Logo Passei Direto
Buscar
Material
páginas com resultados encontrados.
páginas com resultados encontrados.
left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

Prévia do material em texto

AMO R, 
PAZ 
E 
ALEGRIA 
Mez do Sagrado Coração de Jesus 
segundQ Santa Gertrudes. 
Pelo 
Revmo. P. Dr. ANDRE' PRÉVOT. 
da Congreg. dos Padres do Sagrado Coração 
Taubaté 
Publicações S . C . J . 
http://alexandriacatolica.blogspot.com.br
IMPRL'IATUR 
Taubate, die 22 outubris 1937 
t André, Bispo Dioces. 
IMPRDII POTEST 
Taubat-é, die 16 novembris 1937 
P. P. Storms 
�raep. prov. brasil. 
APRESENTAÇÃO 
PELO EDITOR 
Na natureza não ha saltos, nem pheno­
menos isolados, infundados, sem nexo com 
outros factores. Tão pouco os ha normal­
mente no reino da graça. Neste como naquella 
tudo está organicamente ligado, desenvolve­
se aos poucos, de pequeninos germens para 
flôres maravilhosas e frutos deliciosos. 
Com todo direito podemos affirmar que 
o culto ao Sagrado Coração de Jesús é tão
arttigo quanto o christianismo. Tem as suas 
longínquas e tenues raizes no Antig� Testa­
mento, porém o verdadeiro raizame nos san· 
tos Evangelhos, onde se condensam as ma­
nifeStações do seu divino Coração durante a 
sua vida toda, privada e publica. Revelou-o 
e/le sobretudo no Cenaculo e na Cruz, ins­
tituindo a ss. Eucharistia e acceitando o golpe 
de lança que o abriu ao mundo inteiro. 
4 Desenvolvim. da dev. ao S. Cor. 
Os Padres da Igreja não deixaram de ex­
plicar muitos textos da Sagrada Escriptura no 
sentido dessa devoção, como tambem não 
deixaram de praticai-a. Sobretudo para São 
Chrysostomo, Origenes e Santo Agostinho, o 
Sagrado Coração de Jesús era a fonte de amor, 
de graça e de meritos. Escólhem-no para nelle 
estabelecerem a sua morada, o seu refugio, 
na vida e na morte. 
Só na Idade Média começam a multipli­
car-se os testemunhos. Surgem sempre mais 
almas piedosas e santas que conhecem e ve­
neram o divino coração de Jesús. Entre e/las 
ha duas santas irmãs, Santa Mechtilde ( 1 24 1 -
1 298 ) e a grande Santa Gertrud�s ( 1 256-
1 302) , ambas monjas benedictinas, que, fa­
vorecidas de revelações extraordinarias, se sa­
lientam nesse terreno com dedicar-lhe um 
culto todo especial, com fazel-o objecto de 
uma d(JI.)oção importantíssima, 
Notavelmente promoveu o culto ao Sa­
grado Coração o cartusiano Landsberger
(t 1 539) , divulgando os escriptos das 'duas
grandes santas e facilitando-o por imagens 
symbólicas. E' para notar que fez elle isso 
15 O annos antes de Santa Mar gari da Maria. 
De modo semelhante veneram-no muitos 
Desenvolvim. da dev. ao S. Cor. 5 
outros, como São Bôaventura, S. Pedro Ca­
nisio, Santo Aloysio, etc. S. Francisco de 
Salles fundou a Visitação em 1 6 1 O com o 
fim especial de tributarem as Filhas do Sa­
grado Coração um culto particular ao Co­
ração Divino. S. João Eudes ( 1 60 1-1680) 
juntou a devoção dos Sagrados Corações de 
Jesús e de Maria. 
Desde as duas grandes iniciadoras da ad­
m-iravel devoção 400 annos se passaram sem 
que a mesma se completasse. Veiu então 
Santa Margarida Maria ( 1 647-1690).., es­
colhida por Deus para completal-a e introdu­
zil-a publicamente, officialmente. O proprio 
Nosso Senhor preparou a bemaventurada para 
a sua grande missão, em apparições successi­
vas, e associou-lhe o veneravel Padre de la 
Colornbiere como instrumento de execução e 
propaganda. 
Na celebre appai:ição de Junho de 16 7 5 . 
Nosso Senhor queixou-se á sua serva da frieza, 
indifferença e ingratidão dos homens, sobre­
tudo dos que lhe são consagrados, e isso apesar 
de. tantos beneficios que lhes fazia e de tan· 
tos sacrifícios que por elles havia feito. Em 
càmpensação de tan.tos çrimes e injurias, exige 
6 Desenvolvim. da dev. ao S. Cor. 
elle dos seus devotos não só amarem-no sin­
ceramente, como tambem repararem o mais 
possível as injurias que lhe são feitas, por 
actos de desaggravo privados e publicos, pela 
communhão reparadora, mórmente nas pri­
meiras sextas-feiras, e pela consagração ao seu 
divino Coração de famílias, cidades, provin-
ctas e nações. 
Foi por conseguinte o proprio Nosso Se­
nhor quem ensinou a devoção ao seu Sagrado 
Coração e apontou bem claramente os dois 
elementos indispensaveis, essenciaes que della 
deviam fazer parte, que se requerem e se com­
pletam mútuamente como causa e effeito, isto 
é, "Amor e Reparação" , mórntente pelo sa­
crifício, e até pelo sacrifício da propria vida. 
E' bem de admirar que o conhecimento 
integral, theorico, dessa eminente devoção te­
nha levado nada menos que 400 annos. A 
divina Providencia destinou-a para salvar o 
mundo nos ultimos tempos, quando a ingra­
tidão chegar ao auge, quando a apostasia fôr 
geral e a revolta contra Deus attingir o absur­
do. Já vae para 300 annos que Deus espera 
pela conversão geral do mundo mediante a de­
voção ao Sagrado Coração, valendo-se da sua 
bondade e misericordia tão patentemente ma-
Desenvolvim. da dev. ao S. Cor. 7 
nifestadas. A não conversão dos homens em 
grande maioria, subentende a maturidade do 
mundo para o seu fim. 
* * * 
Sem duvida Deus encontra em todas as 
gerações almas generosas que se lhe offerecem · 
em resgate de seus irmãos prevaricadores. Mas 
foi só de 1 876 em diante que algumas repre­
sentantes do sexo feminino começaram a fun­
dar sociedades de victimas do Sagrado Cora­
ção, congregações religiosas especialmente de­
dicac/.as á reparação dos crimes do mundo pelos 
meios mais diversos. Até o fim do seculo pas­
sado só cinco chegaram a estabelecer-se, sendo 
qw antes haviam fracassado varias tentativas 
de sacerdotes nesse s�ntido. 
Entre tantos que alimentavam a mesma 
idéa, havia dois distinctos sacerdotes france­
zes: o Co nego Dr. Leão Dehon (18 4 3-
1 92 5 ) e o Padre Dr. Leio Prévot ( 18 40-
1913) . Mui to favoreceu aquelle a primeira 
fundação de um instituto reparador, o das 
Servas· do Coração de Jesús de Saint-Quen­
tin, cidade donde elle proprio era natural; e 
este a segunda fundação. a das Irmãs Victimas 
8 Apresentaão do autor 
do Sagrado Coração de Jesús de Gnmobles, 
de cuja fundadora e primeira superiorá, IrmQ. 
\í eronica, escreveu posteriormente a santa vida 
em mais de 1 . 000 paginas. 
O Conego Dehon conseguiu em 1 8 77 
fundar em Saint-Quentin a Congregação dos 
Padres do Sagrado Coração, sob a divisa 
"Amor e Reparação': . O Padre Leão Prévot , 
porém, não pôde realizar o intento de fun� 
dar, em conjunto com outros sacerdotes, um 
instituto proprio, de sacerdotes reparadores. 
Logo que veiu a reconhecer, pelas disposições 
da divina Providencia, a sua vocação como 
membro da congregação do P. Dehon, pediu 
admissão a ella e nella ingressou em maio de 
1 8 8 5, vindo pela profissão a chamar-se Padre 
André, chamando-se Padre João do Coração 
de Jesús o fundador. 
Terminado o noviciado em 1 886 , ac­
ceitou o P. André desde logo o cargo, de tanta 
responsabilidade, de mestre de noviços, em 
Sittard (Holtanda), cargo que exerceu duran­
te 2 6 anos juntamente com o de superior da 
casa que allí fundou e que devia desenvolver, 
como desenvolveu, maravilhosamente, como 
pae e amigo de todos, fazendo jus ao epitheto 
não simplesmente de "bondoso padre", porém 
O servo de Deus 
P. JOÃO LEÃO DEHON 
Fundador da Congreg. doe Padres do S. Coração 
morto no Senh.or em 12 üe Aug. de 1926. 
Apresentação do autor 9 
de "santo". Falleceu em 1 9 1 8 , em odor de 
santidade. Talvez nos venha a ser possível 
publicar um dia a santa vida do nosso vene­
ravel pai espiritual e tão venerando amigo. 
Já foi ella editada em varias línguas, em edi­
ções completas e resumidas e em numero su­
perior a 1 milhão! 
Além de tudo, tornou-se tambem o P. 
André escríptor fecundo, aproveitando todos 
os momentos que pôde poupar aos seus muitos 
affazeres. Ao todo escreveu 14 opuscu1os, 
sendo 3 sobre o Sagrado Coração de Jesús, 5 
sabre Nossa Senhora, 1 sobre o Divino Espí­
rito-Santo, 1 sobre S. José, 2 de meditações 
e finalmente 2 biographias de Madre Vero­
nica. Todos elles são muito apreciados e que­
ridos pelas almas interiores, devido sobretudo 
á uncção do Espírito-Santo que parece pene­
trai-os e animal-os. Oxalá possamos fran­
queai-os a tantas almas bôas do nosso paiz,editando-os todos successivamente em língua 
vernacula! Seria de immenso proveito para o 
nosso patrimonio espiritual. 
+ + + 
\ , Abrimos a serie das relíquias ·[iterarias \UO P. André com o presente opusculo intitu-
10 Apresentação da obra 
lado "Amor, paz e alegria", o mesmo coro 
que elle proprio estreiou. Prova da sua excel­
lencia são as numerosas edições que já alcan­
çou este opúsculo tanto na França como na 
Allemanha. Mas a 'fama delle transpoz muito 
para além as fronteiras desses paizes. T or­
nou-se elle conhecido e apreciadissimo no 
mundo inteiro. 
Conforme o subtítulo : Mez do Sagrado 
Coração de Jesús segundo Santa Gertrudes, 
pretende o autor attingir o seu escopo, de 
encher os leitores de Amor, Paz e Alegria me­
diante um mez de devoção ao Sagrado Co­
ração. 
Por um motivo bem patente preferiu elle 
propôr-nos, nesse Mez do Sagrado Coração 
de Jesús, as encantadoras revelações de Santa 
Gertrudes: pela simples e grandiosa razão de 
visar despertar coragem para os sacrificios re­
clamados pela reparação justamente pelo amor 
que a devoção gertrudiana ao Sagrado Co-
ração inspira. _ 
Não póde haver motivo mais fúndado, 
mais racional e mais pratico. Tende ao aluo 
pelo caminho mais facil, mais certo e mais 
curto: pelo amor .para a reparação! 
"Amor, paz e alegria" é para o nosso 
Apresentação da obra 11 
tempo uma necessidade confortadora e agra­
davel, como reparadora. Falta ao mundo o 
uerdadeiro amor : por isto tem tanta falta de 
paz e de alegria, tanta carencia de genuína e 
real felicidade. Este opusculo abre a fonte do 
mais puro amor, derramando sobre quem o 
cultiua uerdadeira paz e alegria. Ainda mais. 
Não só elle 'mostra o caminho que leua ao 
amor, á paz e á alegria, mas tambem, inspi­
rando o verdadeiro amor, inspira igualmente 
verdadeira paz e alegria. Como 'é cheio de 
amor, é igualmente cheio de paz e alegria! 
Ao percorrer as paginas a seguir, o leitor 
deparará as marauilhas do amor diuino, hu­
manisando em N. Sr. e correspondido pelo 
amor integral e jubiloso de duas santas irmãs. 
Ninguem deve estranhar tamanhas intimida­
des e ternuras de N. Sr., como si as reser­
uasse para algumas almas priuilegiadas. Mui to 
p,elo contrario deseja Etle prodigalisal-as à 
todos sem excepção. Quem não as receber, 
só deue inculpar-se a si proprio, por não se 
dispôr para recebei-as, desapegando-se das 
creaturas e apegando-se aos ualores superiores. 
As manifestações de amor de N. Sr. para 
com Sta . Gertrudes são, em verdade,- outros 
tantos convites e outras tantas garantias para 
1:! Apresentação da obra 
todos, de. que serão da mesma forma corres­
pondidos por Elle quanto antes se Lhe entre­
garem sem reserva, ·como Sta. Gertrudes. Eis 
ahi o proprio escopo ideal das revelações dessa 
Santa, como deste opusculo, patentear ao 
mundo irmanado exemplo da vida intima de 
amor que N. Sr. quer ver estabelecida entre 
si e cada alma humana! (Cfr. p. 1 76 ) . 
Recommenda-se ainda este opusculo por 
mais um ultimo, mas soberano titulo. A me­
dulla do seu conteúdo foi extrahida do livro 
das revelações do Sagrado Coração a Santa 
Gertrudes. Sobre ellas versam as reflexões do 
autor, e dellas tira elle as conclusões. Ora, 
Nosso Senhor ligou graças especiaes não só 
ás orações de Santa Gertrudes, corno tarnbern 
a todos os escriptos della sobre o seu Sagrado 
Coração, fazendo-o� seus proprios. Pessas 
graças especiaes participa, pois, este opusculo, 
e ellas lhe realçam muito o valor. São graças 
de amor, paz e alegria, que garantem o -que 
o opusculo affirma, e ajudam a cumprir o
que elle promette. Oxalá encontrem nelle to­
dos os que o lêrern urna fonte inesgotavel de 
AMOR, PAZ E ALEGRIA EM NOSSO 
SENHOR! 
P. LACROIX. 
PR E F A CI O
DO AUTOR 
Que é que nos propomos nesta modesta 
obca dedicada a Sta. Gertrudes e ao Sagrado 
Coração de Jesús? 
Propomo-nos ajudar algumas almas -
e já certo numero se serviram do nosso ma­
nuscripto com resultados que podem ani­
mar-nos, - propomo-nos ajudar algumas 
almas a vêr melhor e melhor gostar o quan­
to o Coração. de Jesús é bom, afim de que 
essas almas de bôa vontade, sentindo-lhe a 
ternura infinita que as solicita, se decidam a 
corresponder plenamente ao desejo tão pre­
mente que elle tem de amai-as e de ser por 
el/as amado, e sem temor como sem reserva, 
se abandonem amorosamente ·a elle para sem­
pre. 
Propomo-nos imprimir nos corações 
daquelles que nos quizerem lêr bem, alguma 
daquellas palavras de Sta. Gertrudes a que 
Nosso-Senhor prometteu ligar uma graça 
toda particular, palavras que penetram a alma 
14 Prefacio do autor 
de uncção suavíssima e que podem vir a ser 
bôa riqueza espiritual para toda a vida. Pro­
pomo-nos proporcionar ao Coração do nosso 
bom Salvador alguns amigos a mais, que lhe 
honrem a amizade pela sua confiança e fideli­
dade, a exemplo da nossa cara Santa; alguns 
consoladores a mais, que, como ella, tomem 
a peito os seus divinos interesses, que pro­
curem agradar-lhe sinceramente e indemni­
zal-a das ingratidões do mundo; que, pela 
oração, e pelo sacrifício trabalhem em pôr 
balsamo nas feridas que lhe são feitas. Propo­
mo-nos finalmente proporcionar á Igreja de 
Jesús-Christo, segundo o nosso fraco poder, 
alguns defensores a mais, que pela dedicação 
á vida de intercessão, de amor, de reparação, 
ajudem essa Mãe Santa a alcançar misericordia 
para os pobres peccadores, a reparar as perdas 
incessantes de seus filhos, a cobrir pelos lou­
vores do amor o concerto horrendo das bla$­
phemias da impiedade. 
E a quem offerecemos esta humilde obra? 
A todos ·os amigos do Coração de Jesus 
que se regozijam sempre, num sentimento de 
caridade cordial com aqui/lo que póde con­
tribuir para fazer conhecer e amar esse ado­
ravel Coração. 
Escopos do autor 15 
Aos amigos de Sta. Gertrudes, cujo nu­
mero vae sempre crescendo na Igreja de Deus; 
aos que se rejubilam de vêr realizar-se a res­
peito del/a o voto do Santo e piedoso padre 
Faber: "Possa Gertrudes tornar-se entre nós, 
para ahi ser o que foi outr' ora, o Propheta e 
o Doutor da vida interior!" (Tudo por Jesús,
cap. VIII, § VIII) ; aos que cre_êm nas pro­
messas que Nosso-Senhor fez a essa prioilegia­
da do seu Coração,. e que já, mais de uma vez, 
por dôce experiencia, sentiram nos escriptos 
del/a uma luz e uncção que não encontravam 
alhures. 
Offerecemol-o emfim mui particular­
mente a essas almas, dia a dia mais ·numero­
sas, que, dóceis ao impulso que o Espírito 
Santo faz . sentir á Igreja no nosso seculo, se 
dedicam por amor, á Obra da Reparação. 
Quizemos offerecer-lhes, nas disposições e 
piedosas industrias que o Coração de Jesús 
inspirou á nossa meiga Santa, o meio facil de 
realizarem em sua vida essa obra que se tor­
nou a mais necessaria e mais urgente de to­
das (1) . 
( 1) Ousa,remos offerecel-o, entre oqtros, aos 
Associados do Coração de J esús q11e nos con'Viá'a. á 
pcm:trucia, em cujas fileiras nós proprios desejamos 
16 Prefacio do autor 
Dividimos esta modesta obra em trinta 
e tres leituras, podendo servir de mez do Sa­
grado Coração : esperamos que sob esta forma 
terá ella em toda parte mais facil accesso e 
poderá, com a graça de Deus, convir mais es­
pecialmente a todos os amigos do Sogrado 
Coração de Jesús, a todas as almas repara­
doras do mundo, do claustro ou do santuario. 
Agradeceremos a Deus si, por intercessão de 
Sta. Gertrudes e peta misericordia do Coração 
de Jesús,. conseguirmos proporcionar a essa 
cara Santa o complemento dos seus desejos, 
afim de contribuirmos para o consôlo do nos­
so bom Mestre, afim de trazermos o nosso 
quinhão de socorro a Igreja, nossa Mãe. 
O' bôa e meiga Santa, que tanto desejaes 
que a leitura dos vossos escriptos sirva cada 
vez para glorificar o Coração de Jesús, e para 
provocar incessantemente novas acções de gra-
fiélmente combater. Reconhecemos com elles a ne" 
cessidade prçdominante da .penitencia na obra da re­
paração. Mas esta necessidade em nada diminúe a 
da reparação pelos aclo.s de religião que deve acom­
panhar a penitenciapropriamente dita, e todos reco­
nhecem que a penitencia deve ser animada pelo amor, 
pela acção de graças e pela alegria. Ora, nesta obra, 
é antes nestes dois outros .pontos de vista que nos 
collocamos como completando o primeiro. 
Escopos do autor ' 17 
ças pelos favores que elle vos cqncedeu, dignae­
vos derramar 'benção copiosa sobre estas pa­
ginas que são vossas, afim de que a leitura 
deltas excite as. �tmas a louvarem a bondade 
do Coração de Jesús e a se darem a elle! 
Já que o Salvador prometteu conceder 
tudo aos que lhe agradecerem as graças que 
elle vos fez, obtende que em troca dos sen­
timentos, de gratidão e de admiração que lhe 
expressamos nesta lertura, nos conceda el/e 
amal-o como vós o amastes, dedicarmo-nos 
inteiramente a elle como vós mesma, com 
amor, com .paz. com alegria ( 1). 
(1) Nesta obra, a que pedimos a Nos!lO Se­
nhor que ligue uma graça de paz e de alegria para 
toda alma de bôa vontade, ficaríamos qesolaq,os de 
perturbar a paz de alguem; rogamos ao leitor que 
se alarmasse com alguma das expressões de Sta. 
Gertrudes ou das reflexões que lhes accrescentamos, 
dignar-se tornai-as no sentido que indicamos nas 
noss11s notas ; e deste modo temos a dôce confiança 
de que tudo redundará em maior bem para· todos os 
amigos do Coração de Jesús. 
Amor, Paz e Alegria 
PRIMEIRO DIA 
CONVITE DO CORAÇÃO DE JESúS 
I 
A deooção ao Sagrado Coração é o derradeiro 
esforço, nestes ultimos seculos, do amor de 
Nosso Senhor aos homens. 
Um dia, S. João, o Apostolo dilecto 
do Coração de Jesús, foi mostrando a Santa 
Gestrudes no fulgor duma gloria íncompara­
vel: "Meu amabilíssimo Senhor, diz a Santa 
a Jesús-Christo, donde vém que me apresen­
teis,· a mim, indigna creatura,, o vosso discí­
pulo mais caro? - Quero, respondeu Jesús, 
estabelecer entre elle e ti uma amizade inti­
ma; elle será teu Apostolo para te instruir e 
dirigir" . 
Dirigindo-se então a Gertrudes, João 
lhe dizia: "Esposa de meu Mestre, oinde: jun­
tos repousaremos a cabeça no dulcissimo peito 
do Senhor; nelle estão encet'rados todos os 
thesouros do céo". Ora, como a cabeça de 
Gertrudes estivesse inclinada á direita e a ca· 
beça de João á esquerda do peito di: Jesus. 
o discípulo dilecto prosseguiu: "E' aqui o 
20- 1." dia 
Santo dos-santos; todos os bens da terra e do 
céo são attrahidos para elle como pará o seu 
centron 
Entretanto, as pulsações do Coração de 
Jesús arrebatavam a alma de Gertrudes; 
"Bem-amado do Senhor, perguntou ella a 
S. João , estas pulsações harmoniosas, que me 
rejubilam a alma, rejubilaram a vossa quan­
do repousastes, durante a Ceia, no peito do 
Salvador? - Sim, ouvi-a$, e a suavidade 
dellas penetrou-me a alma até á medulla. -
Donde· vém pois que no vosso Evangelho, 
apenas tenhaes deixado entrever os segredos 
amorosos do Coração de Jesús-Christo? -
O meu ministerio, naquelles primeiros tem­
pos da Igreja, respondeu o Apostolo dilecto, 
devia cingir-se a dizer sobre o Verbo divino, 
Filho eterno do Pae, al_qumas palavras fe­
cundas que a intelligencia dos hom.ens pu­
desse sempre meditar, sem lhe esgotar jámais 
as riquezas; mas, aos ultimas tempos estava 
r·eservada a graça de ouvir a voz eloquente do 
Coração de Jesús. A essa voz, o mundo en­
velhecido rejuvenescerá; sairá do seu torpor, 
e o calor do amor divino inflammal-o-á 
ainda ( 1)" 
(1) Revelações de Santa Gertrudes (livro IV, 
Convite do S. Coração 21 
REFLEXÕES. - Santa Gertrudes foi de 
alguma sorte· a Evangelista do Sagrado Co­
raçãó, e seu livro revéla-nos o Coração hu­
mano de Jesús, como o Evangelho de S. João 
faz-nos conhecet nelle o Verbo divino. Essa 
revelação toda de amor era um segredo reser­
vado a estes ultimas seculos do · mundo, em 
que, após tant!s ruínas e desolações, as almas 
enfraquecidas e entristecidas ainda aguardam 
no ent�nto uni supremo triumpho da Igreja, 
uma éra de consolação em que se verá a fé 
renascer, a piedade reflorír, a caridade reaccen· 
der-se. E' o que o Apostolo S. João parece 
predizer no seu Apocalypse. quando diz num 
trecho notavel que se tem applicado á nossa 
epoca: "Porque tendes uma virtude fraca, 
eu vos abri uma porta que ningc-Íem poderá 
fechar ( 1) " (Apoc. III, 5) . Nós somos 
fracos, mas pelo Coração de Jesús nos tornare­
mos fortes; somos fracos, mas pela Caridade 
do Coração de Jesús triumpharemos da morte 
e do inferno; somos fracos, mas no Coração 
de Jesús, que nos é aberto, acharemos o amor 
que dá �odas as virtudes. 
r. 4). -· Valeroo-nos da traducção de dom Mege, da 
do P. Cros e da dos Benedictinos de Sol�smes. 
(1) Vêr, Hol<�hauser, Explicação r!o Apoçaly­
tse. 
22 1." dia 
Porquanto o Coração de Jesús é o fóco 
do amor. A devoção ao Sagrado Coração é 
a devoção que vem do amor como principio, 
que se dirige ao amor como fim, que em­
prega o amor como meio. p' o amor feito 
sensível pelo Coração sensível de Jesús-Chrís­
to, que nos communíca os seus propríos senti­
mentos fazendo-nos sentir, con\o a seus mem­
bros, a repercussão das suas pulsações ínti­
mas, segundo este grande princípio que regúla 
a-vida chrístã: Hoc senti te in vobis qw;>d et 
in Christo Jesu. - Senti em vós os senti­
mentos do Coração de Jesús. E' o amor que 
nos attrahe ao amor pelos seus encantos ir­
resistíveis, segundo a prophecia que delle fez 
o proprio Salvador : "Quando eu fôr elevado 
na cruz" e o meu Coração fôr aberto pelo 
amor, "attrahirei a mim todos" os corações. 
{João, XII, 3 2). E' o amor, emfím, que nos 
quer consumir nas suas chammas para santi­
ficar os nossos sacrifícios e reparar todas as 
culpas deste mundo culpado, afim de que o 
perdão se torne a medida do amor, como o 
amor foi a medida do perdão. Remittuntur ei 
peccata multa, quoniam dilexit multum 
(Lucas, VII, 47) . 
CONCLUSÃO PRATICA 1 •. o Confiança 
Convite do S. Coração 23 
em meio ás nossas miserias e ás infelicidades 
do tempo presente, ·porque o Salvador, apie­
dando-se da nossa fraqueza, abriu-nos o seu 
Coração, onde acharemos toda a força. 
2.0 Amor, Amor ! Demo-nos ao amor ! 
A devoção ao Sagrado Coração é a devoção 
do amor, unica que póde reaquecer o nosso 
seculo tão arrefecido ; a renovação que aguar­
damos é obra do amor, e só o amor fal-a-á. 
li 
A devoção ao Sagrado Coração de Jesús 
e o livro de Sta. Gertrudes. 
Sta Gertrudes, retida pela sua humilda­
de, hesitava em publicar as revelações do Sa­
grado Coração de Jesús. Decidiu-a porém o 
Salvador dizendo-lhe: "Quero que tew; es· 
criptas sejam para os ultimas tempos um 
testemunho da ternura do meu Coração, e 
por elles farei bem a muitos (L. 11, c. 1 O). 
- Emquanto escrec;eres, conser()arei teu co­
ração junto ao meu coração, e distillarei nelle 
gôta a gôta o que dec;erás dizer". 
Ella ouviu o proprio Jesús fazer este 
pedido: "O' Pae santo. quero, para vossa 
nforia eterna. que o comção de Gerrrucles der-
24 t.• dia 
rame sobre· os homens· os thesouros encerra­
dos no meu coração humano" 
Quando o livro foi concluído, Jesús 
mostrou-se a Sta. Gertrudes dizendo-lhe: 
"Este livro é meu; eu o imprimi no fundo do 
coração; ahi, Cf!.da uma das suas letras em­
bebeu-se da doçura do meu amor; de cada 
·uma das palavras deste livro exhala-se o per-
fume da minha misericordia ( 1 ) " 
REFLEXÔES. - Sta. Gertrudes é a 
Mensageira ( 1 ) , o Arauto do amor divino, 
encarregado de fazer conhecer o amor na sua 
manifestação mais tocante que é o Coração 
(1) Jesús tratou assim tambem o livro de Sta. 
Mechtilde (P. II, c. 43). "'Tudo o que está escripto 
neste livro safu do meu coração e a elle tornará. -
Todos quantos me buscam com coração fiél acharão 
nclle uma causa de alegria; os que me- amam abra­
. sar-se-ão mais no meu amor, e os qwe estive-rem na 
afflicção acharão nelle consôlo." 
O Salvador fizera mui pa.rtkularmente dom do 
seu Coração a Sta. Mechtilde (P. li, c. 19). Este 
dom produziu nelia extrema devoção para o Sagr." 
Coração, e foi para ella o principio de tod"Os os de­
mais dons. Ella repetia amiudadamente: "Si fôsse 
frreciso escrever todos ·os bens que me têm vindodo 
benignissimo · Coração. de Deus, um livro grosso co-
mo o das Matittas não chegaria." \ 
( 1) Legatus divinolE pietatis. E' o titulo que o 
proprio Nosso Senhor dá a9 livro de Sta. Gertrudes. 
Convite do S. Coração 25 
de Jesú's, incumbido de trazer a este divino 
Coração todos os corações dos homens. E' a 
missão que S. João lhe annunciava, a missão 
que o Coração de Jesús lhe deu, a missão 
para qual escreveu ella o seu livro (I ) . Ella 
já vê essa tarefa realizada em parte, de ma­
neira exterior e official, pela bemaventurada 
Margarida-Maria, filha de S. Francisco de 
Sales, que foi filho espiritual de Gertrudes e 
se nutriu das obras desta; e agora parece que 
a deva realizar de maneira· mais intima, mais 
completa (2), pelos seus novos filhos es­
pirituaes que lhe propagam por toda parte 
a doutrina. 
( 1) Os Benedictinos de Solesmes ( Pref. P. 
XVI) fazem vêr que a missão de Sta. Gertrudes tem 
realmente por obiecto a devoção ao Sagrado Cora­
ção no sentido que indicamos. Elles não separam del­
la Santa Mechtilde. Póde-se, de resto, dizer que o 
livro de Sta. Mechtilde pass·ou pelo cor.ação e pela 
penna de Sta. Gertrudes, tendo-o esta redigido, ao 
menos em grande .parte, fazendo-o depois approvar 
por N. Senhor, e diffundi_ndo-o em torno de si; per­
tence pois realmente á escola de Sta. Gertr1,1des. 
(2) Parece que a missão de Santa Margarida­
-Maria tem antes por objecto o culto exterior e of­
ficial do Sagr.• Coração, e que a de·
' 
Sta. Gertrudes 
tem por objecto o culto intimo e mystico. Santa Ger­
trudes faz-nos vêr em acção todos os mysterios do 
Sagr.• Coração de modo mais completo; dá tambem 
2G 1." dia 
E' sobretudo na escola de Sta. Gertru­
des que a devoção ao Sagrado Coração mos­
tra-se facil e ao alcance de todos nos ensina­
mentos, agradavel e cheia de doçura na for­
ma, tocante emfim e irresistivel nos attrac­
tivos, porque nos mostra em toda parte o 
amor com a alegria e com a paz, que lhe são 
os frutos. 
CONCLUSÃO PRATICA. - 1.0 Escutemos 
com confiança e docilidade a Mensageira do 
amor divino, e tirare,mos das suas palavras 
a graça que o Coração de Jesús se dignou 
ligar-lhes, a graça do amor. 
2. o Proponhamo-nos imitar Gertrudes 
com fidelidade no que fez pelo Coração de 
Jesús, pois ella repete muitíssimas vezes que 
alcançaremos delle por esse meio os mesmos 
favores que ella recebeu como recompensa. 
á devoção ao Sagr." Coração uma forma mais attra­
hente e mais animadora para o nosso seculo tão 
fraco. 
(Cf. Pref. dos Benedict., P. XVI.) 
Si nos permittem accrescenta·r klqui o nosso pro­
prio pensamento, diremos que, do ponto de vista da 
vida de amor e de sacrif1cio que deve ser a vida de 
todo amigo dedicado do Coração de Jesus, as duas 
santas concordam perfeitamente; mas, si a Sanb 
Margarida-Maria póde ensinar melhor o sacrificio, 
Sta. Gertrudes póde communicar melhor o amor que 
n faz acreit�r. 
SEGUNDO DIA 
AMOR DO CORAÇÃO DE JESúS 
I 
O amor, principio da devoção ao Sagrado 
Coração. 
Já ouvimos Jesús dizer a Sta. Gertni­
des: "Foi o amor do meu Coração que pro­
duziu os teus. escriptos; quero que elles sejam 
para os ultimas tempos o testemunho do meu 
amor, para attrahir as almas ao meu coração" 
Um dia de sexta-feira santa, como as 
Freiras fizessem a adoração da cruz, quando 
chegou para Sat. Mechtilde o momento de 
beijar o Crucifixo e ella beijou a chaga do 
Coração, o Senhor lhe disse: "Nesta chamma 
de amor, tão grande que abrange o cêo, a 
terra e tudo o que encerram, applica o. teu 
amor ao meu divino amor, para que elle ahi 
se torne perfeito, e, assim como um ferro em 
28 2.0 dia 
brasa se confunde com o fogo, se confunda 
com elle num só amor" . (S. M. , I. 18). 
Outro dia viu ella o Senhor abrir a 
chaga do seu dulcíssimo Cotação e dizer-lhe 
"Olha toda a extensão do meu amor; méde-o 
por estas palavras que eu dirigi a meus irmãos: 
Como meu Pae me amou, assim eu vos amei 
(S. João, XV, 9 ) . Jií ouvistes palavras que 
exprimissem amor mais Forte ou mais terno?" 
(I. M., L 21) 
REFLEXÕES. - O printipío da devoção 
ao Sagrado Coração é o amor, isto é, que o 
Coração de Jesús nos quer dar esta devoção 
como o derradeiro esforço do seu amor e o 
dom mais perfeito que elle nos possa conce­
der. E' o amor que se quer dar �té o extremo, 
até o fim dos tempos, àté as extremidades da 
terra, até os ultimas limites. do amor. E' o 
amor que quer reaquecer o mundo, agora que 
a caridade tanto se arrefeceu nelle: é o amor 
que veiu trazer o fogo á terra e que quer no 
fim dos tempos abrasai-a toda com as suas 
chammas. E' o amor que quer amar ainda 
mais do que ser amado, pois tal é a lei do 
amor. Quer dizer uma ultima vez a esses 
ingratos quanto os ama; quer estreitai-os ao 
seu Coração, recordar-lhes tudo' quanto fez_ 
Amor do S. Coração 29 
por elles, tentar ·ainda enternecel-os ( 1) , e 
salval-os, Sem duvida, elle pede que o ame­
mos em troca, e a que�xa do amor desconhe­
cido é bem amarga; mas ao menos terá elle 
feito tudo quanto está em si, e, si não fôr 
amado por todos, ao. menos nos. terá .amado 
a todos. Eis porque o meigo· Salvador quer 
fazer penetrar agora em toda parte a devoção 
ao seu Sagrado Coração. Vemol-a já por 
toda parte no exterior; em toda parte encon­
tramos as imagens do Sagrado Coração; em 
toda parte é elle celebrado por festas solemnes, 
em toda parte é honrado por praticas santas; 
mas isto não basta; é preciso que o amor 
penetre no interior, que o fogo ganhe o in­
timo dos nossos corações: /gnem veni mittere 
in terram (Lucas, XII. 49) ; é mistér que o 
amor de Jesús nos transforme em si mesmos 
como o fogo transforma o ferro na sua pro­
pria natureza, afim de que assim ell� possa 
offerecer em holocausto a seu Pae celeste essas 
almas que devem ser uma só victima com 
(1) Póde-se lêr este pensamento expresso do 
modo mais enternecedor nas revelações da bemaven­
turada Varani, no ponto em que ella vê Jesus es­
treitando Judas; ao seu Coração. 
30 2.o dia 
elle. Antigamente as victimas deviam ser con­
sumidas pelo fogo para que se elevassem 
para o céo em odor de suavidade; agora tam­
bem, a Igreja deve ser consumida pelo fogo 
do amor para que, victima santa consum­
mada com J esús, possa subir ao céo no fim 
do seu sacrifício. Sim, o Salvador quer fazer 
das nossas almas outras tantas victimas de 
amor consumidas com elle por essas cham­
mas de amor que escapam do seu divino Co­
ração; para que o amor alcance o perdão para 
o nosso seculo que já não ama, para que o 
amor dos nossos corações ganhe aos poucos 
as almas de nossos irmãos e os faça amarem 
comnosco, para que o amor consumme o nos­
so sacrifício e nos torne dignos no céo desse 
Bem supremo que é o· centro para o qual 
ascendem sempre necessariamente as chammas 
do amor. 
CONCLUSÃO PRATICA. - 1.0 Amor e 
sacrifício. Um não se separa do outro. O 
amor é uma chamma que pede uma victima 
a consumir. e o sacrifício só se consuma na 
chamma do amor. Oh! possamos ser essa vic­
tima e consumar-nos nesse sacrifício! Por­
quanto o amor é o proprio Deus; o sacrifício 
i a santificação, a deificação; a victima con-
Amor do S. Coração 31 
surnrnada é a alma unida a Deus, perdida em 
Deus, transformada em Deus. 
2.° Confiança sempre, pois que haveria­
mos de temer? E' o amor que nos chama, é 
o amor que dá tudo, o amor que provê a 
tudo, o amor que fará tudo. o amor só bem 
nos póde querer; impossível pois corresponder 
ao amor de outro modo que pela confiança; 
e já que é o amor sem limites· que nos con­
vida, correspondamos-lhe tarnbern por urna 
confiança sem limites. 
li 
O objecto da deuoção ao Sagrado Coração 
é o amor do Coração de Jesús, principalmente 
na sua Paixão e na Eucharistia. 
O amor do Coração de Jesús revelou-se 
a Sta; Gertrudes principalmente nos myste­
rios da Paixão e da sagrada Eucharistia. 
Um dia em que Gertrudes segurava af­
fectuosamente e beijava o seu Crucifixo, N. 
Senhor lhe disse: "Cada oez que o homem 
age assim, ou siquer olha com deuoção um 
Crucifixo, a misericordia de Deusdetém-lhe 
os olhos n'alma. U homem deuenà entao 
2,o dia 
pensar, no seu coração, que estas ternas pa­
lavras lhe são dirigidas : _Eis .como, por teu 
amor, eu quizer ser pregado, nú, desfigurado, 
coberto de chagas, com todos os membros 
violentamente esticados, numa cruz; e o meu 
coração é tão apaixonadamente enamorado de 
ti que, si preciso fôra, para· te salvar eu sup­
portaria ainda de bom grado, só por ti, tudo 
o que pude soffrer pela salvação do mundo 
inteito" (III, 41). 
Jesús revelava em seguida a Gertrudes 
o amor do seu divino Coração na :J3ucharis­
tia: "As minhas delicias são estar com os fi­
lhos dos homens. Foi para contentar o meu 
amor que institúí este Sacramento; obriguei­
me a . permanecer nelle até o fim do mundo, 
e quiz que o recebessem frequentemente. Si 
alguem desvia uma alma da communhão, esse 
impede as delícias do meu Coração. Tudo 
fiz para manifestar na Eucharistia a tllrnura 
do meu Coração. Quando, arrastado pela ue­
hemencia do meu amor, venho pela Commu­
nhão a u.ma alma, . cumúlo-a de bens e ella 
propria, e todos os habitantes do céo, todos 
os habitantes da terra, todas at almas do pur­
gatorio Sentem T.IO mesmo instante algum 
novo effeito da minha bondade". 
Amor do S. Coração 33 
REFLEXÕES. - O objecto proprio da 
devoção ao Sagrado Coração, é o amor do 
divino Salvador manifestado principalmente 
na sua Paixão e na sagrada Euch_aristia. Eis 
o objecto, espiritual e sensível ao mesmo tem­
po, que é proposto ao nosso amor: "lnspice, 
et fac secundum exemplar. (Ex. 25. 40) . 
Olhae, e fazei segundo o modelo que vos é 
propos�! " Olhae, pois é o objecto mais dig­
no da vossa attenção. Possa elle attrahir-vos 
de tal modo os olhares, que o vosso coração 
se fixe nelle para todo o sempre! Possa de 
tal forma absorver-vos o espírito, que não 
saibaes mais sinão a elle e a lição de amor 
que elle vos dá! Possa gravar-se-vos tão pro­
fundamente na memoria, que. o tenhaes sem­
pre presente á lembrança! Possa imprimir­
se-vos na imaginação para purificai-a e san­
tificai-a! Possa penetrar-vos todas as poten:. 
das da alma para dirigil-as tqdas segundo a 
lei do amor! Olhae-o, porque elle vos olha 
com tanta misericordia e ternura! Olhae-o, 
porque elle quiz ser elevado acima da terra 
para attrahir e fixar todos os olhares! Olhae­
o, pois olhando-o sarareis das vossas feridas, 
como outr• ora os Israelitas olhando para a 
serpente de bronze! Olhae-o, pois .elle é a 
34 2.o dia 
nossa luz, o nosso mestre e o nosso guia na 
senda da salvação ! 
"Et fac secundum. - E fazei como elle". 
Amae como elle, sentí como elle, vivei como 
elle, visto que elle é o modelo proposto aos 
eleitos por Deus Padre ; visto que é a propria 
Sabedoria de Deus manifestada ao mundo 
para instruil-o ; visto que é a propria força 
de Deus ostentada para salvar-nos ; visto que 
é o chefe divino a que deveis ficar unido, de 
quem deveis depender sempre. 
Ora, que fez elle? Que lição nos dá ? 
Que modelo offerece á nossa imitação ? Amou­
nos e entregou-se por nós. O amor do Co­
ração de J esús não é um amor esteril ; é um 
amor que se mostra pelo sacrifício da Paixão, 
que se continúa e se applica a cada um dl! 
nós no sacrifício da Eucharistia : Dilexit me 
et tradidit se. Amou-me e se deu, sacrificou-se 
por mim : amou-me e ama-me ainda, quer 
amar-me sempre, e continúa ainda, e conti­
nuará sempre a dar-:se, a sacrificar-se por 
mim. Eis o amor ! eis o Coração de J esús ! 
Por isto, em verdade, como o Apostolo 
que se sentia premido pela caridade do Co­
ração de Jesús, eu não quizera mais vêr si­
não um objecto, não mais quizera saber sinão 
Amor do S. Coração 35 
uma sciencia : Jesús crucificado. Quizera occul­
tar-me para todo o sempre nesse Coração de 
Jesús que foi aberto por mim na cruz ; quizera 
com elle dar-me e sacrificar-me por Deus e 
por meus irmãos, consumir-me nas suas cham­
mas, perder-me para todo o sempre numa 
radiação do seu amor. 
Oh! sim, Senhor, . fazei que assim seja ! 
Amor, •o que fazeis, fazei-o quanto antes ! 
Amor, abysmae-me comvosco no Coração de 
Jesús crucificado, para que a minha natureza 
grosseira lhe seja consumida pelas chammas, 
e eu não viva ffii3iS sinão da sua vida santís­
sima ; abysmae-me no Coração de Jesús eu­
charistico, para que o meu sacrifício se con­
tinúe sempre com o delle, e eu seja perpetua­
mente com elle uma victima de religião, de 
louvor e de amor! 
CONCLUSÃO PRATICA. - 1.0 Olhemos 
a miúde o Crucifixo, mas olhemol-o com 
amor; suba o nosso olhar ao Coração de 
Jesús para feril-o duma ferida de amor que 
curará a ferida que lhe fez o peccado. E, em 
troca, elle baixará sobre nós um olhar dos 
seus olhos tão misericordioso, que inflam­
matá cada vez mais o nosso amor. Olhemol-o. 
representando-nos como escriptas ein volta 
36 2.0 dia 
delle em caractéres de fogo estas palavras do 
amor : "Amou-me e entregou-se por mim" 
Sim, por mim, como si eu fôsse unico no 
mundo ; e, si preciso fôra, entregar-se-ia ain­
da por mim só, afim de ganhar o meu co­
ração. Só a elle pois, só a elle todo o meu 
amor ! 
2.0 Tornemos o nosso .sacrifício con­
tinuo como o do Salvador ; encerremo-nos no 
Coração eucharistico de Jesús; é esse o san­
tuario em que a victima deve immolar-se con­
tinuamente ; é nelle ·que se offerece a Deus 
p sacrifício de louvor que o honra ; é nelle 
que irradia sobre toda a Igreja o pedido de 
intercessão que salva as almas. E' assim que 
consolaremos o Coração divino que faz as 
suas delicias de estar com os filhos dos ho­
mens. 
RESUMO.- O objecto espiritual e prin­
cipal da devoção ao Sagrado Coração é o 
amor de Nosso Senhor dedicando-se á salva­
ção dos homens, mórmente pela Paixão e pela 
divina Eucharistia. 
O objecto sensiuel é o Sagrado Coração 
de J esús, esse verdadeiro Coração de carne 
unido hypostaticamente ao Verbo divino, 
Coração vivo nos nossos tabernaculos, sym-
Amor do S. Coração 37 
bolo da caridade sem limites que Jesús­
Cbristo tem para cada um de nós ; fóco ar­
dente do amor com que elle quer abrasar a 
tura ; asylo de todos os corações afflictos·: 
fonte de delicias para as nossas almas e prin­
cipio de todas as graças; e, não obstante, 
Coração saturjldo de amargura pela indiffe­
rença e ingratidão dos homens. 
O objectq do nosso culto relativo é a 
imagem do Sagrado Coração de Jesús repre­
sentado ou com o que nos lembra a sua 
Paixão, ou com o que nos lembra a sua vida 
eucharistica. 
· 
TERCEIRO DIA 
Finalidade intima da devoção ao Sagrado 
Coração: attrahir todos os corações ao amor 
de Nosso Senhor 
Já vimos que o intuito de N. Senhor 
nos escriptos de Santa Gerttudes foi fazer 
conhecer a ternura do seu Coração, attrahir 
desse modo a si muitos corações. 
Jesús tambem deu varias vezes sensivel­
mente os nossos corações a Gertrudes, e re­
cebeu o coração da Santa em troca, para nos 
assignalar o dom mútuo dos corações que o 
seu ·amor pede entre elle e nós. Conservou 
sempre o coração de Gertrudes fiélmente unido 
ao seu. para nos servir ainda de modelo : 
"Gertrudes, dizia Jesús a Sta. Mechtilde, 
adhere de tal forma ao meu Coração, e con­
servo-a de ral forma unida a elle, que ella 
se tornou um tmesmo espírito commigo. Por 
isto ella vive em absoluta dependencia das 
minhÇI$ vontades; os m�mbros estão m'enol$ 
Escopo intimo desta devoção 39 
sujeitos ao coração do que Gertrudes está su• 
jeita ás minhas vontades. Mal o homem diz 
á mão, só pelo pensamento: faze isto; ao 
olho : ólha; á lingua:fala; ao pé: anda; logo, 
sem a menor demóra, a mão, a língua, o olho, 
o pé obedecem. Gertrudes é para mim como 
uma mão, um olho, uma língua de que dis· 
ponho a meu talante, sem que elles resistam 
a nenhum dos meus desejos". 
Jesús manifesta em particular a Gertru• 
des o quanto o seu Coração divino deseja a 
conversão dos peccadores. A Santa rezava um 
dia por uns malvados que haviam causado um 
grande prejuízo ao seu mosteiro. Nosso Se· 
nhor mostrou-se então a Gertrudes : estava 
com um braço 'dolorosamente dobrado e tor· 
ciclo, os nervos pareciam-lhepartidos. E Jesús 
lhe disse : Aquelles que me pedem pela con· 
versão desses infelizes derramam um balsamo 
salutar no meu braço doente,. e com mão deli· 
cada reconduzem pouco a pouco os músculos 
á posição primitiva" Surpresa com este ex· 
cesso de benignidade, Gertrudes disse a Jesús : 
"Dulcíssimo Senhor, como podeis chamar 
vosso braço a taes pessôas tão indignas dessa 
honra? - Chamo"lhes assim com. t)erdade, 
porque ellas são do corpo da Igreja, de que 
40 3,o dia 
me honro de ser a Cabeça. Por isto o inte­
resse das suas almas desperta em mim soli­
citudes inexprimiveis: o meu coração deseja 
com indizível ardor que esses infelizes se con­
vertamH 
REFLEXÕES. - 1 . o A finalidade Ínti­
ma que Nosso Senhor se propoz revelando ao 
mundo a devoção ao seu Sagrado Coração, 
é ainda o amor dos homens, que elle quer 
attrahir todos a si. Jesús quer ter o coração 
do homem: "Meu filho, dá-me o teu cora­
ção" Mas o amor suppõe o conhecimento ; a 
causa do amor é o bem conhecido e sympá­
thico a nós. Si até aqui Jesús não foi amado, 
é que não foi conhecido : eis porque elle ten­
ta um derradeiro esforço para diffundir por 
toda parte o conhecimento do seu amor. Basta 
que o homem olhe para esse Coração aberto 
pelo amor, para que comprehenda o quanto 
é amado, para que veja que tem um Salvador, 
um amigo, e, si quizer pensar nisto um ins­
tante, é impossível que não se sinta attrahido, 
porquanto o amor attrahe necessariamente o 
amor, 
2.0 Jesús quer, pois, primeiramente fa­
zer-nos conhecer o seu amor a todos os ho­
mens. Por este meio, quer vir a. estender so-
Escopo intimo desta devoção 41 
bre todos o reino do amor. Este reino con­
siste principalmente no dom mútuo dos co­
rações, entre elle e nós, na união de vida e 
de sentimentos do nosso coração com o seu 
Coração. O nosso dulcíssimo Senhor precede­
nos, dá-nos em primeiro o seu divino Co­
ração. Não é de toda justiça que a sua pe­
quena creatura lhe dê o seu em troca ? E' esta 
a lei do amor. E por certo, nessa troca, não 
somos nós que tudo temos a ganhar como 
nobreza, como belleza, como paz, como ale­
gria, como felicidade ? Oh ! que admiravel 
condescendencia, que nosso Deus queira assim 
dar-nos o seu Coração para ter o nossó cor,a­
ção ! que permúte os seus thesouros com a 
nossa miseria, o seu poder com a nossa fra­
queza, a sua sabedoria contra a nossa igno­
rancia ! Oh ! saiamos de nós mesmos como o 
amor faz sair de si mesmo o nosso Deus ! ( 1 ) 
Nós, nós somos a miseria, o -erro, o mal, a 
perturbação, o tédio ; saia o nosso coração 
desse meio onde definha ; perca-se em J esús ; 
abysme-se nesse Oceano de rnisericordia, nes­
sa Fonte de todos os bens, nesse Centro de 
paz, nessa Torrente de felicidade! 
