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Ensino Fundamental 2 caderno LÍNGUA PORTUGUESA PROFESSOR ano 9 O sistema de ensino SER está preocupado com a preservação das paisagens brasileiras e do patrimônio cultural nacional. Por isso, ao longo dos anos finais do Ensino Fundamental, você conhecerá pontos importantes de todas as regiões brasileiras, retratados nas capas do material didático. Acompanhe-nos nessa viagem! O Marco Zero, na praça Rio Branco, é um dos pontos mais importantes de Recife. É conhecido como o ponto inicial da capital pernambucana, fundada em 1537. Do local, é possível observar diversos edifícios históricos, como o da Bolsa de Valores e o da Associação Comercial de Pernambuco. 552011PROFESSOR www.ser.com.br 0800 772 0028 552011_Capa_SER_Fund2_2015_PR_LP_9.2.indd 1 2/5/16 4:11 PM A atemporal arte de narrar… Ponto de partida, 3 Capítulo 1 • Conto, 4 Leitura – Metonímia, ou a vingança do enganado – Rachel de Queiroz, 5 Interpretação do texto, 7 Prática de oralidade – Exposição oral, 23 Outras linguagens – Pintura, 24 Língua: usos e reflexão – Período composto (II), 26 Língua: usos e reflexão – Processo de subordinação e coesão (I), 28 Produção de texto, 38 Outro texto do mesmo gênero, 40 Capítulo 2 • Romance, 43 Leitura – Memórias póstumas de Brás Cubas – Machado de Assis, 44 Interpretação do texto, 45 Outras linguagens – Quadrinhos e unidades narrativas, 58 Prática de oralidade – Discussão em grupo, 60 Língua: usos e reflexão – Período composto (III), 64 Língua: usos e reflexão – Processo de subordinação e coesão (II), 65 Produção de texto, 81 Outro texto do mesmo gênero , 82 Ponto de chegada, 84 Ana Trinconi Borgatto Terezinha Bertin Vera Marchezi Língua Portuguesa 2133177 (PR) SER_EF2_Portugues9_M2_C1_001_042.indd 1 2/5/16 9:01 AM Jovens caminhando juntos. 2 SER_EF2_Portugues9_M2_C1_001_042.indd 2 1/20/16 11:33 AM Conto e romance são gêneros narrativos do cotidiano de muitos leitores que apreciam as histórias da atemporal arte de narrar. As novas tecnologias possibilitaram outros suportes — além dos livros impressos — para esses gêneros, garantindo a continuidade dessas formas de comunicação. O romance, como o conhecemos hoje, é uma narrativa literária de longa duração, organizada com vários conflitos que podem ocorrer em espaços e tempos variados. Ponto de partida Você já leu um romance? De que tipo? MÓDULO A atemporal arte de narrar... R ic k B e ck e r- L e ck ro n e /S h u tt e rs to ck /G lo w I m a g e s 3 SER_EF2_Portugues9_M2_C1_001_042.indd 3 1/20/16 11:33 AM Conto1 Capítulo Objetivos: Gênero • Reconhecer semelhanças e diferenças entre crônica e conto. • Identificar recursos estilísticos: metonímia, ironia, polissíndeto. • Ordenar textos encadeamento da narrativa, indícios do desfecho, participação do narrador. Língua: usos e reflexão • Conceituar período composto. Produção textual • Produzir um conto inspirado em notícia de jornal. Conto e crônica são gêneros narrativos muito presentes na literatura brasileira. A crônica, como a conhecemos hoje, começou a ser difundida no Brasil a partir da segunda metade do século XIX. Publicada inicialmente em jornal, ganhou como caracte- rística o texto curto e, como tema, os fatos da realidade. Com o tempo, desenvolveram- -se vários tipos de crônica, como a de costumes, a política, a esportiva, entre outras. Muitas dessas histórias, por sua linguagem e seus recursos expressivos, deixaram de ser vistas como um gênero exclusivamente jornalístico e passaram a ser reconhecidas por seu valor literário, sendo reunidas em livro. Na crônica, valorizam-se, em geral, as situações corriqueiras do cotidiano, em vez de fatos que causam impacto. Com base em um fato comum, o cronista escreve seu texto — às vezes com humor, às vezes tecendo críticas, às vezes com poesia e sensi- bilidade. Hoje, a crônica circula em diferentes veículos de comunicação, como revista, rádio e tevê, além do jornal. O conto também é um gênero do narrar ficcional e, como a crônica, pode ser de curta duração, além de apresentar os elementos da narrativa: personagem, enredo ou ação, tempo, espaço e narrador. Os temas tratados no conto não se restringem aos fatos do cotidiano, como costuma ocorrer na crônica. As semelhanças entre os dois gêneros, o conto e a crônica, geraram textos em que a distinção entre um e outro, às vezes, é difícil de ser percebida. Vamos, agora, conhecer um exemplo da “mistura” de conto e crônica. Mas, para isso, você terá de desvendar um mistério: saber o que é uma meton’mia e o que ela tem a ver com a história narrada! O texto proposto a você neste capítulo foi publicado originalmente em 1955 em três capítulos, em uma revista semanal de variedades chamada O Cruzeiro. Aqui tam- bém está dividido em três partes. Leia a seguir a história toda e perceba como a cronista/contista Rachel de Quei- roz construiu sua narrativa. Verifique o que os alunos sabem sobre metonímia e suas funções discursivas, levantando com eles hipóteses e expectativas sobre o conteúdo da narrativa, que poderão ser anotadas para confronto no decorrer da leitura e do estudo do texto. O conceito de metonímia será sistematizado na seção Linguagem do texto, momento em que as hipóteses iniciais poderão ser confrontadas. T h e o /A rq u iv o d a e d it o ra A atemporal arte de narrar...4 SER_EF2_Portugues9_M2_C1_001_042.indd 4 1/20/16 11:33 AM Leitura Metonímia, ou a vingança do enganado (Drama em três quadros) Quadro I Meton’mia — a palavra me ficou na memória desde o ano de 1930, quando publiquei o meu livro de estreia, aquele romance de seca chama- do O Quinze. Um crítico, examinando a obrinha, censurava-me porque, em certo trecho da história, eu falava que o galã saíra a andar “com o peito entreaberto na blusa”. “Que disparate é esse?”, indagava o sensato ho- mem. “Deve-se dizer é: blusa entreaberta no peito”. Aceitei a correção com humildade e acanhamento, mas aí o meu ilustre professor de Latim, Dr. Matos Peixoto, acudiu em meu consolo. Que estava direito como eu es- crevera; que na minha frase eu utilizara uma figura de retórica, a chamada metonímia — tropo que consiste em transladar a palavra do seu sentido natural da causa para o efeito, ou do continente para o conteúdo. E citava o exemplo clássico: “taça espumante” — continente pelo conteúdo, pois não é a taça que espuma e sim o vinho. Assim sendo, “peito entreaberto” es- tava certo, era um simples emprego de metonímia. E juntos, numa nota de jornal, meu mestre e eu silenciamos o crítico. Não sei se o zoilo aprendeu a lição. Eu fui que a não esqueci mais. Volta e meia lá aplico a metonímia – acho mesmo que é ela a minha única ligação com a velha retórica. Faz pouco tempo, por exemplo, dei com uma ocorrência de metoní- mia prática: certa senhora nossa conhecida, há anos hospedada numa pensão, saiu de repente da casa e passou a ser inimiga mortal da senho- ria. Indagada da gente por que aquela inimizade repentina, quando todos sabíamos que a dona da pensão era boa alma, lhe dava injeções, lhe em- prestava a bolsa de água quente e a acudia nos seus acessos cardíacos, a ofendida explicou: retórica: a arte da palavra; a arte do bem dizer. tropo: emprego figurado da palavra. transladar (trasladar): transpor, mudar, transferir (o sentido). zoilo: cr’tico que, por seu julgamento ‡cido, revela inveja ou incompet•ncia. Acesse o portal e veja o conteœdo “A velha contrabandista”, de Stanislaw Ponte Preta. A express‹o “velha retórica” diz respeito ˆ disciplina Retórica, estudada principalmente na Idade MŽdia e caracterizada por um conjunto de regras que constituem a arte do bem dizer. T h e o /A rq u iv o d a e d it o ra A atemporal arte de narrar... 5 L ÍN G U A P O R T U G U E S A SER_EF2_Portugues9_M2_C1_001_042.indd 5 1/20/16 11:33 AM — O que eu não perdooa ela é o telefone. Todo dia o telefone da copa me chamava — eu ia ver, era trote. — Mas não era ela que dava trote! — Não. Mas de quem era o telefone? Agora sei de outro caso de metonímia aplicada, que ainda é mais im- portante, pois se trata de caso de crime. Relação de causa e efeito, ou mes- mo culpar o continente pelo conteúdo — qualquer dos dois está certo. Assim pois aconteceu numa cidade do interior — não conto onde, para não dar lugar a maledicência. Diga o pecado mas não diga o pecador. Pois nessa cidade do interior havia um homem; não era velho, mas pior que velho, porque era gasto. Em moço sofrera de beribéri, o que lhe arruinou para sempre o futuro. Tinha as pernas fracas, o peito cansado e asmático, a cor terrosa, o olhar vidrado de doente crônico. Contudo era homem de algu- mas posses, casa própria com loja contígua, onde instalara o armazém; vi- vesse ele no Ceará, o armazém se chamaria bodega, em Pernambuco venda, no Pará mercearia, em São Paulo empório. E já que eu não quero designar o local do crime, qualquer nome desses serve. Bodega ou empório, era comér- cio, e quem tem comércio tem dinheiro; de jeito que, apesar de tão mal- -ajambrado, o nosso homem casou. Justiça se faça, que não tentou a Deus com nenhuma beldade: procurou moça pobre, magrinha, operária numa ofi- cina de roupas de homem. Diziam até que ela tinha cara de tísica. Mas não contava o prezado amigo com os efeitos da boa nutrição no metabolismo feminino. Sei é que a cara-de-tísica, livrando-se das oito horas de trabalho à mesa de costura, passando a comer bem, em casa sua, a boa carne fresca, o seu bom tutu, a sua salada de pepino, os doces de lata, as doces laranjas da serra que o marido comprava aos centos para a freguesia, mudou como se fosse encantada. Começou a botar corpo, a aumentar as polegadas nos luga- res certos — parece até que estava crescendo. E as cores do rosto, então! Ainda mais que, com a afluência de dinheiro, deu