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1 PL 1179/2020, Sen. Antonio Anastasia (PSD/MG) Considerações Iniciais 02/04/2020 Excelentíssimo Senhor Senador Antonio Anastasia, Haja vista a relevância e a urgência do tema – “crise causada pela Covid 19” –, bem como o peso dos seus efeitos na sociedade brasileira, manifestamo-nos de modo sumário e pontual sobre alguns pontos do PL 1179/2020, em tramitação no Senado. O PL 1179/2020, que visa dispor “sobre o Regime Jurídico Emergencial e Transitório das relações jurídicas de Direito Privado (RJET) no período da pandemia do Coronavírus (Covid-19)”, é inegavelmente meritório e os efeitos da pandemia sem dúvida demandam a intervenção legislativa. Desse modo, os apontamentos abaixo não representam críticas negativas ou qualquer espécie de censura ao trabalho que contou com a contribuição de ilustres juristas. O objetivo dos signatários é o de somar esforços, contribuindo para o seu aperfeiçoamento, de modo a evitar – ou, ao menos, minimizar – questionamentos que incrementem a insegurança jurídica. Em síntese, o intuito é, de forma ágil e simples, promover o debate construtivo em torno desse relevantíssimo Projeto de Lei. Trazemos, assim, à consideração de Vossa Excelência a necessidade de aprimoramentos ao PL 1179/2020. Art. 1º. • Em relação ao caput do art. 1º, parece-nos que a expressão “no período da pandemia”, não seria adequada, por desconsiderar os efeitos que se estenderão para além do fim deste momento específico. Melhor seria utilizar “em virtude da pandemia”. 2 Além disso, a utilização da expressão “relações jurídicas de Direito Privado” poderá ensejar dúvidas sobre a aplicação da Lei a, por exemplo, contratos de concessão de serviços públicos. Por isso, seria importante incluir na redação que a lei institui normas de caráter transitório e emergencial para a regulação de relações jurídicas afetadas pela pandemia do Coronavírus (Covid-19). Art. 1º. Parágrafo único. • Termo inicial em 20/03/2020: antes desta data, várias decisões estavam sendo tomadas, por consumidores e empresas, em decorrência da Covid-19. Basta lembrar, a par de iniciativas legislativas tomadas em outras esferas, que a Lei 13.979, a qual “dispõe sobre as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus responsável pelo surto de 2019”, é datada de 06/02/2020; recorde-se, ainda exemplificativamente, que os efeitos da pandemia sobre o setor aéreo são anteriores a 20/03/2020. Diante disso, apresenta-se como melhor alternativa estabelecer que a data de 20/03/2020 seja tida como marco a partir do qual fica dispensada a prova da ocorrência de efeitos da pandemia sobre os contratos, ressalvado, porém, que os efeitos da pandemia sobre a concreta relação contratual podem ser verificados mesmo antes, desde que, neste caso, comprovados. Art. 2º. • Parece-nos que não ocorre suspensão de normas, salvo quando houver referência expressa. O que se tem é a aplicação de normas específicas para casos específicos. Melhor seria só ressalvar a não revogação de qualquer lei, ao final, como usualmente se faz. 3 Art. 3º. • Cremos não haver motivo para a inclusão de “prazos impeditivos” (causa impeditiva ao curso de prazo). Se a causa de impedimento acabar, é eficaz o prazo de suspensão. • Aqui, a suspensão não poderia ser gerada pela vigência da lei, mas sim pelo momento em que os respectivos Tribunais de Justiça ou Federais deixaram de atender, se ocorrido antes. Art. 6º. • Cremos que a redação não exprime o que se buscou regrar. Em verdade, o texto enseja algumas dificuldades interpretativas inclusive para os estudiosos do Direito. Entendemos que o objetivo do texto é dizer que a ocorrência de impossibilidade de prestar não pode ser utilizada para escusar a parte do cumprimento de deveres anteriores à caracterização concreta do fato que a gerou. Se é esse o intuito, como está na Justificativa que acompanha o PL, não haveria discordância. Porém, parece-nos que não é isso que se extrai do texto na sua atual redação. • Além disso, o texto também permite uma outra discussão: e se houver disposição contratual em sentido contrário, que determine efeito distinto? É relevante lembrar que há diversos casos em que as partes dispuseram em contratos celebrados anteriormente ao início da pandemia sobre as causas e sobre os efeitos do evento de caso fortuito ou de força maior, de modo que o texto pode representar afronta ao ato jurídico perfeito. • Por fim, sugerimos que as consequências decorrentes da pandemia do Coronavírus, incluídas as previstas no art. 393 do Código Civil, não tenham aplicação a fatos anteriores à pandemia, especialmente em relação às prestações já executadas nos contratos de trato sucessivo. 