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DIREITO ADMINISTRATIVO Gabriele Valgoi Cargo, emprego e função pública Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Descrever cargo, emprego e função pública e as suas principais diferenças. Classificar os cargos públicos diante do quadro funcional. Indicar as principais características dos cargos públicos. Introdução Os serviços públicos são executados a partir das pessoas físicas que compõem a estrutura estatal e que realizam as suas atividades em prol do Estado. Essas pessoas físicas, em razão das funções que exercem e da espécie de vínculo que detêm com o Poder Público, diferenciam-se em razão da aplicação de um sistema de regras diferenciado a cada uma delas. Dessa organização, derivam as unidades jurídicas de cargo, emprego e função pública, cada qual com as suas peculiaridades e condições para o seu exercício, sem, contudo, manter o elo principal entre elas, que é a representação estatal. Neste capítulo, você vai ler sobre as diferentes espécies de cargos públicos, sua diferenciação em razão da natureza jurídica das funções que ocupam e o respectivo quadro funcional que integram na Administração Pública. Você também vai ler sobre as principais características inerentes ao cargo público, de acordo com as diretrizes constitucionais. Conceituação de cargo, emprego e função pública Alguns agentes, pela forma de vínculo com a Administração Pública, assu- mem cargos públicos, enquanto outros são detentores de empregos públicos ou, ainda, ocupam somente uma função pública, a qual requer a assunção de cargo e emprego na estrutura organizacional da Administração Pública. Cargo público O exercício de toda e qualquer função pública decorre da expressa previsão em lei. O princípio da legalidade estrita está previsto no art. 37 da Constituição Federal: “Art. 37 A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obede- cerá aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e efi ciência e, também, ao seguinte: [...]” (BRASIL, 1988, documento on-line). Será, portanto, a lei, então, que vai defi nir — de acordo com a área de atuação, complexidade e qualifi cação necessária — as atribuições a serem exercidas pelos servidores públicos. A organização dessas atribuições é feita com base no critério de divisão do trabalho. Assim, para cada conjunto de atribuições definido por lei, caberá um vínculo específico com o servidor público, que deterá o dever institucional de cumprir suas funções. Esse conjunto de atribuições é chamado de cargo público. De acordo com Mello (2009, p. 226), os cargos públicos: [...] são as mais simples e indivisíveis unidades de competência a serem expres- sadas por um agente, previstas em número certo, com denominação própria, retribuídas por pessoas jurídicas de Direito Público e criadas por lei, salvo quando concernentes aos serviços auxiliares do Legislativo, caso em que se criam por resoluções, da Câmara ou do Senado, conforme se trate de serviços de uma ou de outra destas Casas. No âmbito da União Federal, a Lei nº. 8.112, de 11 de dezembro de 1990, também define cargo público no art. 3º: “Art. 3º Cargo público é o conjunto de atribuições e responsabilidades previstas na estrutura organizacional que devem ser cometidas a um servidor” (BRASIL, 1990, documento on-line). O ocupante do cargo público, portanto, é servidor público, que é espécie do gênero agente público. Na conceituação de Di Pietro (2013), o agente público seria toda pessoa física que presta serviços ao Estado e às pessoas jurídicas da Administração Indireta. Desse modo, a expressão agente público é gênero que define toda e qualquer pessoa que preste, ainda que por diversas formas de relação, um serviço ao Estado. A partir da natureza dessa relação jurídica, nascem diversas espécies. Cargo, emprego e função pública2 Segundo a doutrina de Mello (2009), seguida por Di Pietro (2013), o gênero “agente público” comportaria três espécies, quais sejam: agente políticos; servidores públicos; particulares em colaboração com o Poder Público. Na clássica doutrina de Meirelles (2014), seriam cinco espécies: 1. agente político; 2. agente