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PROFESSOR Dr. CLEBSON PANTOJA PIMENTEL PRINCIPAIS BIOMOLÉCULAS 1 AMINOÁCIDOS E PROTEÍNAS 1. INTRODUÇÃO As proteínas são as moléculas mais diversificadas quanto à forma e função. Desempenham tanto funções estruturais quanto dinâmicas. Formam os componentes do esqueleto celular (citoesqueleto) e de estruturas de sustentação como o colágeno e elastina; participam de grande quantidade de processos biológicos, uma vez que, como enzimas catalisam milhares de reações químicas que ocorrem nos organismo; transportam moléculas no organismo, a exemplo do oxigênio (hemoglobina e mioglobina); contribuem no mecanismo de defesa do organismo (imunoglobulinas); atuam no controle global do metabolismo através das proteínas com função hormonal (insulina); realizam o processo de contração muscular (actina e miosina) e a regulação de atividades de genes, visto que se ligam ao DNA em sítios específicos e alteram a sua expressão. Apesar de apresentarem estruturas e funções diversas, as proteínas são formadas por apenas 20 monômeros denominados de aminoácidos. Os aminoácidos comuns são conhecidos como α- aminoácidos, porque possuem grupo amino primário (–NH2), um grupo carboxílico (–COOH), um átomo de hidrogênio e uma cadeia lateral variável, denominada de grupo R, ligados a um átomo de carbono assimétrico ou quiral (figura 1). As únicas excessões a essa regra são a glicina que não apresenta carbono quiral, visto que, possui dois átomos de hidrogénio ligado ao carbono alfa; e a prolina que possui um grupo imino (amina secundária), no lugar do grupo amino. Figura 1: Estrutura Química Geral dos Aminoácidos Mais de 400 aminoácidos já foram identificados na natureza, no entanto, apenas 20 destes são considerados proteícos, pois apenas esses são reconhecidos pelo código genético das células. Os outros aminoácidos são considerados não proteícos, por não participarem da formação das proteínas. Os aminoácido não protéicos podem surgir durante os processos bioquímicos e podem ser metabólitos importantes para a manutenção da homeostasia celular. Alguns aminoácidos não proteícos são nocivos ao organismo humano, ocasionando envenenamento ou reações alucinógenas. 1.1 CLASSIFICAÇÃO DOS AMINOÁCIDOS Existem várias formas de classificar os aminoácidos, e o tipo de classificação depende, obviamente, do critério utilizado. . Classificaçao dos aminoácidos de acordo com a síntese endógena: de acordo como a síntese endógena, os aminoácidos podem ser classificados em: Aminoácidos Essenciais e Aminoácidos Não- essenciais. 2 Os aminoácidos essenciais são aqueles aminoácidos que não são produzidos pelo organismo e, portanto devem ser ingerido (obtidos) através da dieta. São representados pela: leucina, isoleucina, valina, triptofano, metionina, fenilalanina, treonina, lisina e arginina (a histidina é um aminoácido essencial na infância - até 12 anos). Os aminoácidos essenciais contribuem consideravelmente para o aumento da resistência física, pois durante as atividades de longa duração são utilizados pelos músculos para fornecimento de energia. Os aminoácidos não-essenciais são aqueles aminoácidos que são produzidos pelo organismo e são representados pela: alanina, ácido aspártico, aspargina, ácido glutâmico, cistina, cisteína, glicina, glutamina, hidroxiprolina, prolina, serina e tirosina. Tabela 1. Aminoácidos esseciais e não-essenciais Fontes de proteínas completas são aquelas que contêm todos os aminoácidos essenciais em quantidades e proporções ideais para atender às necessidades orgânicas. Destre essas fontes estão os ovos, o leite, a carne vermelha, o peixe e as aves. Os alimentos de alta qualidade protéica são essencialmente de origem animal, enquanto a maioria das proteínas vegetais (lentilhas, feijões, ervilhas, soja, etc) é incompleta em termos de conteúdo protéico. Convém salientar que todos os aminoácidos essenciais podem ser obtidos diversificando o consumo de alimentos vegetais, cada um dos quais com uma qualidade e quantidade diferentes de aminoácidos. Na realidade, todos os aminoácidos nutricionalmente essenciais devem estar disponíveis no local da síntese de proteína antes que qualquer um deles possa atuar. Isso significa que a cada refeição ingerida deve conter todos esses aminoácidos essenciais em quantidade suficiente para efetuar a síntese de proteína. Classificação dos aminoácidos de acordo com as características da cadeia lateral. Uma das formas mais utilizadas para classificação dos aminoácidos se baseia na característica química das cadeias laterais (grupo R). De acordo com a palaridade da cadeia lateral os aminoácidos são divididos em dois grandes grupos: Aminoácidos apolares (grupo R hidrofóbico não interegem (mistura) bem com a água) e aminoácidos polares (gripo R hidrofílico tem afinidade (mistura) com a água). AMINOÁCIDOS NÃO-ESSENCIAIS AMINOÁCIDOS ESSENCIAIS Alanina Arginina Ácido aspártico Fenilalanina Asparagina Isoleucina Ácido glutâmico Leucina Cistina Lisina Cisteína Metionina Glicina Treonina Glutamina Triptofano Hidroxiprolina Valina Prolina Histidina* Serina Tirosina 3 Os aminoácidos apolares têm grupos R constituídos por cadeias orgânicas com caráter de hidrocarboneto, que não interagem com a água. Esses aminoácidos têm, geralmente, uma localização interna na molécula de proteína, uma vez que, internamente eles estão protegidos da água. Os aminoácidos polares possuem cadeias lateriais com grupos que apresentam carga elétrica líquida ou residual, que os capacitam a interagir com a água. São geralmente encontrados na superfície da molécula protéica. Estes aminoácidos são subdivididos em três categorias, de acordo com a carga apresentada pelo grupo R em soluções neutras. Aminoácidos básicos, se a carga for positiva; aminoácidos ácidos, se a carga for negativa; e aminoácidos polares sem carga, se a cadeia lateral não apresentar carga líquida. (figura 2). Figura 2: Estrutura e Classificação dos Aminoácidos Protéicos 4 1.2 IONIZAÇÃO DOS AMINOÁCIDOS Os grupos amino e carboxílico dos aminoácidos ionizam-se em pH fisiológico (~7,4), originando um grupo amino protonado e um grupo carboxílico desprotonado (carboxilato). Por isso, dizemos que os aminoácidos são anfóteros, pois podem agir como uma base ou um ácido. As moléculas que carregam grupos de polaridades opostas, como os aminoácidos, são conhecidos como zwitterions ou íons dipolares. Quando um aminoácido é titulado, sua curva de titulação indica a reação de cada grupo funcional com o íon hidrogênio (H+) presente no meio (figura 3). Em soluções muito ácidas, os dois grupos apresentam-se protonados (a: forma catiônica); em pH muito alcalino, ambos apresentam-se desprotonados (c: forma aniônica); e em soluções próximas da neutralidade ou na forma cristalina o aminoácido apresenta-se como um íon dipolar (b: zwitterion). Todos os pH de ionização dos grupos amino e ácido presentes na molécula de aminoácido são chamados pK (tabela 2-1). A média aritmética dos pK representa o ponto isoelétrico (pI) do aminoácido, ou seja, é o valor de pH onde predomina a forma eletricamente neutra do aminoácido. Figura 3: Curva de titulação a Alanina O valor de pH no qual o aminoácido fica eletricamente neutro (igual número de cargas positivas e negativas) corresponde ao ponto isoelétrico (pI). Para os aminoácidos que apresentam outros grupos ionizáveis na cadeia lateral, o ponto isoelétrico é calculado de outra forma. Para os aminoácidos que apresentam dois grupos carboxílicos, o ponto isoelétrico é obtido quando um dos grupos carboxílicos estiver protonado e o outro desprotonado. Por um raciocínio análogo, para os aminoácidos com dois grupos aminos, a forma eletricamente neutra será mais abundante em valor de pH onde um dos grupos aminos estiver protonado e o outro desprotonado. 5 1.3 ESTEREOQUÍMICA DOS AMINOÁCIDOS A fórmula bidmensional mostrada na figura 1 pode transmitir somente parte da estrutura comum dos aminoácidos, porque uma das propriedades mais importantes de tais compostos é a sua forma tridimensional, ou estereoquímica. Como o carbono α dos aminoácidos apresenta quatro ligantes diferentes, com exceção da glicina, estas moléculas podem se apresentar em duas formas designadas de L e D, que são imagens especulares uma da outra. As duas formas, em cada par, são denominadas de estereoisômeros, isômeros ópticos ou enantiômeros. Os D-aminoácidos são aminoácidos que apresentam o grupo amino do lado direito, enquanto que os L-aminoácidos são os que contem o grupo amino do lado esquerdo (figura 4). Figura 4: Estereoisômeros da Alanina Todos os aminoácidos encontrados nas proteínas possuem a configuração L. Embora os aminoácidos D ocorram na natureza, mais frequentemente em paredes de células bacterianas e em alguns antibióticos, eles não são encontrados em proteínas. 