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1 Antropologia e Sociologia das Organizações (textos para estudo 2019) 1ª parte Antropologia Conceitos: “Ciência da humanidade e da cultura. Como tal, é uma ciência superior social e comportamental, e mais, na sua relação com as artes e no empenho do antropólogo de sentir e comunicar o modo de viver total dos povos específicos, é também uma disciplina humanística”. Hoebel e Frost Dimensões: Biológica: antropologia física: estuda a natureza física do homem, procurando conhecer suas origens e evolução, sua estrutura anatômica, seus processos fisiológicos e as diferentes características raciais das populações humanas, antigas e modernas. Está ligada de certa forma às ciências biológicas e naturais. Sociocultural: antropologia social: estudo dos processos culturais e da estrutura social, seu interesse está centrado na sociedade e nas instituições. O Antropólogo social é aquele que, levando em conta as diferenças existentes entre grupos humanos, preocupa-se em conhecer as relações sociais que as regem. Cada aspecto da vida social – o familiar, o econômico, o político, o religioso, o jurídico – só pode ser compreendido se estudado em relação aos demais, como parte de um conjunto integrado. Antropologia cultural: campo mais amplo da ciência antropológica. Abrange o estudo do homem como ser cultural, isto é, fazedor de cultura. Investiga as culturas humanas no tempo e no espaço, suas origens e desenvolvimento, suas semelhanças e diferenças. Tem foco de interesse voltado para o conhecimento do comportamento cultural humano, adquirido por aprendizado, analisando-o em todas as suas dimensões. Como ciência social, seu objetivo básico consiste no “problema de relação entre os modos de comportamento instintivo (hereditário) e adquirido (por aprendizagem), bem como o das bases biológicas gerais que servem de estrutura às capacidades culturais do homem” (Heberer). Seu campo de estudo abrange: arqueologia/ etnografia/ etnologia/ linguística/ folclore. Filosófica: antropologia filosófica - responde: Quem é o homem? Uma conceituação mais ampla define antropologia como a ciência que estuda o homem, suas produções e o seu comportamento. O seu interesse está no homem como um todo – biológico e cultural – procurando revelar os fatos da natureza e da cultura. Tenta compreender a existência humana em todos os seus aspectos, no espaço e no tempo, partindo do princípio da estrutura biopsíquica. Busca também a compreensão das manifestações culturais, do comportamento e da vida social. Objeto de estudo Segundo Beals e Hoijer “seus problemas (da antropologia) se centram, por um lado, no homem como membro do reino animal, e, por outro, no comportamento do homem como membro da sociedade”. O objeto da antropologia engloba as formas físicas primitivas e atuais do homem e suas manifestações culturais. Interessa-se preferencialmente, pelos grupos simples, culturalmente diferenciados, e também pelo conhecimento de todas as sociedades humanas, letradas ou ágrafas, extintas ou vivas, existentes nas várias regiões da terra. Atribui-se ao antropólogo a tarefa de proceder a generalizações, formulando princípios explicativos da formação e desenvolvimento das sociedades e culturas humanas. (Apud: Marconi, Antropologia: uma introdução ) 2 CULTURA A cultura, para os antropólogos em geral, constitui no “conceito básico e central de sua ciência” (Leslie White). O termo cultura não se restringe ao campo da antropologia, varias áreas do saber humano — agronomia, biologia, artes, literatura, sociologia, história etc., valem- se dele, embora seja outra a conotação. Muitas vezes, encontramos a palavra cultura indicando o desenvolvimento do individuo por meio da educação, da instrução. Nesse caso. uma pessoa culta seria aquela que adquiriu domínio no campo intelectual ou artístico. Inculta seria a pessoa que não obteve instrução. Os antropólogos não empregam os termos culto ou inculto, de uso popular, e nem fazem juízo de valor sobre esta ou aquela cultura, pois não consideram uma superior à outra. Elas são diferentes em relação à tecnologia ou integração de seus elementos. Todas as sociedades - rurais e urbanas - possuem cultura. Só os recém-nascidos e o homo-ferus não possuem cultura. Segundo Edward B. Tylor, “cultura... é aquele todo complexo que inclui o conhecimento, as crenças, a arte, a moral, a lei, os costumes e todos os outros hábitos e aptidões adquiridos pelo homem como membro da sociedade “. A cultura pode ser analisada, ao mesmo tempo, sob vários enfoques: Ideias: conhecimento e filosofia; Crenças: religião e superstição; Valores: ideologia e moral; Normas: costumes e leis; Atitudes: preconceito e respeito ao próximo; Padrões de conduta: monogamia, tabu; Abstração do comportamento:símbolos e compromissos; Instituições: família, sistemas econômicos; Técnicas: artes e habilidades; Artefatos: machado de pedra, telefone. Relativismo cultural: A posição cultural relativista tem como fundamento a ideia de que os indivíduos são condicionados a um modo de vida específico e particular, por meio do processo de endoculturação. Adquire, assim, seus próprios sistemas de valores e a sua própria integridade cultural. As culturas, de modo geral, diferem umas das outras em relação aos postulados básicos, embora tenham características comuns. Toda cultura é considerada como configuração saudável para os indivíduos que a praticam, todos os povos formulam juízos em relação aos modos de vida diferentes dos seus. Por isso, o relativismo cultural não concorda com a idéia de normas e valores absolutos e defende o pressuposto de que as avaliações devem ser sempre relativas à própria cultura onde surgem. Os padrões ou valores de certo ou errado, dos usos e costumes, das sociedades em geral, estão relacionados com a cultura da qual fazem parte. Dessa maneira, um costume pode ser válido em relação a um ambiente cultural e não a outro e, mesmo, ser repudiados. Traços, complexos e padrões culturais: Traços culturais: consistem nos menores elementos que permitem a descrição da cultura. Referem-se, portanto, à menor unidade ou componente significativo da cultura, que pode ser isolado no comportamento cultural. Embora os traços sejam constituídos de partes menores, os 3 itens, estes não tem valor por si sós. Ex: uma caneta pode existir como um obteto definido, mas só pode funcionar como unidade cultural em sua associação com a tinta, convertendo-se assim em um traço cultural. Complexos culturais: consistem no conjunto de traços ou num grupo de traços associados, formando um todo funcional; ou ainda, um grupo de características culturais interligadas, encontrado em uma área cultural. Ex. carnaval: carros alegóricos, música, dança, instrumentos, desfile, organização, etc. Padrões culturais: o padrão cultural é um comportamento generalizado, estandardizado e regularizado; ele estabelece o que é aceitável ou não na conduta de uma dada cultura. Nenhuma sociedade é totalmente homogênea. Existem padrões de comportamento distintos para homens e mulheres, para adultos e jovens. Quando os elementos de uma sociedade pensam e agem como membros de um grupo, expressam os padrões culturais do grupo. O comportamento do indivíduo é influenciado pelos padrões da cultura em que vive. Embora cada pessoa tenha caráter exclusivo, devido às proprias experiências, os padroes culturais, de diferentes sociedades, produzem tipos distintos de personalidades, característico dos membros dessas sociedades. O padrão se forma pela repetição contínua. Quando muitas pessoas, em dada sociedade, agem da mesma forma ou modo, durante um largo período de tempo, desenvolve-se um padrão cultural. Ex. Matrimônio: (padrão cultural) engloba o complexo do casamento com vários traços (cerimônia, aliança, roupas, flores, convites, etc).Folkways, Mores e Leis A maneira de viver de um grupo social implica normas de comportamento, muitas delas estabelecidas há tempos atrás. As normas de comportamento social foram classificados por Sumner em duas categorias diferentes: oa folkways (usos) e os mores (costumes). Esta divisão dos padrões de comportamento se estende, portanto, desde os de menor importância até os obrigatórios e universais. Entre os usos mais frouxos e os costumes mais rigorosos forma-se um contínuo que, tendo-se em vista as variedades dentro de cada categoria, dificulta a delimitação das fronteiras entre um e outro. Essa passagem, fluida e imprecisa, torna difícil classificar alguns padrões situados nesse contínuo, por parecer pertencerem às duas categorias. Nesse caso temos as regras sobre o recato no trajar; o consumo de bebidas alcoólicas etc. Folkways (usos): padrões não obrigatórios de comportamento social exterior constituem os modos coletivos de conduta, convencionais ou espontâneos, reconhecidos e aceitos pela sociedade. Praticamente, regem a maior parte da nossa vida cotidiana, sem serem deliberadamente impostos. Indicam o que é adequado ou socialmente correto. Não tem caráter obrigatório, mas são bastantes difundidos. Segundo Sumner, surgem de uma necessidade coletiva para a solução de problemas imediatos. A pessoa que infringe um folkway pode ser taxada de excêntrica, distraída, mas a infração não constitui uma ameaça ao grupo. As sanções são brandas, quase despercebidas, com o riso , o ridículo. Exemplos de folkways: convenções, formas de etiqueta, celebração da puberdade, estilos de construções, rituais de observância religiosa, rotinas de trabalho e lazer; convenções da arte ou da guerra, maneiras de cortejar, de vestir etc. Mores (costumes): para Ely Chinoy “são normas moralmente sancionadas com vigor”. Constituem comportamento imperativo, tido como desejável pelo