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Caderno de Geografia Belo Hor izonte V.16 - Nº.26 - 2007 PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS Grão-Chanceler: Dom Walmor Oliveira de Azevedo Reitor: Eustáquio Afonso Araújo Vice-Reitor: Dom Joaquim Giovani Mol Guimarães Chefe de gabinete do Reitor: Osvaldo Rocha Tôrres Pró-reitores: Extensão - Wanderley Chieppe Felippe; Gestão Financeira - Paulo Sérgio Gontijo do Carmo; Graduação - Maria Inês Martins; Infra-estru- tura - Rômulo Albertini Rigueira; Logística - Sérgio de Morais Hanriot; Pesquisa e de Pós-graduação - João Francisco de Abreu; Planejamento e Desenvolvimento Institucional - Carlos Francisco Gomes; Recursos Humanos - Alexandre Rezende Guimarães; Arcos - Marcelo Leite Metzker; Betim - Miguel Alonso de Gouvea Valle; Contagem - Geraldo Márcio Alves Guimarães; Poços de Caldas - Maria José Viana Marinho de Mattos; São Gabriel - Carlos Barreto Ribas. Diretores: Barreiro - Patrícia Bernardes; Serro e Guanhães - Ronaldo Rajão Santiago. Secretaria de Comunicação: Maurício Lara Camargos Secretaria de Ação Comunitária: José Chequer Neto EDITORA PUC MINAS Comissão editorial: Ângela Vaz Leão (PUC Minas); Graça Paulino (UFMG); José Newton Garcia de Araújo (PUC Minas); Maria Zilda Cury (UFMG); Oswaldo Bueno Amorim Filho (PUC Minas) Conselho editorial: Antônio Cota Marçal (PUC Minas); Benjamin Abdalla (USP); Carlos Reis (Univ. de Coimbra); Dídima Olave Farias (Univ. del Bío- Bío - Chile); Evando Mirra de Paula e Silva (UFMG); Gonçalo Byrne (Lisboa); José Salomão Amorim (UnB); José Viriato Coelho Vargas (UFPR); Kabengele Munanga (USP); Lélia Parreira Duarte (PUC Minas); Leonardo Barci Castriota (UFMG); Maria Lúcia Lepecki (Univ. de Lisboa); Philippe Remy Bernard Devloo (Unicamp); Regina Leite Garcia (UFF); Rita Chaves (USP); Sylvio Bandeira de Mello (UFBA). Coordenação editorial: Cláudia Teles de Menezes Teixeira Assistente editorial: Maria Cristina Araújo Rabelo Revisão: Astrid Masetti Lobo Costa Caderno de Geografia Belo Hor izonte V.16 - Nº.26 - 2007 Coordenador do Curso de Geografia Alecir Antônio Maciel Moreira Comissão Editorial Jony Rodarte Gontijo Couto José Irineu Rangel Rigotti Oswaldo Bueno Amorim Filho Conselho Editorial Alexandre Magno Alves Diniz (PUC Minas) Antônio Pereira Magalhães Júnior (UFMG) Aurélio Muzzarelli (Universidade de Bolonha) Bernardo Machado Gontijo (UFMG) Herbe Xavier (PUC Minas) João Alberto Pratini de Moraes (PUC Minas) João Francisco de Abreu (PUC Minas) José Alexandre Filizzola Diniz (UFS) José Carlos Teixeira (Universidade de Toronto - Canadá) Leônidas Conceição Barroso (PUC Minas) Lívia de Oliveira (Unesp - Rio Claro) Lúcia Helena de Oliveira Gerardi (Unesp - Rio Claro) Lucy Marion C. P. H. Machado (Unesp - Rio Claro) Maurício de Almeida Abreu (UFRJ) Sylvio Carlos Bandeira de MeIo e Silva (Unifacs - Bahia) FICHA CATALOGRÁFICA Elaborada pela Biblioteca da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais C122 Caderno de Geografia. - v.1, n.1 (2007). - Belo Horizonte: Ed. PUC Minas, 2007. v. ISSN 0103-8427 Semestrall 1. Geografia - Periódicos. I. Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Departamento de Geografia. CDU: 91(05) Editorial CONFERÊNCIA História social da metrópole: a configuração espacial desigual do sanea- mento básico Catia Antonia da Silva ARTIGOS A pluralidade da Geografia e a necessidade das abordagens culturais Oswaldo Bueno Amorim Filho Os atributos do geógrafo e a paisagem geográfica de Rio Manso-MG Alexandre Magno Alves Diniz Carlos Magno Ribeiro Bruno Durão Rodrigues Crise ambiental: refletindo sobre o pensar e o agir humano no mundo atual Antonio Pereira Magalhães Jr. Geografia e as relações internacionais Danny Zahreddine Rodrigo Corrêa Teixeira Análise da cobertura pedológica em áreas de cerrado e de eucalipto no Parque Florestal do Gafanhoto - Divinópolis/ MG Leonardo Cristian Rocha Wanderson Lopes Lamounier NOTAS O uso de técnicas elementares de estatística espacial no estudo da reestruturação espacial da criminalidade violenta no Estado de Minas Gerais: 1996-2003 Wagner Barbosa Batella Alexandre M. A. Diniz "Adeus Lênin": imagens de um novo socialismo Mariana Guedes Raggi Impacto ambiental em parques urbanos - o Parque Municipal Ursulina de Andrade Mello Carolina Santos Gessner Rodrigo Medeiros de Castro Thiago Guedes de Oliveira Jony Rodarte Gontijo Couto SUMÁR IO 11 30 50 62 78 88 120 160 190 Caderno de Geografia Belo Hor izonte V.16 - Nº.26 - 2007 ntre as comemorações dos 60 anos do curso de graduação em Geografia - licenciatura e bacharelado, e dos dez anos do Programa de Pós-Graduação em Geografia: Tratamento da Informação Espacial (mestrado e doutorado) da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, realizou-se, em maio de 2006, o IV Seminário Cláudio Peres de Prática de Ensino e Geografia Aplicada. Esse semi- nário ganha projeção a cada ano e contribui efetivamente para a dis- cussão de temas relevantes no âmbito da geografia que se faz no Brasil. A temática central do evento foi "Geografia - Ciência Plural: os múltiplos olhares da geografia". A palestra inaugural, que tratou da geografia tradi- cional, foi seguida de mesas cujos temas giraram em torno da prática de ensino, pluralidade cultural, meio ambiente, inclusão/exclusão social, política internacional, planejamento urbano e regional e geoprocessa- mento. O evento encerrou-se com uma discussão sobre o caráter plural da geografia. Nesta edição, os Cadernos de Geografia inauguram uma nova fase, adi- cionando à sua versão