1.4 AMINOÁCIDOS INCOMUNS E BIOLOGICAMENTES ATIVOS O código genético das células utiliza apenas os 20 L-aminoácidos mostrados na figura 2 para sintetizar as proteínas, entretanto após a síntese protéica alguns aminoácidos podem sofrer modificação. Em quase todos os casos, tal modificação inclue uma adição de pequenos grupos químicos as cadeias laterais de alguns aminoácidos: hidroxilação, metilação, acetilação, carboxilação e fosforilação. Em muitos casos a modificação pode ser essencial para a função da proteína. Alguns exemplos de aminoácidos modificados presentes em proteínas são: 4-hidroxi-prolina e 5- hidroxi-lisina, derivados da prolina e lisina respectivamente. Estesa aminoácidos modificados são encontrado em abundância na proteína estrutural colágeno. Desmosina e isodesmosina (na proteína estrutural elastina, resultantes da união de quatro moléculas de lisina com os grupamentos R formando um anel que permite a elasticidade característica da proteína) (figura 5). Alguns aminoácidos livres podem ser modificados pelo metabolismo celular tornando-se biologicamentes ativos, desempenhando inúmeras funções no organismo, a exemplo dos hormônios da tireóide e dopamina (derivados da tirosina), do ácido-γ-aminobutírico (GABA – derivado da glutamina), e da histamina (derivada da histidina) (figura 5). 6 Existem outros aminoácidos que surgem de vias metabólicas intermediárias, como, por exemplo: citrulina e ornitina (intermediários do ciclo da uréia); homocisteína e homosserina (intermediários do metabolismo dos aminoácidos metionina e serina); canavanina, ácido djenkóiko e β-cianoalanina (aminoácidos tóxicos existentes em alguns fungos). Os aminoácidos não são armazenados, ou pelo menos não possuem tecido destinado somente para esse fim. Desta forma, a maioria deles é destinada para a síntese de proteínas e o excesso proveniente da alimentação, se não é degradado no metabolismo energético, é destinado para a síntese de várias moléculas importantes para o organismo como as purinas e pirimidinas (aspartato e glutamina); esfingolipídios (serina); histamina (histidina); tiroxina, melanina, dopamina e epinefrina (tirosina); serotonina, melatonina e NAD+ (triptofano); purinas e porfirinas (glicina). Figura 5: Aminoácidos Incomuns e Biologicamentes Ativos 7 1.5 LIGAÇÃO PEPTÍDICA E NÍVEIS DE ORGANIZAÇÃO DAS PROTEÍNAS Nas proteínas (polipeptídeos), os aminoácidos que as compõe são unidos por ligações peptídicas ou amídicas. Uma ligação peptídica ocorre pela união do grupo amino (-NH2) de um aminoácido com o grupo carboxila (-COOH) de outro aminoácido, liberando uma molécula de água (figura 6). A reação descrita na figura 6 jamais ocorre dessa forma. Nos seres vivos, a união dos aminoácidos por ligação peptídica não é realizada de forma direta entre eles, mas através de um complexo aparato de síntese protéica, que inclui ácidos nucléicos, ribossomos, várias proteínas e enzimas. A equação apresenta apenas o resultado líquido do processo. Figura 6: Ligação Peptídica A ligação C-N, em um peptídeo, é especial: é 10% mais "curta" do que uma ligação C-N normal e o ângulo de ligação também é diferente do esperado para um carbono sp2. Isto ocorre, porque a ligação peptídica, na verdade, apresenta uma estrutura de ressonância (figura 7), tendo um caráter intermediário entre uma ligação simples e uma dupla ligação. Após a união, os aminoácidos passam a ser chamados de resíduos de aminoácidos, orientados da região amino-terminal (N-terminal – esquerda) para a região carboxi-terminal (C-terminal – direita). Figura 7: Estrutura de Ressonância da Ligação Peptídica 8 A estrutura das proteínas pode ser descritas em quatro níveis de organizações. Estrutura primária é a sequência de aminoácidos ao longo da cadeia polipeptídica. A estrutura primária é somente a seqüência dos aminoácidos, sem se preocupar com a orientação espacial da molécula. As interações intermoleculares dos aminoácidos das proteínas fazem com que a cadeia protéica assuma uma estrutura secundária e, algumas vezes, uma estrutura terciária. A seqüência dos aminoácidos em todas as proteínas - fator que é responsável por sua estrutura e função - é determinada geneticamente a partir da seqüência dos nucleotídeos no DNA celular. Quando uma proteína em particular é necessária, o código do DNA para esta proteína é transcrito em uma seqüência complementar de nucleotídeos ao longo de um segmento de RNA - chamado de RNA mensageiro. Em geral, as proteínas possuem pelo menos 40 resíduos de aminoácidos. Polipeptídeos menores são chamados genericamente de peptídeos. O maior polipeptídeo conhecido é a titina, de 26926 resíduos, uma proteína gigante (2900kD), que ajuda a arranjar a estrutura repetida das fibras musculares. Contudo, a maioria dos polipeptídeos contém de 100 a 1000 resíduos (tabela 2-2). Essa faixa de tamanho dos polipeptídeos provavelmente é reflexo das condições químicas e da história evolutiva dessas moléculas. O limite mínimo para uma cadeia polipeptídica dobrar-se em uma forma estável, que lhe permita desempenhar uma função específica, parece ser de 40 resíduos. Os polipeptídeos que contêm centenas de resíduos estão no limite da eficiência da maquinaria de síntese de proteínas. Quanto maior for o polipeptídeo (e quanto maior for seu correspondente mRNA e seu gene), maior será a probabilidade de introdução de erros durante a transcrição e a tradução. Tabela 2-2: Composição de Algumas Proteínas Proteínas Resíduos de Aminoácidos Subunidades Massa Molar (kD) Inibidor de Proteinase III (melão) 30 1 3409 Citocromo (humano) 104 1 13000 Ribonuclease (E. coli) 155 1 17600 Interferon-gama (humana) 288 2 34200 Hemoglobina (humana) 574 4 64500 RNA-polimerase (bacteriófago T7) 883 1 98000 Piruvato descarboxilase (levedura) 2252 4 250000 Glutamina sintetase (E. coli) 5616 12 600000 Titina (humana) 26926 1 2990000 A estrutura secundária descreve as estruturas regulares bidimensionais formadas por segmentos da cadeia polipeptídica. Duas organizações são particularmente estáveis: A α-hélice, que corresponde ao enrolamento da cadeia ao redor de um eixo imaginário, assumindo uma forma helicoidal; e a β-folha, a qual é resultado da interação lateral de segmentos de uma cadeia polipeptídica ou de cadeias diferentes (figura 2-9). 9 A α-hélice e β-folha estabilizam-se por pontes de hidrogênio entre o nitrogênio e o oxigênio dos grupos –NH e –C=O; constituintes das unidades peptídicas. Embora a ponte de hidrogênio seja uma ligação fraca, o elevado número dessas ligações confere grande estabilidade à estrutura secundária. A estrutura terciária (figura 2-9) corresponde ao dobramento final da cadeia polipeptídica por interações de regiões com estrutura regular (α-hélice e β-folha) ou de regiões sem estruturas definada. É a conformação espacial da proteína, como um todo, e não de determinados segmentos particulares da cadeia protéica. A forma das proteínas está relacionada com sua estrutura terciária, que é o resultado de todas as interações dos aminoácidos das proteínas com o meio; algumas cadeias são tão longas e hidrofóbicas que perturbam a estrutura secundária helicoidal, provocando a dobra ou looping da proteína. Muitas vezes, as partes hidrofóbicas da proteína agrupam-se no interior da proteína dobrada, longe da água e dos íons do ambiente onde a proteína se encontra, deixando as partes hidrofílicas expostas na superfície da estrutura da proteína. Regiões como os "sítios ativos", "sítios regulatórios" e “motivos” são propriedades da estrutura terciária. O arranjo (ou conformação) tridimensional dos átomos da proteína na estrutura terciária é de extrema importância porque geralmente coincide com a chamada estrutura nativa, a estrutura que confere à proteína uma função biológica específica. As interações que mantêm a estrutura terciária estável são de diferentes tipos: pontes de hidrogênio (estabelecida entre os grupos R dos aminoácidos), interações hidrofóbicas (formadas entre as cadeias laterais hidrofóbicas dos aminoácidos apolares), ligações eletrostáticas ou iônicas (interações entre grupos com cargas opostas) e as pontes dissulfeto (formadas por resíduos de cisteína) (figura 2-9). A estrutura quaternária é resultado da associação de duas ou mais cadeias polipeptídicas (subunidades ou protômeros), que leva a formação de uma proteína funcional e holigomérica (figura 2- 08). Esta estrutura é mantida pelas mesmas forças que determinam as estruturas secundárias e terciárias. Figura 2-8: Estrutura Quaternária. 10 Figura 2-9. Resumos dos níveis de organização das proteinas Anotações: 11 1.6 CLASSIDICAÇÃO DAS PROTEÍNAS DE ACORDO COM A COMPOSIÇÃO: As proteínas podem ser classificdas, de acordo como sua composição em: Proteínas Simples ou homoproteínas e proteínas conjugadas ou heteroproteínas. As proteínas simples ou homoprotepinas são preínas constituídas somente por aminoácidos em sua composição, enquanto que as proteínas conjugadas ou heteroproteínas são preteínas que contém, além de aminoácidos, outros grupos orgânicos ou inorgânicos. Os grupos não protéicos que compõe as proteínas conjugadas são chamados de grupos prostéticos. São exmplos de grupo prostético: carboidratos (nas glicoproteínas), lipídeos (nas lipoproteínasEx LDL, IDL, VLDL, HDL), ácidos nucléicos (nas nucleoproteínas), DNA (nas desoxirribonucleoproteina), RNA (nas ribonucleoproteínas), metal (nas metaloproteinas), ferro (ferroproteínas), cromo (nas cromproteinas) etc. A hemoglobina é um exemplo de proteína conjugada. Ela contém 4 grupos prostéticos, cada um consistindo de um íon de ferro e a porfirina. São justamente estes grupos que habilitam a hemoglobina a carregar o oxigênio através da corrente sanguínea. 