administrativo; 3. agente honorífico; 4. agente delegado; 5. agente credenciado. O cargo público se trata de uma unidade jurídica existente na estrutura da Administra- ção Pública, instituído por lei, visando à prestação de atribuições específicas exercidas por servidores públicos submetidos ao regime estatutário, sendo que a lei que cria o cargo público fixará um padrão remuneratório que será devido ao seu titular, bem como definirá uma denominação própria para que se diferencie dos demais cargos. A criação de cargos públicos decorre de lei, por iniciativa do Poder cuja estrutura integrará. Segundo o inciso X do art. 48 da Constituição Federal (BRASIL, 1988), somente por meio de lei serão realizadas a criação, trans- formação e extinção dos cargos públicos. Além disso, a formatação das atri- buições, a denominação e a remuneração correspondentes necessariamente decorrem do texto da lei. Portanto, caberá a cada Poder estatal (assim entendidos o Poder Executivo, Legislativo e Judiciário), de cada ente da federação, determinar, por meio da edição de lei, a criação de seus cargos. No âmbito da União, por exemplo, será de iniciativa do Presidente da República a lei que dispor sobre a criação e extinção de cargos no âmbito do Poder Executivo; competirá ao Congresso 3Cargo, emprego e função pública Nacional a criação dos cargos no Poder Legislativo, consoante disposto no art. 51, IV, da Constituição Federal (BRASIL, 1988); e cabe aos tribunais a iniciativa das leis que ensejarão a criação de cargos vinculados à sua estrutura. Mesmo sendo expressa a condição de que a criação e a extinção de cargos públicos deverão ser realizadas mediante lei, a Constituição Federal (BRASIL, 1988) definiu uma exceção a essa regra, nos moldes do art. 84, VI, ao prever a possibilidade de o Presidente da República, mediante decreto, extinguir cargos, empregos e funções, quando vagos, ou seja, quando não ocupados por um agente. Emprego público O emprego público se trata de unidade jurídica, também dotada de atribuições, porém ocupada por um servidor celetista, ou seja, aquele que detém vínculo contratual com a Administração Pública, pois celebrou com esta um contrato de trabalho, nos termos previstos na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Segundo Mello (2009) os empregos públicos são núcleos de encargos de trabalho permanentes a serem preenchidos por agentes contratados para desempenhá-los, sob relação trabalhista, conforme prevê a Lei Federal nº. 9.962, de 22 de fevereiro de 2000. Portanto, os empregados são detentores de empregos públicos e se sub- metem ao acordo firmado com o respectivo ente público, ou seja, ao contrato de trabalho, que se submete às garantias constitucionais previstas no art. 7º da Constituição Federal e às normas da CLT (Decreto-Lei nº. 5.452, de 1º de maio de 1943). Essas normas, no entanto, definem garantias mínimas que devem ser asseguradas pelo empregador, a partir da assinatura do contrato, podendo ser ampliadas mediante ajuste próprio. Na União Federal, a CLT é norma subsidiária às disposições da Lei Federal nº. 9.962/2000, que regula o regime de emprego público do pessoal da Admi- nistração Pública Federal Direta, autárquica e fundacional, que define que o contrato de trabalho será celebrado por prazo indeterminado e somente poderá ser rescindido por ato unilateral da Administração Pública, nas hipóteses do art. 3º daquela lei. O regime de emprego não é mais utilizado na Administração Pública Direta, autárquica e fundacional, em razão da suspensão da redação do caput do art. 39 da Constituição Federal, atribuída pela Emenda Constitucional (EC) nº. 19, de 4 de junho de 1998, que restaurou a vinculaçãoaos entes públicos, da Cargo, emprego e função pública4 adoção de um único regime jurídico. Portanto, com a concessão da medida cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº. 2.135, o Supremo Tribunal Federal (STF) suspendeu os efeitos da nova redação do caput do art. 39, dando efeitos ex nunc, ou seja, não retroagindo os efeitos, que valeram somente a partir da data da decisão. O acórdão referente à decisão foi publicado em 7 de março de 