para se vestir bem, se pintar, ondular cabelo, usar engenho e arte a fim de aumentar os dotes na- turais, pois não sei se contei que, de cara mesmo, ela não tinha nada de feia. E assim bela e assim vestida e assim pintada e formosa, começou a lhe pesar o marido enfermiço, envelhecido antes do tempo. Que, mal fe- chava o armazém, tomava a janta de leite (tinha cisma com carne), pegava o jornal, sentava na cadeira-preguiçosa até a hora de ir para a cama. Não queria saber de cinema, nem de futebol, nem sequer de rádio. Até mesmo por amor não se interessava grande coisa, que aquele corpo franzino, ama- relo, não era de pedir amores. Só a convivência morna, insossa, ité, como se diz em São Paulo. E foi aí que o destino saiu dos seus cuidados e fez a primeira interven- ção: suscitou um sargento. QUEIROZ, Rachel de. 100 cr™nicas escolhidas. O ca•ador de tatu. Rio de Janeiro: José Olympio, 1989. v. 4. p. 199-204. maledicência: comentário maldoso; difamação, injúria. beribéri: nome de uma doença que, por falta de vitamina B1, provoca polineurite, uma inflamação que enfraquece a musculatura e os nervos do corpo, além de causar edemas e problemas cardíacos. contíguo: que está próximo. mal-ajambrado: desarrumado, desajeitado. tísico: tuberculoso. insosso: sem sal; sem graça; desinteressante, monótono. ité: que não tem gosto. suscitar: fazer aparecer; ser a causa do aparecimento; ser motivo para. A atemporal arte de narrar...6 SER_EF2_Portugues9_M2_C1_001_042.indd 6 1/20/16 11:33 AM Interpretação do texto Compreensão Esse texto de Rachel de Queiroz é um exemplo de gênero narrativo misto: um conto dentro de uma crônica. O texto do Quadro I pode ser dividido em duas partes: • a parte inicial, que apresenta características de cr™nica (narrativa ligada a fatos do cotidiano), aparentemente narra fatos da realidade do autor, Rachel de Queiroz; • o início do conto — uma narrativa que prepara o leitor para ler a história de um crime, a ser contada pela voz de um narrador observador na sequência da narrativa crian- do um suspense. 1. Em relação ao conto dentro da crônica de Raquel de Queiroz, pelo que leu no Quadro I, responda: a) Onde acontecem os fatos narrados no conto propriamente dito? Em uma cidade do interior. b) Qual é a explicação dada pelo narrador para não identificar precisamente o lugar? “... para não dar lugar a maledicência.” c) Quais são as personagens do conto? Um homem (o marido), uma mulher (a esposa), um sargento e um carteiro. 2. O narrador conta que, depois do casamento, a moça “mudou como se fosse encan- tada”. Responda. a) Que mudanças foram essas? “Botou corpo, aumentou as polegadas nos lugares certos, ganhou cor no rosto, passou a vestir-se bem, a pintar-se e a ondular o cabelo...”. b) Qual a causa dessas mudanças? Além de se livrar das oito horas de trabalho na costura, passou a morar e a comer bem. 3. O último parágrafo do Quadro I — “E foi aí que o des- tino saiu dos seus cuidados e fez a primeira inter- venção: suscitou um sargento.” — marca um limite no desenvolvimento da história. Nesse momento uma nova personagem é introduzida: um sargento. Por que o aparecimento de um sargento é inter- pretado como um descuido do destino? É possível levantar a hipótese de que sua chegada romperá com o equilíbrio da situação inicial. As questões de interpretação para cada quadro vão se ater aos elementos mais explícitos, como fatos e caracterização de personagens. Depois do estudo desses elementos, a interpretação será complementada com a análise dos aspectos de encadeamento dessas três unidades narrativas, de atuação do narrador e dos recursos linguísticos expressivos. Sugere-se que as questões de Compreens‹o sejam feitas oralmente. Se achar necessário o registro das respostas, solicite aos alunos que façam isso como atividade de casa. Para construir: Interpretação do texto (atividades de compreensão, construção e linguagem do texto, p. 7 a 20) Atividades: recursos que constroem o sentido (p. 20 a 22) Afirmar que vai fazer segredo, preservar a privacidade de personagens, é um recurso narrativo para aguçar a curiosidade do leitor e para dar a ele a ilusão de que se trata de uma história real, e não que isso necessariamente tenha acontecido. T h e o /A rq u iv o d a e d it o ra A atemporal arte de narrar... 7 L êN G U A P O R T U G U E S A SER_EF2_Portugues9_M2_C1_001_042.indd 7 1/20/16 11:33 AM Leitura Quadro II Claro, não era justo que a jovem esposa depois de recondicionada gra- ças às finanças do marido tirasse vantagens dessa nova situação de mu- lher bonita, em prejuízo do supradito marido. Não era justo, mas este mundo vive de injustiças. E o sargento — quer fosse do Exército, da Aeronáutica, da Marinha ou dos Fuzileiros (não digo ao certo, firme no meu propósito de evi- tar identificação) —, o sargento era simpático, era musculoso, era jovem, era formidavelmente marcial dentro da farda justa ao peito, o andar elástico, a fala ríspida habituada ao comando. Aconteceu que, um belo dia, servia a dama ao balcão (segundo era costume do casal, enquanto o marido almoçava), quando sobreveio o sar- gento. O que houve, o que não houve? Hoje é difícil reconstituir. Parece que ele pediu um maço de cigarros. Depois queria um vermute. Por fim pediu licença para escutar o noticiário esportivo no rádio que tocava perto do balcão. Seria pretexto para se demorar ali, mas a moça consentiu. É difícil negar favores a sargentos, mormente um sargento daqueles. Contudo, na- quele dia, além disso ele não pediu mais que olhares. Ou no máximo disse alguma palavra, mas murmurada tão baixo que a não ouviu o resto da fre- guesia presente, sempre atenta a mexericos. Com três almoços o namoro pegara firme. E seguindo-se aos almoços uma gripe do marido, os dois caminharam muito além de namoro. Como se encontravam, onde e a que horas, não se apurou. Basta que se diga que eles se amaram de amor proibido, como Tristãoe Isolda, como Paolo e Francesca. E o destino, que não gosta de amores ilegais e costuma castigá-los com maus fados, fez a sua segunda intervenção: suscitou a transferência do sargento. *** Diz que só quem ama conhece a dor da separação. Os bonitos olhos da moça incharam de tanto choro. O apetite diminuiu. Já lhe transparecia, por sob o rouge da face, a antiga cara de tísica. E há de ter sido esse desgosto, assim alardeado com pranto e fastio, que acabou por despertar as suspeitas do marido, não acordadas quando o amor florescia e tudo ainda eram rosas. Passou o bodegueiro a vigiar a esposa; a lhe examinar os silêncios; a lhe escutar os suspiros e os murmúrios durante o sono. Deu para fazer pesquisas e acabou descobrindo um postal e um livro com um nome de homem escrito em ambos — e com a mesma letra. Descobriu um escudo da corporação do sargento — o que provava que o objeto de suspiros, silêncios e murmúrios, além de homem era soldado. E tantas descobertas pequenas levaram-no afinal à maior de todas, que era descobrir que o traíam. Porque descobrira as cartas, as cartas de amor que vinham com carimbo distante, por via aérea, assinadas com aquele nome fatal. Durante cinco meses o pobre revolveu dentro do seu magro peito doente o punhal venenoso do ciúme. Como menino que descobre um ninho de pássaro e fica diariamente a vigiar escondido o número de ovos que recondicionada: recuperada. supradito: já dito. marcial: relativo a militares; que tem ar guerreiro. ríspido: severo. mormente: acima de tudo; principalmente. fado: destino, sorte. rouge: cosmético; pó vermelho que é espalhado na face para dar cor. alardeado: mostrado, exibido. fastio: aborrecimento; tédio. A atemporal arte de narrar...8 SER_EF2_Portugues9_M2_C1_001_042.indd 8 1/20/16 11:33 AM aumenta, e depois os progressos do choco, assim conseguira o marido uma chave falsa para o cofre de guardados da mulher: era uma caixa de madeira do Paraná, com um pinheirinho recortado na tampa, que ele mesmo lhe dera durante a lua de mel, dizendo rindo: “Está aqui, para você guardar os seus segredos...”. E a ingrata obedecera ao pé da letra. Todos os dias, naquela hora fatal do almoço, quando a mulher o substi- tuía no balcão, ele nem cuidava de comer. Era só correr ao quarto, abrir o camiseiro, tirar a caixa de sob o monte de roupa branca, puxar do bolso a chavinha falsa e abrir ansiosamente a carta nova. E quando não havia carta nova, reler a velha, ou antes, uma das antigas, uma datada de 21 de agosto, tão cheia de recordações realísticas, que até parecia diálogo de filme francês. Depois de ler guardava tudo, corria à cozinha, engolia depressa uma colher de caldo, roía um pedaço de pão — seria impossível comer direi- to com aquele amor dos dois ladrões atravessado na garganta. Até que um dia houve provocação maior... QUEIROZ, Rachel de, op. cit. Compreensão 1. Que fato provocou uma mudança na situação vivida pela mulher e o sargento? A transferência do sargento para um lugar distante. 2. Que indícios no comportamento da mulher provocaram a desconfiança do marido? A mulher passou a chorar, a não se alimentar, a mostrar seu desgosto. 3. Que descoberta o marido fez que lhe deu certeza de haver motivo para sua descon- fiança? A descoberta das cartas de amor. 4. Releia a última frase do Quadro II: “Até que um dia houve provocação maior...” Essa frase marca na história a passagem para uma tomada de decisão. Qual foi a decisão? Armar-se e cometer um crime. camiseiro: móvel com gavetas, próprio para guardar roupas. Aceite outras possibilidades. T h e o /A rq u iv o d a e d it o ra A atemporal arte de narrar... 