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Livro - Historia Medieval

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HISTÓRIA MEDIEVAL
Mateus Sokolowski
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Nesta obra iremos embarcar em uma viagem por mais de mil anos de histó-
ria, que se inicia com a queda do Império Romano do Ocidente (476) e vai 
até a tomada de Constantinopla pelos turcos otomanos (1453). Mais do que 
isso, discutiremos a importância desses marcos, para descobrir que as coi-
sas não mudam do dia para a noite, mas se constroem por meio de proces-
sos, continuidades e rupturas do período anterior (Idade Antiga) ao posterior 
(Idade Moderna). 
O espaço geográfico abordado neste livro é o Ocidente latino, mas, para com-
preensão desse contexto, foi fundamental abordar os estudos sobre Bizâncio e 
sobre o Islã. Trataremos aqui sobre o que “não foi a Idade Média” e sobre o que 
realmente foram as sociedades feudais e suas instituições, como a cavalaria e 
a Igreja. Estudaremos a importância das cidades, o florescimento da arte e da 
cultura e sobre como o homem medieval superou os desafios de seu tempo.
Fundação Biblioteca Nacional
ISBN 978-85-387-6368-0
CAPA_História Medieval.indd 1 14/11/2017 10:15:23
Mateus Sokolowski
IESDE BRASIL S/A
Curitiba
2017
Hist ria
Medieval
CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO 
SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ
S667h Sokolowski, Mateus
História Medieval / Mateus Sokolowski. - 1. ed. - Curitiba, PR : 
IESDE Brasil, 2017
232 p. : il. ; 21 cm.
Inclui bibliografia
ISBN 978-85-387-6368-0
1. Idade Média - História. I. Título.
17-45438 CDD: 940.1
CDU: 94(4)” 476/1492”
Direitos desta edição reservados à Fael.
É proibida a reprodução total ou parcial desta obra sem autorização expressa da Fael.
© 2017 – IESDE Brasil S/A. É proibida a reprodução, mesmo parcial, por qualquer 
processo, sem autorização por escrito do autor e do detentor dos direitos autorais.
Todos os direitos reservados.
IESDE BRASIL S/A. 
Al. Dr. Carlos de Carvalho, 1.482. CEP: 80730-200 
Batel – Curitiba – PR 
0800 708 88 88 – www.iesde.com.br
Produção
FAEL
Direção Acadêmica Francisco Carlos Sardo
Coordenação Editorial Raquel Andrade Lorenz
Revisão IESDE
Projeto Gráfico Sandro Niemicz
Capa Vitor Bernardo Backes Lopes
Imagem Capa Kanuman/Shutterstock.com
Arte-Final Evelyn Caroline dos Santos Betim
Sumário
Carta ao aluno | 5
1. O que não é Idade Média | 7
2. O surgimento da sociedade feudal e as suas instituições | 25
3. A cavalaria medieval | 47
4. A fé cristã | 67
5. A cidade medieval | 85
6. A Baixa Idade Média | 105
7. Arte e cultura material no Medievo | 125
8. O Islã | 149
9. Bizâncio | 171
10. Continuidade e rupturas: a chegada
dos tempos modernos | 193
Gabarito | 209
Referências | 221 
Carta ao aluno
Nas próximas páginas iremos embarcar em uma viagem por 
mais de mil anos de história, que se inicia com a queda do Império 
Romano do Ocidente (476) e vai até a tomada de Constantinopla 
pelos turcos otomanos (1453). Mais do que isso, discutiremos a 
importância desses marcos, para descobrir que as coisas não mudam 
do dia para a noite, mas se constroem por meio de processos, con-
tinuidades e rupturas do período anterior (Idade Antiga) ao poste-
rior (Idade Moderna). O espaço geográfico abordado neste livro é o 
Ocidente latino, mas, para compreensão desse contexto, foi funda-
mental abordar os estudos sobre Bizâncio e sobre o Islã. Trataremos 
aqui sobre o que “não foi a Idade Média” e sobre o que realmente 
foram as sociedades feudais e suas instituições, como a cavalaria e 
a Igreja. Estudaremos a importância das cidades, o florescimento 
da arte e da cultura e sobre como o homem medieval superou os 
desafios de seu tempo. 
– 6 –
História Medieval
No decorrer desta obra iremos superar os preconceitos e a incompreen-
são que ronda a Idade Média, para descobrir o que ela nos deixou de mais 
valioso: a busca pela compreensão e convivência com as diferenças. Afinal, 
todas as eras são feitas de luz e trevas, e não cabe a nós julgar ou projetar 
as trevas de nosso tempo no passado, mas sim compreender esse período 
pela perspectiva de que, se o homem medieval foi capaz de superar-se e ven-
cer paradigmas que pareciam intransponíveis, nós, por meio do conheci-
mento e do respeito pelas diferenças, também somos capazes de modificar o 
nosso tempo.
Bons estudos!
O que não é Idade Média
Neste primeiro capítulo iniciaremos nosso estudo a respeito 
de mais de mil anos de história medieval. Para que isso seja possível, 
é necessário que façamos um recorte espacial e temporal, além de 
dividir esse período tão extenso em temáticas.
Escolhemos iniciar o assunto esclarecendo os erros mais 
comuns que cometemos ao abordar esse período, chamado equi-
vocadamente de “Idade das Trevas”. Afinal, ao superar nossos pre-
conceitos em relação ao tema, tornamo-nos capacitados para nos 
debruçar sobre os livros e as fontes históricas, a fim de definir nossos 
próprios recortes e questões sobre esse período tão fascinante e negli-
genciado por boa parte das instituições universitárias brasileiras.
1
História Medieval
– 8 –
1.1 A importância de se estudar 
a Idade Média hoje
Quando as caravelas portuguesas avistaram as terras brasileiras, elas 
traziam em sua tripulação homens que tinham a herança de uma cul-
tura medieval. Portugal e Espanha haviam vivido a Reconquista cristã na 
Península Ibérica, um processo histórico iniciado com uma série de batalhas 
no século VIII, marcado também pela convivência e pela negociação com o 
Al-Andaluz, domínio muçulmano na região. Esse processo só chegaria ao fim 
em 1492, com a conquista do Reino de Granada, último reduto muçulmano 
na Península Ibérica, pelos reis católicos. É fundamental compreendermos 
esse período, para poder entender a mentalidade guerreira desses homens que 
desembarcaram nas Américas.
A religião católica, o culto aos santos, a música modal somada à poesia 
carregada de paralelismos1 ecoam ainda hoje na literatura de cordel, no movi-
mento armorial e nas típicas canções regionais do Brasil, testemunhando tal 
herança. Ademais, observando atentamente a religiosidade popular, verifica-
mos a presença da crença em São Jorge, também popularizado na música Jorge 
da Capadócia, de Jorge Ben Jor. “Jorge é da Capadócia, salve Jorge”, canta ele. 
Você sabia que São Jorge já era muito cultuado no Império Bizantino? Sabia 
que a Capadócia é uma região próxima a Bizâncio2 atualmente pertencente 
à Turquia?
Essas seriam apenas amostras de como é importante conhecer a cul-
tura medieval para conhecer melhor não só o Brasil, mas o mundo em que 
vivemos. É comum que questões urgentes e cada vez mais atuais recorram à 
Idade Média em busca de explicações. Na Europa, discute-se o Brexit, a legi-
timidade da própria união Europeia e os conflitos com a Turquia. As políticas 
públicas em relação a refugiados e imigrantes provocam debates acalorados 
que constantemente necessitam da História para desatar esses nós. Evoca-se a 
Idade Média para discutir a legitimidade de tais políticas e, no Brasil, temas 
1 Repetição simétrica e rítmica de palavras muito utilizada na poesia dos trovadores medievais.
2 O endereço a seguir é do Bizantística, um portal dedicado ao Império Bizantino. Indica-
mos especialmente a leitura do artigo sobre os santos guerreiros bizantinos, disponível em: 
<https://imperiobizantino.com.br/2012/07/16/santos-guerreiros-bizantinos-martires- 
guerreiros-e-orixas/>. Acesso em: 4 set. 2017.
– 9 –
O que não é Idade Média
como religião e preconceito clamam por uma maior profundidade nos deba-
tes. Somado a isso, é imprescindível que todos nós conheçamos outras reali-
dades espaciais e temporais.
Os historiadores, durante sua formação, devem também conhecer 
o trabalho de importantes medievalistas franceses, espanhóis e italianos 
que muito contribuíram para avanços no estudo da História em toda 
parte do mundo. Georges Duby e Jacques Le Goff, por exemplo, mem-
bros da Escola dos Annales contribuíram para trazer à tona conceitos de 
imaginárioe mentalidade, categorias de estudo que certamente revolu-
cionaram a historiografia.
Hoje, mais do que nunca, é importante que os professores convidem 
seus alunos a compreender como as ideias são forjadas e acabam por se trans-
formar ao longo do tempo. Em tempos em que o terrorismo provoca medo 
na sociedade, por meio da história medieval pode-se compreender o contexto 
de surgimento de muitos conceitos aplicados hoje por grupos extremistas. Por 
exemplo, o conceito de Jihad foi cunhado no período medieval, significando 
a luta pela fé, similar ao conceito de Guerra Santa e Cruzadas, empregado 
pelos reinos cristãos.
Recentemente, as propostas de alteração da BNCC – a Base Nacional 
Comum Curricular no Brasil – provocaram intensos debates sobre a importân-
cia de se manter o estudo da Idade Média no currículo. Um dos argumentos 
no documento publicado pelo Núcleo de Estudos Mediterrânicos da UFPR 
(Nemed) é de que o Brasil não está isolado e separado de tradições culturais 
medievais. A eliminação da Idade Média do currículo causaria prejuízos inco-
mensuráveis ao desenvolvimento da noção, de tempo e espaço. Centrar o estudo 
da História em apenas um só contexto, ou país, pode desembocar num 
estudo puramente ideológico. Segundo a carta escrita pelo Nemed,
A História, nesta proposta, perde a sua dimensão de vivido e inviabi-
liza a sua reflexão crítica enquanto parte de algo que existiu e nos toca 
até hoje. Ao impor recortes contextuais arbitrários e focos específicos 
perde-se a compreensão do todo em detrimento da visão mecanicista 
da parte. Os processos históricos desaparecem e destacam-se apenas 
as construções predominando nesta proposta a concepção de História 
contada, o que em mentes juvenis com pouca vivência pode dar a 
impressão de se estar tratando de uma sociedade imaginada numa 
realidade ficcional. A História perde ainda, nesta proposta, a sua 
História Medieval
– 10 –
dimensão universal, pois os homens são universais e não continen-
tais ou nacionais. Antes de haver nações já havia processos históricos. 
