Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Manual Prático de Identificação de Lesões Pulmonares em Suínos SUINOCAST Karine Ludwig Takeuti, Médica Veterinária Doutora em Ciências Veterinárias, UFRGS As doenças respiratórias, junto com as enterites, correspondem às principais enfermidades que acometem os suínos. O sistema de criação atual favorece a disseminação e instalação de doenças respiratórias devido à maior concentração de animais por baia/galpão e de granjas por região. As pneumonias determinam alto impacto econômico para a suinocultura através de condenações de carcaças, mortalidade de animais, gastos com medicamentos, piora na conversão alimentar e redução na ingestão de alimento, resultando na diminuição de ganho de peso diário. Os sinais clínicos das diferentes formas de pneumonia são semelhantes, o que dificulta o diagnóstico in vivo. Com exceção de algumas doenças que cursam com espirros e secreções nasais, com a Influenza, geralmente animais com pneumonia apresentam apenas tosse. Em casos mais graves pode ocorrer dispneia, respiração abdominal (“batedeira”), diminuição de apetite, depressão e hipertermia. Dessa forma, o histórico (duração dos sinais clínicos e idade dos animais) e a avaliação dos pulmões durante a necropsia e/ou a monitoria no abate são ferramentas importantes para o diagnóstico do (s) agente (s) causal (is) da doença. Anatomia do pulmão suíno Os suínos são mais predispostos a pneumonias devido às suas particularidades anatômicas. A lobulação bem definida, a pleura espessa e a presença escassa de bronquíolos limitam a ventilação colateral entre os lóbulos pulmonares e reduzem a eliminação de partículas, favorecendo o acúmulo de exsudato. O pulmão do suíno é dividido em sete lobos: apical direito, apical esquerdo, cardíaco direito, cardíaco esquerdo, diafragmático direito, diafragmático esquerdo e intermediário (Figura 1). Para a identificação das lesões pulmonares, é importante saber identificar cada lobo, pois em determinadas enfermidades a distribuição das lesões é característica, facilitando o diagnóstico. Durante a inspeção do pulmão, deve-se verificar a presença de lesões tanto na superfície dorsal quanto ventral do órgão, já que é possível que uma das superfícies esteja livre de lesões, enquanto que a outra pode estar afetada. Figura 1: Ilustração dos sete lobos do pulmão suíno: AD (apical direito), AE (apical esquerdo), CD (cardíaco direito), CE (cardíaco esquerdo), DD (diafragmático direito), DE (diafragmático esquerdo) e I (intermediário). Idade dos animais Também é importante que seja considerada a idade dos animais acometidos, já que algumas enfermidades são encontradas em apenas algumas fases do ciclo produtivo (Tabela 1). Sabendo-se quais as doenças mais frequentes em cada fase, é possível restringir as suspeitas, auxiliando o médico veterinário no diagnóstico presuntivo, no tratamento adequado e na adoção de medidas de controle e prevenção. http://suinocast.com.br/wp-content/uploads/2015/07/Pulm%C3%A3o.jpg Tabela 1: Principais pneumonias que acometem suínos no Brasil de acordo com a fase de produção. Fase Doenças mais comuns Maternidade Influenza Aujeszky Intoxicação por fumonisina* Pneumonia embólica* Creche Influenza Circovirose Aujeszky Intoxicação por fumonisina* Pneumonia embólica* Recria-Terminação Influenza Circovirose Pneumonia micoplásmica Pleuropneumonia Pasteurelose Intoxicação por fumonisina* Pneumonia embólica* Lesões pulmonares de importância patológica Ao examinar os pulmões de suínos deve-se observar três características principais: coloração e consistência do parênquima pulmonar e distribuição das lesões pulmonares. As lesões pneumônicas são denominadas áreas de consolidação ou hepatização pulmonar, já que sua consistência e coloração se assemelham ao fígado. Nestes casos, o pulmão