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Estácio FAL Curso de Direito Fundamentos antropológicos e sociológicos Trabalho para AV1 04 de maio de 2020 Professora : Séfora Junqueira dos Santos Aluna : Anna Luísa Acioli de Melo Lima - 201908208881 Etnocentrismo A obra “O que é etnocentrismo” nos proporciona uma fácil e agradável leitura quanto as questões que envolvem a antropologia, com uma grande ênfase ao conceito do etnocentrismo, de modo a permitir uma análise das principais formas pela qual nós percebemos as diferenças e a forma como também a Antropologia pensou a diferença ao longo de seus estudos e reflexões. O autor dessa importante obra, Everardo P. Guimarães Rocha, carioca nascido em 1951, mestre em Antropologia Social pelo Programa de Pós- Graduação em Antropologia Social do Museu Nacional da UFRJ (1981), apresenta sua forte intenção de nos guiar a uma verdadeira “viagem” por meio de sua obra O que é o etnocentrismo visando nos propiciar um conhecimento a respeito do real caráter desta visão de mundo, de que forma e com qual intensidade esta permeou a construção do saber antropológico na passagem dos séculos, a importância de se procurar alcançar a chamada relativização de modo a amenizar ou mesmo desconstruir muitas das visões etnocêntricas que haviam sido estruturadas nessa “viagem” onde o “outro” foi apresentado. A obra encontra-se estruturada em cinco capítulos: Pensando em partir, Primeiros movimentos, O passaporte, Voando alto e A volta por cima; onde o autor por meio de um discurso direto, equiparado de elementos embasados na história do percurso da ciência antropológica bem como evidenciando os panoramas teóricos de grandes autores como Franz Boas, Radcliffe- Brown, Émile Durkheim, Malinowski, Lévi- Strauss e outros que contribuíram em todo esse processo “construtivo” procura então atingir o ideal de sua “viagem” e estabelecer bases para uma maior entendimento desse processo árduo do etnocentrismo até a ideia de relativização por meio do qual a antropologia foi se desenvolvendo. O autor inicia a obra com um primeiro capítulo intitulado “Pensando em partir” onde procura evidenciar de forma clara qual o caráter do chamado etnocentrismo que, segundo ele, baseia-se na “visão de mundo onde o nosso próprio grupo é tomado como o centro de tudo e todos os outros são pensados e sentidos através dos nossos valores, nossos modelos, nossas definições do que é a existência”.(p.5). De acordo com o autor, tal visão estaria formada tanto no plano intelectual quanto afetivo, arraigando-se não só na história das sociedades mas também marcando o dia-a-dia de nossas vidas. Para o autor o etnocentrismo tem como pano de fundo o choque cultural, em outras palavras quando o grupo do chamado “eu” (aquele que compartilha muitas vezes da mesma maneira, atribuindo significados comuns e agindo de forma semelhante) se depara com um outro grupo do “outro” do “diferente” (que age de uma maneira totalmente diferente da minha, mas ainda é preciso entender que este grupo existe e vive a sua maneira) ocorre então um choque que gera o etnocentrismo, a partir do momento que constata-se as diferenças e estas de certa forma se colocam ameaçadoras uma vez que ferem nossa própria identidade. Neste capítulo inicial Everardo nos coloca a característica da atitude etnocêntrica de se pensar este “outro”- o diferente- como aquele atrasado, ao qual pautando-se pela minha visão de mundo é acrescentado o caráter de selvagem, bárbaro enquanto que o grupo formado pelo “eu” está inserido no mundo do saber, do trabalho e do progresso que este diferente supostamente deveria atingir. O etnocentrismo de acordo com o autor, não é propriedade de uma única sociedade, mas se faz uma atitude unânime que é encontrada tanto na história das sociedades, como está presente em nosso cotidiano. Segundo o autor todas essas maneiras exacerbadas, e por muitas vezes cruéis de se pensar o outro acabam por correlacionar-se a violência, ocorrendo uma incapacidade de se compreender a diferença existente, assim o autor nos chama atenção para os importantes sentidos do etnocentrismo, utilizando-se de uma estória que se dá entre um missionário e um índio de modo a nos evidenciar que ocorrido um