2008. Assim, durante o período de vigência da redação do art. 39, caput, da Constituição Federal, atribuída pela EC nº. 19/1998, os eventuais empregos públicos estabelecidos foram reconhecidos como constitucionais, como, por exemplo, os agentes comunitários de saúde, que, nos termos da Lei nº. 11.350, de 5 de outubro de 2006, poderão ser constituídos na forma de cargos ou emprego público, conforme art. 14 daquela lei. Hoje, o regime de emprego na União fica restrito às contratações de pessoal nas empresas públicas, sociedades de economia mista e fundações públicas de direito privado. A criação de empregos públicos — segundo o disposto nos termos do art. 61, § 1º, II, a, da Constituição Federal — deve se dar mediante lei e, em razão da aplicação do princípio do paralelismo das formas, também somente por lei poderá ser extinto (BRASIL, 1988). Assim, para que seja juridicamente possível a contratação do empregado público, este deve ter sido previamente aprovado em concurso público de provas ou provas e títulos, nos moldes do art. 37, II, da Constituição Federal, ainda que as atividades venham a ser desempenhadas nos entes privados da administração descentralizada. Função pública Consideram-se funções públicas as atribuições desempenhadas por um servidor que não titulariza um cargo ou emprego público. Assim, a função pública é sinônimo de atribuições (conjunto de atribuições a serem prestadas por um servidor). Nessa linha de entendimento, não existe cargo ou emprego que não constitua uma série de funções, defi nidas expressamente nos termos da lei. Em alguns determinados casos, no entanto, haverá o exercício de atribuições públicas pelo agente, mas este não ocupará qualquer cargo ou emprego público. 5Cargo, emprego e função pública Essas tarefas são definidas como funções públicas em sentido estrito. A partir do Texto Constitucional (BRASIL, 1988), podemos estabelecer dois tipos de funções que não correspondem a cargo ou emprego público: 1. funções exercidas por servidores contratados temporariamente, con- soante disposto nos termos do art. 37, IX, da Constituição Federal; 2. funções atinentes à chefia, à direção ou ao assessoramento, que são chamadas de funções de confiança, de livre nomeação e livre exone- ração, previstas no art. 37, V, da Constituição Federal. Também são funções públicas o exercício das atividades de mesário no dia das eleições e as atividades de jurado no tribunal do júri. As funções de confiança somente serão preenchidas por servidores efetivos, de carreira, e se limitam ao critério de escolha mediante confiança direta da autoridade nomeante. Por isso, a nomeação para o exercício dessas funções não depende de qualquer critério de seleção, assim como não há qualquer garantia de sua manutenção no exercício das atividades, podendo ser exonerado a qualquer tempo. Principais diferenças entre cargo, emprego e função pública Entre as principais diferenças entre o cargo e o emprego público em relação às funções públicas, está o vínculo entre o servidor ocupante de cargo público e o Estado. Isso porque o vínculo do ocupante de cargo público decorre de lei, enquanto o emprego público tem seu vínculo advindo de um contrato estabelecido entre o empregado e a Administração Pública. Além disso, os empregos públicos são estabelecidos por meio de contrato de trabalho, regido pela CLT, enquanto os cargos são ocupados nos termos da lei, por meio de um ato administrativo chamado de provimento. A Constituição Federal, nos termos do art. 37, I, traz expressa menção sobre as três figuras — cargo, emprego e função —, porém, ao definir a exigência do concurso público nos termos do inciso II do mesmo art. 37, traz referência somente a cargo e emprego público, não englobando o exercício da função pública (BRASIL, 1988). Isso porque a exigência de per si se demonstraria incompatível com a própria natureza da função, já que, conforme mencio- nado, aqueles que a exercem são contratados temporariamente para atender a necessidades urgentes da Administração Pública ou então são ocupantes de função de confiança. Cargo, emprego e função pública6 Muito embora o art. 37, II, da