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Universidade regional do noroeste do estado do rio grande do sUl – UnijUí vice-reitoria de gradUação – vrg coordenadoria de edUcação a distância – cead coleção educação a distância série livro-texto Ijuí, Rio Grande do Sul, Brasil 2013 elenise Felzke schonardie noções básicas de direito processUal constitUcional e a proteção dos direitos FUndamentais 2013, Editora Unijuí Rua do Comércio, 1364 98700-000 - Ijuí - RS - Brasil Fone: (0__55) 3332-0217 Fax: (0__55) 3332-0216 E-mail: editora@unijui.edu.br Http://www.editoraunijui.com.br Editor: Gilmar Antonio Bedin Editor-adjunto: Joel Corso Capa: Elias Ricardo Schüssler Designer Educacional: Jociane Dal Molin Berbaum Responsabilidade Editorial, Gráfica e Administrativa: Editora Unijuí da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul (Unijuí; Ijuí, RS, Brasil) Catalogação na Publicação: Biblioteca Universitária Mario Osorio Marques – Unijuí S363n Schonardie, Elenise Felzke. Noções básicas de direito processual constitucional e a proteção dos direitos fundamentais / Elenise Felzke Schonardie. – Ijuí : Ed. Unijuí, 2013. – 62 p. – (Coleção educação a distância. Série livro- texto). ISBN 978-85-419-0062-1 1. Direito. 2. Direito processual constitucional. 3. Direitos fun- damentais. I. Título. II. Série. CDU : 34 347.9 Sumário ABREVIATURAS .............................................................................................................................5 CONHECENDO A PROFESSORA ................................................................................................7 APRESENTAÇÃO ...........................................................................................................................9 UNIDADE 1 – A JURISDIÇÃO E JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL ....................................11 Seção 1.1 – Breves Apontamentos ................................................................................................11 UNIDADE 2 – O CONTROLE DA CONSTITUCIONALIDADE ................................................15 Seção 2.1 – O Sistema Brasileiro de Controle da Constitucionalidade das Leis .......................15 Seção 2.2 – Do Controle Concentrado da Constitucionalidade ..................................................22 Seção 2.3 – Da Intervenção do Amicus Curiae ...........................................................................32 UNIDADE 3 – A PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS DO HOMEM .......................................................................35 Seção 3.1 – Dos Direitos e Garantias Fundamentais ..................................................................35 UNIDADE 4 – OS PROCEDIMENTOS CONSTITUCIONAIS EM ESPÉCIES ......................39 Seção 4.1 – Ação Civil Pública .....................................................................................................40 Seção 4.2 – Ação Popular ..............................................................................................................41 Seção 4.3 – Habeas Corpus ...........................................................................................................42 Seção 4.4 – Habeas Data ..............................................................................................................44 Seção 4.5 – Mandado de Segurança (individual e coletivo) – lei n. 12.016/09 .........................45 Seção 4.6 – Mandado de Injunção ...............................................................................................48 Seção 4.7 – Ação de Impugnação de Mandato Eletivo (AIME) .................................................49 REFERÊNCIAS .............................................................................................................................51 ANEXO 1 – LEI N. 9.868/99 .........................................................................................................53 EaD 5 noções básicas de direito processUal constitUcional e a proteção dos direitos FUndamentaisAbreviaturas ADC ou Adecon ................................................ Ação Direta de Constitucionalidade ADI ou ADIn ..................................................... Ação Direta de Inconstitucionalidade ADInO................................................................ Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão ADPF ........................................................................ Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental Aime .................................................................. Ação de Impugnação de Mandato Eletivo AP ...................................................................... Administração Pública CE ..................................................................... Constituição Estadual CF ...................................................................... Constituição Federal CP ...................................................................... Código Penal CPC ................................................................... Código de Processo Civil CPP ................................................................... Código de Processo Penal EC ..................................................................... Emenda Constitucional HC ..................................................................... Habeas Corpus HD..................................................................... Habeas Data MI ..................................................................... Mandado de Injunção MIC ................................................................... Mandado de Injunção Coletivo MS .................................................................... Mandado de Segurança MSC .................................................................. Mandado de Segurança Coletivo PGR ................................................................... Procurador Geral da República PGJ .................................................................... Procurador Geral de Justiça RE ...................................................................... Recurso Extraordinário RESP ................................................................. Recurso Especial RGS ................................................................... Rio Grande do Sul RISTF ................................................................ Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal RO ..................................................................... Recurso Ordinário STF .................................................................... Supremo Tribunal Federal STJ .................................................................... Superior Tribunal de Justiça STM .................................................................. Superior Tribunal Militar TSE ................................................................... Tribunal Superior Eleitoral TST .................................................................... Tribunal Superior do Trabalho TRE ................................................................... Tribunal Regional Eleitoral TRF .................................................................... Tribunal Regional Federal TRT .................................................................... Tribunal Regional do Trabalho TJ ...................................................................... Tribunal de Justiça EaD 7 noções básicas de direito processUal constitUcional e a proteção dos direitos FUndamentaisConhecendo a Professora elenise Felzke schonardie Natural de Ijuí, RS, é doutora em Ciências Sociais pela Unisinos (2010). Formou-se em Direito pela Universidade Regional do Noroeste do Estado do RS – Unijuí (1997) e possui Mestrado em Direito pela Uni- versidade de Santa Cruz do Sul (2001). Atualmente exerce a advocacia,é professora do Programa de Mestrado em Direitos Humanos da Unijuí, vinculada à linha de pesquisa “Direitos Humanos, Meio Ambiente e Novos Direitos” e professora da Graduação do curso de Direito da Unijuí e da Universidade de Passo Fundo – UPF. Tem experiência na área de Direito e Ciências Sociais, com ênfase em Direito Ambiental, Constitucional, Econômico e Empresarial, atuando principalmente nos seguintes temas: direito penal ambiental, dano ambiental, instrumentos processuais de proteção ambiental, agentes públicos e responsabilida- de ambiental, sustentabilidade, desigualdades sociais, meio ambiente urbano, direito econômico e controle de constitucionalidade. É autora de várias obras jurídicas, dentre elas: Dano ambiental: a omissão dos agentes públicos; Ambiente e Justiça Ambiental; e inúmeros artigos e capítulos de livros. EaD 9 noções básicas de direito processUal constitUcional e a proteção dos direitos FUndamentaisApresentação O Direito Processual Constitucional, como disciplina específica, tem por escopo o estudo dos instrumentos necessários para efetivar os preceitos estabelecidos na Constituição Federal e compreende o rol de normas e princípios processuais que tem por finalidade regular a jurisdi- ção constitucional. De um lado, abrange a tutela constitucional dos princípios fundamentais da organização judiciária e do processo; de outro, a jurisdição constitucional. Para doutrinadores processualistas constitucionais “O processo constitucional visa a tutelar o princípio da supremacia da Constituição, protegendo os direitos fundamentais. Várias ações e recursos estão compreendidos nessa esfera protecionista e garantista” (Baracho, 2008, p. 45). E mais, há que se compreender que o processo constitucional não é apenas um direito instrumental, mas uma metodologia de garantia dos direitos fundamentais, preceituados na Carta Magna. O professor Baracho (2008), utilizando-se das lições de Chivenda, refere que a relação processual é de