impressa um CD com resultados dos trabalhos apresentados em painéis no IV Seminário Cláudio Peres. Profª Jony Rodarte Gontijo Couto Editora E D I T O R I A L E Caderno de Geografia Belo Hor izonte V.16 - Nº.26 - 2007 C O N F E R Ê N C I A H i s t ó r i a s o c i a l d a m e t r ó p o l e : a c o n f i g u r a ç ã o e s p a c i a l d e s i g u a l d o s a n e a m e n t o b á s i c o Cat ia Anton ia da Si lva* Resumo A problemát ica da exc lusão soc ia l re f le te-se amplamente no Bras i l , que reconhece sua complex idade e a d i f icu ldade de supe rá - l a . Com a modern i zação exc luden te e as des iguais formas de acesso à in f ra-est ru tura urbana nos espaços me t ropo l i tanos b ras i l e i r os , a d imensão de exc lusão soc ia l e o t ra to da natureza foram abandonados nos pro je tos de invest imento em saneamento bás ico no país . Este ar t igo busca apresentar a conf iguração da in f ra- est ru tura do abastec imento de água e do esgotamento san i tá r io , ana l i sando, compara t ivamente , os ideár ios e p ro je tos que impuse ram um mode lo des igua l de saneamento nas metrópoles h is tor icamente const ru ídas no país , como São Paulo, Rio de Janei ro , Belo Hor izonte e Brasí l ia . Palavras-chave : Modern ização; Metrópole ; Saneamento; His tór ia urbana; Exc lusão soc ia l . A problemát ica e o debate sobre a h is tór ia soc ia l do ter r i tór io são recentes como campo ref lex ivo na anál ise in terd isc ip l inar. Na verdade, a proposta para compreender a re lação ent re h is tór ia soc ia l e ter r i tór io requer um d iá logo metodológ ico ent re h is tór ia , geograf ia e c iênc ias soc ia is . Se a geograf ia e as c iênc ias soc ia is remetem a anál ise compreensiva da exc lusão soc ia l ao presente, a h is tór ia das soc iedades, por sua vez, remete a compreensão dessa exc lusão aos processos pretér i tos . O d iá logo metodológ ico da h is tór ia soc ia l do ter r i tór io impõe sobretudo uma ref lexão sobre o fenômeno, remetendo ao passado que demarca o presente e o fu turo, numa forma mais t rad ic ional de expl icação. Mas também é possíve l uma or ientação metodológ ica que aponte o presente como ponto de par t ida da re f lexão, para ident i f icar e los cons t ru ídos no passado , que , apesa r de toda c rença na Caderno de Geograf ia -Belo Horizonte - V.16 - Nº .26 - 2007 11 * Professora do Departamento de Geografia da Faculdade de Formação de Professores – FFP-Uerj e do Programa de Pós-Graduação em História Social – área de concentração História Social do Território – FFP-Uerj. Coordenadora do Laboratório de Estudos Metropolitanos do Grupo de Pesquisa Território e Mudanças Contemporâneas na Produção do Espaço. superação e na t ransformação de va lores e ações, pers is tem e se mantêm no presente com roupagens modernas. Esse é o pr incíp io aqui proposto para a anál ise da h is tór ia soc ia l da metrópole. Para ta l , invest iga-se uma das formas urbanas marcantes de exc lusão soc ia l no Bras i l : o saneamento bás ico, par t indo-se do fazer geográf ico e buscando-se compreender a conf iguração espacia l do saneamento nas reg iões metropol i tanas de São Paulo, Rio de Janei ro , Belo Hor izonte e a Região In tegrada de Desenvo lv imento do Dis t r i to Federa l (Ride de Brasí l ia) . O abastec imento de água e o esgotamento sani tár io são anal isados a par t i r de dados cont idos no Atlas das Regiões Metropol i tanas e Rides brasi le iras , v. 2 (SILVA, 2006) , ident i f icando-se a re lação dessa conf iguração com a exc lusão soc ia l . Na ú l t ima seção, apresentam-se os processos pretér i tos que contr ibuí ram na conformação dessa espacia l idade do saneamento na metrópole f luminense. Conf iguração espac ia l do saneamento bás ico em contextos metropol i tanos Ao se t ra ta r de saneamento , ident i f i cam-se do is s is temas fundamenta is : o abastec imento de água e as insta lações sani tár ias, cu ja conf iguração espacia l nas metrópoles do Rio de Janei ro , São Paulo, Belo Hor izonte e Brasí l ia é ob je to deste estudo. A problemát ica do saneamento é uma referênc ia impor tante para pensar a exc lusão soc ia l no Bras i l . O modelo dominante de insta lação de rede gera l de água, a par t i r dos manancia is a té os postos de t ra tamento e depois a sua d is t r ibu ição, bem como o modelo de t ra tamento do esgoto predominante nas metrópoles têm or igem nos anos 1940-1960, conforme veremos. O padrão de fo rnec imento de água no Bras i l é compos to , segundo o IBGE, de rede gera l de água, poço ar tes iano e out ras formas, como o uso de b ica co le t iva, o uso i legal da rede gera l ou de água de v iz inho. Esse padrão, apresentado em documento do IBGE de 1/1/2001, re ferente ao Censo Demográf ico de 2000, demonstra o grau de des igualdade nas c lasses de ind icadores. Ao se estudar os contextos metropol i tanos, tem-se uma idé ia da segregação no acesso à r iqueza. Caderno de Geograf ia - Belo Horizonte - V.16 - Nº .26 - 200712 Histór ia soc ia l da metrópole: a conf iguração espacia l des igual do saneamento bás ico Em ge ra l , as me t rópo les são de ten to ras de modern i zação tecnológ ica e soc ia l . Sobretudo o Rio de Janei ro , São Paulo e Belo Hor i zon te , me t rópo les p r imazes , h i s to r i camen te p ropu l so ras da indust r ia l ização e dos pro je tos de modern ização (SINGER, 1993; SOUZA, 1993, 1994, 2003; IANNI, 1999) . A grande c idade tem s ido e cont inua a ser cada vez mais uma síntese excepcional da soc iedade. Mui to do que é a soc iedade, se ja esta nac ional ou mund ia l , desenvo l ve -se e decan ta -se na grande c idade. Aí desenvolvem-se re lações, os processos e est ru turas que const i tuem as formas de soc iab i l idade. Mui to do que se imagina nos mais d i ferentes c í rcu los soc ia is , em âmbi to micro e macro, a í ressoa. São mui tas as d ivers idades e as des igualdades, tanto quanto os impasses e os hor izontes da soc iedade que se expressam na c idade. Tanto ass im que a grande c idade tem sido o lugar por excelênc ia da modern idade e da pós-modern idade. ( IANNI, 1999, p . 