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1 Curso Ênfase © 2020 CRIMINOLOGIA – DANIELA PORTUGAL AULA2 - CRIMINOLOGIA: CONCEITOS FUNDAMENTAIS - PARTE II 1. INTRODUÇÃO Na presente aula, será dado continuidade aos conceitos fundamentais de criminologia. 2. CIFRAS CINZAS Nas ocorrências, cujo impulso depende da manifestação de vontade da vítima, por exemplo, lesão corporal de natureza leve, art. 129, caput, do CP, que depende da representação, se a vitima não comparece num prazo de 06 meses, art. 38 do CPP, a contar do dia que vier a saber quem é o autor do crime, ocorre a chamada decadência pela desídia ou ausência de interesse da vítima, o que em criminologia é chamado de cifra cinza.”(PEREIRA, 2015) Nas ocorrências que dependam de manifestação de vontade da vítima, como por exemplo, lesão corporal de natureza leve (artigo 129, "caput" do Código Penal), mediante representação da vítima, se esta não comparece, no prazo de 6 (seis) meses (artigo 38 do CPP), contado do conhecimento do autor do crime, incidirá decadência, pela desídia ou ausência do interesse da vítima, o que em criminologia chama-se cifra cinza. Diferentemente da cifra oculta ou negra, caracterizada pela ausência de conhecimento do Estado sobre o delito, na Cifra cinza o fato chega ao conhecimento do Estado, mas por alguma razão, não necessariamente por culpa da vítima, aquele caso não vai adiante. 3. CIFRAS AMARELA “Quando o crime é praticado pelo Estado contra a sociedade, por exemplo, no crime de abuso de autoridade, Lei nº 4898/65, se a vítima não toma as providências por receio de futuras represálias, em criminologia, esse fato é chamado de cifra amarela.”(PEREIRA, 2015) Para memorizar, a professora sugere que o aluno lembre da metáfora do amarelo, no sentido do ter medo : "ah, Fulano amarelou". Neste caso, refere-se a uma cifra de fatos que não chegam efetivamente a ser apurados, por se tratar de casos de abuso de autoridade, de delitos praticados por representantes do Estado, mas que geram naturalmente um receio da sociedade, em levá-los para apuração. Criminologia – Daniela Portugal Aula2 - Criminologia: Conceitos Fundamentais - Parte II 2 Curso Ênfase © 2020 Inúmeras vítimas de abusos praticados por policiais, por exemplo, não levam os fatos à Corregedoria ou ao Ministério Público, por medo de serem executadas. 4. CIFRAS DOURADAS Existem também os fatos que são computados nas cifras douradas, mas por razões de falta de estrutura do Estado, acabam por operar as prescrições legais, sejam nas Unidades de Polícia ou no Poder Judiciário.”(PEREIRA, 2015) As cifras douradas é uma expressão que remete aos estudos sobre criminalidade de colarinho branco desenvolvidos por Edwin Sutherland. Trata-se, portanto, da criminalidade daqueles que ocupam altas posições na estrutura socioeconômica e política do Estado. São crimes em que o Direito Penal cumpre uma disfunção, ou seja, a função do sistema penal nestes casos, é justamente não funcionar. É um processo que se opera a favor da impunidade dos referidos agentes. As cifras douradas são muito comuns no âmbito do Poder Judiciário, talvez mais do que no âmbito da atuação das unidades de polícia. 5. CIFRAS VERDES Consiste nos crimes não chegam ao conhecimento policial e que a vítima diretamente destes é o meio ambiente, como exemplo: maus tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domesticados, pichações de paredes, monumentos históricos, prédios públicos; fato que quanto se nota o dano causado, fato consumado, há grande dificuldade de se identificar a autoria por não se encontrar mais no local dos fatos quem o praticou, estando assim isento da punição (pena) pelo crime praticado.”(PÁDUA, 2015) As cifras verdes correspondem as condutas impuníveis, no âmbito da criminalidade ambiental. O Brasil ainda é um país que não dá atenção devida para os delitos praticados contra o meio ambiente. Encontra-se em um paradigma extremamente centrado na figura do ser humano, razão pela qual não há a concepção do meio ambiente como sujeito de direito, como previsto na Constituição do Equador e na Corte Constitucional Colombiana. Criminologia – Daniela Portugal Aula2 - Criminologia: Conceitos Fundamentais - Parte II 3 Curso Ênfase © 2020 Assim, há um rol de práticas lesivas que simplesmente não atraem o efetivo interesse do Estado em processar e punir estas condutas. Até porque os sujeitos que mais praticam crimes ambientais no Brasil integram o âmbito do próprio Congresso Nacional. A "bancada do boi" ou bancada ruralista, é responsável por boa parte dos crimes contra o meio-ambiente e obviamente com certa interlocução entre as cifras douradas e as cifras verdes, convergindo para que a incidência efetiva da lei penal não ocorra aos referidos casos. Assim, os números reais de criminalidade reunirão: CIFRAS DOURADAS + CIFRAS OCULTAS + CIFRAS CINZAS + CIFRAS AMARELAS + CIFRAS VERDES Portanto, há uma disparidade grande entre número real, dos crimes que efetivamente acontecem e dos crimes que efetivamente geram, como consequência, a imposição de uma pena privativa de liberdade. E ainda assim, o Brasil possui a terceira maior população carcerária do mundo. (mais de 720 mil presos). Somente atrás dos Estados Unidos (em primeiro lugar) e da China (em segundo lugar). Ademais, este número não computa os mandados de prisão em aberto (mais de 250 mil). Os referidos dados são extraídos de pesquisas do CNJ, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública e do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. 