Constituição Federal não atribua expressamente a obri- gatoriedade de as funções públicas se submeterem ao concurso público como meio de ingresso na Administração Pública, as cortes de contas do País recomendam aos entes que realizem a seleção dos contratados temporários por excepcional interesse público, na forma do inciso IX do art. 37 da Constituição Federal, mediante a realiza- ção de processo seletivo simplificado. Essa exigência é uma interpretação à luz do disposto no caput do mesmo dispositivo, face ao princípio constitucional, aplicado à Administração Pública, da impessoalidade (BRASIL, 1988). Outra importante diferença diz respeito ao exercício da função de con- fiança, que não deve ser confundida com a nomeação para cargo comissionado (Quadro 1). Função de confiança Trata-se de uma função sem cargo, isolada dentro da estrutura do serviço público. Trata-se de uma função de direção, chefia ou asses- soramento, portanto, não está atribuída a um cargo específico, mas seu exercício somente poderá se dar a servidor efetivo, investido em cargo público. Cargo em comissão (ou cargo de confiança) Trata-se cargo cuja função corresponde a uma ativi- dade de direção, chefia e assessoramento. Por se tratar de um cargo, e não somente uma fun- ção, pode ser exercida por quem não possua cargo efetivo, que receberá o tratamento como servidor comissionado. Quadro 1. Diferenças entre função de confiança e cargo público Classificação dos cargos públicos Os cargos públicos podem ser classifi cados quanto à situação perante o quadro funcional como cargos em carreira e cargos isolados. Na doutrina do professor Jose dos Santos Carvalho Filho (2014), a carreira pode ser compreendida como o conjunto de classes funcionais cujos integrantes vão percorrendo 7Cargo, emprego e função pública diversos patamares de que se constitui a progressão funcional. As classes são compostas de cargos que tenham as mesmas atribuições. Assim, os quadros de cargos em carreira permitem que ocorra um avanço profissional por meio de um provimento chamado de promoção, o que não ocorre com os cargos isolados. Em uma segunda classificação, os cargos podem se diferenciar, em razão das garantias e características, como: cargos vitalícios; cargos efetivos; cargos de provimento em comissão. Nessa classificação, os cargos estão divididos em relação à garan- tia de permanência no serviço público pelos seus ocupantes. A garantia contra perda de cargos públicos respeita o princípio democrático, ao não se permitir que ocorram disputas políticas, colisão aos princípios cons- titucionais, proibindo a manipulação de servidores públicos pelo agente político mal-intencionado. Os cargos vitalícios são os mais protegidos contra a perda, uma vez que seus ocupantes só poderão perdê-los por sentença judicial transitada em julgado, ou seja, sentença judicial da qual não caiba mais nenhuma espécie de recurso. Fora essa hipótese, nenhum detentor de cargo vitalício poderá ser forçado a deixar o seu cargo. Hoje em dia, são cargos vitalícios: magistrado; membro do Ministério Público; membros dos Tribunais de Contas. Os cargos efetivos têm como característica garantir a seus ocupantes, após 3 anos de efetivo exercício, a estabilidade. Após a aquisição da estabilidade, o ocupante de cargo efetivo só poderá perdê-loem quatro hipóteses: sentença judicial transitada em julgado, processo administrativo disciplinar (PAD), no qual seja assegurada ampla defesa e contraditório; processo periódico para avaliação de desempenho; excesso de despesa com funcionalismo público (no caso da União, se a despesa com o funcionalismo ultrapassar 50% da receita corrente líquida, poderá haver exoneração de servidores estáveis, desde que cumpridas todas as formalidades legais para tanto). Cargo, emprego e função pública8 Os ocupantes de cargos de provimento em comissão, também chamados de cargos de confiança, são aqueles livremente nomeáveis e exoneráveis pelas autoridades competentes, ou seja, não necessitam de concurso público para ingressar no serviço público, como também não há qualquer processo especial para que sejam exonerados. O STF editou súmula