9 L ÍN G U A P O R T U G U E S A SER_EF2_Portugues9_M2_C1_001_042.indd 9 1/20/16 11:33 AM Leitura Quadro III E um dia, como diz’amos na semana passada, houve provoca•‹o maior ou o cora•‹o do homem enganado saturou-se de —dio e ciœme atŽ ao ponto de n‹o poder contar mais nada. Isso n‹o se explicou. O que se sabe Ž que ele retirou da gaveta do balc‹o um rev—lver que l‡ guardava h‡ anos, e que fora empenhado por um devedor desaparecido. Junto do rev—lver estava a caixa de balas. O nosso amigo carregou a arma; e numa manh‹ de sol claro, eram dez horas em ponto, quando o armazŽm estava cheio de fregueses, viu-se que o bodegueiro apurava o ouvido, pedia licen•a aos presentes e transpu- nha a porta de comunica•‹o da loja com a sua casa. Da’ a pouco se escutou um ru’do de altercação, um grito de mulher e tr•s tiros cortaram o ar, em explos›es secas. A freguesia alarmada correu, rodeou a esquina atŽ ˆ porta da frente da casa de moradia. L‡ estava armada a tragŽdia: a mulher na cal•ada, de joelhos, aos gritos, o marido de rev—lver na m‹o, muito tr•mulo, tentando soerguê-la, e, atravessado na porta, ca’do de borco, com o cor- po para dentro da sala, um homem. Na posi•‹o em que estava n‹o se lhe via cara nem torso, s— as botinas pretas e as duas pernas, vestidas em cal•as cáqui. E foi o pr—prio marido quem falou primeiro. Ergueu os olhos para o grupo apavorado, deu com a vista no seu fregu•s predileto, andou um passo, tapou com o pr—prio corpo a porta onde jazia o morto e pediu: Ñ Pode ir chamar a Pol’cia. *** Na Pol’cia explicou que matara o homem porque era um marido en- ganado. O delegado comentou: Ñ ƒ raro. Em geral voc•s matam as mulheres, que s‹o mais fracas. Mas o marido protestou, magoado: Ñ N‹o, eu n‹o seria capaz de matar minha mulher. Ela Ž tudo que eu tenho no mundo, bonita, delicada, cuidadosa. Me ajuda no armazŽm, entende de con- tas, faz as cartas para os atacadistas. S— ela pode fazer a minha comida Ñ eu s— como dieta especial, o senhor sabe. Como Ž que eu ia matar minha mulher? Ñ Ent‹o Ñ ajudou o delegado Ñ matou o amante dela. O homem tornou a abanar a cabe•a: Ñ TambŽm n‹o. O amante era um sargento, que foi transferido e est‡ longe. AlŽm do mais eu s— descobri o caso depois que ele viajou. Pelas car- tas. Li tudo. Sei atŽ uma de cor, a pior delas... O delegado calava-se, sem entender, esperando o resto. E o resto veio: Ñ Cada carta! Se cada carta daquelas tivesse vida, eu matava, de uma em uma. Fazia atŽ vergonha Ñ parecia coisa de livro. Pensei em saturar-se: encher-se inteiramente; chegar ao limite da tolerância. empenhado: dado para saldar dívida, como compromisso financeiro, como garantia. transpor: passar de um lado para o outro; ultrapassar. altercação: discussão acalorada. soerguer: levantar. de borco: de bruços, de barriga para baixo. torso: parte do corpo humano que corresponde ao tronco. cáqui: cor marrom, de tom amarelado, usada, em geral, em uniformes militares. A atemporal arte de narrar...10 SER_EF2_Portugues9_M2_C1_001_042.indd 10 1/20/16 11:33 AM tomar um avi‹o e liquidar com o sargento. Mas n‹o tenho saœde para andar de avi‹o. Pensei em matar um colega dele, aqui mesmo, para eles tomarem ensino e n‹o transviarem mulher alheia. Mas tive receio de enfrentar a corpora•‹o toda Ñ o senhor sabe como eles s‹o unidos. Tinha entretanto que dar um jeito. J‡ sentia medo de acabar ficando doido. N‹o tirava aquelas cartas da cabe•a; nos dias em que n‹o chega- va uma, ficava aflito, mais aflito do que ela, que era a destinat‡ria. Tinha que liquidar aquilo, n‹o era? E hoje, afinal, carreguei o rev—lver, esperei a hora e, quando vi o desgra•ado apontar do outro lado da rua, fui para casa, me escondi atr‡s da porta do quarto, esperando. Ñ O amante? Ñ indagou o delegado, estupidamente. O homem se irritou: Ñ N‹o, senhor. N‹o falei que n‹o era o amante? PorŽm tinha culpa nas cartas. O sargento escrevia Ñ mas era ele que trazia. Quase todo dia estava ali na porta, risonho, com o desgra•ado do envelope na m‹o. Apontei o rev—lver e atirei tr•s vezes. Ele caiu sem falar. N‹o, n‹o era o amante, seu delegado. N‹o era o amante. Mas era o carteiro. [Rio, 1955] QUEIROZ, Rachel de, op. cit. Rachel de Queiroz (Fortaleza, CE,1910 Ñ Rio de Janeiro, RJ, 2003): estimulada pela m‹e, dedica-se ˆ leitura desde bem jovem. ƒ desse mergulho nos livros que nascem seus primeiros escritos. Depois de se formar professora, Rachel ingressa no jornalismo. Uma suspeita de tuberculose a obriga a repousar. Escreve O Quinze, publicado em 1930. Sua carreira de escritora inclui v‡rios romances, algumas incurs›es na literatura infantojuvenil, pe•as de teatro e um sem-nœmero de cr™nicas. Em 1977, torna-se a primeira mulher a fazer parte da Academia Brasileira de Letras. Ed it o ra J o s Ž O ly m p io /A rq u iv o d a e d it o ra S e rg io Z a li s /A rq u iv o d a e d it o ra Compreensão 1. Releia o trecho reproduzido a seguir. Lá estava armada a tragédia: a mulher na calçada, de joelhos, aos gritos, o marido de revólver na mão, muito trêmulo, tentando soerguê-la, e, atravessado na porta, caído de borco, com o corpo para dentro da sala, um homem. Responda: a partir dessa cena, qual foi a primeira dedu•‹o que voc•, leitor, p™de fazer em rela•‹o ao homem que foi morto? ƒ de se esperar que os alunos tenham pensado, assim como o delegado da hist—ria, que se tratava do amante, ainda que n‹o se tenha dado nenhum ind’cio do seu retorno. A atemporal arte de narrar... 11 L êN G U A P O R T U G U E S A SER_EF2_Portugues9_M2_C1_001_042.indd 11 1/20/16 11:34 AM 2. O marido apresenta várias razões para não matar nem a esposa nem o sargento. Que aspecto da sua personalidade essas razões revelam? Sugestão: Revelam que era fraco, covarde, medroso em relação ao sargento. Em relação à esposa, o marido leva em conta razões “práticas” – cozinhar, atender ao balcão... – além de considerar a mulher “bonita, delicada, cuidadosa”, mas não menciona razões afetivas – amor, carinho, respeito – que o teriam levado a poupá-la. Essa postura pode revelar uma atitude “machista” do marido. Para aprimorar: Conversa em jogo (abaixo) Conversa em jogo Como lidar com as frustrações? Na narrativa, uma das personagens se sente traída e se imagina no direito de matar alguém. Seu ato é um assassinato, um crime, passível de julgamento de acordo com a lei. A atitude criminosa não modifica o fato: o homem foi traído. É preciso lidar com as frustrações e as dores, assim como com a raiva de maneira saudável. A violência desencadeia mais violência. Como você lida com a raiva e a frustração? Que atitudes podem ajudar alguém a lidar com a raiva e a dor de uma perda? Escreva um pequeno texto sobre isso. Resposta pessoal. Construção do texto Formas de organizar o texto Encadeamento da narrativa O texto de Rachel de Queiroz está dividido em três unidades narrativas, que a autora chamou de quadros. Para encadear os quadros e prender a atenção do leitor — lembre-se de que a história foi inicialmente publicada em partes separadas —, a autora criou uma forma de estabelecer uma ligação entre eles. Fazendo as atividades a seguir, você poderá observar melhor como isso acontece. A atemporal arte de narrar...12 SER_EF2_Portugues9_M2_C1_001_042.indd 12 1/20/16 11:34 AM 1. Releia o final do Quadro I. E foi aí que o destino saiu dos seus cuidados e fez a primeira intervenção: suscitou um sargento. Explique de que modo esse trecho pode prender a atenção do leitor para o quadro seguinte. Esse trecho dá a entender que a entrada dessa nova personagem alterará o curso que os fatos vêm tendo até esse momento, isto é, desencadeará mudanças significativas no desenrolar do enredo da história. 2. No desenrolar da história, há passagens que atuam como ligações entre as partes do enredo, indicando ou antecipando que haverá alterações significativas no rumo dos acontecimentos. No esquema a seguir, no quadro A foi transcrita a passagem que liga o Quadro I ao Quadro II. Observe. Quadro I Quadro II Quadro III Casamento e relacionamento morno entre o dono do armazém e a operária. Namoro entre o sargento e a mulher. Transferência do sargento. Sofrimento da mulher e descoberta do amante pelo marido: cartas e ciúme. Relação fatal: assassinato do carteiro. A. “E foi aí que o destino saiu dos seus cuidados e fez a primeira intervenção: suscitou um sargento.” B. “E o destino, que não gosta de amores ilegais e costuma castigá-los com maus fados, fez a sua segunda intervenção: suscitou a transferência do sargento.” C. “Até que um dia houve provocação maior...” Transcreva acima as passagens do texto que funcionam como elementos de liga- ção entre os momentos da narrativa indicados, correspondentes aos quadros B e C do esquema. 3. Em qual momento da narrativa essas passagens se apresentam? Apresentam-se no fim de uma parte ou de um quadro. A atemporal arte de narrar... 13 L ÍN G U A P O R T U G U E S A SER_EF2_Portugues9_M2_C1_001_042.indd 13 1/20/16 11:34 AM 4. No Quadro III, o narrador deixa claro que a história está sendo apresentada para o leitor em dias diferentes, como se fosse em capítulos. Localize e transcreva a passa- gem que comprova esse fato. “E um dia, como dizíamos na semana passada...” 5. Escolha uma das passagens que fazem a ligação entre as partes da narrativa e rees- creva-a de modo que possa prender a atenção do leitor. Solicite a alguns alunos que leiam suas passagens reescritas para a turma, verificando se de fato desempenham o papel de elemento de ligação e de atrativo para a continuidade da leitura. Indícios do desfecho Além dos recursos usados para encadear as partes ou quadros da história que acabamos de analisar, o narrador emprega a estratégia de dar pistas ou indícios sobre o desfecho para atrair a atenção do leitor. 