grupo, apesar de restringir e limitar a conduta. São essenciais e importantes ao bem estar da sociedade e aparecem como normas reguladoras de toda a cultura. Apesar da obrigatoriedade e imposição, são considerados justos pelo grupo que os compartilha. Os Mores tem caráter ativo e seu controle pode ser consciente e inconsciente; são sancionados pela tradição e sustentados pelas pressões da opinião de grupos: ridículo, mexerico, castigos, não-aceitação. Como forma de controle natural, penetram nas relações sociais. Suas normas de 4 conduta regulam o comportamento social, restringindo, moldando e reprimindo certas tendências dos indivíduos. Têm maior conteúdo emocional do que os usos. A não conformidade com os mores provoca desaprovação moral. A reação do grupo é violenta e séria, como o adultério, roubo, assassínio e incesto, na sociedade industrial. Entretanto, há amplas variações nas atitudes dos grupos em relação a essas regras, de acordo com as diferentes culturas. Quem obedece aos costumes recebe o respeito, a aprovação, a estima pública. Quem os viola, além do sentimento de culpa, cai no ostracismo e sua reputação sofre desvios. É apedrejado, ridicularizado, encarcerado, açoitado, exilado, degradado, excomungado, morto. Leis: são “regras de comportamento formuladas deliberadamente e impostas por uma autoridade especial” (Biesanz e Biesanz). São decretadas com a finalidade de suprir os costumes que começam a desintegrar-se, a perder o seu controle sobre os indivíduos. Nas sociedades pequenas e unificadas, as pressões e sanções informais são suficientes para manter o comportamento grupal; nas sociedades complexas são necessários controles mais formais, decretados e exercidos pelas instituições políticas, jurídicas ou pelo Estado. A linha divisória entre leis e mores também não é fácil de ser traçada, tanto nas sociedades simples quanto nas complexas. Assim como os costumes podem transformar-se em leis, estas podem tornar-se mores. As leis servem a diferentes propósitos: Impõem os mores aceitos pelo grupo cultural; Regulam novas situações, fora dos costumes; Substituem costumes antigos e ineficazes; Congregam os padrões reais com os ideais e os valores imperantes. Exemplos de mores impostos por lei ou por ela reforçados: monogamia, bem-estar da esposa e dos filhos, a punição do roubo, do estupro, do assassinato etc. Nível de participação do indivíduo na cultura As culturas são constituídas de normas comportamentais ou costumes. Essas normas podem ser classificadas de acordo com o nível de participação - obrigatório ou facultativo - do indivíduo na cultura (Ralph Linton). Podemos distinguir: os universais, as especialidades, as alternativas, e além disso, as peculiaridades individuais. Universais: embora o conteúdo da cultura varie de uma sociedade para outra, existem padrões de conduta característicos de todos os membros de uma sociedade: são os universais. São idéias, costumes, reações emotivas condicionadas, comuns a todos os elementos de determinada sociedade. Exemplos: a língua portuguesa no Brasil, enterrar os mortos, andar vestido, a monogamia no Brasil, a democracia nos EUA, a liberdade para várias sociedades. Especialidades: são certas normas, praticadas e seguidas apenas por alguns grupos; padrões de conduta compartilhados apenas por certos indivíduos. São habilidades e conhecimentos técnicos referentes a categorias como: médico, engenheiro, advogado. ama-de-leite, curandeiro, administrador, economista, contador, jogador de futebol etc. Alternativas: são os inúmeros traços, existentes em todas as culturas, partilhados por certo número de indivíduos, mas que não são comuns a todos os membros da sociedade. nem aos grupos de especialização, por não se assemelharem a qualquer categoria especial de ocupação. As alternativas estão vinculadas à livre escolha. Ex.: ser ou não ser vegetariano, mulher optar por saia ou calça comprida, homem usar cabelos compridos. Nas culturas pequenas e primitivas o número de alternativas é reduzido, ao passo que nas grandes sociedades urbanizadas e complexas, é enorme. Peculiaridades individuais: ficam além dos limites da cultura e constituem características 5 pessoais do individuo. Ex. habilidade manual de um artesão, de um instrumentista etc. Os universais e as especialidades, por serem mais estáveis, formam o núcleo da cultura. As alternativas são importantes na dinâmica da cultura, pois, caso se difundam ou sejam seguidas, incorporam-se à cultura.Há sempre alguém, numa comunidade que descobre ou inventa coisas.(Sociologia Geral/ Lakatos) O que é sociologia? O surgimento da sociologia no século XIX deu-se como decorrência da necessidade dos homens de compreender os inúmeros problemas sociais que estavam aparecendo, em proporções nunca vistas, em razão da industrialização iniciada no Sec.XVIII. Partindo de uma realidade rural, em que as funções e relações sociais apresentavam pouca complexidade, as sociedades europeias depararam, no Sec.XIX, com estruturas sociais mais complexas, que se desenvolveram em torno da nova realidade industrial. Os problemas desta súbita mudança, avolumaram-se, constituindo-se em assunto abordado nos meios intelectuais, os quais passaram a formular várias hipóteses para explicar a situação. No entanto, as disciplinas existentes apresentavam instrumental insuficiente para explicar os novos fenômenos sociais. Surge daí a necessidade de uma nova ciência, para, utilizando-se do instrumental das ciências naturais e exatas, tentar explicar a realidade. Constitui-se assim a sociologia, em seu início, com o objetivo específico de estudar sistematicamente o comportamento social dos grupos e as interações humanas, bem como os fatos sociais que geram e sua inter-relação. A Sociologia consolidou-se ao longo do tempo como um dos ramos das ciências humanas, pois surgiram inúmeras ciências para estudar cada dimensão do social, aprofundando o conhecimento específico de determinadas relações sociais. No entanto,a sociologia permanece como a única que tem como tema central de estudo as interações sociais propriamente ditas. Outras disciplinas podem estudar aspectos sociais da vida do homem; entretanto, nenhuma apresenta como tema particular e específico o fato social no seu todo. Para o sociólogo, o fato social é estudado não porque é econômico, jurídico, político, turístico, educacional ou religioso, mas porque todos ao mesmo tempo são “sociais”, independentemente da especificidade de cada um, embora essa permita que possam ser abordados por disciplinas específicas. A vida dos seres humanos apresenta, assim, várias dimensões: econômica, jurídica, política, moral, religiosa etc., que ocorrem e se desenvolvem durante a existência social do homem, ou seja, quando os seres humanos estão interagindo uns com os outros. São essas interações, independentemente do aspecto que possam assumir, que são o objeto central do estudo da sociologia. Logo, a sociologia estuda a dimensão social da conduta humana, as relações sociais que a ela estão associadas. Para o sociólogo e para todos aqueles que pensam sociologicamente, o comportamento humano é ordenado, padronizado e estruturado socialmente e assim passível de um estudo sistemático. Ao compreendermos que podemos entender a sociologia como um estilo de pensar, estaremos adquirindo uma visão sistêmica de enxergar a realidade social. Veremos que todas as interações estão relacionadas, de uma forma ou de outra, entre si, e que quando isolamos um conjunto delas em particular, o fazemos por dois motivos: Para estudar isoladamente um grupo de interações específicas que constituem uma dimensão do social, como, por exemplo, os fatos econômicos, jurídicos, educacionais, turísticos, religiosos e assim por diante. Para estabelecer os limites dos relacionamentos sociais que compõem a nossa existência, constituindo-se uma rede social da qual fazemos parte. 6 O entendimento dessa realidade para aqueles que apresentam o modo de pensar sociológico permite compreender os fenômenos em sua totalidade, estabelecendo ligações de fatos cotidianos com a evolução da sociedade como um todo. Constitui um exemplo desse modo de pensar o estabelecimento de uma relação entre a abertura de espaços de sociabilidade com a terceira revolução científico-tecnológica e o aumento da violência. (O aumento da violência que faz com que as pessoas deixem de usar espaços de convivência tradicionais –praças, parques- e optem por se relacionarem em ambientes fechados como shopings, livrarias e em espaços virtuais – internet -) Muitos sociólogos definiram a sociologia e, no entanto, analisando essas muitas definições, Rumney e Maier (1966, p.20) encontraram bastante convergência entre elas no que diz respeito ao seu campo de estudo e aos seus deveres como disciplina. As principais definições analisadas por esse autores foram: “Sociologia é o estudo das interações e inter relações humanas, suas condições e circunstâncias” (M. Ginsberg) “O assunto da sociologia é a interação dos espíritos humanos”. (L.T. Hobhouse) “É a ciência do comportamento coletivo”. (R.E. Park e E.W. Burgess) “É a ciência da sociedade ou dos fenômenos sociais”. (Ward) “A sociologia geral e, em conjunto, a teoria da vida humana em grupo”. (Tönnies) “É uma ciência social especial que se concentra no comportamento inter-humano, nos processos de socialização, na associação e dissociação como tais”. (Von Wiese) “Sociologia é a ciência geral e coordenadora por ser a ciência social fundamental. Longe de ser apenas a soma das ciências sociais, ela é antes a sua base comum”. (Giddings) “A sociologia pergunta o que acontece com os homens e quais as regras de seu comportamento, não no que se refere ao desenvolvimento perceptível de