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Elogio Ao Ocio

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Revista(Aproximação(—(Segundo(semestre(de(2014(—(Nº(8(
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http://ifcs.ufrj.br/~aproximacao 
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BERTRAND RUSSELL: O ELOGIO AO ÓCIO 
 
Vinicius de Miranda Leite 
Graduando de Filosofia na UFRJ 
 
Resumo: O objetivo deste trabalho é analisar a relação do homem com o trabalho e o 
ócio, ressaltando a importância de uma revalorização do ócio e da diminuição da 
jornada de trabalho. Recorro as ideias levantadas em “O Elogio ao Ócio” por Russell, 
destacadas em “A Economia do Ócio” por Domenico De Masi. 
Palavras-chave: Ócio. Russell. Trabalho. 
 
Abstract: This work’s goal is to analyse the relationship between man, labour and 
idleness, highlighting the importance of a revaluing of idleness and the decrease of 
work hours. I resort to ideas mentioned by Russell in “In praise of idleness”, and 
highlighted by Domenico De Masi in “Economia dell’ozio”. 
Keywords: Idleness. Russell. Labour. 
 
 
O ELOGIO AO ÓCIO 
 
 Como todos de sua época, Russell foi criado com a mentalidade do trabalho, 
onde o ócio seria algo negativo. 
Como muitos homens da minha geração, fui educado segundo os preceitos do 
provérbio que diz que o ócio é o pai de todos os vícios. E, como sempre fui 
um jovem virtuoso, acreditava em tudo que me diziam, e foi assim que a 
minha consciência adquiriu o hábito de me obrigar a trabalhar duro até hoje. 
(RUSSELL, 2002:23) 
 Contudo, suas opiniões se transformaram: as pessoas trabalhavam demais, 
sobretudo nos países industrializados. Lutar por algo diferente do que se apregoa é 
necessário. 
 Do início da civilização até a Revolução Industrial, um trabalhador era capaz de 
produzir o suficiente para si e sua família com um pequeno excedente, que não ficavam 
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para eles, era destinado aos guerreiros e sacerdotes. Evidente que o instinto natural dos 
camponeses seria gerar menos ou consumir mais e que, portanto, no início eles foram 
forçados a produzir mais e entregar o excedente. Este regime perdurou por tanto tempo 
que daí derivaram as ideias do caráter virtuoso do trabalho, inadequadas devido a sua 
origem pré-industrial. 
[...] A moderna técnica trouxe consigo a possibilidade de que o lazer, dentro 
de certos limites, deixe de ser uma prerrogativa de minorias privilegiadas e se 
torne um direito a ser distribuído de maneira equânime por toda a 
coletividade. A moral do trabalho é uma moral de escravos, e o mundo 
moderno não precisa da escravidão. (RUSSELL, 2002:27) 
 Antes, o lazer de uns poucos era sustentado pelo trabalho da maioria. Sendo algo 
benéfico, todos deveriam ter direito, e a técnica moderna tornou possível sua 
distribuição sem nenhum prejuízo à civilização. 
A técnica moderna tornou possível a drástica redução da quantidade de 
trabalho necessária para garantir a todos satisfação de suas necessidades 
básicas. Isto ficou claro durante a Primeira Guerra Mundial. Todos os 
membros das forças armadas, todos os homens e mulheres engajados na 
produção de munições, na espionagem, na propaganda de guerra e nas 
funções de governo ligadas à guerra foram sacados das ocupações produtivas. 
Apesar disso, o nível geral de bem-estar físico entre os assalariados não 
qualificados do lado dos aliados era mais alto do que antes ou até depois da 