1. Assinale as alternativas que representam esses indícios. a) X Fazer a descrição detalhada das personagens. b) Não revelar nomes das personagens. c) X Utilizar o termo vingan•a no título. d) X Dizer de início que se trata de um crime. Há indício do desfecho da história que é apresentado no próprio título, por meio do uso da palavra meton’mia. Ao ler esse termo, o leitor é convidado a pensar sobre o que é uma metonímia ou sobre a relação que a ideia de metonímia pode ter com a história. Aparentemente, isso pode ser esquecido no decorrer da leitura da narrativa principal, ou seja, do conto que existe dentro da crônica, mas o leitor atento pode recorrer a ela para tentar buscar pistas para compreender a história que acompanha. 2. Considerando o que você sabe sobre metonímia, explique como pode ser interpre- tado o desfecho da história ao relacioná-lo com essa palavra do título. Auxilie os alunos nessa reflexão. Há as seguintes possibilidades de análise da metonímia " O carteiro é uma metonímia, pois representa o transportador tomado pela coisa transportada: a carta de amor. A carta é o efeito produzido pela causa: o amante — carta é, nesse caso, uma metonímia. O marido mata o efeito (carteiro/carta) na tentativa de acabar com a causa (o amante, a traição). Pode-se também analisar como sendo o continente (carta) pelo conteúdo (traição). A atemporal arte de narrar...14 SER_EF2_Portugues9_M2_C1_001_042.indd 14 1/20/16 11:34 AM Participação do narrador Aquele que narra uma hist—ria introduzindo as personagens e contando os fatos que se sucedem em determinado tempo e espa•o Ž chamado de narrador. ƒ o autor quem escolhe o tipo de narrador para sua narrativa. Na literatura, n‹o se deve confundir a figura do autor com a figura do nar- rador, que Ž um elemento de fic•‹o no texto, uma inven•‹o liter‡ria. Na narrativa analisada neste cap’tulo, o narrador identifica-se tambŽm como a autora do romance O Quinze Ñ hist—ria de uma fam’- lia de retirantes do Nordeste que abandona a casa para fugir da seca. Esse romance levou Rachel de Queiroz a ser reconhecida como escritora ainda muito jovem. No quadro a seguir, reveja o estudo dos tipos de narrador, ana- lisando o modo como este se comportana narrativa. ƒ esse compor- tamento do narrador que define o que se denomina foco narrativo. The o /A rq u iv o d a e d it o ra Tipos de narrador Narrador: aquele que conta a hist—ria. Dependendo do modo como se comporta na narrativa, o narrador pode ser: 1. Narrador observador e neutro: sua presen•a n‹o Ž percebida pelo leitor porque ele apenas conta os fatos, sem se manifestar, interferir ou dar opini‹o ao longo da narrativa. Nesse caso, o foco narrativo Ž em 3a pessoa (ele/a, eles/as). 2. Narrador personagem ou narrador em 1a pessoa: ao mesmo tempo em que narra, ele tambŽm participa dos fatos como personagem da hist—ria. Por isso, o leitor percebe sua presen•a, manifestada no uso da 1a pessoa (eu/n—s) Ñ o foco narrativo Ž em 1» pessoa. 3. Narrador intruso: n‹o faz parte da hist—ria, n‹o toma parte dos acontecimentos, mas interrompe a narrativa para comentar os fatos, expressar sentimentos e opini›es, julgar as a•›es e/ou o comportamento das personagens. O foco narrativo pode ser em 1a ou 3a pessoa. Relembrando: Ž o autor quem escolhe o tipo de narrador que quer para sua narrativa. Comente que, na literatura, h‡ casos de um mesmo narrador exercer mais de um papel na narrativa, comportando-se, por exemplo, como personagem e intruso ao mesmo tempo. T h e o /A rq u iv o d a e d it o ra A atemporal arte de narrar... 15 L ÍN G U A P O R T U G U E S A SER_EF2_Portugues9_M2_C1_001_042.indd 15 1/20/16 11:34 AM 1. O texto “Metonímia, ou a vingança do enganado” apresenta: • uma parte inicial, caracterizada como crônica; • a história do crime, que constitui um conto dentro da crônica. Releia o trecho a seguir. Meton’mia Ñ a palavra me ficou na mem—ria desde o ano de 1930, quando publiquei o meu livro de estreia, aquele romance de seca chamado O Quinze. De acordo com o quadro, qual dos tipos de narrador pode ser identificado nesse trecho? Narrador intruso: o foco narrativo está na 1a pessoa do singular. O leitor percebe a presença do narrador, pois aparece o pronome pessoal eu (“me”, “publiquei”, “meu”), mas ele não participa da história. 2. Leia a seguir esta passagem em que o narrador se manifesta: [...] era homem de algumas posses, casa pr—pria com loja cont’gua, onde ins- talara o armazŽm; vivesse ele no Cear‡, o armazŽm se chamaria bodega, em Per- nambuco venda, no Par‡ mercearia, em S‹o Paulo emp—rio. E j‡ que eu n‹o quero designar o local do crime [...]. Pode-se afirmar que, nesse trecho, se manifesta um narrador personagem? Explique. Não. Trata-se de um narrador observador e intruso, pois não está participando das ações, mas interrompendo a narrativa para se manifestar, fazer comentários. 3. Releia as seguintes passagens do texto: I. “[...] não era velho, mas pior que velho, porque era gasto.” II. “Até mesmo por amor não se interessava grande coisa, que aquele corpo franzi- no, amarelo, não era de pedir amores. Só a convivência morna, insossa, ité, como se diz em São Paulo.” III. “Durante cinco meses o pobre revolveu dentro do seu magro peito doente o punhal venenoso do ciúme.” a) Explique o que se pode perceber da participação do narrador nesses trechos. Essas passagens apresentam a visão pessoal do narrador sobre o marido. b) Que imagem você faz do marido a partir da visão apresentada pelo narrador? Sugestão: A imagem de um homem acabado, fraco, doente, desinteressante e desinteressado pelo amor. A atemporal arte de narrar...16 SER_EF2_Portugues9_M2_C1_001_042.indd 16 1/20/16 11:34 AM 4. Explique a opini‹o do narrador subentendida neste trecho: Claro, não era justo que a jovem esposa depois de recondicionada graças às finanças do marido tirasse vantagens dessa nova situação de mulher bonita, em prejuízo do supradito marido. Não era justo, mas este mundo vive de injustiças. Sugest‹o: O narrador deixa transparecer que Ž contra a atitude da esposa de trair o marido, indicando que ela estava bonita gra•as ao dinheiro dele e que, portanto, n‹o deveria t•-lo tra’do. 5. J‡ foi observado neste cap’tulo que o narrador tambŽm se manifesta dando pistas sobre o desfecho da hist—ria. Escreva abaixo qual Ž a pista dada nesta passagem: E o destino, que não gosta de amores ilegais e costuma castigá-los com maus fados, fez a sua segunda intervenção... Nessa passagem o narrador d‡ pistas de que os amantes ser‹o punidos, ou de que o desfecho n‹o ser‡ feliz. Linguagem do texto Recursos estilísticos Ao escrever um texto, o autor faz escolhas de linguagem para produzir efeitos diversos. S‹o os recursos estil’sticos, isto Ž, os efeitos utilizados no texto que auxiliam na maneira de escrever. Neste m—dulo, vamos estudar alguns desses recursos empregados por Rachel de Queiroz. Metonímia Rachel de Queiroz, no in’cio do texto, d‡ exemplos de uso da meton’mia como um recurso de linguagem: ¥ Òcom o peito entreaberto na blusaÓ Ñ caso de meton’mia em que o efeito (peito entreaberto) Ž usado no lugar da causa (blusa entreaberta no peito); ¥ Òta•a espumanteÓ: caso de meton’mia em que o continente (ta•a) Ž usado no lugar do conteœdo (o vinho que espuma). 1. Citando um exemplo de ocorr•ncia de Òmeton’mia pr‡ticaÓ, o narrador conta como uma pensionista resolveu acabar com os trotes que recebia por telefone. a) Conte o que aconteceu, explicando o caso de meton’mia. Espera-se que os alunos identifiquem a Òmeton’mia pr‡ticaÓ na a•‹o da personagem: culpar a dona do telefone pelos trotes recebidos no aparelho que estava na casa dela. b) Por que o narrador chama essa ocorr•ncia de Òmeton’mia pr‡ticaÓ? Porque ela acontece pela a•‹o da personagem, pelo que a personagem pratica. A atemporal arte de narrar... 17 L ÍN G U A P O R T U G U E S A SER_EF2_Portugues9_M2_C1_001_042.indd 17 1/20/16 11:34 AM c) Qual Ž a meton’mia que justifica o t’tulo do conto: ÒMeton’mia, ou a vingança do enganadoÓ? Explique. Espera-se que os alunos compreendam que houve um caso de meton’mia no assassinato do carteiro no lugar do amante. A metonímia consiste na substituição de um termo por outro, por existir entre eles uma relação de proximidade, de interdepend•ncia, de inclusão. A meton’mia Ž bastante frequente na linguagem do cotidiano. Voc•, mesmo sem perceber, j‡ deve t•-la usado muitas vezes em suas conversas di‡rias e nos textos que escreve. 2. Leia o anœncio publicit‡rio ao lado. Explique o tipo de meton’mia presente na frase: ÒO mundo em boas mãosÓ. Trata-se de um caso de emprego de uma parte do corpo pelo que ela representa Ñ a expressão Òboas mãosÓ Ž usada no lugar, por exemplo, de Òbem amparadoÓ, ÒacolhidoÓ. No quadro a seguir, confira algumas das principais ocorr•ncias de meton’mia. Metonímia: ocorrências Exemplos ¥ O efeito Ž usado em lugar da causa. Por onde o grupo passava eram s— risos e alegria. (Risos e alegria s‹o o efeito das aç›es praticadas pelo grupo.) ¥ O autor Ž usado em lugar da obra. Adoro Rachel de Queiroz. (A obra de Rachel de Queiroz.) ¥ O continente Ž empregado em lugar do conteœdo. Bebeu quatro latas de refrigerante. (Bebeu o conteœdo das latas, o refrigerante, e não as latas.) ¥ A parte Ž empregada em lugar do todo. O bordado foi feito por mãos habilidosas. (Foi feito por pessoa habilidosa.) ¥ O todo, em lugar da parte. O governo est‡ envolvido no esc‰ndalo. (Pessoas que fazem parte do governo.) ¥ O nome de um indiv’duo para indicar um grupo. A ci•ncia espera outros Einsteins. (Bons cientistas, como o famoso cientista Albert Einstein.) ¥ O lugar, em vez dos habitantes. Os EUA rejeitaram o acordo pela preservação ambiental. (O povo ou as pessoas do governo norte-americano Ž que rejeitaram o acordo.) ¥ O singular, em vez do plural. O jovem Ž contra injustiças. (Os jovens em geral.) ¥ A marca substituindo o produto. Paulo vendeu sua Yamaha. (A marca Yamaha est‡ empregada em lugar do produto, motocicleta.) Verifique se os alunos entendem a