apresenta-se firme, resultante da presença de exsudato inflamatório nos alvéolos e/ou infiltração do interstício. A presença de edema interlobular, pleurite, nódulos necro-hemorrágicos e abscessos também deve ser avaliada. Distribuição: a distribuição das lesões é uma das principais ferramentas para auxiliar no diagnóstico presuntivo das pneumonias. Pneumonias localizadas indicam infecção aerógena e os lobos pulmonares acometidos variam conforme o tipo de pneumonia (Tabela 2): Nos casos de broncopneumonia, como na infecção por Mycoplasma hyopneumoniae, as lesões concentram-se nos lobos apicais, cardíacos, intermediário e, eventualmente, porção anterior dos diafragmáticos, resultando em uma distribuição do tipo crânio-ventral (antero-ventral). Este padrão de distribuição ocorre por influência gravitacional e pela menor eficiência dos mecanismos de defesa desses lobos pulmonares. Nas pneumonias fibrinosas ou necro-hemorrágicas as lesões se distribuem na região dorso-caudal do pulmão. Nestes casos é possível que sejam encontradas lesões de pleurite associadas. As infecções por Actinobacillus pleuropneumoniae e Pasteurella multocida são exemplos desse tipo de pneumonia. Já pulmões com áreas multifocais de pneumonia são indicativas de infecção hematógena, consequentemente a disseminação do agente infeccioso pode ocorrer em todos os lobos pulmonares. São exemplos deste tipo de pneumonia: Pneumonia intersticial, como aquelas causadas pelo vírus da Influenza suína e Circovírus suíno tipo 2. Nestes casos, as lesões de pneumonia são disseminadas e pode haver edema interlobular. Normalmente o agente causal é viral. Pneumonia embólica, causadas por bactérias piogênicas, em que são observados pequenos abscessos ou granulomas multifocais. Consistência: na palpação do pulmão podem ser encontradas diferentes consistências que variam com o tipo de pneumonia (Tabela 2). Nas pneumonias intersticiais observa-se que o pulmão é firme e elástico devido ao engrossamento dos septos alveolares, consequentemente encontra-se mais tecido e menos ar. Quanto mais severa a pneumonia intersticial, mais firme será o pulmão. Em pneumonias fibrinosas a consistência do pulmão é firme, porém elástica devido à presença de fibrina que retém elasticidade ao órgão. Nos casos de broncopneumonia, a consistência do pulmão é muito firme e inelástica devido à presença de infiltrado inflamatório. Coloração: o pulmão do suíno sem alterações possui coloração rosada (Foto 1). No entanto, quando lesões de pneumonia estão presentes, observam-se áreas avermelhadas que podem ser identificadas facilmente pelo contraste de coloração em relação ao pulmão normal (Fotos 2, 3 e 4). Tabela 2: Padrão de distribuição de lesões pulmonares, consistência e coloração do pulmão suíno normal e em diferentes tipos de pneumonia. Distribuição das lesões Consistência Coloração Pulmão normal Mole, elástico e crepitante Rosada Pneumonia intersticial Multifocal Firme e elástico (semelhante à bola de espuma) Vermelha Pneumonia fibrinosa Localizada Mais firme e elástico (semelhante à bola de borracha) Vermelha Broncopneumonia Localizada Muito firme e não elástico (semelhante à bola de tênis) Vermelha Foto 1: Pulmão de suíno sem alterações Foto 2: Pulmão com áreas de consolidação antero-ventral, sugestivo de pneumonia micoplásmica. http://suinocast.com.br/wp-content/uploads/2015/07/Pulm%C3%A3o-normal.jpg http://suinocast.com.br/wp-content/uploads/2015/07/Pneumonia-micoplasmica.jpg Foto 3: Pulmão com áreas de consolidação nos lobos cardíaco e diafragmático, lesões necro-hemorrágicas e pleurite nos lobos diafragmáticos, sugestivo de pleuropneumonia. Foto 4: Pulmão com áreas multifocais de consolidação, sugestivo de Influenza. http://suinocast.com.br/wp-content/uploads/2015/07/Pleuropneumonia.jpg http://suinocast.com.br/wp-content/uploads/2015/07/Influenza.jpg *Foram consideradas apenas pneumonias sem envolvimento secundário e aquelas que são mais frequentes na suinoculturabrasileira. No entanto co-infecções entre M. hyopneumoniae e P. multocidasão muito comuns no Brasil. **Cepas de P. multocida “APP like” podem causar lesões semelhantes à pleuropneumonia, com presença de nódulos necro-hemorrágicos. ***O edema interlobular não está presente em todos os casos necessariamente. Alterações pulmonares sem importância clínica Durante a avaliação dos pulmões, deve-se realizar o diagnóstico diferencial das lesões patológicas daquelas que não representam alterações de importância clínica e são facilmente confundidas. As alterações que ocorrem com maior frequência são: aspiração de sangue, aspiração de água e a lesão de choque elétrico. http://suinocast.com.br/wp-content/uploads/2015/07/Les%C3%B5es-pneumonia.png Foto 5: Pulmão apresentando áreas mais escuras com distribuição multifocal e presença de coágulo na traqueia, resultante de aspiração de sangue. Nota-se a diferença de coloração entre áreas de consolidação pulmonar antero-ventral, localizada no lado direito do pulmão (*), e áreas de aspiração de sangue no lado esquerdo do pulmão (**). À palpação, as lesões de consolidação são firmes e não elásticas, enquanto que nas aspirações de sangue os pulmões permanecem friáveis e elásticos. Foto 6: Pulmão apresentando áreas levemente mais escuras com distribuição multifocal, resultante de aspiração de água. http://suinocast.com.br/wp-content/uploads/2015/07/Pulm%C3%A3o-com-%C3%A1reas-escuras1.jpg http://suinocast.com.br/wp-content/uploads/2015/07/Aspira%C3%A7%C3%A3o-de-%C3%A1gua.jpg Foto 7: Pulmão com petéquias multifocais, resultante da eutanásia por eletrocussão. Conclusão Para auxiliar o médico veterinário a diagnosticar o tipo de pneumonia, é possível seguir os fluxograma abaixo: http://suinocast.com.br/wp-content/uploads/2015/07/Eutan%C3%A1sia.jpg Conhecer a anatomia do pulmão do suíno, saber identificar e diferenciar alterações pneumônicas daquelas que não são relevantes do ponto de vista clínico-patológico e observar o padrão de distribuição de lesões são ferramentas importantes na avaliação macroscópica dos pulmões. Esta avaliação, associada ao histórico da doença pulmonar no plantel são fundamentais na obtenção de um diagnóstico presuntivo. Referências Bibliográficas Lippke, R. T.; Kummer, R.; Marques, B. M. F. P. P.; Mores, T. J.; Gonçalves, M. A. D. & Barcellos, D. E. S. N. Monitoria sanitária em suinocultura. Acta Scientiae Veterinariae. v. 37, p. 137-146. 2009. López, A. Respiratory System. In: Mcgavin, M. D. & Zachary, J. F. Pathologic Basis of Veterinary Disease.St. Louis: Mosby Elsevier, 2007. p. 463-558. Mores, M. A. Z. Pneumonias em Suínos. In: Alfieri, A. F. et al. Tópicos em Sanidade e Manejo de Suínos. Sorocaba: Curuca Consciência Ecológica, 2010. p. 19-82. Rech, R. R.; Silva, M. C.; Langohr, I. M.; Marques, M. G.; Pescador, C. A.; Silva, G. S.; Dutra, M. C.; Brum, J. S.; Kramer, B.; Bordin, L. C. & Silva, V. S. Nem tudo que parece ser, é lesão: aspectos anatômicos, não lesões, artefatos, lesões sem significado clínico e alterações post mortem encontrados na necropsia de suínos domésticos e selvagens (Sus scrofa). Pesquisa Veterinária Brasileira. v. 33, p. 1237-1255. 2013. Sobestiansky, J.; Barcellos, D.; Driemeier, D. & Matos, M. P. C. Monitoramento de abate. In: Sobestiansky, J. & Barcellos, D. Doenças dos Suínos. 2. ed. Goiânia: Cânone Editorial, 2012. p. 910-931 Stevenson, G. W. Gross pathology of the respiratory tract. Proceedings 32nd AASV Meeting, p. 457-461, 2001. Van Alstine, W. G. Respiratory System. In: Zimmerman, J. J. et al. Diseases of Swine. 10 ed. Oxford: Blackwell Publishing, 2012. p. 348-362. http://suinocast.com.br/wp-content/uploads/2015/07/Conclus%C3%A3o.jpg
Compartilhar