15) De acordo com Ianni (1999) , Santos (1993) e Ribe i ro (1994, 1996, 1998) , os espaços metropol i tanos são os mais express ivos no que tange à implementação de pro je tos de modern ização a lavancados pelos governos. São, ao mesmo tempo, os lugares de mutação da modern ização, requerendo a rac ional ização do saber e a l terações na es t ru tu ra p rodu t i va , na qua l i f i cação e sens ib i l i dade dos t rabalhadores, nos procedimentos técn icos, no fazer cot id iano, no consumo, c r i ando novas soc iab i l i dades . Tra ta -se , po r tan to , de mutações em s is temas técn icos e de ações, entendidos como uma tota l idade ind issoc iáve l (SANTOS, 1996) . As fo rmas e os p rocessos de exc lusão soc ia l podem se r anal isados a par t i r da conf iguração espacia l presente, que expressa o passado e or ienta o fu turo (SANTOS; SILVEIRA, 2001) . Ass im , a p rob lemá t i ca da v ida co le t i va e das fo rmas de reprodução das c lasses populares em contextos metropol i tanos deve ser compreendida em sua complex idade. No caso do saneamento básico, que tem recebido pouco invest imento nas ú l t imas décadas, o padrão estabelec ido na era Vargas estendeu-se aos governos de JK e dos mi l i ta res (SINGER, 1993) , apresentando pouca a l teração no presente. Caderno de Geograf ia - Belo Horizonte - V.16 - Nº .26 - 2007 13 Cat ia Antonia da S i lva A insta lação do saneamento bás ico re lac iona-se aos pro je tos de implementação da indust r ia l ização. Nos anos 1930-1960, a in f ra- est ru tura é implantada com v is tas a consol idar a indust r ia l ização e a urbanização, condição para a pr imei ra (SILVA, 2002) . De acordo com os mapas 1, 2 e 3 e a TAB. 1 , os domicí l ios res idenc ia is são mais dotados de in f ra-est ru tura nos munic íp ios- núc leo das metrópoles do Rio de Janei ro , São Paulo, Minas Gera is e na Ride de Brasí l ia , cu ja conf iguração espacia l do saneamento bás ico é apresentada a segui r. Abastecimento de água e formas de exclusão A cidade do Rio de Janei ro , segunda mais populosa do Bras i l , depo i s de São Pau lo , é também a ma is popu losa da reg ião metropol i tana, depois de Nova Iguaçu, Ni lópol is e São Gonçalo. Dos cerca de 1.802.347 domicí l ios ex is tentes na c idade em 2000, um grande percentua l é l igado à rede gera l de água. Outros munic íp ios, como Ni teró i , apresentam percentua l re levante de rede gera l . São Gonçalo, Ni lópol is e Duque de Caxias também aparecem no mapa com proporção e levada de domicí l ios abastec idos de água l igada à rede gera l , mas, ao se anal isar mais deta lhadamente os dados e observar, na escala loca l , como essa in formação fo i co lh ida para o censo 2000,1 percebe-se que boa par te desse acesso é i lega l . Em São Gonçalo, cerca de 70% dos domicí l ios não têm acesso legal à rede gera l de água da Cedae, embora se ja munic íp io mediador ent re as redes de co le ta conectadas aos mananc ia is fornecedores do mun ic íp io de Cachoe i ras de Macacu . A in f ra -es t ru tu ra de abastec imento sa i desses manancia is , passa por São Gonçalo e chega a Ni teró i , onde boa par te dos domicí l ios tem acesso à rede gera l de água. Em São Gonçalo, que não possui s is tema in t ra-urbano de red is t r ibu ição, somente poucos domicí l ios res idenc ia is no entorno da rede têm acesso legal , a maior ia u t i l i za i lega lmente a água. Afastando-se da c idade do Rio de Janei ro , nota-se a presença de munic íp ios com dominância de poços ar tes ianos e mesmo, nas áreas mais carentes, domicí l ios que ut i l izam água de b icas co le t ivas e/ou de v iz inhos (Mapa 1) . Mar icá, Mage, Guapimir im, I taboraí e Tanguá foram urbanizados somente nos anos 80-90, a t ravés do Caderno de Geograf ia - Belo Horizonte - V.16 - Nº .26 - 200714 Histór ia soc ia l da metrópole: aconf iguração espacia l des igual do saneamento bás ico pa rce lamen to de á reas ru ra i s e l o teamen tos popu la res , que poss ib i l i taram a mobi l idade da população mais pobre. Mapa 1 O mapa 2, re ferente à metrópole de São Paulo, apresenta conf iguração espacia l semelhante à do Rio de Janei ro . A rede gera l de água é dominante no munic íp io-núc leo e nas ad jacênc ias, e , quanto mais d is tante do núc leo, mais acentuada é a presença de domicí l ios que ut i l izam poços ar tes ianos e out ras formas precár ias de acesso a esse recurso. São Pau lo , coração da met rópo le mais impor tante da Amér ica Lat ina, com cerca de 3.000.000 domicí l ios , em 2000, tem predominância de acesso à rede gera l de água, havendo também as redes i legais conectadas à rede gera l . Em munic íp ios mui to per i fér icos, como Mair iporã, Santa Isabel , Guararema, B i r i t iba- Mir im, Salesopól is e Bambu-Guaçu, é express iva a proporção de domicí l ios que ut i l izam poços, r ios ou nascentes. Caderno de Geograf ia - Belo Horizonte - V.16 - Nº .26 - 2007 15 Cat ia Antonia da S i lva Mapa 2 O mesmo processo des igual de dotação de in