1.7 CLASSIFICAÇÃO DAS PROTEÍNAS DE ACORDO COM A FORMA: As proteínas também podem ser classificadas de acordo com a forma em Proteínas globulares ou globosas e proteínas Fibrosas. As proteínas globulares são formadas por uma ou mais cadeias polipeptídicas organizada em uma forma aproximadamente esférica ou elipsóide. São solúveis em água e desempenham várias funções dinâmicas (proteínas biologicamente ativas). Exemplos de proteínas blobulares: A) Mioglobina. A mioglobina presente no citosol das células musculares é uma proteína transportadora e armazenadora de oxigênio nos músculos esqueléticos e cardíacos dos vertebrados. A mioglobina (Figura 2-10) liga o oxigênio liberado pela hemoglobina nos capilares e posteriormente difundido através das membranas celulares. Formada por uma única cadeia polipeptídica de 153 resíduos de aminoácidos e um grupo prostético heme (anel heterocíclico porfirínico contendo quatro anéis pirrólicos e um átomo de Fe2+). 12 Figura 2-10. Estrutura da molécula de mioglobina. O esqueleto peptídico é constituído por oito α-hélices marcadas por letras, de A a H. B) Hemoglobina. A hemoglobina é uma proteína tetramérica (4 subunidades ou cadeias polipeptídica) presente nas hemáceas cuja principal função é o transporte do oxigênio dos pulmões aos tecidos periféricos. A hemoglobina também transporta CO2 e prótons, dos tecidos periféricos aos pulmões, para subseqüente excreção. A hemoglobina normal (figura 2-11) de adulto, a HbA consiste de quatro cadeias polipeptídicas: duas α (cada uma com 141 resíduos de aminoácidos) e duas β (cada uma com 146 resíduos de aminoácidos) representada por α2β2 e estabilizadas por pontes de hidrogênio e interações eletrostáticas. Outra forma encontrada em baixos teores (1 a 3,0% do total) no adulto é a HbA2 composta por cadeias α2δ2. A HbF formada por α2γ2 predomina no feto, em 60 a 90% no recémnascido e <1% após um ano. A hemoglobina H formada por quatro cadeias β, produzida quando faltam cadeias α para a síntese de HbA. A hemoglobina de Bart constituída de tetrâmero de γ, formada quando faltam cadeias α para a síntese de HbF no feto; apresenta-se em <2% no recém-nascido normal. Cada uma das cadeias de hemoglobina contém um grupo prostético, o heme (molécula de protoporfirina IX contendo um átomo de Fe2+). Figura 2-11. Estrutura da molécula de hemoglobina. 13 Enquanto a mioglobina apresenta grande afinidade pelo oxigênio, a hemoglobina demonstra uma afinidade inicial lenta que se torna progressivamente mais rápida. Esse fenômeno é conhecido como interação cooperativa, uma vez que a ligação do primeiro O2 à desoxi−hemoglobina facilita a ligação de O2 às outras subunidades na molécula. Figura 2-12. Comparação entre as moléculas de mioglobina e hemoglobina De modo inverso, a dissociação do primeiro O2 da hemoglobina completamente oxigenada, Hb(O2)4, tornará mais fácil a dissociação de O2 das outras subunidades da molécula. A oxigenação da hemoglobina é acompanhada por mudanças conformacionais nas proximidades do grupo heme. A estrutura quaternária da hemoglobina desoxigenada (desoxi-Hb) é descrita como estado conformacional T (tenso) e aquela da hemoglobina oxigenada (oxi-Hb) como estado conformacional R (relaxada). A afinidade do O2 é mais baixa no estado T e mais alta no estado R. Em função da cooperatividade em associação e dissociação do oxigênio, a curva de saturação de oxigênio para a hemoglobina difere da observada para a mioglobina (Figura 2.15) C) Os anticorpos ou imunoglobulinas (figura abaixo) compõem uma família de glicoproteínas produzidas pelos linfócitos B em resposta à presença de moléculas estranhas conhecidas como antígenos (resposta imunitária humoral). As características estruturais fundamentais das imunoglobulinas são: 14 • As moléculas de anticorpo são glicoproteínas com quatro cadeias polipeptídicas. Cada molécula tem estrutura em Y contendo duas unidades idênticas chamadas cadeias pesadas (H) e duas unidades idênticas entre si, porém de menor tamanho, denominadas cadeias leves (L). • A estrutura primária das cadeias pesadas, denominadas cadeias γ, μ, α, δ e ε, é a base da classificação das imunoglobulinas em cinco classes: IgG, IgM, IgA, IgD e IgE, respectivamente. • As cadeias leves de cada molécula de imunoglobulina são formadas por apenas dois tipos κ e λ. • As quatro cadeias são covalentemente interconectados por pontes dissulfeto. No interior de cada cadeia da molécula, ligações dissulfeto intercadeias dobram a molécula em uma estrutura mais compacta. • Cada cadeia polipeptídica consiste de duas regiões região variável (V) e região constante (C) quanto à seqüência de aminoácidos, (estrutura primária). A região variável da cadeia leve (VL) é, aproximadamente, 50% do comprimento da cadeia enquanto a região variável da cadeia pesada (VH) é aproximadamente 25% do comprimento da cadeia. 15 A digestão pela papaína fornece dois fragmentos principais chamados fragmento Fab, que retém a capacidade de ligar o antígeno da molécula intacta, e o fragmento Fc, que é cristalizável. As Proteínas fibrosas apresentam forma alongada, são geralmente insolúveis em água e geralmente fazem parte da composição de materiais estruturais de órgãos e ecidos, dando a eles elasticidade e/ou resistência. Dois bons exemplos, nos animais, são o colágeno e queratina. A) O colágeno é a proteína mais abundante em vertebrados sendo componente essencial do tecido conjuntivo que, numa variedade de formas geneticamente distintas, se distribui pela matriz óssea, pele, tendões, cartilagens, córnea, vasos sangüíneos, dentes e outros tecidos. O colágeno é sintetizado pelas células do tecido conjuntivo e secretado para o espaço extracelular para fazer parte de uma rede complexa de macromoléculas localizadas na matriz extracelular. O colágeno é uma proteína extracelular pouco solúvel em água e organizada em fibras de grande resistência. Cada molécula de colágeno é constituída de três cadeias polipeptídicas (uma tripla hélice) enroladas uma em torno da outra e orientadas para a direita com cerca de 1.000 resíduos de aminoácidos cada uma. As três cadeias polipeptídicas entrelaçam-se para formar uma tríplice hélice à direita, estabilizada por pontes de hidrogênio formadas entre as cadeias polipeptídicas individuais (entre o NH da glicina de uma cadeia e a C=O da prolina ou de outro aminoácido em outra cadeia) constituindo o módulo estrutural básico do colágeno, chamado tropocolágeno. As três cadeias polipeptídicas que compõem o colágeno são denominadas cadeias α. Essas cadeias combinadas em uma estrutura em tripla hélice formam os vários tipos de colágenos presentes nos tecidos. O colágeno tipo I, o mais abundante (90% do colágeno total), é formado por duas cadeias polipeptídicas α1 e uma cadeia α2 que formam uma hélice tríplice. B) As α-queratinas são proteínas constituídas quase exclusivamente de α-hélices compostas de três cadeias polipeptídicas enroladas em forma de corda helicoidal resistente ao estiramento. São ricas em resíduos de cisteína que formam pontes covalentes de dissulfeto que estabilizam as cadeias polipeptídicas adjacentes. Apresentam também teores importantes de resíduos de aminoácidos hidrofóbicos alanina, valina, isoleucina, fenilalanina e metionina. As α-queratinas formam a proteína da pele, cabelo, unhas, chifres, penas e lã. O cabelo é constituído de células mortas. C) Fibroína da seda. Muitos insetos e aranhas produzem seda, uma estrutura que consiste da proteína fibrosa fibroína embebida em uma matriz amorfa. Na fibroína, considerada uma β-queratina, as cadeias polipeptídicas são arranjadas na conformação de folhas β-antiparalela. As folhas β são formadas porque a fibroína tem elevado conteúdo de aminoácidos com grupos R relativamente pequenos como a glicina, alanina ou serina. A seda é uma fibra resistente por estar quase completamente distendida. Para esticá-la mais, seria necessário romper as ligações covalentes de suas cadeias polipeptídicas. No entanto, a flexibilidade da seda é ocasionada pelo deslizamento das folhas β adjacentes que estão associados por forças de van der Waals. 16 Desnaturação e renaturação de proteínas A desnaturação ocorre pela alteração da conformação tridimensional nativa das proteínas sem romper as ligações peptídicas (estrutura primária). Como a estrutura tridimensional específica das proteínas é fundamental para o exercício de suas funções, alterações estruturais provocadas pela desnaturação ocasionam a perda parcial ou completa das suas funções biológicas. Muitas vezes, em condições fisiológicas, as proteínas recuperam a conformação nativa e restauram atividade biológica quando o agente desnaturante é removido em processo denominado renaturação. A desnaturação ocorre nas seguintes condições: 1. Ácidos e bases fortes. Modificações no pH resultam em alterações no estado iônico de cadeias laterais das proteínas, que modificam as pontes de hidrogênio e as pontes salinas (associação de grupos iônicos de proteínas de carga oposta). Muitas proteínas tornam-se insolúveis e precipitam na solução. 2. Solventes orgânicos. Solventes orgânicos solúveis em água como o etanol interferem com as interações hidrofóbicas por suainteração com os grupos R não-polares e forma pontes de hidrogênio com a água e grupos protéicos polares. Os solventes não-polares também rompem interações hidrofóbicas. 3. Detergentes. As moléculas anfipáticas interferem com as interações hidrofóbicas e podem desenrolar as cadeias polipeptídicas. 4. Agentes redutores. Em presença de reagentes como a uréia e β−mercaptoetanol ocorre a conversão das pontes dissulfeto em grupos sulfidrílicos. A uréia rompe pontes de hidrogênio e interações hidrofóbicas. 