(UFPR, 2015)
Nesse sentido, nos perguntamos: como podemos estudar os conceitos 
de império, colônia, república ou democracia sem discutir os processos históri-
cos nos quais eles foram pensados? Sabemos que uma História sem passado, 
cronologia e estudo das diferenças não pode ser chamada de História. Por isso 
a importância de se estudar História Antiga e Medieval, visto que esses perío-
dos são fundamentais para a compreensão do momento em que vivemos.
No século XXI, filmes, jogos e séries despertam a curiosidade dos jovens 
e da população em geral, e é importante que eles saibam situar e organizar 
cronologicamente e espacialmente Atenas, Esparta, Florença, Roma, Paris, 
conhecendo os processos históricos dessas regiões. Aqueles que tentam pro-
blematizar a História sem uma cronologia oferecem visões deturpadas, equi-
vocadas e que, infelizmente, encontram-se presentes em muitos de nossos 
manuais do Ensino Médio, constituindo, portanto,
anacronismos que enfraquecem a História e que reduzem os esforços 
de gerações de historiadores brasileiros que defendiam exatamente a 
pluralidade de opções e pensamentos que apresentam a Antiguidade, 
o Medievo, a Modernidade e a Contemporaneidade em espaços 
que vão do Mediterrâneo em direção à Europa, à África, à Ásia e à 
América. (UFPR, 2015)
Não podemos ignorar o estudo do Magreb e da Península Ibérica, cuja 
convivência entre muçulmanos e cristãos ao longo de sete séculos testemu-
nhou muitas trocas culturais, assim como disputas. Os portugueses que 
chegaram ao Brasil já haviam entrado em contato com a cultura africana e 
traziam em si elementos étnicos e culturais daquele continente. É possível 
mostrar aos nossos alunos do Ensino Médio que a paz já foi alcançada entre 
muçulmanos e cristãos que compartilhavam o mesmo território – tal estudo 
certamente teria grande impacto no mundo em que vivemos.
Ademais, o estudo da mentalidade de Cruzada pode ajudar a com-
preender a expansão marítima portuguesa e o descobrimento do Brasil, não 
só como um projeto econômico, como aparece recorrentemente nos livros 
didáticos. Como ficaria uma geração de brasileiros sem conhecer o Ocidente 
latino, Bizâncio e o mundo muçulmano?
– 11 –
O que não é Idade Média
A Idade Média foi muito mais que um período intermediário entre 
e antiguidade e modernidade. Foi a época da música dos trovadores, um 
tempo marcado por contradições entre os prazeres do carnaval e as privações 
da quaresma. São Tomás de Aquino, por exemplo, desaconselhava o uso 
litúrgico da música instrumental porque provocava um deleite tão intenso 
que perturbava a concentração dos fiéis. Nesse tempo, em que os padrões 
de beleza eram radicalmente diferentes e a forma de se viver tão distinta da 
nossa, temos a oportunidade de repensar nossos próprios padrões com a 
consciência de que eles irão inevitavelmente, e da mesma forma, ser altera-
dos no decorrer do tempo.
Um dos objetivos do estudo da História é, justamente, descobrir que as 
mudanças são possíveis e que os paradigmas se alteram ao longo do tempo. 
Se deixarmos de estudar Idade Média, inevitavelmente esses objetivos deixa-
rão de ser cumpridos. O homem medieval via o mundo como uma floresta 
repleta de perigos e as regiões remotas separadas por oceanos habitados por 
monstros marinhos. Essa visão de mundo, tomada pela ideia do maravilhoso, 
fazia-se presente na iconografia medieval, que ignorava a fronteira entre o 
mundo natural e o sobrenatural. O homem e a mulher medieval atribuíam 
um significado místico à natureza e possuíam uma visão de mundo em 
muitos aspectos radicalmente diferente das nossas, sendo, portanto, muito 
importante que nós estudemos esse período para descobrir o que herdamos 
dele e em que medida ele é radicalmente diferente do nosso.
1.2 Uma discussão cronológica e 
espacial do período Medieval
Certo dia um romano foi dormir antigo e acordou medieval. Mil anos 
depois, num dia comum, um lavrador medieval arou a terra, foi dormir e 
acordou moderno. Essas colocações certamente não fazem sentido. As datas 
servem como uma guia, um roteiro, mas não são limites definitivos. Segundo 
o escritor italiano Umberto Eco (2010), estamos muito acostumados a deli-
mitar a Idade Média com a dissolução do Império Romano, que, fundindo 
a cultura latina e tendo o cristianismo como aglutinante, deu origem ao que 
hoje chamamos de Europa, com suas nações e instituições.
História Medieval
– 12 –
Tal concepção propõe a data de 476 d.C. para marcar o fim do Império 
Romano do Ocidente, quando o rei vândalo Odoacro, dos Hérulos, depõe 
o último imperador romano, Rómulo Augusto, como o marco de início 
da Idade Média, que iria até a data de 1492, quando Colombo chega nas 
Américas – mesmo ano em que os reis católicos finalizam o processo de 
Reconquista cristã na Península Ibérica, com a conquista de Granada ao 
sul. Mas essas não são as únicas datas que podem ser utilizadas para marcar 
o início e o fim da Idade Média. É possível marcar o fim desse período com 
a queda de Constantinopla para os turcos otomanos, em 1453. De qual-
quer modo, teremos cerca de 1.016 anos de História, ou seja, trata-se de 
um longo período. Se observarmos de outra perspectiva, ao longo da pró-
pria Idade Média existe a mesma distância temporal que nos separa hoje 
dela. Ou seja, como esperar que ao longo de todo esse tempo não hou-
vesse mudanças no pensamento e na forma de se ver o mundo? Portanto, 
cabe questionar se a Idade Média foi tão uniforme como imaginamos, 
durante esses 1.016 anos.
Caso estudemos a fundo a obra de grandes pensadores da Idade Média, 
como Santo Agostinho (354-430) e sua obra Cidade de Deus, e São Tomás de 
Aquino (1225-1274), com a Suma teológica, podemos ver que o pensamento 
dos dois tem conexões importantes. No entanto, com mil anos de história 
separando esses dois pensadores, devemos entender que essas obras foram 
escritas em contextos completamente diferentes e devem ser lidas deacordo 
com suas especificidades.
Na realidade, nós temos muitas “idades médias”. A começar pela 
divisão clássica, ela é separada pela Alta Idade Média (queda do Império 
Romano até o ano 1000) e pela Baixa Idade Média (do ano 1000 até 1492). 
Tal divisão é uma convenção entre os historiadores devido às profundas 
mudanças de mentalidade que ocorreram com a passagem do milênio no 
ano 1000. Outra divisão didática adotada é a espacial, separando os con-
teúdos da Idade Média em dois grupos: Oriental e Ocidental. O termo 
Oriental aqui é digno de debate. Edward Said (2012) nos mostra que o 
termo orientalismo deve ser discutido, uma vez que tudo que não é parte 
da Europa Ocidental pode ser encarado como exótico, uniforme, perigoso 
e de difícil compreensão, uma visão altamente tendenciosa e distorcida da 
– 13 –
O que não é Idade Média
realidade. Nesse sentido, a história da China, do Japão, do Tibete e da Índia 
medieval clama por uma abordagem mais profunda. Neste livro, procura-
remos informar sobre o recorte tradicional, que inclui a história dos povos 
árabes e do império bizantino e suas relações com o Ocidente. Mas dei-
xamos aqui o convite aos futuros pesquisadores para se debruçarem sobre 
esses temas tão carentes de estudos no Brasil.
Acreditamos que, ainda assim, em meio a um contexto tão heterogêneo, 
podemos encontrar uma unidade em três pilares da Idade Média na Europa, 
a confluência da tradição romana com a tradição germânica, aglutinada pelo 
cristianismo. Na Alta Idade Média, temos a ascensão do Reino Franco, que 
ocorreu de 482 a 814. Clóvis conseguiu unir os francos sob seu domínio, mas 
via a necessidade de obter terras e rendas para premiar e manter a lealdade 
de seus guerreiros. Com a conversão do Reino Franco ao cristianismo, os 
francos passam a ser vistos como defensores da cristandade contra os muçul-
manos. Tal oposição é fundamental para compreender as relações de poder 
da época, pois o Império Carolíngio restaurou uma espécie de ordem política 
no Ocidente latino que não existia mais desde o fim do Império Romano do 
Ocidente. Por outro lado, essa identidade cristã realmente se manifestava no 
difícil embate com o outro, o muçulmano, e, na maioria das vezes, tal identi-
dade se fragmentou devido às partilhas hereditárias e demandas locais.
Nesse contexto de medo constante dos ataques frequentes dos vikings e 
sarracenos, existia, portanto, a necessidade de proteção que irá caracterizar 
o feudalismo. Os reis viajavam pessoalmente para fazer valer seus direitos e 
possuíam ainda um sistema administrativo descentralizado; o império ger-
mânico segue em relação estrita e conflituosa com o papado, marcando as 
relações do poder na Alta Idade Média. Ao fim desse período, a partir do 
século IX a população de Europa encontrava-se provavelmente mais redu-
zida desde a queda do Império Romano, e as estradas estavam deterioradas 
e em péssimo estado.
Chegamos, então, ao período conhecido como a Baixa Idade Média. 
A própria expressão Baixa Idade Média, segundo Guimarães (2010), não 
parece muito gloriosa, pois já passa uma ideia de decadência e, de fato, foi 
um período de crises e transformações, principalmente nos séculos XIV e 
XV, quando muitos padeceram de peste, fome e sofreram com a Guerra dos 
História Medieval
– 14 –
Cem Anos. O homem medieval teve de lidar com esses desafios e conquistou 
alguns progressos nas condições de higiene e inovações no campo. Nos sécu-
los XI e XII, houve um expressivo aumento populacional após a crise do ano 
mil e nesse mesmo período ocorreram a fundação e o crescimento de diversas 
cidades que acompanhavam o surgimento da burguesia. A Igreja se fortale-
ceu criando novas ordens de frades, como os franciscanos e dominicanos no 
século XIII.
