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Literatura do nosso tempo

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Instituto do Emprego e Formação Profissional, IP 
 Centro de Emprego e Formação Profissional da Guarda
Educação e Formação de Adultos - B3
Módulo: Literatura do Nosso Tempo
Como determinar critérios para definir o que é do nosso tempo?
- Última Atualização (Quinta, 30 Junho 2005)
Como determinar critérios para definir o que é do nosso tempo? Aceitar o que coexiste connosco? Mas connosco, quem, de entre nós, uma vez que as idades são diferentes, e as ideias, as sensibilidades e os valores também?
Podemos talvez considerar que essas diferenças são justamente marca de um tempo ainda não filtrado pela sistematicidade de um ponto de vista histórico, e atentar na sua coexistência como sinal de variedade e riqueza, ou mesmo de imperfeição do nosso olhar, que em contrapartida nos transmite a vibração da incompletude de tudo o que vive, e por isso pulsa, dura e se transforma.
Contemporâneos a escrever, em Portugal. Alguns vultos tutelares, personalidades maiores, escritores de referência, mais ou menos afastados do nosso quotidiano, emergindo na imprensa, TV, ou morando mesmo ao nosso lado, frequentando a nossa praia, indo, como nós, ao supermercado ou ao cinema. Outros, menos tutelares, que escrevem nos periódicos, que recebem prémios, mais jovens, mais precários. Todos a fazer-nos pensar sobre o mundo e a vida, a fazer-nos emergir da nossa condição de leitores à partida passivos, mas determinados na atitude de escolha, que só pode exercer-se a partir do conhecimento. Tentemos, pois, conhecer. Em Arte Poética II, Sophia de Mello Breyner Andresen (n. 1919) escreve: A poesia é a minha explicação com o universo, a minha convivência com as coisas, a minha participação no real, o meu encontro com as vozes e as imagens. Por isso o poema não fala duma vida ideal mas duma vida concreta: ângulo da janela, ressonância das ruas, das cidades e dos quartos, sombra dos muros, aparição dos rostos, silêncio, distância e brilho das estrelas, respiração da noite, perfume da tília e do orégão. Para Sophia, a poesia é, pois, encontro do ser com o concreto do mundo, e repare-se como, explicitando o que para si é a poesia, a autora insensivelmente já está a fazer poesia, comunicando a sua percepção das coisas através da transfiguração da palavra poética. 
Publica livros desde 1944 (também prosa de ficção, e livros para crianças como A Menina do Mar e A Fada
Oriana, 1958), e um dos seus grandes temas é o mar, com a luminosidade de conhecimento solar e a regularidade de reconstrução do movimento, ou respiração vital, que ele comunica, ou mesmo na epifania do mundo. Em Dia do Mar (1947), «Navegação»: Distância da distância derivada
Aparição do mundo: a terra escorre
Pelos olhos que a vêem revelada.
E atrás um outro longe imenso morre. Muito sensível às implicações culturais da política e do sentimento da liberdade, exprime por vezes a pequenez dos ambientes que a opressão social sufoca. Em Livro Sexto (1962), «Exílio»: 
Quando a pátria que temos não a temo
Perdida por silêncio e por renúncia
Até a voz do mar se torna exílio
E a luz que nos rodeia é como grades. Em Eugénio de Andrade (n. 1923), a poesia dos elementos é também poderosa, mas quase sempre reportada ao amor - da natureza, dos seres e do corpo. Muito sensual e literária, plástica e musical, a sua poesia concebe-se como reelaboração da palavra até um limite de despojamento que parte do mundo (agudamente percebido) para reencontrar nele o ser eleito e, em última análise, a solidão como reduto essencial. «As palavras interditas» (1951), poema de culto para várias gerações: Os navios existem, e existe o teu rosto encostado ao rosto dos navios.
Sem nenhum destino flutuam nas cidades, partem no vento, regressam nos rios. As palavras que te envio são interditas até, meu amor, pelo halo das searas; se alguma regressasse, nem já reconhecia o teu nome nas suas curvas claras. Eugénio tem a faculdade de articular o circunstancial com o absoluto, de perceber num ambiente concreto a voz de comunicação que o levará à inscrição poética, à transfiguração modelar, numa expressão límpida e pura muito própria. Em Memória Doutro Rio (1978), «Com a manhã»: Vem dos lados do rio, as mãos fresquíssimas, algumas gotas de água ainda nos cabelos. Com a manhã chega o anónimo respirar do mundo. Um cheiro a pão fresco invade o pátio todo. Vem dos lados do rio: para levar à boca, ou ao poema. 