( 1 ) Amor divimts e.vtasim facit. ( S. Diony­
sio.) De D. N oin., ç. 4. · 
42 3,<> dia 
A unidade de vida e de sentimentos é 
ainda uma lei do amor gravada na nossà na­
tureza ; o amigo tem a mesma vida que o 
seu amigo : convivit; quer e pensa como elle : 
concordat (I ) ; sem este accordo das vonta­
des e dos sentimentos, a amizade não poderia 
ser verdadeira. Oh ! Jesús que sois nosso 
Amigo no supremo gráo (2) , vinde e vivei 
nos nossos corações, que quereis possuir in­
teiramente. Seja o vosso Coração o nosso co­
ração ; a vossa vontade seja a nossa vontade, 
as vossas virtudes tornem-se as nossas vir­
tudes : falae em nós, orae em nós, fazei vós 
mesmo todas as nossas obras. Só por esta 
união é que podemos satisfazer o vosso amor ; 
só por esta união é que as nossas obras se 
tornam verdadeiramente divinas e merecem 
a recompensa divina que nos haveis promet­
tido. 
3 .0 Pela ·devoção do Sagrado Coração, 
Jesús quiz especialmente propôr aos pecca­
dores o oh jecto e o meio mais proprios para 
convertel-os. Si o peccador se põe um instan­
te em contemplação desse Coração que tanto 
o amou e tanto o ama ainda, si se diz : Eis 
( 1) Santo Thomaz. 
(;n Christus est tiU:Mimc amicús. (S. Thomaz;) , 
Escopo intimo desta devoção 43 
esse Coração que para me salvar soffreu tão 
cruéis tormentos ! e por meus peccados eu o 
afflijo, encho-o de amargura ! não é posssivel 
que não se sinta tocado e não se proponha 
converter-se. E para incentivar-lhe, para fa­
cilitar-lhe o regresso, o terno Salvador offe­
receu-lhe ao mesmo tempo o meio m'ais dôce e 
mais seguro : é o amor que o seu Coração lhe 
quer communicar ; seja qual fôr o numero 
dos seus peccados, o amor apagai-os-á todo!!. 
Jesús dar-lhe-á o amor, e o amor assegurar­
lhe-á o perdão. 
Jesús quiz sobretudo preparar indirecta­
mente o meio mais efficaz para a conversão 
dos peccadores, inflammando o zelo dos 
irmãos delles mais fié.is que deverão auxiliar 
o Redemptor a salvar essas pobres almas. E' 
principalmente ao contacto sagrado desse Co­
ração que tanto amou os homens que o zelo 
da alma dedicada se atêa de viva chama. Ven­
do o que Jesús fez por seus irmãos, essa 
alma quer fazer como elle : orar, dedicar-se, 
soffrer. Nada lhe custará para completar o 
que falta á Paixão do seu dilecto Salvador 
em mira a assegurar a salvação das almas. 
CONCLUSÃO PRATICA. - l .-0 Appli­
querno-nos ao conhecimento do amor do 
44 3.o dia 
Coração de Jesús, e façamol-o conhecer a 
todos. 
2 . o Repitamos a miúdo esta prece dos 
filhos de Jesús : Meu Deus ,dou-vos o meu 
coração, dae-me o vosso. Tendamos, pela 
imitação do Coração de J esús, a transformar­
nos completamente nelle. 
3 .0 Trabalhemos com zelo, pela oração 
e pelo sacrifício, em reconduzir ao Coração 
de Jesús essas pobres almas cuja conversão 
elle tanto deseja. 
PENSAMENTOS DE STA. GERTRUDES . 
- 1.0 Jesús, pelos escriptos de Sta. Getru­
des, far-nos-á conhecer cada vez mais a ter­
nura do seu divino C<;>ração, attrahirá cada 
vez mais os nossos corações ao seu amor. 
2.0 A união com o Coração de Jesús 
requer que vivamos em absoluta dependencia 
das suas vontades. 
· 
3 .0 Aquelle que reza pela conversão dos 
peccadores derrama balsamos nas chagas de 
Jesús. 
RESUMO. -' A finalidade intima da de­
voção ao Sagrado Coração é : 
1 . o Propagar o conhecimento do amor de 
J esús-Christo a todos os homens, 
Escopo intimo desta devoção 45 
2.0 Estabelecer o reino do amor nas 
Z.: mas fiéis, pelo dom mútuo dos corações 
.:�rre Jesús e nós, e pela união de vida e de 
s.:ntimentos. 
3 .0 Propôr aos peccadores o objecto e o 
meio mais proprios para convertel-os, conci­
tando-os a amar Nosso Senhor. Ademais, 
favorecer-lhes a conversão pelo zelo e pelas 
orações das almas animadas da devoção ao 
Sagrado Coração. 
QUARTO DIA 
VIda intima do Coração de Jesús. 
Santa Gertrudes via um dia as suas com­
panheiras se apressarem em ir á igreja, para 
assistir ao sermão, emquanto a doença a re­
,tinha na cella : Ah! meu caríssimo Senhor, 
diz ella gemendo, como eu iria gostosamente 
ao sermão si não estivesse doente! - Quere:;, 
minha dilecta, respondeu Nosso Senhor, 
queres que eu, proprio prégue para ti? - Com 
muito gosto" , replicou Gertrudes. Então 
J esús inclinou a alma de Gertrudes para o 
seu Coração, e ella logo discerniu neste duas 
pulsações dulcíssimas de ouvir : "Uma destas 
pulsações, diz Jesús, opéra a salvação dos 
peccadores; a segunda, a santificação dos jus­
tos. 
"A primeira fala sem trégua a meu Pae, 
afim de lhe aplacar a justiça e attrahir a mi­
sericordia. Por essa mesma pulsação falo a 
todos os santos, desculpando junto a elles os 
Vida intima do S. Coração 47 
peccadores, com o zelo e a indulgencia de um 
bom irmão,. induzindo-os a intercederem por 
elles. Essa mesma pulsação é o incessante ap­
pello que dirijo misericordiosamente ao pro­
prio peccador, com indizível desejo de vêl-o 
regressar a mim, que não me canço de es­
perai-o. 
"Pela segunda pulsação digo continua­
mente a meu Pae quanto me felicito de ter. 
dado o meu sangue para resgatar tantos jus­
tos, no coração dos quaes frú9 tantas ale­
grias. Convido a côrte celeste a admirar com­
migo a vida dessas almas perfeitas e a dar 
graças a Deus por todos os bens que elle já 
lhes deu ou lhes prepara.Enfim, esta pul­
sação do meu Coração é a conversa habitual e 
familiar que tenho com os justos, já para lhes 
testemunhar deliciosamente o meu amor, já 
para reprehendel-os das suas faltas e fazel-os 
progredir de dia em dia, de hora em hora. 
"Nenhuma occupação exterior, nenhu­
ma distração da vista, do ouvido, interrompe 
as pulsações do coração do homem; assim o 
governo providencial do universo não será 
capaz, até o fim dns seculos, de deter, de in­
terromper de moderar,. siquer por um instante, 
istas duas pulsações do meu Coração : " 
48 4.0 dia 
Na quinta-feira santa, Jesús fez com­
partilhar ao coração de Gertrudes as angustias 
que o seu divino Coração experimentou ao 
aproximar-se a sua Paixão. Parecia á santa 
que Jesús passava todo aquelle dia na pros­
tração e nos soffrimentos da agonia, porque 
sabia d'antemão tudo o que devia aturar. 
Por isto, como elle era Filho duma terna 
Virgem e mais delicado ainda que sua Mãe, 
assustava-se e tremia a todo momento, apre­
sentando já f!S convulsões e a pallidez dum 
moribundo. A Gertrudes, partilhando-lhe as 
angustias, sentia tal compaixão delle que, si 
tivesse o poder de mil corações, tel-oia cen­
sumido todo naquelle dia em compadecer-se 
de amigo tão �.:aro e tão amavel. Sentia tam­
bem no seu coração violentas pulsações, pro­
vocadas pelo desejo e pelo amor, que corres­
pondiam ás pulsações do Coração de Jesús, 
de sorte que estava prestes a desmaiar sob a 
violencia dellas. Ora, o Senhor lhe disse : "O 
amor que me animava no tempo da minha 
Paixão,. quando eu supportava no meu Co­
ração todas essas angustias, sito-o hoje no 
teu coração, que tantas vezes se tem com­
movido e penetrado de compaixão pelas mi­
nhas dôres, pela salvafáO dos meus eleitos. 
Vida intima do S. Coração 49 
A.ssim, dou-te em troca dessa compaixão que 
me teStemunhaste durante aquelle dia� tedo o 
preço da minha sagrada Paixão pelo bem de 
tua alma, e quero que recebas tambem, para 
distribuil-o a toda a Igreja, esse mesmo fruto 
da minha Paixão em todos os lugares onde 
se adora hoje em dia o lenho da Cruz" . 
REFLEXÕES. - A vida intima do Co­
ração de Jesús póde resumir-se nesta só pa­
lavra : Amor - Charitas est. As duas pul­
sações do divino Coração que Gertrudes ou­
viu, são pulsações de amor ; amor a Deus e 
ás nossas almas; amor aos justos e aos pec­
cadores ; amor que une com o Sagrado Co­
ração, e tambem entre si, os diversos mem­
bros do seu corpo, e faz que se amem mú­
tuamente e sirvam ao bem uns dos outros : 
como o coração humano, que envia o sangue 
a todos os mebros do n_osso corpo, lhes serve 
assim de centro a todos, e faz circular de um 
a .outro esse liquido nutritivo que cada um 
delles contribuiu para preparar. 
Nós, portanto, membros do corpo mys­
tico de Jesús, animados pelo seu divino Co­
ração, devemos receber em nós essa corrente 
de amor que elle envia a todos os seus mem­
bros, sentir a repercussão das suas divinas 
50 4.• dia 
pulsações, compartilhar-lhe assim os sentimen­
tos, e viver em tudo da sua vida santa. Esta 
vida, dissemol-o, é o amor, e este amor tem 
como que um duplo movimento produzido 
pelas duas pulsações do Coração de J esús ; o 
da acção de graças pela vida recebida, o da re­
paração pela vida perdida ; mais ou menos 
como no corpo humano ha, sob o impulso do 
coração, o duplo movimento da circulação que 
envia o sangue arterial aos diversos membros, 
e da reabsorpção que lhes repara as forças 
perdidas. 
Oh ! sim, sintamos bem em nós os senti­
mentos do Coração de Jesús ! Pulse sempre o 
nosso cQração com essa dupla pulsação de 
acção de graças e de reparação, que é incessan­
te no divino Coração ! Entreguemo-nos em 
primeiro lugar a essa acção de graças que esse 
Coração tão agradecido deseja tanto continuar 
em nós. Felicitemos primeiro a elle proprio 
pela gloria que adquiriu para si soffrendo 
pelos homens, "pelas alegrias multiplas que 
desfruta no coração de tantos justos ganhos 
por seu amor" Por elle, em seguida, convi­
df:mos a Côrte celeste a celebrar comnosco a 
caridade infinita do nosso Deus, a render-lhe 
graças comnosco por todos os bens que já 
Vida intima do S. Coração 51 
nos concedeu ou nos prepara. Unamo-nos 
umbem, por elle, a esse concerto de louvores 
que se eleva sem cessar de todos os pontos da 
terra, inspirados pelo louvor perpetuo que 
�nta o Coração de Jesús em todos os nossos 
ubernaculos. 
Fale em seguida o nosso coração sem 
trégua a Deus Padre em favor dos pobres pec­
�dores, que são seus filhos como nós. Offe­
r.:ç.unos-lhe incessantemente as homenagens 
ea reparação para aplacar-lhe a justiça offen­
:iida, e preces de propiciação para attrahir 
iObre todos a sua misericordia. Chamemos em 
:::tosso auxilio todos os habitantes do céo, un:a­
:::to-nos a todas as almas santas da terra para 
interceder em favor de nossos irmãos e obter­
ibes o perdão. Unamo-nos sobretudo aos dese­
jos ardentes do Coração de Jesús pela con­
n-rsão delles, offereçamos incessantemente por 
�lles o sangue do Redemptor, cuja voz sem­
pre ouvida chama misericordia para todos. 
O trabalho da reparação deve ser acom­
panhado dum sentimento que vem auxiliai-o : 
é a compaixão,. e esta nos traz necessariamente 
a uma pratica que lhe é a consequencia rigo­
rosa : a immolação. Jésús queixa-se nas suas 
dôres de não encontrar corações compassivos, 
52 4.• dia 
Ah ! nós ao men-os, respondamos á sua queixa 
como amigos dedicados ; compadeçamo-nos 
vivamente do seu Coração saciado de oppro­
brios e de amargura. Compadeçamo-nos del­
te na sua Igreja, que com elle é crucificada 
hoje em dia num novo Calvario ; compadeça­
mo nos delle nesses pobres peccadores que lhe 
são os membros tão doloridos, que renovam 
em si mesmos as dôres da sua paixão. Com­
padeçamo-nos delle pelo desejo, pelo amor. 
pelo soffrimento. Entristeçamo-nos com elle 
para consolai-o ; compartilhemos-lhe as dôres 
para suavizal-as ; offereçamo-nos sem reserva 
com elle como victimas de propiciação e de 
immolação, afim de supprirmos em nós mes­
mos o que falta á sua Paixão para a conver­
são dos peccadores ; entreguemo-nos com elle 
a um zelo sem limites, sem reserva, pela ora­
ção, pela acção, pelo sacrifício. 
Oh ! como o Coração de Jesús se enter­
necerá em favor dos corações que assim o 
quizerem consolar ! Como abençoará os que o 
auxiliarem assim a assegurar a utilidade do 
seu Sangue, a consummar a salvação dessas 
almas que lhe são tão caras! Ah ! não duvi­
demos, elle nos dará a nós tarnbem, como a 
Sta. Gertrudes, de modo especial , por urna 
Vida intima do S. Coração 53 
especie de apropriação, todo o fruto da sua 
Paixão, para que o appliquemos a nós mes­
mos, para que o derramemos em todas as 
3lmas de nossos irmãos. 
CONCLUSÃO PRATICA. - 1 .0 Acção de 
�raças habitua"es dadas ao Sagrado Coração 
:!;: Jesús por todos os seus beneficios . 
• o Reparações ardentes, desaggravos, para 
: .:-mpensar, · tanto quanto estiver em nós, a 
:=�gratidão dos homens para com esse amavel 
5.ã.Indor. 
3 .0 Vivos sentimentos de compa1xao 
;.-.l.ra com o divino Coração saturado de op­
?rObrios e de amargura. 
4.0 Offerecimento sem reserva de nos 
mesmos como victimas de immolação e de 
propiciação, afim de consolarmos esse divino 
Coração e completarmos em nós o que falta 
á sua Paixão para a conversão dos peccadores, 
isto é, zelo sem limites, sem reserva, pela ac­
ção e pelo sacrifício. 
QUINTO DIA 
Os desejos do Coração de Jesús. 
"Um dia de quinta-feira santa, Sta. Ger­
trudes viu o Senhor Jesús antes que as Irmãs 
se aproximassem da sagrada mesa, reduzido a 
um estado de extremo desfallecimento pela 
vehemencia do desejo que tinha no seu divi­
no Coração de se unir áquellas almas dilectas. 
Estava como jacente por terra e não tendo 
mais forças. A Santa ficou tão commovida, 
que ella propria se sentiu a pique de desmaiar ; 
mas o Salvador fortificou-a e lhe fez com­
prehender que aquelle desfallecimento era o 
triumpho do seu amor, e que elle ia ficar no 
cumulo das suas delicias dando-se pela sagra­
da communhãoáquellas almas que tanto de­
sejara" . ( IV, 25 ) . 
Um dia Sta. Mechtilde, estupefacta com 
as provas de ternura do Coração de Jesús, 
queria, por um sentimento de respeito, afas­
tar-se um pouco delle ; mas elle, ao contrario, 
Desejos do S. Coração 55 
mais a attrahia, dizendo-lhe : "Não, fica com­
migo para que eu saborêe a minha ventura" . 
(I . 1 9 ) . 
D'outra vez, disse-lhe o Senhor : "Nada 
me proporciona tantas delicias quanto o co­
ração do homem, sem o qual todavia devo 
muitas vezes passar. Tenho todos os bens em 
abundancia; só o coração do homem é que me 
foge ainda" (IV, 54) . 
REFLEXÕES. - 0 Coração de Jesús é 
todo desejo, tatus desiderium ( 1 ) . Deseja a 
gloria de seu Pae, pela qual trabalha unica­
mente ; deseja o coração do homem, para 
haurir nelle as suas delicias ; antes da sua Pai­
xão, desejava ardentemente soffrer para nos 
purificar no baptismo do seu sangue ; hoje. 
deseja com grande desejo vir a nós pela com­
munhão para nos santificar ; deseja-nos por­
que nos libertou por seus soffrimentos, com­
prou por seus trabalhos, conquistou por suas 
victorias ; deseja-nos porque lhe somos o bem. 
a gloria, a felicidade, Ah ! demos-lhe pois o 
que elle tanto deseja. Quem somos nós para 
recusar ao amor aquillo que elle deseja ? Meu 
I 
(1) Cant. (v. 16) , s_egundo o hebraico. Vêr 
Cornelio a Lavide, 
56 5.o dia 
Deus, vós que vos bastaes eternamente na 
plenitude dos vossos be�s. quizestes, por uma 
extrema delicadeza de amizade, precisar de 
nós, e, , agora que solicitaes o nosso coração 
com ternura infinita, teríamos a triste cora­
gem de vol-o recusar ? Pedis-nos o coração 
para santificai-o e abençoai-o, e seríamos bas­
tante insensatos para não vol-o dar ! Quereis 
enchei-o dos vossos bens, do vosso amor, da 
vossa divina beatitude, e seríamos bastante 
máos para val-o fechar ! Oh ! não, amor ! O' 
Deus desejoso de tudo e todo desejavel, vosso, 
só vosso seja todo o nosso coração ! Abando­
namo-vot-o para sempre, sem temor e sem 
reserva ; abandonamo-val-o por puro amor ; 
entregamol-o inteiramente aos vossos desejos. 
Mas nós tambem, por nossa vez, dese­
jemos a Jesús que tanto nos deseja. Elle é 
para nós todo desejavel, sejamos para elle to­
dos desejo. O desejo, · dizem, é o amor do bem 
ausente : ai! Jesús está ausente para nós
.
: pere­
gre profectus est. Oh ! desejemos ir procurai-o, 
achai-o, chegar até elle : Oh! ire, oh! sibi 
perit'e, oh ! ad te pervenire! (S. Aug. Serm. 
CLIX. ) Desejemol-o com esse desejo que 
consumia o coração do Apostolo, quando ex­
damava : "Estou angustiado, desejo ser dis-
Desejos do S. Coração 57 
solvido para me ir juntar a Jesús" . Oh ! si 
soubéssemos o quanto lá de cima elle nos de­
seja ! si soubessemos que todos os Santos, par­
tilhando-lhe os desejos, esperam com impa­
ciencia, como elle dizia a Sta. Gertrudes, o 
momento em que iremos com elles augmen­
tar-lhe os amores, oh ! como desprezaríamos 
esta terra, comio os nossos olhares se volveriam 
para o céo, como o nosso desejo e o nosso 
coração se fixariam lá em cima, onde está todo 
o nosso thesouro ! 
Mas emquanto nos não é dado possuir 
a Jesús no céo, desejemos neste mundo fazer­
lhe a vontade, possuir-lhe o Coração, ��ir­
nos á sua Cruz. Como Gertrudes, procure· 
mos sempre conhecer-lhe a vontade para cum­
pril -a fielmente ; estejamos sempre ·"com pres­
sa" para lhe executar as ordens ; apprehenda­
mos com solicitude os menores signaes que 
nos manifestam o bemplacido do seu Cora­
ção, e empenhemo-nos com todas as nossas 
forças em satisfazel-o. Peçamos-lhe sem ces­
sar o seu Coração sagrado que é o penhor da 
sua ternura, o nosso verdadeiro thesouro. o 
orgão do nosso amor. Que elle nos una com­
sigo numa mesma caridade! Oh ! amor, o que 
fazes faze-o quanto antes. Oh ! Si os dons 
511 5,o dia 
do amor são tão desejaveis, que não deve ser 
o proprio amor, fonte de todos, esses dons? 
Senhor é a vós que eu amo, é para vós que 
sou feito : nada poderá satisfazer-me sinão 
vós mesmo, nada poderá contentar o meu 
coração sinão o dom do vosso Coração ; quero 
cada - vez mais dar-vos o meu sem reserva, 
para que me deis o võsso todo. 
A Cruz não se separa do dom do Co­
ração de Jesús, nunca o esqueçamos. A alma 
unida a esse divino Coração, não mais sen­
tindo sinão pelos sentimentos delle, deseja 
como elle esse baptismo de sangue em que 
acabará de purificar-se em que se transfor­
mará com elle numa victima santa pela sal­
vação do mundo. O amor da Cruz é o signal 
dos amigos dedicados do Coração de Jesús, 
o desejo da Cruz é levado nelles não raro até 
á paixão, até á loucura. "Penso, dizia uma 
dessas almas generosas, ( 1 ) , que o desejo de 
soffrer me fará morrer" . Quanto a nós, en­
treguemo-nos ao menos· a esse desejó em 
união com o Coração de Jesús ; digamos com 
a Victima santa : "Aqui estou, meu Deus, para 
fazer a vossa vontade" , e faça-se em seguida 
seu bel prazer. 
( 1 ) A B, M. da Incarnação (Sra. Acarie) . 
Desejos do S. Coração 59 
Entreguemo-nos a desejos sem limites, 
primeiro nas nossas orações. Corno Daniel a 
orar pelo seu povo, sejamos homens de de­
sejos, e as nossas orações, corno as delle, mere­
cerão ser ouvidas pela salvação da Igreja. 
Santa Gertrudes, concentrando no coração de­
sejos universaes e infinitos, soava com os de­
sejos de todo o universo, ex affectu totius 
universitatis, e para o maior bem de todo o 
universo, no céo na terra e no purgatorio. 
Eis um coração verdadeiramente segundo o 
Coração de Jesús, grande corno elle, amando 
corno elle, desejando corno elle. Transporte­
mos esses desejos sem limites a todas as noss_as 
obras, para que essas obras possam corres­
ponder ás necessidades da Igreja, que são sem 
limites. Pequenas em si, ellas serão engran­
decidas pelos nossos desejos, e Jesús, que torna 
o desejo pela realidade, dar-lhes-á valor sem 
·:mites para a salvação do mundo. "O' meu 
Deus ! dizia Sta. Catharina de Senna, corno 
fareis nestes desventurados tempos para pro­
vêrdes ás necessidades da vossa lgre ia ? Sei o 
aue fareis : o vosso amor suscitará hornenr 
de desejos ; as suas obras finitas, juntas a de­
sejos infinitos, far-vos-ão attender-lhes os 
anhelos pela salvação do mundo" . 
60 5.0 dia 
Parece, porém, que é sobretudo no to­
cante ás cruzes que, nestes tempos em que 
as almas são tão fracas, o Coração de Jesús 
espera de nós grandes desejos para supprir 
aquillo que não podemos soffrer : "Senhor, 
dizia Sta. Gertrudes, inspirada pelo Coração 
de Jesús, offereço-vos todos os soffrimentos 
de minhas Irmãs, com o desejo de atural·o.r 
até o fim do mundo, si fôr o vosso benepla­
cíto. - Faze-me amiudadamente este offere­
cimento que me inebria o Coração e o torna 
incapaz de vos recusar o que quer que seja. ­
Já que esse offerecimento vos é tão grato, ensi­
nae-me como vol-o poderei fazer sempre. -
Offerece-me sempre, com coração contrito e 
humilhado, o desejo de soffrer para minha 
gloria, si preciso, todos os soffrimentos do 
mundo até o fim dos tempos, e alcançarás do 
meu coração tudo quanto lhe quizeres pedir" 
CONCLUSÃO PRATICA. - 1 .0 Dizer ás 
vezes a invocação : O' J esús, uni a minha von­
tade á vossa vontade, o meu coração ao vosso 
Coração, a minha cruz á vossa cruz. 
2. o - Offerecer as nossas orações, ac­
ções, penas com a piedosa formula de Sta. 
Gertrudes : com o amor de todo o universo 
e do proprio P�1,1s, e para que sirvam il um 
Desejos do S. Coração 61 
augmento de graça ou de gloria para todos 
os habitantes do céo, da terra e do purgato­
rio cum delectamento divinitatis ex affectu 
totius universitatis, ut cedat in augmentum 
salutis omnibus crelestibus, terrestribus et pur­
gendis. 
SEXTO DIA 
Os desejos do Coração de Jesús (continuação) 
Gertrudes foi, por excellencia, a Santa 
dos desejos, e mereceu que muitas vezes nos­
so Senhor a certificasse de que esses desejos 
seriam contados corno si se tivessem realizado, 
e de que acceitava a sua bôa vontade corno 
urna realidade. Ha, de resto, certo numero de 
Santos que só se tornaramsantos pelos desejos 
( 1 ) : Deus ouviu-lhes a preparação do cora­
ção. A perfeição das suas disposições valeu­
lhes as graças maiores, e a santidade das in­
tenções deu rnerito incornparavel ás suas me­
nores acções. Ora, é um caracter particular 
da devoção ao Sagrado Coração, tal corno 
nol-a faz conhecer Sta. Gertrudes, o santifi­
carmo-nos pelos desejos. U:tilizernos pois este 
( 1 ) S. JoãQ Berchmans, por exemplo. O Ve­
neravel Padre de la Colombiere dizia tambem a res­
peito do desejQ tão perfeito que o santificou : Deus 
não poderia deixar de tomar o desejo pela realidade. 
Desejos do S. Coração 63 
meio tão facil, tão dôce, tão animador. Vol­
vamos todas as nossas intenções para Deus. 
Unamo-nos ao Coração de Jesús nas meno­
res acções por um desejo bem. puro, bem sin­
cero e sem limites, de glorificar seu Pae, e 
noss'alma enriquecer-se-á de meritos incom­
paraveis, e o Coração do bom Mestre ficará 
consolado de ouvir e de satisfazer em nós 
os seus proprios desejos. 
Ha um mysterio de amor em que Nosso 
�enhor não quer que o frustrem nos seus de, 
sejos, que a impeçam as delicias do seu Co­
ração : é o mysterio da sagrada Eucharistia. 
Comprehendamos bem porque foi que elle a 
instituiu : foi para estar comnosco até á con­
summação dos seculos. Não foi certamente 
para ficar sózinho, abandonado num Taber­
naculo, verdadeira prisão de amor, onde o 
deixamos tantas vezes definhar no isolamento. 
:\h! sim, é ahi sobretudo que elle nos deseja 
�om grande desejo, é ahi que insta comnosco 
.1 nos virmos unir a elle, chamando-nos sem 
�o::ssar, convidando-nos com ínsístencia, for­
.;ando-nos de alguma sorte a entrar. Respon· 
dú-lhe pois ao appello ; ide vísital-o com so­
_ :citude igual ao seu amor ; ide colhe� as gra· 
�s que elle quer derramar sobre vós p�lo 
64 6.o dia 
seu sacrifício ; ide unir-vos a elle pela sagrada 
Communhão. Elle vos abre o coração ; não 
temaes. Não digaes tão facilmente que ainda 
não estaes bastante preparado ; já que elle vos 
convida, elle que sabe de tudo, é porque não 
quer esperar por mais longa preparação. Elle 
bem sabe o de que somos capazes : não ·nos 
pede disposições perfeitas ; contenta-se com a 
nossa bôa vontade. Ide pois a elle sem. tardan­
ça, com confiança e abandono. Preferí aban­
donar-vos agora ao seu amor misericordioso, 
a terdes de prestar contas mais tarde á sua 
justiça das communhões a que tiverdes falta­
do por culpa vossa, dos convites da sua ter­
nura a que não houverdes correspondido, das 
graças privilegiadas do seu Coração que não 
tiverdes querido receber. 
Em vez de regatearmos a J esús o nosso 
coração, esforcemo-nos antes, como Gertrudes, 
por lhe trazer comnosco as almas de nossos 
irmãos transviado& que elle tanto deseja �nir 
a si pela Communhão. "Manda entrar" , dizia 
Jesús a sua esposa, as almas pelas quaes re­
zastes esta semana; porque as quero ter á mi­
nha mesa" . - Senhor, e como as posso fa­
zer entrar ? Certamente, por mais indigna que 
eu seja, si pudésse trazer-vos todos esses ho-
Desejos do S. Coração 65 
mens com quem vos dignaes fruir as vossas 
delicias, eu iria de pés descalços bem gostosa­
mente, desde este dia até o do juizo, buscai-os 
por todo o mundo ; tornai-os-ia nos braços e 
vol-os viria apresentar, afim de poder assim 
satisfazer um pouco que seja o desejo infinito 
do vosso divino Coração. Mas como poderei 
fazel-o? - Os teus desejos, respondeu o Se­
nhor, e a tua bôa vontade bastam para tudo" 
E nós tambem, si quizermos contentar 
o Salvador, tratemos de lhe trazer as suas 
ovelhas desgarradas, que elle tanto deseja es­
treitar ao seu Coração. Rezemos, ajamos, com­
batamos, sofframos e, si preciso, morramos 
para lhe conquistar almas. Hoje, mais q·ue 
nunca, é o dia do combate. Vêde quantos 
1ntm1gos se assanham contra a Igreja ! que 
conjura infernal se urde para derrubai-a ! dir­
se-ia que Satanaz tenta um supremo esforço 
para prevalecer contra ella. Deixem pois os 
soldados de Christo qualquer outro pensa­
mento, e lancem-se á batalha. Não é o mo­
mento de nos occuparmos de nós mesmos e 
dos nossos próprios interesses ( 1 ) , por mais 
( 1) Bem se comprehende que isto não é dito 
para todos ; quantas almas não ha porél)l que se 
adiantariam mais depressa e mais seguramente na 
I 66 6.0 dia 
importantes que pareçam. E' preciso comba­
ter ; é preciso soccorrer a santa Igreja; é pre­
ciso salvar nosos irmãos ! Eis o desejo do 
Coração de Jesús ! Eis o nosso desejo ! 
CONCLUSÃO PRATICA. - 1 .0 Desejemos 
a cada instante, como Sta. Gertrudes, conhe­
cer os desejos do Coração de Jesús para com­
partilhai-os com elle e nos esforçarmos por 
satisfazel-os. 
2.° Consideremos como a melhor pre­
paração para a Communhão o desejo de cor­
respondermos ao desejo de Jesús. A sagrada 
Communhão é antes um soccorro para as nos.­
sas necessidades, do que uma recompensa para 
as nosas bôas disposições ; é, antes de tudo, 
uma comida para a qual o desejo é excellen­
te preparação, como o appetite para a comida 
do nosso corpo. 
3 .0 Sejamos homens de desejos pela sal-
.perfeição, si se esquecessem 31 si mesmas uma vez 
.por todas, para não mais pensar sinão nos interesses 
de Jesús-Christo e da sua Igreja ! "·Pmsa em mim 
e e" pensarei em ti", dizia Jesús a Sta. Catharina de 
Senna. Eis, para muitas almas,. o melhor meio a em­
pregar para se desvencilharem das suas miserias e 
avançarem rapidamente nas vias do amor, 
Desejos do S. Coração 67 
vação de nossos irmãos e 'pelo triumpho da 
Igreja. 
Assim como os desejos de Maria apres­
saram a vinda do Salvador, os desejos dos 
justos, abreviando-lhe os dias de desdita, po­
derão apressar o dia da salvação para a Igreja. 
SETIMO DIA 
Primeiro fruto da detJoção ao Sagrado Co­
ração : o Coração de Jesús tJitJifica todas as 
nossas obras. 
"Trazendo um dia o seu Coração nas 
mãos, Jesús apresentava-o a Gertrudes e lhe 
dizia : "Vê o meu dulcíssimo Coração, har­
monioso instrumento cujos acórdes arroubam 
a Trindade Santa : dou-t'o, e como um servo 
fiél e solicito ficará elle ás tuas ordens, para 
supprír as tuas impotencias ( 1 ) . Usa do meu 
Coração, e as tuas obras encantarão o olhar 
e o ouvido de Deus" 
"Gertrudes hesitava em fazel-o ; Jesús 
triumphou das suas apprehensões, esclarecendo 
ainda mais a sua humildade : 
"Perante uma assembléa respeitavel, diz­
lhe elle, um homem deve cantar ; mas a voz 
( 1 ) O texto traz : Para reparar a toda hora ãs 
tuas negligencias. 
Vida d. nossas obras 69 
delle é aspera e falsa ; mal póde elle tirar 
do peito alguns sons que não firam o ouvido. 
Ora, tú estás perto deU e ; tens, assim o quero, 
uma voz flexível, límpida, sonora ; podes dar­
lhe a tua voz ou cantar em lugar delle ; dese­
jas fazel-o ; elle conhece o teu desejo ; não te 
indignarias contra elle si elle recusasse cor­
responder aos teus offerecimentos ? Assim, co­
nheço a tua miseria, e o meu Coração póde 
suppril-a ; deseja ardentemente fazel-o, é para 
elle uma viva alegria : tudo o que elle pede 
é que lhe confies o cuidado disso, sinão por 
uma palavr.a ao menos por um sígnal qualquer 
da tua vontade" 
REFLEXÕES. - Já lembrámos que o 
duplo papel do coração no corpo humano 
consiste em vivificar-nos os diversos orgãos 
e em lhes reparar as forças perdidas, E' tam­
bem o duplo papel que desempenha o Cora­
ção de Jesús no seu corpo mystico que é a 
Igreja. Só elle deve vivificar tudo nas nossas 
almas ; só elle póde reparar efficazmente todas 
as perdas que tivermos. Consideremos pri­
meiramente a primeira dessas funcções : o Co­
ração de Jesús vivifica todas as nossas obras 
e transforma-as em obras santas e divinas. 
As pa
.
lavras e os olhares do corpo humano são 
70 7.• dia 
palavras e olhares intelligentes, não que haja 
intelligencia nos nossos orgãos, mas porque 
procedem dum principio intelligente ; · assim 
tarnbem, as diversas obras do homem tornam­
se obras divinas si procedem desse principio 
divino que é o Coração de Jesús. O grande 
ponto na vida christã é pois a união em tudo 
com o Coraçãode J esús. Esta união, quando 
habitual. faz-nos chegar rapidamente á mais 
alta perfeição, corno Nosso Senhor o ensinava 
a Sta. Machtilde. "Um dia em que ella aca­
bava de receber a sagrada Cornrnunhão, pare­
ceu-lhe que o seu coração era absorvido pelo 
Coração de Jesús e fazia agora urna só 
causa com elle. Ora, o Senhor disse-lhe : E' 
assim que eu quero que o coração do homem 
me seja unido nos seus desejos, de tal sorte 
que nada deseje por si mesmo, mas regúle 
todos os seus desejos segundo os desejos do 
meu Coração, corno dois ventos que sopram 
junto.s já não formam sinão uma só corren­
te. O homem deve tarnbern unir-se ao meu 
Coração em todos os seus actos, de sorte que, 
si por exemplo quizer comer ou dormir, diga 
em si mesmo : Senhor, em união desse amor 
que vos fez crear para mim este ·allivio, vou 
tornai-o para vossa gloria e para a necessidade 
Vida d. nossas obras 71 
do meu corpo. Semelhantemente, quando 
houver um trabalho por fazer, diga ellé : Se­
nhor, em união desse amor que vos fez tra­
balhar com as vossas mãos e vos faz ainda 
operar incessantemente em minh' alma ; em 
união do amor com que me confiaes agora 
esta tarefa, quero desobrigar-me della para 
vossa gloria e para a salvação de todos. Já que 
haveis dito : Sem mim nada podeis fazer, 
dignae-vos tornar perfeita esta obra pela 
união com as vossas obras, como uma gôta 
d'agua que cáe num rio se lhe assimila ás 
aguas. Una-se emfim o homem ao meu Co­
ração em todas as suas vontades, de sorte que 
queira tudo quanto eu quizera, na adversidade 
e na prosperidade. Assim como o cobre, fun­
dindo-se no fogo com o ouro forma com o 
ouro um só metal precioso, assim tambem o 
coração do homem passará a fazer uma só 
cousa com o meu Coração, o que é a maior 
perfeição desta vida" ( III, 27) . 
Appliquemos por meúdo esta doutrina 
aos diversos actos da nossa vida. Devemos 
primeiro unir as nossas orações ás orações 
do Coração de Jesús : "Um domingo de Ra­
mos, Sta. Gertrudes, inflammada toda do de­
sejo de dar hospitalidade a Jesús. como o fi-
7-2 7.0 dia 
zera naquelle dia á família de Bethania, lan­
çou-se aos pés do seu Crucifixo e, beijando 
,com ardor a chaga do sagrado lado de Jesús. 
�spirou em si todo o desejo que tivera o seu 
·'amabilíssimo Coração, supplicando-lhe, pelo 
ardor de todas as orações saídas desse Cora­
ção adoravel, que se dignasse vir a ella. E 
Jesús logo lhe deferiu a supplica e cumulou-a 
de seus favores" Como poderia elle resistir ao 
seu proprio desejo, recusar ouvir a propria 
prece do seu Coração? 
O proprio Jesús recommendara-Ihe esse 
modo de rezar. "Todas as vezes que quizeres 
rezar por algumas almas, apersenta-me o meu 
dulcíssimo Coração, em união do amor que 
me fez tomar este coração de homem para a 
·salvação do homem, em união do amor parti­
cular com que tantas vezes t' o tenho dado, e 
deste modo conceder-te-ei tudo quanto me pe­
dires para os homens : será como qu� o cofre 
dum homem rico que trazem a este para que 
tire delle presentes para os seus amigos" 
Não sentimos porventura que deve ter 
um poder irresistivel sobre o Coração de 
Jesús a oração feita assim : o· Amigo, peço­
vos aquillo que quereis mais do que eu : a 
salvação das almas ? 
Vida d. nossas ·obras 73 
Peço-vol-o em nome do amor que ten­
-des a essas almas ; peçovol-o para consôlo do 
vosso Coração ; peço-vot-o em nome da ami­
zade que tantas vezes me tendes testemunha­
do ; peço-vol-o em nome do vosso Coração 
que tantas vezes me tendes dado ! 
Oh ! sim, si quizermos rezar assim, bem 
podemos dizer, e a Igreja a isto nos convida 
na sua liturgia : achei o meio de rezar com 
uma oração soberanamente efficaz, achei o 
Coração de Jesús que é tambem o meu co­
ração ( 1 ) , visto que sou membro do seu cor­
po ; com esse Coração, rezarei a Deus, meu 
Pae, e a minha oracsão será sempre ouvida. 
CONCLUSÃO PRATICA. - Rezemos por 
intermedio do Coração de Jesús, aspirando 
em nós os seus desejos, amando com o seu 
amor, querendo com a sua vontade. e deste 
modo a nossa oração será sempre ouvida, por­
que será sempre segundo o Coração de Deus. 
( 1 ) Hoc igilur invcnio C arde tuõ et mcoJ. 
( Off. S. Cordis ]., Lect. li, Noct. ) . 
OITAVO DIA 
O Coração de Jesús vivifica as nossas boas 
obras (continuação) . 
Sta. Gertrudes ensina-nos tambem como 
as nossas a:cções são ennobrecidas e santifica­
das pela união ao Coração de Jesús. Recom­
menda á alma depositar todas as suas obras 
no Coração de Jesús como num ninho ce­
leste, para que ahi se deifiquem pelas suas 
divinas intenções. 
Parece porém que, o que o Coração de 
Jesús deseja acima de tudo é que unamos as 
nossas penas ás suas para que elle lhes commu­
nique os seus meritos infinitos. Não ha nada 
que elle recommende tão a miúde. Um dia em 
que Sta. Mechtilde achava que as suas enfermi­
dades a tornavam como inutil para o serviço 
de Deus, Jesús lhe disse : "Deposita todas as 
tuas penas no meu Coração, e dar-lhes-ei 
a maior _perfeição para utilidade de toda a 
Igreja. Do mesmo modo que a minha divin-
Vida d. nossas obras 75 
dade uniu a si os soffrimentos da minha hu­
manidade para divinizai-os, assim tambem 
quero unir a mim os teus soffrimentos para 
tornai-os p.-:rfeitos. Offerece-os ao meu amor 
dizendo : O' Amor, confio-te as minhas penas 
na mesma intenção com que m'as haveis tra­
zido do Coração de meu Deus, e rogo-te que 
as leves a elle pela mais perfeita gratidão, 
quando lhes tiverdes dado a ultima perfeição. 
E' assim que o teu coração se unirá a esse amor 
que me fez abraçar a Cruz de todo o meu 
coração, e a essa gratidão com ,que agradeci a 
meu Pae o haver-lhe _permittido soffrer por 
aquelles que amo ; e do mesmo modo que a 
minha paixão deu frutos infinitos no céo e 
na terra, assim as tuas penas, mesmo as mais 
pequenas, unidas com a minha paixão, darão 
frutos taes, que os habitantes do céo rece­
berão com elles- um accrescimo de gloria ; os 
justos, maior merito ; os peccadores, o perdão ; 
e as almas do purgatorio, um allivio. Que ha, 
com effeito, que o meu divino Coração não 
possa mudar em melhor, já que todo bem 
que contêm o céo e a terra saiu da bondade 
do meu Coração?" 
Oh ! porque não haV'eriamos tambem 
nós de assegurar ás nossas penas, mesmo ás 
76 8." dia 
menores, esses frutos incomparaveis que a 
união com o Çoração de Jesús assegurava ás 
da nossa Santa ? Porque não as haveríamos 
tambem nós de receber, com aquelles senti­
mentos de amor e de gratidão que ella hauria 
no Coração do Salvador ? E' no entanto tão 
facil e tão dôce ! Não se trata de soffrer mais, 
porém melhor, porém com mais consôlo e 
mais fruto. E isto se reduz a soffrer tudo em 
união com o Coração de Jesús. Oh ! seja 
doravante a nossa pratica habitual. 
Não é evidente que si levarmos assim as 
nossas penas ao Coração de Jesús, ellas serão 
logo grandemente consoladas ? Uma vez, Sta. 
Mechtilde rezava por uma pessôa afflicta ; 
disse-lhe o Senhor : "Venha ella trazer-me as 
suas penas com simplicidade de criança ; bus­
que a sua consolação no meu Coração com­
passivo, e nunca a abandonarei" Jesús fez 
dom do seu divino Coração ás nossas almas. 
accrescenta a Santa, para que na tristeza nos 
refugiemos nelle com confiança. 
Sta. Gertrudes tinha o habito de offere­
recer a Deus o cantico de lou{)or e da acção 
de graças "com o instrumento melodioso do 
Coração de Jesús e segundo as intenções do 
Coração de Jesús, em nome de todas as crea-
Vida d. nossas obras 77 
turas" : - Sta. M echtilde tambem usa muitas 
vezes desse Coração dulcíssimo como duma 
{yra, para fazer resoar um canto de louvor e 
de gratidão em intenção de todos ( 1 ) . 
O Coração de Jesús era ainda especial­
mente para as duas Santas o orgão do seu 
amor, e succedeu-lhes muitas vezes, quando 
se achavam tíbias e sem devoção , sentirem o 
Coração divino pousar-se-lhes sobre o cora­
ção, como ouro em brasa, e inflammal-o de 
seu amor. 
Jesús déra seu Coração a Sta. Mechtildl.', 
e offerece-o igualmente a cada um de nós para 
uma tríplice união e comotríplice fonte de 
graças incomparavelmente enriquecedoras : · 1. o 
como orgão de amor : "Dou-te meu Coração, 
dizia-lhe elle, para que pelo seu amor ames 
ao teu Deus e a toda creatura por teu Deus ; 
2 . 0 corno orgão de acções de graças : "Sêde 
bemdito. dizia a Santa cada manhã , sêdc 
bemdito, éoração amabilissirno de Jesús, pelo 
louvor, pelas acções de graças e pelas outras 
homenagens que tributastes em meu lugar 
durante esta noite a Deus vosso Pae" ; 3 . 0 
como instrumento de reparação : "Queres-me 
( I ) Pratica aprazivcl ás duas Santa.s era lou­
var Maria pelo Coração de Seu Filho bem-amado. 
78 8.o dia 
ser perfeitamente fiél. dizia Jesús á sua serva, 
que via afflicta com as suas faltas : Prefere 
( 1 ) vêr as tuas negligencias reparadas por 
meu divino Coração antes que por ti mesma, 
supposto que o possas, afim de que lhe adve­
nha disso tanto. mais honra e gloria" 
Ah ! possamos tambem nós usar assim 
desse Coração amantíssimo que quer despen­
der-se todo para os nossos usos : tatus in nos­
tros usus impensus! Seja elle o orgão do nosso 
amor, para que toda a nossa vida seja anima­
da do puro amor ; seja o orgão da nossa gra­
tidão, para que dia e noite -se eleve do nosso 
coração por esse Coração divino a homenagem 
da acção de graças que é tão agradavel a 
Deus ! Seja o orgão das nossas preces e dos 
nossos desejos, para que os nossos desejos se 
elevem directamente para o Céo como um in­
censo de agradavel odor, para que as nossas 
preces se tornem de efficacia segura confun­
dindo-se com as preces desse Filho a quem o 
Pae sempre ouviu ( Seja o instrumento de to­
das as nossas acções para lhes communicar os 
seus meritos infinitos ; sejam em fim as nossas 
penas unidas ás suas penas, para que nos con­
summemos com elle num mesmo sacrifício de 
( I ) O texto accrescenta. e muito. 
Vitla d. nossas obras 79 
amor, para que glorifiquemos com elle a Deus 
nosso Pae, para que salvemos com elle as 
almas de nossos irmãos. 
Podemos aproximar da doutrina tão 
animadora de Sta. Gertrudes alguns princí­
pios theologicos : 1 .0 Suarez (de Oratione) 
promette a efficacia á oração, mesmo nos. ca­
sos que se afiguram d�sesperados, com estas 
duas condições : que parta dum coração ,ami­
císsimo de Deus ; 2. o que se eleve para Deus 
com accentos ardentíssimos. Ora, o Coração 
de Jesús não é maxime amicus? e si pela união 
com elle nos apropriamos daquelles gemidos, 
daquelles gritos possantes que elle soltou para 
o Céo, não podemos esperar ser ouvidos como 
elle? 
2.0 As nossas acções tiram o seu valor 
sobrenatural. da gr�ça que as produz, e do 
amor que as informa. Ora ,· o Coração de 
Jesús é a- fonte da graça e o fóco do amor ; 
por conseguinte, quanto mais unidos estiver­
mos ao Coração de Jesús, tanto mais cheias 
da sua graça e abrasadas do fogo do seu amor 
serão as nossas acções, e por consequencia tan­
to mais valor sobrenatural terão tambem. 
3 . 0 Aproximemos estes dois princípios : 
1.. o In satisfactione magis attrmditur affectus 
110 s.· dia 
quam quantitas (S. Thomaz) ; 2. o Satisfactio 
pro ·altero, pr�sertim uivo, infallibilis est 
(Suarez) . Podemos concluir delles que, unin­
do-nos na oração ao amor do Coração de 
Jesús na Cruz, e apropriando-nos das suas sa­
tisfações divinas que elle céde aos que lhe 
estão assim unidos, asseguraremos ás nossas 
penas um valor satisfactorio incomparavel. 
4. o A lei do amor quer que Jesús nos 
considere como sendo uma só pessôa com elle : 
uelut unum sibi (S. Thomaz) . Resulta d'ahi 
que elle ama e agradece a Deus por nós como 
por si mesmo, e que assim nos podemos apro­
priar desse amor e dessa acção de graças como 
sendo verdadeiramente nossa e por nós. 
CONCLUSÃO PRATICA. - 1 .0 Usemos 
do Coração de Jesús em todas as nossas ac­
ções para que elle as torne perfeitas. 
2 .0 Offereçamos fielmente todas as nos­
sas penas, mesmo as menores, ao Salvador, 
para que elle as una ás suas e nol-as faça ac­
ceitar com o amor de seu divino Coração : 
dupla condição que lhes assegurará merito in­
comparavel. 
3 . • Na oração, sirvamo-nos do Coração 
de Jesús como orgão do nosso amor, da nossa 
Vida d. nossas obras 81 
acção de graças e das outras homenagens que 
temos a prestar a Deus. Essa oração será tão 
facil para nós quanto agradavel para o Se­
nhor. 
NONO DIA 
Segundo fruto da devoção ao Sagrado Co­
ração : o Coração de Jesús repara por nós. 
Vimos mais acima corno Jesús dá o 
seu Coração a Sta. Gertrudes para lhe reparar 
todas as negligencias e tornar pe;rfeitas as 
obras : "Gertrudes, recordando um dia no seu 
coração, com profundo sentimento de gra­
tidão, esse serviço insigne que lhe prestava o 
Coração de Jesús, de reparar assim por ella, 
perguntou ao Senhor até quando se dignaria 
de continuar-lhe esse favor : "Por tanto tem­
po, respondeu-lhe Jesús, quanto desejares con­
servai-o; nunca terás que deplorar que eu t'o 
haja retirado" . A' vista de tanta bondade, a 
Santa, sentindo-se penetrada cada vez mais 
de admiração e de gratidão, mergulhava-se 
com profundo abaixamento no valle da hu­
mildade ; mas, seguindo-a ahi com amor, o 
Senhor pareceu-lhe fazer sair do seu CÇ>ração 
divino corno que um canal todo de ouro que 
O S. Cor., reparação nossa 83 
descia até essa alma assim humilhada, e pelo 
qual lhe fazia chegar a abundancia de suas 
graças. Assim, á medida que ella se humilha­
va dos seus defeitos, o Senhor, pelas graças 
que dimanavam do seu Coração sagrado, apa­
gava-os inteiramente, e lhe communicava em 
lugar delles as suas divinas virtudes para que 
ella parecesse toda santa e sem macula como 
elle " . 