f ra-est ru tura de água ocorre na reg ião e co lar metropol i tano de Belo Hor izonte e na Ride do Dis t r i to Federa l . Be lo Ho r i zon te , t e r ce i ra c i dade ma is popu losa do B ras i l , concentra domicí l ios l igados à rede gera l de água, mas, quanto mais d is tantes da c idade-núc leo, os munic íp ios ut i l i zam poços ar tes ianos ou nascentes ou têm acesso mais precár io ao recurso h ídr ico , conforme Mapa 3. Ent re os munic íp ios em que predominam domicí l ios com rede gera l de abastec imento de água estão Belo Hor izonte, Bet im, Contagem, Lagoa Santa, Nova L ima e Pedro Leopoldo, que fazem pa r te da reg ião me t ropo l i tana e t i ve ram inves t imen tos his tór icos de expansão da rede de abastec imento de água, l igados aos processos de indust r ia l ização e urbanização pós-anos 60. I taúna, por sua vez, faz par te do co lar metropol i tano, área de expansão da metrópole com notáveis invest imentos em in f ra-est ru tura. Caderno de Geograf ia - Belo Horizonte - V.16 - Nº .26 - 200716 Histór ia soc ia l da metrópole: a conf iguração espacia l des igual do saneamento bás ico Dentre os munic íp ios com presença impor tante de domicí l ios que ut i l izam poços ou nascentes sem nenhuma forma de t ra tamento, destacam-se Bonf im, Jabot icatubas, Moeda, Joaquim das Bicas e Taqua raçu de M inas . São domic í l i os pe r i f é r i cos da reg ião metropol i tana, e mui tos do co lar metropol i tano. Isso mostra que a rede de saneamento não acompanha a expansão demográf ica. Par te desses munic íp ios vem de uma conf iguração rura l mui to recente, mas tem d inâmica popu lac iona l i n teg rada às re lações soc ia i s marcadamente urbanas. No espaço de conurbação de Brasí l ia , são v is íve is as formas desiguais de acesso ao abastec imento de água. A Ride do Dis t r i to Federa l , c r iada em 1998 pelo governo federa l , abrange munic íp ios de do is Estados da federação: Minas Gera is e Go iás , a l ém do DF. Po r se r ag lomeração me t ropo l i tana , é cons ide rada , do pon to de v i s ta l ega l , Reg ião In teg rada de Desenvolv imento do Dis t r i to Federa l (SILVA, 2004) . No que se re fere ao abastec imento de água, conforme Mapa 4, predominam domicí l ios l igados à rede gera l de água, f ru to dos invest imentos fe i tos na época da const rução de Brasí l ia . Par te desse acesso é i lega l , como ocorre no Rio de Janei ro . Caderno de Geograf ia - Belo Horizonte - V.16 - Nº .26 - 2007 17 Cat ia Antonia da S i lva Mapa 3 Mapa 4 Nos vár ios munic íp ios de Goiás, destaca-se o uso de poço ou nascente, como em Corumbá de Goiás e Mimoso de Goiás, o que ind i ca a t endênc ia de concen t ração dos i nves t imen tos nos munic íp ios-a lvo de indust r ia l ização e urbanização, processos que v isavam a t ransformar o Bras i l rura l a t rasado num país indust r ia l moderno (SILVA, 2002) . A conf iguração espacia l expressa for temente uma modern ização se le t iva e exc ludente, concentrada espacia lmente, apesar do impor tante papel dos médicos sani tar is tas no t ra tamento da água e na insta lação da rede gera l de água pelas companhias de abastec imento em todo o Bras i l . Em termos in ternac ionais , é a l ta a qual idade da água t ra tada e env iada pe las redes gera is de abastec imento, dados os invest imentos químicos e b ioquímicos, o que demonstra como são grandes as desigualdades soc ia is ent re aqueles que têm acesso legal à rede e aque les que es tão fo ra da rede gera l e que u t i l i zam poços e nascentes em áreas de adensamento urbano, com for te contaminação dos lençóis f reát icos pe lo esgoto. Caderno de Geograf ia - Belo Horizonte - V.16 - Nº .26 - 200718 Histór ia soc ia l da metrópole: a conf iguração espacia l des igual do saneamento bás ico Esgotamento sanitár io e exclusão social : acirramento da vida colet iva Anal isada sob o pr isma do acesso à rede gera l de esgotamento sani tár io , a prob lemát ica da exc lusão soc ia l torna-se mais gr i tante. Os i r r isór ios invest imentos em saneamento bás ico pe los governos estadua is , mun ic ipa is e federa is são, mui tas vezes, fe i tos para sa t i s faze r ma is aos i n te resses empresa r i a i s de esca la g loba l (SOUZA, 2003) do que os soc ia is . A lém d isso, uma verdadei ra implementação e consol idação da expansão do saneamen to p ressupõem g randes i nves t imen tos cont ínuos. Ass im, os dados do Censo Demográf ico do IBGE de 2000 não estão superados. Para o IBGE, o acesso à insta lação sani tár ia se faz de t rês formas: 1 . rede gera l de esgoto, que capta esgoto or iundo de domicí l ios permanentes; 2 . domicí l ios com banhei ro , mas fora da rede gera l , o que pode ind icar a ex is tênc ia de fossas assépt icas, sumidouros ou não, jogando-se o esgoto nos r ios ou nas encostas; 3 . domic í l ios sem banhe i ros ou san i tá r ios , o que s ign i f i ca que os resíduos orgânicos só l idos e l íqu idos são postos d i re tamente nos r ios ou nas encostas. Sobre a def in ição de rede gera l de esgoto, há do is fa tos: a) na maior ia das vezes, a rede de esgoto é at re lada à ca ixa de esgoto e este à rede f luv ia l , o que s ign i f ica que os det r i tos orgânicos são jogados nos r ios e nos mares sem t ra tamento adequado. Por isso é pro ib ido o banho nas pra ias do Rio de Janei ro após for tes chuvas, dev ido ao grande apor te de esgoto no mar. b) No momento da co le ta de dados, o recenseador é or ientado a o lhar se a rua é asfa l tada e a reg is t rar a ex is tênc ia dos domicí l ios l igados à rede