movimento, pois trata-se de ação (atuação, batalha, combate), enquanto as par- tes e o juiz se ocuparem da relação substancial que é o objeto do juízo, vivem eles mesmos uma atuação que desenvolve em razão das suas atitudes (do procedere). Inicialmente é necessário observar, no que se refere às partes e ao juiz, se a relação está validamente constituída, pelo que, preliminarmente, examina-se se estão presentes as condições para proceder essa operação. Por intermédio da relação processual que se estabelece, apreende-se a condição de litigante/ demandante de quem solicita a atuação judicial, bem como o interesse que serve de base para a obtenção da intervenção judicial pleiteada. O sujeito que recorre à jurisdição adota uma postura que exige a pretensão. Assim, deve demonstrar a solidez, com fundamentação. O conteúdo da pretensão é o direito material que se faz valer em juízo. Na pretensão, “o direito material e o di- reito subjetivo de ação consolidam-se na demanda, que é o ato processual específico” (Baracho, 2008, p. 47). É importante lembrar que o processo judicial é o conjunto de atos dirigidos para cumprir uma finalidade: aplicação da norma, investigação de um fato, solução de um conflito, etc. E que o procedimento é a sequência de atos coordenados, a maneira como o processo se exterioriza e se materializa no mundo jurídico. Ou seja, o procedimento é a expressão visível do processo. Considerando que o Direito Processual é o conjunto de princípios e normas que disciplinam a aplicação, ao caso concreto, das normas de Direito material, pode-se afirmar que o processo tem uma finalidade instrumental, garantista e sociopolítica, na medida em que os institutos de Direito Processual Constitucional podem atingir sua finalidade, que é investigar a verdade e distribuir justiça (Siqueira Júnior, 2011). Dessa forma, o processo constitucional assegura a vontade da Constituição e consagra o bem comum do Estado Democrático e Social de Direito. EaD 11 noções básicas de direito processUal constitUcional e a proteção dos direitos FUndamentaisUnidade 1 a jUrisdição e jUrisdição constitUcional objetivos desta Unidade Compreender o que significa a jurisdição, em especial a jurisdição constitucional, a im- portância acerca da independência e separação dos poderes Legislativo, Executivo e Judiciário para o Estado Democrático de Direito. a seção desta Unidade Seção 1.1 – Breves Apontamentos seção 1.1 breves apontamentos 1A função jurisdicional exercida pelo poder Judiciário tem por objetivo aplicar o Direito aos casos concretos a fim de dirimir conflitos de interesses. O poder de aplicar a lei ao caso concreto, com a autoridade da coisa julgada, o que torna as decisões judiciais imutáveis, é tarefa afeta ao poder Judiciário, que o faz por intermé- dio de seus membros – juízes, desembargadores e ministros. 1 Disponível em: <http://www.jornalcidadeaberta.com.br/noticias/geral/geral/inaugurado-centro-judiciario-de-solucao- de-conflitos-e-cidadania-em-osvaldo-cruz/>. Acesso em: 14 abr. 2013. (Footnotes) 1 2 Disponível em: <http://www.concursospublicos.pro. br/ultima-palavra-da-jurisprudencia/concursos-publicos-jurispru- dencia-stf-constitucional-controle-constitucionalidade-lei-estadual- atuacao-agu-vacancia-cargo-governador-escolha-ministro-quinto- porte-municao-tipicidade-regime-tributario>. Acesso em: 14 abr. 2013. 3 Disponível em: <http://lucileyma.blogspot.com.br/2011/04/ direitos-fundamentais-assedio-moral-no.html>. Acesso em: 14 abr. 2013. 4 Disponível em: <http://artur-moritz.blogspot.com. br/2010/07/stf-limita-recebimento-de-habeas-corpus.html>. Acesso em: 14 abr. 2013. EaD elenise Felzke schonardie 12 Assim, a jurisdição realiza-se por meio de um processo judicial e encontra seu limite tanto na legitimidade quanto na competência.2 Os juízes realizam o exercício de sua judicatura dentro de seus âmbitos de competência, pois este é o limite da jurisdição.3 De modo objetivo, podemos afirmar que a jurisdição é a função do Estado destinada a resolver conflitos de interesses que ocorrem com o objetivo de resguardar a ordem jurídica e social. O artigo 1º da Constituição estatui que a República Federativa do Brasil formada pela união indissolúvel dos Estados e municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito. O parágrafo único do referido artigo esclarece que todo poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos diretamente. O Estado Democrático de Direito é um dos conceitos políticos fundamentais do mundo moderno, pois traz, em seu bojo, um padrão histórico de relacionamento entre o sistema político e a sociedade civil, institucionalizado por meio de ordenamento jurídico-constitucional que se desenvolveu e consolidou-se em torno de um conceito de poder público, o qual diferencia a esfera pública da esfera privada, os interesses coletivos dos individuais, o sistema político-institucional do sistema econômico, o plano político- partidário e o político administrativo.4 No aspecto organizacional dos três poderes estatais – Executivo, Legislativo e Judiciário – o próprio texto constitucional determina, de forma expressa, as atribuições e competências de cada um. A Constituição Federal prescreve, expressamente, limitações ao governo nacional e aos Estados federados, e institucionaliza a separação dos poderes. Há, no entanto, mecanismos de controle, mediante os quais cada um dos poderes controla o outro, cabendo ao Judiciário uma espécie de salvaguarda para eventuais rupturas. Isso porque um ato de governo contrário à Constituição é um ato de poder ilegítimo, ou o exercício de auto- ridade por parte do governo que vá além dos limites estatuídos no texto constitucional passa a ser um exercício de poder ilegítimo. “A Constituição determina a autoridade que o povo atribui a seu governo, e, ao fazê-lo, estabelece limites” (Matteuci apud Streck, 2002, p. 97).A Constituição escrita apresenta várias características, dentre as quais a legitimidade e a função. Quanto à legitimidade, podemos referir que assegura que o conteúdo de seu texto emana da vontade do povo e representa o consenso racional dos cidadãos. No que diz respeito à função, 2 “Exercendo-se sobre todo o território nacional, por vários motivos deverá a jurisdição ser repartida entre muitos órgãos que a exercem. A extensão territorial, a distribuição da população, a natureza das causas, o seu valor, a sua complexidade, esses e outros fatores aconselham e tornam necessária, mesmo por elementar respeito ao princípio da divisão do trabalho, a distribuição das causas pelos vários órgãos jurisdicionais, conforme suas atribuições, que são previamente estabelecidas. (...) Diz-se que um juiz é competente quando, no âmbito de suas atribuições, tem poderes jurisdicionais sobre determinada causa” (Santos, 1995, p. 194). 3 Podemos afirmar que o objetivo do Estado no exercício da função jurisdicional é assegurar a paz jurídica pela atuação da lei disciplinadora da relação jurídica em que se controvertem as partes. 4 Ver sobre a evolução do constitucionalismo em Streck, Lenio Luiz. Jurisdição constitucional e hermenêutica: uma nova crítica do Direito. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2002, p. 95. EaD 13 noções básicas de direito processUal constitUcional e a proteção dos direitos FUndamentais a Constituição escrita garante os direitos dos cidadãos, impedindo que o Estado os viole e também impede a instauração de um governo autoritário e ilimitado; ao contrário, o governo deve observar certos limites, impostos no próprio texto constitucional, para ser considerado legítimo. Segundo Ferrajoli (1995), a Constituição consiste no sistema de regras, substanciais e for- mais, e que têm como destinatários os cidadãos, titulares do poder. Impondo a todos os poderes – Executivo, Legislativo e Judiciário – imperativos negativos e positivos como manancial de sua legitimação e, sobretudo, de deslegitimação. É uma função de limite e de sujeição, na qual os indivíduos (cidadãos) encontram a garantia aos direitos fundamentais, cuja titularidade lhes é inerente, constituindo o verdadeiro sentido da democracia e da soberania do povo. Em outras palavras, tem-se a Constituição como norma diretiva fundamental e garantidora, que dirige os poderes públicos e condiciona os particulares, visando à realização dos valores constitucionais, como os direitos sociais. Ao tratarmos da questão da jurisdição constitucional, no entanto, observamos certa sobres- saliência do poder Judiciário não apenas em fiscalizar, mas, inclusive, em controlar e anular atos dos poderes Legislativo e Executivo – estes legitimamente eleitos pelo voto popular, represen- tantes da vontade do povo. Neste momento uma questão deve ser levantada: “Como é possível que juízes (constitucionais ou não), não eleitos pelo voto popular, possam controlar e anular leis elaboradas por um poder eleito para tal e aplicadas por um poder Executivo também eleito?” (Streck, 2002, p. 99). O regime democrático e a realização dos direitos fundamentais são fatores de coexistência necessárias para o constitucionalismo contemporâneo. Dessa forma, faz-se necessário ao Esta- do Democrático de Direito uma Justiça constitucional, como condição de possibilidade deste Estado. Segundo Moreira (1993), a existência de uma jurisdição constitucional tornou-se requisito obrigatório de legitimação e de credibilidade política dos regimes constitucionais democráticos. Consequentemente, a jurisdição constitucional passou a ser considerada elemento necessário à própria definição de Estado Democrático. Para Streck (2002, p. 101), “é preciso analisar e compreender o papel destinado à Justiça Constitucional no confronto com os poderes do Estado, seus limites através da jurisdição cons- titucional e as condições de possibilidades do exercício da assim denominada ‘liberdade de conformação do legislador’”. EaD