O Coração do bom Mestre queria sup­
prir não só as perdas que Gertrudes podia ter 
pelas suas falhas, porém mesmo ainda as que 
eram resultado das suas occupações e das dis­
tracções inherentes aos diversos trabalhos · do 
dia : "Certo dia de sexta-feira, aproximando­
se a noite, Gertrudes, lançando os olhos so­
bre o seu Crucifixo, dizia ao Salvador com 
coração penetrado de compuncção : Dulcíssi­
mo e amantíssimo Creador, quantos tormen­
tos soffrestes hoje para minha salvação, e 
como sou miseravel de ter passado este dia em 
occupações estranhas sem me lembrar do que 
a cada hora suppottastes por mim, vós que, 
sendo a vida, rnorrestes por amor do meu 
amor ! " O Senhor respondeu-lhe do alto da 
sua Cruz : "O que descurastes nisso, eu o sup­
pri por ti; a cada hora deste dia recolhí no 
84 9.o dia 
meu Coração aquillo que deuêras ter recolhido 
no teu, e deste modo
. 
elle se encheu de tal 
forma de graças para ti, qÜf! estd comQ que 
abarrotado, e eu a!Juardaua com grande im­
paciencia o momento em que deuias dirigir-me 
es_ta prece; pois, sem ella, tudo o que recolhí 
para ti não te -poderia aprowitar, mas com 
esta prece pódes apropriar-te disso perante 
Deus meu Pae como pertencendo a ti mesma" 
(III, 4 1 ) . 
. 
O' amor, ó liberalidade do Coração de 
Jesús, corno mereceis com toda razão os lou­
vores de todos os corações ! 
Póde tarnbem haver algo de mais to­
cante do que a liberalidade do Coração de 
Jesús em pagar as dividas de Gertrudes para 
com a SS. Virgem? "O' meu Irmão, dizia 
um dia a nossa Santa a Jesús, ó meu Irmão, 
já que vos fizestes homem para pagardes as 
dividas dos homens, dignae-vos agora, rogo­
vos. supprir a minha indigencia e reparar os 
meus erros para com vossa bernaventurada 
Mãe'J. Ora, Jesús levantou-se logo ; adiantou­
se mui respeitosamente para sua Mãe, poz-se 
de joelhos diante della, e saudou-a inclinando 
a cabeça com dignidade e amabilidade encan­
tadora. E essas homenagens do Filho de Ma-
O S. Cor., reparação nossa 85 
ria pagaram superabundantemente todas as 
dividas de Gertrudes. 
Ora, esses sentimentos, essa linguagem 
tão confiante de Sta. Gertrudes, toda alma 
dedicada a Jesús Christo não se póde apro­
priar delles para obter do Coração de Jesús 
que· elle se digne de pagar-lhe todas as ·dividas 
para com Deus e para com seus irmãos ? 
REFLEXÕES. - Já falámos precedente­
mente da reparação como finalidade da de­
voçãoao Sagrado Coração, mas é a reparação 
offerecida ao Coração · de Jesús por outrem, 
e agora se trata da reparação por nós mesmos : 
é o Coração de Jesús que repara por nós ou 
em nós. 
E' este segundo Sta. Gertrudes, de todos 
os soccorros que achamos na devoção ao Sa­
grado Coração, o que mais nos póde auxiliar 
o progresso da almà : "Um dia, procurava ella, 
entre os differentes favores que recebera de 
Deus, o que seria mais util manifestar aos 
homens para seu adiantamento espiritual. O 
Senhor, entrando-lhe com condescendencia no 
pensamento, indicou-lhe justamente· essa dis­
posição misericordiosa do seu Coração para 
reparar todas as nossas culpas : "Faze conhe­
cer aos homens a vantagem que acharão em se 
86 9.• dia 
lembrarem incessantemente de que eu, o Filho 
da Virgem, me conservo de pé pela salvação 
delles diante de Deus Padre, e que si elles vêm 
a commetter alguma falta, eu offereço por 
elles o meu Coração sem macula á justiça di­
vina" 
Meditemos simplesmente os ensinamim­
tos que nos deu Sta. Gertrudes ; veremos nel­
les que o Coração de Jesús quer reparar as nos­
sas culpas, supprir as nossas faltas involun­
tarias, p�gar o que devemos a Deus e á Igreja , 
com a condição sómente de que lh'o peça­
mos com coração contrito e humilhado sem 
duvida, mas sobretudo com um coração cheio 
de confiança. E elle o quer fazer perfeita­
mente as nossas obras, para completar a nossa 
tarefa, para nos consummar em si. 
O Coração de Jesús deseja ardentemente 
em primeiro lugar reparar todas as nossas 
culpas. Encara-as de alguma sorte como sen­
do as suas proprias culpas : Verba delictorum 
meorum, em virtude da unidade de corpo e 
da solidariedade intima que existe entre elle 
e nós ; ellas são contrarias aos seus interesses, 
tendem á ruína da sua Obra, fazem-lhe mais 
mal que a nós mesmos, e elle deseja incompa­
ravelmente mais que nós apagai-as e destrui!-
O S. Cor., t.eparação nossa 87 
as : é para elle uma necessidade premente, uma 
consolação necessaria. A unica cousa que elle 
pede de nós é que lh'as venhamos trazer com 
Coração contrito e confiante, que nunca se 
deixe desalentar, com uma bôa vontade que 
se levante corajosamente depois de cada quéda, 
e que, só pensando nos interesses de Jesús, 
creia que elle saberá sempre pelo seu poder, 
sabedoria e bondade que são infinitas, reparar 
as faltas da nossa fraqueza, da nossa igno­
rancia e da nossa malícia que são essencial­
mente limitadas ( 1 ) . Levemo-lh'as pois com 
toda confiança ; façamos fielmente cada dia, 
a cada hora, esse offerecimento das nossas fal­
tas, que é conhecido por todos os amigos do 
Sagrado Coração ( 2 ) . 
Levemos em seguida ao Coração de 
Jesús as nossas faltas 'involuntarias, todas 
as nossas negligencias e omissões, para dar­
mos resulta�o inevitavel da nossa fraqueza, 
a esse divino Coração o consôlo e a gloria 
d{' reparal-as. Prefiramos mesmo. como Jesús 
( 1 ) Essa bôa vontade, si é sincera e completa, 
encerra a vontade de trabalharmos e combatermos 
ernquanto pudermos. para nossa emenda. 
(2) Vêr, a este respeito, um capitulo. admira­
nl do P. Ramierc, no seu livro sobre o Apostoladn 
-In S(7�1'11dó Cot·ação. 
88 9,o dia 
o pedia a Sta. Mechtilde, prefiramos, e muito, 
vêr as nossas negligencias reparadas pelo seu 
amor. antes que por nós mesmos, supposto que 
o possamos, afim de que lhe advenha disso 
mais honra e gloria. Porque afinal o que dese­
ja a:cima de tudo a alma dedicada ao Sagrado 
Coração é a gloria desse divino Coração. 
Ora, a sua gloria consiste principalmente em 
mostrar a sua bondade e misericordia. E 
como mostrará elle a sua bondade si não 
fôr dando-nos aquillo que nos falta 7 Sobre 
que base se elevará o throno da sua miseri­
cordia, sinão sobre as nossas miserias ? E si 
tivermos verdadeiramente confundido os nos­
sos interesses com os delle, como é a lei da 
amizade, como é a condição da nossa socieda­
de com elle, que outra causa temos a fazer, 
quando esses interesses hão soffrido, por negli­
gencia nossa, sinão virmos expôr-lh'o com 
toda· simplicidade afim de que elle lhes suppra 
para suas riquezas infinitas ? 
' 
E' pela· mesma razão que, na sociedade 
commercial que Jesús quiz formar comnosco 
para occorrer ás necessidades da sua Igreja, 
nós, pobres peccadores, tão indigentes de todo 
bem, só temos que tirar no bom thesouro do 
Coração de nosso divino Socio, para pagar 
O S. Cor., reparação nossa 89 
todas as nossas dividas, isto é, tudo quanto 
devemos trazer, por nossa parte, a Commu­
nhão dos Santos. 
Jesús nol-o diz : seu Coração deseja ar­
dentemente servir-nos assim de reparação e 
de supplemento ; é para elle uma viva alegria 
e a sua maior gloria. Tudo o que elle nos 
pede é que recorramos a elle .com um coração 
bem arrependido, sem duvida alguma, mas 
sobretudo com um coração confiante, com um 
coração de amigo. O pesar cheio de compun'c­
ção que lhe exprime Gertrudes comoveu-o e 
elle lhe restitue todas as graças que ella p�r­
deu no dia. Quando a vê humilhar-se dos seus 
defeitos, faz fluir nella a abundancia da sua 
graça para apagai-as, e reveste-a das suas 
proprias virtudes divinas. Essa confiança de 
Gertrudes que não se deixa desconcertar por 
causa alguma, porque ella sabe qu.e Jesús é 
seu amigo e que ella pôde contar com a sua 
misericordia, essa confiança encanta o Co.: 
ração de Jesús, e é a essa disposição que elle 
attribúe todas as misericàrdias de que usa 
para com ella. E como não haveria de ser 
assim ? J esús poderia ficar insensível no seu 
Coração quando o chamamos nosso Amigo, 
nosso Irmão, nosso Esposo ; quando lhe re-
90 g;o dia 
presentamos que elle deu seu sangue para pa­
gar as nossas dividas, e que é justamente esse 
sangue derramado por nos que queremos tor­
nar util fazendo-o servir á nossa Redempção? 
Porquanto tudo isso só tende a tornar 
perfeita a obra da Redempção ,a completar 
em nós o que falta á Paixão de Jesús Christo, 
a consummar-nos nelle, afim de que elle possa 
dizer no fim dos tempos, quanto a si mesmo 
e quanto a seus membros : Consummatum est, 
tudo está consummado. Estamos pois segu­
ros, pedindo assim a Nosso Senhor supprir e 
reparar por nós, estamos seguros de lhe entrar 
no plano, de corresponder-lhe ao desejo, de 
lhe cumprir a vontade. Ora, "nós sabemos 
que si lhe pedirmos alguma causa segundo a 
sua vontade, obtel-a-emos infallivelmente" , 
como nol-o promettem os nossos santos Li­
vros. Aproximemo-nos pois com confiança 
desse Coração tão meigo de Jesús, para obter­
mos delle o soccorro que nos é necessa.rio. 
Elle se comprazerá em tornar as nossas obras 
perfeitas ; completará os nossos trabalhos, se­
gundo a palavra do Espírito-Santo ; concluirá 
em nós mesmos o que falta á sua obra por 
nossa parte. 
Niio sentimos o quanto esta doutrina é 
O S. Cor., reparação nossa 91. 
alentadora, fortificante, enriquecedora ? Oh ! 
corno a devoção ao Sagrado Coração assim 
entendida e praticada pôde elevar-nos rapida­
mente á mais alta perfeição ! Sim, si quizer­
rnos dar a Jesús gloria perfeita segundo o 
l('mrna dos seus amigos : A. M. D. G. ( 1 ) si 
quizermos ser victirnas consurnmadas do seu 
amor, sigamos fie)mente estas praticas : leve­
mos cada dia, a cada hora, as nossas culpas, 
as nossas dividas ao Coração misericordioso 
de Jesús para que cada hora, cada dia seja 
perfeito e consurnrnado pelo seu amor ! Oh ! 
"demos a J esús segundo a Iiberalidadé- do seu 
Coração generoso, corno elle o pedia a Sta. 
Mechtilde ; demos-lhe segundo a sua bondade, 
e não segundo a nossa" ; isto é, tenhamos 
confiança sem limites na sua bondade, afim 
de que, enriquecendo-nos pela sua liberalidade 
e generosidade que sãà sem limites, possamos 
dar-lhe, por nossa vez, com liberalidade e ge­
nerosidade semelhantes. Já que esse bom -Mes­
tre põe á disposição dos seus servos fiéis todos 
os seus talentos com tanta liberalidade, use­
mos destes com confiança generosa para sua 
gloria, queiramos gerir os seus negocias com 
magnificencia, afim de que nada falte aos fru-
( 1 ) Ad muloremDel glorlum - pela maior 
e-lorla de Dem<. 
92 9.'! dia 
tos de consolação que lhe devemos dar, á 
gloria que lhe devemos proporcionar. 
CONCLUSÃO PRATICA. - 1 .0 0 offere­
cimento das nossas faltas ao Sagrado Coraç_ão 
de Jesús, cada dia, a cada exame ,depois de 
cada acção, com grande sentimento de con· 
fiança e de puro amor, dizendo a Jesús como 
elle proprio o inspirava a Sta. Mechtilde : 
"Quero-vos ser perfeitamente fiél ; gosto mais 
e muito mais revêr as minhas faltas repa­
radas por vosso amor do que por mim mes­
ma, supposto que eu o possa, afim de que 
resulte para elle tanto mais honra e gloria" 
2.0 O offerecimento das nossas faltas in­
voluntarías, omissões, etc . , resultantes das oc­
cupações, das distracções, de nossa fraqueza, 
etc . , dizendo a Nosso Senhor como elle Q ins­
pirava a Sta. Mechtilde : "Senhor, quero dar­
vos segundo a liberalidade do vosso Coração 
generpso, segundo a vossa bondade e não se­
gundo a minha. Dignae-vos pois restituir-me 
tudo o que perdi assim involuntariamente, 
afim de que eu vol-o possa dar a vós mesmo 
segundo a vossa liberalidade" 
3 .0 Offerecimento das nossas dividas 
para com Deus, para com Maria, para com a 
Igreja, para com as almas do Purgatorio, para 
O S. Cor., reparação nossa 93 
com os peccadores, para com os agonizantes ; 
para com o cumprimento dos nossos deveres de 
estado, dos nossos diversos empregos, etc. Di­
gamos a Jesús como Sta. Gertrudes : "O' meu 
Irmão, já que vos fizestes homem para pagar 
as dividas dos homens, dignae-vos agora, ro­
go-vos, suppfir á minha indigencia e pagar in­
teiramente todas as minhas dividas" 
DECIMO DIA 
Os caminhos fáceis do amor divino pela de­
voção ao Sagrado Coração, segundo 
Sta. Gertrudes. 
O Coração de Jesús tudo dispoz no livro 
de Sta. Gertrudes para attrahir-nos suavemen­
te a si pela trilha facil do amor. Quando esse 
livro ficou concluído, Jesús mostrou-se a Ger­
trudes segurando-o apertado ao seu Coração 
e lhe disse : "Aperto este Livro ao meu Cora­
ção para lhe penetrar todas as letras da doçura 
do meu amor, e quero que a cada pagina se 
manifeste a imagem da minha bondade toda 
gratúita. 
D'outra vez, como a redactora desse li­
vro, indo á communhão, o levasse escondido 
debaixo do manto para offerecel-o ao Senhor 
�m louvor eterno, no momento em que se 
prostrava perante o corpo de Jesús Christo, 
uma das companheiras · enxergou o Salvador 
que, pelo excesso da sua bondade surprehen-
Canúnho facil do amor divino '9á 
dente, vinha elle proprio ao encontro da Irmã 
assim prostrada e abraçava-a ternamente di­
zendo-lhe : "Sim, quero que todas as palavras 
deste livro que me offereceís ou, antes, que 
meu proprío espírito dictou, fiquem cheias da 
fecundidade do meu amor. Quem quer que, 
vindo a mim com coração contrito e humilha­
do, quizer lêl-as por amor do meu amor, fal­
o-ei repousar; sobre o meu Coração e lhe mos­
trarei, com meu dedo, os pontos que lhe são 
propríos e vantajosos" . 
O livro de Sta. Gertrudes vem pois do 
Coração de Jesús, e leva-nos a elle por uma 
trilha toda de doçura, de bondadé e de amo_r. 
REFLEXÕES. - "E' uma das maravilhas 
da espiritualidade de Sta. Gertrudes tornar 
facil, accessiuel a todos, mais que nenhuma 
outra, a santificação da alma e· a mais alta 
perfeição. Parece, com ella, que é um nego­
cio de todas as horas e de todas as circums­
tancias estarmos unidos a Deus, associarmo­
nos' ás suas obras, aos meritos de Nosso Se­
nhor ; que é bastante para todos o menor mo­
vimento sincero de bôa vontade para adqui­
rir direito aos meritos mais elevados e ás re­
compensas mais gloriosas" . (Traducção dos 
Padres Benedictinos, Pref. XXXIII) . 
96 10.0 dia 
Commentemos este pensamento dos sa­
-bias. .editores de Sta. .Gertrudes : elle. não é 
.mais, ::<:omo se vê, do que o desenvolvimento 
do titulo do capitulo. 
A �spiri.tualidade d� Srp._ Gertrudes póde 
reduzir-se a estes tres meios : o desejo, 'a união, 
o abandono; o desejo da gloria de .
-
O�us a . 
u_nião a Jesús, á sua Paixão, ao seu Çpra�ão. 
aos seus Santos ; o abandono ao bep.eplacito de 
Deus e á sua ProvidenCia. Ora. ha nad� mais 
f.acil para qualquer atina de bôa vontade ? Ha 
nada mais · consolador, mais attrahente, mais 
animador ? Não se 'trata aqui de _grandes mor­
tificações, nem de praticas longas ou difficeis, 
nem de vi'rtudes extraordinarias e sublimes : 
Gertrudes quasi não fala disto. Ella haure 
.essas tres disposições, de desejo, de união, de 
11bandono, no Coração de Jesús, e as leva a 
toda parte. Eis ahi, parece, todo o s�.u segredo 
para amar a Deus, para progredir no amor, 
para se consummar no amor. Possa. essa bôa 
Santa auxiliar-nos a bem lhe appreheitder­
mos o segredo, sobretudo a n_os servirmos 
-bem delle na pratica, para progredirmos á 
imitação della nesses. caminhos fáçeis do amor 
divino, e chegarmos como ella ao termo que 
devemos unicamente desejar ! Seria para nós, 
Caminho facil do amor divino 97 
no nosso trabalhinho, grande alegria, si estas 
reflexões simplissimas pudessem ajudar algu­
ma alma, inda que fôsse uma só, a achar · a 
sua trilha, essa trilha de verdade que devemos 
escolher, essa trilha de dilatação que o nosso 
coração necessita achar para se adiantar a lar­
gos passos no amor divino ( 1 ) . 
Vejamos primeiro quão facil é essa tri­
!ha, ao mesmo tempo que segura. o desejó 
pó de referir-se mais particularmente á oração ; 
a união, á acção ; e o abandono, ao soffrimen­
to ; pos'to que essas tres disposições sejam ne­
cessarias, por alguma parte, a essas tres espe­
cies de obras, para lhes assegurar todo o valor. 
Já falámos nos desejos da oração, dessas alnias 
de desejos que alcançam tudo ; como Daniel 
que, por seus desejos, alcançou a libertação 
do seu povo ; como Maria que, por seus d�­
sejos, fez descer o Salvador á terra. Ora, nada 
ha mais facil do que exercitar-se nessa oração 
( 1 ) Não percamos de vista que se suppõe aqui 
·uma alma de bôa vontade que faz o que póde pela
oração, pela acção e pelo sacrifício, e que procura
um meio, uma trilha para fazer melhor. A nossa
bôa Santa indica essa trilha, trilha simples e facil,
trilha que está ao alcance de todos, trilha que póde
fazer-nos avançar a grandes passos, fazer-nos correr
nos mandamentos e nos çonselhos diviDos. 
98 to.o· dià 
de desejos, apropriando-se dos desejos do Co­
ração de Jesús, com o auxilio de Sta. Gertru­
d�s ? O desejo acha-se ahi expresso sob todas 
as formas mais piedosas e mais variadas : é o 
desejo do louvor, é o desejo do amor, é o de­
sejo do zelo ; é o desejo universal, é o desejo 
perpetuo, é o desejo de todos estendendo-se 
a tudo. Ora, uma só destas formulas tão di­
versas "póde offerecer materia para meditar, 
para rezar, para sustentar a alma por longo 
tempo ,por todo um período da vida " . (Trad. 
Pref. XXXIII. ) Experimentemos, por exem­
plo, tornar-nos familiares as formulas tão 
bellas e tão ricas do livro intitulado Orações 
de Sta. Gertrudes; a alma que se applicar a 
isto por algum tempo tornar-se-á necessaria­
mente uma alma de desejo, á feição de Sta. 
Gertrudes, e os seus desejos pôl-a-ão no ca­
minho duma grande santificação. 
Como meio para santificar as nossas ac­
ções, Sta. Gertrudes propõe-nos mais especial­
mente a união : a união aos meritos de J esús, 
a união com os Santos, a união com nossos 
irmãos. Já vimos precedentemente que valor 
póde dar ás nossas obras a união com o Co­
ração de Jesús. A união com os Santos faz 
igualmente que nos apropriemos dos seus me-
Caminho facil do amor divino 99 
ritos, em virtude deste principio que : "a cari­
dade faz seu o que pertence ao proximo" E 
esta apropriação é mais ou menos perfeita con­
forme a nossa união é mais ou menos intima 
com os seus gloriosos amigos, que nada de­
sejam tanto como communicar-nos os seus 
meritos e abrir-nos os seus thesouros. Enfim, 
a união com nossos irmãos deste mundo faz 
tambem que nos possamos apropriar dos meri­
tos e abrir-nos os seus thesouros. Enmfim, a 
união, com nossos irmãos deste mundo faz 
tambemque nos possamos apropriar dos me­
ritos das suas bôas obras, em virtude do prin­
cipio da communhão dos Santos. E os theólo_­
gos reconhecem que essa participação nos me­
ritos dos nGssos irmãos é proporcionada ao 
gráo de união que temos com elles segundo 
a ordem da caridade, ou por causa duma affei­
ção espiritual particular. 
Em terceiro lugar, nos soffrimentos, o 
abandono, que não se deve comtudo separar 
do desejo e da união, parece ser a disposição 
mais facil, ao mesmo tempo que a mais per­
feita. 
E' o Fiat voluntas tua do Padre-Nosso 
� da agonia de Jesús. Pelo Fiat do Padr(f-Nos-
100 10.• dia 
so, abandono-me plenamente á vontade de 
Deus para que ella se cumpra perfeitamente 
em mim : ora, "a vontade de Deus é a nossa 
santificação" ; é isto portanto o que ha de 
mais santificador. Repetindo o Fiat do Cora­
ção de Jesús na agonia, abandono-me sem 
reserva aos planos de seu Pae celeste para a 
Redempção do mundo. Ora, o desígnio de 
Deus é que todos os homens sejam salvos ; 
coopéro pois, tão perfeitamente quanto está 
em mim, na salvação das almas ; torno-me 
tão perfeitamente quanto possível o corre­
demptor do mundo com o divino Salvador. 
Tudo aqui parece pois poder reduzir-se ao 
abandono. 
Si abordarmos a questão do soffri­
mento voluntario, da mortificação voluntaria, 
não poderemos reduzil-a ao abandono, neste 
sentido que ella se reduzirá a praticar as mor­
tificações que a· vontade de Deus me marcar 
pelo attractivo da graça ( 1 ) ou pelo "contrô­
le" da· obediencia ? E não é esta ainda uma 
pratica dulcíssima, já que eu não progrido 
sinão pelo attractivo da graça ; santíssima, já 
( 1 ) Esta graça póde ser uma bôa palavra, uma 
bôa leitura, tudo o que a Providencia nos envia para 
prevenir e alentar a nossa. bôa vontade. 
http://alexandriacatolica.blogspot.com.br
Caminho facil do amor divino 101 
que eu só procuro cumprir a vontade de Deus 
sobre mim ; seguríssima, já que sou guiado 
em tudo pela regra da obediencia ? 
CONCLUSÃO PRATICA. - (Vêr no fim 
do undecimo dia. ) 
UNDECIMO DIA 
Os caminhos fáceis do amor divino pela de­
voção ao Sagrado Coração, segundo Sta. 
Gertrudes. (Continuação) 
Não é difficil agora fazer vêr que Sta. 
Gertrudes reduz toda a santificação a estes 
tres meios tão faceis e tão animadores : o de­
sejo, a união, o abandono. Já demos varias 
provas disto e teremos ainda ensejo de addu­
zir novas. Por exemplo, a respeito dos de­
sejos, uma alma santa, vendo o quanto Ger­
trudes é amada do Senhor, pergunta Jesús 
pela causa : É, respondeu o Salvador, por causa 
de varias virtudes que eu puz nella; em parti­
cular, por causa dessa caridade que a faz dese­
jar a salvação de todos os homens para mi­
nha gloria, e por causa dessa fidelidade que a 
faz consagrar todos os seus bens sem nenhu­
ma reserva á salvação do universo inteiro" , 
Jesús, para lhe mostrar que se encarrega 
de realizar-lhe e completar-lhe os desejos, fa�-
Caminho facil do amor divino 103 
lhe escrever por uma alma santa estas paiW' 
vras tão animadoras : "Voss'alma dá ao vosso 
Bem-Amado cento por um pelos desejos que 
forma para si mesma e para o proximo. O 
Senhor Jesús suppre á importancia dos vos­
sos desejos; rende a Deus Padre as homena­
gens que lhe quereríeis render por vós mesma 
e pelos outros, e completa nisso o vosso tra­
balho de modo que nada lhe falte" . Vemos 
por este modo como a alma de desejos póde 
vêr os seus desejos realizados pelo Coração 
de Jesús não só com relação á sua santifica­
ção pessoal , mas ainda nos votos que o seu 
zelo a faz formular pela Igreja e pela salva-
ção das almas. 
· 
Bem sei que nos não podemos apropriar 
dos favores especialíssimos concedidos a Sta. 
Gertrudes sinão em proporção das nossas dis­
posições ; mas é justamente destas disposições 
que se trata neste capitulo, e quanto mai� 
perfeitas fôrem em nós as disposições que 
nelle recommendamos, resultado tanto mais 
semelhante ao da nossa S-anta conseguiremos. 
A respeito da união, já vimos como Ger­
trudes se apropria por ella dos meritos de 
Jesús. Apropria-se igualmente dos 4os San­
tos ; "Um dia em que d�VÍ<l çomro,ungar (I, 
104 ll.o dia 
�49 ) achando-se pouco preparada, pediu á 
6emaventurada Virgem e a todos os Santos 
que offerecessem por ella a Deus todas as 
bôas disposições que haviam applicado em re­
ceber-lhe as graças. Pediu tambem a Nossa 
Senhor que offerecesse por ella aquella dis­
posição perfeita que tivera no dia da Ascen­
ção, para comparecer perante seu Pae. Depois, 
passado algum tempo, como procurasse com­
prehender o que havia ganho com esse pedido. 
J esús lhe disse : "Ganhaste appareceres aos 
olhos dos habitantes do céo com todos os me­
ritos que pediste" . E o Senhor accrescentou : 
"Porque desconfiarias de mim que sou o Se­
nhor todo poderoso e todo bemfazejo? Não 
posso eu fazer o que faz um amigo na terra 
quando reveste o amigo dos seus proprios or­
namentos para fazel-o apparecer com a mesma 
pompa com que brilha elle proprio?" 
Do mesmo modo tambem, apropriava-se 
ella dos meritos do proximo. Um dia em que 
suas Irmãs tinham feito exercícios particula­
res pelas almas do purgatorio, Jesús lhe disse : 
"Es tú, que me darás para augmentar as mi­
nhas liberalidades para com aquellas almas 
padecentes?" - Gertrudes respondeu : "Of­
fereço-vos . todo o bem díls rninhíls Irmã� de 
Caminho facil do amor divino 105 
que me aproprio inteiramente em virtude da 
união que me haveis dado com ellas por vossa 
caridade" . E Jesús lhe fez comprehender que 
tinha acceito plenamente o seu offerecimento. 
Emfim, a respeito do soffrimento, é so­
bretudo a disposição do abandono que J esús 
pede de Sta. Gertrudes. Quer que ella "ache 
amaveis" as disposições mais crucificantes da 
sua Providencia ; quer que Gertrudes o deixe 
achar seu repouso nas fadigas que elle lhe en­
via ; que se abandone a elle pelas molestias, 
pelas perseguições, pelas provações interiores, 
por todos os soffrimentos numa palavra . Mas 
tambem, si Gertrudes pede expressamente para 
soffrer mais, Jesús lhe indica que a disposição 
que mais deseja della é o abandono ao seu 
beneplacito a esse respeito, de modo a que 
ella nada escolha por si mesma, nem consôlo, 
nem soffrimento, mas esteja abandonada in­
teiramente ao beneplacito divino quanto a 
pena ou quanto ao allivio ; quanto á dôr ou 
quanto á alegria. 
Ora, essas disposições altamente santifi­
cadoras Gertrudes as havia haurido no Cora­
ção de Jesús. O Coração de Jesús, já o disse­
mos, é todo desejo; é tambem o centro da 
união e o lugar c;le repouso çlo �bandono. E' 
106 1 1.• dia 
o Coração de Jesús que nos deve communi­
car todos os sentimentos que nos santificam 
as obras, hoc sentite; é o Coração de Jesús 
que nos une com nossos irmãos, como o co­
ração humano une os - -diversos membros do 
corpo entre si, fazendo circular a vida de um 
a outro, e fazendo servir ao' bem de todos os 
recursos vitaes que cada um delles fornece. 
Especialmente na sagrada Communhão, que 
é o Sacramento da unidade ( 1) , o Coração 
de Jesús nos une comsigo e entre nós, e si 
nos dérmos plenamente a esta união, pode­
mos por ella apropriar-nos dos diversos bens 
dos Santos e de nossos irmãos da terra. 
Finalmente, os sentimentos do Coração 
de Jesús a respeito do soffrimento podem re­
duzir-se ao abandono : o abandono por amor, 
o abandono filial, o abandono completo. E' 
o abandono por amor que o faz dizer ao en­
trar no mundo : "Eis-me aqui, ó meu Deus, 
para me immolar em lugar das antigas vic­
timas, segundo a vossa vontade; a vossa von­
tade reina no meio do meu coração e será toda 
a min·ha lei" . E' o abandono filial que o faz 
dizer no horto da agonia : "Faça-se a vossa 
( 1 ) Sacramentum un#aees eçclt!.riasticcr (S. 
Thomaz) , 
Caminho facil do amor divino 107 
vontade, ó meu Pae, e não a minha, em toda 
essa Paixão tão dolorosa que se desenróla di­
ante de mim! E' o abandono completo que o 
faz dizer na Cruz, no termo do seu sacrifí­
cio : "Meu Pae, tudo está consummado; nas 
vossas mãos entregoa minh'alma; disponde 
de todos os meus soffrimentos e de mim mes­
mo todo, segundo os vossos desígnios e para 
a consummação da vossa obra" . 
CONCLUSÃO PRATICA. - Reduz-se aos 
tres pontos principaes que indicámos nàs re­
flexões. 
DUODECIMO DIA 
A uida de amizade com o Coração ,de Jesús 
segundo Santa Gertrudes. 
Um dia, Nosso Senhor mostrou a Sta. 
Mechtilde sua irmã Gertrudes que parecia pra­
ticar todos os seus actos em presença de Jesús, 
volvendo com frequencia os olhares ao sem­
blante amabilíssimo do Salvador, e achando 
toda luz e toda graça na conversação da sua 
amizade. Admirando Mechtilde esse especta­
culo; disse-lhe o Senhor: "A minha eleita, 
como uês, uiue sempre commigo e só procura 
fazer o beneplacito do meu Coração. Mal co­
nheceu a minha uontade sobre um ponto, 
logo a executa com solicitude, e procura em 
seguida saber os meus outros desejos, afim de 
satisfazel-os sem tardança. Assim toda a sua 
uida passa-se em amar-me e em me agradar 
na amizade mais perfeita" . 
REFLEXÕES. - E' só o amor que torna 
os caminhos fáceis. Viver com Jesús em re-
Amizade com o S. Cor. 109 
lações de amigo, é o meio de dilatar o nosso 
coração para podermos correr na trilha dos 
mandamentos ; foi a vida de Sta. Gertrudes, 
e ·é o grande ensinamento do seu l ivro ; é em­
fim o desejo mais caro do Coração de Jesús 
e a mais dôce consolação que lhe possamos 
proporcionar. 
Em que consiste essa vida de amizade 
com Jesús ? "A amizade, consiste num amor 
mútuo fundado numa communicação de 
bens" . Importa, pois, em primeiro lugar re­
tribuir ao Coração de Jesús amor com amor. 
O' Jesús ! o vosso Coração, bem o vejo, ama­
me de todas as formas. Esse Coração é cop.­
sumido pelo amor. Quereis que elle nos seja 
representado corôado de chammas para nos 
mostrar que é um incendio de amor. E' tão 
grande o vosso amor a mim, apesar das mi­
nhas infidelidades, que, si eu tivesse siquer 
uma parcella desse amor no meu coração, este 
rebentaria immediatamente. E eu tambem vos 
amo, dou-me todo a vós, que sois todo amor ; 
para sempre, sem receio, sem reserva, abando­
no-me ao vosso amor. Que poderia eu temer ? 
A minha confiança, fortalecida por este pen­
samento de que sois meu amigo, será dora­
vante inabalavel. Esperarei tudo de nieu ami-
110 12.o dia 
go, sabendo que a sua riqueza e o seu poder 
lhe igualam a bondade. Por mais fraco que 
eu seja, tornar-me-ei de alguma sorte omni­
potente, pois tudo posso em vosso amor que 
m:e fortifica. 
Eis ahi a amizade mútua. Funda-se, 
dissemos, numa communidade de bens. Jesús 
deu-me tudo e eu lhe dou tudo : "Tudo o que 
tenho é teu, disse-me elle, omnia mea tua 
sunt" . Cumpre que possa dizer tambem : 
Tudo o que tens é meu. Et tua mea sunt. 
Deu-me a sua vida, os seus trabalhos, os seus 
merecimentos, o seu sangue, o seu Coração 
divino ; dá-me seu corpo, sua alma, sua divin­
dade ; quer dar-me a sua gloria, a sua felicida­
de, a sua eternidade. Cumpre que eu lhe dê 
tambem a minha vida em todas as suas mi­
núcias, o meu coração. com todos os seus af­
fectos, minh'alma com todas as suas poten­
cias, a mim mesmo e tudo o que é meu, pelo 
tempo e pela eternidade. A troca deve ser 
completa . E não tenho tudo a ganhar nisso ? 
Sim, Senhor, tomae tudo e dae tudo. T omae 
todas as minhas miserias, visto que verda­
deiramente só tenho isto que· seja meu, e 
depois dae-me os vossos bens na medida em 
que o quizerdes, para me tornardes semelhan-
Amizade com o S. Cor. 111 
te a vós, amavel e amante como vós, afim de 
que o vosso Coração possa regozijar-se em me 
amar tanto quanto deseja, e em se vêr amado 
por mim tanto quanto tem o direito de es­
perai-o ! 
E' mistér em seguida, na amizade, se­
gundo o doutor angelica, para que seja per­
feita, que o amigo ponha toda a sua ventura 
em viver com o seu amigo : Convivit ei delec­
tabili{er. Jesús cumpre tão bem esta condição 
da amizade ! Põe todas as suas delicias em 
viver com os filhos dos homens ; quer estar 
comnosco até a consummação dos seculos. 
Fixou "os olhos e o seu Coração no meio qe 
nos Está sempre vivo nos nossos taberna­
cuJos para ser o companheiro da nossa vida. 
O' Senhor, ponha eu toda felicidade em vos 
fazer companhia I Só desejo uma cousa e pe­
dil-a-ei incessantemente ao vosso a�or : é ha­
bitar sempre- ao pé de vós pelo corpo ou ao 
menos pelo coração, vêr sempre a vossa bel­
leza e a vossa gloria eucharistica, alimentar­
me sempre do vosso amor, passar os dias e 
as noites, emquanto o quizerdes, em vos bem­
dizer, em vos contemplar, em vos amar ! 
Uma ultima condição da amizade é par­
rilbar pela sympathia mais completa todos os 
112 12.0 dia 
prazeres e todas as afflicções daquelle a quem 
amamos; fazer um só coração com elle : Con­
cordat cum ipso. Jesús cumpriu admiravel­
mente esta condição. Tomou o nosso cora­
ção de carne, fez um só coração comnosco ; 
esposou todos os interesses da humanidade 
fazendo-se homem ; tomou sobre si toda as 
nossas dôres ; sente por sympathia, mais vi­
vamente que nós proprios, todos as nossas 
alegrias. Oh ! assim seja igualmente para mim, 
Senhor ! Só quero sentir pelos vossos senti­
mentos, quero que haja entre a vossa vontade 
e a minha, não sómente a união, porém, a 
unidade ! O' Jesús ! seja o vosso Coração o 
meu coração ! Sejam as vossas dôres as minhas 
dôres, e as vossas alegrias as minhas alegrias ! 
O' amizade ! ó união! ó unidade ! Saia eu 
inteiramente de mim mesmo para viver todo 
em Jesús : elle é o meu centro, é o meu tudo ! 
O' Jesús, vós em mim e eu em vós ! Fazei 
que fiquemos sempre amigos, assim agora 
como na eternidade ! 
Esta vida de amizade foi bem toda a 
vida de Gertrudes, e em todo o seu Livro o 
Coração de Jesús só procura attrahir-nos a 
essa vida. Um dia, fazendo Gertrudes a lei­
tura publica sobre este mandamento : "Ama-
Amizade com o S. Cor. 113 
reis o Senhor de todo o vosso coração, de 
toda a vossa alma e com todas as vossas for­
ças" , uma das Irmãs, commovida com o ac­
cento de amor que ella punha nisso, disse ao 
Senhor : "Ah ! meu Deus ! quanto vos ama 
Gertrudes, que nos ensina com tanto ardor 
que é preciso amar-vos ! " E o Senhor respon­
deu-lhe : "Desde a sua infancia eduquei-a para 
a minha amizade e conservei-a pura até o dia 
em que e/la se uniu a mim por sua plena von­
tade; ehtão, dei-me todo a e/la . e agora é 
com toda sorte de delicias que Lhe repouso no 
coração. O amor uniu-a inseparavelmente a 
mim, assim como o 'fogo une o ouro á pra.ta 
para compôr com eiles uma Liga preciosa" 
Gertrudes · deu tudo a Jesús, que póde 
dizer della com complacencia : "Deu-me to­
dos os seus bens se� reserva alguma pela
salvação do universo.; ; e Jesús, por sua vez,
lhe dá tudo : o seu Coração divino, que se 
torna o coração de Gertrudes ; as suas cha­
gas sagradas, que imprime nella ; os seus mere­
cimentos, que ella emprega a seu grado ; a sua 
omnipotencia, de que póde dispôr como so­
berana. 
Toda a vida de Gertrudes passa-se sob o 
olhar de Jesús ; como vimos ao começar, só 
114 12,o dia 
nelle acha ella prazer : "Não posso achar na 
terra em que me compraza, diz ella a Jesús, 
sinão vós só, ó meu Senhor, cheio de do­
çura" , E Jesús lhe responde : "E eu não acho 
no céo nem na terra delícia alguma sem ti, 
porque te associo pelo amor a todas as mi­
nhas alegrias, de forma que não gozo de ne­
nhuma doçura que não desfrute comtigo, e 
quanto mais doçura ha para mim, tanto mais 
fruto ha para ti". 
Eis como o coração de Gertrudes torna­
se para Jesús uma morada agradavel onde 
elle acha as suas delicias, onde gosta de re­
pousar de dia como de 'noite. Por isto J esús 
lhe deu o seu divino Coração de maneira toda 
particular, e ha unidade de coração entre 
ambos, na sympathia mais completa. 
Essa vida de amizade, dissemos, é o que 
o Coração de Jesús mais deseja de nós. Jesús 
abriu-nos o seu Coração para isso, quer dora­
vante chamar-nos seus amigos. Posta-se á 
porta do nosso coração, e bate : "Meu filho, 
dá-me o teu coração" Solicita-nos com ter­
nura infinita ; tem necessidade donosso amor 
para contentar o seu amor ; póde-se dizer que 
elle mendiga a nossa amizade. Oh ! demos­
lhe o que elle deseja ! Vivamos com elle dessa 
Amizade com o S. Cor. 115 
vida de amizade que é tão gloriosa para Deus, 
visto que lhe faz triumphar o poder e exalta 
a misericordia ; ella é, ao mesmo tempo, tão 
dôce e tão frutuosa para as nossas almas, e 
dá-nos tanto credito para alcançarmos graças 
para nossos irmãos : " Uma só alma querida 
de Deus, diziam os Anjos a Sta. Gertrudes, 
tem mais poder sobre o divino Coração do 
que mil e mil outras, para obter a conversão 
dos vivos e o livramento dos mortos!" 
CONCLUSÃO PRATICA. - 1 .0 Nas nos­
sas orações, falemos a Jesús como a um ami­
go : Amice, commod.a mihi tres panes . Ecce 
quem amas, e estaremos no direito de tudo 
esperar da sua amizade ; ab amicis maxime 
speramus. (S. · Thomaz) 
2.0 Quanto ás nossas acções, façamol-as 
todas para o serviço de Jesús, nosso amigo, 
com o pensamento de que no proximo é a elle 
que servimos : mihi fecistis. 
3 .0 Nas nossas penas emfim, pensemos 
que fazemos companhia a Jesús, nosso ami­
go ; que a Cruz é o dom do seu amor e a 
prova do nosso : a sua amizade suavizará, 
ennobrecerá, santificará todas as nossas penas. 
DECIMO TERÇEIRO DIA 
V ida de abandono confiante ao Coração de 
Jesús 
Fazemos um capitulo particular para a 
V ida de abandono ao Sagrado Coração de 
Jesús como para a Vida de desejos, porque o 
abandono é, ouso dizel-o, a virtude principal 
dos amigos do Sagrado Coração, é a forma 
especial da espiritualidade de Sta. Gertrudes 
( 1) , e é a pratica que Nosso Senhor , mais 
parece pedir das almas fraquissimas do nosso 
seculo. Pelo abandono abre-lhes elle uma 
uma porta para fazel-as entrar na sua omni­
potencia ; abre-lhes os thesourós do seu Cora­
ção, que se encaqega de supprir todas as fa-
( 1 ) O oração de Jesús, dizem os PP. Benedi­
ctinos, traductores de Sta. Gertrudes (Pref. p. XXI ) , 
"revéla a Sta. Gertrudes a sua misericordia infinita 
e inspira-lhe uma confiança sem limites, que é como 
um dom especial, uma forma da espiritualidade Ger­
trudiana. ". 
Abandono ao S. Cor. 117 
lhas da alma abandonada e dar-lhe comple­
mento a todas as obras ; faz dellas instrumen­
tos dóceis que de modo algum incommodarão 
a acção exclusiva de Deus, e que deixarão 
fielmente a Deus á gloria de tudo. 
Oh ! possamos nós, por effeito das ora­
ções de Sta. Gertrudes, por effeito da graça 
especial promettida aos amigos do Sagrado 
Coração, possamos sentir vivamente essa ter­
nura infinita do Coração de Jesús que nos so­
licita á confiança ! Possamos sem temor, sem 
reserva, de vez, abandonar-nos amorosamen­
te áquelle que quer ser o nosso poder, a nossa 
sabedoria e o nosso amor ! 
Pr-incípios do abandono confiante ( 1 ) 
ao Sagrado Coração de Jesús 
Meditemos primeiro os princípios que 
Nosso Senhor inculca. a este respeito, á Dis-
( 1 ) Não se póde tratar aqui sinão da confian­
ça inspirada pela graça e medida pela vontade de 
Deus. Lembremo-nos tambem de que a ef ficacia at­
tribuida á confiança, como ao desejo ou á união, não 
se deve entender de maneira absoluta, mas apenas de 
maneira proporcionada a essas disposições e á nossa 
cooperação. Longe de nós qualquer illusã9 pres4m­
pçosa I 
118 13.• dia 
cipula dilecta do seu Coração. Pode-se reduzil­
os a dois : 
1 .0 PRINCIPIO : Só a confiança pôde fa­
cilmente obter tudo. A confiança foi para Sta. 
Gertrudes o prinéipio de todas as graças : 
"Ella attribuia só á confiança todas as graças 
que havia recebido" Por isto convida os 
amigos do Coração de Jesús a pôrem nelle 
uma confiança sem limites para receberem 
delle graçils sem limites. ( I. 1 O . ) 
Um dia em que ella pedia a Nosso Se­
nhor a salvação de numero prodigioso d'almas 
peccadoras, não ousando dizer d'almas em es­
tado de reprovação, o Salvador fez-lhe pri­
meiro meiga censura de que, pondo limites 
á sua confiança, ella os punha tambem á mise­
ricordia divina ; depois, quando ella formulou 
a sua prece segundo a misericordia sem limi­
tes do Coração de Jesús, como perguntasse 
o que devia fazer para alcançar essa graça 
prodigiosa, Nosso Senhor respondeu-lhe : "Só 
a confiança pôde facilmente conseguir tudo" 
E concedeu tudo o que a confiança de Gertru­
des tinha esperado da sua bondade ( 1 ) . 
(III. 9 . ) 
( 1 ) · Outro traço frisante : Sta. Gertrudes attri­
búe do mesmo moclo 4 confiança prodigiosa <!e S. 
Abandono ao S. Cor. 119 
"E' impossível, repete varias vezes Sta. 
Mechtilde, é impossível que o homem não 
obtenha tudo quanto tiver acreditado e es­
perado obter" . - "E' por isto, accrescenta N. 
Senhor ao lhe inculcar esse principio (S. M. 
239) , que me causa grande prazer que os ho­
mens esperem de mim grandes cousas, e con­
ceder-lh'as-ei sempre além da sua especta­
tiva" (2 ) . 
2.0 PRINCIPIO : Pelo abandono confiante 
a alma merece que Je�ús suppra a tudo por 
ella. - "Não me crês bastante rico, dizia 
N. Senhor a Sta. Mechtilde, para poder pagar 
João, o discipiulo dilecto do Sagrado Coração, ·as 
graças prodigiosas que elle -recebeu do seu divino 
amigo, e em particular a de ter sido chamado a elle 
sem sentir os horrores da morte e de vêr já o seu 
corpo virginal introduzido na gloria do céo. A Santa• 
attribuia primeiro esses favores á virgindade de S. 
João e ao martyrio de compaixão que elle soffreu 
ao pé da Cruz ; mas J esús-Christo lhe disse que Ih' os 
havia concedido para recompensar essa· confiança se­
gura com que elle os havia esperado da sua ternura 
«sem limites". O amor- que lhe havia inspiardo essa 
Santa Audacia mereceu vêr-se coroado de exito. 
(2) Nosso Senhor accrescenta : " Aquelle que 
tiver para commigo essa confiança de amigo, dar-lhe­
ei um coração agradecido, um coração amante, um 
coração cheio do meu louvor divino". Que . promessa 
gradosa e çonsol�dor� J 
120 13.• dia 
todas as tuas divr'das? - Sim, Senhor, tenho 
confian.ça em vós para tudo. - Eis então que 
offereço a Deus meu Pae os ánnos da minha 
infancia para supprir o que não podia fazer 
nos teus primeiros annos; os trabalhos da 
minha adolescencia pelas n�ligencias da tua 
juventude; os meus ultimas annos e a minha 
Paixão pelas faltas e omissões de toda a tua 
vida : deste modo, quero que tua vida inteira 
receba em mim e por mim o seu supplemento 
e perfeição" (I. 3 1 ) . 
Eis ahi o commentario mais tocante 
desta palavra dos nossos santos Livros : Com­
.plevit labores illíus. _O' ternura, ó liberalida­
de do Coração de Jesús, nosso amigo. Quer 
completar por si mesmo as nossas obras e dar 
á nossa vida a ultima perfeição. Deseja-o ar­
dentemente, e será para elle viva alegria, pois 
ahi se acham o triumpho do seu amor e a 
gloria da sua misericordia. A unica cousa que 
elle pede de nós, para esse fim, é confiarmos 
nelle, abandonarmo-nos á sua bondade e dei­
xarmol --o fazer. Oh ! sim, agora e sempre, em 
tudo e por tudo, confiança e abandono ao 
Coração de Jesús, para que elle se digne re­
matar a nossa tarefa e tornar plena e perfeita 
Abandono ao S. Cor. 121 
a medida d,e gloria e de consolação que es­
perava de nós ! 
Tres lições do Coração de Jesús a Sta Ger­
trudes a respeito do abandono confiante. 
1 °. ·"Um dia em que Sta. Gertrudes, na 
oração, se sentia muito abatida e desalentada, 
Nosso Senhor inspirou-lhe por sua rnisericor­
dia grande confiança no seu divino Coração, 
e, convidando-a a se apresentar perante elle 
corno Esther perante Assuéro, dirigiu-lhe es­
tas palavras : "Que ordenas, minha Sobera­
na?" - A Santa respondeu : "Peço, Senhor, 
que a vossa vontade amabilíssima se cumpra 
plenamente em mim" Então o Salvador, no­
meando-lhe uma após outra as pessôas que 
se haviam recomrnendado ás orações della, 
disse-lhe : Que pedes para esta alma, e para 
est�outra, e para est'outra mais, que reclamam 
mais especialmente as tuas orações? - Ger­
trudes respondeu : "Peço unicamente ,Senhor, 
que a vossa vontade se cumpra perfeitamente 
nellas. Todos os meus desejos e todas as mi­
nhas d�licias são vêr o vossobeneplacito ple­
namente satisfeito. em m!im e em -todas as 
vossas creaturas" - "Meu Cora�ãÓ, con-
122 13.• dia 
tinuou Jesús, sensibiliza-se tanto com esse 
abandono confiante do teu coração á minha 
vontade :tanta, que elle proprio quer supprir 
a tudo o que pudesse ter faltado na tua vida 
precedente a essa disposição, e te amará dora­
.vante como si toda a tua vida tivesse sido per­
feitamente �onforme �o meu beneplacito" . 