guerra. A guerra demonstrou claramente que, por meio da organização 
cientifica da produção, uma pequena parte da capacidade de trabalho do 
mundo moderno é suficiente para que a população desfrute um nível de 
conforto satisfatório. E se, ao final da guerra, tivesse sido preservada a 
organização científica criada para liberar os homens para a tarefa de lutar e 
municiar, e se a jornada de trabalho tivesse sido reduzida a quatro horas, 
estaria tudo certo. Em vez disso, foi restaurado o antigo caos – aqueles cujo 
trabalho era necessário voltaram às duas longas horas de trabalho, os demais 
foram deixados à míngua como desempregados. Por quê? Porque o trabalho é 
um dever, as pessoas devem receber salários proporcionais à sua produção, 
mas à virtude demonstrada em seu esforço. (RUSSELL, 2002:28) 
 O fato de algumas poucas pessoas desfrutarem de uma vida ociosa, seja por 
viverem de herança ou terem casado por dinheiro, é muito menos nocivo do que a 
imposição feita aos assalariados: escolham entre o sobre trabalho e a privação. 
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 Com bom senso organizacional, se o assalariado trabalhasse quatro horas por dia, 
haveria bastante para todos e não haveria desemprego. Há os que dizem que os pobres 
não saberiam o que fazer com tantas horas livres. O uso “adequado” do ócio é fruto da 
civilização e da educação. Alguém habituado a uma vida dedicada a longas horas de 
trabalho se entediaria se de súbito ficasse ocioso. 
 Não há empenho para uma justiça econômica. A ausência de controle central faz 
com que se produza em excesso, uma quantidade absurda de coisas das quais não 
precisamos. Uma parcela grande da população é submetida ao desemprego, porque se 
impõe o sobre trabalho a outra parte. Quando o sistema entra em colapso criam-se 
guerras, inúmeros são postos para fabricar explosivos e outros, para explodi-los. Assim, 
mostram que uma grande quantidade de trabalho manual é indispensável ao homem 
comum. 
[...] A antiga propensão para a despreocupação e o divertimento foi de certo 
modo inibida pelo culto da eficiência. O homem moderno acha que qualquer 
atividade deve ser exercida em prol de outras coisas, nunca da coisa mesma. 
Há, por exemplo, pessoas sisudas que condenam o hábito de ir ao cinema, 
dizendo que ele induz a juventude ao crime. Mas o trabalho necessário à 
produção dos filmes é tido como respeitável, porque é trabalho e porque gera 
lucro. [...] (RUSSELL, 2002:32) 
 Há uma incongruência quando se pensa demais em produção e pouco no 
consumo. Atividade boa é a que gera lucro. Ganhar dinheiro é bom, mas gastá-lo é ruim. 
Ignoram que produção e consumo estão atrelados, dando pouca importância à satisfação 
que a produção dá ao consumidor. 
 Ao sugerir a redução da jornada de trabalho, Russell não pretende que o tempo 
seja gasto em causas frívolas. Quatro horas seriam suficientes para garantir conforto à 
vida e as demais horas seriam aproveitadas de maneira inteligente. E como não estariam 
cansadas, as pessoas poderiam buscar diversões que fossem exclusivamente monótonas. 
[...] Os prazeres das populações urbanas se tornaram fundamentalmente 
passivos: ver filmes, assistir a partidas de futebol, ouvir rádio e assim por 
diante. Isto ocorre porque as energias ativas da população estão totalmente 
absorvidas pelo trabalho. Se as pessoas tivessem mais lazer, voltariam a 
desfrutar prazeres em participassem ativamente. (RUSSELL, 2002: 33) 
 