elenise Felzke schonardie 14 Essa liberdade do legislador é tida como variável, conforme a espécie de direitos em questão. Por exemplo, quando a questão refere-se a direitos de liberdades individuais há certa restrição, limitação, nessa liberdade do legislador. Quando, no entanto, trata-se de questões referentes a prestações sociais e/ou liberdades econômicas, a liberdade do legislador adquire certa ampliação, elasticidade. A Justiça constitucional é encarregada de realizar o controle da constitucionalidade do ordenamento jurídico do país. O juiz constitucional, no caso brasileiro o ministro membro do Su- premo Tribunal Federal, aplica o Direito, no entanto o faz com certa carga de valoração política, na medida em que sua indicação ao exercício da função ocorre por indicação política. Há, todavia, que se compreender que de forma indireta, considerando os órgãos encar- regados de elaboração e os órgãos de fiscalização do cumprimento dessas leis, o Judiciário é, sobretudo, o órgão que aprecia e julga o descumprimento da lei, bem como, por intermédio de um tribunal que diz ser constitucional, realiza o controle de constitucionalidade das normas editadas pelos demais poderes, visando a evitar o descumprimento ou violações dos dispositivos legais de proteção aos direitos fundamentais. síntese da Unidade 1 Nesta Unidade estudamos a jurisdição constitucional e os mecanismos de controle e independência dos poderes, por meio dos quais cada po- der (Legislativo, Executivo e Judiciário) controla o outro. Ao Judiciário, porém, cabe uma espécie de salvaguarda para eventuais rupturas da independência e equilíbrio entre os mesmos. Isso porque um ato de governo contrário à Constituição é um ato de poder ilegítimo. EaD 15 noções básicas de direito processUal constitUcional e a proteção dos direitos FUndamentais o controle da constitUcionalidade objetivos desta Unidade Compreender o sistema brasileiro de controle de constitucionalidade das leis, em especial o controle concentrado e a possibilidade de intervenção da figura do amicus curiae, nas ações de controle de constitucionalidade. as seções desta Unidade Seção 2.1 – O Sistema Brasileiro de Controle da Constitucionalidade das Leis Seção 2.2 – Do Controle Concentrado da Constitucionalidade Seção 2.3 – Da Intervenção do Amicus Curiae seção 2.1 o sistema brasileiro de controle da constitucionalidade das leis As leis emanadas do processo legislativo de sua criação e submetidas à sanção ou veto presidencial (poderes Legislativo e Executivo) podem, de certo modo, ofender a Constituição, seja mediante o procedimento de sua criação ou seja pelo conteúdo violador aos direitos e garantias constitucionalmente previstos no texto da Carta Maior. Há que se considerar que o órgão legis- lativo, ao derivar da Constituição sua competência, não pode introduzir no sistema jurídico leis contrárias às disposições constitucionais, sob pena de essas serem reputadas nulas, inaplicáveis e inconsistentes com a ordem jurídica estabelecida (Bonavides, 2003). Unidade 2 EaD elenise Felzke schonardie 16 1 O controle de constitucionalidade pode ser formal ou material. O controle formal, pelo órgão competente, ocupa-se da verificação de conformidade do processo de elaboração da lei, se houve correta ob- servância das formas estatuídas, se a obra do legislador não infringe preceitos constitucionais pertinentes à organização técnica dos pode- res, tanto em suas relações horizontais quanto verticais, observando-se a divisão dos poderes estatuída na Constituição. O controle material incide sobre o conteúdo da norma, e é entendido como frágil pelos doutrinadores, em razão do seu elevado teor político, que outorga a quem o exerce competência para decidir sobre o teor e matéria da regra jurídica em questão. Quanto ao órgão que exerce o controle de constitucionalidade, dependendo do Estado em questão, pode ser realizado por um órgão político,como o ocorrido na história das instituições francesas2 em 1852 e 1946 ou por um órgão jurisdicional, este último objeto de nosso interesse. O controle jurisdicional da constitucionalidade da lei é a entrega do exercício dessa com- petência a um órgão jurisdicional, no entanto, no caso brasileiro, essa determinação emana do próprio texto constitucional, como trataremos em seguida. Nascido nos Estados Unidos,3 o controle jurisdicional de constitucionalidade resulta da reflexão acerca da supremacia da Constituição sobre as leis ordinárias, pois o princípio das Cons- tituições rígidas impõe, necessariamente, a supremacia desta sobre as leis ordinárias. Ademais, os poderes do Legislativo e Executivo são definidos e limitados na Constituição escrita, isso porque nenhum ato legislativo ou executivo que contrarie a Constituição pode ter o condão de modificá-la, ao contrário, é a Constituição que controla todo ato legislativo e executivo. Em poucas palavras: todo ato legislativo ou normativo que contrariar o texto constitucional de organização do Estado deve ser declarado inconstitucional. O constitucionalismo norte-americano construiu esse mecanismo de verificação de cons- titucionalidade das leis infraconstitucionais pelo poder Judiciário, por intermédio de inúmeros precedentes. Foi, no entanto, por meio da decisão do caso Marbury vs. Madison, relatado pelo juiz 1 Disponível em: <http://www.concursospublicos.pro.br/ultima-palavra-da-jurisprudencia/concursos-publicos- jurisprudencia-stf-constitucional-controle-constitucionalidade-lei-estadual-atuacao-agu-vacancia-cargo-governador- escolha-ministro-quinto-porte-municao-tipicidade-regime-tributario>. Acesso em: 14 abr. 2013. 2 “O controle por um órgão político, na história das instituições francesas, conheceu outras tentativas igualmente malsucedidas: a do Senado da Constituição de 14 de janeiro de 1852 e a do Comitê Constitucional da Constituição de 27 de outubro de 1946. O primeiro se transformou praticamente numa segunda Câmara Legislativa, enquanto o segundo se caracterizou por seu desempenho medíocre e obscuro” (Bonavides, 2003, p. 300). 3 [...] A Constituição federal dos Estados Unidos, de 1787, em seu artigo VI, cláusula 2º, dispunha: “Esta Constituição e as leis dos Estados Unidos que se fizerem para aplicá-las serão a lei suprema do país; e os juízes em cada Estado a ela se vincularão (...)”, ou no teor do art. III, Seção 2, §1º, que rezava: “O poder Judiciário se estende a todas as causas, de direito ou de eqüidade, que terão sua fonte nesta Constituição, ou mais nas leis dos Estados Unidos e nos tratados celebrados debaixo de sua autoridade” (Bonavides, 2003, p. 306). EaD 17 noções básicas de direito processUal constitUcional e a proteção dos direitos FUndamentais presidente da Suprema Corte Norte-Americana, John Marshall, em 1803, que a tese da supre- macia da lei constitucional sobre a lei ordinária ganhou força, visibilidade e aceitação. Segundo a análise de John Marshall, é dever do poder Judiciário declarar o Direito e, caso uma lei venha a colidir com a Constituição, ou se ambas se aplicam a uma determinada causa, à Corte compete determinar qual das regras antagônicas se aplica ao litígio. Desde então, estabeleceu-se um “sis- tema americano de controle que consagra a via de exceção, de maneira que todo tribunal federal ou estadual, independente do seu grau hierárquico, poderá exercitar esse controle, sentenciando numa demanda a inconstitucionalidade da lei” (Bonavides, 2003, p. 311). A Europa não seguiu o modelo americano para assegurar a supremacia das normas cons- titucionais. A partir do século 20, com base nas ideias de Kelsen, desenvolveu-se o controle de constitucionalidade em abstrato, exercido por um órgão não pertencente ao poder Judiciário, um Tribunal ou Corte Constitucional que examina a lei em questão com efeitos erga omnes (contra todos). O controle jurisdicional de constitucionalidade das leis, entretanto, aplica duas formas básicas, a saber: o controle por via de exceção (controle concreto) e o controle por via de ação (controle abstrato). O controle por via de exceção,4 é o controle por via incidental, pois aplica-se às inconstitu- cionalidades legislativas quando, no curso de uma demanda judiciária, uma das partes arguiu, em defesa de sua causa, a objeção de inconstitucionalidade da lei que se lhe quer aplicar. É essencial a existência do caso concreto e da provocação de uma das partes para ocorrer a intervenção do Judiciário, cujo julgamento se estende unicamente às partes litigantes. Isto é, a sentença que liquida a controvérsia constitucional não conduz à anulação da lei, mas tão somente a sua não aplicação ao caso particular, objeto da demanda. O efeito da decisão é, somente, inter partes. O sistema de controle por via de ação é o controle in abstracto da norma, e trata-se de um controle direto, na medida em que, por meio de uma ação de inconstitucionalidade prevista formalmente no texto constitucional, impugna-se perante determinado tribunal5 uma lei, que 4 Para Alfredo Buzaid (apud Bonavides, 2003, p. 304), os princípios que regem a declaração de inconstitucionalidade pela via da exceção são: a) o tribunal não se pronunciará sobre a constitucionalidade de uma lei, exceto em litígio regularmente submetido ao seu conhecimento; b) nenhum tribunal se manifestará sobre a validade de uma lei senão quando isso for realmente necessário para a decisão do caso concreto; c) a declaração de inconstitucionalidade da lei importa na sua não aplicação ao caso concreto, não tem o condão de revogá-la, fazê-la sumir do ordenamento jurídico; d) o exame sobre a inconstitucionalidade representa questão prejudicial, não a questão principal da lide, ou seja, não configura como objeto do processo e dispositivo da sentença; e) o tribunal só conhecerá da alegação de inconstitucionalidade quando ela emanar de pessoa, cujos direitos tenham sido ofendidos