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Resenha Critica - Consorcio ambiental

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Resenha Critica
O artigo: “STF e a solução de conflitos de competências legislativas em matéria ambiental’’, escrito por  Ingo Wolfgang Sarlet e Tiago Fensterseifer trás como discussão os conflitos de decisões acerca das normas de protenção ambiental entre o Supremo Tribunal Federal e entes federarivos. O artigo nos apresenta como exemplo inicial, a decisão do Ministro Celso de Mello, de indeferir o pedido de medida cautelar formulado pelo Partido Liberal na Ação direta de Inconstitucionalidade 6.218/RS, que defendia a suspensão imediata dos efeitos da Lei Estadual 15.223/2018 do Estado do Rio Grande do Sul. Tal lei compreendia a proibição da pesca de arrasto na faixa marítima da zona costeira do estado do Rio Grande do Sul. Este tipo de pesca proibida nesta legislação compreende o uso de redes de arrasto de fundo por embarcações motorizadas, muito utilizadas por indústrias na captura de espécies marinhas das profundezas do oceano. 
Em contrapartida, o partido liberal usou em sua defesa, o artigo 20, IV, da Constituição Federal de 1988, que dita o Rio Grande do Sul não poderia legislar sobre o mar territorial brasileiro, que cabe apenas ao Congresso Nacional, com a sanção do Presidente da Republica, dispor sobre bens de domínio da União. Em contrapartida, o Ministro Celso de Mello, ao indeferir tal pleito, mesmo tendo reconhecido a competência da União sobre este assunto, definiu que o Estado do Rio Grande do Sul teria agido no exercício de sua competência para legislar concorrentemente, em contexto de condomínio legislativo, com a União Federal, em tema de defesa ecológica, inclusive estabelecendo medidas para proteção do meio ambiente marinho. Além disso, o ministro assinalou a existência de um precedente do STF que reconhece aos Estados a legitimidade para editar suas leis estaduais que vedem a pratica da pesca predatória, principalmente se for realizada pela técnica citada acima. 
A partir desta decisão de voto do Ministro Celso de Mello, é possível desenvolver algumas considerações acerca da sua decisão e a importância do desenvolvimento da jurisprudência do STF. Em especial a relatividade envolva da distribuição/repartição constitucional das competências legislativas pelos entes da federação, no segmento ambiental.
Este conflito legislativo entre as normas de diferentes entes federativos é apoiado pelo modelo adotado pela Constituição, de competências legislativas que são concorrentes e, sobretudo, baseado num sistema federativo corporativo de entes políticos com total autonomia. E, a partir desse contexto, o STF exerce um papel fundamental na analise e resolução destes conflitos legislastivos. Não esquecendo que Juízes e Tribunais estão vinculados a essas decisões pelos deveres de proteção estabelecidos pela Constituição, principalmente focando na proteção do ambiente, estabelecidos nos termos do artigo 225 da Carta Política brasileira. 
O autor nos apresenta duas formas em que este conflito pode ocorrer: na perspectiva do exercício da competência legislativa concorrente, onde a União edita uma norma geral e determinado estado ou município edita uma norma suplementar que cria conflito com a primeira. E pode ocorrer ou exercício da competência legislativa privativa da União que esteja em desacordo com a outra legislação editada pelo ente federativo estadual ou municipal. E é a partir disso, que se torna considerável uma discussão sobre a prevalência ou não da legislação que conferir maior proteção ecológica. Mas, antes de qualquer discussão, é importante ressaltar que se deve existir um debate racional sobre o tema, visto que qualquer decisão pode entrar em conflito com o nosso sistema constitucional, visto que o direito ao meio ambiente equilibrado não é o único direito constitucional que é imposto como direito fundamental. 