Mas foi em 1453 que, no Oriente, encerraram-se mil anos de autonomia 
política bizantina com o fim do Império Romano do Oriente. Muitos histo-
riadores propõem ainda uma longa Idade Média, que se desdobraria até os 
séculos XVIII e XIX, argumentando que os modos de se pensar e ver mundo 
se mantiveram autenticamente medievais. Segundo Guimarães:
Não há consenso, apenas há convite à reflexão, discussão de critérios 
e ideologias. O que pode ser considerado um marco? Quem o consi-
dera? Sob qual perspectiva? Se se insiste em 1453, é preciso levantar 
o significado de um acontecimento, a conquista dos turcos otoma-
nos, numa chave de ruptura com o mundo e nascimento de outro. 
(GUIMARÃES, 2010, p. 131)
Outro marco importantíssimo foi a expansão ultramarina, que permitiu 
à Europa chegar ao Novo Mundo. Essa tecnologia, que esteve em gestação 
durante a Idade Média, daria forma às caravelas na Idade Moderna, período 
em que, pela primeira vez na História, o Ocidente ultrapassou o Oriente em 
termos tecnológicos.
A Guerra dos Cem Anos, que se iniciou no século XIV, também 
viria a ser um importante acontecimento. Ela abalaria a posição privi-
legiada da cavalaria, tão fortemente enraizada na mentalidade medie-
val como um símbolo de escudo da cristandade, pois os cavaleiros não 
podiam vencer facilmente os arqueiros ou enfrentar abertamente os 
canhões de guerra. Tais situações alterariam profundamente o papel da 
nobreza e o poder real.
Dessa forma, verifica-se que todos os períodos da História estão inter-re-
lacionados e que devemos estar preparados para conhecer suas continuidades 
e rupturas, sem impor recortes antes de realmente compreendê-los.
– 15 –
O que não é Idade Média
1.3 História medieval no Brasil: 
um balanço crítico da historiografia nacional
Os estudos medievais no Brasil receberam muita influência dos historia-
dores franceses, principalmente os membros da Escola dos Annales, que con-
tribuíram muito para novas formas de se entender a Idade Média, por meio 
de uma perspectiva de estudos da mentalidade e do imaginário da época. No 
entanto, cada vez mais os historiadores brasileiros têm se interessado pela 
história da Península Ibérica, que possui suas especificidades geográficas em 
relação à história da França medieval, geralmente tomada como paradigma 
para o estudo da cristandade latina. Por isso, é fundamental que os estudiosos 
tenham em mente que nem sempre os estudos sobre uma região da Europa 
podem ser aplicados inadvertidamente a outras realidades. Com esse cui-
dado, o diálogo entre historiadores brasileiros, portugueses e franceses pode 
ser muito profícuo.
Cada vez mais a digitalização de documentos permite que historiadores 
da América Latina se debrucem sobre fontes medievais. As obras literárias, 
nesse sentido, são privilegiadas em relação à cultura material, por motivos 
óbvios. Desde o começo do crescimento dos estudos medievais acadêmicos 
no Brasil, a partir de meados de 1980, houve uma marcante influência fran-
cesa, pois a Escola dos Annales estava em seu auge. O medievalista Hilário 
Franco Júnior foi um dos muitos responsáveis pelo avanço desses estudos no 
Brasil, sendo inclusive orientado por Jacques Le Goff em seu pós-doutorado. 
Posteriormente, diversos programas de pós-graduação do país se voltaram a 
um passado medieval português, conforme demonstra a maioria das pesqui-
sas realizadas. Isso se deu, provavelmente, porque temos um passado e um 
idioma comum compartilhados.
A herança ibérica, com sua tradição medieval frequentemente ressigni-
ficada no Brasil, e o papel desempenhado pela Igreja católica na história do 
país também são pontos que contribuem para o interesse sobre a trajetória 
dessa instituição. Em levantamento realizado no banco de teses da Capes3, 
encontramos os trabalhos mais recentes do Brasil que demonstram o avanço 
dos estudos medievais. Poderíamos listar todas as obras e autores importantes, 
mas isso tornaria nosso livro um grande banco de dados, tarefa que não nos 
3 Disponível em: <http://bancodeteses.capes.gov.br/banco-teses/#!/>. Acesso em: 30 set. 2017.
História Medieval
– 16 –
compete aqui. Citamos, portanto, alguns dos expressivos grupos de pesquisa 
ativos atualmente, como, por exemplo, oNemed, o Leme, o Vivarium, o 
Neve, além de pequenos grupos espalhados em centros estaduais, como os da 
UEM/UEL4.
Além disso, a criação da Abrem5 em 1996 fortaleceu os estudos medie-
vais no Brasil, contribuindo para um crescimento das obras publicadas em 
língua portuguesa, no entanto, ainda é necessário recorrermos a autores 
estrangeiros. Esse diálogo entre autores nacionais e internacionais é vital para 
construção da pesquisa na área6.
Além desses grupos de pesquisa, existe nas universidades um crescente 
interesse pela música e pela cultura medievais, comprovado pelos surgimento 
de grupos que realizam execuções de cantigas, como o conjunto Música 
Antiga, da UFF, fundado em 1982 e ativo até os dias de hoje, e também 
por pesquisadores do Nemed. Esses exemplos evidenciam o interesse dos dis-
centes e docentes pela execução performática da música, contrafactum7, bem 
como na recuperação desses temas, cuja divulgação ao vivo ou em meios de 
4 Para saber mais sobre esse trabalho, acesse os endereços eletrônicos desses grupos, 
disponíveis em:
<http://nemed.he.com.br/>. Acesso em: 5 set. 2017.
<http://www.leme-medieval.com.br/>. Acesso em: 5 set. 2017.
<https://vivarium.vpeventos.com/#/>. Acesso em: 5 set. 2017.
<http://neve2012.blogspot.com.br/>. Acesso em: 5 set. 2017.
5 Associação Brasileira de Estudos Medievais. Disponível em: <http://www.abrem.org.br>. 
Acesso em: 5 set. 2017.
6 No Brasil, não podemos deixar de citar os pesquisadores: Fatima Regina Fernandes e Mar-
cella Lopes Guimarães (UFPR), Renata Cristina de Souza Nascimento (UFG), Adriana Mo-
celim (PUCPR), Aline Dias da Silveira (UFRGS), Ricardo Costa (UFES), Vânia Leite Fróes 
(UFF) e José Rivair Macedo (UFRGS), que colocam o país na vanguarda dos estudos me-
dievais. Além disso, os estudos interdisciplinares se mostram essenciais, pois não há dúvida 
de que a música e a literatura podem contribuir imensamente para a História. As cantigas 
medievais, por exemplo, já foram também examinadas por estudiosos da área de Letras no 
Brasil, como os pesquisadores Osvaldo Ceschin (USP), Ângela Vaz Leão (UFMG) e Paulo 
Roberto Sodré (UFES); entre outros que trazem importantes contribuições para a leitura 
interdisciplinar das fontes.
7 Contrafactum é a substituição de um texto por outro sem mudança significativa na música 
ou utilização de uma mesma melodia para diferentes textos.
– 17 –
O que não é Idade Média
comunicação tem a capacidade de estimular novas pesquisas e despertar o 
interesse do grande público8.
1.4 Os preconceitos em relação à Idade Média
O método socrático, criado por Sócrates na Antiguidade Clássica, é uma 
técnica de investigação filosófica feita em forma de diálogo, na qual o profes-
sor conduz o aluno a um processo de reflexão e descoberta de novos valores. 
O método consiste em duas etapas. Na primeira, utiliza-se a ironia – nesse 
momento busca-se questionar o conhecimento prévio que se tem sobre deter-
minada matéria. Por meio de variados questionamentos, o indivíduo percebe 
que seu conhecimento sobre determinado assunto pode estar equivocado, 
estando apto para a segunda etapa: a maiêutica, o momento no qual se dá à 
luz novas ideias.
Tal método é muito interessante para o estudo da Idade Média. Num 
curso de licenciatura em História, por exemplo, os futuros professores devem 
estar preparados para, antes de abordar os conteúdos de Idade Média, conhe-
cer os preconceitos que os alunos podem ter em relação ao tema e, em seguida, 
explicar os conteúdos com uma base mais sólida.
Umberto Eco, ao escrever sua obra Idade Média: bárbaros cristãos e 
muçulmanos, por exemplo, abordou a importância de se combater os prin-
cipais mitos e preconceitos em relação à Idade Média antes de se construir 
um conhecimento sobre ela, e hoje mais do que nunca isso é importante. 
Para o autor, devemos combater a ideia de Dark Ages, ou Idade das Trevas. 
É claro que as pessoas viviam em ambientes escuros, florestas e compar-
timentos estreitos e mal iluminados, mas, por outro lado, não podemos 
esquecer das festas, das roupas coloridas, das iluminuras dos livros e das 
catedrais góticas plenamente iluminadas pela luz de sol que entrava pelos 
vitrais (ECO, 2010).
Aliás, você sabia que o termo Idade Média surgiu com o advento do 
humanismo? Tratava-se de um movimento que, inspirado na civilização 
8 Para mais informações, recomenda-se a leitura de: SOKOLOWSKI, Mateus. Aspectos da ca-
valaria nas cantigas de Santa Maria de Afonso X (1252-1284). 2016. Dissertação (Mestrado em 
História) – Setor de Ciências Humanas, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2016.
História Medieval
– 18 –
greco-romana, idealizava a Antiguidade, desprezando o milênio imediatamente 
posterior. Daí o uso de tal termo: um período que estava no meio da Renascença, 
para separá-la da Antiguidade Clássica. Tal colocação é fácil de desmistificar a 
partir do momento em que percebemos que só foi possível ter acesso às obras da 
Antiguidade porque elas foram preservadas pelos monges copistas medievais. 
Tradutores árabes desempenharam um papel fundamental ao traduzir e pre-
servar a obra de Aristóteles, por exemplo, e hoje, provavelmente, não teríamos 
acesso a essa obra se não fosse por eles. Um erro comum é pensar que os medie-
vais desprezavam a ciência da Antiguidade: na realidade, eles a preservaram e a 
compreendiam com base em uma perspectiva cristã.
Certamente a Idade Média não ignorou a cultura clássica. Havia sede 
de conhecimento; pesquisadores, curiosos e monges que dedicaram a vida 
para ter acesso a manuscritos raríssimos. Os textos clássicos eram lidos por 
meio de sua interpretação cristã típica do contexto, mas o fato é que a Idade 
Média não rejeitou a ciência da Antiguidade, como defendeu o positivismo 
do século XIX (ECO, 2010).