5. Concentração de sais. A ligação de íons salinos a grupos ionizáveis das proteínas enfraquecem as interações entre grupos de cargas opostas da molécula protéica. As moléculas de água solvatam os grupos protéicos. Com a adição de grandes quantidades de sal às proteínas em solução, formam-se precipitados. As moléculas de água competem pelo sal adicionado tornando a quantidade de solvente muito pequena e, com isso, promovendo a agregação de moléculas protéicas e a sua precipitação. Esse efeito é chamado salting out. 6. Íons de metais pesados. Metais pesados como o mercúrio e chumbo afetam a estrutura protéica de várias formas. Podem romper as pontes salinas pela formação de ligações iônicas com grupos carregados negativamente. Os metais pesados também se ligam com grupos sulfidrílicos, um processo que pode resultar em profundas alterações das estruturas e funções protéicas. Por exemplo, o chumbo liga-se aos grupos sulfidrílicos de duas enzimas da via sintética da hemoglobina causando anemia severa. 7. Alterações na temperatura. Com o aumento da temperatura, a velocidade de vibração molecular aumenta. Eventualmente, interações fracas como as pontes de hidrogênio são rompidas promovendo alterações na conformação das proteínas. 8. Estresse mecânico. Agitação e trituração rompem o delicado equilíbrio de forças que mantém a estrutura protéica. Por exemplo, a espuma formada quando a clara do ovo é batida vigorosamente contém proteína desnaturada. 17 1.8 CORRELAÇÕES CLÍNICAS Os aminoácidos se combinam com vitaminas e minerais e servem como matéria prima para que o corpo fabrique enzimas, hormônios e outros agentes metabólicos. Ao contrário das proteínas alimentares, os aminoácidos não requerem digestão e são diretamente absorvidos, além de não sobrecarregarem o estômago e os intestinos. A utilização de aminoácidos como forma de suplementação alimentar deve ser realizada sob conduta profissional, pois não havendo ambiente bioquímico apropriado nas células, esses aminoácidos podem causar problemas para o metabolismo, ocasionado distúrbios de crescimento e desenvolvimento. Como já foi descrito anteriormente, alguns aminoácidos apresentam funções biológicas importantes. Nessa perspectivas, alguns peptídeos encontrados na natureza também desempenham funções importantes, atuando como hormônios (encefalinas, oxitocina, vasopressina e glucagon), antibiótico (gramicidina) e agentes redutores (glutationa) (tabela 2-3). Tabela 2-3: Peptídeos de Importância Biológica Peptídeos Nº de AA Glândulas/ Células produtoras Efeitos Principais Encefalinas 5 Hipófise anterior e medula adrenal Analgésico Oxitocina 9 Hipotálamo Contração da musculatura uterina no parto e de glândulas mamaria na lactação Vasopressina 9 Hipotálamo Aumento da pressão sangüínea e da reabsorção de água pelo rim Glucagon 29 Células α do pâncreas Hiperglicemiante Gramicidina 10 Cepas de Bacillus brevis Antibiótico Glutationa 3 Maioria das células Anti-oxidante Os níveis estruturais de uma proteína são importantes, pois são eles que ditam a função final das proteínas. Qualquer alteração no dobramento e na conformação final leva a uma proteína com baixa ou nenhuma atividade biológica. Exemplo disso é a osteogenesis imperfecta, também conhecida como a doença dos ossos quebradiços, que é um grupo de pelo menos quatro afecções genéticas e bioquimicamente distintas com prevalência de 1:10000 recém-nascidos vivos. A gravidade da doença varia de moderada a letal e depende da natureza da mutação dos protadores. Na forma mais grave da doença, mais de 100 fraturas foram relatadas in útero. O defeito fundamental é no gene do procolágeno tipo I. Na maioria das mutações ocorre a substituição de uma única base no códon da glicina, resultando na distorção da tripla hélice de colágeno. A estabilidade do colágeno é reduzida pelo romprimento da ponte de hidrogênio N-H do resíduo de alanina (normalmente glicina) ao grupo carbonila da prolina adjacente da cadeia vizinha. A posição da mutação está relacionada com a gravidade da doença. As mutações próximas da extremidade C-terminal são mais graves que as próximas da extremidade N-terminal. Isso porque a formação da tripla hélice do colágeno inicia a partir do C-terminal e progride em direção ao N-terminal. As doenças causadas pelos prions são exemplos de doenças causadas pela forma inadequada das proteínas. A exemplo dessas afecções temos, a doença de Creutzfeldt-jakob, o Kuru e a doença da vaca louca. Estas condições ocorrem quando uma proteína cerebral, chamada de prion, transforma sua conformação normal (PrPSc). Esta transformação é autopropagante, levando a grande agregadosde PrPSc. O papel destes agregados na produção da condição patológica não é bem conhecido. 18 ENZIMAS 2. HISTÓRICO Até o final do século XVIII, muitos processos de biotransformação já tinham sido descritos. Por exemplo, a digestão da carne pelas secreções do estômago e a formação de açúcares a partir do amido, quando esse era colocado em contato com a saliva. Em 1878, Wilhelm Kühne empregou pela primeira vez o termo "enzima" para descrever o fermento, usando a palavra grega ενζυμον, que significa "levedar". O termo passou a ser mais tarde usado apenas para as proteínas com capacidade catalítica, enquanto que o termo "fermento" se refere à atividade exercida por organismos vivos (fungos). O prêmio Nobel de química em 1907 foi ganho por Eduard Buchner que descobriu que os extratos de levedo podiam fermentar o açúcar até a formação de álcool e provou que as enzimas envolvidas na fermentação continuavam funcionando mesmo quando removidos das células vivas. Por muito tempo foi discutido qual era a identidade química das enzimas. Alguns autores afirmavam que as proteínas, associadas à atividade enzimática, apenas eram o suporte da verdadeira enzima, e, por si próprias, incapazes de catálise. Em 1926, o pesquisador James B. Sumner purificou e cristalizou a urease de feijão-soja, a qual catalisa a hidrólise de uréia em amônia e gás carbônico, mostrando que tais cristais apresentavam constituição protéica. Em 1937, o mesmo autor realizou estudo semelhante com a enzima catalase e chegou as mesmas conclusões anteriores. Em 1947, o prêmio Nobel de química dado aos pesquisadores Northrop e Stanley, que em 1930, com o estudo de três enzimas digestivas (pepsina, tripsina e quimotripsina), deram a prova final da característica protéica das enzimas. J.B.S. Haldane escreveu um tratado intitulado "Enzimas", que continha a notável sugestão de que as interações por ligações fracas, entre a enzima e seu substrato, poderiam ser usadas para distorcer a molécula do substrato e catalisar a reação. As técnicas mais utilizadas atualmente para o estudo da estrutura das enzimas é a difração por raio X e ressonância magnética nuclear. A primeira enzima a ser descrita por esses métodos foi a lisozima, um enzima que existe na saliva, lágrimas e na clara de ovo e cliva a parede celular de bactérias. Começaram assim, a bioquímica e biologia estruturais, a compreender o funcionamento das enzimas a nível atômico. Figura 3-2: Histórico - Enzimologistas Wilhelm Kühne 1837 - 1900 Eduard Buchner 1860 - 1917 James B. Sumner 1887 - 1955 J.B.S. Haldane 1892 - 1964 19 2. INTRODUÇÃO As enzimas representam uma classe muito importante de proteínas biologicamente ativas. Elas são responsáveis pela catálise de diversas reações nas células. Reações que, sem o auxílio das enzimas, jamais aconteceriam ou, ainda, gerariam produtos indesejados. Outras moléculas também apresentam função catalítica, a exemplo de moléculas de RNA (ribozimas), capazes de atuar aumentando a velocidade de reações específicas. Figura 3-1: Estrutura das Enzimas As enzimas podem necessitar de grupos não protéicos para a realização da catalise. Esse grupo de moléculas é conhecido como co-fator, que pode ser orgânicos (co-enzimas) ou inorgânicos (íons metálicos). Os co-fatores podem estar tão intimamente ligados as enzimas ao ponto de não haver uma separação entre esses dois elementos, sendo assim o co-fator é chamado de grupo prostético. Tabela 3-01: Alguns Elementos Inorgânicos que são Co-fatores Elemento Enzima Cu2+ Citocromo oxidase Fe2+ ou Fe3+ Citocromo oxidase, catalase, peroxidsase e K+ piruvato cinase Mg2+ Hexocinase, glicose 6-fosfatase e piruvato cinase Mn2+ Arginase, riubonucleotídeo redutase Mo Dinitrogenase Ni2+ Urease Se Glutaiona peroxidase Zn2+ Anidrase carbônica, álcool desidrogenase, carboxipeptidase A e B Aminoácidos - Proteína Nucleotídeos - RNA 20 Tabela 3-02: Algumas Coenzimas que Transportam Átomos ou Grupos Funcionais Elemento Enzima Biocitiona CO2 Biotina Coenzima A Grupos Acil Ácido pantotênico e outros compostos 5’-Desoxiadenosilcobalamina (coenzima B12) Átomo de H Vitamina B12 Flavina adenina dinucleotídeo Elétrons Riboflavina (B2) Lipoato Elétrons e grupos acil - Nicotinamida adenina dinucleotídeo Íon hidreto (:H– ) Ácido nicotínico (B3) Piridoxal fosfato Grupo amino Piridoxina (B6) Tetrahidrofolato Carbono Folato Tiamina pirofosfato Aldeído Tiamina (B1) As enzimas atuam em um conjunto de reações biológicas chamadas de metabolismo, onde cada reação é realizada e controlada por uma enzima específica que gera um determinado produto que será posteriormente utilizado como reagente de uma reação seguinte. Diferentes enzimas catalisam diferentes passos de vias metabólicas, agindo de forma sincronizada de modo a não interromper o fluxo normal das reações químicas da célula. 