(III, 1 1 ) . 
Nós tambem, não desejemos sinão o 
cumprimento da vontade de Deus, em nós 
proprios como nos outros, nos nossos nego­
cios particulares e nos negocias da Igreja, 
quanto ás nossas obras de zelo e para tudo o 
que podemos ter a peito. Esperemos com 
confiança alcançar, pela nossa fidelidade no 
abandono, misericordia semelhante á que Sta. 
Gertrudes alcança do Coração de J esús, a 
saber, que elle proprio se digne reparar tudo 
quanto nos faltou até aqui a esse respeito, de 
sorte que acceite todas as nossas preces passa­
das como vi tivessem sido inteiramente con­
formes á sua santa vontade, todas as nossas 
acções passadas como si tivessem sido feitas 
unicamentue para realizar o seu beneplacito, 
todas as nossas penas passadas como si tives­
sem sido acceita com perfeil:íl resignação. 
2°, "Uma noite em que Genrudes sof-
Abandono ao S. Cor, 123 
fria, com febre, mais que de costume, inquieta­
va-se com saber si o seu mal ia peorar ou 
diminuir. E o Senhor Jesús mostrou-se-lhe a 
ella trazendo na mão direita a saúde e na es­
querda a molestia. Apresentava-lhe as duas 
mãos para que ella escolhessse o que prefe­
risse. Ella porém, afastando ambas as mãos do 
Salvador, inclinou-se-lhe para o Coração dul­
císsimo, em o qual sabia que reside a pleni­
tude de todo bem, e respondeu : "Senhor, não 
escolho nada, não quero sinão o beneplacito 
do vosso Coração" . Jesus 'então, fazendo 
jorraJ;_ do seu Coração como que uma fonte 
de graças, · fêl-a manar diante do coração de 
Gertrudes dizendo : "Já que renuncías á tua 
vontade propria para te abandonares inteira­
mente á minha, derramo em ti. toda a alegria 
do meu Coração divino" . (III, 5 3 ) . 
Que exemplo instructivo e animador ! 
Não escolhamos nada, não peçamos nada : 
abandonemo-nos com toda confiança á von­
tade sapientissima e boníssima do nosso uni­
co amigo ; elle escolherá para nós o que ha de 
melhor, e innundar-nos-á ao mesmo tempo 
da dôce alegria do seu Coração, pois não 
póde haver alegria maior para a creatura do 
que servir ao beneplacito do seu Creaoor, ser 
124 13." dia 
dirigida pela sua vontade amabilíssima e des­
cansar de tudo na sua Providencia boníssima. 
3°. "Um anno, pela festa da Circumci­
são, Gertrudes pedia ao Senhor alviçaras es­
pirituaes para as pessôas da sua Cornmunida­
de ; Jesús respondeu-lhe : "Si alguem quizer 
renunciar generosamente á sua vontade pro­
pria, para só procurar em tudo o meu bel­
prazer, o meu divino Coração illuminal-o-á 
de viva luz para conhecer as minhas vontades. 
Far-lhe-ei vêr em que foi que elle faltou á 
Regra, que é a expressão da minha vontade, 
e repararei com elle todas as suas faltas. Como 
um mestre benevolente que instrúe uma cri­
ança ternamente amada, fal-o-ei repousar no 
meu Coração, e mostrar-lhe-ei dôcemente as 
faltas que commetteu. Corrigirei assim com 
bondade o que elle fez mal, e supprirei o que 
descurou. E si, como uma criança distrahida, 
elle passar sobre varios pontos sem prestar at­
tenção, prestar-lhes-ei attenção por elle e sup­
prirei o que tiver omittido. Eis o presente mais 
glorioso para mim que eu possa dar a essas 
alriws, a saber, o desejo de me agradarem em 
tudo, e o abandono confiante ao meu divino 
Coração. F:ar-lhes-ei achar, com a reparação 
de todas as suas faltas do anno decorrido, a lu;z 
Abandono ao S. Cor. 125 
e a força para se conformarem plenamente de 
_então por diante com a minha vontade" 
(IV, 5 ) .
Appliquemo-nos este ensinamento tão 
luminoso e tão consolador, só desejando o 
bel-prazer do Coração de Jesús, peçamos-lhe 
com confiança que repare tudo por nós, as 
nossas faltas e negligencias, e omissões. Pelo 
abandono confiante poderemos obter assim 
que todos os nossos annos de Religião tenham 
o mesmo valor delle que se tivessemos obser­
vado perfeitamente a Regra, visto que elle 
supprirá misericordiosmente a tudo o que nos 
falta. 
E a mesma causa póde dizer-se de q�àl­
quer tarefa que nos é designada pela sua pro­
videncia e que desejamos cumprir perfeita­
mente. O melhor meio para chegar a isso 
será sempre o abandono confiante á sua mi­
sericordia. 
CONCLUSÃO PRATICA. - (Vêr no fim 
do decimo quarto dia) . 
DECIMO QUARTO DIA 
Vida de abandono confiante ao Coração de 
J esús. (continuação) 
Frutos admiraveis do abandono ao Sa­
grado Coração de Jesús. - Pelo abandono 
confiante ao Coração de J esús, merecemos : 
1 .0 que elle pague todas as nossas dividas 
quanto ao passado ; 2. o que compléte os nossos 
trabalhos quanto ao presente ; 3 .0 que nos pre­
pare para o futuro uma abundancia sempre 
crescente de graças para a gloria de seu Pae 
e para a salvação das almas. 
1 . o Nós temos tres dividas a saldar : di­
vida de reparação por todas as nossas culpas ; 
divida de gratidão pelas graças recebidas ; di­
vida de caridade para com Deus e para com 
os homens, segundo esta palavra de S. Paulo : 
Nemini quidquam debeatis nisi ut inviçem 
diligatis (Rom. , XIII, 8 ) , isto é, comple­
mento da somma de bem que devemos fazer 
a Deus e a nossos irmãos. 
Abandono ao S. Cor. 127 
A divida de reparação, si appellarrnos 
para elle, N. Senhor quer pagai-a dos the­
souros do seu coração, corno vimos preceden­
temente. A divida de gratidão, que Sta. Ger­
trudes fazia tanta questãc- de pagar integral­
mente corno se póde vêr em tantos pontos 
em que ella chama em seu auxilio a gratidão 
de · todas as creaturas, de todos aquelles espe­
cialmente que lêrern o seu livro por toda a 
continuação dos tempos ; esta divida, Jesús 
paga-a inteiramente por nós pelas acções de 
graças do seu Coração eucharistico, corno o 
fez Sta. Gertrudes em particular, a respeitá 
da sua divida para com Maria. 
Ernfirn, a divida de caridade, Nosso Se­
nhor pagai-a-á igualmente tirando do bom 
thesouro do seu Coração riquezas antigas e 
novas, isto é, os . seus merecimentos e os da 
sua Igreja no Antigo e novo Testamento, 
que cobrirão largamente todo o orçamento 
que tínhamos que fornecer para o seu ser­
vtço. 
2.0 No tocante ao presente, orações, ac­
ções e sacrifícios, Jesús completai-o-á de modo 
que nada falte, especialmente em ralação aos 
seis pontos seguintes, que elle preencherá por 
128 14.o dia
nós como as seis urnas de Caná usque ad sum­
mum. 
Nossas faltas. Como mostrou a Sta. Ger­
trudes, cobre-as elle pelos rneritos da sua 
santa vida ; fal-as servir ao nosso adianta­
mento pela pratica da humildade, pelos es­
forços que fizermos para nos corrigirmos ; 
quer fazel-as servir de modo adrniravel á glo­
ria e consolação do seu Coração, nol-as fa­
zendo reparar com intenção uniuersal por to­
das as faltas de nossos irmãos. Offereçarnos-lhe 
essas faltas com um abandono cheio de con­
fiança, para .que elle as utilize segundo os 
desígnios da sua misericordia. Mesmo porque 
elle as encara de alguma sorte corno sendo 
as suas proprias faltas : Verba ·delictorum 
meorum, já que não fazemos sinão urna só 
cousa com elle, e se encarrega de tirar dellas 
grandissisirnos bens, segundo a esperança que 
tivermos posto nelle : mísericordia quemadmo­
dum sperauimus. 
Nossos defeitos. Sta. Gertrudes (I, 20) 
conjurara urna de suas Irmãs a rogar ao Se­
nhor que lhe corrigisse os defeitos. A Irmã 
receebu de Nosso Senhor esta resposta : "Do 
mesmo modo que um campo coberto de es­
trume não fica com isso sinão mais fertil, 
Abandono ao S. Cor. 129 
assim o conhecimento que Gertrudes tem dos 
seus defeitos fal-a dar frutos de graças muito 
mais saborosos. Demais, cubro-os pela abun­
dancia dos meus dons e como o tempo os 
transformarei em outras tantas virtudes" . 
O Coração de J esús quer fazero mesmo 
a respeito de todos os seus amigos. Elle é 
bastante cuidadoso dos seus interesses e dos da 
sua Igreja, aos quaes os nossos defeitos nos 
parecem prejudicar ; deixemo! -o fazer : elle re­
parará tudo. Huilltilhemo-nos sómente, a cada 
vez que sentirmos os nossos defeitos, traba­
lhemos fiélmente por corrigir-nos, e depois 
della qualquer damno, e pouco a pouco, si 
o deixarmos agir, transformai-os-á em vir­
tudes. Mas é mister deixál-o fazer, lembre­
mo-nos bem. As nossas perturbações, as nos­
sas agitações, os nossos despeitos talvez e as 
nossas impaciencia:s contra nós mesmos sus­
tam o trabalho da sua misericordia e fazem­
nos muito mais mal do que os nossos pro­
prios defeitos. Abandono e confiança ! Dei­
xemos fazer, deixemos fazer ! 
Nossas negligencias. Vimos em varias 
pontos como Jesús se · incumbe de reparar to­
das as nossas negligencias no louvor, no amor, 
no zelo, etc . , em proporção da nossa con-
130 14.o dia 
fiança nelle, e já meditámos esta palavra tão 
consoladora do Salvador a Sta. Mechtilde 
"Prefére, e muito, que a· meu,. amor repare 
a.; tuas negligencias antes que tú mesma, afim 
de que elle tenha toda a honra e toda a gloria" 
N assas omissões. O bom Mestre ensi­
nou-nos mais acima como quer supppril-as. 
Nossas impotencias. Recordemos, a este 
respeito, a recommendação de Nosso Senhor 
a Sra. Gertrudes : "Dou-te o meu Coração 
para supprir a todas as tuas impotencias . 
Usa do meu Coração, e tuas obras encantarão 
o olhar e o ouvido da divindade" 
Nossas inutilidades. Não ha nem siquer 
o tempo do nosso sonho, nem os nossos an­
nos passados, si lh'os offerecermos tom con­
fiança, applicando-lhes os merecimentos de 
sua vida, como tambem o vimos mais acima. 
Em resumo, Jesús toma cuidado todo 
paternal dos nossos interesses, que fazem uma 
causa s6 como os seus. Láncemos todos os 
nossos cuidados no seu divino Coração, e elle 
se incumbirá de tudo. Deixemol-o fazer, e 
nada nos faltará. Abandonemo-nos com toda 
confiança á sua providencia sapientissima e 
boníssima, e elle tudo fará servir á realização 
Abandonô ao S. Cor. 131 
deis seus desígnios tão misericordiosos sobre 
nós. 
3.° Finalmente, , quánto ao futuro, si 
fôrmos inteiramente abandonados a N. Se­
nhor, de modo que elle possa fazer de nós o 
que quizer para o cumprimento dos seus de­
sígnios, elle fará em nós prodígios de graça 
afim de se indemnizar de tantos corações que 
se fecham aos seus dons, que atam os braços 
da sua misericordia. Porque elle é por essencia 
o bem ·aiffusivo de si proprio. O seu amor
precisa amar ; a sua bondade precisa dar. 
Confiemos, abandonemo-nos, e 6 seu amor 
irá sempre . crescendo para comnosco, a · sua li7
beralidade augmentará cada dia a nosso res­
peito até que elle nos possa corôar na sua mi­
sericordia. 
CONCLUSÃO PRATICA. - S. Thomaz : 
"Fiducia est spes roborata ex aliqua convic­
tione v. g. Deum esse meum amicum . " 
Logo, a confiança é o fruto necessario da de­
voção ao Sagrado Coração de J esús, visto que 
esta devoção nos torna necessariamente seus 
amigos de coração. 
Eis aqui como podemos chegar, por 
gráos successivos, á plenitude da medída de 
confiança que Nosso Senhor espera de nós. 
132 · t4.o dia 
1 . VIRTUDE · DE CONFIANÇA. - Póde 
ter diversas medidas crescentes : 
1 . o A fé : Meu Deus, tenho confiança 
em vós para alcançar a graça e a gloria tanto 
quanto a fé me ensina. 
2 .0 As circumstancias providenciaes : Te­
nho confiança em) vós tanto quanto me mos­
traes e desejaes por essas circumstancias pro­
videnciaes ; por exemplo, impondo-me esse en­
cargo, quereis que eu confie em vós para cum­
pril -o ; mandando-me essa companhia edifi­
cante, quereis que eu confie em vós para apro­
veitai-a, etc. 
3.0 O attractivo da graça : Tenho con­
fiança em vós tanto quanto a vossa graça a 
isso me convida ; por exemplo, esta manhã, 
na sagrada communhão, haveis-me excitado 
a progredir na humildade ; confio plenamente 
em vós ·a este respeito, sabendo que "Aquelle 
que principiou em mim, acabará" 
4. o A Vontade de Deus : Quero confiar 
em vós tanto quanto o quizerdes. 
5 . 0 O progresso indefinido na confiança : 
Augmentae incessantemente em mim a fé e a 
confiança. 
li. DOM DE CONFIANÇA. - Concedei­
me, para vossa gloria, esse dom especial de 
Abandono ao :S. Cor. 133 
confiança que está acima de toda virtude, ·que 
é o mais dôce presente que possaes fazer aos 
vossos amigos de coração. 
A virtude resulta em parte dos nossos es­
forços ; o dom vem puramente de Deus, e Sta. 
Gertrudes attribúe as suas graças ao dom da 
confiança antes que á virtude 
III. ESTADO DE CONFIANÇA. - Senhor, 
estabelecei-me mui particularmente no estado 
de confiança, que é o mais glorioso para vós 
mesmo e o mais frutuoso para a . vossa Igreja. 
Este estado comprehende tres disposi-
ções : 
1 . o O puro amor : Não quero smao a 
Deus só ; esqueço-me completamente a mim 
mesmo ; 
2.0 O puro abandono : Abandono-me in­
teiramente a Deus para que elle faça absolu­
tamente de mim tudo quanto quizer. 
3 . o A pura confiança : Por conseguinte. 
tenho plena confiança nelle, visto que é só 
delle que se trata, como fim e como meio, 
e visto que eu proprio desappareço inteiramen­
te : elle não póde faltar a si mesmo. 
Assim se acha obtida essa plena· medida 
134 14.o dia 
de confiança a que nada falta e que glorifica 
plenamente o Coração de Jesús, permittindo­
lhe .realizar em nós e por nós os seus desíg­
nios de suprema misericordia. 
DECIMO QUINTO DIA 
A vida de religião no Coração de Jesús. 
Podemos considerai-a successivamente do 
ponto de vista dE>s quatro fins do Sacrifício, 
encaminhandcY,' apenas o leitor, ao quarto dia 
quanto á vida de oração. 
V ida de adoração. 
O Espírito-Santo, que formou Gertru­
des com tanto desvelo para a religião per­
feita, ensinou-lhe antes de tudo "a adorar a 
Deus por J esús Christo, o que é a primeira 
e a m·ais sublime de todas as devoções" (D. 
Mege., Pref. p. 26 ) , e é sempre o Coração de 
Nosso Senhor, perfeito adorador do Pae, que 
é o orgão celeste pelo qual ella offerece a 
Deus as suas homenagens de adoração. 
Quanto a nós tambem, o Espírito-San­
to, mais do que nunca fez nos tempos passa­
dos, quer-nos fazer entrar na vida de ado-
136 15.• dia 
ração, e o Coração de Jesús deseja ardente­
mente communicar-nos os seus sentimentos de 
adoração perfeita ; "A hora é chegada em que 
os que adoram o. Pae adoral-o-ãe em espírito 
e em verdade" Nada de mais definido, nada 
mais consolador em meio ás tristezas do tem­
po presente, do que essa diffusão da graça de 
adoração, essa multiplicação das obras esta­
belecidas para a adoração, institutos religio­
sos consagrados á adoração. Isto se prende em 
primeiro lugar á propria diffusão do espírito 
eucharistico,. que parece ser uma das graças 
dos ultimos tempos, e cuja adoração consti­
túe a forma primeira e principal. Isso se pren­
de tambem á necessidade especial do nosso se­
culo em que, attingindo a revolta contra 
Deus os ultimos limites, é necessario que a 
adoração, que é a submissão a Deus, tome 
tambem desenvolvimentos sem limites, de mo­
do que a reparação seja igual ao mal ; é por 
isto que a divina Providencia, que tem o 
cuidado, a cada época, de enviar á Igreja re­
medios oppostos aos males que a desolam, 
diffunde nella, no seculo presente, o espírito 
de adoração. 
Devemos· pois abordar o assumpto que 
é agora proposto ás nossas meditações, com 
Vida de religião ao S. Cor. 137 
ardentes desejos de aproveitar delle e com uma 
confiança sem limites ; pois nada é mais pro­
prio para inflammar os desejos e para aug­
mentar a confiança do que este pensamento : 
Sei que entro no plano da Providencia e que 
me conformo á vontade divina,, regra de todo 
desejo ; sei que me ponho na corrente actual 
da graça, que me arrastará dôcemente e me 
fará nadar na abundancia. 
1.0 ADORAÇÃO EUCHARISTICA. - A 
alma eucharística deve adorar o Senhor em 
união com o Coração de Jesús e pelo Cora­
ção de Jesús, que é o modelo e o orgão de 
todaadoração perfeita. O primeiro acto dp 
sacrifício de Jesús, á sua chegada ao altar, 
como outr'ora á sua entrada no mundo, é 
um acto de adoração : "Eis que venho, ó meu 
Deus, para cumprir a vossa vontade! Reco­
nheço-vos por meu Creador o meu soberano 
Senhor, e meu coração submette-se inteira­
mente a vós. Fôstes vós que me déstes o meu 
corpo e tudo o que possúo : venho sacrificar­
VOS todo o meu sêr para reconhecer a minha 
inteira dependencia" . 
A alma eucharistica póde acaso fazer 
nada de melhor do que se apropriar desses 
sentimentos do Coração de Jesús, á sua en-
136 15." dia 
trada no santuario, para reconhecer com· elle 
e por elle o soberano domínio de Deus, sub­
rnetter-se-ll�e de todo coração, abandonar-se­
lhe plenàrnente ? E' por ahf que o nosso sa­
crifício deve começar, e , si nos sentimos im­
potentes em presença dessa Majestade infi­
nita; usemos do Coração de Jesús, que suppri­
rá a nossa incapacidade, e offerecerá por nós 
ao Altíssimo as suas homenagens de adoração 
perfeita. Nosso Senhor põe o seu divino Co­
r.ação á disposição da alma eucharistica corno 
um servo pressuroso, tal como dizia a Si:a. 
Gertrudes ; deseja ardentemente ajudar-nos a 
tributar a Deus os nossos deveres de religião, 
e é para elle urna viva alegria, urna dôce gloria, 
supprir o que nos falta ; usemos do Coração de 
Jesús, e estaremos certos de que as nossas ho­
ménagens já não serão indignas do Deus tres 
vezes santo. 
ADORAÇÃO SOLENNE' COM EXPOSIÇÃO 
DO SS. SACRAMENTO. - A adoração solenne 
com exposição do SS. Sacramento parece ser 
a que mais convém á ah:na eucharistica, por­
que é sob essa forma que Jesús-Hostia se 
mostra de modo o mais frisante como objecto, 
modelo e orgão das nossas adorações. Por isto 
vê-se cada vez mais as obras de adoração 
Vida de religião ao S. Cor. 139 
adaptarem esta forma, e, -si nos dois ultimas 
secu1os fôram fundados alguns institutos para 
a adoração sem exposição, todas as funda­
ções feitas no seculo presente se têm con­
sagrado á adoração solenne com exposição. 
E' tambem com esta solennidade que é esta-· 
belecida a adoração perpetua, que tende a tor­
nar-se cada vez mais geral nas nossas diversas 
diocéses ; e já ha varias seculos a adoração das 
Quaren_ta-Horas, que existe em Roma de ma­
neira perpetua, se tem praticado constante­
mente nellas com a exposição do- SS. Sacra­
mento. 
1 . o Esta forma, dissemos, mostra-nos 
melhor Jesús-Hostia como objecto das nossas 
adoz:ações ; propõe-se directamente ao nosso 
culto e convida-nos por si mesma a lhe Ten­
dermos as nossas homenagens : , Venite, pro­
cidamus ante Deum; venite adoremus Domi­
num. Na exposição solenne, Jesús mostra-'se 
como o divino sól <ie que recebemos a luz, o 
calor e a vida ; como o Rei corôado de gloria 
a quem nos devemos submetter ; elle está no 
seu throno cercado de honra e de majestade, 
recebendo as homenagens dos anjos que lhe 
formam. a· ' côrte 'e nos convidam a aqoral-o 
comsigo. 
140 15.• dia 
2.0 Sob esta forma, entretanto, Jesús 
não fica sendo menos o modelo das nossas 
adorações, porque permanece sempre a Hos­
tia escondida que se sacrifica, que se humilha, 
que se anniquila. Eis a adoração perfeita : 
que a alma eucharistica olhe o modelo que 
lhe é proposto do alto, que lhe responde aos 
olhos ; em meio ás graças que Deus lhe pro­
digaliza, ás luzes com que a inunda, sen­
tirá elle ser preciso permanecer sempre oc­
culta, sacrificar-se inteiramente á Majestade 
divina de quem recebeu tudo, humilhar-se em 
proporção dos dons que o Senhor lhe faz. 
anniquilar-se na submissão mais completa, na 
dependencia mais a_bsoluta.
Assim tambem com relação a seus 
irmãos, que representa junto a Jesús, ou antes 
com o proprio Jesús, ella sentirá que só uma 
ccusa tem a fazer : imitar o Salvador que vive 
sempre no estado de Hostia para interceder em 
favor delles ; que se humilha pçr elles, que se 
faz escravo delles ; que, por elles, se torna 
obediente na eucharistia de modo ainda mais 
commovedor do que no Calvario ; que se an­
niquila por elles ainda mais que na Cruz. 
afim de ser sempre, o seu Salvador. Que a 
alma eucharistica se una a esses sentimentos e 
Vida de religião ao S. Cor. 141 
os offereça incessantemente a Deus por seus 
irmãos, mediante o Coração eucharistico de 
Jesús ! 
3 .0 Porquanto Jesús-Hostia, solenne­
mente exposto, offerece-s-e a nós de maneira 
toda particular para ser o orgão das home­
nagens que queremos prestar a Deus em nome 
de toda a Igreja, visto como nessa adoração 
publica elle apparece como o Pontífice e como 
a Victima da religião de toda a Igreja ; elle 
alli está para adorar o Senhor em nome de 
nós todos ; a alma eucharistica tem só que 
se unir a elle, e pelo seu divino Coração póde 
offerecer a Deus todas as homenagens da 
religião mais perfeita, por si mesma e por seus· 
irmãos. 
Nosso Senhor inspira a Sta . Gertrudes 
uma grande devoção em contemplai-o ass-im 
�;xposto aos nossos olhares na sagrada Hostia 
(II , 1 1 8 ) . Era uma das suas praticas mais 
caras, e o bom Mestre diz-lhe um dia a esse 
respeito : "Cada vez que se olha assim com 
amor a hostia que contém sacramentalmente 
o meu Corpo divino, augmentam-se os pro­
prios merecimentos para o Céo, e accrescen­
ta-se ás proprias alegrias eternas um prazer 
particular que corresponderá ao que se tiver 
t42 15.• dia 
tido em olhar deuotamente esse precioso Cor­
po na terra". 
3.0 ADORAÇÃO NOCTURNA. - Ha para 
os amigos do Sagrado Coração uma alegria 
toda particular em adorai-o e em lhe offerecer 
as proprias homenagens em meio ao silencio 
da noite. na hora em que todos os outros o 
esquecem. Foi esta alegria que presentiu o Rei­
Propheta quando se levantava de noite para 
adorar ó Senhor ; é essa alegria que o Apostolo 
manifesta nos nossos santos Livros quando 
o carcereiro o acha na prisão occupado em 
cantar com o companheiro os louvores de 
J esús Christo no meio das trevas. Assim o 
amor da alma eucharistica não conhece re· 
pouso ; o seu coração véla sempre, mesmo du­
rante essas horas que. .a natureza consagrou 
ao somno ; a súa. vontade- de honrar a Jesús 
subsiste dia e noite : uoluntas ejus permanet 
die ac nor:te, e o seu culto é perpetuo para com 
Deus da Eucharistia. Sim, verdadeinmente 
perpetuo, pois ella se associou a outras almas 
que a substitúem quando é preciso que ·ella 
se ausente de junto do Tabernaculo, e o pro­
prio Jesús-Hostia, pondo-se no meio dessas 
almas reunidas em seu nome, associa-se com 
ellas, vélà com ellas e por ellas, e lhes com-
Vida de religião ao S. Cor. 143 
pleta a obra de adoração. Semelhante á mu­
lher forte dos �ossos santos Liyros; a alma 
eucharistica provou e viu ·o quanto essa as­
sociação é bôa, a suei lampada não se apaga 
mais durante a noite, · ella trabalha sem trégua 
pelos interesses da Igreja que é a sua família, 
pela gloria -de seu divino Esposo. Quem po­
derá dizer os frutos de salvação que ella pro­
duz por esse labor infatigavel, as riquezas 
que amontôa para o resgate das almas, por 
esse negocio continuo ? Assim o Coração de 
Jesús confia nella; ella lhe rende gloria. á face 
do dia e da noite; e o divino Esposo lhe pre­
para toda sorte de alegrias para o derradeiro 
dia. 
E' que effectivamente, para examinar a 
cousa do ponto de vista theologico, ha na ado­
ração, feita de noite, varios títulos de gloria 
toda particular para o Deus da Eucharistia. O 
culto que se lhe rende effecfúa-se num reco­
!:1imento mais profundo quando toda a na­
amza está em silencio ; os cantos do louvqr 
s.io mais agradaveis a Deus quando a gente 
�rifica uma parte do nosso repouso em con­
�"'1Ilplar-lhe as perfeições e em lhe celebrar os 
�neficios. Imitamos de alguma sorte por essa 
: .xma os habitantes da mansão celeste que, 
i44 15.• dia 
segundo o Apostolo dilecto, servem a Deus 
dia e noite no seu templo. Reparamos por essa 
obra tão meritoria, as desordens do mundo, 
que consagra o tempo da noite ao jogo e 
á intemperança, e o Coração de Jesús deve ex­
puim'entar uma dôce alegria em vêr diantede 
si essas almas que vêm consolai-o no momen­
to mesmo em que mais o ultrajam. Finalmen­
te, perpetuamos por esse meio, tanto quanto 
possível, no chr"istianismo, o zelo daquelles 
antigos solitarios que mantinham nas suas 
solidões uma psalmodia continua ( 1 ) . 
Levantae pois as mãos durante a noite 
para o Santo dos santos. ó alma eucharist1ca ; 
bemdizei-o e rogae-o por nós todos ; adorae-o 
em presença de seus anjos; reparae as offensas 
que se commettem contra elle ; mantende a 
Hostia santa sempre elevada entre o céo e a 
terra , para attrahir sempre a misericordia 
sobre este mundo culpado. 
4.0 ADORAÇÃO PERPETUA. - Appli­
quemos á adoração perpetua o que acabamos 
de dizer da adoração nocturna, que lhe é o 
méro complemento. 
A felicidade é completa, para a alma eu­
charistica, quando ella póde offerecer a Nosso 
( 1 ) Berthier : Psalmos, In Pg. 33. 
Vida de religião ao S. Cor. 145 
Senhor, com as suas companheiras, um culto 
perpetuo que não é interrompido nem de dia 
nem de noite ; repete elle assim sem repouso 
o Sanctus que os anjos cantam no céo, e 
preludia desde esta vida ás adorações eternas 
que irá em breve offerecer ao Altíssimo com 
a Côrte celeste. 
CONCLUSÃO PRATICA. - Tomar, entre 
as applicações indicadas nessas Reflexões, as 
que nos parecem mais praticas para nós. 
DECIMO SEXTO DIA 
Vida de adoração (continuação) 
5.0ADORAÇÃO REPARADORA. - Todo 
acto de adoração é um acto de reparação, quer 
de modo geral. quer do ponto de vista par­
ticular da adoração eucharistica. 
1. a Primeiramente de modo geral : a ado­
ração, consistindo em reconhecermos a nossa 
dependenda com relação a Deus, e em nos 
submettermos a elle inteiramente, é por isso 
mesmo directamente opposta ao peccado, que 
é precisamente um acto de independencia e de 
revolta contra Deus. Non serviam - adora­
bo : eis os dois termos oppostos. A alma que 
adóra em espírito e em verdade repara, pois, 
directa e efficazmente o peccado, e si a ado­
ração é publica e solenne, a reparação torna­
se igualmente publica e solenne. Eis o prin­
cipio em que se basêa a adoração das Qua­
renta-Horas, instituídas ha longo tempo na 
Igreja para reparar publica e solennemente as 
Vida de adoração 147 
offensas que o mundo commette contra o 
Senhor. 
2.0 Mas, por isto que, conforme já vi­
mos, é principalmente na Eucharistia que a 
majestade e o amor de nosso Deus são mais 
ultrajadas, será na adoração eucharistica que 
se achará a reparação mais necessaria, quer 
para a gloria de Deus, quer para a salvação 
do mundo : cumpre que onde os ultrajes são 
mais odiosos, a adoração se màstre mais re­
tumbante ; que onde a ingratidão é mais 
monstruosa, a adoração se mostre mais so­
licita ; que onde a iniquidade multiplica as 
suas offensas, a adoração multiplique as suas 
homenagens, com as suas festas solennes e 
com as pompas do seu culto. Aqui ainda, 
de outro ponto de vista se manifesta um dos 
grandes deveres da alma eucharistica, uma das 
tarefas mais necessarias que deve realizar no 
silencio e na humildade ; precisamente porque 
é chamada a reparar os ultrajes do orgulho, 
cumpre que ella se humilhe mais ; só o abaixa­
mento, a obediencia até á morte podem of­
ferecer uma digna satisfação á Majestade di­
vina, contra a qual o nosso seculo se revolta 
com tanta insolencia. 
6.0 Os COMPANHEIROS DA ALMÂ ADO-
148 16.o dia 
RADORA. - Nosso Senhor confiara Sta. Ger­
trudes de maneira toda especial ao Côro das 
Dominações para auxiliai-a na vida de ado­
ração. Essas celestes intelligencias diziam um 
dia á Santa (IV, 5 3 ) : "Corno a honra do 
Rei ama o juizo, e o amor levado pelo ardor 
não conhece o freio da razão, todas as vezes 
que o Rei de gloria se abaixa para a vossa 
alma e voss' alma por sua vez se perde nelle 
por um transporte de amor, adorarnol-o em 
vosso nome e lhe offerecernos por vós as ho­
menagens devidas á sua grandeza, afim de que 
a sua gloria soberana em nada soffra com 
essa familiaridade a que elle vos admitte" 
Roguemos a esses meigos Companheiros 
da alma adoradora que nos ajudem, a nós 
tambern, no culto que devemos prestar ao Rei 
dos reis, que nos inspirem os seus sentimen­
tos tão profundos de respeito, que nos as­
sociem ás homenagens que lhe offerecern. A 
Igreja nol-os faz invocar na santa Missa no 
momento em que o Deus da Eucharistia vae 
descer ao altar, afim de que elle nos auxilie 
a recebei-o com a honra que lhe é devida, e 
o adoremos como o fazem os anjos que ro­
dêarn o altar : adoram Dominationes. 
7.0 As ALEGRIAS DA VIDA DE ADORA-
Vida de adoração 149 
ÇÃO. - A vida de adoração é, por si mesma 
e para a alma que sabe comprehendel-a, uma 
vida toda de alegria, toda de ordem, toda de 
paz ; porquanto é uma vida toda consagrada 
ao beneplacito de Deus, toda dependente da 
sua vontade santa, toda abandonada ao seu 
soberano domínio ; ora. o beneplacito de Deus 
é a alegria ; a vontade de Deus é a ordem 'per­
feita ; o soberano domínio de Deus é o reina­
nado da paz. Recitemos simplesmente, mas 
séria e sinceramente, o acto vulgar de adora­
ção, e acharemos nelle todos esses sentimen­
tos e essas diversas disposições : Meu Deus, 
reconheço-vos com prazer por meu Creador 
e meu soberano Senhor ; com prazo-me em 
vós, que sois a fonte de todo bem ; compra­
zo-me na vossa Divindade, que é uma infi­
nidade de infinitas perfeições ; oh ! sim, de 
todo meu coração submetto-me inteiramente 
a vós ; abandono-me sem reserva ao vosso po­
der, á vossa sabedoria, á vossa bondade ; co1-
loco-me pela eternidade debaixo da influencia 
do vosso amor, que é todo bem, toda alegria, 
toda paz. 
Estes sentimentos tomam bem mais for­
ça quando são expressos ao proprio J esús 
exposto no altar, quando os sentimos como 
150 H!.o dia 
a repercussão dos sentimentos do seu proprio 
Coração, quando nos podemos dizer : Pelas 
minhas adorações, venho augmentar a ale­
gria, a ordem e a paz em torno a J esús e por 
Jesús, no proprio Jesús e nos seus membros ; 
entro na alegria de meu Mestre ; elle me es­
tabelece na sua paz ; ordena em mim a sua 
caridade ; regozijo-o e elle me regozija ; paci­
fico-o e elle me pacifica ; tiro de junto delle, 
tanto quanto está em mim, as causas de desor­
dem que tanto o fazem soffrer ; em mim e 
por mim, faço-o viver e reinar no amor e 
na alegria. 
8 .0 As VIRTUDES DA ALMA ADORADORA. 
- A vida de adoração faz entrar a alma eu­
charistica na pratica de tres virtudes eminen­
temente gloriosas para Deus e que constitúem 
a mais alta perfeição, a saber : o amor de com­
p(acencia para com Deus, o abandono a Deus, 
a dependencia de Deus. 
1 . 0 Essa alma compraz-se em reconhecer 
a Deus por seu Creador e Senhor, de quem 
ella recebeu tudo o que possúe, pelo Sêr per. 
feito de quem recebe todo o seu sêr ; ora, não 
está ahi o verdadeiro amor de complacencia 
para com Deus considerado como sendo o so-
Vida de adoração 151 
berano bem em si mesmo, e como sendo o 
autor de todos os bens para nós ? 
2.0 A adoração deve tambem trazer o 
abandono completo de nós proprios a Deus : 
submettemo-nos inteiramente ao seu soberano 
domínio, e esta submissão, si fôr sincera e 
sem reserva quanto ao corpo como quanto á 
alma, quanto ao espírito e quanto á vonta­
de, para o tempo e para a eternidade, deve 
produzir necessariamente em pratica um 
abandono perfeito. 
3 .0 D'ahi resulta emfim que nos con­
servamos inteiramente sob a dependencia de 
Deus, que elle póde dispôr de nós segundo a· 
sua santa vontade, que seu Espírito pôde di­
rigir-nos em tudo sem obstaculo e tornar-se 
o nosso unico principio de acção. E não · tí­
nhamos ra·zão de dizer que era esse o estado 
mais glorioso para Deus, o estado · da mais 
alta perfeição para nós mesmos? 
Oh! ·que a alma adoradora ·progrida com 
ardor na pratica dessas tres virtudes que cons­
titúcm a perfeição mais elevada da vida chris­
tã ! O Deus da Eucharistia quer-lh'as conce­
der plenamente para sua gloria e para consôlo 
do seu Sagrado Coração. Jesús é tão feliz de 
vêr a seus pés uma alma . que só nelle põe to·152 16.o dia 
das as suas complacencias, uma alma que lhe 
é inteiramente abandonada, da quai elle póde 
fazer tudo o que quizer ! Fará della um pro­
dígio de graças para se indemnizar de tanta 
resistencia que encontra em outras almas. 
Coragem, servo bom e fiel , parece elle 
dizer-lhe, entrae plenamente na alegria do 
vosso Senhor; já que deixastes tudo por mim, 
eu serei tudo para vós ; entrae nas potencias do 
Senhor ; entrae no poder do Pae pelo aban­
dono perfeito ; entrae no louvor do Verbo 
pela união com Jesús Christo, vosso Chefe 
divino ; entrae no amor do Espírito Santo 
em união com esse Espírito divino que ha­
bita em vós. Vivei no abandono, no louvor, 
no amor ! Assim a vida de adoração associa­
nos ao poder do proprio Deus, faz-nos de 
alguma sorte com elle um mesmo louvor, 
um mesmo amor. 
9 .0 INDUSTRIAS PRATICAS PARA A ADO­
RAÇÃO. - 1 .0 O throno para a exposição do 
SS. Sacramento. 
O Espírito-Santo, no Cantico que é por 
excellencia á Cantico da adoração, do louvor, 
do amor, ensina-nos (Cant. IH, 3 ) um me­
thodo admiravel para render a Jesús-Eucha­
ristia o culto publico. e solenne da adoração. 
Vida de adoração 153 
Elevemos-lhe primeiro um throno em que elle 
seja exposto aos olhos de todos para receber 
as nossas homenagens : esse throno "feito com 
as madeiras incorruptíveis do Libano" , é no 
sentido mystico o Coração immaculado e 
os braços da Virgem, sua Mãe, unicos dig­
nos de expôr J esús aos nossos olhares e de 
apresentai-o ás nossas homenagens. As co­
lumnas que supportam esse throno são de 
prata, symbolo da pregação ou do louvor 
publiços que devem trazer as afmas de nos­
sos irmãos a J esús-Eucharistia ; "os degrtios 
são de púrpura", porque se faz mistér o san­
gue da expiação, da plenitude, da mortifi­
cação para nos elevar até á Jesús ; "o assen­
to é de ouro puro" porque Jesús repousa na 
caridade figurada pelo ouro ; esse throno é 
coberto de tapetes feitos pelas filhas de Je­
rusalém, e onde se acham representadas di­
versas figuras que exprimem o amor do Sal­
vador ás nossas almas" . Que ventura para 
nós o trabalharmos nessas columnas, nesses 
degráos, nesses tapetes mysticos ! depois de 
havermos preparado assim o throno em que 
Jesús quer receber as nossas adorações, con­
vidaremos "as filhas de Sion, as alJ:llaS de 
nossos irmãos, a virem contemplar comnosco 
154 16.• dia 
o verdadeiro Salomão, o Rei pacifico, que traz 
o diadema com que sua mãe o coroou no dia 
das suas núpcias; no dia da alegria elo seu 
Coração" ; teremos prazer em coroai-o de 
gloria e de honra ; proclamai-o-emas Rei da 
rnisericordia, Rei do amor, celebrar-lhe-emas 
as núpcias espirituaes com as nossas almas, e 
asseguraremos ao seu dulcissimo Coração um 
dia de alegria perfeita. 
· 
2 .0 A adoração a todas as noras. -
Nosso Senhor pedira á Santà Margarida­
Maria que não deixasse passar nenhuma hora 
do dia sem vir adorai-o no SS. Sacramento do 
altar. Póde-se, com menos incommodo do 
que parece á primeira vista, chegar a effectuar 
essa pratica tão terna de amizade, tão rica de 
graças. Para varias horas do dia, a propria 
Regra póde levar-nos perante o SS. Sacra­
mento ; para as outras horas, basta virmos a 
elle um instante pelo fim da hora, e esta 
curta adoração servirá ao mesmo tempo para 
a hora seguinte. Póde-se sempre, ao menos, 
vir, a elle pelo desejo e incumbir o bom Anjo 
de vir effectivamerite em nosso nome. Oh ! 
como é agradavel ao Coração de Jesús essa 
especie de adoração perpetua ! Elle diz a essa 
alma que está sempre assim com elle : "Meu 
Vida de adoração 155 
filho, tú estás sempre commigo, e tudo o que 
eu tenho é teu" Ora, quem poderá dizer os 
thesouros de graças que esta palavra abre a 
essa alma ! 
3 .0 Jesús, adorador por nós. - Dizen­
do Sta. Mechtilde, como vimos, a Nosso Se­
nhor : Eu quizera adorar-vos em nom� de 
todas as creaturas, Jesús respondeu-lhe : "Eu 
que sou o centro de todas as creaturas, o Sa­
cerdote da Úeação inteira, offereço a Deus de 
tua parte essa adoração uniuersal em nome 
de toda creaturan . 
Eis a ultima palavra da adoração per­
feita ! 
CoNCLUSÃO PRATICA. - Tomar entre 
as applicações indicadas nessas Reflexões as 
que nos parecem mais praticas para nós. 
DECIMO SETIMO DIA 
V ida de acção de graças 
Completemos aqui o que dissemos alhu­
res da acção de graças, e não receiamos insistir 
sobre essa virtude em que Sta. Gertrudes par­
ticularmente · sobresaiu. A acção de graças é 
o primeiro fruto que N. Senhor nos convida 
a colher no seu divino Coração, e será tam­
bem o ultimo hymno que a Igreja cantará 
no fim dos tempos com elle. 
I. 0 QUANTO A ALMA EUCHARISTICA 
DEVE PRIMAR NA PRATICA DA ACÇÃO DE 
GRAÇAS. - O seu proprio titulo lh'o lembra, 
visto que Eucharistia quer dizer acÇão de gra­
ças : instituindo a sagrada Eucharistia, Jesús 
quiz multiplicar as suas acções de graças para 
com seu Pae tantas vezes quantas hostias con­
sagradas ha e haverá no mundo, e, unindo­
nos a si na vida eucharistica, quer fazer d0 
nosso coração o éco da gratidão infinita do 
seu divino Coração para si mesmo e para nós. 
Vida de acção de graças 1 57 
Para corresponder plenamente ás suas inten­
ções, cumpre que a vida da alma. eucharistica 
seja uma vida toda de acções de graças. Nosso 
Senhor se compraz em lhe fazer conhecer, na 
intimidade da oração, todos os mysterios do 
seu amor a ella, do seu amor aos peccadores, 
e convida-a a associar-se a elle para pagar, em 
nome de todos, essa divida que quasi todos 
esquecem, a divida da gratidão. Seja ella pois 
grata como o Coração de Jesús e pelo Co­
ração de Jesús ; em união com elle, seja na 
Igreja de Deus um orgão publico de gra· 
tidão ! 
E parece que essa vida de acção de gra· 
ças deva tomar um desenvolvimento maior 
no nosso seculo, visto como a graça dos ul­
timos tempos parece dever ser uma effusão 
de espírito eucharistico, quer dizer, de espírito 
de acção de graças : spiritum grati<E. Convém 
aliás que no fim dos tempos o mundo cante 
mais plenamente o hymno da gratidão para 
com o autor de todos os nossos bens, para 
que os agradecimentos da crc!atura corôem a 
série dos beneficios do Creador. 
11. ACÇÃO DE GRAÇAS PELO CORAÇÃO
EUCHARISTICO DE JESÚS. - Que retribuirei 
ao Senhor por todos os seus beneficios ? excla-
158 17.0 dia 
ma· a alma eucharistica com o Rei-Propheta. 
Elle me deu tudo e se deu a si proprio ; que 
posso eu retribuir-lhe de equivalente ou de 
digno dellê ? Que acharei nos seus thesouros 
cujo valor não seja infinitamente abaixo da 
menor gôta do sangue adoravel que elle der­
ramou por mim ? Verdadeiramente, não tenho 
nada que lhe possa offerecer. Mas o Senhor 
Jesús, condoído á vista da minha pobreza, dá­
me o seu Coração eucharistico para servir de 
orgão á minha gratidão, para que eu offereça 
Elle proprio como um presente de valor infi­
nito. Por elle, retribúo a Deus tanto quanto 
elle me deu e até mais, como o quer a lei da 
gratidão; porque todos os bens que elle me 
deu, não pude recebei-os e nem posso pos­
suil-os sinão dum modo finito, ao passo que 
o bem que lhe retribúo pelo Coração eucha­
ristico de Jesús é verdadeiramente infinito. 
Assim, cumpro o dever da gratidão na sua 
perfeição ; retribúo a Deus mais do que elle 
me deu ; dou-lhé alguma causa gratúitamente. 
III. ACÇÕES DE GRAÇAS POR TUDO. -
Mesmo pelas menores cousas : "Sabeis, ó meu 
Deus, exclama Sta. Gertrudes, o motivo da 
minha mais amarga tristeza, da minha maior 
confusão : é a minha infidelidade, a minha 
Vida de acção de graças 159' 
irreverencia, a minha ingratidão no uso dos 
vossos beneficios. Sim, ainda que só me ti­
vesseis dado, vós tão grande, a mim tão indig-· 
no, em méro fio de estôpa, eu deveria teste­
munhar-vos mais reverencia e amor do que o 
tenho feito por tantas graças" . 
Eis os sentimentos que devem animar a 
alma eucharistica na sua gratidão para com 
Deus : humildade, reverencia, amor, fideli­
dade, bom uso das graças recebidas. Applique 
ella estas disposições ao recebimento das gra­
ças, mesmo as mais pequenas,para dar á sua 
gratidão toda a delicadeza e toda a profun­
deza que convêm á nossa extrema baixeza e 
á nobreza infinita do nosso adoravel bem- · 
feitor 
2.0 Hoc facite in meam commemora­
tionem. "Sta. Mechtilde perguntava ao Se­
nhor o que mais lhe agradava no homem : 
elle respondeu : E' que medite com profunda 
gratidão e guarde em perpetua lembrança to­
das as penas e injurias que aturei durante 
trinta e tres annos, em que miseria vivi, que 
affrontas tive de supportar da parte de minhas 
creaturas, e emfim o quanto soffri na cruz, 
morrendo da morte mais amarga pelo amor 
do homem, para lhe resgatar a alma com- meu 
160 17.• dia 
precioso sangue e fazel-a minha esposa fiel. 
Tenha cada um a todos esses beneficios tanto 
affecto e gratidão como si eu tivesse soffrido 
só por si" , (I, 1 8 ) . 
Oh ! tome a alma eucharistíca bem para 
si estas palavras ! Eis o que mais agradará 
nella a Nosso Senhor : que guarde sempre 
diante delle a lembrança e o reconhecimento 
dos seus beneficios. Já que a Eucharistia é o 
memorial da Paixão, cumpre que a alma eu­
charistica lhe tenha sempre presente a me­
moria, para agradecer a Jesús tanto amor, em 
seu proprio nome e no de seus irmãos. Oh ! 
dê fiél , constante, perfeitamente a Nosso Se­
nhor aquillo que o seu divino Coração mais 
deseja, a gratidão ; consóle-o plenamente da­
quillo que mais o faz soffrer, a ingratidão! 
Guarde assim sempre viva a lembrança do 
Deus da Paixão e da Eucharistia, e cumpra 
perfeitamente a recommendação suprema do 
seu amor : Hoc facite in meam commemora­
tionem! Fazei isto em memoria de mim! 
3 .0 A acção de graças pelas nossàs penas. 
- Ha as mais das vezes, nas penas que Nosso 
Senhor envia á alma eucharistica, diversas at­
tenções de ternura e de delicadeza divinas que 
primam uma sobre a outra, e que devem ex· 
Vida de acção de graças 161 
citar nella uma gratidão crescente. V emol-o 
de modo tocante no exemplo de Sta. Gertru­
des. Nosso Senhor mostra-lhe primeiro que, 
pelas penas que lhe manda, quer desapegai-a 
de todas as creaturas e attrahil-a exclusiva­
mente a elle só : "Gosto muito de conversar 
comtigo, diz-lhe numa occasião desse gener�. 
e quiz assim fruir mais tempo desta ventura. 
A mãe duma criança ternamente amada, que 
deseja tel-a sempre ao pé de si, quando ella 
se quer afastar para ir brincar com os seus ca­
maradinhas, colloca na vizinhança algum es­
pantalho para metter mêdo a criança, que 
logo accorre a se refugiar no seio del/a. Assim, 
como eu desejo ter-te sempre a meu lado, per­
mitto que as creaturas te sejam um motivo de 
pena, afim de que venhas para junto de mim, 
e repouses em mim só" . (IH, 63 ) . Em se­
gundo lugar, Jesús inunda-a de consolações 
em meio a essas penas, para manifestar a ter­
nura do seu divino Coração e provocar nella 
uma gratidão maior ; quer para este fim que 
essas penas sejam amenizadas pela uncção da 
sua graça, que pareçam a Gertrudes muito 
mais leves do que as penas aturadas por suas 
Irmãs, e deste modo a divina Sabedoria lhe 
faz com essas penas "um ornamento delicado 
162 17.o dia 
em que as flôres da humiliade uêm juntar-se 
ás da paciencia para lhe realçarem o brilho" . 
- Em terceiro lugar, a Santa, entregando-se 
então aos transportes da sua gratidão por 
todas essas attenções tão ternas do Coração 
de Jesús, vê que todas essas flôres delicadas 
se transformam e tornam em ouro massiço. 
e o Senhor taz-lhe comprehender que a acção 
de graças pelas penas, mesmo leves, que seu 
amor nos envia, suppre o que falta ao peso 
dessas penas e lhes dá grandíssimo valor, com ... 
paravel ao do ouro puro. - Em quarto lu­
gar, finalmente, o Salvador inspira-lhe offe­
recer todas essas penas pela salvação de seus 
irmãos, e como a Santa o faz com novos tes­
temunhos de acção -de graças, Jesús recebe o 
seu sacrifício com tanta complacencia, que 
perdôa, por amor a ella, multidão incontavel 
de peccadores. 
Alma eucharistica, eis ahi a ternura do 
Coração de Jesús por vós ! Eis o que são . as 
vossas penas perante eU e ! Eis o valor da acção 
de graças ! 