Se, por um lado, temos muitas pessoas que pensam na Idade Média 
como mil anos de intolerância, caça às bruxas, ou, ainda, meramente como 
um conteúdo de livros da escola, onde se decora a lista de impostos pagos 
pelos camponeses ao senhor feudal, temos, por outro lado, a idealização 
da Idade Média pelos jogos de videogame e lançamentos do cinema e da 
TV inspirados nessa cultura, trazendo castelos mágicos e dragões que fre-
quentemente surgem na mente das pessoas quando falamos dessa época. 
Certo é que o maravilhoso era muito presente nesse período, mas não 
podemos imaginar que os castelos pareciam palácios cheios de torres. Eles 
eram rústicos e serviam como fortificações e não ofereciam nenhum con-
forto moderno. O Romantismo resgatou a ideia de cavaleiros e princesas 
morando em castelos que também não condiz com a realidade medieval. 
Segundo Umberto Eco (2010), o castelo feudal consiste numa estrutura 
de madeira em um terreno elevado e rodeado por uma trincheira, sim-
ples assim. Ainda que tais ideias sejam úteis para despertar o interesse do 
público sobre o tema, é necessário desmistificá-las.
Outra ideia comum quando se pensa a Idade Média é a de que foi um 
período em que ninguém ousava viajar ou partir da região onde morava. 
– 19 –
O que não é Idade Média
Claro que haviam florestas densas e estradas em péssimo estado, mas casos 
como o de Marco Polo comprovam o alcance do comércio das repúblicas 
marítimas italianas e o gosto que se tinha pelo desconhecido. Outros exem-
plos são os relatos das viagens dos vikings que alcançaram a Groelândia, o sul 
da Itália e a Rússia.
Não podemos nos esquecer da importância da fé no período medieval. 
As catedrais e suas relíquias constituíam verdadeiros centros de peregrinações, 
e até os mais pobres trilhavam o Caminho de Santiago e sonhavam com a 
possibilidade de um dia fazer uma peregrinação a Jerusalém.
Apesar de a Inquisição ter sido criada na Idade Média, foi na Idade 
Moderna que se aprimoraram os instrumentos e métodos de tortura utiliza-
dos para se obter as confissões. Ao contrário do que se pensa, foi nesse mesmo 
recorte temporal do Renascimento e do humanismo que se bateu o recorde de 
mulheres queimadas na fogueira porsuspeita de bruxaria. Embora em menor 
número, na Idade Média pessoas também foram queimadas na fogueira, não 
somente por motivos religiosos, mas também por motivos políticos (ECO, 
2010). A condenação de Joana d’Arc, em 1431, durante a Guerra dos Cem 
Anos, é um exemplo disso. Durante a disputa entre França e Inglaterra, Joana 
foi capturada e queimada viva sob o argumento de ter praticado heresia; toda-
via, dado o contexto de disputa pelos territórios na França, reconheceu-se que 
sua execução foi política. Anos mais tarde, ela seria santificada e perdoada 
pelo papa.
Convém lembrar que cerca de 100 anos depois haveria um processo da 
Inquisição contra Galileu, em plena Idade Moderna, e em 1600 seria quei-
mado Giordano Bruno, acusado de heresia. Já o Martelo das Feiticeiras, escri-
tos pelos dominicanos alemães Kraemer e Sprenger em 1487, constituía um 
manual verdadeiramente cruel de torturas a serem realizadas para obter a 
confissão de hereges e bruxas, o qual esteve em pleno uso após o fim da Idade 
Média. Nesse livro as mulheres eram apontadas como as únicas capazes de 
bruxaria. Nesse mesmo século XV, tivemos personagens como Savoranola: 
pregador inflexível que em pleno Renascimento promovia a queima de 
livros e de obras de arte em suas fogueiras da vaidade, sendo desacreditado e 
finalmente condenado, mas somente ao fim de sua vida. Tais acontecimen-
tos da Idade Moderna nos fazem refletir sobre a tolerância e pluralidade de 
História Medieval
– 20 –
pensamento que existira outrora na Idade Média e sobre as continuidades e 
rupturas desse período, justificando o argumento de que não foi exclusivi-
dade do período medieval queimar pessoas na fogueira, assim como não foi 
um período de atrasos – muito pelo contrário.
Nós também tivemos trevas na Idade Média: medo, peste, intolerância, 
fanatismo e fome. Mas foi dela que herdamos a luz das catedrais, os moinhos 
movidos a água ou a vento, as abadias românicas, as universidades, a carta 
de crédito, a letra de câmbio, a chaminé, o papel, os algarismos árabes, as 
cartas de jogar, o jogo xadrez e os óculos, bem como a preservação de todos 
os grandes pensadores da Antiguidade, entre outras inúmeras contribuições.
Conclusão
A ideia difundida pelos humanistas de que a Idade Média foi mera-
mente um período intermediário entre o apogeu da Antiguidade e os pro-
gressos da Idade Moderna viria a privar esse período de seu próprio valor. 
Nesse sentido, a Idade Média seria tomada como a Idade das Trevas, ou Dark 
Ages, uma época marcada pela miséria humana, barbárie, anarquia e violên-
cia. Infelizmente tal concepção ainda persiste nos dias de hoje: muitas vezes, 
para se referir a um comportamento atrasado ou preconceituoso, atribui-se o 
adjetivo medieval a essas atitudes.
Devemos estar alerta para superar essas construções históricas e abor-
dar esse contexto de uma maneira mais objetiva e menos preconceituosa. 
Também precisamos perceber os avanços que ocorreram na Idade Média, o 
ordenamento de sua sociedade, sua coletividade e solidariedade, cuidando 
para não idealizar o período e tomá-lo como um sonho de nobres cavaleiros 
e belas donzelas conforme muitos filmes apresentam.
Ao lado disso, há de se rever a sua periodização e não se apegar a con-
ceitos estanques, como “fato histórico”, “classe” e “modo de produção” para 
analisar o homem desse período. A Idade Média emergiu da desagregação do 
Império Romano do Ocidente, marcada pela deposição de Rómulo Augusto 
em 476, mas deve-se ter cuidado ao utilizar esse marco: o período medieval 
não se iniciou da noite para o dia. Além disso, hoje se discute a ideia de uma 
longa Idade Média, pois as mudanças na mentalidade ocorrem com longos 
– 21 –
O que não é Idade Média
processos, e é possível perceber continuidades do pensamento medieval cris-
tão no desenrolar dos tempos modernos. Convidamos o leitor a compreen-
der a Idade Média com base nesses conceitos de processo, continuidades e 
rupturas, e superar a visão preconceituosa desse contexto. Afinal, estudamos 
para compreender o homem e sua conjuntura de vida, e não para julgá-lo 
indiscriminadamente por meio de um olhar anacrônico.
Ampliando seus conhecimentos
O trecho do livro de Jacques Le Goff e Nicolas Truong que 
reproduzimos a seguir ilustra a importância dos estudos dos 
medievalistas para toda a historiografia. Afinal, foram eles que 
se debruçaram sobre temas inéditos, como, por exemplo, a 
história do corpo humano. Essa leitura também nos ajuda a 
compreender como a mentalidade cristã estava presente no 
cotidiano dos homens, além de nos preparar para o próximo 
capítulo, no qual estudaremos as três ordens do feudalismo: 
a dos “Oratore”, que oravam, os “Belatore”, que guerreavam, 
e os “Laboratore”, que trabalhavam. A Igreja fazia parte da 
primeira ordem e viria a exercer sua influência sobre o corpo 
e espírito das pessoas.
Uma história do corpo na Idade Média
(LE GOFF; TRUONG, 2006, p. 34-35)
[...]
Provavelmente não é por acaso que o único fundador e 
representante da escola histórica chamada dos Annales que 
se interessou pela questão do corpo tenha sido um historia-
dor da Idade Média, bem como um dos intelectuais mais 
sensíveis às convulsões do mundo contemporâneo: Marc 
Bloch [...] o desvio pela história do corpo na Idade Média 
História Medieval
– 22 –
pode permitir compreender um pouco melhor nosso tempo, 
tanto por suas convergências surpreendentes como por suas 
irredutíveis divergências. [...]
Na Idade Média o corpo é, reiteremos, o lugar de um 
paradoxo. Por um lado, o cristianismo não cessa de repri-
mi-lo. “O corpo é a abominável roupa da alma”, diz o 
papa Gregório, o Grande. Por outro, ele é glorificado, 
sobretudo por meio do corpo padecente de Cristo, sacra-
lizado na Igreja, corpo místico de Cristo. “O corpo é o 
tabernáculo do Espírito Santo”, diz Paulo. A humanidade 
cristã repousa tanto sobre o pecado original – transfor-
mado na Idade Média em pecado sexual- quanto sobre a 
encarnação: Cristo se faz homem para redimir os homens 
de seus pecados. Nas práticas populares, o corpo é con-
tido pela ideologia anticorporal do cristianismo institucio-
nalizado, mas resiste à sua repressão. A vida cotidiana 
dos homens da Idade Média oscila entre a Quaresma e o 
Carnaval, um combate imortalizado por Pieter Bruegel no 
célebre quadro de 1559, O Combate do Carnaval e da 
Quaresma. De um lado, o magro, do outro, o gordo. De 
um lado, o jejum e a abstinência, do outro, banquetes e 
gula. Essa oscilação tem a ver, provavelmente, com o lugar 
central que o corpo ocupa no imaginário e na realidade da 
Idade Média. As três ordens que compõem a sociedade 
tripartite medieval, oratores (aqueles que rezam), bel/ato-
res (aqueles que combatem) e laboratores (aqueles que 
trabalham), são em parte definidas por sua relação com o 
corpo. Os corpos sadios dos padres, que não devem ser 
nem mutilados nem estropiados; os corpos dos guerreiros, 
enobrecidos por suas proezas de guerra; os corpos dos 
trabalhadores, esgotados pela labuta. As relações entre a 
alma e o corpo são, por sua vez, dialéticas, dinâmicas, e 
não antagônicas [...]
– 23 –
O que não é Idade Média
Atividades
1. Por que é importante superar os preconceitos que cerceam a Idade 
Média nos dias de hoje?
2. De acordo com o trecho do livro de Jacques Le Goff e Truong (2006), 
explique o pensamento da Idade Média em relação ao corpo humano.
3. O que significa dizer que existem muitas “idades médias”?
4. Segundo o capítulo lido, qual é a necessidade de se manter o estudo 
da Idade Média no Ensino Médio?