2.1 PROPRIEDADES GERAIS DAS ENZIMAS - Aumenta a Velocidade das Reações: A velocidade das reações catalisadas por enzimas são tipicamente 106 a 1012 vezes maiores que as reações correspondentes não-catalisadas, isso se deve a capacidade de diminuir a energia de ativação (valor mínimo de energia que as moléculas de reagentes devem possuir para que uma colisão entre elas seja eficaz). - Condições Químicas: As reações mediadas por enzimas ocorrem, na maioria das vezes, em uma faixa de condições químicas brandas e compatíveis com a vida, ou seja, temperatura inferior a 100°C, pressão atmosférica e pH quase neutro. Existem exceções a essa regra, como é o caso de bactérias termófilas que habitam regiões onde a pressão e a temperatura são elevadas. - Maior Especificidade: As enzimas apresentam um grau maior de especificidade do que os catalisadores químicos em relação a identidade de seus substratos (reagentes) e do seus produtos; isto é, as reações enzimáticas poucas vezes produzem subprodutos. - Capacidade de Regulação: A atividade catalítica das enzimas varia em resposta às condições químicas do meio e as concentrações de outras substâncias presentes na reação (reagentes, inibidores, ativadores, co-fator). - Endógenas: as enzimas são moléculas produzidas pelas células, não havendo necessidade da sua obtenção por meio da alimentação. 21 2.2 NOMENCLATURA E CLASSIFICAÇÃO A forma mais comum de nomenclatura das enzimas é a indicação do substrato e a utilização do sufixo ase em uma segunda palavra que indica a reação que a enzima catalisa. Além disso, algumas enzimas, por terem sido descritas há muito tempo, permanecem com a designação clássica, como a exemplo das enzimas digestivas pepsina, tripsina e quimiotripsina. Mas essa nomenclatura usual não é tão informativa e pode levar a vários nomes para uma mesma enzima. Por isso, a determinação da nomenclatura das enzimas foi normatizada por um comitê especializado, o Nomenclature Committee of the International Union of Biochemistry and Molecular Biology / Enzyme Comission (NC-IUBMB / EC) (tabela 3-01). Tabela 3-03: Classificação das Enzimas Segundo a Comissão de Enzimas 1. Oxido-redutases (reações de oxidação-redução ou transferência de elétrons – Desidrogenases e Oxidases) 1.1.atuando em CH-OH 1.2.atuando em C=O 1.3.atuando em C=O- 1.4.atuando em CH-NH 2 1.5.atuando em CH-NH- 1.6.atuando em NADH, NADPH 2.Transferases (transferem grupos funcionais como amina, fosfato, acil, carboxil – Quinases e Transaminases) 2.1.grupos com um carbono 2.2.grupos aldeído ou cetona 2.3.grupos acil 2.4.grupos glicosil 2.7.grupos fosfatos 2.8.grupos contendo enxôfre 3.Hidrolases (reações de hidrólise de ligação covalente) 3.1.ésteres 3.2.ligações glicosídicas 3.4.ligações peptídicas 3.5.outras ligações C-N 3.6.anidridos ácidos 4.Liases (adição de grupos a duplas ligações ou remoção de grupos deixando dupla ligação) 4.1. =C=C= 4.2. =C=O 4.3. =C=N- 5.Isomerases (reações de interconversão entre isômeros óticos ou geométricos - Epimerases) 5.1.racemases 5.2.cis-trans-Isomerases 5.3.oxidoredutases intramoleculares 5.4.transferases intramoleculares 5.5.liases intramoleculares 6.Ligases (condensação de duas moléculas, sempre às custas de energia, geralmente do ATP - Sintetases) 6.1. C-O 6.2. C-S 6.3. C-N 6.4. C-C 22 Tabela 3-04: As Seis Classes de Enzimas e as Reações que Catalisam Classe Tipo de Reação Descrição 1. Oxirredutases AH2 + B A + BH2 Catalisam reações de oxirredução, transferindo elétrons, hidretos (H-) ou prótons (H+). 2. Transferases A–X + B A + B–X Transferem grupos químicos entre moléculas. 3. Hidrolases A–B + H2O A–H + B–OH Utilizam a água como receptor de grupos funcionais de outras moléculas. 4. Liases X Y l l A=B + X–Y A–B Formam ou destroem ligações duplas, respectivamente retirando ou adicionando grupos funcionais. 5. Isomerases X Y Y X l l l l A–B A–B Transformam uma molécula no seu isômero. 6. Ligases A + B A–B Formam ligações químicas por reações de condensação, consumindo energia sob a forma de ATP. A partir destas categorias principais, as enzimas ainda são subdivididas em outras categorias, podendo ser identificadas sem ambigüidade pelo seu número da EC; por exemplo, EC 5.4.2.2 é a fosfoglicomutase. 23 2.3 INTERAÇÃO ENZIMA-SUBSTRATO Tal como todas as proteínas, as enzimas são formados por longas cadeias lineares de aminoácidos que se dobram resultando em uma estrutura tridimensional. Cada seqüência única de aminoácidos produz também uma estrutura tridimensional singular que apresenta propriedades específicas. Cadeias individuais de proteínas podem por vezes agrupar-se para formar um complexo protéico. Em uma proteína enzimática, existe um domínio chamado de "sítio ativo", onde se liga o substrato (a molécula reagente) e diminui a energia do estado de transição que leva ao produto desejado. A ligação entre o sítio ativo e o substrato é específica; a molécula precisa ter certas características eletrônicas e espaciais que permitam o seu "encaixe" na proteína. Por isso esta relação tem sido chamada de chave-fechadura (lock'n'key). A maioria das enzimas é maior do que o substrato sobre o qual atua, e só uma pequena porção da enzima está envolvida na catálise (sítio ativo conjunto de radicais dos resíduos de aminoácidos responsáveis pela catálise). As enzimas também podem ter sítios onde se ligam co-fatores e em outra pode haver um sítio de ligação para pequenas moléculas efetoras (sítio alostérico), que são produtos ou substratos, diretos ou indiretos, da reação enzimática. Estas moléculas, ao ligarem ao sítio alostérico, são capazes de aumentar ou diminuir a atividade da enzima. A análise mais apuradas (difração de raio X e ressonância magnética) da estrutura das enzimas permitiu aos enzimologista a compreenderem que o substrato induz modificações sutis na estrutura das enzimas, o que torna a catálise mais eficiente. Esse modelo é conhecido como encaixe induzido e baseia- se nas modificações sofridas pelas enzimas durante a catálise. Figura 3-3: Modelos de Interação entre Enzima e Substrato Cada enzima apresenta grau de especificidade, podem agir em vários substratos correlacionados ou ser capa de diferenciar isômeros de um mesmo composto. Exemplo disso são as enzimas digestivas que degradam proteínas dos alimentos, mas não atuam em carboidratos e lipídeos; e as enzimas responsáveis pela síntese de DNA que apresentam taxas de 1 erro em 1.000.000 nucleotídeos, sendo capaz de retornar verificando se o nucleotídeo adicionado ao DNA está corretamente pareado. As enzimas possuem normalmente uma alta especificidade em relação às reações que catalisam e aos substratos que estão envolvidos nessas reações. A forma complementar, carga e características hidrofílicas/hidrofóbicas, são responsáveis por esta especificidade. As enzimas exibem também elevados níveis de estereoespecificidade, regioseletividade e quimioseletividade. Algumas enzimas que produzem metabolitos secundários são descritos como promíscuos, visto que podem atuar num largo espectro de diferentes substratos. Tem sido sugerido que este tipo de especificidade diminuída é importante nos processos de evolução de novas vias no metabolismo. Modelo Chave-Fechadura Modelo Encaixe-Induzido Enzima Sítio Ativo Substrato Complexo Ativado (Complexo ES) Enzima Sítio Ativo Substrato Complexo Ativado (Complexo ES) 24 2.4 ENZIMAS ALOSTÉRICAS As enzimas reguladas por modificações não-covalentes são chamadas de alostéricas. As mesmas são encontradas em quase todas as vias metabólicas e geralmente catalisa uma reação irreversível localizada no início da via. Quanto à sua estrutura, são oligoméricas, ou seja, compostas de varias cadeias polipeptídicas, cada uma com um sítio alostérico. A ligação do substrato ao sítio alostérico de uma das subunidades afeta a conformação das demais, facilitando ou dificultando a ligação dos demais substratos ao sítio ativo. As enzimas alostéricas são sensíveis à reguladores do metabolismo, pois ao se ligarem a determinados metabólitos celulares sofrem grandes alterações em sua atividade. Estes metabólitos também podem ser chamados de efetuadores ou moduladores alostéricos, e podem ser positivos (aumento da velocidade da enzima) ou negativos (redução da velocidade da enzima) de acordo com o seu efeito. Portanto, os moduladores alostéricos podem atuar tanto como inibidores como ativadores da reação enzimática. Na maioria das vias metabólicas é comum que o produto final atue como modulador alostérico negativo da enzima que catalisa as primeiras reações da via. Portanto, quando a concentração deste produto fica aumentada ele age como um inibidor alostérico, diminuindo a velocidade da via e a sua própria produção. Este mecanismo é denominado inibição por retroalimentação ou feedback. Caso o produto final comece a ser consumido, consequentemente sua concentração diminui, deixando de inibir a via metabólica, proporcionando o retorno do funcionamento da mesma. Figura 3-04: Enzima Alostérica 2.5 ISOENZIMAS As isoenzimas são enzimas que diferem na seqüência de aminoácidos, mas catalisam a mesma reação química. Elas são codificadas por genes diferentes e apresentam parâmetros cinéticos peculiares, ou seja, diferentes valores de KM e diferentes propriedades de regulação. As isoenzimas são o resultado de diferentes alterações nucleotídicas, a exemplo de duplicação de genes e inserção ou deleção de bases. O acúmulo de mutações pode ocasionar a perda de função de uma das isoenzimas, mas algumas dessas enzimas persistiram durante a evolução, pois sua função é idêntica à original, com pequenas alterações nos mecanismo de regulação de cada uma das isoformas. A existência