CONCLUSÃO PRATICA. - Escolher al­
guma dessas praticas de acção de graças e fa­
zel-a fiélmente. 
DE CIMO OITAVO DIA 
. 
Vida de acção de graças (continuação) 
IV. Calicem salutaris accipiam. - "Sta.
Gertrudes na santa Missa, no momento da 
elevação, offereceu ao Senhor o calice do pre­
cioso sangue de Jesús em acção de graças por 
todos os seus beneficios, e sentindo logo que 
nesse offerecimento devia unir-se aos senti; 
mentos do Coração de Jesús, prostrou-se de 
rosto em terra e disse ao Pae celeste : O fferc­
ço-me com Jesús para tudo o que mais pôde 
contribuir para a vossa gloria. Logo o Salva­
dor veiu prostrar-se ao lado della dizendo : 
Faço uma cousa só com esta alma. Reanimada 
por esta. palavra, disse-lhe Gertrudes : Sim, 
Senhor, sou toda vossa. E o Senhor prose­
guio : Uni-me tão estreitamente a ti pelos la­
ços do meu amor que não posso viver feliz 
sem ti" . (III, 5 ) . 
Alma encharistica, quereis que · Jesús 
.Khe as suas delicias em vós, quereis tornai-o 
164 1S.o dia 
feliz tanto quanto está em vosso poder, que­
reis testemunhar-lhe perfeita gratidão ? Bebei 
no seu calice, nesse calice em que elle bebeu 
primeiro e que vos offerece agora em signal 
de amizade ; partilhae as dôres e as tristezas 
as do seu coração divino, verdadeiro calice 
de amarguras cujo excesso Jesús quer entor­
nar nos corações dos seus amigos. 
Cumpre que a vossa gratidão chegue 
até ahi. Jesús amou-nos com o amor mais 
sincero e mais seria, com o amor mais dedica­
do, mais terno e mais constante, porque be­
beu por nós a longos sôrvos no calice dos 
soffrimentos e das humilhações ; cumpre que 
o nosso amor se assemelhe ao seu ; cumpre que 
a gratidão lhe pague na mesma moeda : co­
gita quoniam oportet te talia praeparare. 
V. ACÇÃO DE GRAÇAS POR TODOS. ­
Já mostrámos eni varias lugares Sta. Gertru­
des cumprindo em nome de todos o dever da 
acção de graças ; vimos tambem como, ren­
dendo graças pelos Santos, ella nos ensina 
a nos apropriarmos dos meritos e virtudes 
delles. 
VI. ACÇÃO DE GRAÇAS PERPETUA. -
Sem per et ubique gratias agere : é a esta pra­
tica que a IgreJa nos. convida no momento 
Vida de acção de graças 165 
em que a Victima eucharistica vae compare­
cer no altar : por essa meiga Victima, dar 
graças a Deus em toda parte e sempre. E' 
a necessidade da alma eucharistica. A sua di­
vida de gratidão vexa-a ; parece-lhe que a 
eternidade não será bastante longa para pa­
gai-a. Não só quer empregar nisso toda a sua 
vida, mas ainda convida seus irmãos a aju­
dai-a a offerecer continuamente a Deus esse 
hymno da acção de graças. 
" Impotente, ó Senhor, para vos bem­
dizer tanto quanto o quizer, exclama Sta. 
Gertrudes, chamo em meu auxilio todas as 
creaturas. Rogo-vos comutardes de vossos b�­
neficios aquelles que me auxiliarem, inda que 
fosse só por um suspiro, a pagar a minha 
divida de gratidão" E obtém, pelo ardor 
dos desejos do seu coração grato, que todo 
aquelle que, mesmo peccador, até o fim dos 
seculos, render graças a Deus por Gertrudes, 
não findará a vida presente sem que Deus o 
haja convertido ou trazido a uma santidade 
mais perfeita ( 1 ) . 
(1) A Associação da acção de gra,as perpetua, 
cujo Centro é em Bordeaux (rua do Hà, · 17) tem 
por padroeira .principal Sta. Gertrudes, 
166 18.o dia 
VII. ACÇÃO DE GRAÇAS COM TODOS.
- "Por todos os vossos beneficios, exclama 
Sta. Gertrudes (1, 1 1 3 ) , ó Deus amantíssi­
mo, que sois todo amor aos homens, offere­
ço-vos as minha acções de graças em união 
dessa acção de graças reciproca que existe entre 
as adoraveis Pessôas da SS. Trindade, em 
união das acções de graças de Jesús e de to­
das as creaturas racionaes ou inanimadas" 
- "Dignae-vos cumprir por mim esse dever 
da acção de graças. (Exercícios, p. 2 20) , ó 
meu Jesús tão amado, em tuda a extensão 
da justiça. Louvae vosso Pae em mim e por 
mim, com todo o poder da vossa divindade. 
com todo o affecto da vossa humanidade e 
em nome da universalidadedos sêres" De­
pois chama todas as creaturas para cantarem 
com elle o hymno da acção de graças, ser­
vindo-se dos Psalmos de Lourdes que expri­
mem tão bem todbs esses sentimentos e lhes 
accrescentam tudo o que a gratidão póde 
inspirar de mais viv!J e de mais terno. 
Póde-se empregar com grande proveito, 
a este respeito, o livro dos Exercícios de Sta. 
Gertrudes, onde ha um exercido particular 
para a acção de graças. 
'Vida de acção de gr.aças 167 
VIII. TRES FRUTOS DA ACÇÃO DE 
GRAÇAS. - Ha na pratica da acção de graças, 
para a alma eucharistica, tres minas inesgota­
veis de riquezas espirituaes que ella pôde �x­
piorar para si mesiTlQ e para a Igreja : 
1 . o Aquelle que agradece a Deus as gra­
ças concedidas a outrem e espera recebei-as 
semelhantes, alcançai-as-á. 
2.0 Agradecendo a Deus todas as gra­
ças que as outras não quizeram receber, nós 
proprios merecemos recebei-as, e beneficiamos 
da recommendação do Evangelho : . colligite 
fragmenta ne pereant, recolhei o que deixa­
ram. 
3 . o Agradecendo a Deus todas as gra­
ças de que os outros não fizeram bom uso, "as cruzes, os sacrifícios, etc. , apropriamo-nos 
dellas, como si nós proprios as usassemos 
bem ( 1 ) . 
IX. - DUAS DELICADEZAS DA ACÇl\0 
DE ÇJRAÇAS. - 1 .0 Jesús deseja ainda mais 
testemunhar a gratidão do que recebei-a. Dei­
xemol-o fazer, deixemol-o cumular-nos das 
suas graças, afim de podermos fazer muito 
( 1 ) Recordemos ainda que tudo isto se entende 
em proporção das nossas disposições e da. nossa cQO­
peração, 
168 18.o dia 
mais por elle, e ter elle eternamente a alegria 
de nos testemunhar por isso a sua gratidão. 
2. o Os miseraveis teem a gratidão mais 
viva, da mesma forma que os infelizes ; rego­
sijemo-nos pois das nossas miserias, que darão 
mais brilho aos beneficios de Jesús e nos ex­
citarão a uma maior gratidão. Libenter glo­
riabor in infirmitatibus meis! 
CONCLUSÃO PRATICA. - l .o Sejamos 
bem fiéis ao dôce dever da acção de graças. 
2.0 Semper et ubique. Cada vez que ou­
virmos estas palavras na santa Missa, cumpra­
mos esse dever de todo nosso coração e peça­
mos a graça de cumpril-o habitualmente. 
DECIMO NONO DIA 
V ida de reparação 
Póde-se dizer que nunca a vida de re­
paração fôra tão necessaria quanto nos nossos 
dias, porque nunca as offensas contra Deus 
tinham sido tão horriveis, urna vez que a 
blasphernia attingiu os ultimas limites ; nun­
ca a ruína das almas fôra tão completa, já 
que é a propria fé dos povos que se destr6e 
até nos fundamentos ; járnais o escandalo fôra 
nem tão extenso, visto que se tornou escan­
dalo nacional, nem tão desastroso, já que 
portanto, mais que nunca, o Salvador necessi­
ta d 'alrnas seria e generosamente reparadoras 
que o auxiliam a satisfazer por esses ultrajes 
comrnettidos contra Deus e reergue essas ruínas 
das almas, a reparar esses escandalos horren­
dos. 
§ A VIDA DE REPARAÇÃO É MUITO ES­
PECIALMENTE O QUINHÃO DA ALMA EU­
CHARISTICA. - Quem responderá a �ssa ne-
170 1 9.• dia 
cessidade urgente do Coração de Jesús e da 
Igreja ? Sem duvida, todas as almas de bôa 
vontade que querem amar a Deus e a seus 
irmãos, porém muíto especialmente as almas 
eucharisticas. A vida de reparação é mais es­
pecialmente o quinhão da alma eucharistica 
porque ella vive sempre com Jesús-Hostia e 
Jesús-Hostia é o objecto principal, o modelo 
e o meio das nossas reparações. 
1 .0 Primeiramente Jesús-Hostia é o ob­
jecto principal da vida de reparação. Com 
effeito, conforme havemos desenvolvido em 
outro lugar, é principalmente na sagrada Eu­
charistia que N. Senhor é ultrajado ,da ma­
neira mais cruel ; é a profanação da Eucha­
ristia que é para o homem o crime mais as­
sombroso, visto que o faz comer e beber a 
sua propria condemnação ; é pelo desprezo 
ou pelo abandono do Deus da Eucharistia que 
,os povos se afastam dos soccorros da vi�a. 
passam fatalmente a uma especie de aposta­
sia pratica, e acabam, perdendo a fé, por tor­
nar irrepatavel a sua ruína. E' pois para este 
lado que se devem volver principalmente os 
esforços da alma reparadora. 
2. o Ella acha aliás, na Eucharistia, um 
modelo perfeito da vida de reparação, por-
Vida de reparação 171 
quanto que faz Jesús no tabernaculo? O'ra, 
immóla-se, repara ; está sempre vivo para in­
terceder em favor dos pobres peccadores ; está 
sempre occupado em reparar o mal que faze­
mos a Deus e a nós proprios ; vive verda­
deiramente duma vida de reparação, repara­
ção universal e perpetua, reparação levada 
a effeito no silencio e na paz, reparação bem 
humilde e bem occulta, reparação pela obe­
diencia mais absoluta, pela abnegação mais 
completa, pelo dom mais integral de si mes­
mo. Almas reparadoras, olhae e fazei segundo 
o modelo que vos é apresentado; nas vossas 
horas de adoração, contemplae Jesús viven­
do na Eucharistia ; amae, como elle, a Deus e 
aos homens ; dedicae-vos como elle e com elle ; 
reparae como elle e por elle. 
3 .0 Porque eÜe é não sómente o modelo, 
mas ainda e sobretudo o meio da nossa re­
paração. A alma eucharistica deve apropriar­
se pelo amor e pela união, das satisfações de 
Jesús, e offerecel-as em seguida a Deus como 
um bem que lhe pertence a ella mesma. e 
com o qual póde pagar as dividas do univer­
so inteiro. Com os labias tintos do sangue de 
Jesús, faz ouvir essa voz que fala mais elo­
quentemente que a do sangue de Abel, e al-
172 19.• dia 
cança misericordia. Offerece-se a si propria 
como uma só victima com Jesús, regando o 
seu sacrifício com as lagrimas santas do Sal­
vador para lavar os crimes do mundo, e me­
rece ser ouvida por causa do respeito que 
Deus dedica a seu divino Filho, com quem 
ella faz uma causa só. Como vimos alhures, 
Jesús, cujo terno Coração não póde soffrer 
que os desejos duma alma que o ama fiquem 
imperfeitos, remata-os por si mesmo ; suppre 
as homenagens de reparação que quereríamos 
offerecer a seu pae, e offerece-as elle proprio 
em nosso nome de maneira que nada lhes 
falte. Completa assim os trabalhos da alma 
reparadora, e, j'leja pelos merecimentos do 
Salvador, seja pelos de seus Santos, a tarefa 
dessa alma se acha inteiramente cumprida ( 1 ) . 
§ 2.° FORMULA GERAL DE REPARAÇÃO. 
- Para que a obra da reparação seja com­
pleta, podemo-nos propôr reparar todo o mal 
que o peccado tem feito ao proprio peccador, 
a Deus e á Igreja. 
Divino Salvador, por vós e por meio de 
vós quero reparar de modo universal e per-
( I ). Na sua intenção, que Nosso Senhor accei­
ta, de algum modo, como si fosse plenamente reali­
zada, 
Vida de acção de graças 173 
petuo todo o mal que se faz no mundo e 
especialmente no vosso santuario : 
A respeito dos proprios peccadores, uno­
me : 1 .0 á vossa contrição que repara, tanto 
quanto possível , todas as nossas iniquidades, 
e applico-a a elles para purificai-os de todos 
os séus peccados eqtquanto culpas ; 2.0 uno­
me ás vossas satisfações para expiar todas as 
penas que são devidas a esses peccados, e 
que eu quizera !Carregar todas �<;obre mim 
comvosco. 
Com relação a Deus, uno-me : 1 .0 ao 
acto de desaggravo que não cessaes de offere­
cer-lhe para lhe restituir a gloria que o pec­
cado lhe ha roubado ; 2. o zo amor que o vosso 
Coração lhe testemunha para lhe restituir a 
alegria que o peccado lhe tira. 
A respeito da Igreja, offereço os me­
ritos da vossa Paixão, de que ouso apropriar­
me, em virtude da união que me haveis dado 
comvosco, para restituir á Igreja padecente 
todos os meritos satisfactorios que o peccado 
lhe tem feito perder ; para restituir aos mem­
bros da Igreja militante todas as graças de que 
o peccado os tem privado ; para restituir em·
fim aos anjos e aos santos todo o accrescimo 
174 19.• dia 
de gloria, de amor e de alegria que o peccado 
lhes tem tirado. 
Podemos aprofundar estes diversos pon­
tos, que são todos fundados na theologia ; 
nelles veremos, duma parte, que o peccado é 
um mal universal neste sentido que o pecca­
do causa mal, de certo modo, a Deus e a 
todas as creaturas ; e, doutra parte, que Jesús 
temsido o Reparador universal de todo esse 
mal, e que, unindo-se ao seu divino Coraçã·o, 
nós participamos dessa reparação geral, e nos 
apropriamos della, de alguma sorte, por for­
ma a podermos offerecer, c..om Jesús, urna re-
paração completa. 
· 
§ 3 . As INDU"STRIAS DE STA. GERTRU: 
DES PARA A REPARAÇÃO. - 1 . o Reparação 
pelas desordens do carnaval. - No domingo 
da Quinquagesima, Gertrudes viu o Salvador 
que fazia annotar no Livro de vida todas as 
reparaÇões que ella propria e suas irmãs lhe 
offereciam pelos tres dias que o mundo passa 
nas desordens do carnaval. "Retríbuír-vos-ei, 
disse-lhe Jesús, por todos esses serviços com 
uma medida cheia, apertada, amontoçzda e 
transbordante. Porque o meu Coração huma­
no, como o vosso, é bem mais sensível aos 
bons officios que me pres�am no dia das mi-
Vida de acção de graças 175 
nhas dôres, do que aos que me podem prestar 
no tempo da prosperidade. Assim como David 
quiz receber no seu palacio e admittir á sua 
mes� os filhos de Berzellai que o haviam aco­
lhido no tempo em que fugia á perseguição 
de Absalão, e se mostrou reconhecido para 
com elles até á morte, assim tambem vos ad­
mittirei á mesa das minhas delicias, e serei 
grato durante toda a eternidade áquelles que 
me acolhem neste momento em que o mundo 
me persegue" . O Salvador recommendou em 
seguida que lhe offerecessem todas essas obras 
ds reparação em união da sua Paixão, que 
lhes dá todo o seu meríto, e como Sta Ger­
trudes lhe pedisse que Ih� ensinasse o modo 
de fazel-o, Nosso Senhor indicou-lhe, para 
este fim, a oração feita com os braços em 
cruz, pela qual representamos, aos olhos de 
Deus, seu divino Filho crucificado. 
2.0 Reparação pelas blasphemias. - Sta. 
Gertrudes (11 , 1 00 ) , tocada até o fundo 
d'alma de uma injuria que ouvira contra Nos­
so Senhor, offereceu-lhe, com todo o affecto 
do seu coração, este a c to de desaggravo : 
"Saúdo-vos, ó pérola vivificante_ da divinda­
de ; saúdo-vos, flôr sempre fresca da natu­
reZa humana, meu amabilíssimo Jesús, · meu 
176 19.• dia 
soberano, minha unica salvação! " O Se­
nhor respondeu : "E eu tambem te saúdo, eu 
que sou teu Creador, teu Redemptor, teu 
Esposo; eu que te adquiri ao preço de todo 
o meu §.angue" . Depois deu,. lhe testemunhos 
de affecto- tão terno, que os santos ficaram 
enlevados de admiração ; e accrescentou : 
"Todo aquelle que me saudar como o fizéste 
para reparar as blasphemias que se commet­
tem contra mim, recebertÍ de minha parte 
iguaes testemunhos de affecto" (IV, 32) . 
"Appliquemo-nos, conclúe o livro, a 
bemdizer o Senhor com todo o ardor da no5-
sa alma quando ouvirmos alguma blasphenfla. 
e si o não pudermos fazer com tanto affecto 
quando Gertrudes, offereçamos-lhe ao menos 
o desejo de pôr nisso todo o desejo e todo o. 
amor de todas as creaturas, e tenhamos con­
fiança de que o seu Coração dulcíssimo accei­
tará essa bôa vontade" 
3 .0 Reparação pelos sacrilegios. - "Sue­
cedeu um dia que, ao dobrarem os paramen­
tos, deixaram cair uma hostia que fôra apre­
sentada ao altar, e da qual duvidavam si es-.. 
tava consagrada ou não. Gertrudes r.ecorreu 
logo ao Senhor, e sabendo delle que aquella 
hostia não estava consagrada. concebeu ex-
O servo de Decs 
P. ANDRÉ PRÉVÓT 
Primeiro mestre de noviços da Congreg. 
dos Padres do S. Coração 
morto no Senhor em 26 de Nov. de 1 !1 1 3. 
Vida de acção de graças 177 
trema alegria de vêr que tal irreverencia fôra 
poupada ao seu Bem-Amado. Mas não obs­
tante; pensando em tantos ultrajes que Jesús 
recebe no sacramento do seu amor, disse-lhe : . 
"Já que sois tão offendido, Senhor, não só 
por vossos inimigos, mas ainda por aquelles 
que deveriam ser vossos amigos, e ás vezes, 
o que é summamente digno de lagrimas, pelos 
vossos proprios sacerdotes e pelos religiosos, 
não direi nada a minhas irmãs, afim de vos 
não privar das satisfações que ellas vos que­
rem offerecer a respeito dessa hostia, e que 
serão para vós uma dôce consolação" . Ac­
crescentou ainda : "Senhor, fazei-me conhecer 
qual ·a satisfação que o vosso Coração mais 
acceitará, porque tratarei de effectual-a, ainda 
quando tivesse para isso de consumir todas as 
minhas forças" . Nosso Senhor fez-lhe co­
nhecer que acceitaria de bom grado que lhe 
recitassem duzentos e vinte e cinco Padre­
.Vossos em honra dos seus membros sagrados, 
- que se fizesse o mesmo numero de actds 
de caridade para com o proximo, como fazen­
do-os para com elle proprio, em união da 
�aridade que elle tem por nós, - e que. se 
privassem o mesmo numero de vezes dos .pra­
zeres inúteis da terra para dar prazer a Deus" 
178 19.• dia 
( III, 1 3 ) . Oh ! como são grandes e ineffa­
veis a bondade e a misericordia do nosso ca­
ridoso Salvador, em acceitar essas ligeiras sa­
tisfações de nossa parte ! Offereçamo-lh'as . de 
todo o coração, contanto que a sua liberali­
dade supprirá o que faltar nellas, e que as suas 
proprias satisfações completarão a reparação 
que lhe tivermos querido fazer. 
4.0 Reparação universal. - "Uma se-
' gunda-feira antes de Ascensão, Gertrudes (li, 
1 44) , prestando a uma irmã doente serviços 
que lhe excediam as forças, offereceu-os ao 
Senhor em satisfação por todos os peccados 
dos homens. Então pareceu-lhe que ella acor­
rentava com uma corrente de ouro, symbolo 
da caridade, uma multidão immensa de ho­
mens e de mulheres, e que os trazia ao Senhor. 
E o proprio Senhor, cheio de misericordia e 
de ternura, mostrando um maravilhoso con­
tentamento, acceitava essa offerta com grande 
favor, como faria um rei que recebesse de um 
dos seus mais caros officiaes todos os seus 
inimigos que este lhe trouxesse prisioneiros 
para fazer a paz com elle e servil-o em seguida 
a seu gosto" . 
No dia seguinte, como, na missa, espu­
sesse ella ao Senhor os defeitos e as �perfei-
Vida de acção de graças 179 
ções de todos os homens justos, rezando com 
ardor pela emenda delles, viu o dôce orvalho 
da graça descer aos corações de totdos os 
justos para fazel-os reflorir com um novo 
brilho e dar-lhes novo vigor. 
CONCLUSÃO PRATICA. - Offereçamos 
habitualmente as nossas acções ao Coração de 
Jesús em espírito de amor e de reparação se­
gundo a piedosa formula : Senhor Jesús, of­
fereço-vos esta acção em união com o vosso 
divino Coração, e pelo Coração immaculado 
de Maria, em espírito de amor e de reparação. 
VIGESIMO DIA 
Vida de reparação (continuação) 
§ DISPOSIÇÕES COM QUE A ALMA EU­
CHARISTICA DEVE ANIMAR A SUA VIDA DE 
REPARAÇÃO. - Reduzimol-as a tres dispo­
sições de Sta. Gertrudes : a vontade plena, a 
gratidiio, o desejo sem limites. · 
Para que a reparação que offerecemos 
ao· Coração de Jesús lhe seja plenamente agra­
davel, cumpre que parta do fundo do cora­
ção, que lhe sejamos gratos por elle se dignar 
servir-se de nós para consôlo das suas dôres 
e para a salavção de nossos irmãos. Para que 
essa reparação seja completa, faz-se mistér 
que, pelos nossos desejos, a augmentemos na 
medida dos males que queremos reparar, e 
que, pela união ás satisfações do Salvador, 
lhe demos um merito tão extenso quanto os 
nossos desejos. 
I . o Já vimos como Sta. Gertrudes, ani­
mando-se de vontade plena de satisfazer por 
Vida de reparação 181 
todos os peccados do mundo, conseguira, por 
suas preces ardentes e carícias affectuosas, apla· 
car o Senhor irritado e tornai-o propicio aos 
pobres peccadores. 
2.0 Era tambem porque ella recebia com 
gratidão os soffrimentos que Jesús lhe enviava 
ao corpo ou á alma, para expiar os crimes 
do mundo, que o seu sacrifício era recebido 
�m odor de suavidade e ella consolava plena­
mente o dulcíssimo Salvador. Jesús lhe en· 
sinara aliás que a gratidão dá peso aos soffri. 
mentos mais pequenos e compensa o que lhes 
poderia faltar como valor satisfactorio. 
3 . 0 Gertrudes finalmente, como lh'o en­
sinara o Salvador, acompanhava as suas me­
nores obras satisfactorias duma intenção uni­
versal e de desejos sem limites ; e, para supprir 
á importancia dos seus desejos, unia-se ás sa­
tisfaçõesde Jesús e dos seus santos, e com­
pletava assim a tarefa de reparação. 
§ 5 . MEIOS PRATICOS PARA MULTI· 
PLICAR OS RECURSOS DA REPARAÇÃO. -
Exporemos varias delles, tão faceis quanto 
animadores, que nos são suggeridos por Sta. 
Gertrudes e que podem tornar�se de eJ_Ctrema 
riqueza quando empregados segundo o. espírito 
que a animava. 
182 20.o dia 
1 .0 O abandono. - O mal que queremos 
reparar provém de que os homens se revol­
taram contra a vontade de Deus, que tudo 
havia disposto para o maior bem de todos ; 
o remedio, pois, e a reparação acham-se em nos 
conformarmos, em nos abandonarmos plena­
mente a essa vontade sapientissima e boníssi­
ma. De outro ponto de vista, si Nosso Senhor 
quer servir-se de nós para a obra da repara­
ção, não esqueçamos que necessita, para este 
fim, de almas que lhe sejam inteiramente 
abandonadas, de que elle possa fazer . o que 
quizer. Si achar almas assim, executará nellas 
essa obra tão necessaria de modo todo suave 
para essas proprias almas, todo consolador 
para o seu divino Coração, todo frutuoso 
pára a Igreja. E' só deixai-o fazer e aban­
donar-se a elle ( 1 ) . Encarada por esta forma, 
e de certo é o ponto de vista mais verdadeiro. 
a reparação nada offerece de terrível, nada de 
triste, nada de · penoso mesmo : é uma obra 
optima, toda suave, toda de paz, para a qual 
nos entreg�mos �orno instrumentos doceis 
( 1 ) Isto é, á sua Providencia que nos tornará 
leve o Peso dos sacrifícios necessarios, e á sua graça. 
que nos attrahir-á a retomarmos spbre nós o jugo 
suave dos sacrifícios volW!tarios. 
Vida de reparação 183 
nas mãos todas .bemfajezas de Jesús, á dispo· 
sição do seu Coração tão terno e tão mise· 
ricordioso, afim "de que por nós e em nós 
ponha elle balsamo em toda parte, cure todo 
mal, console toda dôr, restabeleça por toda 
parte a ordem e a paz. Ora, não começará 
elle por nós mesmos, e não seremos nós os. 
primeiros curados, consolados, pacificados, 
restabelecidos na ordem e na abundancia de 
todos os bens ? Que temos pois a receiar, e 
porque nos inquietarmos? Abandono, aban· 
dono, sem receio e sem retrocesso. A'quelle 
que é toda paz, toda suavidade, toda ordem 
e todo bem. 
z.oA humildade. - O orgulho é o prin­
cipio de todo peccado, donde resulta que a 
humildade destróe o peccado na raiz, estanca 
ná proprja fonte os males que produziu, e 
repara directamente a offensa que fez a Deus. 
Por isto a humildade é o caracter especial da 
reparação de que Jesús nos dá o exemplo na 
eucharistia ; ahi, ainda mais que na Incarna_.. 
ção, elle se anniquilou, despojando-se não só 
da forma divina, porém até da forma huma. 
na, e não apresentando mais aos nossos sen. 
tidos sinão simples apparencia sem realidade. 
Alma eucharistica, eis ahi o vosso modelo: 
184 20.0 dia 
a humildade é a virtude principal da alma 
eucharistica, corno a humilhação lhe é a trilha 
cornrnurn : deixae-vos hurrtílhar, occultae-vos, 
guardae silencio, despojae-vos, tanto quanto 
puderdes, da vossa personalidade ; deixae-vos 
reduzir a nada ; sêde submissa a toda creatu­
ra ; não vos julgueis nada ; acceitae todos os 
rnallogros, todos os esquecimentos, todos os 
desprezos ; supportae todas as contradições, 
todos os rnalentendidos, sem nunca dizerdes 
nada para vossa justificação ; guardae silen­
cio, corno Jesús na Eucharistia, sempre e em 
toda parte quando se tratar de vós mesmo : 
na· Eucharistia, elle se cala completamente ; 
imitae-o, pois elle vos dá o exemplo, elle o 
Mestre, a vós que sois o criadinho, para que 
façaes corno elle faz. Eis a irnrnolação que 
elle pede de vós, irnrnolação que não é tão 
espantosa quanto a do Calvario, e que mesmo 
a sua graça vos tornará suavíssima, mas irn­
molação que nem por isso é menos séria, im­
molação que fará morrer o vosso amor pro­
prio pela' causa de Jesús, irnmolação que vos 
tornará sincera e efficazmente reparadora. 
3 .0 A Adoração, o Louvor, a Acção de 
graças. - Mostrárnos em outra parte corno 
Vida de reparação 185 
podem ser satísfactorias e que recursos offe­
recem á alma para a reparação. ( 1 ) . 
4.0 A Cruz. - Foi pela cruz que Jesús 
reparou todos os peccados do mundo ; o sa­
crifício eucharístíco é méra reproducção do 
sacrifício da Cruz. Todas as nossas penas são, 
no plano geral da redempção, um meio de nos 
unirmos á Cruz de Jesús para reparar os nos­
sos peccados e os de nossos irmãos. Acceíte­
mol-as neste espírito. Abandonemo-nos meiga 
e amorosamente, sem temor e sem reserva, a 
todas essas cruzes providenciaes que Jesús nos 
envia na sua mísericordia ; deixemol-as fazer 
inteiramente a sua obra de expiação. Por essas 
cruzes e pelo sacrifício que a sua graça nos 
fará ajuntar a ellas, completaremos o que falta 
de nossa parte á Paixão do Salvador por seu 
corpo que é. a Igreja ; por ellas completaremos 
de nossa parte a grande obra da rwaração 
que Jesús operou pelo sacrifício do Calvario e 
que applica ás nossas almas pelo sacrifício da 
Eucharistia. 
5 . o O Amor em fim, o amor que resume 
tudo e completa tudo, o amor que dá todo o 
( I Não temos que falar aqui da c·ommunhão 
reparadora, missa reparadora, adoração repãradora, 
�ue, de resto, se prendem aos meios que indi<:ámos, 
186 20.o dia 
valor ás demais reparações, e que póde sup­
prir todas. O amor da alma eucharistica é 
balsamo para as chagas do Coração de J esús, 
é uma dôce compensação por todas as home­
nagens que lhe hão roubado, é uma agradavel 
satisfação por todos os ultrajes que o fazem 
supportar. Amemos, amemos, e é o bastante ; 
amemos por nós mesmos, amemos por nossos 
irmãos ; consumamo-nos no amor ; espalhe­
mos por toda parte o amor em torno de nós. 
Cerquemos Jesús de amor, deixemol-o, em 
nosso coração e por nosso coração, .amar 
tanto quanto deseja, tanto quanto necéssita ; 
levemos-lhe em seguida todo o amor que elle 
pede em troca, reunindo no nosso coração 
o affecto de todas as suas creaturas para offe­
recer-lh'o. Façamos todos os esforços para 
que nosso unico amigo ame e seja amado 
tanto .orquanto quer, e será a reparação mais 
dôce que lhe possamos proporcionar. A alma 
eucharistica que diffundir em torno de si o 
amor, reparará todo mal em torno de si ; a 
alma eucharistica que cobrir seus irmãos com 
seu amor tanto quanto puder, contribuirá 
tanto quanto póde para o perdão e salvação 
delles. Como Magdalena, a alma que ama 
muito por si mesma e por seus irmãos, al-
Vida de reparação 187 
cança que muitos peccados lhe sejam per� 
doados a ella e a seus irmãos : Remittuntur 
peccata multa, quoniam dilexit multum. 
(Lucas, VII, 47) .
CONCLUSÃO PRATICA. - Apropriar· 
nos de algumas dessas industrias da vida de 
reparação. 
VIGESIMO PRIMEIRO DIA 
A alma consoladora do Coração de Jesús 
segundo Sta. Gertrudes 
Consolantem me quresivi; Jesús procura 
consoladores, sobretudo para as dôres intimas 
do seu Coração, que é tão affligido ; pede que 
derramem balsamo nas feridas de seu Cora­
ção, que são de muito as suas feridas mais 
cruéis, porque lhe fôram feitas na casa dos 
que o amavam, no santuario do seu Templo. 
Porquanto os outros, diz-nos elle, contenta­
ram-se com bater-me nas costas, porém os 
meus amigos, ou pelo menos aquelles que o 
deviam ser, aquelles que me eram consagrados, 
bateram no meu Coração; feriram-me no pro­
prio Sacramento do meu amor, no altar, na 
mesa sagrada, no tabernaculo. 
O' Coração eucharistico de Jesús, que 
dôr não é a vossa ! Quem saberá compadecei-a 
plenamente, quem achará consôlo igual aos 
vossos soffrimentos occultos ? Só a alma eu-
Alma consoladora do S. Cor. 189 
charistica poderá comprehender as dôres de 
Jesús na Eucharistia. Jesús, aliás, lh'as revelará 
nessa intimidade da vida de adoração, confiar­
Ih' as-á como a um amigo bem sympathico, e 
lh'as fará sentir por uma viva Compaixão. 
Fal-a-á achar as consolações proprias para 
amenizai-as ; ensinai-a-á enfim a cumprir a 
tarefa, tão necessaria hoje em dia, da repa­
ração, e a fazer descer a misericordia sobre 
seus irmãos culpados. 
§ 1 . E' SOBRETUDO O CORAÇÃOEU­
CHARISTICO DE JESÚS QUE CUMPRE CON­
SOLAR. - Acabamos de dizel-o, porém para 
mais clareza desenvolvamos este principio de 
que os soffrimentos do Coração eucharisticà 
de Jesús são a renovação das dôres mais in­
timas e mais crueis da sua Paixão, e ademais 
a continuação dellas em todos os tempos e em 
todos os lugares. 
A dôr mais intima e mais cruel da Pai­
xão de Jesús, achamol-a no horto da agonia, 
onde se manifesta por aquelle terrível suor de 
sangue e por aquellas palavras de desolação 
suprema que arrancou ao Salvador. Foi : 1 .0 
o calice da justa colera de seu Pae que elle 
teve de beber até ás fezes ; 2 .0 quanto a si 
mesmo, a apprehensão e o pavor causados pela 
190 21.o dia 
vista de tantos soffrimentos a curtir na sua 
Paixão primeiramente, e depois na sua vida 
eucharistica ; 3 .0 nos seus membros mysticos, 
o peso de tantos e tão horríveis crimes que pe­
savam todos sobre elle, como si dclles fôsse 
culpado, por causa da sua união comnosco ; 
o sentimento da ingratidão dos homens que
não correspondiam a tanto amor sinão por 
novos ultrajes ; acima de tudo, este pensamen­
to de que grande numero se perderiam apesar 
da sua Paixão, ou mesmo por causa da sua 
Paixão. 
Ora, é esta agonia que se renova e se 
perpetúa em todos os altares : 1 .0 Jesús ahi 
vem beber de novo até ás fezes o calice da 
colera de seu Pae, que é incessantemente irri­
taclo pelos crimes do mundo, e cujas vingan­
ças elle precisa incessantemente sustar ; 2 .0 
Jesús ahi vem unir-se a esses homens sacríle­
gos, para caxregar mais intimamente, de al­
guma sorte, o peso dos peccados delles, por­
que é obrigado a soffrer-lhes todos os trata­
mentos mais odiosos e mais ignobeis, e é ahi 
que se commettem as suas iniquidades mais 
monstruosas, que recáem directamente sobre 
elle. E' ahi que a ingratidão delles se mostra 
tanto mais negra quão mais terno é o seu 
Alma consoladora do S. Cor. 191 
amor para com elles. E' ahi que este proprio 
amor se torna uma causa mais terrível de 
endurecimento e de reprovação para aquelles 
dt que elle fizera entretanto seus amigos de 
coração. Quem dirá agora o quanto o seu 
Coração é machucado, dilacerado, esmagado 
no lagar da dôr ! 
E essa agonia, como o dizemos, renova­
S>! para elle em todos os tempos e em todos os 
lugares. As angustias tremenclas do Coração 
de Jesús multiplicam-se tantas vezes quantos 
os dias em que se offere'ce o Santo Sacrific'io, 
tantas vezes quantos os lugares em que se 
ergueu um altar, novo Calvario para a Victi­
ma eucharística. Contae, si puderdes, e vêde· 
si ha uma dôr como a do Coração de Jesús 
na Eucharistia : uidete si est dolor sicut dolor 
meus! 
E' portanto o Coração eucharistico de 
Jesús que a alma amante deverá procurar es­
pecialmente consolar. Cumpre que ella mul­
tiplique as suas consolações segundo a mul­
tidão das dôres desse Coração amabilíssimo : 
secundum multitudinem dolorum meorum 
in Corde meo consolationes la!tificauerunt 
animam meam. Cumpre que, pelas industrias 
do seu amor, torne universaes e pe·rpetuas as 
1íl2 21.o dia 
suas consolações (I ) ; e é a tarefa que deseja­
mos ajudai-a a cumprir, conforme as indus­
trias de Sta. Gertrudes, conforme as indus­
trias que o proprio _Salvador ensinou. 
Indiquemos primeiro, de modo geral, di­
versas formas universaes que se podem dar a 
todas as industrias que vamos propôr : 
1 .0 Pela União ao altar (2) , propomo­
nos seguir Jesús a todos os lugares em que o 
seu Coração eucharistico vae soffrer, afim de 
lhe fazermos companhia e de estarmos em 
toda parte onde elle soffre, para consolai-o. 
O sacerdote, especialmente, póde-se propôr de­
sempenhar esta funcção de consolador, que 
lhe convém mais que a ninguem, visto que 
elle é o homem da Eucharistia, desempenhai-a 
de modo universal e perpetuo, considerando­
se como "tendo todo o universo por paro-
( 1 ) Sente-se bastante que essas expressões 
" universal, perpetuo ", só se devem entender no sen­
tido dum piedoso desejo, como na .prece " Louvado, 
adorado, amado seja o Coração eucharistico de Je­
sús, a todos os instantes, em todos os tabernacul.os ... " 
Mas nem por isto deixa esse desejo de ter grande 
valor para N. Senhor, como elle o mostra a Sta. 
Gertrudes. 
(2) Póde-se adquirir em Avignon, na livraria 
Aubanel, uma pequena folha i mpressa em que se acha 
exposta a pratica da União ao altar. 
Alma consoladora do S. Cor. ta3 
chia" , tal como Sta. Brígida o aconselhava a 
um santo sacerdote de seu tempo, e como o 
bemaventurado P. Lefevre o praticava ; e, em 
virtude desse encargo, applicar-se-á elle a fa­
zer guarda e consolar Jesús em todos os seus 
tabernaculos. 
2.0 Podemos em seguida empregar a for­
ma da adoração universal e perpetua junto a 
todos os tabernaculos ; - da missa universal 
e perpetua ao pé de. todos os altares ; - da. 
communhão universal e perpetua por Jesús­
Eucharistia com todas as almas que commun­
gam, e nas quaes entramos com elle para 
amai-as com elle e amar a elle com ellas, para 
consolai-as com elle e consolai -o com ellas ou 
por ellas. 
Que ventu'ra, que alegria sermos assim 
como o caridoso Samaritano para Jesús, nos­
sa dulcíssima victima, velarmos ao pé delle, 
consolarmos o seu Coração, derramarmos-lhe 
nos pés oleo e vinho, o oleo da misericordia 
t o vinho do nosso amor ! Damos por essa 
forma a Jesús aquillo de que elle mais ne­
cessita agora, aquillo que o seu Coração re­
clama com mais instancia. 
Ouçamos esse appello que elle nos · diri-
194 21.o dia 
ge do fundo do tabernaculo, como o fez va­
rias vezes para com seus santos : "Protege-me 
contra a furia de meus inimigos ; guarda-me 
no teu coração para consolar o meu Coração 
que é tão affligido !-Seja o teu amor balsamo 
nas minhas feridas ; o teu amor far-me-á es­
quecer os crimes dos homens, porque sou 
mais sensível ao amor do que á offensa. Sê 
victima commigo por esses cruéis que me fa­
zem soffrer tanto e que meu Coração não cessa 
de amar. Viva_ commigo por elles numa im­
molação continua ; não me recuses nada para 
fazer triumphar a minha misericordia e sal­
var essas almas ; consençe mesmo em soffrer 
sem consôlo, afim de consolar meu Coração 
mais efficazmente. Fica sempre diante de mim 
para me desaggravar, para reparar tantos ul­
trajes de que não cessam de me abeberar" 
Quando Jesús nos vir assíduos na prati­
ca da reparação, da adoração perpetua, da 
adoração nocturna, da communhão repara­
dora, étc . , dir-nos-á ainda como disse aos seus 
santos : "Alegrei-me, alma dilecta, quando te 
vi vir para junto de mim. Quero consolar-me 
comtigo, quero dizer-te o que me causa mais 
dôr, o que dilacera mais cruelmente o meu 
Coração : são as injurias que recebo nb meu 
Alma consoladora do S. Cor. 195 
Sacramento de amor, são os crimes desses 
novos Judas que eu fizera meus amigos, e 
que me tratam agora como o mais cruel dos 
inimigos. A cólera de meu Pae vae explodir 
contra ellcs ; já lhe não posso suster o peso. 
Ajuda-me pelas tuas reparações, pois o meu 
Coração ama sempre esses ingratos, e quizera 
salval -os. Meu ·Coração ser-te-á vivamente 
gtato de que me venhas consolar no proprio 
lugar onde mais me fazem soffrer, e por sua 
vez o teu amigo da Eucharestia te inundará 
de suas consolações" . . 
CONCLUSÃO PRATICA. - Pedir .a graça 
de vir a ser um consolador do Coração de . 
Jesús. 
VIGESIMO SEGUNDO DIA 
A alma consoladora do Coração de Jesús 
(continuação) 
§ PRATICA GERAL DA CONSOLAÇÃO DO
SAGRADO CORAÇÃO DE JESÚS. - Podemos 
reduzil-a aos pontos seguintes : 
1 .0 Antes de tudo, o Amor. A causa de 
que o coração afflicto mais tem necessidade 
é de sentir uni coração que o ame, que lhe 
seja sympathico e dedicado, um coração que 
saiba comprehender-lhe as 'dôres e allivial-as. 
2.0 Depois a Compaixão, que toma de 
alguma sorte sobre si o soffrimento do cora­
ção afflicto para descarr.egal-o delle ; é o que 
pede o Coração de Jesús por estas palavrás : 
"Busquei alguem que se affligisse commigo" 
3.0 A Reparação, que cura completa­
mente o mal da pessôa afflicta,destruindo­
lhe os effeitos ou mesmo supprimindo-lhe as 
causas. 
Finalmente, esforcemo-nos, para acabar 
Alma consoladora do S. Cor. 197 
de consolar o Coração ·afflictissimo de Jesús, 
por fazel-o esquecer inteiramente as suas dôres 
proporcionando-lhe toda sorte de alegria, de 
prazer, de gloria. A alegria primeiramente, 
dando-lhe, pelas nossas orações e pelos nossos 
sacrifícios, o meio de amar, de amar tanto 
quanto quer, pois é o amor que produz a ale­
gria ; falamos disto em outro lugar. O prazer 
( I ) em seguida, fornecendo-lhe os meios de 
dar tanto quanto quer, segundo este prin­
cipio tão verdadeiro : O mais dôce dos praze­
res é poder causal-os ; fazendo-o exercer a 
gratidão, tanto quanto deseja, segundo est' 
outro principio : O prazer dos bons corações 
é a gratidão. Finalmente, a gloria dando-lhê 
o meio de perdoar tanto quanto quer, por­
quanto a gloria do Salvador outra não é sinão 
a manifestação da sua misericordia : falamos 
disto igualmente em outro lugar. 
Agora, para to�;nar essa consol�ção do 
Corãção de Jesús universal e perpetua, appli­
quemol-a : 1 .0 a todas as su:ts dôres passadas, 
as dôres da sua vida mortal, mórmente da 
sua Paixão ; 2.0 a todas as dôres presentes da 
( 1 ) E' de notar que S, Thomaz, tratando das 
consolações que se podem proporcionar aos a f fli­
ctos, -põe em primeira linha o prazer, delectatio; a 
compaixão vem só depois. 
198 22.0 dia 
sua divina pessôa na Eucharistia ; 3,0 a todas 
as suas dôres nos membros do seu corpo mys­
tico. na terra e no purgatorio. 
§ 3. o As INDUSTRIAS QUE NOSSO SE­
NHOR· ENSINOU A STA. GERTRUDES PARA 
CONSOLAR O SEU DIVINO CORAÇÃO. - 1 .0 
Jucundarri mansionem ( 1 ) , - o coração de 
Sta. Gertrudes, repouso agradavel para o Co­
ração de Jesús. Sta Gertrudes, sentindo-se 
muito fatigada, pedia a N. Senhor que lhe 
cbncedesse um pouco de repouso : "Que pre­
féres, respondeu-lhe o bom Mestre, que repou­
ses. em mim ou que eu repouse em ti r - Eis 
aqui a vossa serva, Senhor, faça-se em mim 
segundo o vosso beneplacito. - Pois bem! si 
consentes em supportar ainda esta fadiga, 
proporcionas-me o mais dôce repouso : arrimo­
me ao teu coração, e consólo-me nelle dos 
máos tratos que tantos ingratos me fa:zem 
soffrer. Ao mesmo tempo o conc�Kto dos teus 
bons desejos vem-me alegrar os ouvidos com 
uma dôce harmor'lia; os bons sentimentos de 
tu'alma e.?(halam para mim o perfume de to­
das as virtudes; o amor que dirige para mim 
( I ) Mansão agradavcl : é o termo pelo qual a 
Igr:ja, na cração do breviario romano, carecteriza 
o coração de Sta. Gertrudes. 
Alma consoladora do S. Cor. 199 
todas as pulsações do teu coração forma para 
mim como uma. brisa refrigerante; prefiro á 
mais dôce bebida a terna caridade que te anima 
pela salvação de todos os homens, e possúo ao 
alcance da minha mão o thesouro do teu cora� 
ção onde amontôas os r�cursos para fazer 
bem a teus irmãos .que estão na necessidade. 
Vê assim que consolações me proporciona 
essa fadiga passageira que queres súpportar por 
mim" 
Animemo-nos a supportar valentemente 
as nossas fadigas, as nossas indisposições pe­
quenas ou grandes, pelo pensamento de que 
podemos proporcionar semelhantes consola� 
ções ao nosso unico amigo. As nossas penàs 
serão assim santificadas pelo puro amor, e 
plenamente utilizadas pela misericordia do 
Salvador para a salvação de nossos ·irmãos. 
2.0 O jardim da alma eucharistica. Eis 
aaora para a alma eucharistica o meio de mul� 
tiplicar as consolações e as alegrias do hospede 
do tabernaculo. Varias vezes Sta. Gertrudes 
procurou alegrar Nosso Senhor pelas meigas 
industrias da sua piedade, e Nosso Senhor lhe 
mostrava quanto se comprazia nisso : Um 
dia, dizendo-lhe a Santa : "Como a vossa
bondade póde comprazer�se tanto nas· peque-
200 22.• dia 
nas co usas que eu faço por vós ? " , o Senhor 
respondeu-lhe : " Vejo teu coração sempre oc­
cupado em consolar-me por mil industrias 
diversas que fazem toda a minha alegria. 
Comprazo-me tanto nellas quanto se com­
prazeria um amigo a quem o amigo, em meio 
aos mais .affectuosos abraços, conduzisse a um 
Jardtm agradabtltsstmo para the tazer res-
pirar um ar mais ameno, alegrai-o com o 
aspecto de differentes flôres, encantai-o com 
os sons duma dôce harmonia e retrescal-o 
com Frutos de fino sabor" (III, 5 5 ) . 
Eis ahi um programma bem agradavel 
que a alma eucharistica póde propôr-se exe­
cutar junto ao hospede divino do taberna­
colo : tratai-o verdadeiramente como amigo, 
para fazel-o esquecer que tantos outros o tra­
tam como inimigo ; cobril -o de abraços os 
mais affectuosos para indemnizal-o de tan­
tos ingratos que só têm para elle frieza e 
desdém; conduzíl-o a um jardim agradavel 
para lhe fazer respirar um ar mais ameno. 
em lugar desse ar do mundo todo viciado e 
empestado pelos crimes dos homens ; alegrai-o 
pelo aspecto das differentes flôres, figura das 
virtudes variadas que elle gosta de vêr nas 
almas •. suas espos�s ; encantai-o pelos sons 
http://alexandriacatolica.blogspot.com.br
Alma consoladora do S. Cor. 201 
duma dôce harmonia, pelo Amen do louvor, 
pelo Alleluia da alegria santa, pelo Deo gra­
tias da gratidão, que cobrirão o concerto in­
fernal das blasphemias do nosso seculo ; re­
frescar-lhe o paladar com os frutos primo­
rosos de toda sorte de bôas obras para fazel-o 
esquecer o amargor do · fél e do vinagre com 
que os máos o beberam. 
3 .0 O bàlsamo para as chàgas do Sal­
oador. Encaminhamos ao que dissemos, sobre 
este assumpto, em outro capítulo, onde mos­
trámos a consolação do Coração de J esús no 
nosso desejo da cruz, e onde ouvimos o Sal­
vador dizer a Sta. Gertrudes por causa desse 
desejo : ·"E' s o balsamo agradaoel das "minhas 
chagas" 
CONCLUSÃO PRATICA. - Farei hoje 
todas as minhas acções de maneira que pos­
sam consolar o Coração de Jesús. 
VIGESIMO TERCEIRO DIA 
A victima do Coração de Jesús, 
segundo Sta. Gertrudes 
Gertrudes, victima padecente. (I. 3 ) . 
"Meu coração se compraz tanto em Gertru� 
·des, dizia Nosso-Senhor a uma alma Santa, 
que me succede com frequencia, quando sou 
offendido pelos outros, procurar nella o meu 
repouso, affligindo-a com qualquer pena de 
cqrpo Õu de espírito; ella acceita essas penas, 
em união da minha Paixão, com tanta gra� 
tidão, e supporta-as com tanta paciencia e hu­
mildade, que me aéalma de repente e me obri� 
ga a perdoar, por amor della, a imnumeros 
peccadores" . . 
Gertrudes, Victima eucharistica. (111, 
30) . Jesús faz� lhe comprehender urtl dia por 
estas. palavras de Isaías : "Levantae-vos, tomae 
animo, Jerusalém" , a vantagem que a Igreja 
militante recebe da devoção dos eleitos·, nisto 
que, quando uma alma amante volve�se para 
Victima do S. Cor. 203 
Deus de todo o seu coração, com a vontade 
perfeita de reparar, si lhe fosse possível , todo 
o mal que se faz a Nosso Senhor na Sua
honra, e assim trata de suavizal-o pelas suas 
ardentes preces e carícias respeitosas, não raro 
o apazigua de tal modo, que elle perdôa ao
mundo inteiro. 