6. ESTUDO DA CRIMINOLOGIA A criminologia, conforme visto em aula anterior, relaciona-se ao estudo do crime, da vítima,dos meios de controle social e do autor (sujeito criminoso). Criminologia – Daniela Portugal Aula2 - Criminologia: Conceitos Fundamentais - Parte II 4 Curso Ênfase © 2020 Assim, o estudo do crime pressupõe o estudo do sujeito criminoso, daquele que sofre delito (vítima) e dos meios de controle, que serão lançados pelo Estado, como uma forma efetiva de combate a esse tipo de prática. O estudo vai ser feito das mais variadas formas, pois não é só uma preocupação exclusiva da criminologia, mas de diversas ciências. Conforme imagem, há três âmbitos autônomos de conhecimento: a criminologia, a dogmática penal e a política criminal. Apesar de autônomos, estão conectados por uma unidade teleológico-funcional. Isso porque, são campos do saber dedicados a um mesmo objeto de estudo: o crime e o seu entorno (sujeito criminoso, a vítima e o controle social). Serão perpetrados por meio de técnicas diferentes, metodologias distintas, olhares distintos. Inclusive, a imagem em questão não consegue esgotar todos os campos do saber que estudam o crime e o seu entorno. A criminologia, de maneira geral, estuda a origem do crime e as suas causas. Já a dogmática penal está voltada a decidibilidade de conflitos . E a política criminal, com olhar sempre muito projetado para o futuro, avalia as formas de controle e combate à criminalidade. Dessa forma, em um caso de feminicídio (mulher que recebeu diversas facadas do seu marido que não aceitava o término da relação), a criminologia tentará entender a causa do delito. Ou seja, se o feminicídio ocorreu porque os homens instintivamente são mais violentos (com uma abordagem criminológica muito associada aos estudos feitos no século XIX, deterministas, que tentarão associar a origem do crime a ontologia). Criminologia – Daniela Portugal Aula2 - Criminologia: Conceitos Fundamentais - Parte II 5 Curso Ênfase © 2020 Ainda em uma perspectiva criminológica pode associar o acontecido em razão de a sociedade está totalmente estruturada em um cultura de agressão, violência de gênero, como um componente derivado da própria estrutura social patriarcalista,machista. Neste caso, é uma vertente criminológica, a partir de uma perspectiva sociológica, feminista, que identifica como a opressão de gênero, podendo estar relacionada a causa de determinados crimes. Ainda dentro de uma abordagem criminológica identifica-se algumas vertentes, no âmbito da vitimologia, que investigarão se ocorreu provocação por parte da vítima, se teve uma postura determinante para a ocorrência do delito. Portanto, percebe-se a criminologia como investigadora das causas do crime e no momento desta análise, a resposta será diversa, conforme a vertente criminológica alinhada. Já o estudo da dogmática para o crime, relacionada à decidibilidade de conflitos, refere-se a solução jurídica, dentro de uma dogmática acrítica, basicamente pelo critério da subsunção. Ou seja, diante de um comportamento criminoso verifica-se qual norma se enquadra neste comportamento. Assim, a dogmática tem uma intervenção sempre tardia, uma vez que primeiro o crime acontece, para depois a dogmática agir. Por exemplo, se o individuo pensa em matar alguém, o tipo de homicídio não se aplica, sendo necessário que se ingresse na execução deste crime. Dessa forma, a prevenção de delitos não vai ser uma tarefa cumprida pela dogmática. No exemplo dado do feminicídio, a dogmática apenas analisará a conduta e concluirá se esta enquadra-se no artigo 121, §2, VI do Código Penal, complementado pela descrição contida no §2º-A, do artigo 121. A política criminal analisa o caso de feminicídio apresentado, de modo a tentar diminuir as estatísticas hoje existentes, bem como prevenindo-as. Uma das políticas novas que tem sido utilizada nesse sentido, é a ronda Maria da Penha (rondas policiais com ligação direta com as vítimas que possuem decisão em curso de medida protetiva de urgência). É uma medida que tem sido utilizada pelo Poder público, para o combate à práticas de feminicídio e outras formas de violência contra mulher. Porque há um elo tão próxima entre Criminologia, Dogmática e Política Criminal? Um dos primeiros autores a identificar que o estudo do crime não poderia se esgotar na dogmática foi Franz Von Liszt .Este trouxe o Modelo Tripartido da Ciência Conjunta do Direito Penal ou Ciência Total do Direito Penal. Criminologia – Daniela Portugal Aula2 - Criminologia: Conceitos Fundamentais - Parte II 6 Curso Ênfase © 2020 Estabelecia que o estudo do crime deveria ser feito a partir de uma ciência conjunta/total, que abrange a dogmática, a criminologia e a política criminal. Porém, se há um estudo para interlocução de diferentes campos do conhecimento, nem sempre estes estarão convergentes. Neste caso, defenderia Von Liszt que, nos casos de divergência, prevaleceria a dogmática. Quais as críticas ao modelo de Von Liszt? As críticas são trazidas por Jorge de Figueiredo Dias, Antônio García-Pablos de Molina e Luiz Flávio Gomes. Informam que há três pilares do sistema das ciências penais, inseparáveis e interdependentes, sem que exista entre eles uma relação de hierarquia, de forma que a dogmática não seria mais importante. Atualmente não se pode dizer que o paradigma de Franz Von Liszt está totalmente superado. Prova disso, é que nos cursos de Direito não se dedicam ao estudo da criminologia e da política criminal, estando implícito que a dogmática penal assuma uma importância hierárquica superior, o que é absolutamente ultrapassado.
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