vinculante, de obrigatória obediência sobre a nome- ação para cargo de provimento em comissão e funções de confiança, visando resguardar a Administração Pública contra os interesses privados, por meio do nepotismo. A Súmula Vinculante nº. 13 (BRASIL, 2008, documento on-line) tem a seguinte redação: A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança ou, ainda, de função gratificada na administração pública direta e indireta em qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola a Constituição Federal. A Súmula Vinculante nº. 13 do STF não se aplica à nomeação de ministros e secretários estaduais e municipais por se tratarem de agentes políticos. Dessa forma, nada impede que um prefeito nomeie o irmão para ser secretário municipal. São parentes de terceiro grau: tios e sobrinhos do servidor, da autoridade ou de seus cônjuges. Esses cargos, tradicionalmente no Brasil, são chamados de nomeáveis e exoneráveis ad nutum. Os cargos de provimento em comissão podem ser ocupados por servidor de carreira ou não. Há a possibilidade de serem criadas, em conjunto com os cargos em comissão, as funções de confiança, as quais são de ocupação obrigatória de servidores efetivos da Administração Pública. Não é necessário que o ocupante do cargo de confiança seja previamente servidor. No entanto, a Constituição Federal dispõe que tais cargos serão ocu- pados por servidores de carreira nos termos, nas condições e nos percentuais mínimos previstos em lei, ou seja, em regra, os cargos de confiança podem ser ocupados por quem seja servidor anteriormente ou não. 9Cargo, emprego e função pública No entanto, caberá à lei definir um percentual mínimo em que tais cargos serão ocupados por servidores de carreira. É claramente o que afirma o inciso V do art. 37 da Constituição Federal, com a seguinte redação: Art. 37 [...] V — as funções de confiança exercidas exclusivamente por servidores ocu- pantes de cargo efetivo, e os cargos em comissão, a serem preenchidos por servidores de carreira nos casos, condições e percentuais mínimos previstos em lei, destinam-se apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento (BRASIL, 1988, documento on-line). Abrangência da expressão “servidores públicos” Ainda que pairem controvérsias doutrinárias sobre a conceituação de ser- vidores públicos, seguindo a doutrina fi rmada pela administrativista Maria Sylvia Di Pietro (2013, p. 433), os “[...] servidores públicos em sentido amplo seriam as pessoas físicas que prestam serviços ao Estado e às entidades da Administração Indireta, com vínculo empregatício e mediante remuneração paga pelos cofres públicos”. Muito embora a Constituição Federal não tenha utilizado, em seu conte- údo, a expressão funcionário público, esta se refere à espécie dos servidores submetidos ao regime estatutário e se diferencia do empregado público, que seria aquele contratado sob o regime da legislação trabalhista, de acordo com a CLT, que ocupa um emprego público. Os servidores públicos também se diferenciam dos servidores temporá- rios, que são aqueles contratados por tempo determinado para atender a uma necessidade temporária e de excepcional interesse público, conforme disposto nos termos do inciso IX do art. 37, da Constituição Federal (BRASIL, 1988). Esses servidores temporários exercem uma função e não ocupam cargo ou emprego público. Assim, a expressão “servidores públicos” lato sensu com- preende as modalidades de servidores estatutários, empregados públicos e servidores temporários. No ano de 2018, o STF firmou tese, em repercussão geral reconhecida, sobre a aplicação do critério de livre nomeação e exoneração em razão de cargos em comissão, criados no âmbito da Administração Pública. No caso concreto, a lei do respectivo ente fixou percentual de cargos em comissão que deveriam Cargo, emprego e função pública10 ser preenchidos obrigatoriamente por servidores efetivos, o que denotaria a exigência, portanto, de aprovação em concurso público para sua ocupação. Nesse sentido, restou estabelecido o julgamento: Criação de cargos em comissão. Requisitos estabelecidos pela Constituição Federal. Estrita observância para que se legitime o regime excepcional de livre nomeação e exoneração. Repercussão geral reconhecida. Reafirmação da jurisprudência da Corte sobre o tema. 1. A criação de cargos em comissão é exceção à regra de ingresso no serviço público mediante concurso público de provas ou provas e títulos e somente se justifica quando presentes os pres- supostos constitucionais para sua instituição. 