mensagem do cartaz, o que significa a expressão Òem boas mãosÓ no contextoda imagem, em relação ao Dia Mundial do Meio Ambiente Ñ o mundo amparado/acolhido pelos seres humanos que se identificam com a natureza, representada pelas folhas acomodadas em posição de mãos cruzadas em concha, como se o estivessem segurando. S e ti n C o n s tr u to ra /A rq u iv o d a e d it o ra Anœncio publicado no jornal Folha de S.Paulo. São Paulo, 5 jun. 2005. p. C12. A atemporal arte de narrar...18 SER_EF2_Portugues9_M2_C1_001_042.indd 18 1/20/16 11:34 AM Ironia Na narrativa de Rachel de Queiroz percebe-se a ironia nas escolhas de linguagem ao imprimir aos coment‡rios ou ˆs descri•›es das a•›es ou fatos da hist—ria um tom jocoso, zombeteiro, debochado. A ironia Ž demonstrada tanto pela inten•‹o de quem escreve como pelo contexto da hist—ria. Observe: Pois nessa cidade do interior havia um homem; n‹o era velho, mas pior que velho, porque era gasto. O termo gasto, geralmente usado para coisa deteriorada, que n‹o tem mais uso, Ž empregado para caracterizar, de um jeito meio debochado, sarc‡stico a postura e os h‡bitos do marido ao se casar com a jovem. Essa escolha de linguagem sugere, de forma ir™nica, uma cr’tica. A ironia tambŽm pode ser constru’da falando-se o contr‡rio do que se quer dizer, com inten•‹o sarc‡stica, como neste exemplo: Que bonito exemplo de cidadania: pichar os muros da cidade em Žpoca de elei•‹o! (em lugar de péssimo exemplo) A ironia Ž uma forma de fazer uma cr’tica de maneira camuflada, sugerindo o sentido contr‡rio daquilo que Ž dito. 1. Releia o trecho. Explique por que podemos considerar ir™nico o seguinte coment‡rio do narrador: [...] de jeito que, apesar de t‹o mal-ajambrado, o nosso homem casou. Justi•a se fa•a, que n‹o tentou a Deus com nenhuma beldade: procurou mo•a pobre [...]. Outras vezes, mais do que na escolha de palavras ou express›es, a ironia Ž revelada no modo como nos expressamos oralmente. Nessa passagem, o narrador deixa impl’cito que a personagem (a forma como se refere a ela tambŽm Ž ir™nica: Ònosso homemÓ) n‹o tinha condi•‹o de arrumar mo•a bonita ou rica. A ironia est‡ no modo como o narrador, mediante o jogo de palavras (Òque n‹o tentou a Deus com nenhuma beldadeÓ), constr—i o sentido do texto. 2. Leia a frase, com expressividade, para produzir o efeito ir™nico. Voc• fez um excelente servi•o, hein! Mal sa’ com o carro da garagem, e ele pifou! Poliss’ndeto Voc• j‡ aprendeu que o recurso da justaposi•‹o consiste no encadeamento de palavras, frases ou ora•›es, dispostas lado a lado, em uma sequ•ncia de ideias coor- denadas entre si, ligadas ou n‹o por elementos de coes‹o Ñ os conectivos/conjun- •›es. Essa maneira de encadear palavras, frases, ora•›es produz no texto efeitos de sentido; por exemplo, a sensa•‹o de movimento cont’nuo, em sŽrie. A atemporal arte de narrar... 19 L êN G U A P O R T U G U E S A SER_EF2_Portugues9_M2_C1_001_042.indd 19 1/20/16 11:34 AM Observe como, em sua narrativa, Rachel de Queiroz empregou a justaposição neste trecho: E assim bela e assim vestida e assim pintada e formosa, começou a lhe pesar o marido enfermiço [...]. a) Que tipo de justaposição se verifica nesse trecho? b) Em sua opinião, que efeito de sentido essa justaposição produz no texto? Resposta pessoal. Esse recurso de construção que encadeia ou justap›e palavras ou ideias, coordenando- -as, ligando-as por meio de um conectivo ou conjunção que se repete de modo enfático (geralmente o e) recebe o nome de poliss’ndeto. Espera-se que os alunos percebam que a justaposição constrói a ideia de gradação da metamorfose da moça — de bela a formosa –, tecendo um retrato dela para intensificar quanto estava se distanciando do marido. Este com características opostas às da esposa — velho, gasto, enfermo, magro, entediado... Ela florescia, ele murchava. Nessa comparação há também ironia do narrador ao enredar os fatos. Atividades: recursos que constroem o estilo 1. Observe o cartum. © C a u lo s /A c e r v o d o c a rt u n is ta CAULOS. S— d—i quando eu respiro. Porto Alegre: L&PM, 2001. p. 27. A atemporal arte de narrar...20 SER_EF2_Portugues9_M2_C1_001_042.indd 20 1/20/16 11:34 AM Responda: a) Que elementos se alteram ao longo da sequ•ncia? O cora•‹o e a mala. b) O que cada um desses elementos pode estar representando no cartum? Sugest‹o: O cora•‹o: os sentimentos, as emo•›es, o lado sens’vel do ser humano; a mala: o trabalho, o lado racional, talvez atŽ o lado material da vida do ser humano. c) Qual Ž a prov‡vel cr’tica que se pode inferir dessa sequ•ncia? Sugest‹o: Pode-se pensar na cr’tica ̂ correria, ao ritmo alucinante do dia a dia em busca de sobreviv•ncia, de afirma•‹o no trabalho para ganhar mais. Essa atitude Ž, na sequ•ncia, vista como desencadeadora do fato de o ser humano perder os sentimentos, as emo•›es, a ponto de ser praticamente transfor- mado em um objeto. d) Pode-se afirmar que o autor empregou o recurso de meton’mia para estruturar esse cartum? Explique. Sim, ao empregar o cora•‹o e a mala para representar ideias mais amplas. Pode-se dizer que esses elementos representam a parte de um todo. 2. Identifique e explique abaixo as meton’mias presentes nos seguintes textos: a) Manchete de jornal Viol•ncia deixa mais de 60 mortos no Iraque A Not’cia. Joinville, 31 out. 2005. Trata-se do emprego do efeito pela causa Ñ o termo viol•ncia (efeito) no lugar de a•›es violentas (causa). b) Quadrinhos Verifique se os alunos percebem aqui a presen•a de outra figura de linguagem, a personifica•‹o (da viol•ncia). © 2 0 0 5 C h ri s B ro w n e /K in g F e a tu re s S y n d ic a te , In c . BROWNE, Chris. Hagar. Folha de S.Paulo. S‹o Paulo, 15 fev. 2005. Trata-se de uso da parte pelo todo Ñ a palavra cafŽ est‡ empregada no lugar de Òrefei•‹o da manh‹Ó. Observe que a personagem fala em comer. Se esti- vesse se referindo apenas ˆ bebida ÒcafŽÓ, falaria em beber. A atemporal arte de narrar... 21 L êN G U A P O R T U G U E S A SER_EF2_Portugues9_M2_C1_001_042.indd 21 1/20/16 11:34 AM c) Publicidade G o v e rn o F e d e ra l/ M in is tŽ ri o d e M in a s e E n e rg ia Anúncio publicado na revista ƒpoca. São Paulo: Globo, 27 jun. 2005. p. 20-21. A metonímia ocorre no uso da palavra brasileiro no lugar de “pessoas do Brasil”. Consiste no uso da parte pelo todo ou do particular pelo geral. 3. No dia a dia usam-se muitas expressões com metonímia. A expressão “braço direito”, por exemplo, pode significar: • pessoa imprescind’vel, indispens‡vel para outra; • membro superior direito do corpo. Construa uma frase com cada significado, indicando aquela que representa uma metonímia. 4. Assinale as frases que apresentam ironia. a) X O jogo foi ótimo: perdemos de 3 a 0. b) A multidão gritava enraivecida para que abrissem os portões. c) X Que bela lição de cidadania: parar o carro em lugar proibido! d) X “Um carro começa a buzinar... talvez seja um amigo que venha me desejar Feliz Natal. Levanto-me, olho a rua e sorrio: é um caminhão de lixo. Bonito presente de Natal!” (Rubem Braga) Hora de organizar o que estudamos Conto Intenção Contar fatos criados pela imaginação do autor. Linguagem Recursos estilísticos (possibilidade de uso): • metonímia; • ironia; • polissíndeto. Construção • elementos e momentos da narrativa; • encadeamento das unidades narrativas de acordo com o estilo do autor; • diferentes tipos de narrador. Leitor Aquele que gosta de ler ficção de qualidade literária. Narrativa de fatos imaginados A atemporal arte de narrar...22 SER_EF2_Portugues9_M2_C1_001_042.indd 22 1/20/16 11:34 AM Prática de oralidade Exposição oral Discriminações e preconceitos associados Ao se referir à atitude do marido enganado, o delegado comenta: “Em geral vocês matam as mulheres, que são mais fracas”. 1. Reflita sobre o tipo de atitude, crença ou valor que a personagem do delegado, nanarrativa de Rachel de Queiroz, deixa transparecer em seu comentário. 2. Escolha um dos temas a seguir. Forme um grupo com os colegas que também esco- lherem esse tema. ¥ A Lei Maria da Penha: o que é e a história que há por trás dessa lei e desse nome. ¥ No século XXI, as mulheres ainda são discriminadas em relação aos homens, rece- bendo tratamento desigual; por exemplo, muitas vezes elas trabalham fora e, quan- do chegam em casa, desempenham sozinhas as tarefas domésticas. 3. Considere estes dados: ¥ a data do texto de Raquel de Queiroz, 1955, como base para seu estudo; ¥ o que afirma a Constituição Brasileira: “homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações” (art. 5o inciso I da Constituição Federal de 1988); ¥ a lei n o 11.340/2006, conhecida como Lei Maria da Penha, que entrou em vigor no dia 22 de setembro de 2006, “coíbe a violência doméstica e familiar contra a mulher”. 4. Converse com seu grupo para definirem um ponto de vista a ser defendido. Procurem levantar os argumentos que podem ajudá-los a sustentar essa opinião. 5. Pesquisem exemplos que comprovem o ponto de vista defendido por vocês. Suges- tões de fontes: ¥ recorte e gravação de notícias e reportagens sobre o assunto; ¥ dados obtidos em pesquisas oficiais, como o Censo 2011 do IBGE; ¥ entrevistas sobre o assunto com líderes comunitários, autoridades policiais e jurí- dicas. 6. Preparem uma apresentação para os outros grupos, organizando: ¥ o material (o quê): estruturando a apresentação em um texto expositivo, isto é, organizando-o em ideias-chave. Se acharem conveniente, utilizem um esquema em que seja possível visualizar essa organização; ¥ o material de apoio: imagens, reprodução de textos ou gráficos, gravações em áudio ou vídeo; ¥ as falas (quem vai falar e em que sequência), observando: a clareza na articu- lação das palavras e frases; a altura da voz; a postura do falante em relação aos ouvintes; 7. Deem um título para a apresentação. 