Gertrudes, victima de .desejos. (IV, 
52 ) . No dia da Exaltação da Santa Cruz, 
durante a elevação do Calice, corno Gertrudes 
offerecesse a N. Senhor os soffrirnentos da 
commr.nidade, elle lhe disse : "Sim, beberei, 
beberei este calice que o fervor dos vossos de� 
se i os encheu de tanta doçura para mim; ber 
bel-o-ei tantas vezes quantas m'o offerecerdes. 
até que me tenhaes como que embriaqado, 
para me tornardes favoravel aos oossos rogos. 
--E corno, replicou ella, ó Senhor, vol-as 
poderemos offerecer ? - Tantas vezes quantas 
formardes em vosso coração o desejo de so� 
frer por minha gloria tudo quanto se póde 
scffrer até a hora da morte'' . Depo1s o Se­
r..hor ensinou-a a formular assim esse desejo : 
"Senhor, para vossa maior gloria, fazei con� 
cordar· o meu desejo com as minhas palavras : 
eti qnizera que todo o ·soffrirnento de !iesejós 
que jamais foi sentido em vosso amor por um 
204 23.o dia 
coração humano, desde o começo do mundo 
até o fim, venha accumular-se no meu co­ração e ahi fique até o dia da · minha morte, 
afim de que esses desejos vos façam achar em 
meu coração um retiro mais agradavel, e vos 
indemnizem da ingratidlo dos homens" 
REFLEXÕES. - O amor manifesta-se 
pelo sacrifício� e o sacrifício effectuado no 
Coração de J esús exhala um ardor de suavida­
de não só para Deus que o recebe, mas tam­
bem para nós que o offerecemos, e para o 
proximo que a elle assiste. Assim, a vida de 
sacrifício, ou por outras palavras a vida de 
Victima, em união com o Coração de Jesús, 
é uma vida toda de suavidade, e, no sentido 
mais verdadeiro, uma vida de amor, de alegria 
e � paz. Pos�amos nós comprehendel-o Pos­
samos, pela pratica e 'experiencia, vêl-o e gos­
tai-o : Gustate et videte quoniam suavis est ! 
1 .0 A Victima pôde ser encarada sob 
tres pontos de vista distinctos : o soffrimento, 
que é o ponto de vista pessoal ; a substituição, 
em relação a seus irmãos ; a religião, em re­
lação á Deus. 
Do ponto de vista do soffrimento, Sta. 
·Gertrudes parece ter-se cingido á regra da 
sua Ordem, que era bastante austera, e á gran-
Victima do S. Cor. 
de regra do abandon9 á Providencia .. A regra 
de S. Bento fornecia-lhe bastantes jejuns, vi­
gílias, trabalhos e penitencias diversas para 
alimentar o fogo do seu. sacrifício ; e a Pro­
videncia sapientissima e affectuosissima de 
Jesús accrescentava-thes, além das mortifica­
ções que o attractivo da graça lhe pedia, do­
enças, trabalhos e outras provocações que lhe 
vinham activar a chamma. Quanto ao que 
pudesse faltar, a Santa achava meio de sup­
pdl-o, e de chegar a ter diante de Deus o 
merito do soffrimento dos Santos que mais 
soffreram, pelas disposições que indicámos 
precedentemente : o desejo, a união, o aban­
dono. Eis ahi tudo o que ella aprendera do 
Coração de Jesús nesse primeiro ponto de 
vista. Quem de nós não pôde aprender della 
esta sciencia da Victima do Sagrado Coração, 
apropriar-se dessas disposições e excitar-se as­
sim, como ella, a rivalizar, de alguma sorte, 
com os mais ardorosos amantes da cruz" ? 
Do ponto de vista da substituição, ve­
mos pelos trechos citados acima, e poderíamos 
juntar muitos outros, que Gertrudes esteve 
constantemente á disposição de Nosso 'Senhor 
para se immolar em lugar de seus irmãos, e 
alcançar-lhes assim e perdão. Apenas, · as mais 
206 23.o dia 
das vezes, Nosso Senhor parece haver-se · con­
tentado com soffrimentos bastante communs 
juntos a disposições extraordinarias, que lhes 
multiplicavam o merito. Ou antes, applican­
do-lhe a regra do Evangelho : Medir-vos-ão 
com a mesma medida de que tiverdes usado 
para com os outros, do mesmo modo que 
Gertrudes se substituía a seus irmãos para sof­
frer, Jesús quiz substituir-se, elle proprio e 
seus .Santos, a Gertrudes ; de modo que a 
Santa pôde apropriar-se dos soffrimentos do 
Salvador e das dos Santos como si as hou­
vesse supportado ella propria de algu� modo, 
e por esse meio os seus soffrimentos mais leves 
adquiriam valor incomparavel de satisfação 
Rara ella mesma e para seus irmãos. Aqui 
ainda, quem de· nós não se póde esforçar por 
fazer outro tanto ? Não ha nisso nada de 
triste ou de assustador. A vida da Victima 
assim comprehendida não é muito attrahente, 
toda cheia de graças e de frutos de salvação ? 
Por fim, do ponto de vista da religião, 
Sta. Gertrudes é a Victima por excellencia 
do · Coração de Jesús, que foi o perfeito Re­
ligioso de seu Pae. Ella não vive com elle 
sinão da vida de religião : o . louvor, a acção 
de graças, a oração, os desejos, a reparação, 
Victima do S. Cor. 207 
o culto, o officio divino. Ahi está toda a sua 
occupação. 
2.0 Assim ella preenche excellentemente 
os quatro fins da vida de Victima : adoração, 
acções de graças •. reparação, supplica. Estes 
quatro actos praticados em união com o Co­
ração de Jesús absorvem-lhe toda a vida. Pa­
rece entretanto que a acção de graças e a sup­
plica predominam, porque Gertrudes é uma 
alma eucharistica, e. a vida do Coração eucha­
ristico de Jesús manifesta-se principalmente 
pela acção de graças e pela oração. 
3 . o Podem -se ainda distinguir na vida 
de Victima quatro phases : a oblação, pela 
qual a Viétima é offerecida a Deus ; a immo­
lação, pela qual lhe é sacrificada, a combustão, 
pela qual é purificada, transformada, santifi­
cada ; a communhão, pela qual Deus a une a 
si e se serve della para se unir aos homens. 
Essas quatro phases acham-se na vida de Sta. 
Gertrudes como na vida de Nosso Senhor, mas 
póde-se dizer que é a ultima, a communhão, 
que mais lugar nella occupa, como na vida 
do Coração eucharistico de Jesús. A oblação 
e a imniolação fôram effectuadas pela von­
tade mais generosa ; a transformação pelo 
fogo do amor vae-se operando sempre. e cada 
208 28.0 dia 
vez mais perfeitamente ; mas é principalmen­
te a communhão que acha em que se exercer ; 
a communhão com Jesús pela unidade de co­
ração e de vida ; a communhão com os San­
tos, pela caridade mais intima ; a communhão 
com as almas pelo zelo mais devotado. 
4.0 Emfim, podem-se encarar na vida de 
Victima duas formas distinctas : a Victima do 
Calvario, a Victima euchar:istica. Parece que 
a Víctima do Sagrado Coração deve tomar 
mais particularmente a segunda dessas for­
mas, porque Nosso Senhor nos manifestou· 
o seu Coração divino especialmente na sagra­
da Eucharistia e sob a forma de sua vida eu­
charistica, como para nos dizer que a forma 
eucharistíca é , um estado mais permanente 
( 1 ) e mais commum, o estado a que elle 
chama de preferencia a Víctima do seu Sagra­
do Coração nestes ultimas tempos do mundo 
em que a Igreja parece esperar ainda por uma 
época de consolação, numa suprema effusão 
de espírito eucharistíco. 
E' sobretudo esta segunda forma que se 
patentêa na vida de Sta. Gertrudes, e ella pôde 
( 1) Sic eum volo ma-nere donec veniam, diz }e­
sús a respeito de S. João, que é o typo da victima 
eucharistica. do Sagrado Coração. 
Victima do S. Cor. 209 
�nsinar-nos que, si a virtude mais assignalada 
da Victima do Calvario é a paciencia, a da 
Victima eucharistica é antes a húmildade ; si 
a Victima do Calvario mostra mais genero­
sidade, a Victirna eucharistica distingue-se 
antes pelo abandono ; si a Victima do Cal­
vario reproduz mais perfeitamente a vida do­
lorosa do Salvador, a Victima euchatistica 
imita mais a vida de Jesús, no Santo Taber­
naculo, vida toda de louvor, de oração e 
de amor. Tal foi de preferencia a vida de Sta. 
Gertrudes, e é por isso, assim nos parece, que 
ella é um modelo mais accessivel· para nós ; é 
por isso que nos levá mais suave e mais se-: 
guramente ao Coração de Jesús. 
CONCLUSÃO PRATICA. - Os diversos 
pontos que acabamos de expôr apresentam por 
si mesmos as applicações prat�cas. 
VIGESIMO QUARTO DIA 
A Victima de desejos 
Completemos o que dissemos mais acima 
sobre a Victima de desejos, fazendo v-êr es­
pecialmente como o Sagrado Coração de Jesús 
a tem por agradavel e lhe conta a sua bôa 
vontade peia realidade. Fazemos disto um 
capitulo especial, posto que já tenhamos fa­
lado disso varias vezes, porque é uma das 
formas especiaes da espiritualidade de Sta. 
Gertrudes, e uma mina toda particular de ri­
quezas espirituaes, faceis de explorar para os 
amigos do Sagrado Coração. E parece-nos 
mui particularmente útil, nesta época de pro­
vações, em que as almas de bôa vontade pa­
recem acorrentadas de alguma forma e redu­
zidas a viver duma vida de desejos qpe não 
podem realizar no exterior, parece-nos parti­
cularmente útil fazer-lhes vêr que a Victima 
de desejos nem por istot é menos agradavel a 
Nosso Senhor, que ellas podem ter perante 
Victima de desejos 211 
elle os mesmos merecimentos que os santos 
de antigamente· que tanto fizeram pela causa 
delle, e que delle podem conseguir para a sua 
Igreja uma abundancia de graças proporciona� 
das aos seus desejos. 
I. JESÚS REALIZA OS DESEJOS DOS SEUS 
AMIGOS SEGUNDO A EXTENSÃO DELLES. -
Urna vez em que Sta. Gertrudes no officio 
(L. 2) o versículo Salvum fac populum tuum, 
com ardentedesejo de que o Senhor concedes­
se benção copiosa a toda a Igreja, disse-lhe o 
Salvador : "Que queres que eu faça nisso, mi­
nha bem-amada, porque eu me abandono á 
tua vont.,ade agora, tão absolutamente quanto 
me abandonei á de meu Pae na cruz? Distri­
búe pois, em virtude da minha divindade, 
tudo o que quizeres e tão abundantemente 
quanto desejas" . Que commovedor cumpri­
mento da promessa divina : Deus fará a von­
tade daquelles que o servem. - Voluntatem 
timentium se faciet! Que motivo de confiança ! 
que incentivo para a Victirna de desejos ! 
Sta. Mechtilde (p. 59 ) , ouvindo cantar 
na missa : Omne genu flectatur etc . , exprimia 
a N. Senhor este desejo : "Oh ! si estivesse 
agora em meu poder, corno eu vos fada adorar 
humildemente, meu dulcíssimo e fidelíssimo 
�4.• dia 
amigo, pelo céo, pela terra e pelo inferno, 
com todas as creaturas ! " O Senhor respondeu­
lhe com bondade : "Pede-me que e� realize o 
teu desejo por mim mesmo, pois em mim 
esttÍ contida toda creatura; e, offerecendo a 
meu Pae as diversas homenagens da religião, 
suppro tudo o que falta ás creaturas para o 
cumprimento desses deveres. E' o que quero 
fazer agora a convite teu, para realizar o teu 
desejo; uma vez que minha bondade não 
póde soffrer que o desejo duma alma fiél 
quando não o póde e/la realizar por si mesma, 
fique imperfeito" . 
Vemos bem aqui a Victima de desejos 
acceita pelo Coração de Jesús e consumma­
da com elle no sacrifício de louvor ; o seu 
desejo é universal, abrangendo na _sua extensão 
o céo, a terra, o inferno e toda creatura ; o 
seu desejo é perfeito, porque o Coração de 
Jesús suppre o que lhe pudesse faltar. O seu 
desejo acha-se realizado pela· bondade om­
nipotente de Jesús, que o torna efficaz. 
li. JESÚS CONTA COMO REALIDADE OS 
DESEJOS DOS SEUS AMIGOS. - E' o titulo de 
um dos capítulos de Sta. Mechtilde (p. 3 62) . 
Santa Gertrudes erige tambem em principio 
que com Nosso Senhor "a vontade é acceita 
Victima de desejos 213 
peló facto" . Um dia .em que ella rezava por 
uma pessôa que não conseguia realizar um 
trabalho que lhe haviam confiado, instruiu-a 
o Senhor por esta resposta : "b bom desejo 
desse homem, emprehendendo aquelle traba­
lho para cumprimento da minha vontade, 
.apesar das difficuldades que nelle encontra, 
é-me, agradabilíssimo, e acceito a bôa vontade 
delle pelo proprio facto. Mesmo quando elle 
não pudesse conseguil-o, conceder-lhe-ia a 
mesma recompensa que si elle o tivesse reali­
zado" . 
O Coração de J esús póde mesmo achar 
mais gloria num desejo cuja realização lhe 
sacrificamos, do que na satisfação que teria­
mos. em vêr esse desejo realizado. Sta. Ger­
trudes (p. 23 9 ) , nas proximidades duma 
grande festa, sentia-se doente e offerecia a 
Nosso Senhor, o desejo de celebrar bem essa 
festa ; pedia-lhe não ser impedida disso pela 
molestia, entregando-se entretanto acima de 
tudo ao seu beneplacito. Ao que recebeu do 
Senhor esta resposta : Si eu te conceder o que 
desejas, seguir-te-ei ao canteiro de flôres que 
preféres, ao passo que si o sacrificares ao meu 
beneplacito, és tú que me segues ao jardim 
de delícia' em que mais me comprazo; por-
214 24.• dia 
quanto terei mais complacencia em ti, si ti­
veres o desejo e a pena, do que sr tiveres a 
devoção e o prazer" . 
Citemos outros exemplos : A Santa, 
outro dia (p. 234) , levada por violento de­
sejo do amor de Deus, dizia a Nosso Se­
nhor : "Oh ! corno desejaria ser consumida 
por um amor tão ardente, que o meu coração 
pudésse liquefazer-se e perder-se todo em 
vós ! " O Senhor respondeu-lhe: "Os teus de­
sejos são esse fogo que te liquefaz a alma para 
que o meu amor o absorva em seu divino Co­
ração" . Esta resposta fez-lhe cornprehender 
que a bôa vontade assegura ao homem todo 
o effeito dos seus desejos que têm a Deus por 
objecto. 
Certa vez' · em que Sta. Mechtilde se 
preparava (p. 268) ·para a sagrada Commu­
nhão, N. Senhor lhe disse : "Offerece-me em 
teu coração um desejo que encerre todos os 
desejos e todo o amor que os homens 'jámais 
me tenham podido offerecer, e acceitarei esse 
desejo de teu coração como si tivesses real­
mente em ti um amor tão intenso e tão ex­
tenso" . 
o · dulcíssimo Jesús ! como vosso Cora­
ção é bom e liberal ! Ficaes satisfeito com ·a. 
Victima de desejos 215 
preparação do nosso pobre coração e atten· 
deis plenamente os seus desejos : Desiderium 
pauperum exaudivit Dominus! Oh! fazei que 
tratemos sempre comvosco segundo a libera· 
lidade do vosso Coração generoso ! Que me· 
çamos a nossa confiança em vós pela vossa 
bondade e não pela nossa ! Op ! sim, dilatemos 
o nosso coração pelos santos desejos : por elles
tornamo-nos de alguma sorte omnipotentes, 
já que podemos offerecer a Deus um amor 
tão intenso, tão extenso quanto quizermos ; 
podemos exercer o zelo para com nossos ir· 
mãos com todo o ardor e toda a universali· 
da de que quizermos ; podemos, de algum 
modo, render a Deus a mesma gloria e me· 
recer da sua liberalidade as mesmas recom· 
pensas que os Santos que tanto o amaram, 
que os apostolos que lhe ganharam tantas 
almas ! Lembremo-nos de que varios santos 
não se tornaram. tantas almas I Lembremo-nos 
de que varios santos não se tornaram sinão 
pelos desejos e pela preparação do coração, 
como S. João Berchmans, o veneravel P. de
la Colombiere, o bemaventurado Pedro Le· 
fevre, etc. 
li. REPARAÇÃO PELOS DESEJOS. - Os 
desejos, junto ao Coração de Jesús, podem 
216 24.0 dia 
até produzir effeito retroactivo e servir plena­
mente á vida de reparação. " Um dia, Sta. 
Mechtilde (p. 3 5 3 ) rezava por uma pessôa 
afflicta que não podia conter as lagrimas ; 
tantas derramara durante cinco annos que, 
sem o soccorro da misericordia divina teria 
perdido a vista ou o senso. A insistentes ro­
gos da Santa, o Senhor concedeu-lhe emfim 
o livramento dessa pobre alma, e accrescen­
tou : "Dize-lhe de minha parte que me peça 
qr.Je eu tenha a bondade de transformar todas 
essas lagrimas como si ella as tivesse derra­
mado por um sentimento de amor ou de 
contrição" . E como a Santa admirasse essa 
bondade do Senhor, que queria mudar lagri­
mas tão inutilmente vertidas em santas la­
grimas, Jesús lhe disse : "Creia ella apenas na 
minha bondade, e far-lhe-ei segundo a me­
dida da sua fé" . 
"O' maravilhosa condescendencia da di­
vina bondade! exclama aqui a redactora do 
l ivro de Sta. Mechtilde. Vós que lêdes que 
Deus por sua bem-amada, concedeu taes gra­
ças aos homens, aconselho-vos, vos apropriar­
des dellas ; porque Deus ouve, como se dignou 
revelal-o, áquelle que se regozija com as gra-
Victima de desejos 217 
ças ·concedidas a outrem e que espera receber 
melhores" 
Podemos applicar este effeito retroactivo 
dos desejos a todas as perdas que ternos tido 
nas 
'orações e nas obras, como nas cruzes. 
Tudo o que foi feito com vistas imperfeitas 
ou puramente naturaes, offereçamol-o ao Sa­
grado Coração de Jesús com ardente desejo 
e plena confiança, para que elle lhe suppra 
da abundancia dos seus rneritos, corno si tudo 
tivesse sido feito segundo a sua vontade di­
vina, e elle se comprazerá em reparar as nos­
sas perdas, em preencher as lacunas da nossa 
rniseria, em completar-nos as obras, segund? 
a medida da nossa fé. 
Sta. Gertrudes faz-nos tambern achar na 
vida de desejos um meio de reparação uni­
versal tão facil para nós quão glorioso para a 
misericordia divina. A sua pratica para a festa 
da Epipha�?,ia mostra excellentemente como o 
desejo transforma em perolas preciosas as 
cousas mais defeituosas, quer para nós mes­
mos, quer para os outros. Gertrudes queria 
offerecer a_ N. Senhor prese'ntes semelhantes 
aos dos reis Magos, e, não achando em der­
redor de si nada que fôsse digno de lhe ser 
offerecido, poz-se a percorrer com desejo in· 
218 24.0 dia 
quieto a terra inteira, apanhando toda a falsa 
myrrha, falso incenso, falso ouro que nella 
pôde encontrar, quer dizer, todas as penas 
supportadas sem resignação á vontade de 
Deus, todas as preces feitas com sentimentosque Deus não póde acolher, todas os affectos 
que não estão na ordem. Transformando to­
das essas causas no coração pelo ardor dos seus 
desejos, como pelo fogo ardenté do crisól, 
apresentou-os a N. Senhor como uma myrrha 
escolhida, como um incenso de agradavel odor, 
como um ouro precioso. E o Salvaodr, achan­
do alegria extrema nesse trabalho de sua Es­
posa, recebeu essas offertas com solicitude: e 
pregando-as ao seu diadema real· como pedras 
preciosas, disse á Santa : "Aqui estão as pe­
ra! as que me acabas de offerecer. Acceito-as 
com tanto prazer, por causa da sua raridade, 
que as quero usar, como lembrança do teu 
amor extraordinario, no diadema que me cin­
ge a fronte, perante toda a Côrte celeste" 
Oh ! que excellente meio de reparação 
nos offerece Jesús nessas industrias que en­
sinou á sua discípula dilecta, quer para nós 
proprios, quer para toda a Igreja! Apanhe� 
mos todas as inutilidades pelas falsidades da 
nossa vida, lancemol-as por santos desejos 
Victima de desejos 219 
nessa fornalha ardente do Coração de Jesús, 
e tudo se purifacrá nelle, tudo se transfor­
mará, tudo nos será restituído, santificado, 
divinizado : excoquam ad purum scoriam 
tuam (Is., I, 25 ) . Lancemos a elle do mesmo 
modo, pelos desejos duma ardente caridade, 
tantas orações, affectos, penas que não são 
por Deus, em toda a extensão do mundo, e 
offereceremos por esse divino Coração glo­
riosa reparação ao Deus cioso a quem tudo 
deve referir-se ; proporcionaremos dôce con­
solação ao Salvador que se queixa da inutili­
dade do seu Sangue e da perda das suas gra­
ças ; juntaremos finalmente perolas preciosas 
á corôa da misericordia divina. 
CoNCLUSÃO PRATICA. - (Vêr no fi­
nal do dia seguinte) . 
VIGESIMO QUINTO DIA 
A Victima dos desejos (continuação) 
IV. DESEJOS UNIVERSAES E PERPE­
TUOS POR TODOS. - Um dia em que liam 
no Evangelho estas palavras : "Simão, amas­
me!' Apascenta as minhas ovelhas" , Sta. 
Mechtilde ficou em extase em presença do 
Senhor, que lhe disse : ·"Vou interrogar-te 
como ao meu apóstolo,. e responder-me-ás na 
sinceridade do teu coração : Ha no mundo al­
guma cousa de tão caro para ti que não qui­
zesses abandonar por meu amor?" E a Santa 
respondeu : "Senhor, sabeis que, si todo o 
mundo fôsse meu com tudo o que encerra, eu 
o abandonaria todo por vosso amor" E o
Senhor acceitou esta bôa vontade como si ef­
fectivamente ella fôsse dona do mundo in­
teiro e o tivesse sacrificado todo por elle. O 
Senhor interrogou-a segunda vez : "Ha algum 
trabalho ou algum acto de obediencia que não 
quizesses executar por meu amor?" E ella 
Victima de desejos :;&:U 
respondeu : "Senhor, estou prompta a fazer 
tudo por vosso amor" . O Senhor proseguiu : 
"H a algum soffrimento tão grave, que re­
cusasses supportar por meu amor?" E ella 
respondeu : "Seahor, comvosco e por vós es­
tou prorp.pta a supportar todos os soffrimen­
tos" E 6 Senhor acceitou ainda essa bôa 
vontade como si fôsse seguida do effeito. 
Depois accrescentou : "Em troca, eis aqui 
tres especies de homens que te recommendo : 
os simples, figurados pela simplicidade do 
cordeiro, para que os instrúas no meu amor; 
depois os que estão na afflicção e no despre­
zo, figurados pela mansidão do cordeiro; fi­
nalmente a Igreja toda, figurada pela ovelha, 
para que attraias sobre ella a minha miseri­
cordia por teus desejos perseverantes e tuas 
orações infatigaveis" . 
Assim, eis a Santa encarregada pelo ·Se­
nhor, de um lado, de provêr ás necessidades 
de toda a Igreja "por seus desejos perseve­
rantes e orações infatigaveis" e, ao mesmo 
tempo, assegurada de que os seus desejos de 
trabalhar e de soffrer por toda a Igreja serão 
acceitos como si fôssem seguidos do effeito. 
A victima do Sagrado Coração que quer con­
sumir-se por amor delle no serviço das almas, 
222 25;o dia 
bem póde, sem duvida, applicar a si as mes­
mas promessas, propondo-se a mesma exten­
são, o mesmo ardor, a mesma sinceridade de 
desejos. 
Esse desejo universal, de Sta. Mechtilde 
pelo bem de todos era ao mesmo tempo um 
desejo de toda a sua vida, e acompanhou-a 
até na sua agonía, como nol-o informa Sta. 
Gertrudes, que a viu nesse momento supremo 
collocando-se diante da chaga do Sagrado 
Coração de Jesús, e exhalando nelle, como 
por cada uma das suas respirações, ardentes de­
sejos por todos os vivos e mortos : esses de­
sejos, penetra�do assim no Coração do Sal­
vador, faziam transbordar delle ondas de gra­
ças sobre toda a Igreja. 
Essa perseverança até o fim nesses san­
tos desejos mereceram-lhe da liberalidade do 
Coração de Jesús uma recompensa singular 
e bem admiravel. O Senhor, fazendo trans­
bordar a medida das suas misericordias, como 
a Santa fizera transbordar a medida dos seus 
desejos, quiz que no dia da morte della ne­
nhum dos agonizantes por quem ella havia 
assim rezado em toda a Igreja, descesse ao 
inferno : concedeu a todos os que morreram 
á graça duma bôa morte, e quanto aos que 
Victima de desejos 223 
resiStiram a toda graça, não permittiu que 
morressem naquelle dia. Quanto ás almas do 
Purgatorio, por quem ella tanto havia re­
zado, livrou elle multidão incontavel. e quan­
to ás que a justiça não permittia livrar intei­
ramente, fil-as entrar num lugar de repouso 
e de consolação. 
Oh ! quem nos déra esquecermo-nos as­
sim a nós mesmos até o fim, só vivermos do 
desejo da gloria de Deus e da salvação das 
almas ! Aspiremos incessantemente este dese­
jo no Espírito-Santo, e exhalemc!-o no Co­
ração de Jesús, para tirarmos deU� incessan­
temente de modo universal e perpetuo ondas 
de graça que derramaremos sobre toda a 
Igreja. 
' 
Sta. Gertrudes mostra-nos outro exem­
plo de desejos universaes e perpetuas torna­
dos efficazes pela liberalidade divina. No dia 
da festa de S. Tiago Maior, esse glorioso 
apostolo appareceu a Sta. Gertrudes marávi­
lhosamente ornado de todos os meritos dos 
peregrinos que lhe vão venerar as relíquias. 
Enlevada dê admiração, elle perguntou ao 
Senhor porque tornava o sepulcro dessa Santo 
mais glorioso que o d�s príncipes dos ,aposto­
los S. Pedro e S. Paulo. O Senhor respondeu : 
224 
"E' por causa do zelo de que elle foi devorado 
pela salvação das almas. Elle não pôde con­
verter as multidões, como o desejava para mi­
nha gloria; porém como o seu desejo, sustado 
por morte prematura, tem todo o merito, pe­
rante mim, de uma longa vida, icdemnizo-o 
por essas conversões innumeras que se opéram 
agora no seu tumulo, e desde o começo con­
cedí-lhe a recompensa de tbdos os meritos dos 
peregrinos que a t?lle vêm em tão grande nu­
mero" . Que instrucção animadora para a Vic­
tima de desejos ! Deus olha ao coração, á in­
tenção, ao desejo. Concede fruto ao nosso 
zelo, não em proporção dos nossos exitÓs e 
das nossas obras exteriores, porém em razão 
daquillo que quizemos fazer, ainda quando 
uma morte prematura ou difficuldades insu­
peraveis viéssem a deter-nos. Pensemos a 
miúdo que pelos nossos desejos podemos as­
sim juntar em pouco tempo os rneritos duma 
longa vida, e que perante N. Senhor adqui­
rimos todos os meritos das almas que lhe 
quizemos ganhar ( 1 ) . 
( 1 ) E' de notar tambem que Sta. Gerttrudes 
attribúe a grande gloria de S. Domingos no céo ao 
fervor dos seus desejos na terra. Podemo-nos lem­
brar de que esse homem de desejos confessava con-
Victima de desejos 225 
V. CONSOLAÇÃO DO CORAÇÃO DE JE­
SÚS NO DESEJO DA· CRUZ. - Como falassem 
de enviar varias religiosas para fundarem um 
novo mosteiro, Sta. Gertrudes, que só dese­
ja�a o beneplacíto de Deus, posto que se sen­
tisse sem forças, veiu prostrar-se diante do seu 
crucifixo e offerecer-se a elle para essa nova 
fundação, com grand!! desejo de sacrificar-se 
por sua gloria. O Senhor pareceu tão sensi­
bilizado com a sua bôa vontade, que se pre­
cipitou da cruz para abraçai-a ternamente, e 
estreitando-a contra a chaga do seu Coração 
adoravel, disse-lhe ni excesso da sua alegria : 
"Sêde bemvinda, mmha cara esposa, tú que 
és o balsamo agradavel das minhas chagàs e 
a suavizaçãode todas as minhas dôres" . Por 
estas palavras Gertrudes comprehendeu que, 
quando offerecemos plenamente a nossa von­
tade ao beneplacito de Deus, seja qual fôr a 
a adversidade que prevejamos dever succeder, 
o Senhor acceita esse offerecimento como si, 
no momento da sua Paixão, tivessemos appli­
cado o balsamo mais suave ás suas feridas. 
- Gertrudes perguntou em seguida ao Se-
fidencialmente ao prior de Cellamare que nunca pe­
dira nada a. Nosso Senhor que o não tivésse conse­
guido. 
226 .25.o dia 
nhor por que razão permittira que· ella tives­
se precedentemente o desejo da morte, e de­
pois diversos outros deseJOS de se sacriricar 
por sua gloria que não chegavam a nenhum 
resultado. Jesús respondeu-1ne : ··comprazo­
rhe em propôr aos meus eleitos dil.)ersos sa­
crificios que ei les nunca terão de realtzar, 
afim de Lhes conhecer a fidelidade a mtm, e 
multtplicar-lhe as recompensas, pots conto­
lhes todos os bons desejos como si fôssem 
ettectiuamente realizados" 
VI. 0 DESEJO DE TER DESEJOS. -
"Sta. Gertrudes (1, 23&) , queixando-se um 
dia coms1go de não poder tormu1ar tão ar­
dentes des�JOS quanto desejaria para a gloria 
de Deus, recebeu certeza do alto de que o 
�enhor üca mreuamenre satis1e1to com o no­
mem que, nao podendo fazer ma1s, tem ao 
menos a vontade de ter um grande Clesejo, 
e que perante Ueus esse deseJo lhe será com­
putado como tão grande quanto elle tiver 
quendo tel - o. 
Almejemos pôr nos nossos desejos toda 
a extensão, toda a intensidade, toda a perfei­
ção que seria mistér para offerecer a Deus a 
medida de gloria e á Igreja a medida de gra­
ças que devemos, e ser-nos-á feito segundo o 
Victima de desejos 227 
nosso desejo : Concupivit anima mea desi­
derare. O' Senhor, desejo ter desejos corno o 
vosso divino Coração, aproprio-me dos vossos 
desejos intinitos ; desejo ser todo desejo com­
vosco, para a gloria de vosso Pae e para a 
salvaçãq das almas ! 
VIII. DESEJOS HAURIDOS NO CORAÇÃO 
DE JESÚS. - Porque esses santos desejos, é 
no Coração de Jesús que �ta. Gertrudes nos 
convida a hauril-os corno os hauria ella pro­
pria. O Salvador dizia semelhantemente a 
Sta. Mechtilde (p. 3 3 Y) , a respeito duma 
alma que ella lhe rec<;>rnrnendava e que pedia 
ter um coração desejoso e amante : "Protur� 
ella no meu divino Coração tudo o que qui­
zer, pedindo-m'o como uma cnança que pede 
ao pae tudo o que deseja; em partteular, pro­
cure haurir nel/e o espírito de desejos" . 
CONCLUSÃO PRATICA. - A.:crescente­
mÕs apenas alguns pontos ao que foi dito nas 
reflexões. 
1 .0 Notemos especialmente os effeitos do 
desejo da cruz. 
As cruzes presentes, recebidas com pleno 
desejo, produzem pleno effeito de reparação 
pela Igreja. (Vêr acima o vigesimo j:erceiro 
dia) . Quanto ás cruzes passadas, os desejos 
228 25.o dia 
podem produzir effeito retroactivo de repa­
ração admiravel. Finalmente as cruzes futu­
ras acceitas antecipadamente com desejos 
sem limites, tornam-se um calice inebriante 
para o Coração de Jesús e um balsamo agra­
davel para as suas feridas. 
2. o Duas condições são necessarias : A 
confiança, fiat· tibi secundum credidisti 
A fidelidade da alma em fazer o que póde : 
Jesús chama-lhe alma fiél. 
Não percamos de vista, aqui e alhures, 
que quando Sta. Gertrudes nos fala da effi­
cacia dos desejos e do merito das disposições, 
suppõe sempre a bôa vontade e a fidelidade, 
e suas palavras só devem entender-se duma 
efficacia proporcionada ao gráo de graça e á 
cooperação de cada um. 
3.0 S. Thomaz admitte em varias luga­
res que perante Deus o desejo e a disposição 
podem ter tanto merecimento quanto a reali­
dade ; que Abrahão, por exemplo, pela sua 
disposição para guardar castidade, póde ter 
tido o mesmo merecimento que as virgens da 
nova lei, e que tal Santo que não foi martyr 
sinão pelo desejo póde avantajar-se a tal outro 
que foi martyr effectivamente. 
Victima de desejos 229 
4.0 Em resumo. Em tudo, um desejo : 
1 .0 sincero, 2.0 unido ao Coração de Jesús, 
que é todo desejo; 3 .0 infinito ou, mais exac· 
tamente, sem limites, universal, perpetuo, per· 
feito. Esforcemo-nos por entrar 'nestas dis· 
posições ; ellas nada offerecem de difficil, nada 
de triste, nada de assustador ; tudo nellas é 
desejavel,. attrahente, animador; enriquecedor. 
Entremos nell;1s plenamente pela união ao 
Coração de Jesús, e ellas santificarão grande­
mente a nossa vida, para sua gloria e para 
salvação das almas. 
Adaperiat Dominus cor vestrum ut 
serviatis illi corde magno et animo volenti. 
VIGESIMO SEXTO DIA 
A Victima de louvor do Coração. de Jesús 
Um dos caractéres especiaes da devoção 
ao Sagrado Coração de Jesús segundo a escóla 
de Sta. Gertrudes, é o louvor divino, a vida 
de louvor, o sacrifício de louvor, hostiam 
laudis, que constitúe a Victima de louvor. 
Este caracter convém mui particularmente ás 
almas reparadoras do nosso desventurado se­
cuia, em que, como a blasphemia sóbe sem­
pre, cumpre que o louvor dos amigos do Co­
ração de Jesús forme como que um encontro 
celeste que chegue a abafar esse concerto in­
fernal dos seus inimigos. Sim, cumpre cada 
vez mais que a vida interior haurida no Co­
ração de Jesús se manifeste pelo louvor di­
vino, e parece que ella não se póde formar 
em melhor escóla do que na escóla de Sta. 
Gertrudes. Por isto, repetimos gostosamente 
estas palavras do P. Faber : "Gertrudes foi 
por excellencia a santa dos louuores . Oh! 
Victima do louvor. 231 
oxalá que ella tornasse á Igreja para ser o que 
foi nos seculos passados. a Doutora e a Pro­
phetiza da vida interior!" 
A Victima de louvor do Sagrado Co­
ração, segundo Sta. Gertrudes, bebe a vida de 
louvor no Coração de Jesús ; offerece conti­
nuamente com elle o sacrifício de louvor para 
reparar as offensas do mundo : consummá-se 
neste mundo, com elle, no louvor, pao:a mere­
cer estar-lhe unida no céo no louvor eterno. 
I. LOUVOR HAURIDO NO CORAÇÃO DE 
JESÚS. - "Um dia, o amor, empolgando-lhe 
a alma, conduziu-a ao Senhor, e ella, incli­
nando-se. sobre a chaga do meigo Coração de 
Jesús, que era tudo para ela, tirou della um 
fruto de grande suavidade que levou á bôca. 
Esse fruto exprimia o eterno louvor que 
procede do Coração divino, pois todo louvor 
de Deus procede desse Coração adoravel que 
é a fonte pura donde mana todo bem. A alma 
tirou em seguida um segundo fruto, que era 
a acção de graças" . (Sta. Mechtilde, 11, 1 6 ) . 
Vemos primeiramente aqui que o louvor 
divino póde ser distinguido da acção de gra­
ças. A acção de graças, com effeito, honra a 
Deus nos dons da sua bondade ; Q louvor 
honra-o antes em 6Í mesmo, nas suas per-
232 26.• dia 
feições infinitas, nas suas operações summa­
mente admiraveis. S. Thomaz parece dizer 
que o louvor, em geral, é uma honra tribu­
tada a alguem por causa da sua habilidade em 
escolher os meios para chegar ao.s fins. Deste 
ponto de vista, quem é mais digno de louvor 
que a Sabedoria divina, que attinge os seus 
fins c_om poder infinito e dispõe tambem com 
suavidade infinita os meios para chegar a el­
les ? O louvor entretanto póde ser tambem 
considerado, na pratica, como abrangendo a 
acção de graças, e entender-se de toda locução 
honorífica dirigida a Deus, ou pelos bens que 
elle contém em si .mesmo, ou pelos que nos 
dá, quer a nós proprios, quer ás suas outras 
creaturas. 
O louvor divino de que a alma se deve 
encher, repleatur laude, segundo Sta. Ger­
trudes, é haurido pelo Coração de Jesús na SS. 
Trindade, que a si mesma se louva por um 
louvor substancial , eterno, infinito. Da ado­
ravel Trindade, esse louvor dimana, pelo Co­
ração do Verbo incarnado, para o coração da 
bemaventurada Virgem Maria, depois para 
todos os anjos e santos, em seguida para toda 
creatura, no céo e na terra ; finalmente, re­
monta a Deus pelo Cora�ão _de Jesús, que lhe 
Victima do louvor 233 
é como o centro, e que offerece a seu Pae as 
homenagens de toda a creação. 
O Senhor mostrou tambem a Sta. Mech­
tilde como o seu divino Coração suppre a nos­
sa impotencia para louvara Deus dignamen­
te. Como cantassem a missa In excelso thro­
no, viu ella Jesús sentado no altar como em 
seu throno, e dizendo : "Eis-me aqui com 
toda a minha virtude divina para curar todas 
as feridas que vos fazem gemer" . Mas a santa 
dizia comsigo : "Oh ! si elle quizesse offerecer 
por mim um louvor pleno e inteiro a Deus 
Padre, eu ficaria muito mais contente ! " E o 
Senhor lhe disse : "Esse gemido, essa dôr d_e 
tela/ma, por não poder jámais louvar a Deus 
tanto quanto deseja, é essa justamente a ferida 
que eu quero curar, supprindo por mim mes­
mo a tua impotencia, e offerecendo a meu 
Pae este louvor pleno e inteiro que desejas" 
(M. I, 9 ) . 
O Coração de J esús quer assim offerecer 
por nós a Deus seu Pae um louvor perpetuo : 
Queixando-se uma -pessôa a Sta. Mechtilde 
da magua que sentia de não glorificar a Deus 
como o quizera, a Santa rezou por ella, e 
concebeu com isso grande tristeza q�anto a 
si mesma, sentindo que se achava no me�mo 
234 26.0 dia 
caso. Mas o Senhor lhe disse : ''Não te affli­
jas, minha dilecta, tudo o que é meu é teu. 
Quando me quizeres louvar e vir que não 
me podes offerecer um louvor perpetuo se­
gundo os teus desejos, dize sómente: Bom 
Jesús, suppri,. rogo-vos, tudo o que me falta, 
supprí-o por mim. E logo offerecerei a Deus 
por ti esse louvor perpetuo. E dirás á pessôa 
por quem rezas que faça o mesmo, e si ella 
tornar a isso mil vezes por dia, mil vezes por 
dia offerecerei por ella esse louvor a Deus 
Padre, pois meu amor nunca se cansa" . 
Eis ahi o meio de louvar mil vezes por 
dia, de louvor eternamente as misericordias 
do Senhor. Oh ! si cornprehendessemos os the­
souros que são postos á nossa disposição no 
divino Coração de J esús. 
Vírnos precedentemente corno Nosso Se­
nhor prornettia tarnbern a Sta. Gertrudes of­
feercer por ella o louvor universal em nome de 
todos os homens, e completar assim os seus 
immensos desejos de louvor "como si nada 
lhes faltasse" . Accrescenta mesmo que lhe pre­
param a recompensa desse louvor perpetuo 
e universal, corno si a Santa o offerecesse per­
feitamente por si mesma, segundo os seus de­
sejos. Oh ! que incitamento para a vida de 
Victima do louvor 235 
louvor ! Oh ! si quizessemos comprehender o 
amor infinitamente attencioso que se recrêa 
nessas industrias, o convite infinitamente ter­
no que o Coração de J esús esconde sob essas 
promessas para attrahir-nos á vida de lou­
vores ! 
JI. LOUVOR REPARADOR. - Um dia, 
Sta. Mechtilde (IV, 29 ) , emquanto rezava 
por um homem que estava atribulado, viu-o 
diante do Senhor, e o Senhor dizia : "Perdôo­
lhe agora todas as suas culpas •. mas elle pre­
cisa reparar os seus peccados e negligencias 
pelo louvor. Assim, quando se diz na Missa 
estas palavras : Per quem M ajestatem tuam 
1audant Angeli, - Por quem os Anjos lou­
vam a vossa Majestade, - louve-me elle em 
união desse louvor divino pelo qual a SS. 
Trindade louva a si propt'Ía, desse louvor que 
deriva primeiro para a Bemaventurada Virgem 
Maria, depois para todos os Anjos e Santos; 
recite em seguida um Padre-Nosso em união 
com esse louvor que o céo e a terra e toda 
creatura fazem remontar para Deus; rogue 
emfim que o seu louvor e a sua oração sejam 
acceitos em meu nome, visto como sou eu 
só que posso fazel-os receber com . compla­
cencia por Deus Padre. E' assim que por mim 
236 - 26." dia 
se acharão reparados todos os seus peccados e 
todas as suas negligencias. Si alguem mais 
agir assim tambem, acredite . piamente que re­
ceberá a mesma graça, porque é impossível 
que o homem não alcance quanto tiver criado 
e esperado" . 
Esta doutrina não nos deve surprehen­
der. A satisfação perfeita, segundo S. Tho­
maz, consiste em offerecer. a Deus alguma cau­
sa que lhe dê mais prazer do que magua lhe 
causou a offensa. Ora, Deus é maís sensível 
ao amor do que ao ultraje, .e o louvor que 
lhe offerecemos assim pelo Coração de seu 
Filho é-lhe incomparavelmente mais agrada­
vel do que odiosas lhe são as nossas offen� 
sas. Demais, o louvor séria e sinceramente 
unido ao Coração de J esús encerra necessaria­
mente a humildade e a confissão das nossas 
culpas, assim como o amor e a contrição, sen­
timentos que, por si mesmos, reparam as nos­
sas culpas e podem, quando assaz intensos, 
expiar inteiramente toda a pena de'Vida aos 
nossos peccados ( 1 ) . 
( 1 ) Aqui está, parece-nos, a razão fundamental 
desta doutrina : todo peccado encerra um ado de or­
gulho, isto é, o desejo desregrado da nossa exçeJ­
lencia pessoal, a inveja. da excellencia divina e a re-
Victima do louvor 237 
A Escriptura sagrada tambem nos mos­
tra o sacrifício de louvor como sendo o mais 
agradavel a Deus e o mais effícaz para nos 
livrar dos nossos peccados. O psalmo 49.0 
todo tem por objecto fazer-nos vêr que no 
juizo de Deus o sacrifício de louvor assegu­
rar-nos-á a salvação : os sacrifícios exteriores 
são pouca causa, mas o sacrifício do coração, 
o sacrifício do louvor, emquanto encerra o do 
amor e da submissão a Deus, será recebido 
em odôr de suavidade alcançar-nos-á mise­
rícordia. Citemos apenas estes trechos : Non 
accipiam de domo tua vitulos . . . Immola 
Deo sacrificium laudis . . Sacrificium laudis 
honorificabit me, et illic iter quo ostendam 
illi salutare Dei ( 1 ) . 
Laudetur J. C. in tl!ternuml Demo-nos 
á vida de louvor durante o tempo, para nos 
consummarmos na vida de louvor durante a 
eternidade : Louvor mediante o Coração de 
Jesús, louvor por nós e por todos, louvor 
volta contra ella. Ora, o louvor encerra justamente 
os actos oppostos : o desejo e a alegria do bem de 
Deus, e a submissão da propria excellencia. Elle é 
portanto directamente reparador. 
( 1 ) " Assim, até o fim, accrescenta o tradu­
ctor, o louvor divino é a característica de Sta. Mech­
tilde. ". 
238 26.• dia 
perpetuo e universal, louvor de amor, louvor 
reparador, louvor agora e sempre. Laudetur 
J. C. in �ternum! 
PRATICAS. - 1 . o Para nos formarmos 
na vida de louvor, meditar os l ivros de Sta. 
Gertrudes e de Sta. Mechtilde, que fôram por 
excellencia santas de louvor. Não ha melhor 
escóla para aprender essa vida, que é tão suave 
á alma que ella associa aos anjos, tão agrada� 
vel a Deus, que é com ella continuamente 
glorificado, tão útil á Igreja, que necessita 
tanto de Victimas de louvor para reparar as 
ortensas do mundo. 
2. o Roguemos mil vezes por dia ao Sa� 
grado Coração de Jesús que suppra o nosso 
louvor demasiado imperfeito, afim de que mil 
vezes por dia possamos offerecer por elle a 
Deus a hostia de louvor consummado que 
elle deseja acima de tudo. 
S. Thomaz ensina que "Jesús�Christo 
era figurado no antigo Templo pelos dois 
altares dos holocaustos e do incenso, porque 
é por Jesús-Christo que devemos offerecer' a 
Deus todas as nossas obras : primeiro as obras 
de penitencia, como no altar dos holocaustos, 
depois as obras do nôsso espírito, as suas ho­
menagens, louvores, desejos, que são UI)l sa-
Victima do louvor 239 
crificio mais perfeito, como no· altar do in� 
censo. E' este ultimo sacrifício que recommen­
da o Apóstolo : Per ipsum ergo offeramus 
hostiam laudis semper Deo" . Eis ahi realmen� 
te a Victima de louvor a offerecer a Deus o 
seu sacrifício perpetuo, como o mais perfeito 
de todos. 
VIGESIMO SETIMO DIA 
A Victima universal e perpetua do Coraçã� 
de Jesús, segundo Sta. Gertrudes. 
Outro caracter da espiritualidade de Sta. 
Gertrudes é a intenção universal. Ell,a torna 
emprestado a todos para dar a todos, o co­
ração se Jhe dilata á medida do Coração da 
grande Victirna que se deu toda em Redernp­
ção por nós todos, e eHa diz corno o Rei­
Propheta cujo coração era segundo o Coração 
de Deus, corno o grande Apostolo cujo cot:a­
ção era segundo o Coração de Jesús :Particeps 
ego sum omnium; omnibus debitor sum. -
Participo do be� de todos, e dou meus pro­
prios . bens a todos" , 
Tal deve ser a Victirna verdadeiramente 
unida ao Coração de Jesús, dedicada corno 
elle e generosa ; irnrnolando-se por todos, 
como Jesús no Calvario ;unindo-se a to­
dos, como Jesús no paraíso. 
Victima universal 241 
I. A VICTIMA DA TUDO. - A Victima 
dá tudo a todos e sempre ; e isto não só pela 
oração, mas ainda e principalmente pela ac­
ção e pelo sacrifício. Sem duvida o apostola.; 
do da oração que, unindo-nos ás intenções do 
Coração de Jesús, nos faz rezar por todo�. 
já é obra magnífica, mas cumpre estender 
a mesma intenção de zelo a todas as nossas 
obras e sacrifícios. A União ao altar póde 
auxiliar-nos a nos unirmos á acção universal 
do Coração de Jesús eucharistico. A união 
ao Coração de Jesús Victima associa-nos á 
perpetuidade do seu sacrificio. 
Notemos que o coração humano foi for-· 
mado sobre o modelo do Coração de Jesús ; 
porquanto, ao formar esse coração de carne, 
o Verbo eterno pensava que se apropriaria um 
dia delle pela incarnação : Christus cogitaba­
tur homo futurus, e dispunha-o de modo a 
que elle se pudesse tornar apto a realizar o 
plano divino. Ora, conforme esse plano, o 
Coração de N. Senhor devia ser o centro de 
tudo, recebendo tudo de todos os membros de 
seu corpo mystico parfl lhes restituir tudo e 
unir assim todos os homens nelle. Ahi está 
porque o nosso coração de carne é, do mes­
mo modo, o centro da vida animal para to-
242: 27.o dia
dos os membros do nosso corpo. Agora pois, 
si nos estabelecermos no Coração de Jesús 
por urna união constante, si não fizermos 
sinão um só coração com elle, segundo pede 
o amor, como elle, com elle e por elle, recebe­
remos tudo de todos corno daremos tudo a 
todos. Eis o que o dulcíssimo Mestre fizera 
cornprehender a Sta. Gertnides, eis o que os 
escnptos da Santa nos inculcam em muitos 
lugares. 
li. A VICTIMA APROPRIA-SE PELA CA­
RIDADE DO BEM DE TODOS. - Sta. Gertrudes 
toma emprestado primeiro á propria SS. 
Trindade o louvor, a acção de graças, a ale­
gria, para derramai-os em seguida sobre toda 
c.reatura. Já citámos varias exemplos disto, 
e poderia-mos multiplicai-os, si necessario. 
Apropria-se depois, como vimos igual­
mente, pela união da caridade, dos meritos, 
dos louvores, das graças, de todos os bens 
de todos os Santos, que, por seu lado, se 
apressam a lhe corresponder aos desejos. Eis 
aqui outro exemplo dos mais notaveis : "Um 
dia de festa da Assumpção, Gertrudes (IV. 