de isoenzimas permite o ajuste fino do metabolismo por satisfazer as necessidade particulares de um determinado tecido ou um dado estágio do desenvolvimento. Considerem a lactato desidrogenase (LDH), uma enzima que funciona no metabolismo anaeróbio e na síntese da glicose. Os seres humanos têm duas cadeias isoenzímicas para esta enzima; a isoenzima H, muito expressa no coração, e a isoenzima M, encontrado no músculo esquelético. A sequência de aminoácidos entre as duas isoformas é 75% idêntica. Estado 1 (Inativo) Estado 2 (Ativo) 25 A enzima funcional é um tetrâmero, e são possíveis muitas combinações diferentes das duas subunidades. A isoenzima H4, encontrada no coração, tem maior afinidade pelo substrato do que M4. As duas isoenzimas também diferem porque os nívesi altos de piruvato inibem alostericamente a H4, mas não a isoenzima M4. As outras combinações, como H3M, têm propriedades intermediárias dependendo da proporção destes dois tipos de cadeia. Figura 3-04: Isoenzimas – Lactato Desidrogenase Coração Rins Hemácias Cérebro Leucócito Músculo Fígado 26 2.6 ATIVIDADE ENZIMÁTICA As enzimas convertem reagentes (substratos) em produtos específicos. Isso significa que, em geral, uma enzima catalisa um tipo de reação química. Conseqüentemente, o tipo de enzimas encontrados numa célula determina o tipo de metabolismo que a célula efetua. A velocidade da reação catalisada por uma enzima é aumentada devido a diminuição da energia de ativação necessária para converter o substrato em produto. O aumento da velocidade da reação pode ser da ordem de milhões de vezes: por exemplo, a enzima orotidina-5'-fosfato descarboxilase diminui o tempo da reação por ela catalisada de 78 milhões de anos para 25 milissegundos. A velocidade da reação catalisada pelas enzimas é diretamente proporcional à concentração dos reagentes, ou seja, em uma transformação simples de A→B a velocidade pode ser representada por v=k[A]; com o decorrer da reação a concentração de A diminui e, conseqüentemente, a velocidade da reação diminui. O método utilizado para obtenção da velocidade de uma reação enzimática é baseado em uma padronização laboratorial chamada de velocidade inicial (v0). A velocidade de uma reação química é definida pelo número de moléculas de reagente(s) que são convertidas em produto(s), em um período de tempo especificado e depende da concentração dos componentes químicos envolvidos no processo e das constantes de velocidade, que são características da reação. A maioria das reações que ocorrem na natureza é reversível. Cada reação química apresenta um ponto de equilíbrio característico, onde as velocidades absolutas na direção da formação de produto(s) e na direção de formação de reagente(s) são iguais. Este ponto de equilíbrio é descrito por uma constante de equilíbrio, que corresponde à relação entre as duas constantes de velocidade. Figura 3-05: Enzimas: um catalisador biológico Esta velocidade é obtida medindo-se a quantidade de produto formado em tempos suficientemente curtos para que, no máximo, 5% do reagente (substrato) seja consumido. Com esse método pode-se considerar que a concentração do substrato permanece aproximadamente constante durante o tempo medido. Outro fator relevante é o tempo da reação, que não é semelhante entre as enzimas, isto é, cada enzima apresenta afinidade diferente pelo seu substrato e tempos diferentes de reação. http://www.ufpe.br/dbioq/portalbq04/adendo_cinetica_velocidade.htm 27 k1 k2 k3 As enzimas, como outros catalisadores, não interferem na constante de equilíbrio das reações, mas aumentam a velocidade das reações químicas, diminuindo a energia de ativação dos reagentes necessa´ria para alcançar o estado de transição. As enzimas não somente aceleram as reações, mas também acoplam reações endergônicas e exergônicas. Considere a energia livre (ΔG°’) necessária para transformar glicose em glicose-6-fosfato: Glicose + Pi → Glicose-6-Pi ΔG°’ = 4,0 kcal/mol e a energia de hidrólise do ATP: ATP → ADP + Pi ΔG°’ = -7,3 kcal/mol Das reações citadas acima, somente a hidrólise do ATP é possível, pois é uma reação exotérmica (liberação de energia) e dessa forma diminui a energia do sistema. A reação de glicose para glico-6-Pi é endotérmica, aumentado a entropia do sistema, logo é uma reação dita impossível. Mas a enzima hexocinase catalisa o acoplamento destas duas reações, gerando glicose-6-fosfato, com ΔG°’ de hidrólise -3,3 kcal/mol: Glicose + ATP → Glicose-6-Pi + ADP + Pi ΔG°’ = -3,3 kcal/mol Em 1913, Leonor Michaelis e Maud Menten propuseram um modelo simples para explicar essas características cinéticas. Elas propuseram que uma enzima, E, combina-se com o substrato, S, formando um complexo ES (complexo ativado), com uma constante de velocidade k1. O complexo ES pode dissociar-se para E e S, com uma constante de velocidade k2, ou pode prosseguir formando o produto P, com uma constante de velocidade k3. Na etapa inicial da reação, antes que a concentração de produto seja apreciável, quase nada do produto é revertido para o substrato inicial. E + S ⇌ ES ES → E + P E + S ⇌ ES → E + P A velocidade de formação ES será v1=k1 [E][S] [E] representa a quantidade de enzima livre, que é a diferença entre a concentração de enzima total [Et] e a concentração de enzima ligada ao substrato [ES]. Substituindo esses valores em [E] temos: v1=k1 ([Et] – [ES]) . [S] http://www.ufpe.br/dbioq/portalbq04/adendo_energia_de_ativacao.htm http://www.ufpe.br/dbioq/portalbq04/adendo_energia_livre.htm 28 A velocidade de desaparecimento de ES será a soma de v2 = k2 [ES] dissociação de ES em E + S v3 = k3 [ES] transformação de ES em E + P ou seja, v2 + v3 = k2 [ES] + k3 [ES] → v2 + v3 = (k2 + k3) . [ES] Durante os tempos considerados iniciais da reação, a concentração de ES mantém-se constante, com o estabelecimento de um equilíbrio estacionário (steady-state). As velocidades de formação (v1) e de desaparecimento (v2 + v3) de ES são, portanto, iguais. v1 = v2 + v3 k1 ([Et] – [ES]) . [S] = (k2 + k3) . [ES] ([Et] – [ES]) . [S] = (k2 + k3) . [ES] k1 [Et] . [S] – [ES] . [S] = (k2 + k3) . [ES] k1 [Et] . [S] = (k2 + k3) . [ES] + [ES] . [S] k1 [Et] . [S] = [ES] (k2 + k3) + [S] k1 [ES] = [Et] . [S] Equação A (k2 + k3) + [S] k1 A velocidade inicial da reação total é a velocidade do aparecimento do produto. v0 = k3 [ES] Substituindo o valor de [ES] na equação A: v0 = k3 [Et] . [S] (k2 + k3) + [S] k1 29 A velocidade máxima (Vmáx) da reação corresponde ao produto k3 . [Et] v0 = Vmáx . [S] (k2 + k3) + [S] k1 A relação entre (k2 + k3)/ k1 foi definida por Michaelis-Menten como uma nova constante, KM (Constante de Michaelis-Menten). Chega-se assim à expressão final da equação de Michaelis-Menten. v0 = Vmáx . [S] KM + [S] Quando a velocidade inicial é igual à metade da velocidade máxima teremos Vmáx = Vmáx . [S] 2 KM + [S] 1 = [S] 2 KM + [S] KM + [S] = 2 [S] → KM = [S] A última igualdade indica que a constate de Michaelis-Menten (KM) é numericamente igual à concentração de substrato que determina a metade da velocidade máxima, o que permite a fácil determinação experimental dessa constante. 2.7 FATORES QUE INTERFEREM NA ATIVIDADE ENZIMÁTICA A atividade enzimática depende de muitos fatores, dentre eles podemos citar a concentração do substrato e da enzima, a temperatura, o pH e a pressão. Quanto a concentração do substrato, a atividade aumenta linearmente com o aumento da concentração do reagente, indicando que durante a reação ainda havia moléculas de enzimas livres, mas depois de uma determinada concentração a velocidade mantém-se constante, indicando que toda enzima está na forma de ezima-substarto [ES] e, nesse ponto a velocidade não aumenta, permanecendo constante. Figura 3-5: Concentração do Substrato x Atividade Enzimática 30 O aumento da concentração da enzima aumenta a velocidade da reação, pois disponibiliza mais enzima livre, e dessa forma pode haver mais formação do complexo enzima-substrato e transformação de substrato em produto. Figura 3-6: Concentração da Enzima x Atividade Enzimática A elevação da temperatura aumenta o grau de agitação das moléculas, podendo ocasionar o rompimento das forças que matem a estrutura das enzimas, alterando a estrutura tridimensional desses catalisadores. O pH também é um fator importante, uma vez que alguns dos aminoácidos que compõe a estrutura da enzima apresenta grupos que podem ser protonados ou desprotonados, isso pode alterar a conformação espacial e carga elétrica das enzimas interrompendo a interação desse catalizador com o meio e com o seu substrato. Quando a enzima perde a sua estrutura tridimensional e, portanto, as suas propriedades, dizemos que ela sofreu desnaturação. Cada enzima possui um KM característico para um dado substrato; este parâmetro é muitas vezes usado para demonstrar a afinidade da enzima para diferentes substratos. Um exemplo disso é a enzima hexocinase, que degrada carboidratos com seis carbonos, mas apresenta afinidade diferente para cada um deles. No caso em que o substrato é a glicose, a metade da Vmáx é obtida com concentração do açúcar igual a 0,15mM, ou seja, é necessário uma concentração de 0,15mM de glicose para que metade da enzima disponível encontre-se ligada à glicose. Para conseguir situação análoga com a frutose, é necessário uma concentração de frutose 10 vezes maior, ou seja, 1,5mM. Então, a hexocinase tem maior afinidade pela glicose, pois seu KM para esse substrato é menor. 