pela lei. 5 O órgão competente para julgar a ação de inconstitucionalidade da lei poderá ser um tribunal ordinário, como uma corte especial, a exemplo dos chamados tribunais constitucionais, dotados, para este fim, de jurisdição específica (Bonavides, 2003). Nessas condições, questionava-se a devida observância à repartição dos poderes do Estado e o distanciamento deste sistema do cidadão. EaD elenise Felzke schonardie 18 poderá perder sua validade constitucional. Se a lei em questão for declarada inconstitucional, ela será removida da ordem jurídica com a qual se apresenta incompatível, sendo assim anulada erga omnes. Em síntese, pode-se apresentar o seguinte quadro, com relação às formas, órgãos e critérios de controle de constitucionalidade: Formas de controle de constitucionalidade a) Controle preventivo b) Controle repressivo Órgãos de controle a) Político b) Judicial Critérios de controle a) Difuso b) Concentrado Quanto aos meios de controle da constitucionalidade, os efeitos e natureza da decisão, veja o quadro a seguir: Meios de controle a) Por via incidental ou de defesa ou indireto b) Por via principal ou de ação ou direto Efeitos da decisão a) “Inter partes” b) “Erga omnes” Natureza da decisão a) “Ex tunc” b) “Ex nunc” seção 2.1 o sistema brasileiro de controle da constitucionalidade das leis No Brasil, o sistema constitucional preceitua duas formas de controle de constitucionalidade: o controle por via de exceção (indireto), e o controle por via de ação (direto). Esta previsão cons- titucional revela certa evolução, tanto doutrinária quanto institucional do sistema brasileiro. Ao longo da história do constitucionalismo brasileiro, nota-se, por exemplo, que desde a Constituição de 1891 há instrumentos, como a via de exceção, para a defesa e proteção dos direitos individuais. De inspiração liberal, muito próximo ao modelo norte-americano de con- EaD 19 noções básicas de direito processUal constitUcional e a proteção dos direitos FUndamentaistrole da constitucionalidade, desenvolve-se no Brasil, inicialmente, um modelo individualista e liberal, de controle jurisdicional. A via de exceção, enquanto via judiciária de controle da consti- tucionalidade conferiu à Justiça da União e às Justiças dos Estados a competência para recusar aplicabilidade a atos inconstitucionais do Executivo e do Legislativo, sendo a decisão adotada a cada caso particular, por ação adequada e executável entre as partes. A arguição por via de ação, por sua vez, surge no sistema brasileiro com certa lentidão, mas com traços peculiares, com o mais significativo sendo aquele referente à suspensão da lei, que, todavia, não se anula. A Constituição de 1934 foi um verdadeiro marco progressivo do Brasil, na direção do con- trole direto de constitucionalidade. Isso porque o texto constitucional de 1934 introduziu quatro modificações que aperfeiçoaram o nosso sistema de controle da constitucionalidade, a saber: adotou o sistema da maioria absoluta de votos da totalidade dos juízes como requisito • indispensável à declaração, pelos tribunais, da inconstitucionalidade de lei ou ato do poder público; é deferida ao Senado Federal a competência para suspender a execução total ou parcial • de qualquer lei ou ato, deliberação ou regulamento, cuja inconstitucionalidade tenha sido declarada pelo poder Judiciário; a instituição do mandado de segurança para a defesa de direito certo e incontroverso, • ameaçado ou violado por ato manifestamente inconstitucional ou ilegal de qualquer autoridade e a mudança mais significativa para o nosso sistema de controle de constitucionalidade • foi, sem dúvida, a provocação do Procurador-Geral da República para que a Corte Su- prema tomasse conhecimento da lei federal que houvesse decretado a intervenção da União no Estado-membro em caso de inobservância de certos princípios constitucionais, e lhe declarasse a constitucionalidade. A Constituição do Estado-Novo de 1937, porém, significou um verdadeiro retrocesso no sistema de controle da constitucionalidade, na medida em que determinou um reexame pelo Parlamento da decisão dos tribunais, e por dois terços dos votos de cada uma das Câmaras o órgão legislativo poderia invalidar a decisão judiciária, assim tornando eficaz a lei inconstitucional. Não obstante, a Constituição de 1946 retoma os avanços do texto de 1934 e aduz que a intervenção federal, pela violação dos princípios do inciso VII, do artigo 7º, só se decretava após o Supremo haver examinado o ato arguido de inconstitucionalidade. EaD elenise Felzke schonardie 20 Ao longo do período de vigência da Constituição de 1946, a publicação e entrada em vigor de dois textos legais foram de suma importância para a disciplina da constitucionalidade esta- belecida na lei maior. A lei n. 2.271, de 22 de julho de 1954, criou novo instrumento processual, a ação direta de declaração de inconstitucionalidade, que veio a se somar à já existente via incidental ou de exceção. Ocorre que esse novo caminho de verificação da constitucionalidade, via Judiciário, era por demais estreito, abrangendo somente os atos vinculados a hipóteses de intervenção federal. “Escapavam de seu campo de incidência os atos federais em geral e os estaduais que não ofen- diam os princípios do artigo 7º, inciso VII, da Constituição Federal, bem como os atos locais que ofendiam a Constituição estadual, além dos municípios” (J. L. Anhaia Mello apud Bonavides, 2003, p. 330). A Emenda Constitucional n. 16, de novembro de 1965, ampliou o âmbito material do con- trole de constitucionalidade por via da ação, na medida em que deu nova redação à aliena “k” do artigo 101, inciso I, da Constituição de 1946. Dentre as competências originárias do Supremo Tribunal Federal, inclui-se a competência originária para processar e julgar “a representação contra inconstitucionalidade de lei ou ato de natureza normativa, federal ou estadual, encami- nhada pelo Procurador-Geral da República”. Artigo 2º As alíneas c , f , i e k do artigo 101, inciso I, passam a ter a seguinte redação: c) os Ministros de Estado, os juízes dos Tribunais Superiores Federais, dos Tribunais Regionais do Trabalho, dos Tribunais de Justiça dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios, os Ministros do Tribunal de Contas e os Chefes de missão diplomática de caráter permanente, assim nos crimes co- muns como nos de responsabilidade, ressalvado, quanto aos Ministros de Estado, o disposto no final do artigo 92; f) os conflitos de jurisdição entre juízes ou tribunais federais de justiças diversas, entre quaisquer juízes ou tribunais federais e os dos Estados, entre juízes federais subordinados a tribunal diferente, entre juízes ou tribunais de Estados diversos, inclusive os do Distrito Federal e os dos Territórios; i) os mandados de segurança contra ato do Presidente da República, do Senado e da Câmara dos De- putados ou das respectivas Mesas, do próprio Supremo Tribunal Federal, de suas Turmas ou de seu Presidente do Tribunal Federal de Recursos, do Tribunal de Contas e dos Tribunais Federais de última instância (art. 106, art. 109, I, e art. 122, I); k) a representação contra inconstitucionalidade de lei ou ato de natureza normativa, federal ou estadual, encaminhada pelo Procurador-Geral da República (Emenda Constitucional nº 16, de 1965). A Constituição de 1967 e a Emenda Constitucional n. 1 de 1969 conservaram o instituto do controle de constitucionalidade por via de ação, introduzido em nosso sistema pela Emenda Constitucional n. 16 de 1965. EaD 21 noções básicas de direito processUal constitUcional e a proteção dos direitos FUndamentais Observa-se que a verificação da constitucionalidade da lei ou de ato normativo estava ads- trita à atribuição do Procurador-Geral da República, sendo este o único legitimado para o exercício da ação. O que em 1970 acabou por gerar grande controvérsia em razão de uma representação feita pelo Movimento Democrático Brasileiro contra o Procurador-Geral da República, por haver este, por meio de despacho, mandado arquivar uma representação que lhe fora encaminhada por aquela organização partidária que arguia a inconstitucionalidade do Decreto-lei n. 1.077, de 26 de janeiro de 1970, que estabelecera a censura prévia na divulgação de livros e periódicos. Na época, o STF em decisão de 10 de março de 1971, interpretou de forma restrita, adu- zindo competência exclusiva do Procurador-Geral da República à iniciativa da ação direta de inconstitucionalidade. Em outras palavras, segundo o acórdão do STF, naquela época somente o Procurador-Geral da República possuía legitimação ativa para promover a ação direta de in- constitucionalidade em abstrato. Com a Constituição Federal de 1988 muitas inovações foram introduzidas, não apenas no sistema de controle da constitucionalidade, mas na previsão e garantia dos direitos (individuais e coletivos) por meio de normas constitucionais programáticas. Com a nova Constituição, não apenas o Procurador-Geral da República possui legitimi- dade para interpor a Adin, nos termos do artigo 103, mas também acham-se legitimados o pre- sidente da República, a Mesa do Senado Federal, a Mesa da Câmara dos Deputados, a Mesa da Assembleia Legislativa ou Câmara Legislativa do Distrito Federal, o governador do Estado ou do Distrito Federal, o Conselho da Ordem dos Advogados do Brasil, partido político com representação no Congresso Nacional e confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional. Observe: Art. 103. Podem propor a ação direta de inconstitucionalidade e a ação declaratória de constituciona- lidade (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) I – o Presidente da República; II – a Mesa do Senado Federal; III – a Mesa da Câmara dos Deputados; IV – a Mesa de Assembléia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) V – o Governadorde Estado ou do