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11111Lato & Sensu, Belém, v. 4, n. 1, p. 3-5, out, 2003. 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 A SOCIEDADE PÓS-MODERNA E O FENÔMENO DAS TRIBOS URBANAS Isabela Fonseca Cardoza1 1 Graduanda de Psicologia da Universidade da Amazônia, bolsista de Iniciação Científica do CNPq, do Projeto Encontros Transculturais: sua importância para o pensar e o agir democrático na formação de educadores. RESUMO. O trabalho exposto abordará o fenômeno das Tribos Urbanas, realizando uma análise comparativa das conseqüências comportamentais dos atores sociais, pertencentes a estas tribos, com a Teoria do Inconsciente apresentada por Sigmund Freud, no final do século XIX. Essa comparação é necessária porque se percebe que os sujeitos contemporâneos fazem parte de uma sociedade definida por um inconsciente coletivo governante, encarnado através da sociedade de consumo, da ética da estética corporal e da autonomia da identificação com o outro apenas através de atitudes. Constatando-se, que o sujeito contemporâneo é movido pela condição de desamparo e, para garantir uma aceitação social, busca muitas vezes a participação em uma “tribo”, descolando-se de seu próprio ego em prol do ego do grupo, caracterizando o fenômeno do tribalismo pós-moderno. PALAVRAS-CHAVE: Socie- dade Pós-moderna; Tribos Urba- nas; Teoria do Inconsciente; Éti- ca da Estética Corporal; Socie- dade de Consumo; Inconsciente Coletivo. É importante ressaltar des- de o início, que neste trabalho não se pretende criticar, fazer qual- quer doação de idéia ortodoxa ou verdade absoluta e irrevogável, pois em se tratando de sociedade pós-moderna todo o cuidado é pouco para que não se provoque um apocalipse das palavras, ou dos pensamentos que já se en- contram justapostos e recortados por uma gama de intelectuais, entre os quais destacam-se, Michel Maffesolli, Mike Featherstone, Alain Touraine e Antohony Giddens, que serão de suma importância para toda a construção dos temas abordados. Assim, tem-se como ob- jetivos a explicação de como se estrutura o fenômeno das Tribos Urbanas, e a realização de uma análise comparativa sobre as ar- ticulações sociais e psíquicas, dos bastidores dos sujeitos humanos, atores de uma sociedade pós- moderna dotada de toda uma gama de complexidade que defi- ne novos padrões para um com- portamento, uma estética, e um estar junto ao outro, muito parti- cular e singular. Fazendo-se necessário um olhar ao avesso que não mais parte do individualismo, de um indivíduo senhor de si, mas de um inconsciente que governa, e de uma necessidade de identificação e adequação a uma atomização social, determinada por uma me- táfora de tribos e mais tribos, que se multiplicam na paisagem ur- bana do mundo jovem. 22222 Lato& Sensu, Belém, v.4, n.2, p. 6, out, 2003. 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 Desta forma, a pós- modernidade, caracteriza-se por trazer consigo todas as mudan- ças culturais e sociais, resultan- tes do triunfo do capitalismo so- bre o socialismo real, e do declínio de um individualismo hegemônico, da modernidade fun- dada na máxima da razão, e nos princípios iluministas. O que vem alterar a percepção da realidade do indivíduo, que é obrigado a redefinir suas práticas cotidianas e estar exposto às diferenciações de experiências a serem vivenciadas. Acarretando o declínio das tradições e a acelerada pluralização de grupos primários, a chamada dessocialização2 causada pela cultura de massa, que resulta na constituição de um novo enfoque às subjetividades, designando novas noções de há- bitos e valores nos quais as tribos urbanas encenam um novo cená- rio. O fenômeno das tribos, pode não apenas ser de um todo observado no universo jovem, porém é neste universo que ele mais se perpetua, constituindo a realização da idéia do “ser jovem” como sendo sinônimo da adequa- ção em um universo, ou em uma tribo que tenha o reflexo do mo- derno e do arrojado, e é esta idéia ou ideal que é vendido maciça- mente na sociedade de consumo, vivendo-se o “mito da novidade”, o qual transforma o jovem, e sua idéia acerca de sua auto-imagem, em produtos próprios do merca- do de consumo. Ou seja, a transitoriedade e o imediatismo se congre- gam numa certa apologia do presente vivida na tri- bo, não havendo projetos futuros ou preocupações com o destino da tribo. É o próprio movimento do consumo que determina o futuro destas tribos. (COUTINHO, 2003) Maffesoli (2000) afirma que esta atomização social pre- domina-se como “a massa inde- finida, o povo sem identidade ou o tribalismo enquanto nebulosa de pequenas entidades locais. Tra- tando-se de metáforas que pre- tendem acentuar, sobretudo, o aspecto confusional da