2.8 TRANSFORMAÇÃO DE LINEWEAVER-BURK A equação de Michaelis-Menten é a equação de uma hipérbole retangular; portanto, rigorosamente, os valores de Vmáx nunca são atingidos, pois a curva tem assíntota no valor do eixo v0. Este fato dificulta a determinação do KM, ainda mais levando-se em conta que boas aproximações dos valores de Vmáx devem ser obtidas com concentração tão altas de substratos que são, às vezes, experimentalmente difíceis de conseguir. 31 O problema de determinação exata do KM e da Vmáx pode, entretanto, ser resolvido através da transformação algébrica da equação de Michaelis-Menten. Esta transformação, formulada por Lineweaver e Burk, é obtida tomando o inverso daquela equação. 1 = KM + [S] v0 Vmáx . [S] ou 1 = KM . 1 + 1 v0 Vmáx [S] Vmáx que é uma reta do tipo y = ax + b Um gráfico com valores de 1/v0 contra valores de 1/[S] é, portanto, uma reta cujo intercepto nas ordenadas é 1/Vmáx e, nas abscissas, – 1/KM. Esta inversão permiti a determinação do valor de KM (e de Vmáx) sem que seja necessário determinar experimentalmente o valor de Vmáx, já que a reta pode ser traçada a partir de alguns pontos experimentais, prolongando-se a reta até o eixo das ordenadas, encontram-se o valor do inverso de Vmáx; o ponto em que a reta corta o eixo das abscissas fornecerá o valor negativo do inverso de KM. Figura 3-6: Transformação De Lineweaver-Burk 2.9 INIBIDORES Os inibidores são moléculas capazes de impedir o diminuir a atividade das enzimas. Os inibidores podem ser utilizados pelas células para controlar processos biológicos complexos, a exemplo das vias metabólicas. Algumas vezes os inibidores podem ser tornar venenos, pois o excesso deles pode desativar muitas enzimas; ou ainda, os inibidores são utilizados como fármacos no controle de estados metabólicos indesejados. Os inibidores são classificados em: - Inibidores Irreversíveis: são moléculas que reagem com as enzimas levando-as praticamente a inativação total. Esses inibidores dissociam-se muito lentamente de suas enzimas, porque ficam ligados muito fortemente à enzima, por covalência ou não. Exemplos de inibidores irreversíveis são os compostos organofosforados, que formam ligações covalentes com os resíduos de aminoácidos das enzimas (principalmente serina e cisteína); a aspirina (ácido acetil-salicílico) que age modificando covalentemente a enzima ciclo-oxigenase, reduzindo a síntese de sinais de inflamação; a penicilina, que atua modificando por covalência a enzima transpeptidase, impedindo a síntese da parede celular bacteriana. 32 - Inibidores Reversíveis: São substâncias que inativam as enzimas por um pequeno período de tempo, ou seja, o inibidor reversível é caracterizado por uma rápida dissociação do complexo enzima-inibidor. Os inibidores reversíveis podem ser divididos em: a) Inibição Competitiva: o inibidor tem estrutura espacial semelhante ao do substrato, por isso existe uma competição pelo centro ativo da enzima. A molécula que estiver em maior concentração, inibidor ou substrato, é aquela que vai se ligar primeiramente a enzima, impedindo dessa forma ligação da outra. Um inibidor competitivo diminui a velocidade de catálise ao reduzir a proporção de moléculas de enzimas ligadas a um substrato. A velocidade máxima da reação não é alterada, mas o KM aumenta. b) Inibição Não-Competitiva: o minibidor não apresenta semelhança estrutural como substrato, logo não compete pelo sítio ativo da enzima. Esse inibidor apresenta outro sítio de ligação, podendo associar-se a enzima livre ou como o complexo enzima-substrato. A velocidade máxima da reação diminui, mas o KM não é alterado. c) Inibição Incompetitiva: nesse caso o inibidor só se liga ao complexo enzima substrato. Isso acontece, porque o sítio de ligação do inibidor só surge após a interação da enzima com o seu substrato. Logo, quanto mais substrato maior será a inibição. A velocidade máxima da reação diminui e o KM é alterado. Figura 3-7: Inibidores Irreversíveis Compostos Organofosforados Malathion Dimetoato Chlorfenvinphos Parathion Tetraetil Fosfato - TEPP Trichlorfon Fármacos Ácido Acetilsalicílico Penicilina Amoxicilin a Ampicilina Tetracilina Estreptomici na Neomicina 33 Figura 3-8: Inibidores Não-Competitivos: Metais Pesados Figura 3-8: Inibidores Competitivos Substrato Enzima Inibidor Diidropteroato sintase Adenilsuccinato sintase Timidilato sintase Diidrofolato redutase Sulfanilamida: utilizado para combater infecções bacterianas Mercaptopurina: utilizado no tratamento de leucemia Fluorouracila: utilizado no combate de tumores Metotrexato: utilizado no tratamento de leucemia AZT (3’-azido-2’-desotimidina): utilizado no tratamento de AIDS p-Aminobenzoato Hipoxantina Uracila Diidrofolato Desotimidina DNA polimerase viral 34 35 2.10 CORRELAÇÕES CLÍNICAS As enzimas são proteínas com propriedades catalisadoras sobre as reações que ocorrem nos sistemas biológicos. Elas têm um elevado grau de especificidade sobre seus substratos acelerando reações específicas sem serem alteradas ou consumidas durante o processo. O estudo das enzimas tem imensa importância clínica. Em algumas doenças as atividades de certas enzimas são medidas, principalmente, no plasma sangüíneo, eritrócitos ou tecidos. Todas as enzimas presentes no corpo humano são sintetizadas intracelularmente. Três casos se destacam: Enzimas plasma-específicas: Enzimas ativas no plasma e utilizadas no mecanismo de coagulação sangüínea e fibrinólise. Ex.: pró-coagulantes: trombina, fator XII, fator X e outros. Enzimas secretadas: São secretadas geralmente na forma inativa e após ativação atuam em locais extracelulares. Os exemplos mais óbvios são as proteases ou hidrolases produzidas no sistema digestório. Ex.: lipase, α-amilase, tripsinogênio e antígeno prostático específico. Enzimas celulares: Normalmente apresentam baixos teores séricos, mas os níveis aumentam quando são liberadas a partir de tecidos lesados por alguma doença. Isto permite inferir a localização e a natureza das variações patológicas em alguns órgãos, tais como: fígado, pâncreas e miocárdio. A elevação da atividade sérica depende do conteúdo de enzima do tecido envolvido, da extensão e do tipo de necrose. São exemplos de enzimas celulares as transaminases, lactato desidrogenases, etc. As meias-vidas das enzimas teciduais após liberação no plasma apresentam grande variabilidade – nos casos de enzimas medidas com propósitos diagnósticos e prognósticos podem variar desde algumas horas até semanas. Em condições normais as atividades enzimáticas permanecem constantes, refletindo o equilíbrio entre estes processos. Modificações nos níveis de atividade enzimática ocorrem em situações onde este balanço é alterado. As elevações na atividade enzimática são devidas: Aumento na liberação de enzimas para o plasma é conseqüência de: - Lesão celular extensa, as lesões celulares são geralmente causadas por isquemia ou toxinas celulares, por exemplo: na elevação da atividade da isoenzima CK-MB após infarto do miocárdio. - Proliferação celular e aumento na renovação celular, por exemplo: aumentos na fosfatase alcalina pela elevação da atividade osteoblástica durante o crescimento ou restauração óssea após fraturas. - Aumento na síntese enzimática, por exemplo: marcada elevação na atividade da γ-glutamil transferase após a ingestão de álcool. - Obstrução de ductos – afeta as enzimas normalmente encontradas nas secreções exócrinas, por exemplo: a amilase e a lipase no suco pancreático. Estas enzimas podem regurgitar para a corrente circulatória se o ducto pancreático-biliar estiver bloqueado. 36 Redução da remoção de enzimas do plasma devido à insuficiência renal. Afetas enzimas excretadas na urina, por exemplo: a amilase pode estar elevada na insuficiência renal. A redução nos níveis de atividade enzimática são comuns e ocorrem na: - Síntese enzimática reduzida, por exemplo: colinesterase baixa na insuficiência hepática grave pela redução do número de hepatócitos. - Deficiência congênita de enzimas, por exemplo: baixa atividade da enzima fosfatase alcalina plasmática na hipofosfatasemia congênita. - Variantes enzimáticas inerentes com baixa atividade biológica, por exemplo, variantes anormais da colinesterase. A utilidade diagnóstica da medida das enzimas plasmáticas reside no fato que as alterações em suas atividades fornecem indicadores sensíveis de lesão ou proliferação celular. Estas modificações ajudam a detectar e, em alguns casos, localizar a lesão tecidual, monitorar o tratamento e o progresso da doença. No entanto, muitas vezes falta especificidade, isto é, existem dificuldades em relacionar a atividade enzimática aumentada com os tecidos lesados. Isto porque as enzimas não estão confinadas a tecidos ou órgãos específicos, pois estão grandemente distribuídas e suas atividades podem refletir desordens envolvendo vários tecidos. Na prática, a falta de especificidade é parcialmente superada pela medida de vários parâmetros (que incluem várias enzimas). Como as concentrações relativas das enzimas variam consideravelmente em diferentes tecidos, é possível, pelo menos em parte, identificar a origem de algumas enzimas. Por exemplo, apesar das enzimas transaminases ALT (GTP) e AST (GOT) serem igualmente abundantes no tecido hepático, a AST (GOT) apresenta concentração 20 vezes maior que a ALT (GTP) no músculo cardíaco. A determin ação simultânea das duas enzimas fornece uma clara indicação da provável localização da lesão tecidual. A especificidade enzimática pode também