suas existências individuais como um todo, porém, na medida em que formam grupos e são influenciados, devido às interações, por sua vida grupal”. (Simmel) “A sociologia busca descobrir os princípios de coesão e ordem dentro da estrutura social, os modos pelos quais esta se radica e cresce em um dado ambiente, o equilíbrio instável da estrutura mutável e do ambiente transformável, as tendências principais da mudança incessante, as forças que determinam sua direção em dado momento, as harmonias e conflitos, os ajustamentos e desajustamentos no íntimo da estrutura conforme se revelam à luz dos desejos humanos, e, assim, a aplicação prática dos meios aos fins nas atividades criadoras do homem social”. (MacIver) Como observaram Rumney e Maier, as diferenças entre as várias definições encontradas são, essencialmente, variações de ênfase. O substrato comum a todas elas é a ideia de que a sociologia se ocupa das relações humanas, do comportamento do homem com os seus semelhantes. Em resumo, podemos definir inicialmente sociologia como o estudo sistemático do comportamento social, dos grupos e das interações humana. Preocupa-se, particularmente, em explicar como as atitudes e os comportamentos das pessoas são influenciados pela sociedade mais geral e pelos diferentes grupos humanos em particular, e, numa perspectiva mais ampla, qual é a dinâmica social que mantém as sociedades estáveis ou provoca a mudança social. A visão sociologia compreende observar além das aparências das ações humanas e das organizações. O estudo da sociologia também pode ser compreendido como o estudo científico da sociedade e sua influência sobre o comportamento humano. Para este estudo, os sociólogos utilizam métodos científicos para a abordagem dos diversos fenômenos sociais existentes nas diferentes sociedades humanas. (Dias, Reinaldo; Introdução à Sociologia) 7 A Necessidade de uma ciência social A Revolução Industrial refere-se ao período em que um conjunto de invenções e inovações relacionadas entre si permitiram alcançar uma enorme aceleração da produção de bens e assegurar um crescimento que foi se tornando rapidamente independente da agricultura. Esse fenômeno, também conhecido como Primeira Revolução Industrial, teve início na Inglaterra no século XVIII, entre os anos 1760 a 1820, quando se consolidou e se estendeu a outros países da Europa e os EUA. A economia inglesa passou então, de economia agrária para industrial com produção em larga escala e a substituição do trabalho braçal pelo trabalho da máquina. Para Marx e Engels a grande indústria criou um mercado mundial que acelerou o desenvolvimento do comércio, da navegação e dos meios de transporte por terra, as ferrovias principalmente. Mudanças trazidas pela Revolução Industrial: Substituição progressiva do trabalho humano por máquinas; Divisão do trabalho e sua coordenação; Mudanças culturais no trabalho (disciplina); Produção de bens em grande quantidade; Surgimento de novos papéis sociais (operários e capitalistas) Com o início da Revolução Industrial a agricultura na Inglaterra sofreu grandes transformações na busca por um aumento de produtividade. Esta reestruturação acabou provocando o êxodo do trabalhador rural para a cidade. Como consequência dessas mudanças no campo, as cidades cresceram enormemente com o afluxo de massas de camponeses atraídos pelo trabalho que era oferecido nas fábricas, formando o proletariado industrial. O rápido processo de urbanização provocou a degradação do espaço urbano anterior, do meio ambiente e a destruição de valores tradicionais. Além disso, ocorria uma monstruosa exploração do homem pelo homem nas fábricas, com jornadas de trabalho de até 16 horas, sem garantias trabalhistas, mulheres e crianças empregadas por salários ultrajantes e todos vivendo em precárias condições habitacionais, de higiene e alimentação. Essa condição urbana provocava problemas sociais gravíssimos advindos da rápida urbanização: doenças, ausência de moradia, prostituição, alcoolismo, suicídios, violência, epidemias (tifo, cólera).O surgimento da Sociologia. O surgimento da sociologia ocorre em um contexto histórico específico, que coincide com a desagregação da sociedade feudal e a consequente consolidação da sociedade capitalista. Sua criação não é obra de um só homem; representa o resultado de um processo histórico, intelectual e científico. A Revolução Francesa e a Revolução Industrial possibilitam o surgimento da sociologia. A sociologia surgiu em grande medida em decorrência dos abalos provocados pela Revolução industrial. Uma outra circunstância que contribuiu para o surgimento da sociologia foi a evolução dos modo do pensamento e que, somada aos problemas advindos da rápida industrialização,possibilitou seu aparecimento. No Séc. XVII ocorreu um notável avanço no modo de pensar com o uso sistemático da razão – o livre exame da realidade – característica marcante dos pensadores conhecidos como “racionalistas”. Tal avanço se completa no Séc. XVIII com os “iluministas”, que não 8 buscavam apenas transformas as velhas formas de conhecimento, mas utilizavam a razão para criticar com veemência a sociedade. Os iluministas atacaram os fundamentos da sociedade feudal, os privilégios dos nobres e as restrições que estes impunham aos interesses econômicos e políticos da burguesia. Combinando o uso da razão com a observação os iluministas analisaram vários aspectos da sociedade. Tinham como objetivo demonstrar que as instituições da época eram irracionais e injustas e que impediam a liberdade do homem. Se impediam a liberdade do homem deviam ser eliminadas. Esse pensamento revolucionário dos iluministas levou-os a ter um importante papel na Revolução francesa. O Positivismo Do ponto de vista intelectual surgiu uma reação conservadora às transformações desencadeadas pela Revolução Francesa e Revolução Industrial. A sociedade moderna, na visão conservadora, estava em franco declínio. Não viam progresso em uma sociedade urbanizada, na indústria, na tecnologia, na ciência e no igualitarismo. Lamentavam o enfraquecimento da família e da religião. Consideravam que a sociedade moderna era dominada pelo caos social, desorganização e anarquia.. Preocupados com a ordem, a estabilidade e a coesão social, enfatizariam a importância da autoridade, da hierarquia da tradição e dos valores morais para a conservação da vida social. Ao estudarem as instituições – família, religião, o grupo social – preocupavam-se com a contribuição que poderiam prestar para a manutenção da ordem social. As ideias dos conservadores constituíram-se em uma referência para os pioneiros da sociologia, particularmente os “positivistas”, interessados na preservação da nova ordem econômica e política que estava sendo implantada. Os positivistas foram bastante influenciados pelas ideias dos conservadores, pois também consideravam que na sociedade francesa pós revolucionária reinava um clima de desordem e anarquia, visto que todas as relações sociais tinham se tornado instáveis, e o problema a ser enfrentado era o de restabelecer a ordem. (Introdução à Sociologia – Reinaldo Dias) Augusto Comte Filósofo e matemático francês, Auguste Comte (1798-1857) foi o fundador do positivismo. Fez seus primeiros estudos no Liceu de Montpellier, ingressando depois na Escola Politécnica de Paris, de onde foi expulso em 1816 por ter se rebelado contra um professor. A partir de 1846, toda a sua vida e obra passaram a ter um espírito religioso. Ao se dedicar mais às questões espirituais, afastou-se do magistério. O pensamento de Comte influenciou as teorias existentes, provocando grandes mudanças. Teve grande influência que como filósofo social, quer como reformador social. Morreu em Paris em 05/09/1857. Suas principais obras foram: Curso de Filosofia Positiva, 6 tomos (1830-1842); Discurso sobre o espírito positivo (1844); Sistema de política positiva, 4 tomos (1851-1854); Síntese subjetiva (1856). Augusto Comte lutava para que, em todos os ramos de estudos, se obedecesse à preocupação da máxima objetividade. Em sua classificação das ciências, colocou a matemática na base e, no ápice, os esforços de compreensão de tudo o que se referia ao homem, principalmente as relações entre eles. Nessa atirude, entretanto, assumia uma posição diferente da dos socialistas. Defendia o ponto 9 de vista de somente serem válidas as análises das sociedades quando feitas com verdadeiro espírito científico, com objetividade e com ausência de metas preconcebidas, próprios das ciências em geral. Os estudos das relações humanas, assim, deveriam constituir uma nova ciência, a que se deu o nome de sociologia. Esta não deveria limitar-se apenas à análise, mas propor normas de comportamento, seguindo a orientação resumida na famosa fórmila positivista: “saber para prever, a fim de prover”. É verdade que nos seus escritos sobre a sociedade Comte esteve bem longe de seguir à risca as suas recomendações de “positividade”. Mas teve enorme repercussão, e ainda tem a atitude que preconizou quanto ao estudo dos fenômenos sociais, não influenciado pela emotividade, mas levado a efeito com a isneção de ânimo, semelhante a adotada na química ou na física. Aliás, inicialmente, em vez do termo “sociologia”, denominara esta ciência de “física social”. Podemos discernir, nos estudos de Comte, três princípios básicos: prioridade do todo sobre as partes: significa que, para compreender e explicar um fenômeno social particular, devemos analisá-lo no contexto global a que pertence. Considerava que tanto a Sociologia Estática (estudo da ordem das sociedades em determinado momento histórico) qunato a Sociologia Dinâmica (estudo da evolução das sociedades no tempo) deveriam analisar a sociedade de