António Ramos Rosa (n. 1924) intelectualiza (não só nos seus inúmeros livros de poesia, mas também em ensaios sobre a criação literária e de interpretação poética) a articulação entre os elementos naturais e a cultura, mas mantém a vibração inteira do apelo pela expressão livre do homem e pela sua sagração no labor da palavra. Em Viagem através Duma Nebulosa (1960), ficou célebre este poema: Não posso adiar o amor para outro século não posso ainda que o grito sufoque na garganta ainda que o ódio estale e crepite e arda sob montanhas cinzentas e montanhas cinzentas
(...)
Não posso adiar para outro século a minha vida nem o meu amor nem o meu grito de libertação não posso adiar o coração. Posteriormente, a austeridade de expressão apurou-se na sua poesia, extremamente reduzida no plano da sintaxe, tanto quanto luxuriante nas insistências vocabulares e numa inexaurível irradiação semântica, quase sempre em torno da relação amorosa e da relação com a escrita. Em O Incerto Exacto
(1982): O desejo 
A surpresa
Ou a maravilha
Não pela igual imagem mas destroçando – a Resíduos só ou a passagem dos sinais que dizem a passagem do que será se for o contacto imprevisível do obscuro inacessível corpo em outro corpo vivo Na ficção, Agustina Bessa-Luís (1922) afirmou-se com A Sibila (1954), que cria um modo muito próprio de narração no romance, utilizando constantes derivações em relação ao discurso romanesco central, mas escapando à tendência abstractamente que daí resulta, através de um regionalismo radicalizado em atitudes psicológicas peculiares e de um estilo centrado na subjectividade dos juízos narrativos. Ah, rotina doce dessa vida em comum, porém extraordinária de independência e qualidade solitária!
 A fazenda progredia, iam envelhecendo as mulheres; os cabelos que eram há pouco ainda castanhos apareciam grisalhos, depois brancos; Joaquim abandonava de todo o seu cargo de lavrador, raramente vigiava os moços ou escolhia o gado e até deixava de visitar a amiga, seca e escura como um tronco castigado dos temporais. Bebia de madrugada a sua dose de aguardente que o mantinha numa benévola e distraída disposição durante todo o dia; tinha uma embriaguez discreta, quase afável, e delicados sonhos povoavam-lhe a mente. 
Os Quatro Rios, 1964Desenvolve no seu romance uma concepção do tempo que sublinha a sua qualidade de duração interior e de continuidade, que prolonga até à sua ficção mais recente, em A Corte do Norte, 1987, ou
O Concerto dos Flamengos, 1994. Também pela qualidade ficcional do tempo interior se destaca Maria Judite de Carvalho [1921-1998], esplendorosa revelação nos contos de Tanta Gente, Mariana! 1959, ou na novela romanceada As Palavras Poupadas, 1961, onde emergem personagens de fundura psicológica matizada de finas implicações sociais, patentes em recortes de miúdos gestos ou de imperceptíveis atitudes e julgamentos: Levanta-se da mesa. Lá fora, num relógio qualquer, batem duas horas. Daí a momentos, daí a uma eternidade, levantar-se-á da mesa outra vez. E amanhã.
E depois. E daí a muitos anos. Tudo morre à noite, dizia Claude. Mas não, a vida é longa, desliza e escorre sem uma quebra. Uma sucessão de acontecimentos, uma corrente sem fim de palavras ditas e de palavras poupadas. Dessas principalmente. As Palavras Poupadas Decorre desta concepção narrativa uma atenção ao desfiar do tempo quotidiano e às personagens incaracterísticas da circunstância comum que levam a autora à prática da crónica (Seta Despedida, 1994) e à atenção ao fragmentário que pode concretizar-se no conto (Flores ao Telefone, 1968). Urbano Tavares Rodrigues (1923) escreve regularmente desde os anos cinquenta,durante os quais se revelou como contista talentoso (Uma Pedrada no
Charco, 1958) e como romancista receptivo ao estado da sociedade contemporânea e à evolução da escrita literária (ex.