gera l de esgoto. O o lhar do pesquisador na logís t ica da rua é, ass im, o que def ine a rede gera l da insta lação sani tár ia no Bras i l . A lém d isso, a rede gera l sani tár ia está mui tas vezes l igada d i re tamente à rede p luv ia l , por sua vez conectada ao r io ou/e mar, o que s ign i f ica apor te de esgoto chegando ao mar com t ra tamento pouco adequado. A fa l ta de rede gera l de esgoto e/ou a fa l ta de conexão com os domicí l ios comprometem o meio ambiente urbano, os r ios , os mares, oceanos e lençóis f reát icos, causando a propagação de doenças. O esgo tamen to não teve p ro je tos de de fesa do me io amb ien te , d i ferentemente do t ra tamento da água, que teve pro je tos impor tantes Caderno de Geograf ia - Belo Horizonte - V.16 - Nº .26 - 2007 19 Cat ia Antonia da S i lva propostos por sani tar is tas, desde o in íc iodo século XIX. A lém d isso, t ra ta-se de um modelo implementado anter iormente ao debate po l í t ico susc i tado pe los movimentos soc ia is de defesa da natureza. Ao observarmos a conf iguração espacia l do esgotamento nas metrópoles em anál ise, é notável a semelhança ent re os seus padrões de segregação soc ioespacia l . Na Ride de Brasí l ia (Mapa 5) , é mui to d iscrepante a des igualdade de acesso à rede de esgoto. Somente Brasí l ia e Unaí têm domicí l ios com predomín io na rede gera l . A grande maior ia es tá fora dessa rede, o que s ign i f ica ter fossa assépt ica ou não (os dados do IBGE não esc larecem), podendo os resíduos serem jogados nos r ios e nas encostas. No entanto, maior é a des igualdade quando se ver i f ica que há munic íp ios com domicí l ios sem banhei ros ou sani tár ios, como Pi renopól is , Cocalz inho de Goiás, Mimoso de Goiás e Vi la Boa. Mapa 5 Na reg ião metropol i tana e co lar metropol i tano de Belo Hor izonte, é v is íve l o acesso des igual às insta lações sani tár ias. Dos 628.447 domicí l ios ex is tentes em Belo Hor izonte em 2000, grande par te tem acesso à rede gera l de esgoto sani tár io , ass im como Bet im, Sete Lagoas, Santa Luz ia , Sabará, Nova L ima e I taúna, munic íp ios que também se destacaram pela presença de res idênc ias na rede gera l de água (Mapa 6) . Caderno de Geograf ia - Belo Horizonte - V.16 - Nº .26 - 200720 Histór ia soc ia l da metrópole: a conf iguração espacia l des igual do saneamento bás ico Mapa 6 No entanto, nos munic íp ios mais per i fér icos da reg ião e do co lar metropol i tanos é express ivo o número de domicí l ios fora da rede gera l de esgoto e sem banhei ro (Bet im, Bald im, Ribe i rão das Neves, Sabará, Santa Luz ia , Contagem, Esmera ldas, dent re out ros) . São, em gera l , munic íp ios poucos populosos, com centenas de domicí l ios e onde se destacam paisagens rura is , mas cu ja população exper imenta a v ida metropol i tana no acesso ao t rabalho urbano e no uso de equipamentos e serv iços de out ros munic íp ios da reg ião, como São José da Varg inha, Vespasiano, Ib i r i té , For tuna de Minas e Funi lândia. O padrão des igual de acesso ao esgotamento sani tár io repete-se nas metrópoles em que o país mais investe: São Paulo e Rio de Janei ro (Mapas 7 e 8) . Caderno de Geograf ia - Belo Horizonte - V.16 - Nº .26 - 2007 21 Cat ia Antonia da S i lva Mapa 7 Mapa 8 Caderno de Geograf ia - Belo Horizonte - V.16 - Nº .26 - 200722 Histór ia soc ia l da metrópole: a conf iguração espacia l des igual do saneamento bás ico Assim como Belo Hor izonte e Brasí l ia , essas duas capi ta is recebe ram h i s to r i camen te recu rsos púb l i cos e p r i vados pa ra consol idar o padrão de indust r ia l ização bras i le i ro . O saneamento básico aparece nos munic íp ios-núc leo das metrópoles de São Paulo e Rio de Janei ro , destacando-se o acentuado processo de insta lação sani tár ia em Ni teró i , cap i ta l f luminense (RJ) a té in íc io dos anos 1970, São Paulo capi ta l e ABCD paul is ta (munic íp ios de Santo André, São Berna rdo , São Cae tano e D iadema) , á reas h i s tó r i cas de desenvolv imento indust r ia l e estata l . Nas áreas mais per i fér icas das duas metrópoles, destaca-se o padrão de domicí l ios com banhei ro , mas fora da rede gera l . Quanto mais d is tante da c idade-núc leo, maior é a proporção destes. Em todas as metrópoles em estudo ex is tem res idênc ias com banhei ro fora da rede gera l e sem banhei ros, sobretudo nas fave las loca l i zadas em luga res h i s tó r i cos poucos a t ra t i vos ao cap i ta l imobi l iár io – encostas e be i ras de r ios . É at ravés da geograf ia que se pode mapear a exc lusão soc ia l e a compreende r as f o rmas des igua i s de i nves t imen to pa ra a modern ização b ras i l e i ra . O t ra tamento ana l í t i co do saneamento bás i co em con tex tos me t ropo l i tanos é f undamen ta l pa ra a ident i f icação de r iscos de enchente, desmoronamento e des l izamento de encostas, bem como de pro l i feração de doenças decorrentes do modelo des igual de insta lação sani tár ia no país . Esses prob lemas não podem ser t ra tados setor ia lmente ou pe lo d iscurso de que a cu lpa é do morador. Na verdade, o saneamento bás ico é prob lemát ica complexa e densa do ponto de v is ta dos invest imentos e das po l í t icas públ icas, dev ido à sua inv is ib i l idade d iante do poder públ ico. Na busca da compreensão metodológ ica da h is tór ia soc ia l da met rópo le , pa r t i u -se do levan tamento da con f igu ração espac ia l , t rad ic iona lmente obt ida na geogra f ia pe la aná l ise das fo rmas e est ru turas urbanas (SANTOS, 1993, 1986, 1998, 1984) . Mi l ton Santos (2001, p . 