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A CULTURA DO ÓCIO 
 
 A Revolução Francesa e o maquinismo aceleraram a mudança que já ocorria no 
durante o século XVIII, de uma concepção mais ampla e prática do conhecimento. 
[...] A Revolução deu um golpe na cultura fidalga e o maquinismo criou um 
novo e extraordinário campo de ação para o exercício de habilidades 
destituídas de toda fidalguia. Ao longo dos últimos cento e cinqüenta anos, as 
pessoas passaram a questionar o valor do chamado conhecimento “inútil” 
com um vigor crescente, passando a acreditar mais e mais que o único 
conhecimento digno de mérito é aquele que se pode aplicar a algum setor da 
vida econômica da coletividade. (RUSSELL,2002:38) 
 Em toda parte, com raríssimas exceções, o conhecimento vinha perdendo o seu 
valor em si mesmo, passando a ser mero ingrediente de aptidão técnica. Os 
estabelecimentos de ensino, antes de tudo, deviam provar ao Estado sua capacidade de 
disseminar a qualificação técnica e a lealdade. 
 O conhecimento “útil” de fatofoi e é importante, pois construiu o mundo 
moderno e tudo o que nele desfrutamos como os carros, os trens e a aviação. Entretanto, 
trouxe consigo também os problemas como os gases poluentes nas cidades. E uma parte 
da educação tradicional era descabida, como o ensino de grego e latim a meninos que 
não possuíam capacidade e nem vontade (com raras exceções) de ler os originais das 
línguas. Contudo, isto não justifica o caráter apenas utilitário da educação. Adultos e 
crianças tem direito a lazer e para que seja mais proveitoso é necessário que se tenha 
interesse e prazer nos assuntos não relacionados ao trabalho. 
[...] Uma organização econômica mais adequada, que permitisse à 
humanidade beneficiar-se da produtividade das máquinas, levaria com 
certeza a um grande aumento do lazer, e lazer de sobra só é tedioso para 
quem não dispõe de uma boa quantidade de interesses e atividades 
inteligentes. Para que uma população ociosa seja feliz, ela deve ser uma 
população educada, e educada com uma visão de um deleite mental 
equivalente à da utilidade imediata do conhecimento técnico. (RUSSELL, 
2002: 42) 
 A atividade contemplativa é valorizada pelo conhecimento inútil. Torna mais 
prazerosa as coisas que a princípio seriam banais. 
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O aprendizado de curiosidades não apenas torna menos desagradáveis as 
coisas desagradáveis, como torna ainda mais agradáveis as coisas agradáveis. 
Eu passei a gostar mais de pêssegos e abricós desde que soube que seu 
cultivo provém da China dos primórdios da dinastia Han, que foram 
introduzidos na Índia pelos chineses do grande rei Kaniska, de onde se 
espalharam para a Pérsia, alcançando o Império Romano no primeiro século 
de nossa era. Ao aprender que a palavra “abricó” deriva da mesma raiz latina 
de “precoce”, porque o abricó amadurece cedo, e que o a do início da palavra 
foi acrescentado por engano, devido a um erro etimológico. Tudo isso torna 
mais doces estas frutas. (RUSSELL, 2002:44-45) 
 Indo além, a atitude contemplativa garante a serenidade e a prudência 
indispensáveis às atitudes a serem tomadas na vida. Além de aliviar aborrecimentos, 
tantos os triviais, como também os grandes males da vida como a dor, a morte e a 
crueldade. 
 
A ARQUITETURA DO ÓCIO 
 
 A arquitetura tem duas funções: a primeira – proporcionar abrigo e calor; a 
segunda – marcar a humanidade com uma ideia. No período medieval, por exemplo, as 
construções eram belas acidentalmente. O principal objetivo era garantir segurança, 
implicando na utilização de critérios militares nas obras. 
 No século XIX as construções, fábricas e os conjuntos de habitacionais não 
incentivavam a interação social de seus moradores. 
São duas as formas típicas da arquitetura do século XIX e elas se devem 
respectivamente à produção mecânica e ao individualismo democrático: a 
fábrica, com suas chaminés, e as fileiras de casas das famílias trabalhadoras. 
Enquanto a fábrica representa a organização econômica gerada pela produção 
industrial, as casas representam o ideal de segregação social de uma 
população essencialmente individualista. Os grandes edifícios das áreas onde 
o valor do solo é elevado apresentam uma unidade meramente arquitetural, 
não social, são blocos de escritórios, edifícios de apartamentos e hotéis cujos 
ocupantes, em vez de formar comunidades, como nos monastérios, se 
esforçam o mais possível para não tomar conhecimento da existência de seus 
vizinhos. E em todo lugar onde o valor da terra é relativamente baixo 
reafirma-se o princípio da casa unifamilar. À medida que nos aproximamos 
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de Londres ou de qualquer grande cidade do norte da Inglaterra, por trem, 
passamos por uma infinidade de ruas com esse modelo de habitação, no qual 
cada casa é o centro da vida individual, cabendo ao escritório, à fábrica e à 
mina, dependendo da localidade, representar a vida comunitária. A vida 
social exterior à família, até onde a arquitetura possa assegurar, é 
exclusivamente econômica: toda necessidade não-econômica deve ser 
satisfeita no âmbito da família ou permanecer latente. Se julgarmos os ideais 
sociais de cada época pela qualidade estética de sua arquitetura, os últimos 
cem anos constituem certamente o nível mais baixo já atingido pela 
humanidade. (RUSSELL, 2002:49) 
 A solução para o individualismo crescente seria a mudança arquitetônica. A 
criação de áreas comuns tornaria possível a diminuição da rotina desgastante das donas 
de casa, assim como tornaria melhor a interação entre as pessoas. 
 