Bastardos do Sol, 1959, e A Hora da Incerteza, 1995). O amor, a intervenção social e política, a cidade de Lisboa e a região do Alentejo são os seus temas dominantes, cuja natureza e circunstância persegue com insistência e insatisfação: Almoço (a Adriana está a reaprender as comidas alentejanas) uma fabulosa sopa de beldroegas com queijo e ovo escalfado. É a minha infância que regressa, quase intacta, nesse sabor. Os cílios da minha irmã a baterem muito, interrogativos e indignados, quando lhe roubo do prato, à sorrelfa, o bocado de queijo de ovelha, delicioso, que de direito, direitíssimo, lhe cabia. Já está com lágrimas nos doces olhos castanhos e eu, repeso, de colher no ar, a querer-lhe restituir o objecto da sua mágoa. 
A Hora da Incerteza José Cardoso Pires (1925) esteve desde sempre ligado à ficção de implicação social, por vezes aliando as concepções neo-realistas às existencialistas (O Anjo Ancorado, 1958), e notabilizando-se por um estilo seco e enxuto que maneja com extrema sobriedade, desde O Hóspede de Job, 1963, a
Balada da Praia dos Cães, 1982. Pássaros pontilhando a ramaria, o horizonte do mar por cima da copa das árvores e entre o céu e a linha de água uma luzinha fria a caminhar para o crepúsculo. Um petroleiro? Elias demora-se a olhar.
Tempo ao tempo. Só no dia seguinte começará o inventário dos sinais e dos palpites, confiado como sempre no Velhaco das Algemas. 
Tempo ao tempo. Mais depressa se apanha um assassino que um morto, porque, como dizia o outro, o morto voa a cavalo na alma e o assassino tropeça no medo. Balada da Praia dos Cães Mais recentemente, Alexandra Alpha, 1987, e De Profundis - Valsa lenta, 1997 dão conta de um insanável gosto de ficcionar a realidade mais próxima e comum no que ela, através da percepção do ficcionista, pode revelar de inverosímil, excepcional e inacessível ao olhar humano. José Saramago (1922), embora só comece a publicar muito mais tarde, em poesia, crónica e conto, só com os romances Levantado do Chão, 1980, e Memorial do Convento, 1982, atinge uma popularidade que não deixa de crescer, no plano nacional e internacional. Ficcionaliza momentos particulares da história e da cultura de Portugal (O Ano da Morte de Ricardo Reis, 1944, História do Cerco de Lisboa, 1989) ou entrevê períodos de distopia ucrónica (Jangada de
Pedra, 1986) e inlocalizável (Ensaio sobre a Cegueira, 1995, Todos os Nomes, 1997) que dão conta de uma reversão do homem ao seu confronto necessário, e nem sempre afortunado, com a comunidade, numa escrita particularíssima que põe em relevo uma frase longa e progressivamente elaborada por uma instância autoral que emerge e não se demite do seu papel de seleccionar e de julgar, assim fundamentando a ideia da criação literária. Aqui têm, disse o escritor. A mulher do médico perguntou, Posso, sem esperar a resposta pegou nas folhas escritas, umas vinte seriam, passou os olhos pela caligrafia miúda, pelas linhas que subiam e desciam, pelas palavras inscritas na brancura do papel, gravadas na cegueira. Estou de passagem, dissera o escritor, e estes eram os sinais que iam deixando passar. 
A mulher do médico pôs-lhe a mão no ombro, e ele com as suas duas mãos foi lá buscá-la, levou-a devagar aos lábios, não se perca, não se deixe perder, disse, e eram palavras inesperadas, enigmáticas, não parecia que viessem a propósito.
Ensaio sobre a Cegueira Augusto Abelaira (1926), ficcionista de renome durante os anos sessenta (Cidade das Flores,
1959, As Boas Intenções, 1963), correspondeu aos anseios de uma geração que propunha a renovação social e política num contexto cultural de consciencialização e responsabilidade, no qual a arte e a literatura ocupavam lugar determinante.
Bolor, 1968, é um romance que manifesta a desagregação dos sentimentos e a oscilação das convicções, numa escrita narrativa profundamente inovadora que o seu autor continuaria a desenvolver subsequentemente, questionando a lógica da comunicação e da sucessão do tempo, e por isso mesmo afirmando a fidelidade a valores fundamentais como o amor e a criatividade (O Bosque Harmonioso, 1982, Outrora Agora, 1996). Agora, ele (ele, o Jerónimo) ali à varanda, trinta anos depois, a gozar o sol, os olhos no mar ( «la mer, toujours recommencée»). Mas lá em baixo, acinzentado, na avenida paralela à praia, um automóvel chega e, a curva rápida, sem hesitações, enfia-se entre dois carros -, manobra fulminante.
A Formadora: Belmira Lourenço

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