choque de culturas por parte de ambos o etnocentrismo passa justamente pelo julgamento de valor da cultura do “outro” nos termos próprios da cultura do “eu”. Na verdade é comum fixar o pressuposto de que o “outro” não possui autonomia nem voz, o que acontece então, é que este acaba por ser representado pelas imagens distorcidas, manipuladas e não verdadeiras provindas de diversas fontes como a indústria cultural, livros didáticos, mídia que procuram transformar ora este “outro” em um ser traiçoeiro cheio de defeitos, ou ainda, em um outro momento num ser bondoso, manso repleto de boas qualidades. Everardo mesmo realiza uma crítica aos livros didáticos que para ele ocupam uma posição de enorme relevância uma vez que tem o propósito de apresentar a nós o “outro”, mas acabam por se revestir de um caráter de evidente etnocentrismo trazendo visões que não condizem com a realidade. Aqui o autor traz a ideia da importante incorporação do relativismo na quebra dessas visões etnocêntricas, ideia esta que é desenvolvida e comparada nos capítulos que seguem a obra. Assim no capítulo seguinte “Primeiros Movimentos” o autor procura traçar um panorama que irá permitir que entendamos como os séculos XV, XVI e XVIII e XIX contribuíram ao desenvolvimento de um “sentimento” da Antropologia, a forma que as expedições, colonizações, descobertas moldaram o momento de encontro com o “outro” dentro de uma situação que exige pensar a diferença, e contribui em uma parte ao sentimento etnocêntrico. Segundo o autor, o primeiro momento (sécs. XV e XVI) envolve a especulação nos centros avançados de estudo acerca do que estaria além da Europa, quem habitava os espaços até então desconhecidos. Em meio a isto, financiamentos se davam para a pesquisa e exploração com o fim de ampliar o universo e os domínios. Assim nasce para o pensamento ocidental o conjunto de novos interesses, novas questões que obrigam o mundo do “eu” a pensar a diferença, uma vez que, se coloca: Quem seriam esses “outros”? Será que estes fazem parte desse mundo? Possuem alma, leis, rei, ou ainda religião/ fé? Ou seja, o primeiro encontro com o “outro” é marcado pela perplexidade, a busca de modelos explicativos para a diferença, mas que acabaram envolvendo violência, espanto que regularam as relações entre os povos. Somente aos poucos a ideia de perplexidade ia cedendo lugar a outras ideias que procuram compreender as diferenças, que vão assumindo novas formas. De acordo com o autor, num segundo momento (sécs. XVIII e XIX) um dos primeiros pensamentos que ocorre na Antropologia de modo a explicar o conhecimento é o chamado Evolucionismo pautado na ideia de evolução que contribuirá enormemente a construção do pensamento antropológico. Deixa-se a perplexidade e encontra-se uma nova explicação de que o outro é diferente porque possui diferente grau de evolução. Evolução esta no sentido de desenvolvimento, caminho da manifestação plena de algo que se encontrava oculto. Ocorre o encontro de um evolucionismo biológico e um evolucionismo social onde este último passa a ser o modelo explicador da diferença, tendo como lógica a saída de estádios mais primitivos numa trajetória rumo ao progresso onde encontra-se a civilização. Tem os nomes importantes de James George Frazer e Edward Burnett Tylor ( Inglaterra) e Lewis Morgan (Estados Unidos) nos estudos que começaram a produzir ideias da presença do homem em idades remotas. E que como nos coloca Everardo, por meio do conceito de cultura tomado pelos evolucionistas encontrou-se o critério mediador de comparação, no entanto é preciso esclarecer que esse evolucionismovem carregado de etnocentrismo. A seguir no terceiro capítulo intitulado “O passaporte” o autor procura falar das conquistas de uma maior relativização dentro da Antropologia começada no século XX que complexificará o “outro” enquanto objeto de estudo. Segundo o autor, ocorre para isto uma vasta contribuição de novas ideias formuladas por vários pesquisadores. Nesta parte do texto Everardo coloca no centro desse início de relativização a figura importante do alemão Franz Boas ao qual se liga toda uma escola de pensamento que ficou conhecida como Difusionismo ou escola americana. De acordo com o autor, Boas