O trabalho da esposa do trabalhador nunca se modernizou porque não é 
remunerado. Na verdade, é um trabalho em parte desnecessário e em parte 
passível de ser repartido entre especialistas diversos. Para que isto se realize, 
a primeira reforma seria de natureza arquitetônica. Trata-se de garantir as 
mesmas vantagens comunitárias que existiam nos monastérios medievais, 
sem o celibato, suprindo as necessidades dos filhos. (RUSSELL, 2002: 51-52) 
 Uma das barreiras a essa mudança nas construções eram os próprios assalariados, 
que gostavam da privacidade do lar. Contra tal argumento, Russell aponta que áreas de 
convívio como cozinhas comunitárias e de escolas maternais para as crianças não 
diminuiriam a privacidade e o conforto do resto de uma moradia bem mobiliada. 
 Os homens eram os que menos sofriam nesta estrutura vigente. Passavam pouco 
tempo com suas famílias, se irritando apenas com as lamúrias e irritações de suas 
companheiras. Em contrapartida, as crianças sofriam pelo pouco contato com o ar e a 
luz antes da experiência escolar. As mulheres, por sua vez, eram as piores vítimas. Mães 
e esposas em tempo integral, sem direito a férias ou descanso acabavam tendo nos filhos 
motivo de aborrecimento ao invés de felicidade. O sistema vigente exigia da mulher 
excepcional autodisciplina, bom senso e vigor. A ascensão profissional feminina, cada 
vez maior desde o século XIX, minimiza esta situação, tornando-a cada vez mais 
próxima do ideal. 
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 É possível a construção de espaços comunitários (cozinhas e escolas maternais), 
espaços que sirvam não só as tradicionais donas de casa, como mais ainda a crescente 
classe trabalhadora feminina, que sejam belos e que não prezem apenas pela eficiência, 
que sirvam tanto para unir como para tornar melhor a vida dos assalariados. 
[...] Se os subúrbios fossem construídos pelas municipalidades e não pelas 
empresas privadas, com ruas planejadas e casas parecidas com os 
alojamentos universitários, não haveria razão para não serem um colírio para 
os nossos olhos. A sordidez, tanto quanto a aflição e a pobreza, é a parte do 
preço que pagamos por continuarmos escravos da motivação do lucro privado. 
(RUSSELL, 2002:56) 
 
 
AS FINANÇAS DO ÓCIO 
 
 As finanças eram conduzidas de forma descabida e de difícil compreensão. 
Russell cita a reserva de ouro adquirida pela Espanha no século XVI como exemplo: A 
todo custo o país tomou medidas para evitar sua exportação. Isto, no entanto, não 
melhorou nem um pouco a realidade da população. E demonstra como até hoje a 
mineração é um exemplo da incongruência do pensamento moderno a despeito do 
dinheiro. 
De todas as ocupações consideradas úteis, uma das mais absurdas é a 
mineração do ouro. O ouro é extraído no solo da África do Sul e transportado, 
com infindáveis cuidados contra roubo e acidentes, para Londres, Paris e 
Nova York, onde é novamente colocado debaixo da terra, nas caixas fortes 
dos bancos. Ele bem poderia permanecer debaixo da terra na própria África 
do Sul. É possível que as reservas bancárias já tenham tido a sua utilidade na 
época em que supunha que elas poderiam serusadas quando surgisse a 
ocasião, mas, depois que se adotou a política de não permitir que elas 
baixassem além de um mínimo, esse valor tornou-se irrelevante. Se decido 
poupar 100 libras para uma emergência, estou sendo prudente. Mas se decido 
que por mais pobre que fique, nunca vou gastar as 100 libras, elas deixam de 
fazer parte da minha fortuna e não fará a menor diferença se eu me livrar 
delas. É exatamente esta a situação das reservas bancárias se elas não forem 
gastas em absolutamente nenhuma circunstância.[...] (RUSSELL,2002: 62-63) 
 