8. Aguardem as orientações do professor quanto à data e ao local da apresentação. Para construir: Prática de oralidade (ao lado) Espera-se que os alunos percebam que o comentário revela preconceito em relação à mulher, incorporado à nossa cultura, que, até pouco tempo atrás, a via como um ser frágil, submisso e, portanto, sujeito à pressão e à violência do homem. Ainda hoje, em algumas comunidades, essa visão subsiste. Embora o narrador não situe a história no tempo, pode-se levar em conta a época em que a narrativa foi escrita — 1955 (chamar a atenção dos alunos para o significado dessa informação no final do texto). Acesse o portal e veja o conteúdo “Relações entre corpo e gênero”. A atemporal arte de narrar... 23 L êN G U A P O R T U G U E S A SER_EF2_Portugues9_M2_C1_001_042.indd 23 1/20/16 11:34 AM Outras linguagens Pintura O ser humano sempre gostou de contar hist—rias. E, para perpetuar suas narra- tivas, procurou registr‡-las nos mais variados suportes, valendo-se de diferentes linguagens. Observe a imagem a seguir. Trata-se de uma pintura em casca de ‡rvore, dividida em tr•s quadros. Para aprimorar: Outras linguagens (p. 24 e 25) K n e e p a d /R e x R e in it s C o ll e c ti o n /P it t R iv e rs M u s e u m , U n iv e rs it y o f O x fo rd Pintura do artista australiano Kneepad. In: BOWKER, John. Para entender as religi›es. Trad. C‡ssio de Arantes Leite. S‹o Paulo: çtica, 2000. p. 182. 1. Pelo fato de a imagem estar dividida em tr•s quadros, pode-se imaginar que o artista tivesse a inten•‹o de contar uma hist—ria. Escreva os elementos da narrativa que voc• consegue identificar na imagem. a) personagens: Sugest›es: estrela, figura humana... b) espa•o: Trata-se do espa•o celeste: h‡ estrelas e a Terra Ð as figuras humanas est‹o em pŽ no quadro maior. c) a•›es: Mostrar arma, voar... d) tempo: Acontecimentos que se sucedem em tr•s quadros, tr•s momentos. A atemporal arte de narrar...24 SER_EF2_Portugues9_M2_C1_001_042.indd 24 1/20/16 11:34 AM 2. Leia o texto que acompanha a imagem do livro de onde ela foi extra’da. [...] Esta pintura mostra um mito da criação dos aborígines australianos. Feita por um artista conhecido como Kneepad, da Terra de Arnhem, ela mostra a lenda de uma mulher (abaixo, à direita) que ainda não é deste mundo e vaga com a estrela Número Dois, procurando um lugar para morar. Mas a estrela Número Dois não é suficientemente brilhante para achar um lugar, e assim as duas juntas requi- sitam a ajuda da estrela da manhã (a estrela-d’alva), que traz a luz do dia com ela. Juntas, encontram a Terra, desenhada no alto. A estrela da manhã cria então o Sol e um homem, a quem dá uma lança para caçar. A mulher vem depois à existência, acha a Terra um bom lugar e une-se ao homem. O texto do livro esclarece que o quadro superior Ž o œltimo da sequ•ncia. Portanto, Ž prov‡vel que haja uma rea•‹o dos alunos em rela•‹o ˆ sequ•ncia narrativa da lenda. Como Ž natural para as pessoas de nossa cultura, eles devem ter come•ado a leitura da pintura pelo quadro superior. Ci•ncias Humanas e suas Tecnologias Ci•ncias da Natureza e suas Tecnologias Linguagens, Códigos e suas Tecnologias Matem‡tica e suas Tecnologias Conexões Voc• j‡ deve ter lido em algum livro ou visto em novelas de tev•, filmes ou mesmo em teatro uma hist—ria de amor que termina em tragŽdia. H‡ duas especial- mente famosas. 1. Literatura: histórias famosas de amores impossíveis Amores proibidos sempre foram assunto de grandes obras da literatura univer- sal. O narrador do conto que voc• leu recorre ˆ intertextualidade ao fazer refer•ncia a dois casais famosos da literatura: Trist‹o e Isolda e Paolo e Francesca. Conhe•a um pouco da hist—ria de cada um: A intertextualidade foi explorada no 8o ano. Verifique o que os alunos sabem sobre esse recurso. Tristão e Isolda, personagens da mitologia celta, tomam uma poção mágica e se apaixonam. Vivem um amor impossível, porque adúltero — Isolda casara com o tio de Tristão — e de final trágico: ele é ferido em batalha por uma flecha envenenada e morre desgostoso por achar que a amada não iria vê-lo em seu leito de morte; e ela, ao chegar e encontrá-lo já sem vida, morre de tristeza logo depois. Como novela de cavalaria, a história de Tristão e Isolda foi registrada por volta de 1200. Na foto, retrato do casal conforme o imaginou o artista John Waterhouse, em 1916, na tela Tristão e Isolda com a poção. novela de cavalaria: narrativa liter‡ria em cap’tulos que conta os grandes feitos de um her—i e de seus cavaleiros, entremeados de cŽlebres hist—rias de amor. R e p ro d u ç ã o /A rq u iv o d a e d it o ra Paolo e Francesca, personagens da Divina comédia, do escritor italiano Dante Alighieri (1265-1321), são mortos pelo marido dela, Giovanni, que é irmão de Paolo. Giovanni surpreendera-os beijando-se enquanto liam um romance. Na foto, as personagens retratadas na cena do beijo, conforme a imaginou o artista italiano Dante Gabriel Rossetti, em 1867, na tela Paolo e Francesca da Rimini. R e p ro d u ç ã o /A rq u iv o d a e d it o ra A atemporal arte de narrar... 25 L êN G U A P O R T U G U E S A SER_EF2_Portugues9_M2_C1_001_042.indd 25 1/20/16 11:34 AM 2. Literatura e música em diálogo Se a igualdade de direitos entre g•neros Ñ homens e mulheres Ñ fosse respeitada no Brasil, a Lei Maria da Penha n‹o precisaria ter sido criada. Isso voc• j‡ sabe. Leia o poema a seguir, observando principalmente as palavras em destaque. Descubra as conex›es que podem ser feitas entre esse texto e as personagens femininas que s‹o cantadas em letras da mœsica popular brasileira. Converse com os seus colegas sobre essas possibilidades. Estatuto da mulher Art. I Fica decretado que a partir de agora vale a utopia. Valem os sonhos os poss’veis e os imposs’veis. E que eles se façam verdade e se desdobrem em luz noescuro de nossas incertezas. Art. II Fica constitu’do, por decisão soberana, o Poder Feminino e feminina Ž Justiça. A Liberdade Ž feminina; a luta, a conquista, a vit—ria; a paci•ncia, a toler‰ncia, a paixão; e femi- nina Ž a Esperança que nos permite confiar no futuro. Art.III A partir de agora... Carolinas deixarão as janelas por onde o tempo passou... e elas não viram; e se atirarão ˆ vida, fazendo sua pr—pria hist—ria. Não mais Òmulheres de Atenas que fustigadas não choram, se ajoelham, pedem, imploram mais duras penas, serenasÓ. A partir de agora, seremos todas Marias, de raça, de força, de gana; Marias com mania de terem fŽ na vida. Marias de nosso tempo, Marias de nossos dias. Art. IV Fica decretado que, a partir de hoje, est‡ banida dos dicion‡rios a palavra viol•ncia pela inutilidade de seu uso. Os gestos serão suaves mesmo nas decis›es mais fortes, porque a palavra ser‡ a grande espada na defesa dos direitos e da liberdade. [...] LEVI, Jovita. Dispon’vel em: <www.conselhodamulher.pi.gov.br/ noticias.php?id=361> . Acesso em: 26 fev. 2015. Fragmento. Carolina: ÒEu bem que mostrei a ela/O tempo passou na janela/S— Carolina n‹o viuÓ (ÒCarolinaÓ, de Chico Buarque.) mulheres de Atenas: composi•‹o de Chico Buarque. Maria: ÒMaria, Maria/ Mistura a dor e a alegria/ Mas Ž preciso ter manha/ƒ preciso ter gra•a/ƒ preciso ter sonho sempre/Quem traz na pele essa marca/ Possui a estranha mania/De ter fŽ na vida...Ó (ÒMaria, MariaÓ, de Milton Nascimento) L’ngua: usos e reflex‹o Per’odo composto (II) AlŽm do emprego da meton’mia, da ironia e do poliss’ndeto, h‡ outros recursos que determinam o estilo de um autor. Como foi estudado, um desses recursos diz respeito ̂ maneira como se organizam as frases e os per’odos em um texto. A parte da gram‡tica que se dedica a esse estudo Ž a sintaxe, que diz respeito ao modo como as palavras s‹o combinadas e se relacionam em ora•›es e/ou frases. Na p‡gina seguinte, observe a an‡lise de um exemplo de coes‹o em per’odo do texto de Rachel de Queiroz. Procure perceber a rela•‹o de sentido que a conjun•‹o estabelece entre as duas ora•›es. Para construir: L’ngua: usos e reflex‹o (atividades sobre per’odo composto (II) e processo de subordina•‹o e coes‹o (I), p. 26 a 37) Sugere-se que este conteœdo seja lido em conjunto Ñ leitura compartilhada Ñ para que os alunos possam participar com interven•›es da compreens‹o dos sentidos produzidos especialmente pelo uso das conjun•›es. ƒ um conteœdo fundamental para que eles se apropriem mais das formas de coes‹o. A atemporal arte de narrar...26 SER_EF2_Portugues9_M2_C1_001_042.indd 26 1/20/16 11:34 AM coes‹o representada por uma conjunção coordenativa adversativa Diga o pecado mas n‹o diga o pecador. 1a ora•‹o 2a ora•‹o ora•‹o coordenada assindŽtica ora•‹o coordenada sindŽtica adversativa A segunda ora•‹o contraria a primeira, isto Ž, expressa uma ideia de oposição em rela•‹o ˆ primeira. 1. Ao lado, leia um coment‡rio feito pela personagem Mafalda. Pela fala da garota, ela n‹o considera o mundo algo f‡cil de se vender. A figura dela, sentada e segurando o queixo com as m‹os, confirma isso. Responda: qual Ž o prov‡vel motivo de Mafalda dizer que um comercial, para vender o mundo, precisaria ser convincente? Sugest‹o de resposta: Provavelmente Mafalda est‡ bastante desanimada com a situa•‹o do mundo, talvez com as atitudes das pessoas. Ela parece acreditar que ninguŽm gostaria de comprar o mundo. 2. Observe de que modo Mafalda come•a a frase: Se a gente quisesse coloc‡-lo ˆ venda [...]