no início do século trabalhando nos Estados Unidos influencia um grupo de alunos que desenvolvem um trabalho fortemente inspirado em suas ideias. Ideias estas que contribuem para uma transformação substancial da antropologia, transformação que relativiza as bem estabelecidas noções evolucionistas, modificando as ideias de cultura e história. Foi com Boas que se inicia uma reflexão que vem a relativizar o conceito de cultura ( o evolucionismo tomava a cultura do “eu” como absoluta e com base em seus padrões organizava a classificação das culturas do “outro”) é ele o primeiro a perceber a importância de estudar as culturas humanas nos seus particulares, isto é, o que cada grupo produzia a partir de suas condições históricas, climáticas, linguísticas, ou seja, cada cultura se caracterizava por ser única e específica é com base nisso que vai ocorrendo uma certa relativização, uma vez que essa pluralidade de culturas exigem uma maior complexidade quanto ao estudo das culturas humanas. Contudo segundo o autor, o interesse no trabalho de Boas estava mais em levantar hipóteses novas, do que torná-las sistematicamente formuladas, ou seja, este preferia deixar pistas férteis do que se conter em ideias bem arrumadas e acabadas (o conceito de cultura não fica nitidamente cristalizado com Boas). Pesquisando sobre: Antropologia Física, Linguística, Folclore, Geografia, Migrações, Organização Social onde a ideia de cultura se renova e se transforma Boas se voltou para o grupo do “outro”. A ideia de uma história única cumulativa como colocavam os evolucionistas perde seu “H” maiúsculo e acaba por adquirir um “h” minúsculo. É baseado em seus pensamentos que toda uma geração de antropólogos vai acabar sendo influenciada de modo a desenvolver em direções distintas pistas, toques e instituições que se ancoravam em seus escritos. A obra tem sequência com mais um capítulo sugestivamente denominado “Voando alto” no qual Everardo procura pensar as importantes contribuições teóricas de importantes autores como: Radcliffe- Brown, Durkheim e Malinowski que contribuíram não só para a formação da Antropologia, mas que também se apresentam relevantes as Ciências Sociais em geral. Antes de falar de tais contribuições o autor nos coloca uma observação importante: tanto no evolucionismo quanto no difusionismo um tema se mostrava permanente “Era a história estava sempre a permear os estudos e reflexões em quase toda a literatura das culturas humanas”. (p.64). Embora que de maneiras diferentes como o próprio autor coloca uma história com “H” maiúsculo no evolucionismo e uma história com “h” minúsculo no difusionismo, a história sempre se fazia necessária para compreensão. Assim Radcliffe- Brown é incorporado ao capítulo uma vez que este ofereceu grande contribuição ao exatamente discordar desta vinculação existente entre a compreensão do presente de uma cultura e o estudo de seu passado, na verdade Radcliffe- Brown propõe uma ruptura: o presente não precisa ser necessariamente explicado pelo passado, em termos técnicos – à sincronia (presente) não está submetida à diacronia (passado). Para ele a história conjetural, especulativa estava em forte contraste à sua proposta de estudo funcional das sociedades. Nesta parte do texto o autor nos coloca que será a partir da introdução desse adjetivo funcional que ocorrerá uma marca da Antropologia no sentido da relativização, uma vez que “desamarrando” essa perspectiva de estudo do passado e a adesão de uma perspectiva funcionalista, o estudioso se obriga a pensar o “funcionamento” de uma sociedade menos em seus próprios termos e acaba a proporcionar um grande espaço para que a sociedade do “outro” se mostre como ela é. Radcliffe- Brown também traz mais uma contribuição ao procurar estabelecer uma comparação entre a Antropologia e as Ciências Naturais, fazendo analogias para explicar conceitos de “função e sua relação com “processo” e estrutura. Quando este autor optou por um estudo sincrônico teve de lidar com uma forte relativização. A seguir o autor nos coloca uma nova contribuição que versa agora sobre o problema da autonomia antropológica, este que vai ser pensado por Émile Durkheim que possui um tema pertinente em sua complexa