ser aumentada pela análise das formas isoenzimáticas de algumas enzimas como na lactato desidrogenase. A seleção de quais enzimas medir com propósitos diagnósticos e prognósticos depende de vários fatores. As principais enzimas de uso clínico, juntamente com seus tecidos de origem e aplicações clínicas são listadas na tabela 3-05. Tabela 3-05: Distribuição de algumas enzimas de importância diagnóstica Enzima Principal fonte Principais aplicações clínicas Amilase ovários Glândulas salivares, pâncreas, Enfermidade pancreática Aminotransferases (transaminases) Fígado, músculo esquelético, coração, rim, eritrócitos Doenças do parênquima hepático, infarto do miocárdio, doença muscular Antígeno prostático específico Próstata Carcinoma de próstata Creatina quinase Músculo esquelético, cérebr o, coração, músculo liso Infarto do miocárdio, Fosfatase ácida Próstata, eritrócitos Carcinoma da próstata Fosfatase alcalina Fígado, osso, mucosa intestinal, placenta, rim Doenças ósseas, enfermidades hepáticas γ-Glutamiltransferase Fígado, rim Enfermidade hepatobiliar, alcoolismo Lactato desidrogenase Coração, fígado, músculo esquelético, eritrócitos, plaquetas, nódulos linfáticos Infarto do miocárdio, hemólise, doenças do parênquima hepático Lipase Pâncreas Enfermidade pancreática 37 CARBODRATOS 3. INTRODUÇÃO O açúcar que as pessoas põem no café, as fibras de uma folha de papel e o principal constituinte da carapaça de um besouro são substâncias que pertencem ao mesmo grupo: os carboidratos. Sabe-se, há muito tempo, que essas substâncias atuam como reservas de energia do organismo, mas estudos recentes revelam que elas têm outras – e importantes – funções biológicas. Os carboidratos são as macromoléculas mais abundantes na natureza. Suas propriedades já eram estudadas pelos alquimistas, no século 12. Durante muito tempo acreditou-se que essas moléculas tinham função apenas energética no organismo humano. A glicose, por exemplo, é o principal carboidrato utilizado nas células como fonte de energia. O avanço do estudo desses compostos, porém, permitiu descobrir outros eventos biológicos relacionados aos carboidratos, como o reconhecimento e a sinalização celular, e tornou possível entender os mecanismos moleculares envolvidos em algumas doenças causadas por deficiência ou excesso dessas moléculas. O avanço científico permitiu conhecer de modo mais detalhado as propriedades físico-químicas dos carboidratos, resultando na exploração dessas características em diversos processos industriais, como nas áreas alimentar e farmacêutica. Um dos carboidratos com maior utilização médica é a heparina, composto de estrutura complexa, com ação anticoagulante e antitrombótica. A combinação das diferentes funções bioquímicas de cada uma dessas moléculas permite a integridade da célula e de todos os processos metabólicos, fisiológicos e genéticos dos organismos vivos. A partir da década de 1970, o surgimento de técnicas avançadas de cromatografia, eletroforese e espectrometria permitiram ampliar a compreensão das funções dos carboidratos. Hoje existe um novo ramo da ciência – a glicobiologia – voltado apenas para o estudo desses compostos. Sabe-se agora que eles participam da sinalização entre células e da interação entre outras moléculas, ações biológicas essenciais para a vida. Os primórdios do estudo de carboidratos estão ligados ao seu uso como agentes adoçantes (mel) ou no preparo do vinho a partir da uva. Nos escritos dos alquimistas mouros, no século 12, há referências ao açúcar da uva, conhecido hoje como glicose. Os relatos iniciais sobre açúcares na história vêm dos árabes e persas. Na Europa, o primeiro agente adoçante foi sem dúvida o mel, cuja composição inclui frutose, glicose, água, vitaminas e muitas outras substâncias. Há indícios de que Alexandre, o Grande – o imperador Alexandre III da Macedônia (356-323a.C.) – introduziu na Europa o açúcar obtido da cana-de-açúcar, conhecido hoje como sacarose (e o primeiro açúcar a ser cristalizado). A dificuldade do cultivo da cana-de-açúcar no clima europeu levou ao uso, como alternativa, do açúcar obtido da beterraba (glicose), cristalizado em 1747 pelo farmacêutico alemão Andreas Marggraf (1709-1782). A história dos carboidratos está associada a seu efeito adoçante, mas hoje sabemos que a maioria desses compostos não apresenta essa propriedade. Os carboidratos são os “combustíveis da vida”. Eles armazenam a energia nos seres vivos, na forma de amido e glicogênio (outro polissacarídeo), e a liberam para as reações metabólicas quando são degradados (em especial a glicose). Atuam ainda como doadores de carbono para a síntese de outros constituintes das células. São os principais produtos da fotossíntese, processo em que a energia solar é transformada em energia química pelas plantas e depois transferida, através da cadeia alimentar, para os animais. Estima-se que sejam formados mais de 100 bilhões de toneladas de carboidratos na Terra, a cada ano, pela fotossíntese – nesse processo, as plantas captam a luz solar e usam sua energia para promover reações, envolvendo moléculas de gás carbônico (CO2) e de água (H2O), que produzem glicose, armazenada depois como amido nos tecidos vegetais. 38 Entretanto, os carboidratos não têm apenas função energética. Estão presentes também na superfície externa da membrana das células. Nesse caso, podem ser glicoproteínas (quando ligados a uma proteína), glicolipídios (se unidos a um lipídio) ou proteoglicanos (quando estão na forma de cadeias de glicosaminoglicanos – um tipo de polissacarídeo – unidas a uma proteína). Essas formas conjugadas presentes nas membranas atuam como receptores e sinalizadores, interagindo com moléculas e outras células. A remoção de hemácias envelhecidas do sangue foi um dos primeiros eventos biológicos estudados que revelou a participação da estrutura dos carboidratos (em glicoproteínas) em um processo de “sinalização”. Hemácias jovens têm, em sua superfície, glicoproteínas cuja extremidade é rica em ácido siálico. Quando tais células envelhecem, suas glicoproteínas perdem esse ácido e passam a expressar, em sua extremidade, a galactose. Esse monossacarídeo é reconhecido por receptores do fígado, que então capturam e removem da circulação as hemácias “velhas”. Os grupos sangüíneos A, B, O e AB são outros exemplo típicos de um sistema de sinalização controlado pela estrutura de carboidratos em glicoproteínas. Os grupos A e B diferem em apenas um tipo de monossacarídeo nos glicolipídios ou glicoproteínas das hemácias. No A está presente a N- acetilgalactosamina (uma galactose ligada a grupos químicos amino e acetil) e o B tem a galactose – a diferença entre esses dois carboidratos está em apenas alguns átomos, mas isso pode levar a um resultado fatal, se o indivíduo receber o tipo sangüíneo incompatível em uma transfusão. Os carboidratos encontrados nesses compostos mistos também funcionam como receptores na membrana celular. A ação de diversas toxinas de plantas e bactérias (da cólera, da difteria, do tétano e do botulismo, entre outras) depende da interação com gangliosídios (glicolipídios ácidos) específicos de suas células-alvo. Por isso, estudos nessa área pretendem projetar agentes terapêuticos capazes de inibir essa interação, evitando os efeitos nocivos das toxinas. Em 2005, o glicocientista Lior Horonchik e seus colaboradores, do Departamento de Biologia Molecular da Escola de Medicina de Jerusalém (em Israel), mostraram que a degeneração dos neurônios causada por infecção pelo príon (proteína responsável pelo chamado “mal da vaca louca”) depende da presença, na superfície das células nervosas, de receptores (proteoglicanos) que contêm glicosaminoglicanos. O príon precisa interagir com esses polissacarídeos para entrar no neurônio – isso significa que o papel deles no reconhecimento celular é fundamental para o desenvolvimento dessa infecção. Algumas moléculas reguladoras da proliferação de tipos celulares – como o fator de crescimento para fibroblastos (FGF) e o fator de transformação do crescimento β (TGF- β) – também atuam interagindo com os carboidratos dos proteoglicanos. Essas informações permitem que os glicocientistas desenvolvam moléculas com o objetivo de regular esses processos biológicos. Além da importância biológica dos carboidratos, esses compostos são matérias-primas para indústrias importantes, como as de madeira, papel, fibras têxteis, produtos farmacêuticos e alimentícios. A celulose é o principal carboidrato industrial, com um consumo mundial estimado em quase 1 bilhão de toneladas por ano. Alguns polissacarídeos, como ágar, pectinas e carragenanas, extraídos de algas marinhas, são utilizados – graças a suas propriedades gelatinosas – em cosméticos, remédios e alimentos. A carragenana é empregada para revestir cápsulas (drágeas) de medicamentos, para que o fármaco seja liberado apenas no intestino, aumentando a sua absorção. O ágar serve ainda para a cultura de microorganismos, em laboratórios. Tanto o ágar como a carragenana são também usados, como espessantes, na produção de sorvetes. A sacarose (extraída da cana-de-açúcar) é o principal adoçante empregado na culinária e na indústria de doces. O açúcar ‘invertido’ (obtido pela ‘quebra’ da sacarose, que resulta em uma mistura de glicose e frutose) é menos 39 cristalizável, mas muito usado na fabricação de balas e biscoitos. A quitosana, um polissacarídeo
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