 As nações por sua vez possuem a mentalidade de que devem produzir tudo, a 
não ser que exista algum obstáculo natural que a impeça. Insistem na proteção de seus 
mercados, ignorando o fato de por isso perderem eventuais clientes, simplesmente por 
ver os demais países como concorrentes. 
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[...] As nações estrangeiras são vistas mais como produtores concorrentes do 
que como clientes potenciais, de modo que as pessoas se predispõem a perder 
os mercados externos para evitar a concorrência estrangeira. Havia, certa vez, 
numa pequena cidade, um açougueiro que ficou furioso com os outros 
açougueiros, porque eles roubaram sua clientela. Para arruiná-los, ele 
converteu a cidade inteira ao vegetarianismo, e viu depois, com espanto, que 
se arruinara também. A insensatez deste homem parece inacreditável e, no 
entanto, ela não é maior do que a das grandes potências. Ao perceberem que 
o comércio exterior enriquece as outras nações, todas ergueram barreiras 
tarifárias para destruí-lo. Para seu espanto, descobriram que haviam sido tão 
prejudicadas quanto suas concorrentes. Nenhuma foi capaz de lembrar que o 
comércio é recíproco e que a nação estrangeira que lhe vende é a mesma que 
lhe compra, direta ou indiretamente. Não se lembraram deste fato porque o 
ódio às nações estrangeiras tornou-as incapazes de pensar com clareza a 
respeito do comércio exterior. (RUSSELL, 2002: 67-68) 
 
 Os financistas dominam o sistema vigente, possuem interesses que de maneira 
geral não beneficiam a população. Com poder e dinheiro sustentam instituições de 
ensino para que formulem teses que sustentem suas decisões, controlam os meios de 
comunicação. Talvez isto seja a dificuldade da democracia no tempo moderno, que seria 
plenamente possível com os Estados tornando possível a consciência de suas finanças a 
população. Garantindo a educação e a maneira mais simples e explicar a estrutura da 
sociedade. 
 