48) , para se preparar para a sagrada Com­
munhão, recitou tres vezes o Laudate Domi­
num omnes gentes, pedindo como de costume 
Viclima· ·unívcrsal 243 
(no"te-se bem esta expressão, trata-se .aqui dos 
habitos de Sta. Gertrudes, dos principias de 
espiritualidade que seguia) pelo primeiro, a 
todos os Santos, offerecerem por ella ao Se­
nhor todos . os seus merecimentos para que 
lhe servissem de preparaçãoi pelo segundo 
Laudate, fez o mesmo pedido á SS. Virgem, 
e pelo terceiro ao . Senhor Jesús. Viu então a 
bemavcnturada Virgem levantar-se logo e vir 
offerecer por ella á SS. Trindade os meritos 
incomparaveis que a elevaram acima de todos 
os Anjos, no dia da sua Assumpção. Depois, 
cem meiga deferencia, Maria, deixando o lu­
gar, fez signal a Gertrudes para se aproxi­
mar : "V em, filha querida, e põe-te no meu 
lugar com toda esta perfeição de virtudes que· 
attrahe sobre mim as complacencias da ado­
ravel Trindade, afim de que lhe aprazas tam­
bem como eu mesma" . E Gertr:udes sentiu 
todas as complacencias do Senhor repousarem 
nella, e os Anjos e os Santos aproximaram-se 
della para lhe prestar honra. Tendo feito 
em seguida a santa Communhão, Gertrudes 
offereceu-a ao Senhor pelo augmento da ale­
gria e da gloria de sua bemave:Q.turada Mãe, 
" troco do dom que ella lhe fizera dos seus 
meritos. Então o Senhc;>r Jesús, parec'endo of-
244 27.0 dia 
ferecer um presente a sua dulcíssima Mãe, 
disse-lhe : "Eis, minha Mãe, qúe eu vos res­
titúo pelo dobro aqui/lo que vos pertence, 
sem todavia tiral-o áquella que.. quizeste fa­
vorecer com elle por meu amor" . 
Assim tambem, Gertrudes apropriava­
se dos bens de seus irmãos da terra, como o 
vimos ·no Capitulo 5 .0, 
Apropriava-se por fim dos bens do uni­
verso inteiro, por exemplo nesta formula tão 
bella que repetia com frequencia : "Saúdo­
vos, Jesús, Esposo divino, ornado das vossas 
chagas como de outras tantas flôres ; com as 
complacencias de vosso Pae em vós, com o 
amor do universo inteiro, abraço-vos e beijo 
essas feridas que o amor vos fez. - Ave, 
Jesu, Sponse florid�. cum delectamento di­
vinitatis tuce, et ex affectu totius universi­
tatis te salutans amplector et in vulnus amoris 
te deosculor" . 
III. A VICTIMA DA A TODOS. - E' ainda 
um dos princípios, uma das formulas habi­
tuaes de Sta. Gertrudes. Por exemplo, quando 
ella tomava algum allivio, offerecia-o a Nosso 
Senhor com· a intenção de obter um aug­
mento de alegria e de graça para to�a · creatu.: 
ra, no céo, na terra e no Purgatorio : Ut cedat 
Victima universal 245 
rn augmentum salutis ómnibus ccelestibus, 
terc·estribus et purgandis. _ 
Uma noite - em que Sta. Gertrudes não 
pudera dormir, �entiu-se tão fatigada que 
quasi lhe não restavam mais forças. E no 
entanto o amor deu-lh'as ainda bastantes 
para offerecer ao Senhor o seu mal. segundo 
o seu costume, em intenção da salvação de
todos. 
Sta. Gertrudes recommendava aos outros 
as mesmas praticas (111, 74) , "procurarem 
attrahir com todo o seu poder todos os ho­
mens a Deus, em união desse amor com que 
o Senhor operou a salvação do genero hu­
mano, fazerem todas as suas acções pela -sal­
vação do mundo inteiro, em união com o 
Coração do Salvador" Santa Mechtilde fazia 
o mesmo, e parece que era uma das praticas
de toda a sua communidade naquella época, 
um dos princípios definidos da escola de Sta. 
Gertrudes. 
Fôra o Coração de Jesús que ensinara 
essas, pratica� a Gertrudes, com a recommen­
dação expressa de communical-os ás outras 
almas. "Um anno, pelo segundo domingo 
de Quaresma (11, 92) , rogava ella ao Senhor 
que lhe désse alguma instrucção ·que fôsse 
'246 27.o dia 
útil ás almas observarem durante a semana 
seguinte. Jesús respondeu-lhe por estas pa­
lavras do officio do dia : "Traze-me dois 
cabritos gordos" , quer dizer, o corpo e a alma 
de todo o genero humano. Comprehendeu 
ella. com isso que N. Senhor queria que ella 
fizesse satisfação por toda a Igreja; Recitou 
então cinco Padre-Nossos em honra das cinco 
chagas do Salvador, por todos os peccados 
commettidos no universo pelos cinco senti­
dos corporaes ; depois tres Padre-Nossos por 
tcdos os peccados commettidos pelas tres po­
tencias da alma ; e offereceu esses Padre-Nos­
_sos ao Senhor em união da perfeitissiil).a in-
. tenção que tirou essa oração do Coração di-
vino para salva,ção de nós todos. Ante esse 
offerecimento, o Senhor mostrou-se todo 
aplacado e plenamente satisfeito. Em troca, 
abençoou a Gertr_udes de modo ineffavel, dan­
do-lhe a benção do genero humano todo, de 
sorte que ella recebeu para si todas as ben� 
çãos que- elle teria concedido a todos, si para 
ellas se houvessem disposto com ella. Ora, 
cada qual póde, por ·semelhantes praticas, 
receber o effeito de semelhante benção. 
No domingo seguinte, pedindo Gertru­
�es d9 we$JllO rno�o ao �enhor que lhe en-
Victima universal · 247 
sinasse alguma pratica para toda a semana, 
elle lhe respondeu : "Compra por trinta e tre.� 
Padre-Nossos todos os merecimentos dos trin� 
ta e tres annos da minha vida : dPoois rlá par� 
t-e n"s<:e nrove.ito a toda a Igreja" . Feito o 
que, reconheceu ella que assim se achava ma� 
ravilhosamente ornada do fruto da vida 
perfeitíssima Jesús-Christo. 
Finalmente, no quarto domingo, Nosso 
Senhor lhe disse : "Manda entrar os que or� 
naste durante os sete dias precedentes com o 
fruto da minha santa vida, pois etles devem 
comer á minha mesa" - "E como os posso 
mandar entrar ?" respondeu Gertrudes. E en� 
tão e-xprimiu a N. Senhor esse ardente desejo 
· da salvação de todos aquelles que citámos 
precedentemente. N. Senhor respoJ;tdeu�lhe : 
"O teu desejo basta para tudo". E ao mesmo 
tempo fez-lhe vêr que toda a Igreja tomava 
lugar á sua mesa, e accrescentou : "E's tú 
queua:?s servir hoje esta multidão" Então 
Gertrudes beijou devotamente as cinco cha­
gas do Salvador para haurir nellas a satis� 
fação por todos os peccados do mundo, o 
supplemento de todas as miserias ou negli­
gencias, e a abundancia de todas as graças. 
Nosso Senhor concedeu-lhe os seus rogos sob 
248 27,o dia 
a forma dos cinco pães do Evangelho do dia. 
que benzeu dando graças a Deus a lhe deu 
para serem. distribuídos a toda a Igreja. 
Com isso fez-lhe comprehender que quando 
se faz alguma acção, por menor que seja. 
pela salvação da Igreja, ainda que se disse­
sse apenas um Padre-Nosso ou uma Aúe­
M aria, Nosso Senhor toma logo essa obra 
como um fruto da sua santa humanidade, 
dá graças a Deus Padre, abençôa-a, e, mui- . 
tiplicando-a por essa -benção, faz-lhe a dis­
tribuição á Igreja universal . Cada um póde 
seguir as mesmas praticas que Sta. Gertrudes, 
"e alcançará graça semelhante da minsericordia 
de Deus" 
Digne-se o Coração de Jesús fazer-nos 
compreQ.ender como a Sta. Gertrudes, o quan­
to essas praticas são agradaveis in omni loco 
dominationis ejus benedic anima mea Do­
mino, e o pedido da Igreja de que demos 
a Deus de modo universal e perpetuo, semper 
et ubique; que nos faça provar .o quanto el­
las são enriquecedoras para nós prprios. já que 
o Senhor não pôde deixar de retribuir-nos na 
mesma medida fazendo-nos participar dos 
bens de todos ; quão úteis são ellas para nosso 
Victima universal 249 
irmãos, que se vêem todos assim ajudados, 
alliviados e socco�ridos ! 
CONCLUSÃO PRATICA. - 1 .0 Experi­
mentae, algumas vezes ao menos, servir-nos 
dessas industrias de Sta. Gertrudes. 
2.0 Podemo-nos soccorrer para isso da 
excellente Collectaneazinha intitulada Ora­
ções de Sta. Gertrudes. 
3 .0 Não percamos de vista que essas 
praticas baseadas no dogma da Communhão 
dos Santos só podem ter efficacia proporcio­
nada ás nossas disposições, e que devem ser 
mui particularmente acompanhadas da humil­
dade, que afastará todo perigo de illusão ou 
de ambição espiritual. 
VIGESIMO OITAVO DIA 
A vida de alegria no Coração de Jesús, 
segundo Sta. Gertrudes. 
I. VIDA DE ALEGRIA, FRUTO O MAIS 
DELICIOSO DA DEVOÇÃO AO SAGRADO CO· 
RAÇÃO DE JESÚS. - Na visão cujo começo 
havemos referido em outro lugar, N. Senhor, 
d�pois de fazer Sta. Mechtilde colher no seu 
divino Coração os frutos tão dôces do louvor 
e da acção de graças, fêl-a colher um terceiro 
ainda mais precioso, o da alegria espiritual 
O Senhor disse a Mechtilde : "Espero ainda de 
t 1 um fruto acima de todos os outros" . A 
Santa respondeu : "Qual é esse fruto, ó Deus 
que me sois tão caro ?" Disse-lhe o Senhor : 
E' a alegria santa pela qual expandirá só 
em mim todas as delicias do teu coração" . -
"O' meu unico B.em-Amado, õ que posso fa­
zer para isso ?" - E elle respondeu : "Meu 
amor effectual-o-á em ti" . Então, num trans­
porte de gratidão, ella exclamou : "SQ:n, sim ; 
Alegria do S. Coração 2:il 
amor, amor, amor" Jesús proseguiu : "O 
amor do meu Coração será tudo para ti : 
proverás ás t:uas necessidades �orno urna mãe 
terna para te conservar na plena alegria, e 
haurirás necessariamente nelle a consolação in­
terior e urlla suavidade inenarravel" . 
Segundo Sta. Gertrudes tambem, a ale­
gria é um dos caractéres espedaes da devoção 
ao Sagrado Coração. Gertrudes achou nesse 
divino Coração a sciencia da jubilczção, segun­
do a expressão dos nossos santos livros ; quer 
servir o Senhor na alegria e alegrar-se sempre 
nelle, segundo os desejos do seu Corpção ama­
bilíssimo. E' sempre sob este aspecto qué o 
seu livro nos faz .encarar a devoção ao Sa­
grado Coraçá<>. Ora, não é tarnbein sob este 
aspecto que cumpre apresentai-a aos filhos do 
no��o sec:ulo, tão fracos e� v�rtude, tão desa­
nirnadcs, tão egoístas ? Não é mistér attra­
hil-os pela alegria, para trazel-os á fonte da 
alegria, que é o Coração de Jesús, fons totius 
consolationis, para trazel-os áquelle que é a 
alegria essencial de Deus Padre ? Oh ! ditosas 
as almas que vi�ram a esta escóla aprender 
a sciehcia da jubilação, beatus populus qui 
scit jubilationem! Apesar da sua fraqueza, 
não mais reçeiarão tomar esse jugo que o 
252 28.• dia 
Sagrado Coração de Jesús lhes tornará suave 
e leve ; deixarão sem difficuldades as falsas 
alegrias do mundo para irem haurir a verda­
deira alegria nas fontes do Salvador. O sa­
crifício não as assustará mais, porque lhes 
apparecerá cheio de suavidade; é a propria 
cruz não as desgostará, porque sentirão a 
uncção da graça que .a ameniza, o attractivo 
do amor que a faz abraçar com delicias. 
"Só fazemos bem aquillo que fazemos 
com alegria, cum delectatione" (S. Thomaz) . 
Portanto, si quizermos que as nossas almas 
sirvam bem a Deus e amem bem o proximo, 
cumpre que lhes façamos vêr . a alegria no ser­
viço de Deus e do proximo, servite in !tE­
titia. Oh I façamos pois assim. Não desnatu­
remos as cousas : Deus é a alegria ; a verda­
deira devoção é a alegria ; o amor é a ale­
gria ; o sacrificio é a fonte da alegria ; a pro­
pria cruz é a condição da solida alegria. Di­
latemos pois o coração; é a alegria que nos 
convida ; corramos para a frente, nada te­
mamos. Alegremo-nos sempre ; progridamos 
sempre no amor e na alegria ! 
li. VIDA DE ALEGRIA, CONDIÇÃO E RE­
SULTADO DA AMIZADE DE NOSSO SENHOR. ­
Achando-se Sta. Gertrudes muito enferma 
Alegria do S. Coração 258 
(I,285) , varias pessôas aconselharam-lhe re­
nunciar por algum tempo ás delicias da con­
templação, até que recuperasse · a saúde. A 
. Santa, que preferia sempre seguir o sentimento 
alheio, acquiesceu-lhes ao conselho, com a 
condição entretanto de que lhe deixassem o 
prazer de enfeitar as imagens da cruz de 
Jesús, e a alegria sensível que achava em con­
solar assim o seu unico amigo. Ora, uma noite 
em que, não podendo dormir, se occupava 
dôcemente nisso, preparando com palhas para 
o crucifixo o pequeno sepulcro em que deviam 
depositai-o na sexta-feira santa, o Deus qe 
bondade, que acha prazer nas menores obras 
daquelles que o amam, inclinou-se para ella 
e disse-lhe : "Alegra-te no Senhor, minha di­
lecta, e elle te concederá os pedidos do teu 
coração" . E fez-lhe comprehender por essas 
palavras que, quando a alma se alegra no 
Senhor, seja fazendo com alegtia o que é do 
seu serviço, seja buscando um pouco de ale­
gria sensível em causas que se referiram a 
elle, o Senhor, que é cheio de bondade, olha-a 
com complacencia, alegra-se elle proprio nella, 
como um pae que fica alegre com a alegria 
dos filhos, e sente-se inclinado a . conceder-
254' 28.6 diá. 
lhe tudo o que ella deséja para tornar com­
pleta a sua alegria. 
Gertrudes disse então ao Senhor : "E que 
gloria podereis tirar, ó Deus amabilíssimo, 
duma alegria em que os sentidos têm mais 
que o i?spirito ? " Jesús respondeu-lhe : "Um 
usurario aoarento não aproueita toda occa­
sião para fazer ualer seus fundos? Pois-bem! 
eu, que me resolui a haurir em ti as minhas 
delicias, ponho ainda mais empenho em não 
deixar perder nada de tudo quanto me apre­
sentas para me alegrar e attrahir as minhas 
complacencias, nem siquer um simples pen­
samento, nem siquer um mouimento do teu 
dedo mínimo" . - A Santa replicou : "Si 
a vossa immensa bondade se digna comprazer­
se tanto nessas pequenas cousas, quanto mais 
não se comprazerá neste poemazinho que 
compuz para consolar-vos das dôres da vos­
sa paixão? " - E o Senhor respondeu : "Re­
gozijo-me tanto com elle quanto se regozija­
ria um amigo a quem o amigo conduzisse 
em meio aos mais affectuosos abraços a um 
jardim agradabilíssimo para fazel-o respirar 
um ar mais ameno, alegrai-o com o aspecto de 
differentes flôres, encantai-o com os sons 
duma dôce harmonia. e refrescai-o com fru-
Alegria do S. Coração 2.S5' 
tos de gosto finíssimo. Assim retribuir-te-ei 
alegria com alegria, prazer com prazer, can­
sôlo com consôlo. E o mesmo farei com as 
que lêrem a tua obra com os mesmos senti­
mentos que titJeste ao C0!1Jpol-a"' . 
Eis ahi a amizade do Coração de J esús, 
ei� ahi a alegria! Oh ! porque não fazermos 
assim, nas pequenas causas e nas grandes ! 
Tratemos com Jesús como um amigo com 
seu amigo, alegrando-o pela nossa alegria e 
attrahindo-lhe as complacencias sobre nós 
pelo prazer que achamos nelle ! 
S. Thomaz estabelece claramente que a 
alegria é a condição e o resultado da amizade : 
o am1go, diz elle, põe o seu prazer e alegria 
em viver com seu amigo : · contJitJit ei delec­
tabiliter; alegra-se com as mesmas alegrias 
que seu amigo : in eisdem delectatur, são duas 
condições indispensaveis da amizade. Em 
outro lugar, mostra que a alegria é producto­
directo do amor, e isto dum tríplice ponto 
de vista. Si eu amo a Deus com verdadeiro 
amor de benevolencia, regozijo-me de qu� 
elle possúa todos os bens que lhe posso de­
sejar ; si amo a Deus com verdadeiro amor de 
união, regozijo-me de que, pela carida·de, elle 
256 28.• dia 
esteja em mim e eu nelle ; si amo a Deus com 
o amor de concupiscencia, rejubilo-me de que 
elle se dê e se queira dar eternamente a mim 
com todos os seus bens ( I ) . 
Eis ahi o amor, o amor verdadeiro : 
dilatemos os nossos corações para recebei-o : 
dilatemos os nossos corações na alegria, por­
que dilatação e alegria é ainda a mesma causa, 
segundo o santo Doutor ( 1 ) . Alegria, peis, 
e dilatação, para que o nosso coração assim 
augmentado receba o amor na medida �m 
que póde contei-o, e retribúa a Jesús o amor 
e a alegria na medida em que lh'os pode dar. 
Reparemos bem, ao contrario, em que 
a tristeza estreita o coração, rebaixà-o, torna­
o menos capaz de amor, diminúe e destróe­
lhe as forças para amar. Fujamos, fujamos 
á tristeza, pois ella só póde é prejudicar-nos 
os interesses do Coração de Jesús : Fuge tris­
titiam, non est utilitas in illa. 
CONCLUSÃO PRATICA. - (Vêr no fim 
do dia seguinte) . 
( 1 ) A razão fundamental é que o amor faz as­
,pirar o coração para um objecto cuja posse o torna 
cQntente, de sorte que elle se dilata para recebei-o 
segundo a sua capacidade. Ora, é esse contentamento 
e essa dilatação que oonstitúem a alegria. 
( 1 ) Dilatare, latu.m facere; 1m titia, !atum facil. 
VIGESIMO NONO DIA 
A vida de alegria no Coração de Jesús 
(continuação) 
UI. VIDA ·DE ALEGRIA INSEPARAVEL DA 
VIDA DE SACRIFIQO, - S. Thomaz estabe ­
lece que a al�gria é o fruto natural da verda� 
deira devoção, isto é, o devotamento sério, 
a vida de sacrifício, separa a alma das cousas 
da terra que a -macúlam e estorvam, e que 
ella a une a Deus, fonte essencial de toda 
alegrià. 
A vida de sacrifício tornar�se-á bem de� 
pressa insupportavel para a nossa fraqueza, 
si não fôr auxiliada por uma santa alegria ; 
como tambem a alegria espiritual não poderá 
ser de longa duração si não fôr alimentada 
péla vida de sacrifício. Devemos dar ao Se� 
nhor com alegria, porque elle gosta das offer� 
tas dum coração alegre hilarem datorem; de� 
vemos acompanhar todos os sacrifícios que 
lhe offerecemos, da simplicidade do nosso co� 
258 29.o dia 
ração e da alegria das nossas palavras, l2tus 
obtuli universa, porque "uma palavra de ale­
gria ser-lhe-á mais agradavel do que o ·proprio 
dom" E elle nos retribuirá a mesma medida 
de alegria, ou. antes, como o prometteu, cem 
vezes mais alegria, para . nos animar nos nos­
sos sacrifícios e attrahir-nos cada vez mais ao 
seu amor. 
Era por essa alegria colll/ que acompa­
nhava todos os seus actos que Gertrudes lhes 
augmentava o valor perante Deus, e dava a 
cruzes pequeninas o peso e o merecimento 
das grandes cruzes. Nosso Senhor felicitava-a 
grandemente por achar assim amaveis as dis­
posições mais crucificantes da sua Providen­
cia para com ella. Quando estava cansado das 
iniquidades dos homens, vinha repousar no 
Coração de Gertrudes : mandava-lhe, para 
expiar os peccados do mundo, alguma pena 
no corpo ou no espírito, e a Santa recebia-a 
com tanta alegria e gratidão, que o proprio 
Coração de Jesús se sentia todo consolado, 
todo regozij'ado e inteiramente disp�sto a 
perdoar. 
Gertrudes, dando assim alegremente a 
Jesús tudo quanto elle lhe pedia, e não lhe 
recusando sacrifício algum, mereceu que por 
Alegria do S. Coração 2:>9 
sua vez Jesús nada lhe recusasse, e lhe fizesse 
transbordar n'alma, pela abundancia das gra­
ças divinas, a medida da alegria . . Façamos o 
mesmo, não recusemos nada ao amor ; demos­
lhe com alegria todos os sacrifícios qu� elle 
pede ; e depois, por nossa vez, peçamos {:Om 
confiança ; nada nos será rétusado, e será para 
nós a plena alegria, ut gaudium vestrum sit 
plenum, 
IV ALEGRIA UNIVERSAL E PERPETUA 
HAURIDA POR STA. GERTRUDES NO CORAÇÃO 
DE JESÚS, NO CORAÇÃO DE MARIA, EM TO­
DOS OS SANTOS. - Gertrudes hauria a al�gria 
espiritual no seu manancial inesgotavel que 
é o Coração de Deus. Uma das suas praticas 
mais caras era applicar-se a consolar e a ale­
grar N. Senhor com a propria alegria da sua 
Divindade : cum delectamento diuinitatis tu;:c. 
Comprazia -se tambem em fazer derramar essa 
alegria do Coração divino sobre todas as crea­
turas, no céo, na terra e no purgatorio, e de­
pois em fazer suas creaturas, nas quaes elle 
gosta de se alegrar, [;:ctabitur in operibus suis. 
Gertrudes offerecia assim a N. Senhor 
essa alegria continua em todas as menores 
occasiões. Si, por exemplo, tomava algum 
allivio, era para alegrar em si com essa alegria 
260 29.o dia 
universal a N. Senhor e a todas as suas crea­
turas. Assim tambem, todas as pequenas ale­
grias que a Providencia multiplica no nosso 
caminho tornavam-se para ella occasiões de 
alegria universal. Porque não adaptarmos 
estas praticas tão faceis e tão consoladoras ! 
Gertrudes não podia esquecer essa outra 
fonte universal das santas alegrias, o Coração 
immaculado de Maria : causa nostr<E (<Eti­
ti<E. N. Senhor ensinara-lhe especialmente o 
modo de lhe preparar uma morada alegre na 
sagrada Communhão, apropriando-se das ale­
grias immensas do Coração de sua santíssima 
Mãe, e a propria Maria cornprazia-se em corn­
rnunicar a sua filha querida, com seus meri­
tos e virtudes, essas alegrias especiaes que, 
nos diversos mysterios da sua vida, lhe inun­
daram a alma e a fizeram palpitar em Deus. 
Ernfirn, Gertrudes hauria a alegria no 
coração de todos os Santos. Em varias cir­
curnstancias. N. Senhor lhe fizera vêr (I. 
340) corno, por toda a alegria que haurimos 
nos benefícios conferidos aos seus ·eleitos, nós 
merecemos para nós proprios um augrnento 
de alegria eterna, e noss1alrna se illumina 
deste este mundo dum reflexo da gloria de 
Deus em seus Santos. 
Alegria do S. Cora�o 261 
Um dia tan:ibem em. que Sta. Mechtilde 
se alegrava mui particularmente com os fa­
vores que Jesús concedeu a Santa Ignez, viu 
esta gloriosa Martyr revestil-a das suas pro­
prias virtudes, e o Senh6r fez-lhe conhecer 
que, pela alegria que achamos nas graças con­
ceditlas aos Santos, nós nos apropriamos de 
alguma sorte dos seus merecimentos. 
Por estas praticas, tantas fontes de ale­
grias são-nos abertas quantos os Santos que 
temos para honrar n:o anno ; as alegrias de 
nossos irmãos tornam-se as nossas alegrias ; 
as suas graças as nossas graças ; a sua gloria, 
a. nossa gloria. O' amor ! ó amor de Jesús 
e dos seus Santos ! O' amor ! ó alegria ! Por­
que 
·
o nosso coração não se abre todo para 
receber-vos ! Estamos cercados só de amor e 
de alegria, porque temermos? Oh ! dilatemos 
os nossos corações ; dilatemos os nossos co­
rações no amor ; dilatemos os nossos corações 
na alegria : Dilatamini et vos! 
CONCLUSÃO PRATICA. - 1 .° Fazer com 
frequencia actos de alegria por ser Deus todo 
alegre, e por lhe estarmos unidos pelo amor. 
2 . 0 Offerecer todos os nossos sacrifícios 
a Deus com coração jubiloso : 
262 29,o dia 
3 ,0 Alegrar-nos, a cad:l ensejo, com a 
felicidade dos Santos e com as graças conce­
didas a nossos irmãos. 
TRIGESIMO DIA 
A amizade dos Santos no Coração de Jesús 
O douto e pio Lansperg, no seu pre­
facio sobre o terceiro livro de Sta. Gertrudes, 
escreve estas palavras notaveis : "Gertrudes 
mostra-nos a exuberancia doamor do Cora­
ção de Jesús, que, nestes ultimos tempos, com­
padecendo-se da fraqueza humana, quer pro­
digalizar-nos os seus dons e os seus Santo� 
e a si mesmo sem reserva" 
Eis ahi uma das riquezas mais preciosa� 
da devoção ao Sagrado Coração de Jesús, 
consoante Sta. Gertrudes. Por esta devoção, 
Jesús dá-nos seus Santos, com seus louvores 
e seu amor, para glorificai-o, com seus me­
ritos e suas virtudes para santificar-nos, com 
sua intercessão para ajudar o nosso zelo, com 
a amizade para consolar-nos e alegrar-nos. 
E para que essa amizade seja mais in­
tima e mais frutífera, Jesús quer que o seu 
Coração sa!lrado lhe seja a fonte e ·lhe fique 
264 30.• dia
sendo o centro. E' nesse divino Coração que 
Sta. Gertrudes nos mostra a fonte de delicias 
em que os Santos veem beber e nos convidam 
a beber consigo ; elle é tambem como que um 
Altar no qual os Santos offerecem as hol}lena­
gens que rendem a Deus em nosso nome, e as 
orações que lhe dirigem pelas nossas necessi­
dades. Esse terno Coração, pelas suas dôces 
pulsações, convida os bemaventurados a sup­
prír corp elle, a agradecer, a louvar a Deus por 
nós ; e em compensação, transmitte-lhes os 
nossos votos, e, suppríndo a nossa fraqueza, 
completa os louvores e as acções de graças que 
lhes queremos offerecer. 
Em toda parte N. Senhor mostra-se a 
Sta. Gertrudes acompanhado de seus Santos ; 
consóla-a com seus Santos, ajuda-a por seus 
Santos, e em toda parte tambem Gertrudes 
glorifica N. Senhor com os, seus Santos, tra­
balha em alegrai-o com seus Santos. Apro­
priar-se dos meritos e dons destes COIJlO dos 
do Coração de Jesús ; . com ella, parece que é 
um negocio de todas as circumstancias, uma 
pratica muito simples e ao alcance de todos 
o procurar nos Santos uma. cooperação em
�odas as 'nossas acções,. em· todos os nossos 
Amizade d. Santos' no S. Cor. 265 
sacrifícios, da mesma forma que um apoio 
para todas as nossas preces. 
Esta amizade que N. Senhor nos quer 
fazer contrahir com seus Santos, e de que o 
seu Coração é o meigo traço de união, cons­
titúe um dos maiores recursos da nossa fra­
queza, uma das mais preciosas riquezas da 
nossa pobreza, uma das mais puras alegrias 
do nosso desterro. Abramos o coração a essa 
amizade que a dilecta do Coração de Jesús 
nos inculca de tantos modos ; sejamos ami­
gos. dos Santos porque somos amigos do Sa­
grado Coração, e para que elles nos façam 
cada vez mais amigos do Sagrado ·Coração. 
Do ponto de vista do zelo, formemos uma al­
liança com os Santos para qui elles nos au­
xiliem com os seus recursos na guerra que 
temos de sustentar contra o mundo, e para 
que, combatendo comnosco, nos tornem po­
derosos como esse exercito em linha de ba­
talha de que falam os nossos santos Livros, ao 
qual está assegurado o triumpho final. 
Do ponto de vista da vida eucharistica, 
que é mais particularmente a dos amigos do 
Sagrado Coração, sejamos amigos dqs Santos 
para: . que elles nos ajudem ·a fazer .a côrte ao 
Rei dos reis, a consolar e rej�bjlar o meian 
266 30.• dia 
pns10n�iro do Tabernaculo, a prestar desde 
este mundo ao Deus escondido o culto de amor 
e de louvores que lhe é offerecido no céo. 
Convidt:rnol-os a assistir ás nossas festas no 
lugat; san.to ou, antes, roguemo-lhes que nos 
auxiliem a fazer nelle a Jesús urna festa con­
tinua ; que nQS façam cantar cornsigo o Al­
leluia da jubilação e o Amen do louvor, que 
façam . assim dos nossos Tabernaculos corno 
um céq. antecipado, até que possam receber 
seus amigos nos Tabernaculos eternos. 
V ejarnos porém antes, em detalhe em 
que consiste essa cara amizade que o éora­
ção de Jesús quer formar entre nós e seus 
Santos. 
Que é a amizade santa de que o Coração 
de Jesús é o unico fóco ? Póde-se definil-a 
consoante S. Thomaz : um amor reciproco 
fundado na comrnunicação dos bens sobre­
naturaes. Ora, que cornmunicação, que per­
muta ha entre os Santos e nós ? Que nos dão 
elles ? Que lhes damos nós ? b amigo do Sa­
grado Coração dá tudo aos Santos e os San­
tos -dão-lhe tudo ( 1 ) : é a amizade no mais 
·( I ) Não percamos de vista, �omtudo, que só 
se póde tratar dum augmento accid'l!ntal da felicid:1.-
Amizade d. Santos no S. Cor. 26'1 
alto gráo ; tornamo-nos por ella, como .o pro­
prio Jesús, amigos o mais possível ; maxime 
amicus (S. Thomaz) . 
§ I. Os AMIGOS DO SAGRADO CORAÇAO 
DÃO TUDO AOS SANTOS. - Sta. Gertrudes · 
ensina-nos de modo· todo luminoso e alenta­
dor a render perfeítamente ·aos Saritcis o culto 
de dulia no altar do Coração de Jesús e ·unin­
do-nos a Jesús, summo Sacerdote e Victima. 
Este culto póde reduzir-se aos quatro 
fins do Sacrifício : 1 . o a adoração de Deus nos 
seus Santos, e o louvor dirigido aos proprios 
Santos ; 2 .0 a . acção de graças dada a Deus 
pelos seus Santos, e aos propríos Santos pelas 
graças que nos alcançaram ; 3 . o a reparação 
offerecida a Deus pelos seus Santos ; 4.0 a 
oração, para augmentar a alegria . e a gloria 
dos Santos. 
1 .0 Adoração e louvor. Sta. Gertrudes 
mostra-nos, em particular, como os Santos 
são honrados pela sagrada Communhão (II, 
1 7 4) . No dia da festa de S. Thiago, Gertru-· 
des propoz-se ir á 'Mesa santa como para 
fazer a peregrinação em honra delle ; depois· 
de dos Santos, e, quanto a nós, duma participação 
nos seus meritos proporcionada á nossa cooperação 
pessoal. 
268 30.• dia
offereceu a N: Senhor o seu Corpo adoravel 
para augmentar em algum gráo a gloria e a 
alegria do illustre Apostolo, e logo o viu vir 
assentar-se com eila á mesa do Salvador, dan­
do a Deus immensas acções de graças pelo 
offerecimento que Gertrudes tinha feito em 
sua honra pela sagrada Communhão, e diri­
giu-lhe esta prece : "Senhor, dignae-vos con­
ceder em troca á vossa Esposa todas as gra­
ças que jámais concedestes a nenhum dos pe­
regrinos que têm vindo venerar o meu tu­
mula'' 
Eis ahi mats uma mina inesgotavel de 
riquezas espirituaes, um meio facil de adqui­
rir perante Deus o merito das peregrinações 
que estão em honra na Igreja, um meio de 
honrar os Santos pelo proprio -Coração de 
Jesús que pulsa no nosso peito na saograda 
Communhão, um meio de augmentar a gloria 
e a alegria desses bem -amados de nosso Deus. 
Oh ! que dôce pensamento : nós, pequenas 
creaturas, damos maior gloria e maior ·ale­
gria aos favoritos do Senhor, a esses prín­
cipes do céo cuja amizade tanto nos honra, 
e que .se mostram tão gratos ! Que gloria e 
q�e alegria para nós proprios ! 
2 . 0 Acção de graças. - "Pela festa de 
Amizade d. Santos no S. Cor. 269 
Todos os Santos (H, 22 1 ) , Gertrudes, que 
s� preparava para fazer a sagrada Communhão 
em honra de todos os Santos, admirava e 
invejava de alguma sorte o esplendor dos 
ornamentos que elles traziam diante de Deus. 
E como se entristecia de se vêr ellâ propria 
desprovida de todo ornamento, o Espírito­
Santo inspirou-lhe render graças a Deus por 
todos aquelles que elle elevou á dignidade 
sublime da virgindade, e logo viu ella su'alma 
resplender da alvura que . distingue o côro das 
Virgens ; depois deu graças pela santidade 
dos Confessores e dos Religiosos, e su'alma 
brilhou tambem da côr de jacintho que res­
plandecia nelles ; dando graças igualmente 
pelas diversas Ordens dos Santos, revestiu­
se dos ornamentos que ·assignalavam cada 
uma dessas Ordens ; emfim, rendendo gra­
ças pela universalidade dos amigos de Deus, 
viu su'alma cobrir-se dum mantot de ouro. 
Então apresentou-se ao Senhor, que, alegran­
do-se de vêl"a assim ornada, diss.e a todos os 
Santos : "Vêde a minha Esposa que vem a 
mim ornada de franjas d' ouro e enfeitada 
de toda a variedade ·dos ornamentos" De­
pois, estendendo o braço, fêl-a repousar no 
seu Coração, porque a )affluencia das de-
270 ao,• dia 
lidas·· que a inundavam. tel-a-ia feito desfal ­
lecer" . 
V em os. ainda aqui a applicação tocante 
.de _om. dos pr-incípios da espiritualidade de 
Sta. Gert±udes : .quando agradecemos a Deus 
a·s. graças qu�. e:lle conceda � nossos irmãos, 
.<OlJ1! • a ·· confia-nça �de que elle nos concederáoutras tantas, 'merecemos por alguma parte 
receber as mesmas graças. 
3 .0 Reparação. - Sta. Gertrudes, a 
estas paiavras da l iturgia : Omne genu f/ec­
�atur etc. , fazia u'ma genuflexão em nome 
dos habitantes do · céo, para reparar o que 
os Santos pudessem ter omittido nas home­
nagens prestadas a Deus durante a sua vida, 
e os Santos lhe mostravam o quanto folga­
vam com esse complemento dado á gloria 
que quereriam ter dado ao Senhor. 
Gertrudes, tambem, para reparar as 
suas negligencias no culto dos Santos, usava 
do Coração de Jesús, que é o orgão perfeito 
da nossa �ligião ; e o Salvador louvava e 
agredecia aos Santos, em nome de Gertrudes, 
com .os mais maravilhosos sentimentos de 
amizade. 
4.0 Oração. - Uma das mais amena� 
occupações de Sta. Gertrudes era rezar pelo 
Amizade d. Santos no S. Cor. 271 
augmento da .gloria e da alegria dos Santos, 
trabalhar em lhes dar o complemento dos 
seus desejos, como se exprime o B. P. Lefe­
vre no seu piedoso Memorial-: Já. . vimos va­
rias praticas suas a este; respeito::.Acciéscente­
mos aqui só mais um e:x:emplo bem com­
rnovedor, em que vemos Gertru·des . receber 
de todos, no Coração de Jesús, e por ·elle 
tambem dar do mesmo modo a todos. "Um 
dia, ( traducção de D. Mege I, 2 5 3 ) , em que 
se preparava para a sagrada Communhão, 
sentindo· vivamente a sua miseria, dirigiu-se 
ella ao seu dulcíssimo Mediador para que ene 
proprio se dignasse apresentai-a a Deus seu 
Pae. Jdús, aproxi�ando-a do seu divino 
Coração, regou-a como uma arvore ainda ten­
ra, com 9 sangue vivificador que manava do 
seu lado aberto, e d.epois apresentou-a com 
grande reverenda á SS. Trindade, que a 
recebeu com amor e ternura ' ineffaveis. Deus 
Padre prendeu aos galhos mais elevados des­
sa arvore todo o fruto que ella poderia ter 
produzido si tivesse ficado na dependencia da 
sua omnipotencia ; Deus Filho e Deus Espí­
rito-Santo prenderam da mesma lorma aos 
outros galhos todo o fruto que ella poderia 
ter dado recebendo plenamente a influencia 
30.• dia 
da sabedoria e da caridade divinas. Fazendo 
então a sagrada Communhão, pareceu-lhe que 
ella se enraizava no Coração de Jesús e que 
o sangue do Salvador, passando como uma 
seiva divina por todos os seus ramos, a fazia 
produzir frutos maravilhosos que o Rei dos 
céos fazia admirar aos habitantes da sua côrte. 
Esse espectaculo causava-lhes alegria indizível : 
elles se levantaram todos por deferencia e of­
fereceram cada qual os seus meritos, em forma 
de corôas que suspenderam · aos ramos dessa 
arvore, para gloria d' Aquelle que, ostentando 
assim as riquezas da sua �misericordia, os 
cumulava de novas delicias. Então Gertrndes 
supplicou ao Senhor que se dignasse comple­
tar os frutos que ella deveria ter produzido 
por todos os seus amigos do céo, pa terra e 
no purgatorio, e logo as suas bôas obras, figu­
radas pelos frutos da arvore, começaram a 
distillar um licor de virtude extraordinaria, 
uma parte do qual. caindo sobre os habitantes 
do céo, levou-lhes ao auge a alegria ; outra 
parte,fluindo no purgatorio, abrandou as 
penas das almas que alli se achavam ; e a ter­
ceira parte, derramando-se na terra, augmen­
tou entre os justos as doçuras da _graça, e 
Amizade d. Santos no S. Cor. 273 
entre os peccadores os amargores da peniten-. , c1a . 
Ahi estão excellentes industrias que 
tambem nós podemos empregar para nos pre­
pararmos para a sagrada Communhão, apro­
priando-nos das riquezas dos Santos ; para, nos 
unirmos cada vez mais aos Santos, visto ser 
principalmente na sagrada C�mmunhão que 
o Coração de Jesús forma o traço de união
entre elles e nós ; para augmentar as delicias 
dos Santos e accrescer-lhe os amores ; para lhes 
retribuir, numa palavra, tudo quanto have­
mos recebido delles, duplicado pelos meritos 
que lhes juntará o Coração de Jesús em nós. 
' 
CONCLUSÃO PRATICA. - Tratemos de 
fazer para nós, do santo de cada dia, suces­
dvamente, um amigo e um auxilio, - ao 
menos dos santos principaes. 
TRIGESIMO PRIMEIRO DIA 
A amizade dos Santos no Coração de Jesús 
(continuação) . 
§ 11. Os SANTOS DÃO TUDO AOS AMI­
COS DO SAGRADO CORAÇÃO. - Podemos dis­
tinguir nas obras dos Santos, como em qual­
quer bôa obra, tres partes ou meritos diffe­
rentes : a parte expiatoria, emquanto essas 
obras satisfazem pelos peccados ; a parte im­
petratoria, emquanto alcançam graças ; a parte 
latteutica, emquanto glorificam a Deus ; (não 
falamos da parte meritoria propriamente dita, 
que os Santos a ninguem podem_ communi­
car) . Ora, Santa Gertrudes mostra-nos os 
Santos dando parte nesses diversos meritos 
aos amigos do Sagrado Coração. 
1 ;o A parte expiatoria. - Nosso Senhor 
ensinava a Sta. Mechtilde recorrer aos Santos 
para pagar todas as suas d_ividas para com 
a justiça divina : os Patriarchas offereciam por 
e lia os seus desejos ardentes ; os Apostolos os 
Amizade d. Santos no S. Cor. 275 
seus trabalhos ; os Martyres os seus soffri­
mentos ; os- Confessores as suas virtudes heroi­
cas ; as Virgens a sua castidade. Abriam-lhe 
assim o thesouro das satisfações da Igreja, 
donde ella podia tirar a mancheias para si 
mesma e para os outros. 
" Sta . Gertrude� (V, 3 ) , quando certa 
vez rezava por urna irmã sua que acabava de 
morrer, viu-a repousar no Coração de Jesús, 
e todos os Santos, aproximando-se segundo 
as suas diversas Ordens, depositaram as suas 
satisfações no seio do Salvador para supprir 
ás falhas dos meritos daquella alma ; ora, 
Sta. Gertrudes conheceu que elles assim fa­
ziam porque aquella alma, quando na terra, 
costumava rogar-lhes que assistissem do mes­
mo modo as almas dos defuntos. Todos os 
Santos ao mesmo tempo testemunhavam 
grande amizade áquella alma, especialmente 
as Virgens que a tratavam como irmã" 
Que riquezas immensas nos são offere­
cidas aqui para pagarmos as dividas das al­
mas do Purgatorio ! Esse thesouro das sa­
tisfações dos Santos, que é o proprio thesouro 
em que a Igreja tira para as Indulgencias, elles 
o abrem largamente aos seus amigos, mór­
mente agora em que nos aproximamos do 
276 31.o dia 
fim dos tempos, e em que é mistér que as suas 
satisfações sejam esgotadas, sob pena de fi­
carem eternamente inúteis. Façamo-nos pois 
amigos dos Santos, . e a nossa pobreza terá á 
sua disposição essas riquezas sem limites que 
podem permittír libertarmos milhares d'almas 
do Purgatorio ao mesmo tempo, como Sta. 
Gertrudes fazia com suas irmãs. 
2.0 A parte impetratoria. - "Quando 
Sta. Mechtilde (VII, 4) se achava em agonia, 
emquanto recitavam por ella as ladainhas, 
Sta. Gertrudes viu ds diversos córos dos Anjos 
e as differentes Ordens dos Santos levanta­
rem-se, á medida que eram invocadas, e vi­
rem depositar com alegria no Coração do 
Salvador todos os seus meritos como ricos 
presentes, e o Senhor logo os doava á sua 
Bem-Amada para augmento da sua alegria e 
da sua gloria. No dia seguinte, havendo a 
Santa fallecido, Sta. Gertrudes viu, após a sua 
enthrortização no céo, os Anjos e os Santos 
que se aproximavam do Senhor e dobravam 
o joelho diante delle á maneira dos príncipes 
que recebem a investidura de seus bens da 
mão do imperador ! 'Receberam os seus merí­
tos, que haviam offerecido na vespera para 
accrescimo dos rnerítos da bem-amada do 
Amizade d. Santos no •S. Cor. 277 
Christo. corno duplicados e maravilhosamente 
ennobrecidos pelos rneritos da propria Santa" 
Eis aqui mais urna industria de riqueza 
extrema ; 'êlpropriando-nos dos merecimentos 
dos Santos, duplicarnol-os por isso mesmo, e 
os que são causa dessa multiplicação recupe­
ram em toda justiça os seus rneritos assim 
duplicados com um augrnento de alegria e de 
gloria. Assim, fazendo amizade com os San­
tos, nós dupliçarnos os nossos recursos e lhes 
duplicamos tarnbern os rneritos, a alegria e a 
gloria. E' o cumprimento desta palavra da 
Escriptura : E' melhor que dois estejam jun­
tos do que si ficassem sós, porque adquirem 
assim o beneficio da associação : Habent enim 
emolumentum societatis su02. 
3.0 A parte latreutica.- "Sta. Mech­
tilde, cantando no officio de Sta. Ignez o 
responso Amo Christum - Amo a Christo, 
queixava-se em si mesma ao Senhor de o não 
ter amado de todo o coração desde os seus 
verdes annos corno ·Ignez. Então o Senhor 
disse a Sta. Ignez : "Dá-lhe tudo o que tens" . 
Esta palavra fez cornprehender a Mechtilde 
que Deus conferiu aos Santos este favor de 
poderem dar tudo quanto elle operou nelles, 
aos que ps amam. aue rendem graças a Deus 
278 31.o dia 
por elles, que amam os dons que Deus lhes 
concedia. Tendo Sta. lgnez feito o que dis­
sera o Senhor, Mechtilde sentiu-se cheia de 
alegria ineffavel ; rogou á Rainha das virgens 
que agradecesse por ella a seu Filho, e Maria, 
attendendo ao seu rogo, deu-lhe parte ainda 
em todos os seus dons, e com os dons de 
lgnez e os dons de Maria, ella amou, honrou, 
glorificou plenamente o Senhor pelo passado 
e pelo presente" . . 
o admirabile commercium! o· amiza­
de dos Santos infinitamente preciosa ! Damo­
lhes os nossos louvores, as nossas acções de 
graças, o nosso amor, e elles nos fazem parti­
cipar, em troca, de todos os dons que o Se­
nhor multiplicou nélles para sua gloria ; e 
por elles podemos offerecer a Deus homena­
gens todas celestes. perfeitamente santas, 
verdadeiramente dignas delle ; porque "o que 
podemos por nossos amigos é como si o pu­
dessemos por nós mesmos" ( I ) , e as home­
nagens que os Santos offerecem em nosso 
nome Deus as recebe como si as offerecesse­
mos por nós mesmos. 
( 1 ) Quod possumus Per amicos, per 11os aliqzto 
1•znd o possumus. ( Principio de S. Th{'maz) . 
Amizade d. Santos no S. Cor. 279 
CONCLUSÃO. -· 1 .11 Os operarias da un­
decima hora. SomoS' os operarias da unde· 
cima hora, ociosos ou negligentes até aqui, 
e agora ainda bem fracos e bem tíbios no 
nosso humilde trabalho. Entretanto o Co­
ração de Jesús, sem merecimento algum de 
nossa parte, mas unicamente "porque elle é 
bom" , quer tornar-nos iguaes aos seus obrei­
ros das horas precedentes, quanto aos frutos 
de salvação como quanto á recompensa. Os 
Santos, nossos predecessores, glorificarão com 
isso eternamente a sua misericordia e libe­
ralidade : pares illos nobis fecisti. Que meio 
empregará elle p'ra este fim? A amizade, que 
torna iguaes os amigos : amicitia pares invenit 
aut facit. O seu Coração, que dá tudo, for­
necer-nos-á elle proprio esses sentimentos de 
amizade ; virá pulsar em nós para amar os 
Santos, para ser amigo dos Santos ; já pulsa 
e pulsará sempre no coração dos Santos para 
nos amar com a amizade mais terna ; assim no 
Coração de Jesús travaremos plenamente am._ 
zade com os Santos, e esta amizade, pela per­
muta dos bens, tornar-nos-á iguaes a elles, 
e os Santos louvarão com isso a Deus, agra­
decerão a Deus eternamente : pares illos nobis 
fecisti! 
· 
280 31.0 dia 
2 .0 Os companheiros da alma eucharis­
tica. - Não percamos nada dos recursos pre­
ciosos que N. Senhor nos offerece na amizade 
dos Santos. A' medida que as diversas festas 
do anno nos põem em relação com esses a-mi­
gos de Jesús, appliquerno-nos a invocai-os, a 
honrai-os pelo Coração do Salvador, que 
quer ser o orgão da nossa religião e do nosso 
culto ; façamos amizade /COm elles, forme­
mos sociedade com elles no Sagrado Coração 
de J esús ; e exploraremos em seguida o rico 
capital dos rneritos delles, de que entramos 
corno parte, para glorificarmos a Deus e at­
trahirrnos toda sorte de graças sobre a Igreja. 
Seja, assim, cada dia, ao pé do tabernaculo. 
uma festa nova para rejubilar Jesús em com­
panhia de algum dos seus amigos. 
E' principalmente pela sagrada cornrnu­
nhão que o Coração de J esús nos une de 
amizade aos seus Santos. corno o vemos por 
exemplo de Sta. Gertrudes. e como resulta da 
ptopria natureza do sacramento da Bucha� 
ristia, que é o Sacramento da unidade eccle­
siastica: Sacramentum unitatis ecclesiasticre 
(S. Thomaz) . E' portanto principalmente a 
alma eucharistica que elle quer fazer entrar 
nessa alliança sobrenatural ; nessa unidade. 
Amizade d. Santos no S. Cor. 281 
principio de força, nessa amizade, fonte de 
consolações. o· alma eucharistica, que helio 
é o vosso quinhão! Entrae na alegria do 
vosso Senhor, servi-o na alegria, pois os San­
tos do céo vêm associar-vos ao seu culto, que 
é toda jubilação. A vossa solidão povoar-se-á 
de habitantes celestes, o vosso deserto cobrir­
se-á de flôres rtJ.ysticas que brilham nas di­
versas ordens dos Bemaventurados ; podereis 
offerecer ao vosso Bem-Amado a gloria do 
Líbano por esses incensos numerosos que vos 
serão dados nas orações dos Santos ; circum­
dareis o Tabernaculo da beileza do Carmélo 
pela variedade dos meritos dos Santos que 
encantará os olhares do divino Prisioneiro ; e 
far-lhe-eis ecoar aos ouvidos concertos celes­
tiaes unindo-vos aos canticos dos Santos. 