sociabili- dade”. Deste modo, a comunida- de emocional3 é vista como algo que nunca existiu, e que hoje ser- ve-se como reveladora da situa- ção presente em que se instaura a palavra “tribo”, apenas como referência para se afirmar uma metáfora de uma articulação do mundo pós-moderno, pois as características atribuídas a estas “comunidades emocionais”3, seriam: o aspecto efêmero, a ins- crição local, a valoração da esté- tica da imagem e a ausência de uma organização e estrutura co- tidiana. Dessa forma, conhecer alguém não mais seria adentrar na sua biografia e estrutura his- tórica familiar, mas sim “agir jun- to”, e esta ação representaria ati- tude, onde se você faz isso e eu também faço, então participo de sua tribo e tenho uma identifica- ção com ela, ou seja, me relacio- no com você. Em algumas tribos tem se apenas olhares rápidos, que não se fixam, entre os próprios membros ou mesmo em relação ao res- to do mundo. A circula- ção parece emergir como um valor em si mesma o que nos remete a própria circulação incessante de objetos e mercadorias em uma sociedade de con- sumo. (CAIAFA, 1985). Constituindo-se, que es- tas coletividades afetivas transi- tórias, caminham sob uma nova ética, a “ética da estética”, em que palavras como intensidade, afeto e imagem, se interagem e determinam a maneira com que o indivíduo se situa no mundo. E para Featherstone (1997) “a éti- ca da estética é o modo contem- porâneo de ordenar-se no mun- do, e ela própria constitui-se num fator de favorecimento ao apa- recimento das tribos”. Onde a beleza e o culto à imagem impe- ram, redefinindo o próprio senso de identidade que este Individuo possa cultivar de si. Desta forma, expõe Cas- tro (1998), os sentimentos de iden- tidade e de pertencimento social 1 Termo utilizado por Alain Touraine no livro intitulado: Poderemos viver juntos? Iguais e Diferentes (TOURAINE, 1999). 2 Termo utilizado por Michel Maffesoli, no livro intitulado: O Tempo das tribos - Declínio do individualismo nas sociedades de massa. 33333Lato & Sensu, Belém, v. 4, n. 1, p. 3-5, out, 2003. 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 1234567890123456789012345678901212345612345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 se apóiam cada vez mais na materialidade dos objetos exter- nos, e o sujeito fica cada vez mais remetido ao objetivo da cultura da materialidade. Assim, há a ten- dência, a se colar a identificação da imagem corpórea, ao asseguramento narcísico do ego, que busca através de uma completude ilusória seus objetivos de fetiches através do reconhe- cimento das tribos, tornando suas identidades tão nômades, e o in- dividualismo do sujeito tão frágil quanto à fluidez da substituição da lógica do consumo do merca- do. A estética que se elabora na imagem parece, ao que tudo indica, pode ser como uma linguagem que impulsiona e favorece a formação de pequenos grupos ou tribos. A efi- cácia da aparência assu- me a função de identificar, de agrupar. Nas grandes cidades, em que os sujei- tos se tornam anônimos na multidão, torna-se possível ser visível, e re- conhecido. (CASTRO, 1998). Sendo o individualismo um formato obsoleto frente à po- tência da impessoalidade, o que Maffesoli (2000) chamará “de um perder-se, em um sujeito coleti- vo, que não permite existir, senão no espírito dos outro, não se tra- tando mais da história que cons- truo, contratualmente associado ao outros Indivíduos racionais, mas um mito do qual participo. Podem existir heróis, santos figu- ras emblemáticas, mas eles são, de certa maneira, tipos-ideais, formas vazias, matrizes que per- mitem a qualquer um reconhecer- se e comungar com os outros, servindo todos como receptácu- los da expressão do nós.” Concluindo-se no que ser diferentes de alguns, tende-se a ser iguais a outros, e frente a es- tes “outros” está a morada de um inconsciente coletivo que gover- na, descentralizando a consciên- cia de si dos sujeitos em relação à realidade, onde as tendências da mídia e do consumismo encarnam o caráter mais claro deste inconsciente coletivo pós- moderno. Assim, faz-se necessá- ria uma volta à psicanálise, e o grande embate que a Teoria do Inconsciente causou no final do século XIX, auge da racionaliza- ção no homem, a psicanálise veio para deslocar este homem de si, e dizer que nem mesmo ele po- deria ser conhecedor e senhor total de suas atribuições, pois como parte pertencente de seu psiquismo estava um Inconscien- te, com caracterizações tão pri- mitivas e tão próprias que nem mesmo este homem antropo- cêntrico, poderia tomar-lhe as rédeas. E as margens da pós- modernidade, volta-se a Freud, e as suas teorias, que não estão aí para serem aprovadas ou desa- provas, mas apenas para dar con- ta da complexidade com