 
A POLÍTICA DO ÓCIO 
 
 Em seu artigo “Em Defesa do Socialismo” Russell apontou que o sistema 
socialista depois de estabelecido mundialmente seria a chave para a solução de 
muitos problemas decorrentes do sistema econômico vigente. No entanto, ele 
ressalvou que sua opinião diferia da concepção marxista da maioria dos 
socialistas, de que uma revolta proletária contra os que controlavam os meios de 
produção era necessária. Esta mentalidade de vingança fez com que os não 
pertencentes à classe operária se rebelassem contra o socialismo de forma 
violenta, sendo o Fascismo um exemplo – uma retaliação “formidável”, segundo 
o filósofo. Enquanto os parâmetros marxistas fossem usados, um forte 
antagonismo faria do socialismo uma realidade impossível. 
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De minha parte, embora eu seja um socialista tão convicto quanto o mais 
ardente dos marxistas, não vejo o socialismo como o evangelho da vingança 
proletária e nem mesmo, primordialmente, como um meio de garantir a 
justiça econômica. Eu o vejo mais que tudo como um ajustamento à produção 
mecânica, demandando por considerações de senso comum e calculado para 
aumentar a felicidade não apenas dos proletários, mas da totalidade da raça 
humana, com exceção de uma ínfima minoria. E se ele não pode ser hoje 
conquistado sem uma sublevação violenta, isso se deve em boa medida à 
violência de seus defensores. Mas ainda tenho esperança de que uma defesa 
mais razoável possa abrandar a oposição e provocar a transição menos 
catastrófica possível. (RUSSELL, 2002:101-102) 
 Russell aponta três razões para a transição para o socialismo não ser feita de 
forma não violenta: (a) provavelmente ela não terá sucesso; (b) a luta será 
desastrosamente destrutiva; e (c) depois de uma guerra obstinada, os vitoriosos 
esquecerão seus objetivos originais e instituirão algo totalmente diferente, 
provavelmente uma tirania militar. Portanto, para que o regime seja bem sucedido é 
necessária a capacidade de convencer a maioria a aceitar suas doutrinas. (RUSSELL, 
2002:104) 
 Os que defendem o sistema econômico vigente defendem que a expectativa do 
lucro faria com que houvesse mercadorias certas nas quantidades certas. Talvez no 
passado isso tenha sido verdade, no entanto, com a complexidade da produção moderna 
isto não pode ser afirmado. 
Isto é conseqüência do caráter complexo da produção moderna. Se sou um 
remendão de aldeia à moda antiga e as pessoas me trazem seus sapatos para 
consertar, eu sei que haverá demanda para o produto do meu trabalho. Mas se 
sou um grande fabricante de sapatos, empregando maquinaria cara, preciso 
estimar a quantidade de pares de sapatos que serei capaz de vender e não é 
improvável que erre na minha estimativa. Outro fabricante pode ter uma 
maquinaria melhor e ser capaz de vender sapatos mais baratos, ou meus 
antigos clientes podem ficar mais pobres e aprender a fazer seus sapatos 
durarem mais, ou ainda a moda pode mudar e meus clientes passarem a 
demandar um tipo de sapato que não sou capaz de produzir com minhas 
máquinas. Se acontece uma dessas coisas, não apenas eu deixo de obter 
lucros, como minhas máquinas ficam ociosas e meus empregados, sem 
trabalho. O trabalho utilizado na fabricação de minhas, que acabou não 
resultando na produção de mercadorias úteis, terá sido tão inútil quanto areia 
jogada no mar. Os homens demitidos do emprego não estarão mais 
produzindo bens para servir às necessidades humanas, e a comunidade terá 
empobrecido na proporção do gasto que terá de fazer para livrá-los da miséria. 
Vivendo seguro-desemprego e não do salário, as pessoas passam a gastar 
muito menos, causando, por conseguinte, desemprego entre os que produzem 
as mercadorias que elas consumiam. E, assim, o erro de cálculo inicial quanto 
ao número de sapatos que eu posso vender com uma certa margem de lucro 
produz, pouco a pouco,círculos cada vez mais amplos de desemprego, 
acompanhado da redução da demanda. Quanto a mim, sigo atado à minha 
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dispendiosa maquinaria, que provavelmente absorveu todo o meu capital e 
meu crédito, o que me impossibilita mudar repentinamente do ramo dos 
sapatos para outra indústria mais próspera. (RUSSELL, 2002:106) 
 A ausência de escassez é outro motivo para o colapso do capitalismo. Algumas 
mercadorias se tornam mais baratas quando produzidas em excesso. Na prática, deveria 
haver uma fábrica só no mundo. No entanto, a situação atual exige diversas 
concorrentes, que não produzem plenamente e que, portanto, não possuem garantia de 