2. Consoante a jurisprudência da Corte, a criação de cargos em comissão pressupõe: a) que os cargos se destinem ao exercício de funções de direção, chefia ou assessoramento, não se prestando ao desempenho de atividades burocráticas, técnicas ou ope- racionais; b) necessária relação de confiança entre a autoridade nomeante e o servidor nomeado; c) que o número de cargos comissionados criados guarde proporcionalidade com a necessidade que eles visam suprir e com o número de servidores ocupantes de cargos efetivos no ente federativo que os institui; e d) que as atribuições dos cargos em comissão estejam descritas de forma clara e objetiva na própria lei que os cria. 3. Há repercussão geral da matéria constitucional aventada, ratificando-se a pacífica jurisprudência do Tribunal sobre o tema. Em consequência disso, nega-se provimento ao recurso extraordinário. 4. Fixada a seguinte tese: a) A criação de cargos em comissão somente se justifica para o exercício de funções de direção, chefia e assessoramento, não se prestando ao desempenho de atividades burocráticas, técnicas ou operacionais; b) tal criação deve pressupor a necessária relação de confiança entre a autoridade nomeante e o servidor nomeado; c) o número de cargos comissionados criados deve guardar proporcionalidade com a ne- cessidade que eles visam suprir e com o número de servidores ocupantes de cargos efetivos no ente federativo que os criar; e d) as atribuições dos cargos em comissão devem estar descritas, de forma clara e objetiva, na própria lei que os instituir (BRASIL, 2019, documento on-line). Principais características dos cargos públicos O cargo público é ocupado por um funcionário público (subgrupo da classi- fi cação servidor público administrativo), que mantém, com a Administração Pública, vínculo estatutário. Assim, seja o servidor público efetivo — como sendo aquele ingresso no serviço público por meio da submissão ao concurso 11Cargo, emprego e função pública público, na forma do art. 37, II, da Constituição Federal — seja o servidor comissionado — nomeado em razão da confi ança entre este e a autoridade nomeante, nos moldes do art. 37, V, da Constituição Federal —, a ambos será aplicado o Estatuto dos Servidores Públicosdo respectivo ente. Assim, por meio do provimento no cargo público, restará o agente vinculado ao desempenho das suas atribuições (BRASIL, 1988). Em âmbito federal, os funcionários públicos têm como estatuto a Lei nº. 8.112/1990, conhecida como Regime Jurídico Único dos Servidores Públi- cos Civis da União (RJU). Portanto, ao detentor de cargo público, não será aplicado outra lei que não a do ente pelo qual esteja vinculado, assim como não serão automaticamente aplicadas as disposições da CLT. Entre as principais características dos cargos públicos, está a ampla aces- sibilidade. Segundo o art. 37, I, da Constituição Federal, é garantido, em razão do princípio da impessoalidade, que os cargos e empregos públicos devam ser acessíveis aos brasileiros, natos ou naturalizáveis, exceto aqueles cargos previstos no § 3º do art. 12 da Constituição Federal, que são privativos de brasileiros natos e que preencherem os requisitos estabelecidos em lei (normalmente a lei de criação do cargo ou emprego público), assim como aos estrangeiros, na forma da legislação aplicável. Nesse tocante, caberá à lei do respectivo ente competente regular o acesso de estrangeiro a cargos públicos. Portanto, não se trata de disposição automática, devendo ser regulamentada para bem de ser assegurada a garantia de acesso ao estrangeiro. Os cargos públicos, assim como as funções e os empregos públicos, não poderão ser cumulados, consoante disposto nos termos do art. 37, XVI, da Constituição Federal. Ocorre que, por expressa previsão