! Assinale a(s) alternativa(s) que melhor completa(m) a afirma•‹o a seguir. Essa ora- •‹o inicial relaciona-se com as demais do per’odo expressando ideia de: a) X condi•‹o b) certeza c) X hip—tese d) tempo e) finalidade A part’cula se Ž uma conjun•‹o, introduz uma possibilidade, uma condição para as ora•›es seguintes. Releia: [...] seria bem dif’cil fazer um comercial convincente! As ora•›es dependem umas das outras: pelo sentido e pela depend•ncia sint‡- tica. Observe uma possibilidade de an‡lise do per’odo: Se a gente quisesse coloc‡-lo ˆ venda, seria bem dif’cil fazer um comercial convincente! ora•‹o (I) ora•‹o (II) ora•‹o (III) Pode-se afirmar que essas ora•›es n‹o t•m independ•ncia entre si. Est‹o sintaticamente ligadas. A 2a ora•‹o e a 3a ora•‹o t•m seu sentido complementado pela condi•‹o que a 1a ora•‹o estabelece. Assim, a 1a ora•‹o apresenta uma circunst‰ncia que relaciona o sentido das outras ora•›es. Ao contr‡rio do que voc• estudou anteriormente, h‡ entre essas ora•›es um processo de subordinação. A seguir, ser‡ poss’vel refletir um pouco mais sobre essas constru•›es. QUINO. A pequena filosofia da Mafalda: como vai o planeta? S‹o Paulo: Martins Fontes, 2014. © J o a q u ín S a lv a d o r L a v a d o ( Q u in o )/ A c e rv o d o c a rt u n is ta convincente: aquele que convence alguŽm. A atemporal arte de narrar... 27 L êN G U A P O R T U G U E S A SER_EF2_Portugues9_M2_C1_001_042.indd 27 1/20/16 11:34 AM Processo de subordinação e coesão (I) Você já sabe que há duas formas de organizar um período composto: • por coordenação; • por subordinação. Releia este trecho do texto de Rachel de Queiroz: Na Polícia explicou que matara o homem porque era um marido enganado. Pelo número de verbos, podemos afirmar que se trata de período composto de três orações. É possível analisar as relações entre os termos de cada oração, estabelecendo algumas questões e usando trechos do texto para responder a elas: a) Explicou o quê? ... que matara um homem Esta oração complementa o verbo explicar da oração anterior. b) Por quê? ... porque era um marido enganado. Esta última oração apresenta a causa que o levou a matar. Na organização desse período composto, foram usadas formas de coesão para indicar a complementação de um verbo e a causa de uma ação. Releia outro trecho da narrativa: Aconteceu que, um belo dia, servia a dama ao balcão [...], quando sobreveio o sargento. Note que, se organizamos o período na ordem direta, fica mais fácil perceber as relações coesivas. Um belo dia, aconteceu que a dama servia ao balcão quando sobreveio o sargento. 1a oração 2a oração 3a oração inicia o fato oração principal o verbo acontecer refere-se a esta oração em que se diz o que aconteceu sujeito do verbo acontecer indica o tempo em que o fato aconteceu: quando aconteceu adjunto adverbial de tempo Observe que, nesse período, apenas uma oração n‹o exerce função sintática em relação às demais. Por essa razão, é chamada ora•‹o principal. A segunda oração exerce a função sintática de sujeito do verbo (aconteceu) da primeira oração. A terceira oração exerce a função sintática de adjunto adverbial de tempo da primeira oração. Oração principal é aquela que não exerce função sintática no período composto por subordinação. A ela se subordinam outras orações, isto é, dela dependem sintaticamente outras orações. A oração principal encerra, quase sempre, a ideia principal: ou é o núcleo da comunicação a ser feita ou é a responsável por desencadear as outras orações do período. Quando se fala em dependência sintática é feita referência ao modo como os termos de uma frase ou de uma oração se combinam, cada qual exercendo uma função na organização do período. Por ser um conteúdo complexo, sugere-se a leitura compartilhada para que os alunos se manifestem e possam fazer intervenções, apresentando dúvidas, relacionando com os conhecimentos que já têm dos usos que fazem desses tipos de orações, mesmo antes de estudá-las. O objetivo fundamental de se propor aos alunos o estudo sobre as formas de se organizar um período composto — por coordenação ou por subordinação — é tanto enriquecer o conhecimento deles sobre os mecanismos coesivos com o intuito de que possam se sentir à vontade para usá-los ao elaborar seus textos, percebendoos elementos coesivos que tornam o período mais claro e coerente, como permitir a eles que façam equivalências de sentido entre os elementos coesivos à disposição. O estudo da classificação das orações deve ajudar no reconhecimento dos efeitos de sentido que uma oração produz no encadeamento com outra. Assim, pretende-se que o estudo sobre a classificação corrobore a compreensão dos sentidos. A atemporal arte de narrar...28 SER_EF2_Portugues9_M2_C1_001_042.indd 28 1/20/16 11:34 AM Em gram‡tica, a sintaxe Ž o campo que estuda a combina•‹o de palavras. A segunda e a terceira ora•›es desse per’odo n‹o est‹o apenas justapostas, dispostas uma ao lado da outra. Elas dependem da primeira, pois exercem funções sintáticas em rela•‹o ao verbo Ñ aconteceu. Quando h‡ essa rela•‹o de depend•ncia sint‡tica entre as ora•›es, afirma-se que se trata de um período composto por subordinação. Esse Ž um tipo de encadeamento entre as ora•›es diferente do que voc• estudou na coordena•‹o, pois s‹o necess‡rios elementos de coes‹o distintos: as conjun•›es chamadas subordinativas. As ora•›es subordinadas s‹o divididas em tr•s grupos, de acordo com a fun•‹o sint‡tica que exercem, relativa ˆs classes de palavras a que s‹o equivalentes: subs- tantivas, adjetivas e adverbiais. O estudo inicial ser‡ dedicado ˆs ora•›es subordinadas substantivas. Orações subordinadas substantivas As ora•›es subordinadas substantivas s‹o assim chamadas porque exercem as mesmas fun•›es sint‡ticas que o substantivo: sujeito, objeto direto, objeto indireto, complemento nominal, predicativo do sujeito ou aposto. Vejamos um exemplo de ora•‹o substantiva. Leia o quadrinho a seguir. © 2 0 0 5 C h ri s B ro w n e /K in g F e a tu re s S y n d ic a te , In c . BROWNE, Chris. Hagar. Folha de S.Paulo. S‹o Paulo, 21 maio 2005. No primeiro quadrinho, a personagem expressa dois desejos: ora•›es com fun•‹o de complemento objeto direto ora•‹o principal 2a ora•‹o 3a ora•‹o“Às vezes, desejo que um jovem cavaleiro apare•a e (que) me carregue com ele!”(verbo transitivo direto, desejo o quê?) Note que a terceira ora•‹o come•a com a conjun•‹o e; portanto, est‡ coordena- da ˆ segunda. Classificação das orações substantivas Como vimos, as ora•›es subordinadas substantivas exercem em rela•‹o ˆ prin- cipal as fun•›es sint‡ticas próprias de um substantivo: sujeito, objeto direto, objeto indireto, complemento nominal, predicativo do sujeito, aposto. Por isso, se classificam de acordo com essa fun•‹o. Como se frisou anteriormente, a apresenta•‹o da classifica•‹o das ora•›es não visa à memorização, e sim à percepção dos mecanismos de coesão necessários à estruturação dos períodos. Mais consciente desses mecanismos e de suas rela•›es, os alunos poder‹o manejar com mais propriedade as diversas estruturas sint‡ticas que a l’ngua disponibiliza aos usu‡rios. O estudo metalingu’stico ajuda na medida em que se presta a ser um instrumento de refer•ncia para o uso. A atemporal arte de narrar... 29 L ÍN G U A P O R T U G U E S A SER_EF2_Portugues9_M2_C1_001_042.indd 29 1/20/16 11:34 AM Vamos analisar mais detalhadamente os tipos de oraç›es substantivas conforme a funç‹o sintática que desempenham no período. I. Sujeito oraç‹o subordinada substantiva subjetiva. Exemplo: ƒ bom que voc• n‹o chegue muito tarde. 1a oraç‹o 2a oraç‹o (= sujeito da 1a oraç‹o) issoconjunç‹o integrante Observe que a 2a oraç‹o faz a funç‹o de sujeito da 1a oraç‹o. Observe substituindo a 2a oraç‹o pela palavra isso: sujeito ƒ bom isso. predicado Se substituirmos a oraç‹o subjetiva pelo pronome demonstrativo isso, teremos na ordem direta a seguinte construç‹o: Isso Ž bom. O pronome substantivo isso terá o valor de sujeito da oraç‹o. A oraç‹o que exerce a funç‹o de sujeito da oraç‹o principal Ž classificada como oração subordinada substantiva subjetiva. II. Objeto direto oraç‹o subordinada substantiva objetiva direta. Exemplo: Em geral, podemos reconhecer uma oração substantiva verificando se Ž possível substituí-la pelos pronomes substantivos isto, isso ou aquilo. Geralmente o verbo da oraç‹o principal vem na terceira pessoa do singular em express›es como: Òƒ bom...Ó, Òƒ necessário...Ó, ÒFoi preciso ...Ó. DAVIS, Jim. Garfield. Folha de S.Paulo. S‹o Paulo, mar. 2015. G a rf ie ld , J im D a v is © 2 0 1 5 P a w s , In c . A ll r ig h ts r e s e rv e d / D is t. U n iv e rs a l U c li ck Releia: [...] eu sempre me pergunto se eu poderia ter sido mŽdico. 1a oraç‹o 2a oraç‹o oraç‹o principal coes‹o representada por uma conjunção subordinativa oraç‹o subordinada com funç‹o de complemento verbal para a outra oraç‹o objetiva direta Veja ainda outro período: Todos diziam que n‹o voltariam ˆquele lugar. principal oraç‹o subordinada substantiva objetiva direta V.T.D. conjunç‹o integrante isso O.D. A segunda oraç‹o está completando o sentido do verbo dizer, que Ž um verbo transitivo direto e que, portanto, necessita de um complemento objeto direto. Essa oraç‹o Ž classificada como oração subordinada substantiva objetiva direta. A atemporal arte de narrar...30 SER_EF2_Portugues9_M2_C1_001_042.indd 30 1/20/16 11:34 AM III. Objeto indireto oração subordinada substantiva objetiva indireta. Leia o período a seguir: conjunção integrante Os pa’ses pobres dependem de que os pa’ses ricos aceitem a redu•ão de suas d’vidas. oração principal oração subordinada substantiva objetiva indireta dissopreposição O.I. A segunda oração está completando o sentido do verbo depender, transitivo indireto, que, portanto, necessita de um complemento objeto indireto. Observe que, além da conjunção, o verbo depender precisou da preposição de. Assim, a segunda oração é chamada ora•‹o subordinada substantiva objetiva indireta. De acordo com a variedade-padrão, a oração subordinada substantiva objetiva indireta deve ser sempre introduzida por preposição. IV. Complemento nominal oração subordinada substantiva completiva nominal. Leia esta tira: © 1 9 8 8 P e a n u ts W o rl d w id e L L C ./ D is t. b y U n iv e rs a l U c li ck [...] SCHULZ. Snoopy Ð Pausa para a soneca. Porto Alegre: L&PM, 2013. p. 72-73. No 3o quadrinho, a personagem Charlie Brown dá um conselho para sua irmã Sally. O conselho parece não obter o resultado esperado. Responda: de que modo Charlie Brown procura explicar o conselho do avô? Sugestão de resposta: Ele supõe que o avô não acorda antes do meio-dia, diferentemente de sua irmã, que acorda muito cedo. Releia o período: 1a oração 2a oração Tenho a sensa•ão de que o vov™ nunca acorda antes do meio-dia. preposição conjunção integrante ligando as orações Observe que a 2a oração complementa o sentido da palavra sensa•‹o, usada na 1a oração: sensação de alguma coisa. A palavra sensa•‹o é um substantivo. Assim, a 2a oração completa o sentido de um nome: é uma ora•‹o subordinada completiva nominal. A atemporal arte de narrar... 