que os novos relacionamentos sociais de sujeição e subjetivação se instau- ram. Desta maneira, realiza-se a comparação entre o Inconscien- te psíquico da Teoria de Freud, e o inconsciente coletivo encarna- do no poder que a mídia e a sociedade de consumo exercem nos sujeitos da sociedade pós-mo- derna. Analisando a relação en- tre um sujeito que não mais tem domínio sobre as limitações de si, e o sistema coletivo a que ele se integra, lhe envolve tanto ao pon- to de tornar-lhe inconsciente de sua própria atuação social. Neste sentido, esta análise faz-se bas- tante pertinente, para desmis- tificar as barreiras entre a reali- dade e a ilusão, que em muitos momentos submergem os indiví- duos contemporâneos. Desta forma, faz-se ne- cessária ainda, a análise sobre duas questões fundamentais para o entendimento das articulações das tribos urbanas: a primeira questão, é em relação à consti- tuição do ego e a “ilusão grupal” que tais formações causam.E a segunda questão é a do entendi- mento do porquê da proliferação destes grupos primários nas ci- dades contemporâneas. Desta forma, Anzineu (1978) afirma “que a adequação 44444 Lato& Sensu, Belém, v.4, n.2, p. 6, out, 2003. 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 12345678901234567890123456789012123456 em um grupo resulta também em uma ilusão grupal, sendo que a ilusão de ser um junto à uma tri- bo, é uma reedição do narcisismo individual para um narcisismo grupal”. Sobre o qual Freud(1974) propõe, que “nestes casos de gru- pos, por vezes, o sujeito abando- na seu ideal do ego, e o substitui pelo ideal do ego do grupo”. Ou seja, um grupo primário desse tipo é um certo número de indivíduos que colocaram um só e mesmo objeto de seu ideal do ego e, con- seqüentemente, se iden- tificaram uns com outros em seu ideal de ego. (FREUD, 1974). Neste sentido, leva-se em conta o fato de que o sujeito contemporâneo é movido pela condição de desamparo, e a ade- quação em uma tribo, é também, a garantia da sobrevivência do próprio ego e uma maneira de li- dar com o próprio desamparo. Desta maneira, o compartilhar emoções, fantasias e fetiches, seria de certa forma uma fuga dos conflitos ao encontro de um am- paro. Finalizando, discute-se de acordo com alguns autores como GIDDENS, 1997; MAFFESOLI, 2000, que a insti- tuição familiar tem sofrido pro- fundas transformações nas últi- mas décadas, e o lugar nuclear da família deu espaço a uma redefinição de papéis, materno e paterno, fosse na sua organiza- ção ou na sua constituição de identificação e subjetividade. Sen- do assim, a família pós-moderna encontra-se na condição de perdedora de seus referenciais principais para uma formação de sujeito, vindo a ser substituída, pelo amparo e acolhimento da ilusão a que as tribos se oferecem. Neste sentido, este sujei- to já não mais se sente esperan- çoso, quanto aos dispositivos tra- dicionais de organização e estruturação social, expressando- se em um movimento de ação, sob uma constante “transferên- cia”, do engajamento de leis fa- miliares que obedeciam aos pa- drões tradicionais, para o pertencimento a um instigante “tribalismo”. Concluindo-se que os fenômenos das Tribos Urba- nas são mais do que uma simples transformação na organização dos sujeitos, pois enceram-se como uma mudança real na estruturação das constituições de subjetividades e complexidades de toda uma sociedade pós-mo- derna, o que exige novas manei- ras de se pensar e repensar tais atores sociais enquanto sujeitos contemporâneos. REFERÊNCIAS BIBLIO- GRÁFICAS ANZINEU, D. El Grupo y El Inconsciente. Madrid: Biblioteca Nueva, 1978. CAIAFA, J. Movimento PunK na Cidade: a Invasão dos Bandos. Rio de Janeiro: Zahar, 1985. CASTRO, L. R. Estetização do corpo: identificação e pertenci- mento na contemporaneidade. In: ______. Infância e Adoles- cência na Cultura do Consumo. Rio de janeiro: [s.n.], 1998. COUTINHO, L.G. Um estudo psicanalítico sobre as tribos urbanas e as novas confi- gurações do Individualismo. Disponível em: <http:// www.rubeco.psc.br>. Acesso em: 02 jun. 2003. FEATHERSTONE, M. O Desmanche da Cultura-Glo- balização, Pós-Modernismo e Identidade.São Paulo: Studio Nobel, 1997. FREUD, S. Psicologia do grupo e análise do ego. Rio de Janeiro: Imago, 1976. ______. O Mal-estar da civilização. Rio de Janeiro: Imago, 1974. GIDDENZ, A. Modernização Reflexiva - Política, tradição e estética na ordem social moderna. São Paulo: Unesp, 1997. ______. Conseqüências na Modernidade. São Paulo: Unesp, 1991. MAFFESOLI, M. O Tempo das tribos: declínio do individualismo nas sociedades de massa. Rio de Janeiro: Forense, 2000. TOURAINE, A. Poderemos viver Juntos? Iguais e Diferentes.Petrópolis: Vozes, 1999.
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