21) f r i sa que p rocessos de recons t rução para le la da soc iedade e do ter r i tór io podem ser entendidos a par t i r da categor ia de formação soc ioespacia l , ou se ja , do espaço como ter r i tór io usado, onde se expressam os usos co le t ivos e os conf l i tos . Caderno de Geograf ia - Belo Horizonte - V.16 - Nº .26 - 2007 23 Cat ia Antonia da S i lva O uso do te r r i t ó r i o pode se r de f i n i do pe la imp lan tação de i n f ra -es t ru tu ra , pa ra a qua l estamos ut i l izando a denominação de s is temas de engenhar ia , mas também pelo d inamismo da economia e da soc iedade. São os movimentos da popu lação , a d i s t r i bu i ção da ag r i cu l t u ra , da indúst r ia e dos serv iços, o arcabouço normat ivo, inc lu ídas a leg is lação c iv i l , f isca l e f inancei ras, que juntamente com o a lcance e a extensão da c idadan ia , con f i gu ram as funções do novo espaço geográf ico. (SANTOS; SILVEIRA, 2001, p. 21) A busca me todo lóg i ca do i ns t rumen to t empora l pa ra a ident i f icação da h is tór ia soc ia l da metrópole impl ica a anál ise de p rocessos soc ia i s como p ro je tos em con f l i t o , p ro je tos que se tornaram ações dominantes, a re lação dos Estados, economia e soc iedade com p ro je tos nac iona i s e i deá r i os i n te rnac iona i s . A per iod ização do ter r i tór io torna-se inst rumento fundamenta l para a compreensão da gênese do quadro atua l de exc lusão soc ia l no Bras i l , como ens inam Santos e Si lve i ra : A busca de uma pe r i od i zação do te r r i t ó r i o bras i le i ro é um par t ido essencia l para um pro je to ambic ioso: fazer fa lar a nação pelo ter r i tór io . Ass im, como a economia fo i cons iderada como a fa la pr iv i leg iada da nação por Celso Fur tado, o povo por Darcy Ribe i ro e a cu l tura por F lorestan Fernandes, pretendemos cons iderar o ter r i tór io como a fa la pr iv i leg iada da nação. (SANTOS; SILVEIRA, 2001, p . 27) Essa é uma est ra tég ia para a const rução anal í t ica da or igem da exc lusão soc ia l . Apesar da modern ização bras i le i ra , as des igualdades soc ioespac ia i s acen tuam-se cada vez ma is nos con tex tos metropol i tanos (FIX, 2001; RIBEIRO, 1996; RIBEIRO; SILVA; VIEIRA, 1998) . Pode-se propor a saída in termetropol i tana, na escala nac ional , para a compreensão do Rio de Janei ro na escala in t rametropol i tana, apesar de a metropol ização e urbanização bras i le i ras fornecerem processos semelhantes à conformação gera l das metrópoles. As me t rópo les b ras i l e i r as possuem seme lhanças espac ia i s e Caderno de Geograf ia - Belo Horizonte - V.16 - Nº .26 - 200724 Histór ia soc ia l da metrópole: a conf iguração espacia l des igual do saneamento bás ico compar t i l ham tendênc ias ge ra i s , h i s tó r i cas e p resen tes , o que permi te o exerc íc iodo método comparat ivo. Ao mesmo tempo, cada metrópole tem suas par t icu lar idades loca is , f ru to das re lações ent re poderes de escalas nac ionais , g lobais e loca is . Grande par te das ações formadoras da ag lomeração urbana tem or igem nos pro je tos nac ionais , in terag indo com in teresses e questões do âmbi to estadual , in t rametropol i tano e também loca l . His tór ia soc ia l da met rópo le : uma propos ição metodológica para compreender o contexto do Rio de Janeiro A relação ent re espaço e Estado pode ser ava l iada por meio das ações gove rnamen ta i s , do u rban ismo e das ob ras que se pro je tam para o fu turo (SILVA, 2002; MARRAMAO, 1997) . Diversos agen tes conso l i da ram esses p rocessos : cap i ta l imob i l i á r i o , mobi l idade urbana, capi ta l comerc ia l e indust r ia l , que condic ionam a urbanização, espra iando o fenômeno urbano para a lém dos l imi tes munic ipa is e dando forma à metropol ização. Lefebvre (2004) , Santos (1993) e Soja (1993) , dent re out ros autores impor tantes para a geograf ia , estudaram o papel do Estado na produção f ís ica, soc ia l e s imbó l i ca do espaço , v i ab i l i zando p rocessos fu tu ros . Ob ras governamenta is e in f ra-est ru tura bás ica de saneamento implantada po r gove rnos es tadua i s e f ede ra i s pe rm i t i r am a expansão metropol i tana do Rio de Janei ro , conformando a conurbação ent re os munic íp ios que ho je formam essa metrópole. É necessár io ident i f icar, pe la anál ise do espaço, processos e ações passados que de te rm ina ram ações fu tu ras . Tra ta -se de invest igar a ação do Estado na formação da metrópole e, ao mesmo tempo, reconhecer essas ações como prát icas de co lon ização do futuro, entendidas por Marramao (1997) como secular ização, que s ign i f ica pro je tar, produz i r o fu turo e dar sent ido de t ranscendência à ação (SILVA, 2002) . Ass im, do ponto de v is ta metodológ ico, busca-se na le i tura do espaço ident i f icar as ações que de fa to a l teram o fu turo e as que intenc ionam a secular ização, v isando a cont r ibu i r para o debate Caderno de Geograf ia - Belo Horizonte - V.16 - Nº .26 - 2007 25 Cat ia Antonia da S i lva epis temológico no campo da geograf ia e da h is tór ia ao pensar as ações do Estado sobre o ter r i tór io , seus sent idos de imanência e de t ranscendência. O Estado na const rução h is tór ico - te r r i to r ia l da metrópole do Rio de Janeiro Durante o século XX, o Estado do Rio de Janei ro fo i um espaço pr iv i leg iado na mater ia l ização de grandes pro je tos governamenta is . A ampl iação do por to do Rio e a aber tura da Avenida Centra l na re forma