constitucional, com- porta exceção tal regra. Vejamos: Art. 37 [...] XVI — é vedada a acumulação remunerada de cargos públicos, exceto, quando houver compatibilidade de horários, observado em qualquer caso o disposto no inciso XI: a) a de dois cargos de professor; b) a de um cargo de professor com outro técnico ou científico; c) a de dois cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde, com profissões regulamentadas (BRASIL, 1988, documento on-line); Cargo, emprego e função pública12 Portanto, poderão ser cumulados até dois cargos de professor, ou um cargo de professor e outro técnico ou científico, e dois cargos ou empregos privativos de profissionais da saúde (por exemplo, dois cargos de médico, dois cargos de enfermeiro, entre outros), desde que seja comprovada a compatibilidade de horários. Outra importante característica do cargo público é a possibilidade de cumulação com o cargo de agente político, na forma do art. 38, III, da Constituição Federal. Vejamos: Art. 38 Ao servidor público da administração direta, autárquica e fundacional, no exercício de mandato eletivo, aplicam-se as seguintes disposições: [...] III — investido no mandato de Vereador, havendo compatibilidade de horários, perceberá as vantagens de seu cargo, emprego ou função, sem prejuízo da remuneração do cargo eletivo, e, não havendo compatibilidade, será aplicada a norma do inciso anterior; [...] (BRASIL, 1988, documento on-line). Uma garantia inerente ao servidor público detentor de cargo efetivo é concessão da estabilidade funcional, que, segundo o art. 41 da Constituição Federal, será conferida ao servidor após o decurso de 3 anos de serviço pú- blico, mediante a aprovação em estágio probatório. Assim, o servidor somente perderá o cargo público em virtude de sentença judicial transitada em julgado, mediante processo administrativo em que lhe seja assegurada ampla defesa, conhecido como PAD, e mediante procedimento de avaliação periódica de desempenho, na forma de lei complementar, assegurada ampla defesa, caso não atenda aos critérios de pontuação definidos nos termos da lei. A Controladoria-Geral da União disponibiliza, por meio de perguntas e respostas, mais informações sobre o regime disciplinar aplicado aos servidores públicos da União, consoante disposto nos termos da Lei Federal nº. 8.112/1990: https://qrgo.page.link/BaQMu 13Cargo, emprego e função pública BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Diário Oficial da União, 5 out. 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/consti- tuicao.htm. Acesso em: 16 set. 2019. BRASIL. Lei nº. 8.112, de 11 de dezembro de 1990. Dispõe sobre o regime jurídico dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais. Diário Oficial da União, 12 dez. 1990. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/cci- vil_03/LEIS/L8112cons.htm. Acesso em: 16 set. 2019. BRASIL. Recurso Extraordinário nº. 1041210. Relator Ministro Dias Toffoli. Diário da Justiça eletrônico, 22 maio 2019. Disponível em: https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe. asp?incidente=5171382. Acesso em: 16 set. 2019. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Súmula vinculante 13. A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica inves- tido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança ou, ainda, de função gratificada na administração pública direta e indireta em qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola a Constituição Federal. Diário de Justiça, p. 1, 2008. Disponível em: http://www.stf.jus. br/portal/jurisprudencia/menusumario.asp?sumula=1227. Acesso em: 16 set. 2019. CARVALHO FILHO, J. S. Manual de Direito Administrativo. São Paulo: Atlas, 2014. DI PIETRO, M. S. Z. Direito Administrativo. São Paulo: Atlas, 2013. MEIRELLES, H. L. Direito Administrativo brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2014. MELLO, C. A. B. Curso de Direito Administrativo. 26. ed. São Paulo: Malheiros, 2009. Leitura recomendada CARVALHO, M. Manual de Direito Administrativo. 2. ed. Salvador: Editora JusPODIVM, 2015. Cargo, emprego e função pública14
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