4 Art. 7º. • Entendemos que o dispositivo deva ser suprimido, pois o Código Civil e a jurisprudência consolidada já oferecem soluções adequadas. • Além do mais, a mantença do texto proposto poderia suscitar maiores problemas dos que visa solucionar. Exemplificativamente: - prever rol de hipóteses legais de imprevisibilidade; - excluir desse rol a hipótese do art. 317 do Código Civil, não parecendo haver razão para isso, pois, tanto quanto ocorre com os dispositivos citados, é possível cogitar-se de uma desproporção entre prestações pecuniárias, considerado o momento em que estatuído o dever e o momento de seu adimplemento; - a redação permite a intepretação de que, para outras regras (p. ex., para relações de consumo), aqueles critérios seriam viáveis, especialmente em razão do disposto no parágrafo primeiro; - ao listar hipóteses de fatos imprevisíveis, afasta-se o requisito da “extrema vantagem” para a contraparte, que está no art. 478 do Código Civil; - o texto refere o aumento inflacionário. É provável que tenhamos deflação em um primeiro momento. Ela está afastada? • Por fim, parece-nos desnecessária mencionar a “alteração de padrão monetário”, pois esta, diferentemente da inflação, da variação cambial e a desvalorização da moeda, é resultado direto de decisão da autoridade monetária. Essa se daria, necessariamente, por lei, a qual regularia os efeitos jurídicos decorrentes de tal alteração. Art. 7º. Parágrafo primeiro • Caso não aceita a sugestão de supressão do art. 7, no seu parágrafo 1º a interpretação a contrario sensu pode indicar que os critérios previstos no caput se aplicariam nas relações de consumo e nas relações de locação, o que parece ser contrário ao objetivo do PL. 5 Art. 7º. Parágrafo segundo • O parágrafo parece estar dizendo o óbvio. Isso é um problema, pois o óbvio, na lei, gera discussão inclusive se isso é óbvio. É prudente retirar, ainda que o caput e o parágrafo 1º subsistam. Art. 8º. • O texto, conforme proposto, implica dificuldades interpretativas. Por exemplo, não fica claro se entrega domiciliar é o mesmo que delivery, para os fins legais. Os bens entregues pelos correios, não estariam compreendidos na expressão “por entrega domiciliar”? • Além disso, a abrangência da regra pode gerar problemas sérios de garantia aos consumidores, na medida em que, em razão da pandemia, grande parte do comércio relacionado a bens de consumo acaba ocorrendo por meio de entregas domiciliares. Art. 9º. • Entendemos que a proposta desta regra merece grande atenção. Apresentamos algumas questões que podem ser suscitadas pelo texto proposto, de modo a aprimorar a redação, tendo em vista as questões que exemplificativamente apresentamos: - Qual o tratamento para o locador vulnerável, isto é, aquele que depende do aluguel para a sua subsistência ou de sua família? Se for um caso de necessidade de subsistência do locador e o locatário tinha meios de arcar com os custos? Se for o caso de subsistência do locador,ainda que o locatário não tenha meios? Por que os riscos devem ser imputados a apenas um dos polos da relação? - Se for locação empresarial, segue-se o mesmo regime? 6 - A regra abarca locação em shopping center, que pode ser entendida como uma subespécie particular das locações empresariais? - Como fica o seguro do locador e as outras garantias prestadas? - Seria o caso de cobrar juros quando do pagamento dos aluguéis que forem diferidos? Não seria mais prudente deixar essa questão para mais adiante, já se conhecendo mais os efeitos e o tamanho da crise? - Poderia haver a inversão do ônus da prova, no sentido da demonstração de que o locatário pode arcar com os custos do aluguel ou estabelecer um critério objetivo para afastar o despejo? (por ex., a todos que tenham renda superior a quantia a ser determinada). - Ainda: deveria ser ressalvada a locação para temporada, pois