urbana de Pere i ra Passos, à época da Repúbl ica Velha, fo i um grande conjunto de obras que ocorreu somente na c idade do Rio (Dis t r i to Federa l ) , tendo como objet ivo inser i r o Bras i l numa nova d iv isão internac ional do t rabalho. No per íodo do Estado Novo, fo i implantado o “Pro je to do Bras i l urbano- indust r ia l ” e , na d i tadura mi l i tar, o “Pro je to do Bras i l Potênc ia” ( indust r ia l , bé l ica e autônoma). Invest imentos federa is permi t i ram a ins ta lação de g randes es t ru tu ras pa ra se rv i r de a l i ce rce ao desenvolv imento do país in te i ro e não somente do Estado de Rio de Janei ro . Governo Vargas na construção da metrópole: o projeto pol í t ico e ideológico do Brasi l urbano- industr ia l O gove rno Va rgas ca rac te r i zou -se pe lo desenvo l v imen to indust r ia l , nac iona l ismo, d i r ig ismo es ta ta l e aprox imação com o capi ta l est rangei ro . Concebia o desenvolv imento como resul tante da ar t icu lação de um t r ipé: empresa públ ica, empresa pr ivada nac ional e cap i ta l i n te rnac iona l . Ass im , apos tando na subs t i t u i ção de impor tações, Vargas consol ida o pro je to do Bras i l urbano- indust r ia l , compar t i lhado com setores da e l i te bras i le i ra . A indust r ia l ização assume um papel cent ra l na organização econômica do país e se concentra ter r i tor ia lmente nos Estados de São Pau lo , R io de Jane i ro e M inas Gera is . É nesse con tex to h is tór ico-po l í t ico que se forma a metrópole do Rio de Janei ro , a par t i r dos anos 40, mediante apoio às prefe i turas na implementação de saneamento bás ico, cr iação de est radas de rodagem e do parque indust r ia l . Caderno de Geograf ia - Belo Horizonte - V.16 - Nº .26 - 200726 Histór ia soc ia l da metrópole: a conf iguração espacia l des igual do saneamento bás ico No pr imei ro momento da formação da metrópole f luminense, concebeu-se a base urbana de sustentação do pro je to , um tec ido urbano- indust r ia l que fosse a lém da c idade cent ra l /cap i ta l e pudesse abr igar a mão-de-obra operár ia . Foram fe i tas obras de saneamento na Baixada, est radas de rodagem e de fer ro . Incent ivos foram dados aos grandes lo teamentos populares, à tar i fa ún ica dos t rens e às indús t r ias . Expand iu -se o tec ido u rbano na Ba ixada e em São Gonçalo.2 A preocupação com a in f ra-est ru tura sani tár ia assoc iava- se aos i n te resses de imp lemen tação e conso l i dação da indust r ia l ização e à implantação de res idênc ias para as c lasses médias e a l tas. Do ponto de v is ta da cr iação do parque indust r ia l bras i le i ro , a metrópole do Rio de Janei ro ter ia papel est ra tég ico. Próx ima de São Paulo e de Minas Gera is , e possuindo indúst r ias que remontam ao século XIX, ter ia o papel de est ru turar o parque da indúst r ia de base com a CSN (em Vol ta Redonda) , Pet robras (em Duque de Caxias) e Álca l is (em Arra ia l do Cabo, então d is t r i to de Cabo Fr io) . Essas indús t r i as fo ram es t ra teg icamente pos ic ionadas no te r r i t ó r i o do ant igo Estado do Rio e não na c idade do Rio de Janei ro , com a in tenção de promover uma expansão pol í t ico- ter r i tor ia l da c idade em direção ao in ter ior, encampando o ter r i tór io f luminense, tanto para a rea l ização do pro je to de desenvolv imento indust r ia l nac ional , como para fazer f rente po l í t ica aos Estados de Minas Gera is e São Paulo. Essas grandes est ru turas, fundamenta is para cumpr i r os ob je t ivos a e las dest inados, permanecem até ho je em func ionamento.3 Na perspect iva das ações governamenta is estaduais , o governo Chagas Fre i tas, a t ravés da Cedag (cr iada sob o governo Vargas nos anos 40) , recuperou, em 1967, a adutora do Guandu, que operava à meia vazão dev ido ao desabamento no túnel sob pressão Guandu- Lameirão. Para recuperar o t recho avar iado, fo i necessár io const ru i r um by-pass – a l inha de super f íc ie Guandu-Lameirão, com 13 km de extensão e 1,75 m de d iâmetro. A lém d isso, fo i implantada a Nova Elevatór ia do Al to Recalque do Guandu, passando a produção do s is tema Guandu de 12 m³/s para 24 m³/s . E fo i implementado o s is tema de f luoretação de água do Guandu, p ionei ro no Bras i l .4 Caderno de Geograf ia - Belo Horizonte - V.16 - Nº .26 - 2007 27 Cat ia Antonia da S i lva Nova Estação de Tratamento de Água do Guandú - 40 m3/s Fonte: Engenhar ia Emi l io Ibrah im. Memór ias. ht tp : / /www.emi l io ibra im.eng.br /guandu.shtml , 2006 Em 1982, fo i const ru ída uma nova estação de t ra tamento de água do Guandu, com capacidade de 16 m³/segundo. Depois de ma is um con jun to de ob ras , o s i s tema Guandu passou a ope ra r com sua capacidade p lena de adução, is to é , 40 m³ / s . Ho je , essa capac idade es tá em 45m³/s . As seguintes obras completaram o s is tema in tegrado de abastec imento do munic íp iodo R io de Janei ro-Baixada F luminense: mais c inco conjuntos motor-bomba de 2,5 m³/s e 700 HP, idênt icos aos doze já ex is tentes; quar ta adutora de água bruta, em aço, com 2.500 mm de d iâmetro e cerca de 3 .000 m de compr imen to ; r emane jamen to das t rês j á ex is tentes; reca lque de água t ra tada do Guandu com a insta lação de c inco con jun tos motor -bomba de 1m³ /s e 1800 HP cada; reservatór io do Marapicu com capacidade de 20 mi lhões de l i t ros.5 Adutora da Baixada Fluminense Fonte: Engenhar ia Emi l io Ibrah im. Memór ias. ht tp : / /www.emi l io ibra im.eng.br /guandu.shtml , 2006 A adutora da Baixada F