O surgimento da 
sociedade feudal e as 
suas instituições
Após definirmos os equívocos mais comuns cometidos ao 
se abordar o período medieval, chegou a hora de aprofundarmos 
um pouco mais nossa discussão. Para tanto, vamos contextualizar 
as principais instituições desse período e conhecer as três ordens do 
feudalismo. Sabe-se que o homem medieval não se autodenominava 
feudal; tal termo, segundo Hilário Franco Júnior (1983),foi conce-
bido somente no século XVIII. Esse sistema surgiu das ruínas do 
Império Romano para atender às demandas de uma nova realidade 
que estava em gestação desde o início da Idade Média, atingindo seu 
amadurecimento nos séculos X ao XIII, para, nos séculos seguintes, 
sofrer seu processo de desestruturação. Devido às variações e espe-
cificidades de cada região, seria mais correto dizermos, então – no 
plural –, sociedades feudais.
2
História Medieval
– 26 –
2.1 A teoria dos dois gládios: o espiritual e o 
temporal e a formação da sociedade feudal
Muito mais do que uma simples exploração dos camponeses pelo clero 
e pela nobreza, o feudalismo foi um longo processo. Para Alain Guerreau 
(2006, p. 440), a própria noção de Europa feudal estava interligada ao con-
ceito de dominium, que constituía numa relação social original marcada pela 
simultânea dominação dos homens e de suas terras pelo senhor, tratando-se, 
portanto, de uma relação de natureza desigual, diferente do período posterior, 
quando o mercado se tornou a instituição dominante. Por isso a dificuldade 
dos historiadores ao abordarem o período medieval, afinal, palavras como 
moeda, comércio e religião possuíam um sentido radicalmente distinto dos 
quais lhes atribuímos nos dias de hoje. Para nos ajudar a compreender melhor 
esse contexto tão distante do nosso, Franco Júnior (1983, p. 9) desenvolveu 
tópicos que são comuns a todas as sociedades feudais, a saber:
 2 ruralização da sociedade;
 2 enrijecimento da hierarquia social;
 2 fragmentação do poder central;
 2 desenvolvimento das relações de dependência social;
 2 privatização da defesa;
 2 clericalização da sociedade;
 2 transformações na mentalidade.
A seguir, discutiremos cada um deles.
Com a ruralização da sociedade, a terra tornou-se a maior fonte de 
riqueza e poder e, desde o início da dinastia Merovíngia, era concedida como 
forma de pagamento pelos serviços prestados ao rei. Essa concessão tornou-se 
hereditária com o tempo, o que levaria a uma fragmentação do poder real 
e, consequentemente, ao isolamento de grupos humanos nos feudos, onde 
se buscava a segurança e o sustento viabilizados por meio dos indivíduos 
mais poderosos. Para Franco Júnior (1983), seria a instituição das relações de 
suserania e vassalagem que iria moldar essas sociedades, conforme veremos 
adiante. A difusão desse sistema deu-se desde Carlos Magno, pois a autoridade 
– 27 –
O surgimento da sociedade feudal e as suas instituições
do imperador dependia em muito da fidelidade de seus servidores pessoais, 
nessa dinastia que daria procedência ao Sacro Império Romano-Germânico.
Carlos Magno, após sua coroação, dedicou-se à organização de seus 
domínios, por meio de uma atividade legislativa que procurava não abolir a 
organização política que existia previamente. Disso resultou uma complexa 
articulação que compreendia: os condados, dotados de consistência territorial 
e dirigidos pelos condes, que aliavam às funções militares as judiciárias; e os 
ducados, regiões maiores que tinham uma forte base étnica, principalmente 
dos saxões. Ao fim, os homens de confiança do reino acabavam assumindo 
importantes cargos públicos e tornavam-se vassalos do imperador. Assim, a 
fidelidade desses indivíduos era garantida com a concessão de feudos e títulos 
de nobreza. A organização do império era completada, também, pela pre-
sença de uma corte, estável na estrutura, mas itinerante para fazer valer suas 
determinações. No entanto, a dissolução do Império Carolíngio implicaria 
na divisão desses centros de poder, marcando uma nova concepção de poder 
régio, muito mais ligada a uma concepção territorial e baseada na divisão do 
reino em ducados (RAIOLA, 2010, p. 179).
Nessa conjuntura de fragmentação política, a Igreja se destacava por sua 
proposta de integração e pela incrível capacidade de unir todos sob o ideal 
cristão. A palavra católico vem do latim e significa universal, e foi justamente 
essa abrangência que a fez superar o poder dos senhores feudais, uma vez que 
se encarregaria do eterno, enquanto os camponeses e a nobreza se encarrega-
riam do mundano e transitório, conforme os dizeres: “Dai a Cesar o que é de 
Cesar, a Deus o que é de Deus”.
Alain Guerreau (2006) afirmou que foi a ecclesia (Igreja) a instituição 
predominante no sistema feudal, definindo-a de forma muito precisa:
Entendemos por instituição uma forma social de organização pensada 
como estável e perene fundada sobre regras de funcionamento, explí-
citas, distribuindo a seus membros ou aos indivíduos relacionados 
a ela papéis diferenciados, articulados uns aos outros. A ecclesia era 
uma instituição dominante na medida em que todos os seus habitan-
tes da Europa Medieval estavam obrigatoriamente relacionados com 
ela. (GUERREAU, 2006, p. 447)
Devemos lembrar que o cristianismo se estabeleceu como instituição 
nos séculos finais do Império Romano. Enquanto este sucumbia em crises, 
História Medieval
– 28 –
a Igreja católica fortaleceu-se. A perseguição aos cristãos encerrou-se com 
Constantino I, que, por meio do Édito de Milão, promoveu a liberdade reli-
giosa em 313 d.C. A partir de 380 d.C., com o imperador Teodósio, o cris-
tianismo transformou-se na religião oficial do império.
Segundo Franco Júnior (1983), foi a partir desse contexto que os bis-
pos começaram a alargar sua atuação, substituindo aos poucos a magistratura 
civil; dessa forma, a Igreja fortalecia suas raízes na sociedade. Ao lado disso, 
as doações contribuíram enormemente para o crescimento do seu poder eco-
nômico e, já no século V, o celibato clerical impedia a alienação ou divisão 
dos bens. Chegando ao século IX, a Igreja tinha em seu poder 1/3 das terras 
cultiváveis da Europa (FRANCO JÚNIOR, 1983). Disso advém a impor-
tância do debate sobre os dois gládios1 na Idade Média. Sabe-se que a espada 
temporal era considerada do imperador ou dos reis até a Reforma gregoriana 
(embora se considerasse que ela deveria ser usada em prol da Igreja) e que 
Carlos Magno chegou a ser chamado de rector ecclesiae (condutor da Igreja).
Figura 1 – Modelo de gládio romano.
Fonte: Rama/Wikimedia Commons.
1 Gládio era uma espada romana de dois gumes que simbolizava o poder real.
– 29 –
O surgimento da sociedade feudal e as suas instituições
No século IX, Carlos Magno, inspirado pelo Império Romano, tentaria 
construir um novo império. Mas os próprios soberanos carolíngios iriam (por 
necessidades defensivas e administrativas) promover a dissolução do império 
que tentaram criar. Devemos entender que a crise do império afetava igual-
mente a unidade da Igreja e o poder do papa, pois diminuíra os recursos 
para sua administração e para as missões de conversão dos pagãos ao norte 
da Europa. Portanto, no século X, o papado teve seu poder restringido e sua 
própria eleição era refém dos interesses da aristocracia (RAIOLA, 2010).
Georges Duby (1989) lembra-nos de que, por volta do fim do século X, 
a realeza perdeu boa parte de seu poder sobre as autoridades leigas e locais 
que exerciam seus comandos em benefício próprio. A autoridade de julgar e 
punir tornara-se desde então uma oportunidade para arrecadar taxas lucrati-
vas da população, atingindo inclusive os homens da Igreja, que antes estavam 
protegidos pelos privilégios de imunidade concedidos pela autoridade real. 
De variadas maneiras, os poderes temporais ameaçavam a liberdade da Igreja.
Apesar dos longos anos de conflitos pós-carolíngios, a ideia de uma 
soberania imperial não desaparece e a Igreja também se interessa pela con-
servação de uma autoridade universal: reconhece no imperador um protetor 
poderoso e está disposta a lhe conferir legitimidade. Por outro lado, exige dos 
imperadores que não interfiram nos assuntos espirituais. Seria com a coroa-
ção de Otão I (912-973) que o papado voltaria a fazer crescer sua autono-
mia. Apesar de os bispos serem escolhidos entre os nobres, a Igreja consegue 
acumular terras e propriedades e Otão I torna-se guardião da independênciados Estados papais. No entanto, ele teria de se dirigir a Roma três vezes, para 
defender seus interesses e para assegurar que a eleição do papa fosse aprovada 
pelo imperador (RAIOLA, 2010).
Vemos que os séculos X e XI foram marcados pela fragmentação do 
poder central, que seria completamente incompatível com as aspirações uni-
versalistas disputadas pela Igreja e pelo império (RAIOLA, 2010, p. 179). 
Ao lado disso, o poder dos bispos opunha-se ao poder dos duques e condes. 
No Capítulo 4 deste livro, veremos que os papas persistiram em colocar a 
Igreja acima do poder temporal, numa disputa que resultaria na Concordata 
de Worms, em 1122, conciliando o poder papal com o poder do imperador.
História Medieval
– 30 –
Nos séculos seguintes, com base nas teses de Egídio Romano (1247- 
-1295) presentes na bula Unam Sanctam, por exemplo, descobrimos a afirma-
ção teórica de que a Igreja detém ambos os gládios, embora só use diretamente 
o gládio espiritual, devendo o gládio temporal ser subordinado à Igreja:
O gládio espiritual e o material estão ambos em poder da Igreja, mas 
aquele deve ser manejado pela Igreja e pelo sacerdote, e este pelos reis 
e soldados, se bem que por indicação e anuência do sacerdote. Por 
isso, é necessário que uma espada esteja sob a outra e que a autoridade 
secular esteja subordinada à autoridade espiritual. (DIEHL, 2015, 
p. 28 apud SOUZA, 1997, p. 184)
Trazemos essa discussão teórica sobre os dois gládios, que data de fins da 
Idade Média, pois ela nos permite refletir sobre as relações de poder entre duas 
importantes instituições: o Sacro Império e a Igreja. O cristianismo atendia aos 
anseios espirituais mais profundos da população e a conversão permitia que os 
mais humildes e analfabetos tivessem acesso a uma concepção de mundo. Por 
meio da liturgia, vivia-se uma relação de troca com Deus, com a esperança de se 
obter recompensas celestiais. Ao lado disso, havia um medo constante de que o 
diabo estivesse sempre à espreita, ameaçando a vida cotidiana.