o intuito da norma não a abrange e podem-se ter vários problemas se, por exemplo, o locatário aluga para temporada e permanece no imóvel que serve à subsistência do locador. - Seria preciso discernir entre a proibição de despejo por causa atribuível ao fato da pandemia e por outras causas previstas em lei. • Ademais, uma medida de prudência seria somente deferir a liminar após a oitiva da parte contrária, assegurando-se que ela não será deferida desde que o locatário comprove que o seu negócio foi afetado pelos efeitos da pandemia COVID-19, sem grandes rigores. Art. 10. • A regra deixa o poder em mãos do locatário, sem apontar critérios permissivos do seu exercício. Parece um excesso protetivo. Seria melhor estabelecer alguns critérios para a suspensão. Além disso, não há diferença entre locação residencial e empresarial, o que parece ser um problema. Sugere-se ao menos um rol exemplificativo das hipóteses. 7 • Ademais, verificam-se problemas na redação. Não há, propriamente, “exercício da suspensão do pagamento do aluguel”, mas de sua exigibilidade, total ou parcial. • Parece importante criar regra especial para os locadores vulneráveis: talvez um apoio social direto como forma de compensação para a suspensão da exigibilidade dos aluguéis – ou, ao menos, ter em mente, para um futuro próximo, uma regra nesse sentido. • A “devolução” dos aluguéis, acrescidos de juros, parece-nos excessiva para o locatário que estará empobrecido. Talvez cancelar a referência aos juros. • Como tratar a situação dos encargos geralmente repassados na locação: despesas condominiais e IPTU? Estariam abrangidas nessa suspensão de exigibilidade? Atualmente, há casos em que há o denominado “pacote” que é um valor que engloba aluguel e encargos. • Não está contemplada a hipótese de extinção contratual. Deveria ter um parágrafo 4º para isso. Poderia remeter ao critério do art. 395, § único do Código Civil, é dizer: a perda da utilidade da prestação para o credor leva à extinção. Sugere-se apresentar um rol de hipóteses de justa causa para a extinção da relação jurídica de locação, utilizando-se a técnica da enumeração exemplificativa. • Parece ser útil criar uma regra de transição envolvendo certa flexibilização para ações revisionais de aluguel. Os três anos poderiam permanecer, mas, havendo motivo relevante e comprovado decorrente da pandemia, o prazo de 3 anos da ação revisional poderia ser atenuado. • Nada há sobre locação empresarial. Três temas relevantes: (i) uso do imóvel atingido pela pandemia, (ii) efeitos sobre o prazo para o direito de renovação; (iii) excluir da regra locação em shopping center, por suas características especiais. • Redação do § 3º poderia ser aprimorada, por exemplo, abrindo aos meios digitais. Art. 15 – Inciso I 8 • Não abarca os locatários, que parecem estar abrangidos no inciso II (veja- se que nesse inciso II estão ressalvados os possuidores diretos. No inciso I, não. O efeito, na prática, é excluir os locatários da aplicação do inciso I). * * * Pelas razões expostas, pedimos a sua elevada atenção para que proceda aos ajustes ora sugeridos, com o intuito de preservar o espírito da nobre proposição e torná- la compatível com a legislação vigente, com o que se promoverá a esperada segurança jurídica neste momento de crise. Signatários: Jorge Cesa Ferreira da Silva Judith Martins-Costa André Estevez Aline Miranda Valverde Terra Ana Carolina Brochado Teixeira Ana Luiza Maia Nevares André Rodrigues Corrêa Augusto Tolentino Carla Müller da Rosa Carlos Edson do Rêgo Monteiro Filho Carlos Konder Eduardo Secchi Munhoz Fabiano Menke Fabiano Robalinho Cavalcanti Francisco Marino Gerson Branco Giovanni Ettore Nanni Gisela Sampaio Cruz Guedes Guilherme Nitschke Gustavo Haical Gustavo Tepedino Henrique Cunha Barbosa José Alexandre Tavares Guerreiro José Emilio Nunes Pinto José Roberto de Castro Neves Luis Felipe Spinelli 9 Luis Renato Ferreira da Silva Luiz Alberto Colonna Rosman Marcelo Ferro Marcia Santana Fernandes Maria Cláudia Mercio Cachapuz Mariana Pargendler Milena Donato Oliva Nelson Laks Eizirik Pablo Renteria Paula Greco Bandeira Pedro Batista Martins Rodrigo Barreto Cogo Rodrigo Garcia da Fonseca Rose Meireles Selma Lemes Vitor Butruce
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