Distrito Federal (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) VI – o Procurador-Geral da República; VII – o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; VIII – partido político com representação no Congresso Nacional; EaD elenise Felzke schonardie 22 IX – confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional. § 1º – O Procurador-Geral da República deverá ser previamente ouvido nas ações de inconstituciona- lidade e em todos os processos de competência do Supremo Tribunal Federal. § 2º – Declarada a inconstitucionalidade por omissão de medida para tornar efetiva norma constitu- cional, será dada ciência ao Poder competente para a adoção das providências necessárias e, em se tratando de órgão administrativo, para fazê-lo em trinta dias. § 3º – Quando o Supremo Tribunal Federal apreciar a inconstitucionalidade, em tese, de norma legal ou ato normativo, citará, previamente, o Advogado-Geral da União, que defenderá o ato ou texto impugnado (Brasil, 2013). Destaca-se, ainda, o fato de o texto constitucional de 1988 ter criado, também, a ação direta de inconstitucionalidade por omissão. A omissão refere-se a não ação do legislador na criação ou demora na criação de medida para tornar efetiva a norma constitucional. Isso porque o silêncio (omissão) do legislador em relação às normas constitucionais programáticas poderia desencadear diversos problemas em relação aos direitos sociais consagrados pelo texto constitucional. No início da seção mencionamos que, atualmente, o sistema brasileiro de controle de cons- titucionalidade abarca duas modalidades: o controle por via de exceção (indireto) e o controle por via de ação (direto). Na seção que segue analisa-se, especificamente, o sistema de controle concentrado de constitucionalidade. seção 2.2 do controle concentrado da constitucionalidade O controle concentrado de constitucionalidade, também denominado de controle em abs- trato ou direto de constitucionalidade, ou via principal ou de ação, é um processo de natureza objetiva, no qual é questionada a constitucionalidade ou não de uma lei. Nesse processo não se admitem discussões de interesses meramente individuais. Tem como principal objetivo ejetar do ordenamento jurídico a lei ou o ato normativo contrários à CF, bem como declarar a omissão inconstitucional. EaD 23 noções básicas de direito processUal constitUcional e a proteção dos direitos FUndamentais Pela via jurisdicional do controle concentrado de constitucionalidade busca-se obter a decla- ração de inconstitucionalidade da lei ou do ato normativo em tese, não dependendo da existência de um caso concreto, tendendo obter a invalidação da lei, a fim de garantir-se a segurança das relações jurídicas, que não podem ser sustentadas por normas que violem a Constituição, ou seja, por normas inconstitucionais. Essa modalidade de controle de constitucionalidade, regulamentada no ordenamento ju- rídico brasileiro por meio da lei n. 9.868/99, apresenta as seguintes características: a ação deve ser proposta diretamente perante o STF;• o objeto da ação é a própria declaração da constitucionalidade ou inconstitucionalidade • do ato legislativo ou normativo; a decisão produz efeito • erga omnes (valendo para todos, produzindo coisa julgada, também, para as pessoas e órgãos que não participaram da ação); quanto à titularidade a ação somente pode ser proposta pelas pessoas mencionadas • no artigo 103 da CF; no caso de declarada a inconstitucionalidade, a lei torna-se imediatamente inaplicável.• Apesar da decisão dessa ação ter efeito erga omnes, vinculante e ex tunc, nos termos do artigo 102, § 2º da CF, todos os atos processuais e decisões definitivas de mérito, antes da decisão do STF acerca da inconstitucionalidade da lei, não serão desfeitos. Isso porque o STF anulará a lei e não os atos individuais e coisas julgadas. Todo indivíduo que se sentir prejudicado, no entanto, poderá propor ação anulatória ou desconstitutiva ou rescisória, conforme o caso. Os efeitos dessa ação encontram-se modulados no artigo 27 da Lei nº 9.868/99. Um detalhe importante é que a competência originária do STF dá-se quando os parâmetros forem as leis federais e as Constituições Estaduais – CE – perante a CF, e quando os parâmetros forem as leis locais perante a CE a competência para a ação será do TJ. No Direito Constitucional brasileiro o Controle Concentrado de Constitucionalidade pode ser realizado por uma das cinco modalidades de ações previstas na CF, as quais são: 1) Ação Direta de Inconstitucionalidade; 2) Ação Declaratória de Constitucionalidade; 3) Ação de Incons- titucionalidade por Omissão; 4) Representação Interventiva e 5) Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental. 1) Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADI ou Adin (genérica): artigo 102, inciso I, alínea “a”, CF, e normatizada pela Lei nº 9.868/99. Artigo 95, inciso XII, alínea “d”, da CE do RGS. Súmulas STF: 360 e 642: Esta modalidade de ação visa à declaração de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual ante a CF. A competência para a ação é originária do STF e o procedimento a ser observado encontra-se previsto na lei n. 9.868/99. A Suprema Corte não torna a norma EaD elenise Felzke schonardie 24 inconstitucional, apenas declara uma inconstitucionalidade que já existia. Essa decisão, sobre invalidade da lei ou ato normativo, é sempre desconstitutiva. Isso porque a incompatibilidade com a Constituição é o defeito, e o juízo de inconstitucionalidade, a sanção. E nessa modalidade de controle de constitucionalidade decreta-se a nulidade da lei ou do ato normativo. No caso de controle de constitucionalidade de leis municipais, por meio da arguição de inconstitucionalidade, em sede de Adi ou Adin, diante da CE, a competência originária será do Tribunal de Justiça de cada Estado, não cabendo exame de inconstitucionalidade de Lei Muni- cipal, por meio da Adin, diante da Constituição Federal. Em síntese pode-se apontar como características da lei e ato normativo para Adi ou Adin: abstração, generalidade e impessoalidade. Quatro 1 – Sinopse da legitimidade para a propositura da Adin – artigo 103 do CF. Legitimados (Podem impugnar qualquer matéria, independentemente de comprovação de interesse) – Presidente da República – Procurador Geral da República – Mesa do Senado Federal e da Câmara – Conselho Federal da OAB – Partido político com representação no Congresso Nacional Legitimados Especiais (somente podem impugnar matéria em relação a qual comprovem interesse) – Governador do Estado e do Distrito Federal – Mesa da Assembleia Legislativa ou da Câmara Legislativa do DF – Confederação Sindical ou entidade de classe de âmbito nacional Fonte: Elaboração da autora. Observações gerais: a) A EC nº 45, de 31/12/2004 – deu nova redação ao artigo 102, §2º da CF, determinando efeito vinculante para as decisões definitivas de mérito, proferidas pelo STF, também em sede de Adin, alterando, assim, a interpretação dada pelo STF ao parágrafo único do artigo 28 da Lei 9.868/99. b) O Procurador-Geral da República, nos termos do artigo 103, § 1º, da CF, deverá ser previamente ouvido em todas as ações de inconstitucionalidade e em todos os processos de competência do STF, tendo assim um papel muito relevante na via concentrada, pois, além de poder propor tais ações, deve sua opinião ser ouvida antes da tomada de decisão pelo Supremo. EaD 25 noções básicas de direito processUal constitUcional e a proteção dos direitos FUndamentais c) Alguns processualistas constitucionais referem que a “ação direta interventiva” é uma moda- lidade especial de ação concentrada e, possui dupla finalidade, na medida em que pretende a declaração de inconstitucionalidade formal ou material da lei ou ato normativo estadual (fi- nalidade jurídica) e a decretação de intervenção federal no Estado-membro ou DF (finalidadepolítica), constituindo-se, pois, um controle direto, para fins concretos [...] – nas hipóteses do artigo 34, V e VII da CF. d)Se o STF ao julgar a ação, efetivamente, declara a norma parcialmente inconstitucional, as- severando a inconstitucionalidade em determinadas hipóteses de aplicação, consegue-se a manutenção da norma no ordenamento jurídico. e) A Adin é uma ação constitutiva negativa, pois seu intento é extinguir (desconstituir, aplicar a sanção da invalidade) situação jurídica existente de validade (presumida) do ato normativo (Barroso, 2004). 2) Ação Declaratória de Constitucionalidade – ADC ou Adecon: artigo 102, inciso I, alínea “a”, segunda parte, da CF e normatizada pela Lei 9.868/99: A ação declaratória de constitucionalidade foi introduzida pela EC nº 3 de 1993, a qual tem por objetivo a declaração de constitucionalidade de uma lei ou ato normativo federal. A finalidade dessa ação era dar ao governo a oportunidade de obter uma rápida decisão judicial definitiva do STF, que produzisse efeitos erga omnes, no intuito de evitar decisões contrárias em instâncias inferiores e o não cumprimento da medida legislativa adotada. O interessado (legitimado) apenas comparece perante o STF para solicitar que este declare a constituciona- lidade da lei. Somente poderá ser objeto de ADC a lei ou ato normativo federal. Não cabe essa moda- lidade de ação para a declaração de constitucionalidade de lei ou ato normativo estadual em virtude de falta de previsão legal. Os pressupostos para seu ajuizamento são, por ocasião da petição inicial, a demonstração de existência de séria divergência jurisprudencial que coloque em risco a presunção de constitucionalidade do ato normativo sob exame, a fim de permitir ao STF o conhecimento das alegações em favor e contra a constitucionalidade, bem como o modo pelo qual estão sendo decididas as causas que envolvem a matéria. Quanto à legitimidade para a propositura da ADC, observa-se o disposto no artigo 103 da CF. O artigo 13 da lei n. 9.868/99, contudo, que regulamenta o dispositivo constitucional, restringe o rol do artigo 103, na medida em que determina que podem propor a ação declarató- ria de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal: I – o Presidente da República; II – a Mesa da Câmara dos Deputados; III – a Mesa do Senado Federal e IV – o Procurador-Geral da República. EaD elenise Felzke schonardie 26 Observações gerais: a) Por ocasião da propositura da ação a comprovação da controvérsia exige prova de divergência judicial, e não somente de entendimentos doutrinários diversos (ADC 8-MC, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 13-10-99, DJ de 4-4-03). b) Em sede de ADC, o provimento cautelar deferido pelo STF, produz efeitos erga omnes e re- veste de efeito vinculante em relação ao poder Executivo, nos termos do § 2º, do artigo 102, da CF. c) O procedimento a ser observado por ocasião da propositura e julgamento da ação encontra-se disciplinado nos artigos 13 a 21 da lei n. 9.868/99. d) Como a própria denominação indica, trata-se de uma ação meramente declaratória, visto que tem por objetivo, simplesmente, a certificação da existência de situação jurídica de legitimidade (presumida) do ato normativo. 3) Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão – AdinO: artigo 103, §2º, da CF, regula- mentada pela lei n. 9.868/99, com as alterações introduzidas pela lei n. 12.063/09 que criou o Capítulo II-A. Nos termos do artigo 103, § 2º, da CF, “declarada a inconstitucionalidade por omissão de medida para tornar efetiva norma constitucional, será dado ciência ao poder competente para a adoção das providências necessárias e, em se tratando de órgão administrativo, para fazê-lo em trinta dias”. O objeto da ação é suprir a omissão dos poderes constituídos, que deixaram de elaborar a norma reguladora que possibilita o exercício de um direito previsto na CF. Ou seja, essa ação é supridora de omissão quando a responsabilidade pela edição da norma faltante prevista ou pela adoção das necessárias providências for, respectivamente, do legislador ou do administrador. Seu papel é debelar a omissão por parte dos poderes competentes que atentem contra a CF. A omissão pode ser total, quando há falta da norma regulamentadora que possibilite o exercício do direito, ou parcial, quando não permitir o integral cumprimento do direito previsto na CF. Quando ao objeto da ação, pode-se afirmar que o mesmo é o vício omissivo. Na decisão judicial, no caso de inconstitucionalidade por omissão, o STF dará ciência ao poder competente para que sejam tomadas as medidas necessárias à cessação da omissão. Tratando-se de omissão administrativa, o órgão competente será cientificado para providenciar a norma regulamentadora faltante no prazo de 30 dias. EaD 27 noções básicas de direito processUal constitUcional e a proteção dos direitos FUndamentais Nos casos de omissão legislativa, o Congresso Nacional será comunicado da mora, sem, contudo, a estipulação de qualquer prazo para a elaboração da norma infraconstitucional, indis- pensável para o exercício do direito previsto na CF, porém não autoaplicável. Quando se tratar de omissão meramente administrativa, a decisão proferida na ação de inconstitucionalidade por omissão só possui caráter mandamental. Nesta hipótese o órgão res- ponsável deverá providenciar a edição da norma faltante, no prazo máximo de 30 dias, sob pena de incidência na prática do crime de desobediência, previsto no artigo 330 do CP. Tratando-se, entretanto, de inércia total ou de atuação normativa deficiente de qualquer um dos poderes constituídos, Executivo, Legislativo ou Judiciário, o STF não pode se substituir ao órgão estatal lento, providenciando, por si só, a edição do provimento normativo que falta. Nesta hipótese, a decisão da Suprema Corte tem caráter de mera admoestação, isto é, de comunicação do não cumprimento do preceito constitucional. Quanto à legitimidade para a propositura da Adin por Omissão, observa-se, também, o disposto no artigo 103, da CF, regulamentada pelo artigo 12-A da lei n. 9.868/99. Observações gerais: a) Fixação de parâmetro temporal razoável para cumprimento do disposto no artigo 18, § 4º, da CF (ADI 3.682, julgada em 9-5-2007, na qual o STF declarou a omissão legislativa no cumprimento do disposto do artigo 18, § 4º, da CF e, estabeleceu o prazo de 18 meses para a elaboração da lei faltante, acolhendo o voto do ministro Gilmar Mendes). b Quanto à legitimação para a propositura da ação, ressalte-se que a afirmação segundo a qual os órgãos e entes legitimados para propor a ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, nos termos do artigo 103, caput, da CF, estariam igualmente legitimados a propor a ação direta de inconstitucionalidade por omissão, prepara algumas dificuldades. Deve- se notar que, naquele elenco, dispõem de direito de iniciativa legislativa, no plano federal, tanto o presidente da República como os integrantes da Mesa do Senado Federal e da Mesa da Câmara dos Deputados (CF, artigo 61). Assim, salvo nos casos de iniciativa privativa de órgãos de outros poderes, como é o caso do Supremo Tribunal Federal em relação ao Estatuto da Magistratura (artigo 93, caput, CF/88), esses órgãos constitucionais não poderiam propor ação de inconstitucionalidade, porque, como responsáveis ou corresponsáveis pelo eventual estado de inconstitucionalidade, seriam eles os destinatários primeiros da ordem judicial de fazer, em caso de procedência da ação; todavia, “diante da indefinição existente, será inevitável, com base no mesmo princípio de hermenêutica que recomenda a adoção da interpretação que assegure maior eficácia possível à norma constitucional, que os entes ou órgãos legitimados a propor a ação direta contra ato normativo – desde que sejam contempladas as peculiaridades e restrições mencionadas – possam instaurar o controle abstrato da omissão.Não há como EaD elenise Felzke schonardie 28 deixar de reconhecer, portanto, a legitimidade ativa da Assembléia Legislativa do Estado de Mato Grosso para propor a presente ação direta de inconstitucionalidade por omissão” (ADI 3.682, voto do ministro Gilmar Mendes, julgamento em 9-5-07, DJ de 6-9-07). c) Segundo a jurisprudência do STF, não é possível a conversão da ação direta de inconstitucio- nalidade, por violação positiva da Constituição, em ação de inconstitucionalidade por omissão (violação negativa da Constituição). A jurisprudência da Suprema Corte, fundada nas múltiplas distinções que se registram entre o controle abstrato por ação e a fiscalização concentrada por omissão, firmou-se no sentido de não considerar admissível a possibilidade de conversão da ação direta de inconstitucionalidade, por violação positiva da Constituição, em ação de inconstitucionalidade por omissão, decorrente da violação negativa do texto constitucional (ADI 1.439-MC, Rel. ministro Celso de Mello, julgamento em 22-5-96, DJ de 30-5-03). 4) Ação de Representação Interventiva – ADI Interventiva: artigos 129, inciso IV; 34 e 36, inciso III, da CF A ADI Interventiva tem por objetivo o restabelecimento da ordem constitucional no Estado ou no município. Existem duas modalidades de ADI Interventiva: a federal e a estadual. Nos termos dos artigos 34, 36, inciso III, e 129 da CF, a ação interventiva federal busca promover a intervenção da União nos Estados, enquanto que a estadual, a intervenção dos Estados nos municípios. Dessa forma, a intervenção federal é competência originária do STF e a estadual, dos Tribunais de Justiça. Há que se levar em consideração que a finalidade dessa ação é política. E que a interven- ção da União nos Estados e destes nos municípios é medida excepcional, como o próprio caput do artigo 34 da CF expressamente refere. REPRESENTAÇÃO No caso de ofensa aos PGR → STF INTERVENTIVA princípios sensíveis (ADIn interventiva) No caso de descumprimento PGR → STF de lei federal (Ação de executoriedade de lei federal) No âmbito estadual, para o fim → PGJ → TJ Intervenção em município EaD 29 noções básicas de direito processUal constitUcional e a proteção dos direitos FUndamentais Observações gerais a) As representações devem ser promovidas pelo PGR, nos casos de intervenção federal e, pelo PGJ, nos casos de intervenção estadual. b) Segundo jurisprudência do STF: “O instituto da intervenção federal, consagrado por todas as Constituições republicanas, representa um elemento fundamental na própria formulação da doutrina do federalismo, que dele não pode prescindir – inobstante a excepcionalidade de sua aplicação –, para efeito de preservação da intangibilidade do vínculo federativo, da unidade do Estado Federal e da integridade territorial das unidades federadas. A inva- são territorial de um Estado por outro constitui um dos pressupostos de admissibilidade da intervenção federal. O presidente da República, nesse particular contexto, ao lançar mão da extraordinária prerrogativa que lhe defere a ordem constitucional, age mediante estrita avaliação discricionária da situação que se lhe apresenta, que se submete ao seu exclusivo juízo político, e que se revela, por isso mesmo, insuscetível de subordinação à vontade do poder Judiciário, ou de qualquer outra instituição estatal. Inexistindo, desse modo, direito do Estado impetrante à decretação, pelo chefe do poder Executivo da União, de intervenção federal, não se pode inferir, da abstenção presidencial quanto à concreti- zação dessa medida, qualquer situação de lesão jurídica passível de correção pela via do mandado de segurança” (MS 21.041, Rel. ministro Celso de Mello, julgamento em 12-6- 91, DJ de 13-3-92). c) RI federal no caso de impossibilidade do Estado-membro assegurar direito fundamental: “Re- presentação do Procurador-Geral da República pleiteando intervenção federal no Estado de Mato Grosso, para assegurar a