lucro. 
 Em um sistema justo as decisões seriam tomadas em cima do que é socialmente 
vantajoso, pesando os custos para a coletividade, mas é o custo para o fabricante 
individual que determina o que acontecerá. 
No regime capitalista, o custo que determina se um certo produto será 
fabricado por uma determinada firma é o custo para aquela firma, não para a 
comunidade. Vamos ilustrar esta diferença com um caso imaginário. 
Suponhamos que alguém – o Sr. Henry Ford, por exemplo – invente uma 
forma de fabricar automóveis tão baratos que ninguém poderá competir com 
ele, resultando daí a falência de todos os outros fabricantes de automóveis. 
Para se estimar o custo desses novos carros paraa coletividade, deve-se 
acrescentar, aos custos do Sr.Ford, a exata proporção de todas as fábricas que 
pertenciam as firmas falidas, bem como o custo de recuperação e treinamento 
dos operários e administradores que elas empregavam e que agora estão sem 
trabalho.(Alguns poderão arranjar emprego com o Sr.Ford, mas não todos, 
uma vez que o novo processo é mais barato e requer menos trabalho). Talvez 
haja também outras despesas para a comunidade – disputas trabalhistas, 
greves, distúrbios, policiamento extra, processos e prisões. Quando todos 
esses itens forem contabilizados, talvez se descubra que o custo dos novos 
carros para a coletividade é, de início, consideravelmente mais alto que o dos 
velhos.[...] (RUSSELL,2002:108) 
 Há os que dizem que devido à tecnologia existente, uma jornada de uma hora de 
trabalho seria suficiente para se cumprir as metas. Russell sugere uma redução pela 
metade da média existente de oito horas. Uma jornada de quatro horas permitiria o 
direito ao lazer, bem como o emprego a todos. Entretanto,o assalariado é medido pelo o 
que produz, preferindo longas horas de trabalho com um salário longo, a mais horas 
livres e um salário menor. 
 A situação poderia ser pior. Se não fosse por algumas ineficiências e produções 
desnecessárias, mais da metade dos trabalhadores estariam desempregados. Enquanto 
permanecer este sistema, qualquer medida para eliminar o desperdício só tornará pior a 
vida dos assalariados. 
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 No mundo existem muitos na miséria e a outra grande parte da população vive 
com medo da mesma. O desemprego assombra a vida dos assalariados. Ninguém está 
livre desse sentimento, os chefes de negócios, por exemplo, convivem com o receio de 
suas empresas falirem e perderem tudo o que possuem. Os trabalhadores autônomos 
vêem todos os seus esforços na educação de seus filhos serem em vão, pois a 
qualificação deles não se demonstra mais suficiente para garantir seus empregos. 
[...] Acham-se homens e mulheres com formação universitária trabalhando 
atrás de balcões, que os livram da miséria às custas dos que antes lá estavam 
empregados. Em todas as classes, desde a mais baixa até quase a mais alta, o 
medo econômico governa os pensamentos dos homens durante o dia e seus 
sonhos durante a noite, tornando o trabalho exasperante e o lazer não 
reparador. Este terror permanente é, creio eu, a principal causa do estado de 
loucura que vem varrendo uma parte considerável do mundo civilizado. 
(RUSSELL, 2002: 111) 
 A aspiração a riqueza rege as vidas das pessoas, mas só ela não garante a 
qualidade do trabalho, já que as maiorias das pessoas trabalham apenas para não 
empobrecer. Um sistema social que abolisse esta aspiração não seria errado, e por 
conseqüência acabaria com a insegurança que é o motivo de história no mundo moderno. 
 Os ricos desempregados influenciam a arte de forma nefasta e sustentam um 
comércio fútil. 
[...] E há o mal adicional de que o sustento de muita gente depende desse tipo 
de futilidade. O poder de compra dos muitos ricos gera ao seu redor um 
grande número de parasitas que temem ficar arruinados se não houver mais 
gente rica e desocupada para comprar seus artigos. São pessoas que sofrem 
moral, intelectual e artisticamente de uma insolúvel dependência do poder 
desses tolos. (RUSSELL, 2002: 114) 
 No que concerne a educação, por mais que existam bolsas, a educação superior 
é praticamente para os ricos. A grande maioria da população humilde tem de trabalhar 
tanto que chegam sem energias aos locais de estudo. Como resultado, mais desperdício 
de talentos dos filhos dos trabalhadores nas mais diversas áreas. 
 Além disso, é necessária uma escola que incite pensamentos críticos nos alunos. 
O modelo atual apenas serve ao estado, evitando tais pensamentos que poderiam trazer 