uma determinada época, correlacionando-a com sua história ou com a história da humanidade (a Sociologia de Comte é, na realidade, sociologia comparada, tendo como quadro de referência a História Universal); progresso dos conhecimentos é característico da sociedade humana: a sucessão de gerações, com seus conhecimentos, permite um acumulo de experiências e de saber que constitui um patrimônio espiritual objetivo e liga as gerações entre si; existe uma coerência entre o estágio dos conhecimentos e a organização social; homem é o mesmo por toda a parte e em todos os tempos: em virtude de possuir idêntica constituição biológica e sistema cerebral. Partindo dos princípios acima, Comte concluiu ser natural que a sociedade, em toda a parte, evolua da mesma maneira e no mesmo sentido, resultando daí que a humanidade em geral caminha para um mesmo tipo de sociedade mais avançada. De tais idéias surgiu a classificação das sociedades denominada “a Lei dos três estados”: Estado teológico: em que se explicam os diversos fenômenos através da causas primeiras, em geral personificadas nos deuses. Estado metafísico ou filosófico: aqui o homem raciocina, analisa e abstrai, procurando através de causas mais gerais explicações sobre a natureza das coisas e a causa dos acontecimentos. Estado positivo ou científico: o homem tenta compreender as relações entre as coisas e os acontecimentos através da observação científica e do raciocínio, formulando leis e, portanto, não tendo mais necessidade de procurar conhecer a natureza íntima das coisas e as causas absolutas (período filosófico). O estado positivo será em estado definitivo para a humanidade onde o homem finalmente encontrará paz e prosperidade, ordem e progresso. 10 Os “Clássicos” do pensamento sociológico Muitos foram os cientistas sociais que contribuíram para a construção teórica da sociologia. No entanto, há três que podem ser considerados os mais importantes e são tidos como clássicos – pela elaboração teórica ampla – e que com o passar do tempo não perdem sua atualidade. São eles: Émile Dürkheim,Karl Marx e Max Weber. Karl Marx (1818-1883) Fundador do materialismo histórico, Marx, na realidade um filósofo social e economista alemão, contribuiu para o desenvolvimento da sociologia, salientando que as relações sociais decorrem dos modos de produção (fator de transformação da sociedade), numa tentativa de elaborar uma teoria sistemática da estrutura e das transformações sociais. O postulado básico do marxismo é o determinismo econômico, segundo o qual o fator econômico é determinante da estrutura do desenvolvimento da sociedade. O homem, para satisfazer suas necessidades, atua sobre a natureza, criando relações técnicas de produção. Todavia, essa atuação não é isolada: na produção e distribuição necessárias ao consumo, o homem relaciona-se com outros seres humanos, dando origem às relações de produção. O conjunto dessas relações leva ao modo de produção . Os homens desenvolvem as relações técnicas de produção através do processo de trabalho (força humana e ferramentas), dando origem a forças produtivas que, por sua vez, geram um determinado sistema de produção (distribuição, circulação e consumo de mercadorias); o sistema de produção provoca uma divisão de trabalho (proprietários e não proprietários das ferramentas de trabalho ou dos meios de produção) e o choque entre as forças produtivas e os proprietários dos meios de produção determina a mudança social. Para Marx a sociedade divide-se em infra-estrutura e supra-estrutura. A infra-estrutura é a estrutura econômica, formada das relações de produção e forças produtivas. A supra-estrutura divide-se em dois níveis; o primeiro, a estrutura jurídico-política, é formado pelas normas e leis que correspondem à sistematização das relações já existentes; o segundo, a estrutura ideológica (filosofia, arte, religião etc.), justificativa do real, é formado por um conjunto de ideias de determinada classe social que, através de sua ideologia, defende seus interesses. Sendo a infra- estrutura determinante, toda a mudança social se origina das modificações das forças produtivas e relações de produção. De acordo com essa teoria, Marx, juntamente com Engels, chegou a uma classificação de sociedades segundo o tipo predominante de relações de produção: a comunidade tribal, a sociedade asiática, a cidade antiga, a sociedade germânica, a sociedade feudal, a sociedade capitalista burguesa (comercial, manufatureira e industrial; financeira e colonialista) e a sociedade comunista sem classes ( que se instalaria através da ditadura do proletariado. Sociologia Geral – Eva Lakatos O Papel de Marx Enquanto a preocupação principal do positivismo foi com a manutenção e a preservação da nova sociedade capitalista, o marxismo procurará fazer uma crítica radical a esse tipo de ordem social, colocando em evidência seus antagonismos e suas contradições. A elaboração mais significativa do conhecimento sociológico crítico foi feita pelo marxismo. Deve-se a Marx e Engels a formação e o desenvolvimento desse pensamento sociológico crítico radical da sociedade capitalista. Na concepção de Marx e Engels, o estudo da sociedade deveria partir de sua base material, e a investigação de qualquer fenômeno social de estrutura econômica da sociedade, que constituía a verdadeira base da história humana. Desenvolveram a teoria de que os fatos econômicos são a base sobre o qual se apoiavam os outros níveis da realidade, como a política, a cultura, a arte e a religião. E, ainda, de que o conhecimento da realidade social deve se converter em um instrumento político, capaz de orientar os grupos e as classes sociais para a transformação da sociedade. Dentro dessa perspectiva, a função da sociologia não era a de solucionar os problemas 11 sociais, com o propósito de restabelecer a ordem social, como julgavam os positivistas – ela deveria contribuir para a realização de mudanças radicais na sociedade. Enquanto a sociologia positivista preocupou-se com os problemas da manutenção da ordem existente, concentrando sua atenção, principalmente na estabilidade social, o pensamento marxista privilegiou, para o desenvolvimento de sua teoria, as situações de conflito existentes na sociedade industrial. Para os marxistas, a luta de classes, e não a harmonia social, constitui a realidade mais evidente da sociedade capitalista. A obra de Marx é fundamental para a compreensão do funcionamento da sociedade capitalista, e tanto recorrem a ela seus simpatizantes como seus críticos; isto porque Marx estudou o capitalismo em seus estágios iniciais, nos quais eram nítidas as posições ocupadas pelos capitalistas e pelos operários e onde a exploração social do trabalho assalariado ocorria de forma brutal. Karl Marx nasceu na Alemanha, em 05 de maio de 1818, numa família de classe média, sendo seu pai um advogado bem conceituado. Um fato ocorrido quando dos seus 17 anos, no ginásio da cidade onde nasceu, Trèves, demonstra o que seria a vida futura do jovem Marx. Seu professor mandou-o dissertar sobre o tema: “Reflexões de um jovem a propósito da escolha de uma profissão”. “Em sua dissertação, Karl desenvolveu duas ideias que deveriam acompanhá-lo por toda a vida. A primeira era a ideia de que o homem feliz é aquele que faz os outros felizes; a melhor profissão,portanto, deve ser a que proporciona ao homem a oportunidade de trabalhar pela felicidade do maior número de pessoas, isto é, pela humanidade. A segunda era a ideia de que existem sempre obstáculos e dificuldades que fazem com que a vida das pessoas se desenvolva em parte sem que elas tenham condições para determiná-la”. A obra de Marx, embora não diretamente relacionada com os estudos acadêmicos de ciências sociais, teve enorme importância para a sociologia. Trouxe para esta a teoria da luta dos contrários o “método dialético”, assim definido por Engels: “ a dialética considera as coisas e os conceitos no seu encadeamento; suas relações mútuas, sua ação recíproca e as decorrentes modificações mútuas, seu nascimento, seu desenvolvimento e sua decadência”. Marx soube reconhecer na dialética o único método científico de pesquisa da verdade. Sua dialética diferia das interpretações que a precederam, como ele mesmo afirmou. “No meu método dialético o movimento do pensamento não é senão o reflexo do movimento real, transportado e transposto para o cérebro do homem”. “Para Marx era o mundo real, o âmbito da economia, das relações de produção, que determinavam o que pensava o homem, e não o contrário. Foi muito criticado por outros autores por isso, pois consideravam sua teoria determinista do ponto de vista econômico. E, na realidade, o determinismo econômico marcou as diversas correntes do marxismo que proliferaram no século XX. O método dialético proposto por Marx possui quatro características fundamentais: tudo se relaciona (lei da atração recíproca e da conexão universal); tudo se transforma (lei da transformação universal e do desenvolvimento incessante); mudança qualitativa; e luta dos contrários. Já no fim da vida, Marx mantinha-se atualizado e aborrecia-se com as deficiências dos socialistas, que se diziam seus seguidores. Sabendo das tolices que eram ditas ou praticadas em seu nome, pilheriou com Engels, afirmando: “o que é certo é que eu – Marx – não sou marxista”. Faleceu em 14 de março de 1883. (Introdução à Sociologia – Reinaldo Dias) Emile Durkheim (1858—1917) É considerado por muitos estudiosos o fundador da sociologia como ciência independente das demais Ciências sociais. Ao preconizar o estudo dos fatos sociais como coisas, através de regras de rigor científico, determinou o seu objeto, próprio dos estudos sociológicos, e sua metodologia. 