observância dos ‘direitos da pessoa humana’, em face de fato criminoso praticado com extrema crueldade a indicar a inexistência de ‘condição mínima’, no Estado, ‘para assegurar o respeito ao primordial direito da pessoa humana, que é o direito à vida’. (...) Representação que merece conhecida, por seu fundamento: alegação de inobservância pelo Estado-membro do princípio constitucional sensível previsto no art. 34, VII, alínea b, da Constituição de 1988, quanto aos ‘direitos da pessoa humana’. (...) Hipótese em que estão em causa ‘direitos da pessoa humana’, em sua compreensão mais ampla, revelando-se impotentes as autoridades policiais locais para manter a segurança de três presos que acabaram subtraídos de sua proteção, por populares revoltados pelo crime que lhes era imputado, sendo mortos com requintes de crueldade. Intervenção federal e restrição à autonomia do Estado-membro. Princípio federativo. Excepcionalidade da medida interventiva. Autonomia do Estado-membro na organização dos serviços de Justiça e segurança, de sua competência (Constituição, artigos 25, § 1º; 125 e 144, § 4º)” (IF 114, Rel. ministro Néri da Silveira, julgamento em 13-3-91, DJ de 27-9-96). EaD elenise Felzke schonardie 30 5) Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental – ADPF: (Artigo 102, §1º, CF e normatizada pela Lei 9.882/99 Esse instituto jurídico foi introduzido no ordenamento jurídico brasileiro pela CF de 1988. Originalmente essa ação constitucional tinha sua previsão no parágrafo único do artigo 102 da CF, mas, em razão da EC 3/93, que eliminou o parágrafo único do referido artigo e introduziu dois novos parágrafos ao mesmo, sua previsão legal passou a constar no § 1º, com a seguinte redação: “A arguição de descumprimento de preceito fundamental, decorrente desta Constituição, será apreciada pelo Supremo Tribunal Federal, na forma da lei”. Essa ação tem caráter subsidiário, na medida em que somente será admitida quando não houver outro meio eficaz de sanar a lesividade, conforme previsão do § 1º, do artigo 4º da lei n. 9.868/99. Em regra, a ADPF será proposta quando não for cabível a ADI, ADC, AP, AR, RO, RI ou qualquer outra medida judicial capaz de sanar, eficazmente, a situação de lesividade, con- forme jurisprudência do STF. Essa ação pode ser proposta para fins de a) evitar ou reparar lesão a preceito fundamental decorrente de ato ou omissão do poder público; b) quando for relevante o fundamento da controvérsia constitucional acerca de lei ou ato normativo federal, estadual ou municipal, inclusive aos anteriores à CF de 1988. Há uma grande discussão sobre o que sejam os preceitos fundamentais, em que parte respeitável da doutrina entende, em apertada síntese, que se manifestam nos princípios funda- mentais da CF (Artigos 1º ao 4º), os princípios constitucionais sensíveis (artigo 34, VII), os que compõem as cláusulas pétreas (artigo 60, §4º), e outros de mesma natureza, cuja violação possa comprometer a ordem e o sistema constitucional. Observações gerais a) A legitimidade ativa para a ação é a do rol do artigo 103 da CF. b) A decisão proferida em sede de ADPF possui eficácia erga omnes e efeito vinculante em re- lação ao poder público. c) Recentemente foi objeto de ADPF a lei federal que institui o sistema de cotas raciais para as universidades públicas federais – ADPF nº 186/DF. d) Outra questão, muitas vezes controversa, é a definição do que compreende os chamados preceitos fundamentais. Nesse sentido é a jurisprudência do STF: “Argüição de Descum- primento de Preceito Fundamental – ADPF. Medida Cautelar. Ato regulamentar. Autarquia estadual. Instituto de Desenvolvimento Econômico-Social do Pará-Idesp. Remuneração de pessoal. Vinculação do quadro de salários ao salário mínimo. Norma não recepcionada pela Constituição de 1988. Afronta ao princípio federativo e ao direito social fundamental ao salário EaD 31 noções básicas de direito processUal constitUcional e a proteçãodos direitos FUndamentais mínimo digno (artigos 7º, inciso IV, 1º e 18 da Constituição). Medida liminar para impedir o comprometimento da ordem jurídica e das finanças do Estado. Preceito fundamental: pa- râmetro de controle a indicar os preceitos fundamentais passíveis de lesão que justifiquem o processo e o julgamento da argüição de descumprimento. Direitos e garantias individuais, cláusulas pétreas, princípios sensíveis: sua interpretação, vinculação com outros princípios e garantia de eternidade. Densidade normativa ou significado específico dos princípios funda- mentais. Direito pré-constitucional. Cláusulas de recepção da Constituição. Derrogação do direito pré-constitucional em virtude de colisão entre este e a Constituição superveniente. Direito comparado: desenvolvimento da jurisdição constitucional e tratamento diferenciado em cada sistema jurídico. A Lei n. 9.882, de 1999, e a extensão do controle direto de normas ao direito pré-constitucional. Cláusula da subsidiariedade ou do exaurimento das instâncias. Inexistência de outro meio eficaz para sanar lesão a preceito fundamental de forma ampla, geral e imediata. Caráter objetivo do instituto a revelar como meio eficaz aquele apto a sol- ver a controvérsia constitucional relevante. Compreensão do princípio no contexto da ordem constitucional global. Atenuação do significado literal do princípio da subsidiariedade quando o prosseguimento de ações nas vias ordinárias não se mostra apto para afastar a lesão a pre- ceito fundamental.” (ADPF 33-MC, Rel. ministro Gilmar Mendes, julgamento em 29-10-03, DJ de 6-8-04). e) É difícil indicar, a priori, os preceitos fundamentais da Constituição passíveis de lesão tão grave que justifique o processo e julgamento da arguição de descumprimento. Não resta dúvida, no entanto, de que alguns desses preceitos estão enunciados, de forma explícita, no texto constitucional, como no caso dos direitos e garantias individuais (artigo 5º, dentre outros). Da mesma forma, não se poderá deixar de atribuir essa qualificação aos demais princípios protegidos pela cláusula pétrea do artigo 60, §4º, da CF. f) O STF tem entendido, em sede de jurisprudência: “Argüição de descumprimento de preceito fundamental: distinção da ação direta de inconstitucionalidade e da ação declaratória de constitucionalidade. O objeto da argüição de descumprimento de preceito fundamental há de ser ‘ato do Poder Público’ federal, estadual, distrital ou municipal, normativo ou não, sendo, também, cabível a medida judicial ‘quando for relevante o fundamento da contro- vérsia sobre lei ou ato normativo federal, estadual ou municipal, incluídos os anteriores à Constituição’” (ADPF 1-QO, Rel. ministro Néri da Silveira, julgamento em 3-2-00, DJ de 7-11-03). EaD elenise Felzke schonardie 32 seção 2.3 da intervenção do amicus curiae Amicus Curiae é expressão latina que tem por significado literal “amigo da corte”. Repre- senta aquele que pode prestar informações à corte quando algum de seus juízes tem dúvidas ou comete equívocos em questões legais. A intervenção do amicus curiae é garantia nas ações de controle concentrado de constitu- cionalidade, por meio do § 2º, do artigo 7º, da Lei n. 9.868/99: [...] § 2º O relator, considerando a relevância da matéria e a representatividade dos postulantes, poderá, por despacho irrecorrível, admitir, observado o prazo fixado no parágrafo anterior, a manifestação de outros órgãos ou entidades. [...] (Brasil, 2013). Essa intervenção tem por objetivo pluralizar o debate constitucional, permitindo que o STF venha dispor de todos os elementos informativos necessários e possíveis à resolução da contro- vérsia, buscando superar a grave questão pertinente à legitimidade democrática das decisões emanadas da Suprema Corte por ocasião do exercício de seu poder do controle concentrado de constitucionalidade. Segundo o STF, mediante a participação do amicus curiae, o tribunal conta com os bene- fícios decorrentes dos subsídios técnicos, elementos de repercussão econômica que possam ser apresentados e implicações político-jurídicas, dando caráter pluralista e aberto, fundamental para o reconhecimento de direitos e a realização de garantias constitucionais, extremamente importantes ao Estado Democrático de Direito. Em outras palavras, o amicus curiae promove democrática abertura ao rol de intérpretes da Constituição nos processos de controle de consti- tucionalidade. A presença dessa figura nas ações de controle de constitucionalidade, encontra-se condicio- nada à discricionária vontade do relator e sua vontade é irrecorrível, no entanto faz-se necessário haver a relevância da matéria e a representatividade dos postulantes a amicus curiae. Quanto às formas de manifestação do amicus curiae, inicialmente, era admitida apenas de forma escrita, sendo-lhe vedada a sustentação oral. Por ocasião do julgamento da Adin 2.675/PE e da Adin 2.777/SP, no entanto, o STF passou a admitir a manifestação oral do amicus curiae. Essa permissão ensejou a Emenda Regimental nº 15/2004, que modificou o RISTF e a possibilidade de manifestação oral do amicus curiae encontra-se expressa no § 3º do artigo 131 do RISTF. EaD 33 noções básicas de direito processUal constitUcional e a proteção dos direitos FUndamentais Quadro 2 – Sinopse das ações concentradas de constitucionalidade AÇÃO ADI 102,I , “a”; Lei 9868/99 ADC 102, I, “a”; Lei 9868/99 ADI por Omissão 103, §2º ADI INTERVEN- TIVA 34, VII e 36, III ADPF 102, §1º Lei 9882/99 Objeto da ação É a declaração de inconstitu- cionalidade da lei ou ato nor- mativo federal ou estadual. É a declaração de constitucionali- dade da lei ou ato normativo federal. É a declaração de inconstitucionali- dade omissiva do poder público (le- gislador ou adminis- trador). É a declaração de inconstitucionali- dade de lei ou ato normativo contrá- rio aos princípios sensíveis e conse- quente intervenção federal. É