Alain Guerreau (2006) lembra-nos de que as regras ditadas pela Igreja 
tinham um valor geral e coercitivo e que suas posses fundiárias e materiais 
não tiveram equivalente. O papa, durante a Idade Média, não somente tratava 
de assuntos espirituais, mas também interferia nos assuntos concernentes à 
vida política, atuando, inclusive, como mediador de conflitos entre diferentes 
senhores feudais. A própria organização e hierarquia da Igreja medieval ajuda-
vam a garantir a consolidação do seu poder. Desde 756, o papa era dirigente de 
vários territórios que estavam sob a autoridade e o controle direto da Igreja, o 
que o levou a envolver-se em múltiplos conflitos políticos com as monarquias 
medievais. Mais tarde, no início da chamada Baixa Idade Média, os conflitos 
tornam-se acirrados e cada vez mais os monarcas buscam centralizar o poder 
em si, argumentando que para a Igreja cabia apenas a função espiritual.
No entanto, segundo Fernandes (2008), durante o Medievo havia um 
conjunto de pensadores eclesiásticos diretamente envolvidos na manutenção 
da teocracia papal, que triunfaria, pelo menos no plano teórico, até o século 
XIV. A partir desse momento, outra realidade política teve suas bases insti-
tucionais e teóricas amadurecidas: trata-se do conceito de reino. A França de 
– 31 –
O surgimento da sociedade feudal e as suas instituições
Filipe IV, o Belo, daria o primeiro passo no sentido de interferir no embate 
teórico de superioridade entre império e papado, enfrentando este último ao 
criar uma sé pontifical alternativa em Avinhão, território francês, no episó-
dio conhecido como o Cisma do Ocidente. Passam então a existir dois papas, 
que, em sua disputa pelo poder, excomungaram-se mutuamente. Esses foram 
tempos de crise para cristandade, com a culminância de uma disputa que 
atravessou todo o Medievo.
A universalidade do conceito de império desenvolvida no Sacro Império 
Romano-Germânico seria, no fim da Idade Média, aplicada às realidades 
políticas específicas dos reinos. Essa concepção é recorrente nos tratados dou-
trinais do estilo espelho de príncipes2. Afonso X, o Sábio (1252-1284), rei 
de Leão e Castela, personifica muito bem tal fenômeno ao afirmar que o rei 
é imperador dentro do seu reino. As universidades da época também teriam 
um papel determinante ao propiciarem argumentos aristotélicos às bases teó-
ricas de supremacia dos reis (FERNANDES, 2008).
Assim, podemos concluir que o tradicional embate entre papado e impé-
rio, nos fim do século XIII e princípio do século XIV, tenderia a ser tempora-
riamente superado pelo eclodir da força dos reis. É importante destacar que 
os documentos que defendem a supremacia de um dos gládios não excluem 
ou propõem a extinção de seus opositores, na medida em que o conjunto 
dos poderes, espirituais e temporais, configuraria a realidade política ideal e 
equilibrada, ainda que hierarquizada (FERNANDES, 2008).
Dessa forma, podemos ver o desafio de conciliar esquemas generalizantes ao 
estudo de realidades específicas na Idade Média e percebemos como as institui-
ções às quais ela deu vida passaram por transformações nesse período, devido a 
complexas relações de poder, típicas de cada contexto dessas sociedades feudais.
2.2 Oratore, belatore e laboratore
É muito comum os historiadores recorrerem ao clássico poema do 
bispo católico Adalbéron de Laon (947-1030) para debater a trifunciona-
lidade da sociedade medieval ocidental. O poema cita as três ordens que, 
2 Espelho de príncipes é um gênero literário tratadista que, por meio de uma narrativa norma-
tiva, propõe modelos de governantes ideais.
História Medieval
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teoricamente, seriam: em primeiro lugar, a dos oratore, que no latim significa 
os que oram, responsáveis por rezar pela salvação de todos; em segundo, a dos 
belatore, que executavam a função bélica de proteger a primeira e a terceira 
categorias, lutando contra os infiéis; e, por último, a dos laboratore, que 
deveriam, com o seu labor, vestir e alimentar todos os demais. Tal concepção 
estava em harmonia com a ideia corrente de que a sociedade medieval era 
um só corpo, em que cada membro devia trabalhar em harmonia com os 
demais, obedecendo à hierarquia para o funcionamento ideal e ordenado do 
grupo como um todo.
Devido à natureza de sua função, os que oravam tinham primazia sobre 
os demais, sobretudo devido ao fato de possuírem autoridade moral como 
representantes da vontade divina na Terra. Tal destaque social era reforçado 
por normas que os diferenciavam, como o celibato e a tonsura – corte de 
cabelo que simbolizava a renúncia da vaidade, pois se raspava o topo da 
cabeça deixando o cabelo apenas nas laterais (Figura 2). Além disso, somente 
o clero poderia realizar os rituais da liturgia, que se tornava cada vez mais 
complexa e com uma grande quantidade de festas religiosas.
Figura 2 – Exemplo de tonsura. ANGELICO, Fra. São Domingos de Gusmão 
(detalhe), séc. XV, afresco, color. Museu Nacional de São Marcos, Florença, Itália. 
Para Franco Júnior (1983), essa tentativa de monopolizar a comunicação 
com Deus tornava o clero responsável por todos os demais, pois sem o traba-
lho deles não haveria salvação. Esse monopólio da fé acabou por levar a uma 
– 33 –
O surgimento da sociedade feudal e as suas instituições
verdadeira Cruzada contra as heresias e repressão das manifestações populares 
da fé, que nunca deixaram de existir. As rejeições individuais levavam à exco-
munhão; essa exclusão do coletivo era uma das piores penalidades possíveis na 
Idade Média, enquanto as rejeições coletivas eram consideradas heresias, que 
tinham como consequência uma repressão brutal (GUERREAU, 2006). Um 
exemplo é o caso dos cátaros, que, ao negar os dogmas da Igreja, foram perse-
guidos. No século XIII, o papa, ao lado da dinastia Capetíngia, convocou uma 
verdadeira Cruzada contra a heresia cátara no sul da França, o que iria resultar 
num verdadeiro massacre de homens, mulheres e crianças pelos cruzados.Era à Igreja que cabia a função unificadora de uma Europa medieval 
marcada pela divisão. Numa sociedade altamente hierarquizada, dentro da 
Igreja não podia ser diferente. Percebia-se que a Terra deveria refletir o reino 
dos céus, que era igualmente hierarquizado. Os mosteiros da ordem de Cluny, 
por exemplo, seguiam uma rígida hierarquia, não havia relações horizontais 
entre mosteiros da mesma categoria, mas uma hierarquia vertical em que 
todos se reportavam a uma ordem superior.
Quando falamos de feudalismo, estamos nos referindo a uma sociedade 
agrária em sua essência e sob um forte controle clerical. Nesse contexto os 
movimentos monásticos se reforçaram, afinal eram os eclesiásticos que assegu-
ravam a coesão da aristocracia. Segundo Alain Guerreau (2006), a tendência 
global e obrigatória da Igreja constituía a estrutura do sistema de dominação 
medieval. Era o soar dos sinos da igreja que informava as horas mais impor-
tantes do dia, assim como eram as festas do calendário litúrgico que marca-
vam a passagem do tempo. Os que oravam, portanto, interferiam em todos os 
aspectos do cotidiano dos homens. Acreditava-se que somente a intervenção 
da vontade divina por meio das orações promovidas pelo clero podiam superar 
as maiores provações e ajudar o homem, fraco por natureza, a superar o campo 
do mal que dominava a vida material (FRANCO JÚNIOR, 1983).
Naturalmente, a Igreja acumulou cada vez mais riquezas e os mosteiros 
eram alvos fáceis para os mais cobiçosos. Os responsáveis pela proteção de 
seus bens eram os cavaleiros – geralmente de origem nobre – e a eles cabia 
atuar como protetores da Igreja e dos que não podiam portar armas para se 
defender. Aos poucos eles conseguiram cada vez mais conquistar poder polí-
tico, pelo domínio que exerciam no território que protegiam. Na prática, os 
História Medieval
– 34 –
camponeses, aqueles a quem eles deveriam proteger, eram os mais explorados, 
e o estilo da vida dos guerreiros buscava imitar a fartura e a pompa da velha 
nobreza à qual estavam ligados. Até o século XII, mais especificamente na 
França, nobreza e cavalaria tornaram-se sinônimos. Segundo Baschet (2006), 
a Igreja denuncia a violência da aristocracia laica na medida em que ela pró-
pria é sua vítima e defende seus próprios senhorios de uma constante pressão 
da aristocracia. Nesse embate com a nobreza, a Igreja apela ao povo, conforme 
comprovam os movimentos de Paz de Deus, que fazem então a manutenção 
da ordem senhorial que a Igreja queria dominar.
Em vários momentos os reis e a Igreja buscavam controlar o comporta-
mento agressivo dos guerreiros, o que de modo geral também teria eco nas 
Cantigas de Santa Maria, compiladas na corte de Afonso X, o Sábio de Leão 
e Castela (1252-1284). Na “Cantiga n. 22”, por exemplo, um cavaleiro ataca 
um lavrador devido ao desamor que tinha pelo seu senhor, evidenciando as 
rivalidades existentes entre a nobreza nesse período. O lavrador então pede 
socorro a Santa Maria para suportar os golpes de lança:
[...]
En Armenteira foi un lavrador,
que un cavaleiro, por desamor
mui grande que aví’ a séu sennor,
foi polo matar, per nome Matéus.
E u o viu séu millo debullar
na eira, mandou-lle lançadas dar;
mas el começou a Madr’ a chamar
do que na cruz mataron os judéus. [...]3
3 “Em Armenteira havia um lavrador,
que um cavaleiro, por desamor
muito grande que tinha por seu senhor,
foi matá-lo, seu nome era Mateus.
Ele viu seu milho debulhar
e mandou lançadas dar
mas ele começou a Maria chamar
Mãe daquele que na cruz foi morto por judeus.”