12 Na obra “A Divisão do Trabalho Social” enuncia dois princípios básicos: consciência coletiva e solidariedade mecânica e orgânica. Por consciência coletiva entende-se soma decrenças e sentimentos comuns à média dos membros da comunidade formando um sistema autônomo, isto é, uma realidade distinta que persiste no tempo e une as gerações. A consciência coletiva envolve quase que completamente a mentalidade e a moralidade do individuo: o homem - primitivo pensa, sente e age conforme determina ou prescreve o grupo a que pertence. Durkheim acusa a existência, em cada indivíduo, de duas consciências, a coletiva e a individual, a primeira, predominante, compartilhada com o grupo; a segunda, peculiar ao individuo. Nas sociedades “primitivas”, a consciência coletiva subjuga a individual e as sanções aplicadas ao indivíduo, que foge as normas de conduta do grupo, são extremamente severas. À medida que as sociedades se tomam mais complexas, a divisão de trabalho e as consequentes diferenças entre os indivíduos conduzem a uma crescente independência das consciências. As sanções repressivas, que existem nas “sociedades primitivas”, dão origem a um sistema legislativo que acentua os valores da igualdade, liberdade, fraternidade e justiça. A coerção social não desaparece, pois a característica da sociedade moderna - os contratos de trabalho - contém elementos predeterminados independentes dos próprios acordos pessoais. Ex. Cabe ao Estado determinar a duração do período de trabalho, o salário mínimo e as condições em que se realiza o trabalho físico. As “primitivas” coletividades humanas são caracterizadas pela solidariedade mecânica, que se origina das semelhanças entre os membros individuais. Para a manutenção dessa igualdade, necessária à sobrevivência do grupo, deve a coerção social, baseada na consciência coletiva, ser severa e repressiva. Essas sociedades não podem tolerar as disparidades, a originalidade, o particularismo, tanto nos indivíduos quanto nos grupos, pois isso significaria um processo de desintegração. Todavia, o progresso da divisão de trabalho faz com que a sociedade de solidariedade mecânica de transforme. O princípio de divisão do trabalho está baseado nas diversidades das pessoas e dos grupos e se opõe diretamente à solidariedade por semelhança. A divisão do trabalho gera um novo tipo de solidariedade, baseado na complementação de partes diversificadas. O encontro de interesses complementares cria um laço social novo, ou seja, um outro tipo de princípio de solidariedade, com moral própria, e que dá origem a uma nova organização social. Dürkheim denomina de solidariedade orgânica esta solidariedade, não mais baseada nas semelhanças entre indivíduos e grupos, mas na sua independência. Sendo seu fundamento a diversidade, a solidariedade orgânica implica maior autonomia com uma consciência individual mais livre. Em 1895, Dürkheim publica As Regras do Método sociológico. É o seu tratado mais importante, pois estabelece as regras que devem ser seguidas na análise dos fenômenos sociais. Para este autor, a primeira regra, fundamental, relativa à observação dos fatos sociais, consiste em considerá-los como “coisas”. Somente assim, desvinculada de concepções filosóficas e não subordinadas às noções biológicas e psicológicas, a Sociologia pode manipular, com finalidade de estudo e análise, os fenômenos sociais. “Coisas” opõem-se a “idéias”, como as coisas exteriores se opõem às interiores. Ao escolher seu método de pesquisa, o sociólogo deve selecionar um grupo de fenômenos cujos caracteres exteriores comuns sejam previamente definidos, e analisar todos os que correspondam a esta definição. Ainda mais, sabendo-se que uma mesma causa dá origem a um mesmo efeito, a explicação de um fato social complexo requer o conhecimento de seu ndesenvolvimento através de todos os tipos de sociedades. Na análise dos fenômenos sociais como “coisas”, o pesquisador deve abandonar as pré- noções e a pressuposição do significado ou caráter de uma prática ou instituição social. Deve ser objetivo e estabelecer, através da investigação, o proprio significado do fenômeno estudado, dentro da sociedade particular em pauta. Deve considerar somente os fenômenos que se apresentam isolados de manifestações individuais. 13 Para explicar um fenômeno social, deve-se procurar a causa que o produz e a função que desempenha. Procura-se a causa nos tatos anteriores, sociais e não individuais; e a função, através da relação que o fato mantém com algum fim social. Dürkheim, ao estabelecer as regras de distinção entre o normal e o patológico, propôs: um fato social é normal, para um tipo social, determinado, quando considerado numa determinada fase de seu desenvolvimento, desde que se apresente na média das sociedades da mesma categoria, e na mesma fase de sua evolução. Esta regra estabelece uma norma de relatividade e de objetividade na observação dos fatos sociais, como foi ilustrado em sua obra sobre o suicídio. Demonstra também, que certos fenômenos sociais, tidos como patológicos, só o são à medida que ultrapassam uma taxa dita “normal”, em determinado momento, em sociedades de mesmo nível ou estágio de evolução. Na obra suicídio (1897), Émile Dürkheim demonstra que o suicídio varia inversamente ao grau de integração do grupo social ao qual o indivíduo faz parte, com algumas exceções por ele apontadas. A lei do suicídio de Dürkheim é considerada uma lei sociológica em virtude de as variáveis constituirem fenômenos sociais: a taxa de suicídio, representando um traço característico de um grupo, e o grau de coesão que, além de ser um traço do grupo, aparece também como caracterítico desse grupo. Assim, se a sociologia estuda fatos sociais, uma proposição que estabeleça relação de regularidade entre eles é uma lei sociológica.( Sociologia Geral- Lakatos) Para Dürkheim, o objeto de estudo da sociologia são os fatos sociais, que “apresentam características muito especiais: consistem em maneiras de agir, pensar e sentir exteriores ao indivíduo, e dotadas de um poder coercitivo em virtude do qual se lhe impõem”. Para ele, o fenômeno social constitui-se do fato social, que pode ser religioso, político, literário, artístico, etc. e que é externo ao indivíduo e determinador de suas ações. A sociedade, que é externa aos indivíduos, determina as interações sociais. Filme 1- www.youtube.com/watch?v=D6BY6LtK9xQ Filme 2- www.youtube.com/watch?v=LJENpHfaS_k Max Weber (1864-1920). Segundo Max Weber a sociologia é o estudo das interações significativas de indivíduos que formam unia teia de relações sociais, sendo seu objetivo a compreensão da conduta social. Esta ênfase dada à compreensão subjetiva levou Weber a definir ação social como a conduta humana pública ou não, a que o agente atribui significado subjetivo. Para Weber, a conduta social se apresenta em quatro formas ou categorias: • A conduta tradicional, relativa às antigas tradições; • A conduta emocional, reação habitual ou comportamento dos outros, expressando-se em termos de lealdade ou antagonismo. • A conduta valorizadora, agindo de acordo com que os outros indivíduos esperam de nós; • A conduta racional-objetiva, que consiste em agir segundo um plano concebido em relação à conduta que se espera dos demais. A contribuição de Max Weber à metodologia foi a distinção preconizada entre o método científico de abordar os dados sociológicos e o método do valor-julgamento: a validade dos http://www.youtube.com/watch?v=D6BY6LtK9xQ http://www.youtube.com/watch?v=LJENpHfaS_k 14 valores é um sistema de fé, não de conhecimentos e, em consequência, as Ciências sociais devem libertar-se do0s valores. O principal objetivo da análise sociológica é a formulação de regras sociológicas concretas que exigia conceitos precisos e claramente definidos- o tipo ideal. Quando a realidade concreta é estudada desta forma, torna-se possível estabelecer relações causais entre seus elementos. A obra A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo permite verificar esta relação. Por espírito, o autor entendiaum sistema de máximas de comportamento humano. Estudando as sociedades capitalistas ocidentais e depois confrontando seus dados com estudos realizados na China e na Índia, Weber chegou à conclusão de que o surgimento do capitalismo não é automáticamnte assegurado só por condições econômicas específicas; deve haver pelo menos uma segunda condição. Essa condição deve pertencer ao mundo interior do homem, isto é, existe forçosamente um poder motivador específico qual seja, a aceitação psicológica de idéias e valores favoráveis a essa transformação. (Sociologia Geral – Lakatos) A “ação social” A ”ação social” toma o significado de uma ação que, quanto ao sentido visado pelo indivíduo, tem como referência o comportamento dos outros, orientando-se por estes em seu curso, A ação social é a conduta humana pública ou não a que o agente atribui um significado subjetivo. É quando agimos tendo como referência o comportamento dos outros, ou levando estes em consideração. filme www.youtube.com/watch?v=ea-sXQ5rwZ4 No Brasil foram muitos os pensadores que contribuíram para o avanço da análise da realidade social. Podemos destacar dois como referências fundamentais no campo da sociologia: Gilberto Freyre e Florestan Fernandes. Gilberto Freyre adotou uma perspectiva nos seus trabalhos em que o indivíduo, suas particularidades, suas intimidades e seu modo de pensar predominam em relação aos fatos mais marcantes da história; um tipo de abordagem que podemos chamar de “sociologia do cotidiano” e que ele mesmo denominou como “sociologia existencial”. Em todo trabalho de Florestan Fernandes a reflexão principal é a desigualdade social, procurando identificar as contradições