31 L ÍN G U A P O R T U G U E S A SER_EF2_Portugues9_M2_C1_001_042.indd 31 1/20/16 11:34 AM Releia mais uma oração: Temos medo de que a intoler‰ncia entre os povos gere mais viol•ncia. oração subordinada substantiva completiva nominal preposição oração principal V.T.D. substantivo conjunção integrante disso complemento nominal A segunda oração está completando o sentido de um nome — o substantivo medo — da primeira oração. Essa oração que exerce função de complemento nominal é cha- mada de ora•‹o subordinada substantiva completiva nominal. Observe que o verbo é transitivo direto e já possui um objeto direto — medo. Assim como as objetivas indiretas, as completivas nominais, de acordo com a variedade-padrão da língua, devem sempre ser introduzidas por uma preposição. V. Predicativo do sujeito oração subordinada substantiva predicativa. predicativo do sujeito A realidade é que há muita miséria no mundo.oração principal oração subordinada substantiva predicativa sujeito verbo de ligação conjunção integrante isso/essa A segunda oração exerce a função de predicativo do sujeito da oração principal: é chamada de ora•‹o subordinada substantiva predicativa. VI. Aposto oração subordinada substantiva apositiva: aposto Os índios queriam apenas uma coisa: que suas terras fossem devolvidas. oração principal oração subordinada substantiva apositiva conjunção integrante isso A segunda oração explicita o termo coisa da primeira oração, portanto, é um aposto da oração principal. Essa segunda oração é classificada como ora•‹o subordi- nada substantiva apositiva. Como você pôde observar, foi possível substituir as orações subordinadas subs- tantivas pelo pronome substantivo isso. Essa é uma maneira fácil de reconhecer uma oração subordinada substantiva. Note que a conjunção frequente nesses períodos foi a conjunção integrante que. As conjunções que e se, que geralmente introduzem a oração subordinada substantiva, são chamadas de integrantes, pois têm o papel de integrar, de completar algum termo da oração principal. As orações subordinadas substantivas também podem ser introduzidas por outras palavras, além das conjunções integrantes. Observe os exemplos a seguir. oração subordinada substantiva objetiva direta Não sabíamos quando voc• tinha voltado da Inglaterra. se que como por que oração principal T h e o /A rq u iv o d a e d it o ra A atemporal arte de narrar...32 SER_EF2_Portugues9_M2_C1_001_042.indd 32 1/20/16 11:34 AM Orações reduzidas Observe o seguinte per’odo: preposi•‹o Mas tive receio [...] de enfrentar a corpora•‹o toda. ora•‹o principal ora•‹o reduzida: sem conjun•‹o + verbo na forma nominal (no infinitivo) Trata-se de um per’odo composto de duas ora•›es. Na primeira, a palavra receio pede complemento nominal. Se a segunda ora•‹o for substitu’da pelo pronome isso, Ž poss’vel confirmar que essa segunda ora•‹o exerce a fun•‹o de complemento nominal de receio: Mas tive receio disso. Trata-se, portanto, de uma ora•‹o subordinada substantiva completiva nominal. Essa segunda ora•‹o, no entanto, n‹o Ž introduzida por conjun•‹o e tem o verbo no infinitivo (enfrentar); Ž classificada como ora•‹o reduzida. Mas tive receio de que enfrentasse a corpora•‹o toda. ora•‹o principal ora•‹o desenvolvida: com conjun•‹o (que) preposi•‹o conjun•‹o integrante Observe que ela pode ser desenvolvida numa ora•‹o com conjun•‹o e com verbo flexionado: Nas ora•›es reduzidas, em lugar de conjun•‹o e de verbo flexionado, ocorrem as formas nominais do verbo Ñ infinitivo, gerœndio ou partic’pio. Assim, as ora•›es reduzidas podem tornar os textos mais concisos. Veja outra forma de concis‹o: Mas tive receio do enfrentamento com a corpora•‹o. express‹o nominal Observe comparativamente: de que enfrentasse a corpora•‹o toda. ora•‹o desenvolvida Mas tive receio de enfrentar a corpora•‹o toda. ora•‹o reduzida do enfrentamento com a corpora•‹o toda. express‹o nominal Observe que as tr•s constru•›es acima t•m fun•‹o de complemento nominal do substantivo (nome) receio. Atividades: ora•›es substantivas 1. Leia a manchete a seguir: Voc• sabia que Albert Einstein j‡ esteve no Brasil? Dispon’vel em: <www.parana-online.com.br>. Acesso em: 14 maio 2015. Observe o esquema: 1a ora•‹o 2a ora•‹o Voc• sabia que Albert Einstein j‡ esteve no Brasil? a) Que termo da 1a ora•‹o a 2a est‡ complementando? O verbo sabia. A atemporal arte de narrar... 33 L êN G U A P O R T U G U E S A SER_EF2_Portugues9_M2_C1_001_042.indd 33 1/20/16 11:34 AM b) Assinale a alternativa que indica a fun•‹o exercida pela segunda ora•‹o: X objeto direto do verbo sujeito do verbo da 1a ora•‹o complemento nominal de um termo da 1a ora•‹o 2. Reescreva abaixo as ora•›es a seguir transformando-as em per’odos compostos. Para isso, substitua as express›es nominais destacadas por ora•›es subordinadas substantivas desenvolvidas. As respostas s‹o apenas sugest›es. a) Os sem-terra reivindicam a distribui•‹o de terras para plantio. Os sem-terra reivindicam que sejam distribu’das terras para plantio. b) O problema Ž o seu ego’smo. O problema Ž que voc• Ž ego’sta. c) Os respons‡veis autorizaram a entrada de menores. Os respons‡veis autorizaram que os menores entrassem. d) S— as crian•as n‹o tinham receio de erros. S— as crian•as n‹o tinham receio de que errassem. e) Seus pais s— querem uma coisa: sua volta para casa. Seus pais s— querem uma coisa: que voc• volte para casa. f) ƒ necess‡rio autocontrole. ƒ necess‡rio que tenhamos autocontrole. 3. Agora fa•a o contr‡rio: reescreva abaixo os per’odos compostos transformando as ora•›es subordinadas substantivas desta- cadas em express›es nominais ou em ora•›es reduzidas de infinitivo. a) A maioria ali presente desconhecia que tinha direito ˆ liberdade de express‹o. A maioria ali presente desconhecia o direito.../... ter direito... b) A grande vantagem do ser humano Ž que tem o poder da linguagem. A grande vantagem do ser humano Ž o poder.../... ter o poder... c) Seu medo era que necessitasse de apoio na velhice. Seu medo era a necessidade.../... necessitar de apoio... d) A sua esperan•a era que as pessoas demonstrassem compaix‹o. A sua esperan•a era a demonstra•‹o de compaix‹o pelas pessoas./... as pessoas demonstrarem compaix‹o. A atemporal arte de narrar...34 SER_EF2_Portugues9_M2_C1_001_042.indd 34 1/20/16 11:34 AM e) Temo que ele não seja aprovado. Temo a sua desaprova•‹o./Temo ele n‹o ser aprovado. f) Estou com esperan•a de que minha prima chegue em breve. Estou com esperan•a da chegada em breve de minha prima./Estou com esperan•a de minha prima chegar em breve. 4. Na linguagem mais formal, as ora•›es subordinadas substantivas objetivas indiretas e as completivas nominais relacionam-se com a ora•‹o principal por meio de preposi•›es. Entretanto, na linguagem informal, no dia a dia, muitas vezes elas s‹o empre- gadas sem a preposi•‹o exigida pela variedade-padr‹o da l’ngua. Reescreva as frases a seguir incluindo a preposi•‹o de acordo com a linguagem mais formal. a) N‹o duvido que voc• tenha esquecido de me ligar. N‹o duvido de que... b) Gostar’amos que voc• n‹o fizesse tantas ironias. Gostar’amos de que... c) Lembre-se que as pessoas s— respeitam quem as respeita. Lembre-se de que... d) A comunidade de jovens do meu bairro tem necessidade que todos colaborem para a reforma da sede. ... tem necessidade de que... e) N‹o tenha medo que volte a ditadura. N‹o tenha medo de que... 5. Transcreva dos trechos a seguir as ora•›es que t•m a fun•‹o de ora•›es subordinadas substantivas e classifique-as de acordo com a fun•‹o que exercem em rela•‹o ˆ principal (se facilitar, use o recurso de substituir a ora•‹o pelo pronome isso). a) ÒTodos sab’amos que a dona da pens‹o era boa alma.Ó que a dona da pens‹o era boa alma. Ñ or. sub. subst. objetiva direta. b) ÒA maior de todas as descobertas do marido era que a mulher o tra’a.Ó que a mulher o tra’a. Ñ or. sub. subst. predicativa. c) ÒParece que ele pediu um ma•o de cigarros.Ó que ele pediu um ma•o de cigarros. Ñ or. sub. subst. subjetiva. T h e o /A rq u iv o d a e d it o ra A atemporal arte de narrar... 35 L êN G U A P O R T U G U E S A SER_EF2_Portugues9_M2_C1_001_042.indd 35 1/20/16 11:34 AM d) “Não falei que não era o amante?” que não era o amante? — or. sub. subst. obj. direta. e) “Não era justo que a jovem esposa [...] tirasse vantagens dessa nova situação de mulher bonita.” que a jovem esposa tirasse vantagens dessa nova situação de mulher bonita.— or. sub. subst. subjetiva. f) “Não sei se o zoilo aprendeu a lição.” se o zoilo aprendeu a lição. — or. sub. subst. obj. direta. g) Não duvide de que seus pais ficarão muito bravos com você. de que seus pais ficarão muito bravos com você. — or. sub. subst. obj. indireta. h) Os grevistas queriam apenas
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