(Cantiga de Santa Maria n. 22, tradução nossa)
– 35 –
O surgimento da sociedade feudal e as suas instituições
Esse poema expressa os sentimentos de aflição e as expectativas do 
monarca em relação ao comportamento violento de seus cavaleiros que não 
poupavam os vilões4. A cantiga em questão (a CSM 22), por exemplo, nos 
traz um episódio baseado em uma situação real ou imaginária que tem como 
cenário o Mosteiro de Santa Maria de Armenteira, que foi construído no 
século XII, no noroeste da Península Ibérica. O texto da cantiga que selecio-
namos evidencia o contexto de realização de saques violentos por parte da 
própria cavalaria castelhana, contra mosteiros e camponeses do reino, que irá 
inclusive ter repercussão não só nas crônicas, mas também será cantada pelos 
jograis da corte de Afonso X.
Segundo Franco Júnior (1983), o custo do equipamento do cava-
leiro era o equivalente ao valor de 22 bois, isso numa época em que uma 
família de camponeses mal tinha condições de cuidar de um boi. Por meio 
dessa informação trazida pelo autor, percebemos a diferença de recursos 
disponíveis para cada categoria social. Nessa sociedade agrária e altamente 
hierarquizada, os camponeses trabalhavam e dependiam da proteção dos 
cavaleiros, que estavam no topo da hierarquia social. Com a leitura da 
cantiga apresentada, descobrimos então uma ambiguidade do Estado da 
época, que direciona sua violência justamente àqueles que deveria proteger 
(GUIMARÃES, 2010, p. 119).
Na Idade Média a proteção possuía, portanto, um caráter muito mais 
pessoal. Para poder de alguma forma controlar a liberdade de exercício da 
violência por parte desses guerreiros, a Igreja criou conceitos como os de 
Guerra Santa5 e Paz de Deus6, que visavam colocá-los a serviço da cristandade. 
Segundo Baschet (2006), essa dominação aristocrática ancorava-se localmente, 
mas nem todos os dependentes do senhor feudal eram servos; havia também 
uma série de tributos, e os trabalhos devidos ao senhor eram apenas uma das 
formas de exploração. Todas as relações sociais eram relações entre as pessoas, e 
cerimônias e gestos reforçavam a submissão dos laboratore aos belatore.
4 Agricultor residente nas vilas.
5 Guerra declarada em nome de Deus e em defesa da cristandade – e, por isso, autorizada 
pelo papa.
6 Período em que a Igreja restringia o uso da violência.
História Medieval
– 36 –
Nessa sociedade agrícola, boa parte da riqueza vinha da terra, mas, além 
disso, quase todo senhorio tinha sua produção artesanal, obtendo produ-
tos de extrema necessidade, como o sal, no comércio, no caso de não terem 
condições de produzi-los. Já os produtos mais luxuosos eram importados do 
Oriente, geralmente por intermédio do Império Bizantino, para atender aos 
clérigos e cavaleiros mais abastados. Conforme aponta Franco Júnior (1983), 
cabia aos servos, portanto, fornecer os alimentos e as vestimentas, pois o tra-
balho na terra não era função dos que oravam ou lutavam. Os braços do 
corpo da sociedade medieval eram, assim, os servos ligados à terra em que 
viviam e trabalhavam.
Os trabalhadores apresentavam uma grande diversidade de condi-
ções, desde camponeses livres até escravos. As pequenas propriedades 
rurais não ligadas a um grande domínio [...] foi uma das origens do 
vilão, camponês livre que recebera um lote de terra de um senhor, mas 
em troca de obrigações e limitações relativamente leves. (FRANCO 
JÚNIOR, 1983, p. 53)
As concepções organicistas das sociedades fundadas sobre metáforas 
corporais (que utilizam partes do corpo) remontam à Antiguidade e tive-
ram muita força na Idade Média. A Igreja, sendo uma comunidade de fiéis, 
era considerada um corpo do qual Cristo é a cabeça, ou seja, o sistema 
cristão de metáforas corporais repousava sobretudo no binômio cabeça-co-
ração. Muitas vezes, na Idade Média esse argumento foi utilizado de forma 
política, para justificar a liderança do rei ou da própria Igreja católica (LE 
GOFF, 2006, p. 162).
Com a falta de um poder ordenador centralizado, equivalente ao 
Estado moderno, podemos dizer que a sociedade feudal teve em seu desen-
volvimento uma série de particularismos regionais e que cada região possuía 
sua trajetória específica. No entanto, a alimentação, o trabalho e o jejum 
acabavam sempre sendo determinados pela Igreja. Um exemplo disso eram 
as dietas quaresmais, que definiam um cardápio rico em peixes, legumes, 
pães brancos e pouco consumo de álcool, estimulandoo jejum e a penitência 
dos fiéis. Veremos, nos próximos capítulos, que cada fase da vida, de qual-
quer indivíduo, era marcada pelos ritos cristãos: o nascimento pelo batismo, 
depois o casamento sempre público e monogâmico e, na hora da morte, a 
extrema-unção.
– 37 –
O surgimento da sociedade feudal e as suas instituições
O ensino formal também era de responsabilidade do clero, que, nos 
mosteiros e depois nas universidades, abordava por um viés cristão a herança 
cultural greco-romana. Isso se dava por meio das chamadas artes liberais, 
metodologia de ensino organizada na Idade Média, composta pelo Trivium 
(lógica, gramática, retórica) e o Quadrivium (aritmética, música, geometria, 
astronomia). Eram entendidas como opostas às artes mecânicas, executadas 
pelos camponeses. Fora desses meios, cabia aos sermões dominicais e às artes 
plásticas presentes nos templos ensinar a mensagem de Deus à esmagadora 
maioria analfabeta. Mais do que isso, a confissão individual, adotada a partir 
do século VIII, permitia ao clero penetrar na consciência de cada indivíduo 
(FRANCO JÚNIOR, 1983).
Concluímos aqui que essa divisão tripartida da coletividade medieval era 
um modelo ideológico, que propunha uma imobilização de suas categorias 
em prol da ordenação e estabilidade do corpo social que deveria refletir uma 
ordem celeste perfeita e imutável, conforme Santo Agostinho (354-430) iria 
propor em sua obra A cidade de Deus. Na prática, a realidade medieval foi 
muito mais complexa do que a proposta por Agostinho; no entanto, por meio 
dessa obra, podemos descobrir os modelos e as expectativas que os detento-
res do poder na Idade Média perseguiam, na busca pela organização de sua 
própria sociedade.
2.3 A importância das relações feudo- 
-vassálicas: senhor (proteção e benefício) 
e vassalo (fidelidade e serviço)
Em parte, este subtítulo é autoexplicativo: se por um lado o senhor deve-
ria oferecer proteção e benefício, o vassalo deveria cumprir seu papel com 
serviço e fidelidade. A realidade, no entanto, é mais complexa: só é possível 
compreender verdadeiramente as relações sociais na Idade Média se conhe-
cermos a mentalidade desse contexto, em que as relações se davam de forma 
muito pessoal e a palavra tinha um peso muito distinto do que tem hoje. 
Os contratos firmados entre os homens tinham grande valor numa sociedade 
em que o mundo era visto como palco de luta entre o bem e o mal, que 
opunha a espiritualidade à matéria, onde epidemias e desastres naturais eram 
História Medieval
– 38 –
compreendidos como consequência da ira divina e os milagres eram testemu-
nhados como verdadeira manifestação da vontade de Deus.
Já na Alta Idade Média, observa-se a prática do juramento de fideli-
dade ao rei ou imperador, que, para garantir tal lealdade, concede as honras 
como a posse de um castelo ou o direito de comandar e de punir. Na época de 
Carlos Magno, isso se generalizava como forma de subordinação, enquanto na 
Catalunha do século XI fazia-se um contrato escrito, ou seja, cada região tinha 
a sua maneira. A partir do século X, a relação vassálica passa a ser instituída por 
um ritual, a homenagem, que consiste num engajamento verbal do vassalo, em 
que o homem ajoelhado se declara como homem do senhor. A investidura do 
cavaleiro seria também um ritual vinculado à homenagem. Para Georges Duby 
(1989), esse ritual sofreria cada vez mais a influência eclesiástica, que passa a 
consagrar e benzer suas armas, tornando-o soldado de cristo. Essa cerimônia 
feudo-vassálica possuía forte carga simbólica de uma hierarquia entre iguais.
Conforme aponta Franco Júnior (1983), na Alta Idade Média, com o 
enfraquecimento de um poder real centralizado, estreitaram-se os laços de 
sangue e as relações pessoais diretas dentro das famílias e linhagens. Nesses 
grupos, a solidariedade interior protegia seus membros e a morte de um deles 
era sentida por todos, em alguns casos sendo motivo de vingança. Nesse con-
texto o ritual de vassalagem possuía grande importância e jurava-se lealdade 
perante relíquias cristãs ou a Bíblia. No entanto, com o passar do tempo, 
vemos um processo de enfraquecimento dos laços de parentesco carnais e 
fortalecimento do parentesco espiritual, como o parentesco batismal e o apa-
drinhamento, como parte do desígnio da Igreja para melhor controlar a aris-
tocracia guerreira (GUERREAU, 2006).
Devemos lembrar que a história de cada região varia. Os ataques dos 
vikings, sarracenos, húngaros e muçulmanos levaram a um processo em que a 
defesa só poderia ser realizada por condes ou por quem detivesse o poder na 
região, para responder com eficácia aos ataques surpresa, cujos saques e rapi-
nas relâmpago, seguidos da rápida retirada das tropas, deixavam um rastro de 
destruição, simplesmente imune à lentidão dos exércitos reais. Esse contexto 
belicoso e de constante temor mudou a paisagem da Europa, que, em busca 
de sobrevivência, tornou-se repleta de castelos e fortalezas, que eram símbolos 
de poder e de proteção.
– 39 –
O surgimento da sociedade feudal e as suas instituições
Figura 3 – Vista do Castelo dos Mouros, construído no século IX em 
Sintra, Portugal.
Fonte: Lusitana/Wikimedia Commons.
História Medieval
– 40 –
Jérôme Baschet (2006) destaca que a vassalidade é habitualmente consi-
derada um dos traços mais característicos da sociedade medieval. No entanto, 
ao contrário da historiografia tradicional, que toma as instituições feudais 
como um sistema homogêneo e bem estruturado, tende-se hoje a atribuir a 
importância do feudo e do laço vassálico a uma proporção pequena da popu-
lação. A forma de feudo e vassalidade são apenas um dos diversos tipos de 
laço e concessões de bens, visto que existiam também os pactos de amizade e 
outras formas de juramentos de fidelidade que asseguravam a distribuição de 
poder dentro da aristocracia. Nesse sentido, concluímos que a vassalidade não 
pode ser vista como a principal relação social do contexto feudal, porque ela 
era restrita apenas ao grupo dominante.