da sociedade de classes e o papel da sociologia diante dessa realidade. (Introdução à Sociologia – Reinaldo Dias) http://www.youtube.com/watch?v=ea-sXQ5rwZ4 15 Conceitos básicos em Sociologia Processos Sociais: Isolamento Social: pode ser entendido como a falta de comunicação ou de contato entre grupos e indivíduos. Contato Social: é o aproximar-se ou o afastar-se que acontece no relacionamento social. O contato é um aspecto primário, fundamental, do qual dependerão todos os outros processos ou relações sociais. No contato social os meios físicos são apenas instrumentos: o abraço, o beijo, o polegar para o alto, etc.; o importante no contato é a interpretação, o significado. Interação Social: pode ser conceituada como a ação social, mutuamente orientada, de dois ou mais indivíduos em contato. É a reciprocidade das ações sociais. Envolve significados e expectativas em relação às ações de outras pessoas. Interação é a ação recíproca de ideias, atos e sentimentos entre pessoas, grupos, entre pessoas e grupos. Implica numa modificação de comportamento. R. Dias Comunicação: é o processo pelo qual ideias e sentimentos se transmitem de indivíduo para indivíduo, tornando possível a interação social. A comunicação é fundamental para o homem, enquanto ser social, e para a cultura. Pode dar-se através de: meios não vocais: expressões, traços fisionômicos etc., que determinam sentimentos de alegria, tristeza, espanto, desagrado, raiva. sons inarticulados: baseados em emoções e inflexões de voz, determinados sons que não são palavras. palavras e símbolos: as diferentes linguagens: oral, escrita, musical, pictórica. “meios técnicos de comunicação”: imprensa; rádio; tv; internet; celular. Socialização: é o processo social pelo qual o indivíduo biológico se transforma no indivíduo social. Socialização, segundo Guy Rocher, é “o processo pelo qual ao longo da vida a pessoa humana aprende e interioriza os elementos sócio-culturais do seu meio, integrando-os na estrutura de sua personalidade sob a influência de experiências de agentes sociais significativos, e adaptando-se assim ao ambiente social em que se deve viver”. Cooperação: é o tipo particular de processo social em que dois ou mais indivíduos ou grupos atuam em conjunto para a consecução de um objetivo comum. É requisito especial e indispensável para a manutenção e continuidade dos grupos e sociedades. Competição: Em todas as sociedades existem diferenças de capacidades e de desejos entre os seus componentes. Para a satisfação de suas necessidades, os indivíduos (e grupos menores) de forma universal, competem entre si, com maior ou menor energia. A competição é pois, a forma mais elementar e universal de interação, consistindo na luta incessante por coisas concretas. É uma contenda contínua, inconsciente e impessoal. 16 Conflito: é uma contenda entre indivíduos e grupos, em que cada qual dos contendores almeja uma solução que exclui a desejada pelo adversário. Diferente da competição, em que a luta tem a característica de ser impessoal, no conflito a luta é pessoal. Acomodação: é um processo social com o objetivo de diminuir o conflito entre indivíduos e grupos, reduzindo o mesmo e encontrando um novo modus vivendi. É um ajustamento formal e externo, sendo pequena ou nula a mudança interna, relativa a valores, atitudes e significados. Assimilação: é o processo social em virtude do qual indivíduos e grupos aceitam e adquirem padrões comportamentais, tradição, sentimentos e atitudes de outra parte. É um indício de integração sócio cultural e ocorre principalmente nas populações que reúnem grupos diferentes. Os indivíduos assimilam-se entre si, partilham sua experiência e sua história, e participam da vida cultural comum. Status e Papel social Status é o lugar ou posição que a pessoa ocupa na estrutura social, de acordo com o julgamento coletivo ou consenso de opinião do grupo. Portanto o status é a posição em função dos valores sociais correntes na sociedade. Um papel social é um conjunto de direitos, obrigações e expectativas culturalmente definidos que acompanham um status na sociedade. A cada posição social (status) ocupada por uma pessoa corresponde um determinado papel social. Papel é o comportamento socialmente esperado de uma pessoa que detém um certo status. Cada pessoa pode ter inúmeros status aos quais correspondem papéis apropriados. Controle social As sanções, positivas ou negativas, possuem dupla função: de um lado, assegurar a conformidade das condutas, permitindo a coesão e o funcionamento das coletividades e, de outro, desencorajar o não-conformismo perante as normas estabelecidas. Guy Rocher define controle social como: “o conjunto de sanções positivas e negativas a que uma sociedade recorre para assegurar a conformidade das condutas aos modelos estabelecidos”. Estratificação social Os indivíduos e grupos de uma sociedade diferenciam-se entre si em decorrência de vários fatores, formando uma hierarquia de posições, estratos ou camadas mais ou menos duradouros. Esse fato, observado em todas as sociedades, significa que nelas os indivíduos e grupos não possuem a mesma posição e os mesmos privilégios, mas, sob esse aspecto, diferem entre si. Portanto, inexistem sociedades igualitárias puras. A essa diferenciação de indivíduos e grupos em camadas hierarquicamente sobrepostas é que denominamos de estratificação. Um dos primeiros pensadores a tratar do problema da estratificação foi Karl Marx. Marx considerava o fator econômico como determinante da estratificação. Max Weber, refutando a posição de Karl Marx, fez uma distinção entre as três dimensões da sociedade: a ordem econômica, representada pela classe, a ordem social, pelo status ou “estado”, e a ordem política, pelo partido. Cada uma das três dimensões possui uma 17 estratificação própria: o interesse econômico é fator que cria uma classe, podendo-se até considerar que as classes estão estratificadas segundo suas relações com a produção e a aquisição de bens; a estratificaçãoeconômica é, portanto, representada pelos rendimentos, bens e serviços que o indivíduo possui ou dispõe. Os grupos de status estratificam-se em função do princípio do consumo de bens, representados pelos estilos de vida específicos; a estratificação social é, portanto, evidenciada pelo prestígio e honra desfrutados. A dimensão política manifesta-se através do poder; a estratificação política é, assim, observada através da distribuição do poder entre grupos e partidos políticos, entre indivíduos no interior dos grupos e partidos, assim como entre os indivíduos na esfera da ação política. Mobilidade Social “Por mobilidade social entende-se toda passagem de um indivíduo ou de um grupo de uma posição social para outra, dentro de uma constelação de grupos e estratos sociais.” Grupo social Segundo Fichter grupo social é “uma coletividade identificável, estruturada, contínua, de pessoas sociais que desempenham papéis recíprocos, segundo determinadas normas, interesses e valores sociais, para a consecução de objetivos comuns”. Mudança social Segundo Rocher, mudança social é “toda transformação observável no tempo que afeta, de maneira que não seja provisória ou efêmera, a estrutura ou o funcionamento da organização social de dada coletividade e modifica o curso de sua história. É a mudança de estrutura resultante da ação histórica de certos fatores ou de certos grupos no seio de dada coletividade”. Divisão social e técnica do trabalho A divisão social do trabalho é a responsável pela sobrevivência da humanidade perante os demais animais. O homem não é tão bem equipado fisicamente como os demais animais, e, nessas condições, suas chances de sobrevivência seriam mínimas. O que permitiu o domínio humano sobre a natureza e os seus seres foi a divisão do trabalho. Essa possibilita que, simultaneamente, a espécie humana desenvolva várias atividades antes exclusivas de determinados animais; assim, o homem é ao mesmo tempo “tecelão, pescador, construtor e mil outras coisas combinadas...” (Braverman). Desse modo, cada homem desenvolve um trabalho que é social na medida em que pertence a uma divisão estabelecida pelas sociedades humanas em que cada um realiza um tipo de atividade. Somadas, essas atividades tornam a espécie humana mais capacitada a sobreviver do que determinadas espécies incapazes de realizar trabalho por meio da divisão social de ocupações e ofícios. Do ponto de vista do controle operário, no âmbito da organização industrial, o capitalismo criou a divisão do trabalho na produção (técnica). Nessa, cada atividade, ofício ou tarefa foi parcelado de tal modo que tornou o trabalhador incapaz de acompanhar qualquer processo produtivo completo. A divisão de trabalho na fábrica é diferente da 18 social. Ocorre que o capital, ao realizar a divisão técnica do trabalho nas fábricas, parcelou a ocupação ou o ofício que pertencem à divisão social do trabalho na sociedade. Por exemplo, o ofício de tecelão pertence à divisão social de trabalho na sociedade na medida em que existem pessoas que desenvolvem essa ocupação e possuem conhecimento necessário para a produção do tecido. Na sociedade industrial, o ofício deixa de existir, sendo substituído pela indústria têxtil, na qual o conhecimento da produção de tecido é exclusivo do capitalista, proprietário da fábrica. Assim, os trabalhadores perdem esse conhecimento e realizam apenas uma parcela da atividade necessária à produção do tecido. (Reinaldo Dias – Introdução à Sociologia) Leitura: O Econômico Em Platão - Assim, quando um indivíduo chama outro para ajudá-lo em algum empreendimento, e mais um terceiro para outra precisão, desse modo, por serem múltiplas as necessidades de cada um, vários indivíduos se reúnem no