Reconheci a bondade e a sabedoria do Deus 
da Eucharistia ; eile quer multiplicar os au­
xiliares do vosso zelo e os ministros do vosso 
culto, para que nada tenhaes a invejar ás 
almas activas que são as mais ricas, para que 
(VOS apegueis cada vez mais a essa parte que 
vos preparou a sua ternura e que será sem­
pre a melhor, porqt!anto a vossa parte, bem o 
vêdes, é já o céo desde esta vida, e não vos 
será tirada durante a eternidade. 
TRIGESIMO SEGUNDO DIA 
A/eu jugo é suaue e n1eu fardo leue 
Parece-nos que essas palavras tão alenta­
doras. do Evangelho acham a sua plena reali­
zação na devoção ao Sagrado Coração de 
Jesús, nessa devoção tal como Sta. Gertrudes 
nos inculca por seus exemplos e escriptos. 
nessa devoção emfim tal como Nosso Senhor 
quer dal-a aos seus amigos no seculo presente. 
Deixen1o-nos attrahir por tanto an1or, 
e ex.perimentemos saborear essa suavidade do 
jugo do Senhor no Coração de Jesús : Gustate 
et uidete. Ella nos ganhará para seu serviço, 
prender-nos-á a elle cada vez mais, e abran­
dará para nós todas as difficuldades. Sabo­
reemol-a por nós mesmos, e façamol-a sa­
borear · a todos, tanto quanto pudermos ; e 
que a nossa ultima conclusão pratica seja 
esta palavra do proprio Evangelho a respeito 
da devoção ao Sagrado Coração : Venite ad 
O doce jugo do Senhor 283 
me omnes. - Venham todos ao Coração de 
Jesús. 
. 
1 .0 Nesse Evangelho, a que se póde cha­
mar com toda razão o Evangelho do Sagra­
do Coração, parece que tudo é disposto para 
attrahir-nos, ganhar-nos, alentar-nos, ,.conso­
lar-nos, prender-nos para sempre. Nosso Se­
nhor abre primeiro seu Coração a todos os 
que estão na afflicção e carregam o peso do 
soffrimento : Vinde a mim, todos, e eu vos 
alliviarei : Vinde, não temaes, eu sou o vosso 
Salvador e vosso amigo ; abro-vos o meu Co­
ração que é tão humilde e tão manso. Nada 
ha em mim que vos possa assustar. Vim para 
vos servir, para ser a vossa victima. Quero 
gastar-me todo em vos fazer bem, tomarei 
sobre mim o trabalho e deixarei para vós a 
consolação. Rejeitae o jugo do mundo que 
haveis supportado até aqui com tantos abor.-< 
recimentos e fadigas, deponde o fardo dos vos­
sos peccados que vos esmaga ; tomae em lugar 
disso o meu jugo que é suave, o meu fardo 
que é leve, e, digo-vos em verdade, far-vos-ei 
achar o repouso para vossas almas. Sereis 
felizes no meu serviço, e o meu coração aman­
tíssimo será para vós um manancial. sempre 
aberto de consôlo e de paz. 
284 32.• dia 
Eis ahi, parece-nos, a devoção ao Sa­
grado Coração conforme o Evangelho. A' 
Providencia aprouve reservar-lhe a plena ap­
plicação á nossa época, que é tão carregada 
de peccados e de soffrimentos e servir-se es­
pecialmente de Sta. Gertrudes para mostrar­
nos a inteira realização das promessas divinas. 
2.° Com effeito, na vida como nos es­
criptos de Sta. Gertrudes, tudo respira a paz, 
tudo é impregnado de suavidade. Vê-se-lhes 
em toda parte, com um mixto de sombras 
sem duvida, pois todo quadro tem sombras, 
vê-se-lhes por toda parte a luz, a graça, o 
consôlo, a alegria. E' uma vida de oração e 
de amor, de confiança e de abandono, antes 
que de trabalho e de pena. Si procuramos 
qual é a característicade Sta. Gertrudes no 
meio de todos os outros Santos. não a acha­
mos na multidão dos soffrimentos, ou no 
brilho extraordínario das virtudes, nem nas 
grandes obras emprehendiâas ou nas grandes 
penitenci�s praticadas, porém antes no aban­
dono tranquillo á ternura de Jesús, na ac­
ceitação fiél do jugo do Senhor supportado 
sempre com suavidade, na união constante 
ao Coração de Jesús manso e humilde, no 
serviço do bom Senhor effectuado por amor, 
O doée jugo do Senhor 285 
e setnpre com um sentimento de paz e. de 
alegria. • 
3.0 Ora, é justamente. o que N. Senhor 
offerece tambem a nós. Elle escolheu essa Santa 
para nol-o mostrar, nol-o dizer, nol-o fazer 
sentir, e é ao nosso seculo, todo arrefecido e 
todo enfermo que o Coração de Jesús faz . 
esse offerecimento tão consoladorr unico que 
o póde aquecer e curar. Agora que parecemos 
estar no fim dos tempos, o Salvador diz-nos, 
como o annunciara pelo Apostolo dilecto do 
seu Sagrado Coração : Aquelle que tem sêde 
de felicidade, de graças, de paz, venha ao 
meu divino Coração que lhes é a fonte, e 
haurirá nelle tudo o que quizer sem ter que 
comprai-o nem ganhai-o por seu proprio tra­
balho : absque ulla commutatione ( 1 ) (Is. , 
55 , I) . A misericordia do meu Coração, que 
quer, antes do fim dos tempos, glorificar-se 
na sua suprema manifestação e ainar os ho­
mens até o ' ultimo limite, dispoz tudo para 
este fim. Basta que venham a mim essas almas · 
( 1 ) Porque tudo quanto eu lhe pedir de penoso 
para a natureza não será nada em comparação da 
abundancia da paz que lhe derramarei n'alma ;_ por­
que " aquelle que dá todJl. a sua substancia pelo amor, 
despreza-a como si nada tivesse dado . ". 
286 32.0 dia 
fraquinhas ; .confiem na minha bondade e 
abandonem-se á minha ternura ; descansem na 
doçura do meu divino Coração : comparti­
lhem os meus· sentimentos de humildade e de 
obediencia, e não sentirão mais o peso do 
jugo, por causa da abundancia de consola­
ções que derramarei nellas. Vinde pois todos ; 
viride sem receio, e, sem demora, para sempre 
abandonae-vos amorosamente a mim. 
Possamos nós ouvir esse appello do Co­
ração de Jesús. Vinde pois, vinde, pobres al ­
mas que vos assustaes, que tendes medo da 
Cruz, da luta, da renuncia. Vind.e pois, apro­
ximae-vos delle, e sereis esclarecidas; o dem.o­
nio do desanimo ou da tristeza enganou-vos 
até aqui ; vinde e vêde. E' o Coração de Jesús 
que se abre a vós ; é a fonte da paz, da co­
ragem, da confiança, da alegria. Não temaes ! 
Lançae-vos nesse asylo que vos é offerecido, e 
ficareis ao abrigo de qualquer temor ; mer­
gulhae-'vos nessa fonte que vos é aberta, e 
achareis nella tudo quanto o vosso coração 
deseja. Sim, confiae nessa bondade sem li­
mite, abandonae-vos a essa ternura infinita, 
e vereis, e saboreareis. Vereis que aquellas 
penas interiores que vos embaraçavam déram 
lugar á paz ; que aquelles soffrimentos que 
O doce jugo do Senhor 287 
vos abatiam se ach�m inteiramente abranda­
dos ; que aquellas contradições que vos deso­
lavam fazem resultar maravilhosamente os 
vossos emprehendimentos; que aquellas en­
fermidades que vos tiravam a coragem, tor­
nam-se companheiras dulcíssimas e · vos pro­
porcionam toda sorte de graças ; que aquella 
pratica da mortificação que vos espantava re­
dunda antes· no maior bem, da vossa alma 
como do vosso corpo ; que todas aquellas 
penas, numa palavra, em que o demonio vos 
deixava vêr a cruz e vos occultava a uncÇão 
que a acompanha, mudam-se em consolações 
de suavidade toda celeste. Provae e vêde ! 
Confiança e abandono ! O que vos offerece o 
Coração de Jesús é antes a suavização das 
pe�as que vos atemorizariam, a paz e a ale­
gria- d9 coração, a abundancia da graça· que 
vos encorajará , em proporção da vossa con­
fiança e do vosso generoso abandono. 
CONCLUSÃO PRATICA. - } .0 Dedique­
mo-nos cada vez mais á devoção ao Sagra
.
do 
Coração. 
2.0 Sirvamo-nos, para este fim, dos 
exemplos, dos esc"tiptos, da intercessão de Sta. 
Gertrudes. 
3.0 Propaguemol-os em torno de nós, 
32.• dia 
tanto quanto pudermos, porque é mui parti­
cularmente o soccorro e o remedio . preparado 
pela misericordia para estes ultimas tempos 
( 1 ) . 
( 1 ) Os escriptos de Sta. Ge:irudes podem ser 
offerecidos a todos, mesmo ás pessôas do mundo, - ­
fizemos a exper-iei)cia varias vezes, - porém sob 
differentes formas ; ás .pessôas a quem espantaria 
uma forma demasiado mystica, podem-se offerecer os 
dois livros que o R. P. Cros extrahiti das /nsimuz­
ções : o CORAÇÃO DE SANTA GERTRUDES e 
o ANNO DE SANTA GERTRUDES. Esses dois
livros já têm feito muito bem, mesmo ás pessôa;s do 
mundo, e são um dos mais graciosos presentes que 
se possam fazer. 
Lembremos tambem as Orações de Sta. Gertru­
des e os Exe.rcicios de Sta. Gertrudes, editaoos por 
D. Guéranger. 
O abbade Lagrelette, cura em Bar-le-Duc,. que 
mandou construir uma bella capella a Sta. Gertru­
des, e que não é licito esquecer quando se trâta dessa 
grande Santa, tambem fez editar pequenas folhas de 
orações a Sta. Gertrudes, assim como imagens que 
tem espalhado em profusão ha 60 annos e que mui­
to têm contribuído para popularizar-lhe o culto. Um 
boletim publicado de vez em quando dá contas das 
graças alcançadas por intercessão della, não só ni!l
.França, mas em todas as regiões do mundo, e até na 
America, onde as orações e as imagens do abbade
Lagrelette têm ido levar o amor de Sfa. Gertrudes r 
do Sagrado Coração. 
TRIGESIMO TERCEIRO DIA 
Nossa Senhora do Sagrado Coração 
Parece que a ui tima palavra das mise­
ricordias do Coração de J esús e dos incenti­
vos que elle concede ao nosso pobre s.eculo, 
é Nossa Senhora do Sagrado .Coração, a bo­
níssima, a misericordiosissirna, a esperança dos 
desesperados. 
Não sairemos do nosso assumpto, mas 
antes lhe juntaremos u� complemento ne­
cessario, terminando-o por urna palestra sobre 
Nossa Senhora · ·do Sagrado Coração. 
Exponhamos simplesmente aqui, seguin­
do sempre a nossa bôa Santa por guia, alguns 
pensamentos que nos parecem bem animado­
res, bem proprios para facilitar-nos a realiza­
ção dos nossos mais caros desejos. Piedoso 
leitor, que nos haveis seguido até aqui, que 
desejaes principalmente ? Honrar o Coração 
de Jesús e Maria sua Mãe ; trabalhar pela 
conversão dos pobres peccador�:s ; coop�:rar 
290 33,o dia 
por vossa parte na obra da reparação. Pois 
bem ! digo que por Nossa Senhora do Sa­
grado Coração chegareis a todos esses fins 
da maneira mais segura e mais suave, suaviter 
et fortiter. Ella vos conduzirá a elles mater­
nalmente, pelo coração � suavissimamente. 
V ereis e sentireis, pela mais dôce das experien­
cías, que progredis mais abandonando-lhe á 
conducta, para gloria de Deus, a vossa pro­
pria santificação e a salvação de vossos irmãos, 
do que por todos os outros meios que pu­
désseis empreg�r. 
I. NOSSA SENHORA DO SAGRADO CORA­
ÇÃO E O CULTO DE MARIA. - Pela devo­
ção a Nossa Senhora do Sagrado Coração. 
preenchemos para com Maria, da maneira 
mais excellente, os quatro · fins da virtude de 
religião. Honramol-a e lhe rendemos graças 
pelo Coração de Jesús, que se faz de algum 
modo o orgão do nosso culto para com ella ; 
imploramos as suas graças e o nosso perdão 
pelos titulas· que mais lhe tocam o coração ; 
porquanto, invocando-a como Soberana do 
Coração de Jesús, invocamol-a como a Ra­
inha do amor e da misericordia, que não 
póde deixar de exercer 'para comnosco esse 
duplo attributo tão glorioso. 
N. Sra. do S. Cor. 291 
E primeiramente, que louvores mais per­
feitos, que acções de graças mais commove­
doras poderemos offerecer a Maria do que as 
do Coração de Jesús, ao qual no
.
s unimos 
para honrai-a ? 
Um dia de festa de Maria, Sta. Gertru­
des cantava, unindo-se ao Coração de Jesús, 
o officio dessa gloriosa Rainha, e viu então 
Jesús attrahir para o seu Coração diviho os 
louvores que encerravam os Psalmos, e do 
seu Coração brotavam elles como ondas im­
petuosas para a Bemaventurada Virgem, sua 
Mãe. 
Chegada a antiphona : Sois toda bella,a Santa esforçava-se por cantar essas dôces 
palavras pelo proprio Coração de Jesús, em 
memoria dos carinhos appellativos e dos lou­
vores filiaes que elle proprio deve ter prodi­
galizado em semelhantes termos a sua Mãe 
dilecta durante a sua vida mortal. Então es­
trellas brilhantes jorraram do Coração de 
Jesús e inundaram Nossa Senhora com seu 
brilho : figjuravam esses louvores. Algumas 
caiam, aqui e acolá, no chão. Os bemaven­
turados habitantes do Céo recolhiam-nas e 
apresentavam-nas a Jesús, com os testemu­
nhos duma admiração e alegria inexprimi-
292 33.o dia 
veis. Gertrudes comprehendeu dess'arte que os 
louvores que o Coração de Jesús tributa a 
Nossa Senhora são para os Santos uma fonte 
ine:xprimivel de gloria e de felicidade. 
Ao mesmo tempo, os Anjos, unindo as 
suas vozes aos cantos das irmãs de Gertrudes, 
diziam: Quce est ista? - Quem é esta ? E, em 
voz alta e possante, J esús respondia : E' a mais 
bella das filhas de Jerusalém . . Esta voz partia 
da harpa divina do Coração de Jesús, e o 
Espírito-Santo parecia dedilhar-lhe as cordas, 
para fazel-a dignamente celebrar as glorias so­
breeminentes da Virgem Maria. 
Como que inebriada de ventura, Maria 
inclinou-.se sobre o Coração de seu Filho 
amantíssimo, e pareceu saborear nelle a paz 
dum dôce somno ; mas1 ao canto da estrophe 
O •gloriosa Domina, reergueu-se como que 
para responder ao appello de .suas filhas, e 
·�stendeu a mão so,bre ellas em signal de
maternal . benevolencia, como para dizer-lhe
que, tendo 14>do poder sobre o Coração de
seu Filho, as protegeria efficazmente ·contra
os seus inimigos ( 1 ) .
A exemplo de Sta. Gertrudes, com pro­
funda humildade e confiança filial, honremos 
(1) Vê An11o de Sta. Gcrtmdcs, ·P· 233. 
N. Sra. do S. Cor. 293 
aquella que é nossa Mãe, como é a Mãe de 
Jesús ; pelo Coração de seu divino Filho agra­
deçamos a Maria, roguemos a M;uia, peça­
mos perdão a Maria pelo Coração de Jesús ; 
tudo quanto fizermos por elle, será perfeito. 
Quanto mais sentirmos a nossa indignidade 
e impotencia em honrar essa grande Rainha, 
tanto mais devemos crêr que podemos tudo 
.em Jesús. Offereçamos a Maria o Coração de 
J esús, e a nossa offerta será bem escolhida e 
nada faltará á nossa devoção. 
Citemos ainda outro exemplo da nossa 
cara Santa, onde poderemos vêr que Maria 
acceitava as homenagens que ella lhe offerecia 
pelo Coração de Jesús, com mais favor do 
que todas as outras : era pela festa da Nati­
vidade ; Gertrudes, retida no leito pela enfer­
midade, via os anjos de suas irmãs offerecerem 
os seus cantos piedosos á Rainha do Céo sob 
a forma de ramos verdes. 
Ai ! minha dôce Mãe, disse então · Ger­
trudes, porque hei de ser indigna de associar 
a minha voz á voz de minhas irmãs ? "Não 
te afflijas, respondeu Nossa Senhora : a tua 
bôa vontade compensa essas perdas apparen­
tes. Nenhum exercido exterior poderia, com 
effeito, agradar-m� como a inten�ão que vejo 
294 33.o dia 
em tua alma de louvar-me, segundo o teu 
costume, pelo Coração dulcíssimo de meu 
filho. Para te dar a prova, quero eu propria 
offerecer, em teu nome, á Trindade Santa 
um ramo carregado de flôres e de' frutos, e 
as tres Pessôas divinas ficarão encantadas com 
a minha · offerta. 
Jesús offerece tarnbern a nós o seu di­
vino Coração para nos servir a honrar Maria. 
Deseja a"rdenternente que façamos assim tarn­
bern ; é urna viva alegria que lhe proporcio­
namos, e elle quer testemunhar-nos o seu 
reconhecimento. Escutemos ainda : Durante o 
mesmo officio, á antiphona : Oh! como sois 
bella Gertrudes cantou interiormente es­
sas palavras, dirigindo-as a Maria pelo pro­
prio Coração de Jesús. Nosso Senhor exter­
nou-lhe, por graciosa inclinação de cabeça, 
que essa devoção lhe agradava, e accrescentou : 
"Quando chegar a hora, pagar-te-ei a gloria 
que dás agora, em meu nome, a minha ca­
ríssima Mãe" 
Oh ! ternura, oh ! alegria, oh ! amor. 
Quero· perder-me no amor do Coração de 
Jesús e do Coração de Maria. Oh ! Nossa 
Senhora do Sagrado Coração, tornae o meu 
c:oração, uni-o com o Coraç.ão de Jesús, �uar· 
N. Sra. do S. Cor. 295 
dae-o por todo o sempre para as detidas do 
vosso Coração materno ! 
11. NOSSA SENHORA DO SAGRADO CO­
RAÇÃO E A DEVOÇÃO AO CORAÇÃO DE JESÚS. 
- E' Nossa Senhora do Sagrado Coração 
quem tem a chave do Coração de Jesús. 
Abre-o como quer, para fazer-nos entrar nel­
le e abeberar-nos nelle nas proprias fontes da 
gr-aça. Cor regis in · manu DominCP.. o coração 
do Rei, poder-se-ia traduzir á maneira de S. 
Bôaventura, está nas mãos de Nossa Senhora 
do Sagrado Coração : e lia o inclinará para o 
lado que quizer, conciliar-lhe-á os favores, 
assegurar-lhe-á as misericordias a quem quizer. 
Não, não receiemos attribuir a Maria dema­
siado poder sobre o Coração de seu Filho : 
ella é soberana desse Coração além de qualquer 
expressão e de qualquer pensamento, e é as­
sim que apraz a Jesús honrar sua Mãe. 
A Igreja. que ' conhece os segredos divi­
nos, não receia, para melhor nos fazer enten­
der o imperio dado por Jesús a Maria, em­
pregar até na liturgia formulas que podem 
parecer excessivas. Assim permitte-nos cantar : 
Tua per precata dulcíssima, nobis concedas 
veniam per sCP.cula : Por vossos rogos tão 
poderosos sobre o Coração de Jesús, conce-
296 33.o dia 
dei-nos para sempre, ó Maria, o perdão dos 
nossos peccados. Dever-se-ia dizer : alcançae­
nos; tal é porém o infallivel poder da inter­
cessão de Maria, que ella parece conceder, si 
bem que obtenha. 
Neste m:esmo espírito, a Igreja dirige-se 
directamente a Maria para solicitar bens que 
só Deus póde dar. Canta : Solve vi nela reis, 
profer lumen ca!cis. - Quebrae os grilhões 
dos culpados, levae a luz aos cégos, etc. Te­
nhamos pois o espírito da Igreja, porque a 
Igreja tem o espírito de Deus. E' neste fun­
damento inabalavel , na propria Pedra, que 
se apoia a devoção a Nossa Senhora do Sa­
grado Coração ( I ) .
A maior graça que nos possa alcançar 
essa toda poderosa e bôa Mãe, a que resulta 
do seu proprio titulo de Nossa Senhora do 
Sagrado Coração, é a da devoção ao Sagrado 
Coração de Jesús. Oh ! peçamos.:"Ihe instante­
mente que ella nos alcance este dom. Foi ella 
quem o obteve para todos até aqui, desde a 
beata Margarida-Marl'a, desde Sta. Gertrudes, 
e desde S. João Evangelista. S. João, effecti­
vamente, toma primeiro Maria por sua Mãe, 
( I ) Vê r Anno de Sta. Gertrudes, l'· 233, 
• N. Sra. do S. Cor. 297 
e é por ella que recebe o dom do Sagrado 
Coração de Jesús. Ora, si S. João represen­
tava-a de modo geral todos os christãos, re­
cordemos que representava tambem muito es­
pecialmente os amigos do Sagrado Coração 
de Jesús ; será portanto por Maria, por Nossa 
Senhora do Sagrado Coração de Jesús. 
111 . NOSSA SENHORA DO SAGRADO CO­
RAÇÃO E OS POBRES PECCADORES, cuja con­
versão desejamos alcançar. - Ella é que será 
a nossa mais dôce e mais !legura esperança 
a respeito delles, mesmo para os mais desespe­
rados. Ella é quem nos fará haurir para elles 
graças de misericordia no Coração de Jesús, 
e quem, sustentando maternalmente o nosso 
zelo pela conversão desses pobres transviados, 
nos fará perseverar até a alcançarmos ; porque 
um coração de mãe nunca se cansa, nunca de­
sanima e acaba geralmente por triúmphar dos 
corações mais endurecidos. 
Oh ! como ella folgará de que lhe lem­
breis a este respeito, com confiança toda fi­
lial, o que lhe dizia Sta Gertrudes ao im­
plorar della uma graça de misericordia ex· 
traordinaria : "O' Mãe de bondade, si Deus 
vos deu por Filho aquetle cujo coração é a 
propria fonte da misericordia, não foi para 
298 33,o dia 
que derrameis essas aguas da graça sobre to­
dos os miseraveis, e para fornecer á vossa 
inexhaurivel caridade o meio de subtrahir aos 
olhos da justiça a multidão dos nossos pecca­
dos e das nossas culpas?" Vereis essa terna 
Mãe, no mesmo instante, mostrar-vos, como 
a Sta. Gertrudes, um semblante radiante de 
graça e de misericordia. Sentireis que o seu 
coração está commovido, e que o Coração de 
Jesús, sentindoa repercussão dessa emoção, 
se acha enternecido em favor das almas para 
as quaes solicitaes o perdão. 
Oh ! si soubéssemos o quanto Maria se 
commove com as miserias das nossas almas, 
quão ardentemente deseja a salvação desses 
pobres peccadores pelos quaes sacrificou seu 
Filho Jesús ! Um dia em que Gertrudes lh'o 
recordava por estas palavras da liturgia : Por 
vós nos véiu a redempção, a misericordiosa 
Mãe pareceu tão vivamente enternecida que, 
desfallecente de algum modo, repousou a ca­
beça no Coração de Jesús, e ahi, multiplicando 
as supplicas e as demonstrações de amor, con­
jurou-o a derramar copiosamente sobre as 
almas as graças da redempção. Oh ! como o 
Coração de Jesús poderia oppôr-lhe uma re­
çus� ! O amor· que elle tem í1 sua mãe não é 
N. Sra. do S. Cor. 299 
incomparavelmente maior do que a aversão 
que tem aos nossos peccados ? Um dia em que 
a nossa Santa dirigia a Nossa Senhora 
est' outra oração da liturgia : - Interceda ella 
propria pelos nossos peccados, viu Maria re­
petil-a a seu divino Filho, e ·Jesús, de sem­
blante sorridente, responder a sua Mãe : 
"Dei-vos, minha venerada Mãe, em virtude 
da minha omnipotencia o direito de recon· 
ciliar com minha justiça, ao gosto do vosso 
coração, todos os peccadores que recorrem de­
votamente á vossa intercessão" . E como Ger­
trudes proseguisse com o canto sagrado : Uni 
os vossos rogos aos nossos, ó Mãe de mise­
ricordia : "Sim, respondeu a bemaventurada 
Virgem, meu coração fala por vós ao Cora­
ção de meu "Bem-Amado" . O Coração de 
Maria que fala ao Coração de Jesús por nós 
pobres peccadores, é a misericordia que se 
entende com a misericordia para soccorrer os 
miseraveis : o Coração de Maria que fala ao 
Coração de Jesús por essas almas infortuna­
das cuja conversão queremos, é a mais dôce 
esperança para sustentar o nosso zelo! Ah ! 
comprehendo que a · Igreja saúde Nossa Se­
nhora do Sagrado Coração com o titulo de 
esperanfa dos çlesesperadQs. GQstemos d� 
300 33,o dia 
lembrar a essa terna Mãe este dôce nome que 
é a ultima palavra das suas glorias redemp­
toras. Invoquemol-a com confiança sob esse 
titulo bemdito, e veremos sempre exitos con­
soladores virem acoroçoar-nos os esforços pela 
conversão .aos peccadores. 
Tenhamos confiança em Nossa Senhora 
do Sagrado Coração especialmente com rela­
ção á nossa pobre patria, a que ella se deu. 
Sim, lembremo-nos, em meio ás nossas des­
ditas, de que Nossa Senhora do Sagrado Co­
ração se revelou e se deu primeiro e muito 
especialmente á França, e depois pela França 
ao resto da Igreja, como para nos dizer que, 
si quizermos pôr a proveito esse dom mara­
vilhoso que ella nos faz, ella reanimará a 
fé e a caridade. 
IV. NOSSA SENHORA DO SAGRADO CO­
RAÇÃO E AS ALMAS REPARADORAS. - Sois 
vós sobretudo, caras almas, que deveis ter 
confiança em Nossa Senhora do Sagrado Co­
ração. Vós respondeis aos seus desejos mais 
ardentes : ella baterá comvosco, por todas as 
pulsações do seu coração, á porta da miseri­
cordia divina, que outra não é sinão a aber­
tura do Coração de Jesús, e podereis haurir · 
abundantemente nas fontes do Salvador gra-
http://alexandriacatolica.blogspot.com.br
N. Sra. do S. Cor. 801 
ças de reparação. Oh ! sim, i�e bem toda con­
fiança a Nossa Senhora do Sagrado Coração, 
e essa Mãe ternissima fará comvosco como 
fez com Sta. Gertrudes. Cobrirá primeira­
mente com o manto da sua misericordia as 
vossas proprias culpas e negligencias ; depois, 
á medida que lhe offerecerdes as vossas abras 
de reparação, "inclinar-se-á para o coração de 
seu Filho e offerecerá por um ·beijo da sua 
bôca maternal todas as vossas praticas" , uni­
das ás suas proprias obras reparadoras, que 
lhes asseguram merito incomparavel. 
Talvez, nessa vida de reparação a que 
a graça vos attrahe, receieis a vossa fraqueza 
e inconstancia, ou temaes attrahir sobre vós 
provações fortes demais. Offerecei-vos a Nos­
sa Senhora do Sagrado Coração, abandonae­
vos á sua guia maternal, e não temereis mais. 
Ella vos fará haurir no Coração de Jesús o 
amor que dá forças ; só deixará chegar a vós 
as provações que vos podem fazer bem; me­
nores talvez do que as que teríeis sem o vosso 
offerecimento, e certamente acompanhadas 
duma graça maior que as amenizará. Colherá 
nos thesouros do Coração de Jesús com que 
supprir o que falta aos vossos pequenos es­
forços, e vereis, como tantos outros antes de 
302 33.o dia 
vós, que a trilha das_ almas reparadoras é toda 
recta e luminosa quando se avança nella ar­
rimado á mão de Maria ; que é semeada de 
graças para vós mesmas e para vossos irmãos. 
Assim, pois, confiança sem limites nessa bôa 
Mãe, e, si não ousaes offerecer-vos como vic­
timas do Coração de J esús, sêde víctimas de 
Nossa Senhora do Sagrado Coração. 
CONCLUSÃO PRATICA. - Praticar de­
voção especial para com Nossa Senhora do 
Sagrado Coração, para que ella nos faça entrar 
no Coração de J esús. 
http://alexandriacatolica.blogspot.com.br
LADAINHAS DO 
SAGRADO CORAÇAO DE JESúS 
approuadas por Leão XIII, a 27 de Junho 
de 1 898 . 
Senhor, tende piedade de nós. 
J esús-Christo, tende piedade de nós. 
Senhor, tende piedade de nós. 
Jesús-Christo, escutae-nos. 
J esús-Christo, attendei-nos. 
Pae celeste, que sois Deus, tende piedade de 
nós. 
Filho. Redemptor do mundo, que sois Deus, 
Espírito-Santo, que sois Deus, � 
Trindade Santa, que sois um só Deus, g_ 
Coração de Jesús, Filho do Padre eterno, � 
Coração de Jesús, formado pelo Espírito- :;· 
Santo no seio da Virgem Mãe, fr 
Coração de Jesús, unido consubstanciai- g.. 
mente ao Verbo de Deus, g.. 
Coração de J esús, de infinita majestade, t:t 
Coração de Jesús, templo Santo de Deus, �-
304 Ladainha ao S. Cor. 
Coração de Jesús, tabernaculo do' Altís­
simo, 
Coração de Jesús, casa de Deus e porta do 
Céo, 
Coração de Jesús, fornalha ardente de ca­
ridade, 
Coração de Jesús, santuario de justiça e 
de amor, 
Coração de Jesús, cheio de bondade e de 
amor, � 
Coração de Jesús, abysmo de todas as vir- 5. 
� md�. � 
Coração de Jesús, dignissimo de todo lou- :;; · c. vor, lll 
Coração de Jesús, rei e centro de todos os � 
corações, � 
Coração de Jesús, em que estão todos os ::I 
thesouros da sabedoria e sciencia, �· 
Coração de Jesús, em que reside toda a ple­
nitude da Divindade, 
Coração de Jesús, em quem o Pae poz to­
das as suas complacencias, 
Coração de Jesús, de cuja plenitude todos 
nós havemos recebido, 
Coração de Jesús, desejo das collinas eter­
nas, 
Ladainha ao S; Cor. 305 
Coração de Jesús, paciente e misericordio-· 
sissimo, 
Coração de Jesús, prodigo de beneficios 
para com todos os que vos invocam, 
Coração de Jesús, fonte da vida e de san-
tidade, � 
Coração de J esús, propidação pelos nos- 5. 
sos peccados, � Coração de Jesús, saciado de opprobrios, ;;· 
Coração de Jesús, esmagado por causa das g. 
nossas iniquidades, • !?' 
Coração de Jesús, obediente até á morte, � 
Coração de Jesús, traspassado pela lança, ::::1 
Coração de Jesús, fonte de toda consola- �-
ção, 
Coração de Jesús, nossa vida e resurrei-
ção, 
Coração de Jesús, nossa paz e reconciliação, 
Coração de Jesús, victima dos peccadores, 
Coração de Jesús, salvação dos que em vós 
esperam, 
Coração de Jesús, esperança dos que mor­
rem em vós, 
Coração de Jesús, delicias de todos os San­
tos, 
Cordeiro de Deus, que tiraes os peccados do 
mundo, perdoae-nos, Senhor, · 
306 Consagração 
Cordeiro de Deus, que tiraes os peccados do 
mundo, ouvi-nos, Senhor, 
Cordeiro de Deus, que tiraes os peccados do 
mundo, tende piedade de nós. 
V. Jesús, manso e humilde de Coração. 
R. Fazei o nosso coração semelhante ao vosso. 
OREMOS 
Deus omnipotente e eterno, olhae para o 
Coração de vosso diviníssimo Filho e para 
os louvores e satisfações que vos tributa em 
nome dos peccadores ; e aos que imploram a 
vossa misericordia concedei benigno o vosso 
perdão em nome desse mesmo vosso Filho 
Jesús Christo, que comvosco vive e reina, em 
unidade do Espirito-San:to ,por todos os se­
cuias dos seculos. Assimseja. 
ACTO DE DESAGGRAVO 
AO SAGRADO CORAÇÃO DE JESÚS 
O' Coração adoravel de meu divino Sal · 
vador, penetrados da mais viva dôr á vista de 
todos os ultrajes que haveis recebido e que 
recebeis ainda todos os dias no SS. Sacra-
Consagração 307 
menta, humildemente nos postramos diante 
d� Vós, e vos pedimos perdão e misericordia 
para tantos pobres peccadores que não cessam 
de offender-Vos, para tantos herejes e ímpios. 
que vos desprezam e blasphemam, para tan­
tos christãos que vos ultrajam por suas com­
munhões sacrílegas, que Vos affligem por suas 
irreverencias na igreja ou pela sua indiffe­
rença e frouxidão. Pedimo-Vos sobretudo 
perdão para nós mesmos, que V os havemos 
tantas vezes offendido pelos nossos peccados 
e iniquidades. 
Oh ! não podemos, bom Salvador, re­
parar por nossas homenagens os ultrajes que 
soffre o Vosso divino Coração ! Não poder­
mos apagar por nossas lagrimas os crimes que 
se commettem contra a vossa soberana .. Ma­
jestade! Mas a nossa impotencia oppõe-se aos 
nossos desejos. Entretanto. em espírito de ex­
piação, de reparação e de desaggravo, offe­
recemo-Vos o nosso corpo e a nossa alma, 
todos os nossos pensamentos, palavras, ac­
ções, soffrimentos e penas : O' dôce Coração 
de Jesús, recebei esta offerta em união com 
o amor e as adorações do Coração da V assa 
Santa Mãe, e com as homenagens dos Anjos 
e dos Santos. 
308 Consagração 
Transforme o nosso coração criminoso, 
e dae-nos um coração segundo o Vosso, um 
coração contrito e humilhado, um coração 
puro e sem mancha, um coração que não 
seja mais doravante sinão urna victirna con­
sagrada á Vossa gloria e abrasada do fogo 
sagrado do Vosso amor. 
Por nossa parte, queremos reparar as 
nossas ingratidões passadas por urna vida 
christã e virtuosa, pelo nosso respeito e de­
voção nas igrejas, pela nossa assiduidade em 
visitar-Vos no SS. Sacramento, pelo nosso 
fervor em receber-Vos na sagrada cornmu­
nhão. Possam estas resoluções ser agradaveis 
ao Vosso divino Coração, e attrahir sobre 
n'ós FOmo sobre os que Vos ultrajam os 
olhares da vossa misericordia I 
� J\ssim seja. 
FORMULA DE CONSAGRAÇÃO 
AO SAGRADO CORAÇÃO DE JESÚS 
Dulcíssimo Jesús, Redernptor do genero 
humano, lançae um olhar favoravel sobre nós, 
que humildemente estamos prostrados ao pé 
do vosso altar. Nós somos e queremos ser 
Consagração 309 
vossos ; e para podermos estar mais intima­
mente unidos a vós, neste dia cada um de 
nós se consagra espontaneamente ao vosso sa-
grado Coração ! 
• 
Muitos homens ha que nunca vos co­
nheceram, muitos vos têm desprezado trans­
gredindo os vossos preceitos. 
Tende compaixão duns e doutros, ó 
amabilíssimo Jesús, e attrahi-os todos ao vos· 
so sacratíssimo Coração. 
Sêde, "Senhor, o Rei não só dos fiéis 
que nunca se afastaram de vós, mas tambem 
dos filhos prodigos que vos abandonaram : 
fazei que estes voltem depressa á ·casa paterna, 
para não morrerem de miseria e de fome. 
Sêde o Rei daquelles que estão domina­
dos pelo erro oU: separados da Igreja pelo 
schisma ; trazei-os ao porto da verdade e á 
unidade da fé, afim de que em breve haja 
um só rebanho e um só pastor. 
Sêde finalmente o Rei de todos aquelles 
que ainda estão mergulhados nas antigas su­
perstições dos gentios, e não recuseis arran· 
cal-os ás trevas para os conduzirdes á luz e ao 
reino de Deus. 
Dae, Senhor, á vossa Igreja a salvação, 
a bonilnça e a lib�rdade. Çoncedd a todas ªs 
310 Consagração 
nações a paz e a ordem, e fazei que duma 
extremidade �da terra· á outra resôe uma só 
voz : Louvor ao Coração divino que nos deu 
a salvação ; a Elle sejam dadas honra e gloria 
por todos os seculos dos seculos. Assim seja. 
ACTO DE CONSAGRAÇAO 
AO SAGRADO CORAÇÃO DE JESÚS 
O' Coração adoravel de Jesús, o mais 
terno, o mais amavel , o mais generoso de 
todos os corações, penetrado de gratidão á 
vista dos vossos benefícios, venho consagrar­
me a vós sem reserva e para sempre. Quero 
empregar-me com todas as forças em propa­
gar o vosso culto e em ganhar-vos, si pos­
sível, todos os corações. Recebei hoje o meu, 
ó Jesús, ou antes tomae-o vós mesmo, trans­
formae-o, puríficae-o para tornai-o mais dig­
no de vós ; tornae-o humilde, manso, pa­
ciente, fiél e generoso como o vosso, abrasan­
do-o de todos os fogos do vosso amor. Es­
condei-o no vosso divino Coração, com to­
dos os corações que vos amam e que vos são 
consagrados, e não permittaes que eu o re­
tome nunca. Ah ! ;mtes morrer do que Já-
Oração de agrado 311 
mais contristar o vosso coração adoravel. 
Sim, Coração de Jesús, sempre amar-vos, hon­
rar-vos, servir-vos, ser sempre todo vosso : é 
a· voto do meu coração, para a vida e para a 
morte, e em toda a eternidade. Assim seja. 
ORAÇÃO EFFICACISSIMA 
O' Deus, que vos communicastes com 
tanta familiaridade a vossa esposa Sta. Ger­
trudes durante a sua vida, e que promettestes 
attender, depois da sua morte, os que por sua 
intercessão reclamassem o vosso soccorro, hu­
mildemente prostrado diante de vós, com o 
intúito de reparar as minhas faltas e negli­
gencias, e merecer a vossa poderosa protec­
ção, dou-vos graça, conforme o desejo della, 
pelos cinco beneficios particulares com que a 
cumulastes : -I . o Por a haverdes escolhitio gra­
túitamente desde toda a eternidade ; 2.0 Por 
a terdes attrahido tão suavemente a vós; 3 .0 
Por a haverdes unido tão estreitamente a vós ; 
4.0 por terdes feito as vossas delicias de ha­
bitar no seu coração ; 5. o emfim, por vos 
haverdes dignado consumar tão admiravel­
mente a vossa obra nella, pela eterna felici­
dade, 
312 Oração de agrado 
Que todas as creaturas no céo", na terra 
e nos abysmos vos glorifiquem, ó meu Deus, 
e vos agradeçam o excesso de vosso amor a 
essa grande santa, vossa esposa. Em troca 
desta acção de graças e fundado nas promes­
sas obsequiosas que lhe fizestes, conjuro-vos, 
por seus piedosos merecimentos, me conce­
daes o favor que vos peço hoje. Assim seja. 
O A . M . D . G .
http://alexandriacatolica.blogspot.com.br
I N D I C E
Pag. 
APRESENT AÇAO . 3 
Prefa�io J 3 
t .• Dia. - Convite do Coração de Jesús 18 
2. • Dia. - Amor do Coração de ] esús 27 
3.• Dia� - Finalidade intima · da devoção ao 
Sagrado Coração : attrahir todos 
os corações ao amor de Nosso Se-
nhor . 
· 
38 
4." Dia. --.:. Vida intima do Coração de Jesús 46 
�.· Dia, - Os qesejos elo Cora�ão de Jesús S6 
316 Indice 
Pag. 
6. • Dia. - Os desejos do Coração de Jesus 
( continuação) . •52 
7.• Dia. - Primeiro fruto da devoção ao Sa­
grado Coração : o Coração de J e-
sús . vivifica todas as nossas obras 68 
8.• Dia. - O Coração de Jesús vivifica as nos-
sas obras ( continuação) . 7tJ 
9.• Dia. - Segundo fruto da devoção ao Sa­
grado Coração : o Coração de J e-
sús repara por nós . 82 
10.• Dia. - Os caminhos fáceis do amQr divi-­
no .pela devoção ao Sagrado Co-
ração, segundo Sta. Gertrudes . 94 
11.• Dia. - Os caminhos fáceis do amor divi­
no pela devoção ao Sagrado Co­
ração, segundo Sta. Gertrudes 
( conJinuação) , 102 
12.• Dia. - A vida de amizade com o Cora­
�ão de Jesús, conforme Sta. Ger-
�r\ldes , • , 108 
· lndice 
13.• Dia. - Vida de aba!Jdono confiante ao Co-
317 
Pag. 
ção de Jesús . 116 
14." Dia. - Vida de abandono confiante ao Co-
• ração de Jesús (continuação) 126 
15." Dia. - A vida de religião no Coração de 
Jesús 135 
16.• Dia. - Vida de adoração (continuação) . 146 
17.• Dia. - Vida de acção de graças . 156 
18." Dia. - Vida de acção de graças ( contimta-
ção) . 163 
19.0 -Dia. - Vida . de reparação 169 
20.• Dia. - Vida de reparação (continuação) 180 
21." Dia. - A alma consoladora do Coração 
de Jesús, conforme Sta. Gertru-
des . 188 
22. • Dia. - A alma consoladora do Coração 
de Jesús (continuação) 196 
318 . · lndice 
Pag. 
23. • Dia. - A Victima do Coração de J esús, 
segundo Santa Gertrudes 202 
24." Dia. - A Victima de desejos 210 
25.• Dia. - A Victima de desejos ( continua-
ção) . 220 
26." Dia. - A Victima de louvor do Sagrado 
Coração de Jesús 230 
27." Dia.- A Victima un�versal e perpetua 
do Coração de J esús, segu,ndo Sta. 
Gertrudes . 240 
28. • Dia. - A Vida de alegria no Coração de 
Jesús, segundo Sta. Gert�udes . 250 
29.• Dia. - A Vida de alegria no Coração de 
Jesús (continuação) . 257 
30." Dia. - A amizade dos Santos no Cora­
ção de J esús . 
31 ." Dia. - A amizade dos Santos no Coração
de J esús (continuação) 
263 
27.4 
lndice 919 
Pag. 
32.• Dla. - M�u jugo é suave e meu fardo leve 282 
33.0 Dia. - Nossa Senhora do S?grado Cora-
ção 230 
Ladainhas • Sagrado Coração de J esús 30.J 
Acto de desaggravo ao Sagrado Coração de 
]esús . 306 
Formula de Consagração ao Sagrado CoraÇão 
de J esús . 308 
Acto de Consagração ao Sagrado Coração de 
Jesús . . . 310 
Oração efficacissima 31 1 
http://alexandriacatolica.blogspot.com.br
	APA - 0001
	APA - 0002
	APA - 0003
	APA - 0004
	APA - 0005
	APA - 0006
	APA - 0007
	APA - 0008
	APA - 0009
	APA - 0010
	APA - 0011
	APA - 0012
	APA - 0013
	APA - 0014
	APA - 0015
	APA - 0016
	APA - 0017
	APA - 0018
	APA - 0019
	APA - 0020
	APA - 0021
	APA - 0022
	APA - 0023
	APA - 0024
	APA - 0025
	APA - 0026
	APA - 0027
	APA - 0028
	APA - 0029
	APA - 0030
	APA - 0031
	APA - 0032
	APA - 0033
	APA - 0034
	APA - 0035
	APA - 0036
	APA - 0037
	APA - 0038
	APA - 0039
	APA - 0040
	APA - 0041
	APA - 0042
	APA - 0043
	APA - 0044
	APA - 0045
	APA - 0046
	APA - 0047
	APA - 0048
	APA - 0049
	APA - 0050
	APA - 0051
	APA - 0052
	APA - 0053
	APA - 0054
	APA - 0055
	APA - 0056
	APA - 0057
	APA - 0058
	APA - 0059
	APA - 0060
	APA - 0061
	APA - 0062
	APA - 0063
	APA - 0064
	APA - 0065
	APA - 0066
	APA - 0067
	APA - 0068
	APA - 0069
	APA - 0070
	APA - 0071
	APA - 0072
	APA - 0073
	APA - 0074
	APA - 0075
	APA - 0076
	APA - 0077
	APA - 0078
	APA - 0079
	APA - 0080
	APA - 0081
	APA - 0082
	APA - 0083
	APA - 0084
	APA - 0085
	APA - 0086
	APA - 0087
	APA - 0088
	APA - 0089
	APA - 0090
	APA - 0091
	APA - 0092
	APA - 0093
	APA - 0094
	APA - 0095
	APA - 0096
	APA - 0097
	APA - 0098
	APA - 0099
	APA - 0100
	APA - 0101
	APA - 0102
	APA - 0103
	APA - 0104
	APA - 0105
	APA - 0106
	APA - 0107
	APA - 0108
	APA - 0109
	APA - 0110
	APA - 0111
	APA - 0112
	APA - 0113
	APA - 0114
	APA - 0115
	APA - 0116
	APA - 0117
	APA - 0118
	APA - 0119
	APA - 0120
	APA - 0121
	APA - 0122
	APA - 0123
	APA - 0124
	APA - 0125
	APA - 0126
	APA - 0127
	APA - 0128
	APA - 0129
	APA - 0130
	APA - 0131
	APA - 0132
	APA - 0133
	APA - 0134
	APA - 0135
	APA - 0136
	APA - 0137
	APA - 0138
	APA - 0139
	APA - 0140
	APA - 0141
	APA - 0142
	APA - 0143
	APA - 0144
	APA - 0145
	APA - 0146
	APA - 0147
	APA - 0148
	APA - 0149
	APA - 0150
	APA - 0151
	APA - 0152
	APA - 0154
	APA - 0156
	APA - 0157
	APA - 0158
	APA - 0159
	APA - 0160
	APA - 0161
	APA - 0162
	APA - 0163
	APA - 0164
	APA - 0165
	APA - 0166
	APA - 0167
	APA - 0168
	APA - 0169
	APA - 0170
	APA - 0171
	APA - 0172
	APA - 0173
	APA - 0174
	APA - 0175
	APA - 0176
	APA - 0177
	APA - 0178
	APA - 0179
	APA - 0180
	APA - 0181
	APA - 0182
	APA - 0183
	APA - 0184
	APA - 0185
	APA - 0186
	APA - 0187
	APA - 0188
	APA - 0189
	APA - 0190
	APA - 0191
	APA - 0192
	APA - 0193
	APA - 0194
	APA - 0195
	APA - 0196
	APA - 0197
	APA - 0198
	APA - 0199
	APA - 0200
	APA - 0201
	APA - 0202
	APA - 0203
	APA - 0204
	APA - 0205
	APA - 0206
	APA - 0207
	APA - 0208
	APA - 0209
	APA - 0210
	APA - 0211
	APA - 0212
	APA_ - 0001
	APA_ - 0002
	APA_ - 0003
	APA_ - 0004
	APA_ - 0005
	APA_ - 0006
	APA_ - 0007
	APA_ - 0008
	APA_ - 0009
	APA_ - 0010
	APA_ - 0011
	APA_ - 0012
	APA_ - 0013
	APA_ - 0014
	APA_ - 0015
	APA_ - 0016
	APA_ - 0017
	APA_ - 0018
	APA_ - 0019
	APA_ - 0020
	APA_ - 0021
	APA_ - 0022
	APA_ - 0023
	APA_ - 0024
	APA_ - 0025
	APA_ - 0026
	APA_ - 0027
	APA_ - 0028
	APA_ - 0029
	APA_ - 0030
	APA_ - 0031
	APA_ - 0032
	APA_ - 0033
	APA_ - 0034
	APA_ - 0035
	APA_ - 0036
	APA_ - 0037
	APA_ - 0038
	APA_ - 0039
	APA_ - 0040
	APA_ - 0041
	APA_ - 0042
	APA_ - 0043
	APA_ - 0044
	APA_ - 0045
	APA_ - 0046
	APA_ - 0047
	APA_ - 0048
	APA_ - 0049
	APA_ - 0050
	APA_ - 0051
	APA_ - 0052
	APA_ - 0053
	APA_ - 0054
	APA_ - 0055
	APA_ - 0056
	APA_ - 0057
	APA_ - 0058
	APA_ - 0059
	APA_ - 0060
	APA_ - 0061
	APA_ - 0062
	APA_ - 0063
	APA_ - 0064
	APA_ - 0065
	APA_ - 0066
	APA_ - 0067
	APA_ - 0068
	APA_ - 0069
	APA_ - 0070
	APA_ - 0071
	APA_ - 0072
	APA_ - 0073
	APA_ - 0074
	APA_ - 0075
	APA_ - 0076
	APA_ - 0077
	APA_ - 0078
	APA_ - 0079
	APA_ - 0080
	APA_ - 0081
	APA_ - 0082
	APA_ - 0083
	APA_ - 0084
	APA_ - 0085
	APA_ - 0086
	APA_ - 0087
	APA_ - 0088
	APA_ - 0089
	APA_ - 0090
	APA_ - 0091
	APA_ - 0092
	APA_ - 0093
	APA_ - 0094
	APA_ - 0095
	APA_ - 0096
	APA_ - 0097
	APA_ - 0098
	APA_ - 0099
	APA_ - 0100
	APA_ - 0101
	APA_ - 0102
	APA_ - 0103
	APA_ - 0104
	APA_ - 0105
	APA_ - 0106
	APA_ - 0107
	APA_ - 0108
	APA_ - 0109

Mais conteúdos dessa disciplina