problemas ao sistema capitalista vigente. Russell ainda aponta que com o tempo o 
socialismo poderia se tornar maduro a ponto de permitir pensamentos de tal magnitude 
e que enquanto permanecer nosso sistema econômico não se podem esperar melhoras no 
sistema educacional. 
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 Pior que a situação dos homens é a situação das mulheres. No papel de mães e 
donas-de-casa, não possuem o direito sequer de se demitir. É necessária a implantação 
de mais escolas maternais. Esta mudança na vida das mulheres vem ocorrendo deforma 
gradativa, mas não será feita plenamente sem uma transformação econômica geral da 
sociedade. 
 Os danos impetrados pelo sistema capitalista a arte são visíveis, a motivação 
comercial acabou com a beleza das pinturas que adornavam as arquiteturas, impedindo 
a exploração de várias possibilidades no cinema e na literatura. 
 O filósofo aponta que depois que o socialismo estiver instaurado e a oposição ao 
regime não for mais tão pesada, o Estado poderá custear a publicação dos livros e os 
que não considerarem com mérito, podem ser custodiados por trabalho extra. 
 Em alguns setores da sociedade ficou provado que o controle público é 
necessário. A saúde pública, as escolas, o setor energético, tais setores quando não 
diretamente controlado pelo Estado, devem ser regulamentados e supervisionados. 
Dentre estes serviços que devem permanecer na mão do pode público está a Guerra. 
Ninguém acredita que a defesa do Estado deva permanecer em empreiteiras privadas, 
por mais que haja incompetência estatal. 
 No que se referem à guerra, Russell levanta dois questionamentos (1) Até que 
ponto o perigo da guerra está hoje ligado ao capitalismo? ; (2) Até que ponto o 
estabelecimento do socialismo eliminaria este perigo? (RUSSELL, 2002:119) 
Uma paz duradoura só pode nascer da eliminação das causas de inimizade 
entre as nações. Atualmente, essas causas residem antes de tudo nos 
interesses econômicos de alguns setores e só podem, portanto, ser abolidas 
por uma reconstrução econômica de base. (RUSSELL, 2002:120-121) 
 Ainda cita a Indústria siderúrgica, a para que as nações sirvam aos seus 
interesses, incentivam nas pessoas impulsos como o medo, o ressentimento contra a 
injustiça e o patriotismo e a honra nacional. 
[...] O mundo está na condição do bêbado que quer se recuperar, mas, 
cercado de amigos que a toda hora lhe oferecem bebida, acaba recaindo no 
vício. Neste caso, os amigos são pessoas que ganham dinheiro com a sua 
propensão infeliz, de modo que o primeiro passo para a sua recuperação deve 
consistir em eliminá-los. É somente neste sentido que o capitalismo moderno 
pode ser considerado causa da guerra e a se empenharem na construção de 
acordos equânimes que tornassem improvável a sua ocorrência futura. 
(RUSSELL, 2002:122) 
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 O filósofo ainda ponta que a nacionalização das indústrias melhoraria a situação, 
já que os lucros da siderúrgica serviriam para amenizar o prejuízo de outras áreas e 
garantir o emprego da população. No entanto, a solução definitiva estaria no socialismo 
internacional. 
 Com uma unidade central os erros poderiam ser evitados. Ao invés dos lucros, 
as indústrias teriam como motivação o planejamento governamental. Com o socialismo 
pode se encontrar o equilíbrio impossível no sistema capitalista. Acabará a insegurança 
econômica, que faz com que surjam as guerras. E as pessoas democraticamente eleitas 
seriam responsáveis por garantir o equilíbrio entre o lazer e o conforto. 
Enquanto o socialismo existir somente em alguns países civilizados, a 
possibilidade da guerra permanecerá e a totalidade dos benefícios do sistema 
não será capaz de concretizar-se. Mas podemos assumir com segurança que 
todo país que adotar o socialismo deixará de ser agressivamente militarista e 
só estará preocupado em evitar a agressão por parte dos demais. Quandoo 
socialismo tiver se generalizado em todo o mundo civilizado, os motivos para 
guerras em grande escala não deverão ter força suficiente para superar as 
razões, muito mais óbvias, de se preferir a paz. (RUSSELL, 2002: 124) 
 
Referências: 
DE MASI, Domenico. O Ócio Criativo. 2ª Ed, Rio de Janeiro: Sextante, 2000. 
________. A Economia do Ócio. 2ª Ed., Rio de Janeiro: Sextante, 2001. 
________. A Sociedade Pós-Industrial. São Paulo: Senac, 1999. 
________.Desenvolvimento sem trabalho. 4ª Ed São Paulo: Esfera,1999. 
RUSSELL, Bertrand. O elogio ao ócio. Rio de Janeiro: Sextante, 2002.

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