a declaração do descumprimento de preceito fundamental. Pedido Inconstituciona- lida-de. Constitucionali- dade Há que se ter comprovada a controvérsia judicial. Inconstitucionalida- de Omissiva (vício omissivo). Inconstitucionali- dade de lei ou ato normativo estadual. Constitucionalidade ou Inconstitucionalida- de: Ofensa a preceito fundamental, que nos termos legais se exte- rioriza por evitar ou re- parar lesão a preceito fundamental, resul- tante do ato do poder público e quando for relevante o funda- mento da controvérsia constitucional sobre lei ou ato normativo federal, estadual ou municipal, incluídos os anteriores à CF/88. Finali- dade Expelir do siste- ma jurídico lei ou ato inconsti- tucional Afastar a inse- gurança jurídica ou estado de incerteza sobre a validade da lei. Transforma pre- sunção relativa da constitucionalida- de em presunção absoluta. Objetivo: trans- ferir ao STF a decisão sobre a constitucionalida- de de um dispo- sitivo legal que esteja ensejando o controle difuso. Garantir a plena eficácia da norma constitucional. Reprimir a omissão por parte dos pode- res competentes que atentem contra a CF. Declara a omissão, o STF dará ciência ao órgão competente para tomar as medi- das necessárias para cessar a omissão. Se for a AP, esta deverá supri-la em 30 dias. Jurídica: declara- ção de inconstitu- cionalidade; Política: Interven- ção federal. Defesa da integridade e preservação da CF, no que se refere aos preceitos fundamen- tais. Exigên- cia de compro- vação de contro- vérsia NÃO SIM NÃO NÃO SIM para ADPF ajui- zada com base no arti- go 1º, parágrafo único, I, da Lei 9.882/99 (ADPF incidental) NÃO para ADPF ajuizada com base no caput do artigo 1º da Lei 9.882/99 (arguição autônoma) Fonte: Baseado em Paulo; Alexandrino, 2007. EaD elenise Felzke schonardie 34 SínteSe da Unidade 2 Nesta Unidade estudamos o sistema brasileiro de controle de constitu- cionalidade das leis. Nosistema de controle concentrado analisamos as modalidades de ações: ADIN; ADC; Adino; ADI Interventiva e ADPF; bem como a possibilidade de intervenção da figura do amicus curiae, introduzido pela CF de 1988 nas ações de controle de consti- tucionalidade. EaD 35 noções básicas de direito processUal constitUcional e a proteção dos direitos FUndamentais a proteção constitUcional dos direitos FUndamentais do Homem objetivo desta Unidade Compreender as características e historicidade dos direitos fundamentais e sua distinção em relação às garantias fundamentais. a seção desta Unidade Seção 3.1 – Dos Direitos e Garantias Fundamentais seção 3.1 dos direitos e garantias Fundamentais Os direitos fundamentais do homem são considerados indispensáveis à pessoa humana, na medida em que são necessários para assegurar a todos os indivíduos (sejam eles homens ou mulheres, crianças ou idosos, portadores de necessidades especiais ou não, etc.) uma existên- cia digna, em que a liberdade e a igualdade entre os indivíduos devem ser respeitadas. Esses direitos, ditos fundamentais, também são reconhecidos como garantias e informam a ideologia política de cada ordenamento jurídico. 1 No patamar do Direito Positivo, os direitos e garantias fun- damentais do homem tratam de situações jurídicas sem as quais a pessoa humana não se realiza, nem mesmo sobrevive, e esses direitos não devem ser reconhecidos apenas em âmbito formal, faz-se necessário concretizá-los, incorporá-los, no dia a dia dos cidadãos. 1 Disponível em: <http://lucileyma.blogspot.com.br/2011/04/direitos-fundamentais-assedio-moral-no.html>. Acesso em: 14 abr. 2013. Unidade 3 EaD elenise Felzke schonardie 36 Podem ser entendidos como uma limitação imposta pela soberania popular aos poderes constituídos do Estado que dela dependem. A República Federativa do Brasil constitui-se em um Estado Democrático de Direito e possui dentre os seus fundamentos, nos termos do artigo 1º e incisos da CF, a cidadania e a dignidade da pessoa humana. Isso significa que o princípio do Estado Democrático de Direito e os direitos fundamentais encontram-se na CF e estes são elementos básicos para a realização daquele. A Constituição confere uma unidade de sentido, de valor e de concordância prática ao sistema dos direitos fundamentais. E ela repousa na dignidade da pessoa humana, ou seja, na concepção que faz a pessoa fundamento e fim da sociedade e do Estado (Miranda apud Piovesan, 2000, p. 53). A CF de 1988 dedica o seu Título II aos direitos e garantias fundamentais. Este título é dividido em cinco capítulos: I – Dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos; II – Dos Direitos Sociais; III – Da Nacionalidade; IV – Dos Direitos Políticos e V – Dos Partidos Políticos. Dessa forma nossa Constituição, sob a denominação de “direitos e garantias fundamentais”, abrange os direitos individuais, os coletivos, os sociais, os nacionais e os políticos. Há que se observar ainda que a CF está vinculada à Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, à Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 e ratificada pelo Brasil em 1948 e também à Convenção Americana de Direitos do Homem de 1969 e ratificada pelo Brasil apenas em 1992, por exemplo. Embora a ideia de que os seres humanos tenham direitos e liberdades fundamentais, que lhes são inerentes, e há muito tempo tenha surgido o pensamento humano, a concepção de que os direitos constituem objeto próprio de regulação internacional, por sua vez, é bastante recente. Isto porque, muitos dos direitos que hoje constam do Direito Internacional dos Direitos Humanos, emergiram apenas em 1945 [...] (Piovesan 2000, p. 32). Outro aspecto que merece destaque é o de que a CF de 1988 trouxe inúmeras inovações, dentre as quais destacam-se: a) impôs deveres ao lado de direitos individuais e coletivos; b) foi a primeira Carta Maior a fixar os direitos fundamentais antes da organização do próprio Estado, e c) tutelou novas formas de interesses, denominados coletivos e difusos. Quanto aos direitos fundamentais pode-se afirmar que possuem como principais caracte- rísticas: 1) a historicidade; 2) a inalienabilidade; 3) a imprescritibilidade; 4) a irrenunciabilidade; 5) a universalidade e 6) a limitabilidade. Os direitos fundamentais, apesar de sua importância para o Estado Democrático de Direito, não são absolutos. A própria inevitabilidade de assegurar aos outros o exercício desses direitos revela a sua limitação. EaD 37 noções básicas de direito processUal constitUcional e a proteção dos direitos FUndamentais A Constituição, ao referir-se no seu Título II “Dos Direitos e Garantias Fundamentais”, mostra que há distinção entre esses. Por direitos entende-se aquelas normas de cunho material, substancial e consistem nas disposições declaratórias que imprimem existência legal aos direi- tos reconhecidos. As garantias, por seu turno, consistem naquelas disposições instrumentais, processuais, que servem para defender os direitos. Analisando de forma alinhada, pode-se di- zer que os direitos seriam as normas principais em relação às garantias, que seriam as normas acessórias. Nesse sentido, [...] os direitos fundamentais propriamente ditos referem-se diretamente aos indivíduos, integrando sua esfera jurídica, fazendo parte de seu patrimônio jurídico. A razão de ser de um direito reside no indivíduo. O direito é declarado, em atenção à pessoa. As garantias, diferentemente, reportam-se aos direitos; só indiretamente elas concernem à esfera jurídica do indivíduo, exatamente na medida em que atuam como instrumentos assecuratórios de seus direitos (grifos dos autores). Em nosso or- denamento constitucional temos tanto remédios judiciais, que são maioria (habeas corpus, mandado de segurança, habeas data, mandado de injunção, ação popular), quanto remédios administrativos (direito de petição e direito de certidão). Alguns remédios são de índole individual (como o mandado de segurança individual) e outros são de índole coletiva (como o mandado de segurança coletivo e a ação popular) (Paulo; Alexandrino, 2005, p. 4). Ao que se refere à natureza desses direitos, são situações jurídicas, objetivas e subjeti- vas, definidas no Direito Positivo, a favor da dignidade, da igualdade e da liberdade da pessoa humana. Quanto à eficácia e aplicabilidade das normas constitucionais que contêm os direitos fundamentais, dependem de seu enunciado, pois trata-se de tema que está em função do Direito Positivo. A CF de 1988, no entanto, é expressa quanto àquelas (eficácia e aplicabilidade), quando estatui que as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata (§ 1º, do artigo 5º). Algumas normas constitucionais fundamentais têm aplicação plena, de forma que devem ser executadas de plano. Outras, porém, têm eficácia contida ou limitada, de forma que vão de- pender da criação da legislação infraconstitucional. Enquanto não surgir essa norma, o dispositivo constitucional não será autoaplicável. Quanto ao rol dos direitos individuais básicos do cidadão, expresso no artigo 5º da CF, este não é taxativo, pois existem outras normas previstas na própria Constituição, contendo direitos e garantias, como é o caso do caput do artigo 225 e artigo 150 da CF (o direito de viver em um meio ecologicamente equilibrado e as garantias de ordem tributária, respectivamente). EaD elenise Felzke schonardie 38 Expressamente previstos no caput do artigo 5º da CF, são cinco os direitos individuais básicos do cidadão: o direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e a propriedade. Os demais direitos fundamentais reconhecidos ao longo dos incisos do referido artigo 5º são decor- rências desses direitos básicos. síntese da Unidade 3 Nesta Unidade estudamos sucintamente os direitos e garantias fun- damentais previstos na CF em vigor e a distinção doutrinária entre direitos e garantias, bem como a
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