mesmo local, para reciprocamente se auxiliarem. Damos o nome de cidade a semelhante ajuntamento, não é verdade? - Perfeitamente. - Mas alguém só entrega alguma coisa a quem quer que seja, no caso de ter o que dar ou de receber também algo, de que se espera auferir alguma vantagem. - Isso mesmo. - Muito bem, lhe disse; façamos então, surgir em pensamento uma cidade desde o seu começo. Em sua origem, ao que parece, estão nossas necessidades. - Que mais poderia ser? - Mas a primeira e maior necessidade é encontrar alimentos, base imprescindível da existência e da vida. - Sem dúvida nenhuma. - A segunda é moradia; a terceira, vestes e coisas semelhantes. - Isso mesmo. - Vejamos agora, continuei, de que modo a cidade se arranjará para suprir tantas necessidades. Alguém não terá de ser lavrador, um outro, pedreiro, e um terceiro, tecelão? E não será bom acrescentarmos a esses um sapateiro ou mais algum artesão para outras necessidades do corpo? - Perfeitamente. - Sendo assim, a cidade mais rudimentar deverá constar no mínimo de quatro ou cinco pessoas. - Parece que sim. - E então? Deverá cada um por à disposição dos demais o resultado do seu trabalho, como por exemplo, o lavrador que, sendo um somente, produzirá alimento para quatro, gastando quatro vezes mais tempo no esforço de assegurar a alimentação dos outros, ou de preferência, sem preocupar-se com estes, só cuidará de obter para si mesmo um quarto desse alimento na quarta parte do tempo, empregando as outras três na construção de sua casa, ou no preparo de vestes e de sapatos, sem se incomodar de trabalhar para os outros e suprindo sozinho a todas as suas necessidades? Nessa altura, Adimanto observou: - talvez, Sócrates, a primeira hipótese seja mais cômoda do que a outra. - Sim, por Zeus, voltei a falar; e não seria nada de admirar; para começar, enquanto falavas, ocorreu-me que não somos iguais por natureza, mas nascemos com disposições diferentes, cada um com mais jeito para determinado trabalho, não te parece? - É também o que eu penso. - E então? Como fará alguém trabalho mais perfeito: aplicando-se ao mesmo tempo a muitas atividades ou dedicando-se apenas a uma? - Apenas a uma, respondeu. 19 - Outro ponto, lhe disse, se me afigura evidente: todo trabalho que não é feito no tempo certo acaba por perder-se. - Sem dúvida. - Porque, a meu ver, lhe falei, o que tem de ser feito não espera pela disposição do trabalhador, sendo de necessidade que este se dedique seriamente ao seu ofício, em vez de considerá-lo mero passatempo. - É fato. - Por conseguinte, tudo se fará em maior quantidade, mais facilmente e melhor quando cada pessoa puder trabalhar de acordo com suas aptidões e no tempo certo, e deixar tudo o mais de lado. - Sem dúvida. - Então Adimanto, precisaremos de muito mais de quatro cidadãos para as necessidades que enumeramos. Pelo que vemos, o agricultor não irá preparar seu próprio arado, se tiver este de sair bem feito, nem sua enxada e os demais utensílios para trabalhar a terra; o pedreiro também, não fabricará seus instrumentos de trabalho, e são vários os de que ele necessita, o mesmo acontecendo com o tecelão e o sapateiro. - É muito certo. - Sendo assim, passarão a fazer parte de nossa pequena cidade carpinteiros, ferreiros e muitos outros profissionais que a deixarão consideravelmente aumentada. - Exato. - Porém ainda não ficará muito grande, se a esses agregarmos boieiros e pastores de ovelhas e de outros animais, para que agricultores disponham de bois para o arado, e de bestas os construtores para o transportarem com os lavradores, e tenham peles e lãs os tecelões e os sapateiros. - Deixaria de ser uma cidade pequena a que congregasse tanta gente. - Porém, seria quase impossível fundar uma cidade num local que não fosse necessário importar nada. - Impossível realmente. - Precisará, portanto, de novos cidadãos que lhe tragam de outras cidades o de que ela necessita. - É fato. - Mais, se o emissário for de mãos vazias, sem levar nada do que precisam os que devem suprir as necessidadesde seus concidadãos, voltará também de mãos abanando, não te parece? - Penso que sim. - Não deverão, portanto, produzir em casa apenas para o gasto, mas tudo em quantidade e variedade suficientes para atender aos pedidos dos que lhe suprem as necessidades. - É isso mesmo. - Precisamos, por isso, aumentar o número dos trabalhadores agrícolas e dos artesãos de nossa cidade. - Precisamos, de fato. - E também o dos incumbidos de importar ou de exportar as mercadorias, a saber: os comerciantes, não é verdade? - Sem dúvida. - Sendo assim, vamos precisar também de comerciantes? - Perfeitamente. - E se o comércio se fizer por mar, precisaremos ainda de um número maior de trabalhadores, justamente dos que têm prática na vida do mar. - Muito maior, sem dúvida. 20 - E com respeito à própria cidade, de que modo será feita a permutação do que cada um produzir com seu trabalho? Foi para isso, precisamente, que se congregaram e fundaram a cidade. - É evidente, respondeu, que será por meio de compra e venda. - Daí, então, terá de surgir um mercado e a moeda representativa do valor das trocas. - Perfeitamente. De Diálogos, vol VI-VII, A República, Belém, UFPA, 1976. Tradução de C. A. Nunes 21 O Estudo Sociológico das Organizações Causa do surgimento da Sociologia das Organizações: as profundas transformações na sociedade causadas pela Revolução Industrial principalmente dentro das empresas industriais. Podemos indicar o trabalho de Max Weber como o marco inicial da Sociologia das Organizações. Embora Weber tenha estudado a burocracia sob a perspectiva histórica e focado principalmente a mudança dos padrões de autoridade política e organizações governamentais, a maioria das pesquisas que se seguiram – e baseadas em seus estudos – tinham como foco as empresas e apresentavam pouco interesse nas comparações históricas que o motivaram. No entanto, as ideias de Weber constituem uma contribuição fundamental com muitas implicações, e não foram questionadas em sua essência por estudos posteriores. Para vários autores, entre os quais Morgan, que considera que a teoria abrangente de organização e administração recebeu uma importante contribuição deste sociólogo, que observou paralelos entre a mecanização da indústria e a proliferação de formas burocráticas de organização. Identificou que “as formas burocráticas rotinizam os processos de administração exatamente como a máquina rotiniza a produção”. A questão organizacional é uma das dimensões centrais da empresa, e é por isso que a sociologia das organizações se ocupou desta instituição muito mais que os outros ramos da sociologia. De fato os estudos organizacionais, de um modo geral, são feitos sobre e para as empresas. No entanto, o objeto da sociologia das organizações não se esgota na empresa, mas se estende a todas as organizações, incluídas aquelas cujos objetivos e funcionamento são claramente disfuncionais para a sociedade (p/ex.: as organizações criminosas). Etzioni considerava que a sociologia organizacional focalizava o estudo das organizações de acordo com quatro pontos de vista: 1. As organizações são analisadas como unidades sociais, e o interesse se divide entre o estudo da estrutura formal e o da não formal. 2. O estudo das organizações aborda a relação de uma estrutura organizacional, como unidade, com outras estruturas de organizações, e com unidades sociais que não são organizações (coletividades), tais como: família, comunidades, grupos étnicos, classes sociais, a sociedade. 3. As organizações são analisadas do ponto de vista de suas relações com a personalidade e a cultura. Quanto à personalidade, relacionam-se com as necessidades da estrutura organizacional e as necessidades das personalidades dos participantes. O estudo das relações da organização como sistemas culturais, abrange por um lado, as orientações de valor, as fontes de legitimação da autoridade e as relações dinâmicas entre os ideais e os objetivos da organização e as necessidades da própria estrutura organizacional, e por outro lado envolve os meios pelos quais o conhecimento é adquirido e institucionalizado dentro das organizações. 4. A relação entre as organizações e o meio ambiente incluiria o estudo do comportamento das organizações relacionado com a capacidade biológica e fisiológica, inclusive as necessidades dos participantes e o estudo das respectivas adaptações entre a organização e o ambiente geográfico. A sociologia das organizações tem como conteúdo central o estudo de cinco grandes características que são encontradas em todas as organizações: Alguns objetivos específicos que orientam os outros aspectos estruturais e funcionais; Uma rede de posições ocupadas por indivíduos substituíveis; Uma dedicação responsável às tarefas de sua posição por parte dos indivíduos que a ocupam; Uma estrutura ou sistema estável e coordenado de relações entre as diferentes posições; Um ou mais centros de poder que controlam a atividade da organização e a dirigem para a realização de seus objetivos. 