A caracterização normativa de um princípio (ou dever) de melhoria progressiva da qualidade ambiental, sempre com a intenção de acatar a norma que for mais projetiva, é encontrada em diversos diplomas legislativos internacionais e nacionais, bem como no direito comparado. Como exemplo, o artigo cita que recentemente e de forma paradigmática, o princípio da progressividade aplicado ao regime jurídico de proteção ecológica foi consagrado expressamente, juntamente com o princípio da proibição de retrocesso ecológico, no artigo 3, c, do Acordo Regional de Escazú para América Latina e Caribe sobre Acesso à Informação, Participação Pública e Acesso à Justiça em Matéria Ambiental (2018).[2]
Um diploma interessante sobre este tema, de forma a firmar o reconhecimento de um postulado herneutico de prevalência da lesgislação mais protetiva, é a Lei 7.661/1988 (Lei do Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro – PNGC). De acordo com o artigo 5° presente nesta Lei, “ o PNGC será elaborado e executado observando normas, critérios e padrões relativos ao controle e à manutenção da qualidade do meio ambiente, estabelecidos pelo CONAMA, que contemplem, entre outros, os seguintes aspectos: urbanização; ocupação e uso do solo, do subsolo e das águas; parcelamento e remembramento do solo; sistema viário e de transporte; sistema de produção, transmissão e distribuição de energia; habitação e saneamento básico; turismo, recreação e lazer; patrimônio natural, histórico, étnico, cultural e paisagístico”. Com este exemplo, é possível observar que a maioria dos diplomas em vigência estão alicerçados na premissa de que deve prevalecer a norma mais protetiva para o meio ambiente. 
Outro exemplo recente apontado pelo artigo é o Acordo de Escazú, de 2018. Este acordo também reconheceu que se pode afirmar como um principio in dúbio pro natura para a resolução de conflitos legislativos, corroborando com a atual jurisprudência do STJ e STF. De acordo com a previsão expressa do seu artigo 4: (...) Nenhuma disposição do presente Acordo limitará ou derrogará outros direitos e garantias mais favoráveis estabelecidos ou que possam ser estabelecidos na legislação de um Estado Parte ou em qualquer outro acordo internacional de que um Estado seja parte, nem impedirá um Estado Parte de conceder um acesso mais amplo à informação ambiental, à participação pública nos processos de tomada de decisões ambientais e à justiça em questões ambientais. 8. Na implementação do presente Acordo, cada Parte procurará adotar a interpretação mais favorável ao pleno gozo e respeito dos direitos de acesso (...).
A partir de todos esses exemplos e argumentos expostos ate aqui, o artigo expressa sua opinião a favor do estado e o município respeitarem o padrão normativo que estabelece como regra prevalecer o piso legal protetivo mínimo. De modo que prevaleça este piso caso as medidas sejam inferiores, mas que sejam acatadas medidas maiores que garantam maior proteção ao meio ambiente. Dessa forma, o legislador estadual ou municipal subverte a sua competência legislativa de forma suplementar e incorre na pratica constitucional. Com a aplicação do principio da prevalência da norma mais benéfica a tutela ecológica, impõe-se o dever da progressiva melhoria da qualidade ambiental e de sua respectiva proteção, quanto às correlatas noções de proibição de retrocesso e insuficiência de proteção.
Em decisão relativamente recente, envolvendo conflito entre competência legislativa privativa da União (direito marítimo) e competência legislativa concorrente dos Estados (proteção do meio ambiente e controle da poluição), o STF, tal como ocorreu no voto-relator do ministro Celso de Mello lançado na ADI 6.218/RS, privilegiou entendimento favorável ao ente federativo estadual, justamente por adotar postura “mais protetiva” em tema afeto a direitos fundamentais. No caso, a Lei Estadual 11.078/99, do Estado de Santa Catarina, estabeleceu normas sobre o controle de resíduos de embarcações, oleodutos e instalações costeiras, tendo a impugnação em face da mesma sido levantada como violação à competência legislativa privativa da União disposta no artigo 22, I, da Constituição, relativamente ao direito marítimo.
O que posso concluir, aofim da leitura desse artigo, é ressaltar a importância do caminho tomado pelo STF, assim como da esfera doutrinaria, em levar em consideração às melhores normas e decisões favoráveis a proteção total do meio ambiente, sejam elas em questões simples, sem grandes impactos, ou em questões mais sensíveis que requerem uma racionalização dos atos e medidas que devem ser tomados. De modo que, não haja conflito entre os entes federativos para evitar um retrocesso ecológico.

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