obra: a afirmação de uma ruptura – O social não é explicado pelo individual. Pautado na ideia do fato social e explicitando suas características principais de coerção, generalidade e exterioridade este autor nos colocará a questão chave de se compreender que o social tem suas particularidades e não se confunde com a soma dos indivíduos. E por últ imo de grande relevância ao que diz respeito não só a Antropologia mas vincula-se principalmente ao processo de relativização é colocada a contribuição do grande viajante da antropologia - Malinowski com seus estudos e a “expressão de trabalho de campo”, essa expressão de acordo com o autor, é importantíssima por estabelecer uma nova concepção, a de abandonar o conforto e segurança proposta pelo etnocentrismo e colocar em contato direto o antropológo e o seu objeto de pesquisa, isto é, estabelecer o contato com a diferença e buscar relativizações a respeito do “outro”. Assim Everardo nos coloca a grande obra de Malinowski Os Argonautas do Pacífico Ocidental que serve de referência a nova atividade de trabalho de campo e a forma como esta permitiu se pensar as diferenças afastadas das ideias de ameaça e sim pensadas como alternativas, ou seja, Malinowski dentro de sua obra estabelece essa importante noção de comparação relativizadora. Na verdade este capítulo revela todos os voos possíveis da antropologia no sentido da autonomia em relação a história, a relativização ocorrida, a importância do trabalho de campo, que se deram arduamente e aos poucos foram guiando a disciplina no sentido de conceber o “outro” na ideia da diferença passível de existência e não extinção. Por fim, no último capítulo da obra “A volta por cima”, o autor conclui essa longa “viagem” proposta no sentido da superação do etnocentrismo e estabelecimento da relativização, recapitulando certas questões que já haviam sido colocadas nos capítulos anteriores, mas tratando de algumas novas questões, bem como trazendo novos autores importantes dentro da antropologia. Everardo nos fala da importância de certos questionamentos realizados por autores como no caso Marshall Sahlins, que ao analisar através do trabalho de campo aspectos indígenas como economia de subsistência vem derrubar a visão etnocêntrica de uma economia miserável mas sim nos fazer pensar que sua de economia está ligada a sua maneira de viver e compreender o mundo, ou seja, relativizações como esta feita por Sahlins nos suscita a importância de um trabalho de campo realizado respeitando-se o verdadeiro significado dos dados etnográficos obtidos e a transformação que estes podem provocar na teoria antropológica; ou ainda a questão colocada pela grande figura que é Lévi – Strauss que questiona sobre de qual tipo de história estamos falando, da importância de se entender qual a interpretação filosófica que é feita desta, relacionando Roberto Da Matta com seu trabalho sobre os Apinayé. O autor procura neste capítulo final colocar qual é o real trabalho da antropologia, o trabalho de procurarser uma ciência não das verdades absolutas, mas que tem como pauta as explicações relativas, que se torna possível quando uma nova definição de cultura é colocada, definição esta que explora diferentes possibilidades, a cultura humana torna-se uma alternativa que as sociedades escolhem para se organizar, classificar e praticar a experiência e a esta o antropólogo deve saber atribuir a ideia de código onde todas as dimensões da cultura são pequenos conjuntos que trazem dentro de si algum tipo de informação sobre quem somos, o que pensamos e o que fazemos. Sendo trabalho do antropólogo captar a lógica e os códigos não pensando no plano do “eu” (etnocêntrico) mas abrindo espaço para o “outro" (relativizando). Como considerações finais pode-se pensar que a obra apresentada se mostra além de um livro meramente introdutório a questão do etnocentrismo, mas que acaba por se apresentar como uma obra muito mais ampla e abrangente centrada não só em uma única questão mas que perpassa várias outras ligadas no vasto campo da antropologia. “O que é etnocentrismo” de Everardo P. Guimarães Rocha é um livro indispensável dentro dos cursos de antropologia.
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