22 Hoje, a sociologia organizacional se preocupa em estudar as formas organizacionais como sistemas sociais em contínua interação com seu ambiente externo, que gera efeitos em seus processos internos (os indivíduos, suas interações, comportamentos, processos sociais básicos, relações de poder, etc.) e a organização como um todo. O indivíduo Sociologia Das organizações Aborda o fenômeno organizacional tendo com referencial básico: A organização A ação da organização na sociedade Indivíduo: os problemas objeto de estudo são aqueles que dizem respeito às pessoas que pertencem à organização, ao tipo e ao grau de participação, seu comportamento, motivação, cultura adquirida, identificação com a organização etc. Organização: é considerada como um todo complexo, e o seu estudo foca a estrutura (hierárquica, física, de dominação, de relações de poder), os diversos subsistemas que contém (técnico, de normas, entre outros), a ideologia, os fins, objetivos e metas. Incluem-se neste referencial, também, os processos de cooperação, os conflitos, a comunicação, a influência do ambiente externo na organização, entre outros. Ação na sociedade: da relação com seu público externo, com as instituições públicas, privadas e do terceiro setor, e da comunidade que vive em seu entorno imediato. O estudo sociológico das organizações A origem da palavra organização ( em grego – organon, que significa ferramenta ou instrumento) fornece uma boa ideia do seu significado. Nesse sentido, as organizações podem ser entendidas como instrumentos utilizados pelo homem para desenvolver determinadas tarefas que não seriam possíveis de ser realizadas por um indivíduo em particular. Conceitos: Peter Drucker, “é um grupo humano, composto por especialistas que trabalham em conjunto em uma tarefa comum” Anthony Giddens: “Uma organização é um grande agrupamento de pessoas, estruturadas em linhas impessoais e estabelecida a fim de atingir objetivos específicos”. Amitai Etzioni: “são unidades planejadas, intencionalmente estruturadas com o propósito de atingir objetivos específicos”. Para ele, as organizações apresentam três características: Divisões de trabalho, poder e responsabilidades de comunicação, que são planejadas intencionalmente com o objetivo de intensificar a realização de objetivos específicos. A presença de uma ou mais centros de poder que controlam os esforços combinados da organização, direcionando-os para que sejam atingidos os objetivos propostos; estes centros de poder devem reexaminar continuamente as atividades da organização e, quando necessário, reordenar sua estrutura, a fim de aumentar sua eficácia. Substituição de pessoal, quando não satisfaz aos padrões estabelecidos pela organização; nesse caso, pessoas podem ser demitidas, sendo designadas outras para as tarefas. A organização pode, também, promover uma realocação interna de seu pessoal, através de transferências e promoções. 23 São sistemas sociais Pessoas associadas Perduram no tempo Organizações São universais Tem identidade própria Tem sistema de comunicação Divisão do trabalho São sistemas sociais: as organizações reproduzem, de certo modo, as sociedades humanas e os relacionamentos nela existentes, assim constituem-se em sistemas sociais, onde cada indivíduo assume um papel social que deve desempenhar para a manutenção do conjunto. Como sistemas sociais, as organizações possuem regras de convivência humana perfeitamente estabelecidas e que ditam como devem ocorrer os relacionamentos cotidianos para que os objetivos sejam alcançados. Compreendem grupos de pessoas associadas: as organizações reúnem grupos de pessoas que buscam atingir objetivos comuns, através do estabelecimento de relações formalizadas, e, caso haja necessidade, qualquer membro pode ser substituído, sem que ocorra risco à sobrevivência da entidade. Perduram ao longo do tempo: as organizações podem perdurar muito mais tempo do que os indivíduos que as criaram. São universais: podem existir em qualquer lugar em que seja necessária uma atividade coletiva para se atingirem determinados objetivos. As vantagens obtidas na coordenação e divisão do trabalho podem ser estendidas para qualquer lugar onde haja necessidade da colaboração de várias pessoas para se atingir determinado objetivo comum. Apresentam identidade própria: o conjunto de pessoas que conformam a organização segue regras pré-determinadas, e atua como um todo roganizado e com características próprias na sociedade em que se situa. Assim, as organizações, e as pessoas que as representam ou nelas atuam, na sua relação com as outras organizações e indivíduos apresentam determinadas tendências de ação que somadas constituem sua identidade organizacional. Essa identidade organizacional faz com que as organizações constituam juntamente com as pessoas as sociedades atuais, o que nos permite afirmar que as sociedades são formadas por organizações e indivíduos, no sentido de que ambos (organizações e indivíduos) apresentam características identitárias próprias. Este fato tem reconhecimento legal, pois as organizações podem ser reconhecidas como pessoas jurídicas, capazes de adquiris direitos e contrair obrigações. Assim temos pessoas físicas (indivíduos) e as pessoas jurídicas (organizações). Apresentam um sistema de comunicação: este sistema é crucial para o perfeito funcionamento da organização. Torna-se mais importante na medida do aumento do tamanho da estrutura organizacional. Um sistema de comunicação se destina a regular as relações entre os indivíduos, estabelecer e consolidar os diferentes níveis de autoridade, e ainda é essencial no controle social da direção sobre o trabalho executado nos diversos setores da organização. O fluxo contínuo de informações verticais, tanto de coma para baixo como de baixo para cima, é o que vai determinar um maior ou menor controle da organização por parte de seus dirigentes. Vale lembrar de que não se 24 pode ignorar a existência de um sistema informal de comunicação que coexiste com o sistema formal. Multiplicam a capacidade individual através da divisão do trabalho: ao se dividirem as tarefas entre vários indivíduos, o resultado final não será a soma dos esforços individuais, mas sim algo muito maior. Este é o efeito multiplicador das capacidades individuais associadas que apresentam as organizações. – Este é um ponto crucial para as organizações, pois o parcelamento das atividades em processos executados por diferentes pessoas faz com que aumente a eficiência e se produzam melhores resultados do que a soma dos trabalhos individuais. As organizações como agentes sociais As organizações devem ser consideradas como agentes sociais coletivos que influenciam e determinam a vida de outros agentes (coletivos e individuais). Tomando como exemplo uma organização econômica (empresa), temos como principais âmbitos em que intervém: Criação do mercado de trabalho, entendido como conjunto de práticas que regulam a contratação e o controle da atividade produtiva dos trabalhadores; Contribuição eficaz e decisiva para a estratificação social; Modificação do meio natural ou ecológico, do qual toma seus recursos e sobre o qual intervém de muitos modos ao longo do processo produtivo; Através da produção de mercadorias, ou seja, bens e serviços que se oferecem ao mercado mediante um preço: -produz valores de uso, bens úteis, que respondem a necessidades individuais e coletivas, reais ou fictícias, naturais ou criadas; -produz valores de troca, cujos preços são construídos pelas empresas; -cria identidade, não somente dentro das organizações, mas também no contexto da sociedade, ao relacionar o consumo de certos produtos com a posição social, ou com o pertencimento a determinados setores sociais. É a busca permanente de novas formas de gosto como afirmação da própria identidade. Podemos proceder do mesmo modo com outros tipos de organizações não econômicas, demonstrando seu relevante papel social e a dependência da sociedade em relação a elas. Principais tipos de organizações: Características: Administração pública Empresas (setor privado) Organizações sociais (terceiro setor) Modo primário de filiação obrigatório voluntário Voluntário Fundamento da filiação primária cidadania propriedade inscrição Fundamento da filiação secundária emprego emprego emprego Tipos de tarefas geral específica específica Estrutura primária de poder estrutura política propriedade estrutura participativa Administração pública: sua finalidade principal é a prestação de serviços básicos aos cidadãos ou a cobertura de setores estratégicos definidos a partir do bem comum. Nesse tipo de organização, o objetivo principal não é o benefício econômico, mas a prestação de um serviço social como exigência do bem público. Devidos às relações de poder existentes em seu seio, apresenta uma estrutura hierarquizada, com um sistema de posições fixas e consolidadas, que lhe impõe um certo grau de rigidez estrutural. 25 Organizações sociais: este tipo busca objetivos de caráter solidário, de modo geral benéficos. Tanto as suas estruturas como os meios com que contam são otimizados para melhorar o alcance da organização. Diferentemente da administração pública, cujo orçamento prevê o necessário para cobris as despesas anuais, ou da empresa, que fixa o objetivo econômico a ser alcançado, nas organizações sociais faz-se uma previsão do que será necessário e se buscam os meios humanos e materiais em função das necessidades colocadas, de tal modo que os objetivos se definem operacionalmente de acordo com os meios disponíveis. Possui um caráter voluntário, altruísta e com uma estrutura menos hierarquizada. Empresas: o objetivo final e principal é o benefício econômico, a partir do qual se desenvolve sua estrutura, que se adapta às situações novas de acordo com a necessidade de otimizar os recursos disponíveis. Daniel Katz e Robert Kahn (Psicologia Social das Organizações) reconhecem 04 tipos de organizações: Organizações produtivas ou econômicas: ocupam-se da criação de capital, manufatura de mercadorias e da prestação de serviços ao público. Podem ser subdivididas em: primárias – lavoura e mineração -; secundárias – manufatura e processamento -; e, terciárias – serviços e comunicações. Organizações de manutenção: se dedicam à socialização das pessoas para cumprir seus papéis em outras organizações e na sociedade de modo geral.
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