É claro que não se pode também menosprezar a importância das rela-
ções vassálicas. Dito isso, vamos esclarecer como ela se constituía. Foi a par-
tir do século VI que o benefício acabou se tornando o feudo recebido pelo 
vassalo em troca de sua fidelidade e serviço, tratando-se de uma relação em 
que o senhor ocupava uma posição de superioridade em relação ao vassalo 
(FRANCO JÚNIOR, 1983). Já a palavra serviço teve seu sentido alterado no 
decorrer da Idade Média; a partir do século VII, o termo acabou se tornando 
sinônimo de distinção: servir a Deus ou ao seu senhor era algo que tinha 
apreço, por exemplo. Segundo Baschet (2006), o serviço do vassalo possuía 
três aspectos principais:
1) obrigação de incorporar as operações militares empregadas 
pelo senhor;
2) ajuda financeira para casamento dos filhos, pagamento de resgate 
ou partida para as Cruzadas etc.;
3) dever de conselho.
Em troca, o senhor concedia sua proteção e podia também assumir a 
educação dos filhos do vassalo, o que naturalmente o colocava em posição 
de dominação. O feudo era geralmente uma extensão de terra que podia 
englobar um ou mais senhorios. Era, portanto, terra com camponeses, pois 
a nobreza guerreira não se dedicava a tarefas produtivas. Além disso, feudo 
poderia ser também um direito, como cobrar pedágio numa ponte ou reco-
lher taxas de impostos (FRANCO JÚNIOR, 1983). Baschet (2006) vai ao 
encontro dessas colocações ao nos lembrar de que o feudo era muito mais do 
– 41 –
O surgimento da sociedade feudal e as suas instituições
que um pedaço de terra cultivável, pois podia significar um direito ou honra 
particular, como, por exemplo, o de exercer justiça. Tais concessões tinham 
como função capacitar o vassalo para o cumprimento de suas obrigações.
Contudo, ainda segundo Baschet (2006), os laços feudo-vassálicos 
foram vítimas do seu próprio sucesso. Sua eficácia tende a diminuir à medida 
que seu uso passa a ser mais frequente, ao passo que a rede de dependên-cia vassálica torna-se sobrecarregada quando um nobre homenageia vários 
senhores diferentes. Essa pluralidade de homenagens atestada no século XI é 
vantajosa para os vassalos, mas atrapalha a realização do serviço, colocando 
em xeque determinados juramentos a partir do momento que o vassalo tem 
de servir senhores rivais entre si. Para resolver tal dilema institui-se a home-
nagem-lígia7, que deveria ter prioridade sobre as demais. Apesar de ter bons 
resultados, a homenagem-lígia não foi suficiente e o poder do senhor sobre os 
feudos concedidos decresceu cada vez mais.
Para nos ajudar a exemplificar algumas das transformações da relação 
suserania-vassalagem no decorrer da Idade Média, fazemos aqui uma citação 
da obra A sociedade cavaleiresca, de Georges Duby:
No fim do século XIII, no próprio momento em que as novas condi-
ções econômicas e a aceleração da circulação monetária começavam 
a questionar as relações de fidelidade, demasiado dependentes de 
relações meramente territoriais [...] puseram-se a utilizar o dinheiro 
para recompensar os devotamentos pessoais, sem contudo abando-
nar as formas feudais: distribuíram rendas exigindo a homenagem. 
Os usos vassálicos foram assim revigorados. (DUBY, 1983, p. 55)
Em alguns casos, tal ritual podia ser realizado por procuração, inclu-
sive sem a presença dos envolvidos. Compreender tais transformações é 
fundamental para não percebermos as relações sociais da Idade Média como 
estanques. Segundo Duby, o feudo-renda8 possibilitou assim a transição 
entre o conjunto de costumes e de hábitos mentais a que chamamos feuda-
lismo e o novo mundo onde as relações políticas fundamentavam-se, sobre-
tudo, na moeda.
7 Uma homenagem superior às demais homenagens. Todos os soberanos tentavam obtê-la de 
todos os vassalos de seu reino, pois ela tinha prioridade sobre as demais.
8 Conforme vimos, o feudo podia ser a terra ou uma fonte de renda concedida por um susera-
no ao vassalo, como a cobrança de um pedágio, por exemplo.
História Medieval
– 42 –
O feudo, segundo Baschet (2006), que na Alta Idade Média tratava-
-se de uma concessão pessoal ao vassalo que poderia ser recuperada após 
a sua morte, com o passar do tempo tornou-se hereditário, o que levava 
os filhos dos vassalos a reiterarem o juramento ao senhor. Na prática, a 
relação hereditária afrouxava o laço pessoal entre senhor e vassalos, con-
tribuindo para o crescimento da autonomia destes últimos, tendo como 
consequência um constante embate entre um projeto centralizador dos 
reis e a autonomia de sua nobreza. Em alguns casos podia acontecer tam-
bém de o vassalo, inclusive, realizar a venda de seu feudo. Em contrapar-
tida, reservava-se ao senhor o direito de punir as faltas dos vassalos e até a 
possibilidade de confiscar o feudo em caso extremo de traição ou agressão 
direta, caráter rentável da justiça.
Um aspecto fundamental do direito do senhor era a possibilidade de ele 
próprio exercer justiça. Tal função abrangia os delitos mais variados cometi-
dos nas aldeias. Ele possuía também servidores e agentes que supervisionavam 
as colheitas e inspecionavam a floresta, ajudando na aplicação de decisões 
sobre a justiça. Para tentar evitar o repúdio dos aldeões, procuravam respeitar 
os princípios locais. Fato é que todos os castelos possuíam uma forca próxima, 
para lembrar os delinquentes de que eles poderiam ser condenados à morte. 
Ao mesmo tempo, a forca perto do castelo se destacava como símbolo do 
poder senhorial que, junto à cruz, cumpria a ordem feudal.
Para a historiografia do século XIX, tal fragmentação do poder senho-
rial era típica de uma Idade Média obscura, caracterizada por uma anar-
quia feudal desolada pelas destruições provocadas por guerras privadas entre 
senhores. Essa perspectiva ideológica do período medieval visava destacar 
o contraste com a aparente ordem trazida pelo Estado nacional moderno e 
centralizado. No entanto, ao analisarmos com mais cuidado nosso período 
em estudo, percebemos um tênue equilíbrio social e político que, graças aos 
poderes locais, fez a ordem reinar no mundo feudal, atestado pelo impressio-
nante desenvolvimento rural nesse período e pela longevidade desse sistema. 
Devemos, portanto, ter cuidado em tomar a fragmentação do poder como 
algo essencialmente negativo.
– 43 –
O surgimento da sociedade feudal e as suas instituições
Conclusão
Na sua obra A civilização feudal, Jerome Baschet (2006) atenta para 
um ponto fundamental: captar as formas de organização social e suas 
dinâmicas de transformação é mais importante que somente detalhar as 
regras do direito feudal. Tal opção de abordagem nos permite perceber 
dois momentos da Idade Média. Primeiramente, temos o contexto do 
século X, tempo dos principados, em que os condes assumem a função 
militar e de justiça; nesse caso, o rei estava numa posição mais delicada 
de poder. Já no século XIII, existiu uma tendência crescente de centra-
lização e fortalecimento da autoridade real, cuja lógica irá perpassar os 
vínculos feudo-vassálicos. Sabe-se que os campos na Idade Média eram 
dispersos e instáveis, ocupados por construções leves de madeira, que 
coexistiram com o nascimento da aldeia de casas de pedra, fixas e orga-
nizadas em torno de uma consciência comunitária, geralmente próximas 
aos castelos – que, como símbolos de proteção e poder, mantinham todos 
inseridos nas malhas, do tecido senhorial. À Igreja cabia, portanto, cos-
turar essas malhas contribuindo para a ordenação e a coesão da sociedade 
com base em argumentos cristãos.
Ampliando seus conhecimentos
Convidamos você à leitura de um trecho da obra A socie-
dade cavaleiresca, no qual é possível perceber que o autor 
busca apresentar uma realidade específica para debater a 
pluralidade de relações de feudo-vassalagem no decorrer 
do tempo. Percebemos, por exemplo, que a permanência 
da mentalidade feudal durante a Idade Média foi o prin-
cipal motor das relações feudo-vassálicas, mesmo com as 
transformações econômicas do período.
História Medieval
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A sociedade cavaleiresca
(DUBY, 1989, p. 45)
[...] No entanto, a razão profunda do abandono do feudo-
-renda é menos a evolução econômica ou política do que 
a da mentalidade. Do meado do século XIV ao meado do 
século XV, o contrato de indenture e o feudo-renda foram 
conjuntamente utilizados. Se o feudo-renda saiu de uso em 
seguida, foi porque a homenagem (logo, o vínculo vassálico) 
já não apresentava interesse, foi porque a concepção feudal 
do serviço, até então vigorosa, se perdeu. Possibilitado desde 
o fim do século XI pela abertura progressiva da economia, 
rapidamente difundido a seguir em razão de suas vantagens, 
da flexibilidade que conferia às relações de homem para 
homem (pode-se pensar que a maioria dos beneficiários 
dessas tendências jamais viram o senhor, que lhes recebia a 
homenagem por procuração), o uso do feudo-renda era na 
realidade dependente de uma certa atitude mental. O belo 
livro de B. D. Lyon, mostrando tanto os vínculos quanto as 
discordâncias entre a evolução das condições materiais e a 
da psicologia coletiva, incita a prolongar a história econômica 
pela das mentalidades. E ilustra à perfeição esta evidência: que 
é o feudalismo? É antes de tudo uma disposição de espírito. 
[...]
Atividades
1. De acordo com o texto A sociedade cavaleiresca e o capítulo lido, de-
fina o que é feudalismo.
2. Quais os principais fatores que levaram a Igreja a ser a instiuição pre-
dominante na Idade Média?
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O surgimento da sociedade feudal e as suas instituições
3. Qual o argumento utilizado pelo clero (poder espiritual) e pelos 
reis (poder temporal) para justificar a proeminência de um poder 
sobre outro?
4. Quais eram os serviços prestados pelos vassalos ao seu senhor?
A cavalaria medieval
Neste capítulo iremos tratar de um eixo importante dos 
estudos medievais: a cavalaria. Esses guerreiros, apesar de serem ins-
pirados pelas cantigas que narravam feitos de heroísmo, nem sem-
pre corresponderam a esse ideal

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