luminense, const ru ída nos anos 90, percorre 45 km de tubulações com d iâmetros que var iam ent re 0 ,8 m e 2 m, e uma capacidade para t ranspor tar 518.400 mi lhões l i t ros de água por d ia (6 m³/s) . No seu complexo, foram const ru ídos 103 km de Caderno de Geograf ia - Belo Horizonte - V.16 - Nº .26 - 200728 Histór ia soc ia l da metrópole: a conf iguração espacia l des igual do saneamento bás ico subadutoras e se is reservatór ios com capacidade to ta l de 10.500 mi lhões l i t ros. Também foram const ru ídas a subadutora da Barra da Ti juca, de Urucu ia-Juramento ( reg ião da Leopo ld ina) e d iversas outras subadutoras para re forçar a d is t r ibu ição da água pela c idade do Rio de Janei ro : Jacarepaguá, Ipanema, Leb lon, Copacabana, Centro da c idade e I lha do Governador. Fo i const ru ído o s is tema de abastec imento de água de Teresópol is e rea l izados melhoramentos nos s is temas de São F idé l is , Pádua, São Gonçalo, Ni teró i , I taguaí , Macaé e Bom Jesus de I tabapoana.6 His tor icamente, o debate e a lu ta soc ia l pe la implementação de s is tema de água com qual idade resu l taram em grandes invest imentos no s is tema de abas tec imento de água , em de t r imento da rede sani tár ia , apesar de o pagamento do saneamento bás ico à Cedae englobar o abastec imento de água e o esgoto. Considerações f inais Compreender a exc lusão soc ia l por meio da or ientação metodológ ica da h is tór ia soc ia l do ter r i tór io fo i o ob je t ivo cent ra l deste ensaio. Espaço bana l , d i spu tado po r d i f e ren tes i n te resses e usos , a i den t i f i cação do te r r i t ó r i o me t ropo l i tano to rnou -se chave pa ra conhecer a prob lemát ica da exc lusão soc ia l . As metrópoles são o somatór io de in tenções, pro je tos e redes técn icas h is tor icamente const ru ídas e presentemente d isputadas. Expressam a modern idade cap i ta l is ta e detêm tecno log ias de ponta , abr igando, ao mesmo tempo, os mais pobres. Relac ionar metrópole e saneamento s ign i f ica descobr i r que a insta lação da rede sani tár ia é re ferênc ia técn ica e soc ia l fundamenta l , po is faz par te do un iverso de redes técn icas que qual i f icam o espaço metropol i tano, juntamente com out ras redes de in f ra -es t ru tu ra que ga ran tem o exerc íc io econômico (comerc ia l , indust r ia l ) , po l í t ico (as promessas de acesso à r iqueza) e soc ia l (a f ina l , a v ida co le t iva cr ia e recr ia est ra tég ias de uso do ter r i tór io) . A poss ib i l i dade de supe ração da exc lusão soc ia l p ressupõe a al teração do sent ido de secular ização (co lon ização do fu turo) e a compreensão de processos espac ia is p resentes , a r t i cu lados aos pro je tos e ideár ios de or igens pretér i tas e por tadores de va lores e escolhas que a inda permanecem. Caderno de Geograf ia - Belo Horizonte - V.16 - Nº .26 - 2007 29 Cat ia Antonia da S i lva Abstract The prob lem of soc ia l exc lus ion is w ide ly re f lec ted in Braz i l , and one recognizes the complex i ty o f i ts nature, as wel l as the d i f f icu l ty o f overcoming i t . In understanding the exc lus ion brought about by modern izat ion and the d i f ferent forms of access to urban in f rast ructure in the Braz i l ian met- ropol i tan areas, one rea l izes how far the issues of soc ia l exc lus ion and the t reatment o f nature have been neglected in bas ic sani ta t ion investment pro jects in the country. Th is ar t ic le a ims to present a p ic ture of the conf igurat ion of the water supply and sewage in f rast ructure, compar ing some Braz i l ian c i t ies such as São Paulo, Rio de Janei ro , Belo Hor izonte and Brasí l ia , estab l ish ing a connect ion wi th the ideolog ies and pro jects that des igned such d i f ferent sani ta- t ion models . Key words : Braz i l ian modern iza t ion ; Met ropo l is ; San i ta t ion ; Urban h is tory ; Soc ia l exc lus ion. Referências CAPEL, H. Redes, chabolas y rascac ie los. Las t ransformaciones f ís icas y la p lan i f icac ión en las áreas metropol i tanas. In : SEMINARIO INTERNACIONAL, Ba rce lona , 2002 . El desa f ío de las á reas metropol i tanas en un mundo global izado : una mirada a Europa y Amér ica Lat ina. Barce lona: Inst i tu t Cata lá , 2002. p . 17-56. FIX, M. Parceiros da exclusão . São Paulo: Boi tempo, 2001. IANNI, O. Cidade e modern idade. In : SOUZA, Mar ia Adél ia Aparec ida de et a l . (Org. ) . 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Em out ros casos, o domicí l io de fa to l igado à rede gera l legal pode se tornar re ferênc ia na amostragem a leatór ia para aquela rua ou quadra. 2 GV c 1950.12.22/2. Car ta de Ernâni do Amara l Peixoto a Getú l io Vargas comunicando que v ia jar ia à Europa para descansar e reso lver prob lemas de t ranspor te do Estado do Rio. Relata seus contatos com Dutra, Canrober t e Ismael Cavalcant i , in forma que cont inuam as negociações para insta lação de uma ref inar ia em Ni teró i e que Regis Bi t tencour t e Saturn ino Braga não t iveram par t ic ipação no caso de corrupção na const rução da Rio-São Paulo. Sol ic i ta que Getú l io não esqueça das pretensões do Estado do Rio de Janei ro . Rio de Janei ro , 22/10/1950. Nota de Álvaro Pere i ra de Sousa L ima a Getú l io Vargas comunicando que homologara a reso lução do Conselho Rodoviár io Nacional a l terando o orçamento do DNER para o ano de 1952. Rio de Janei ro , GV c 1952.11.13. Te legrama de Eur ico de Sousa Gomes F i lho a Getú l io Vargas comunicando a ass inatura de emprést imo do BNDE, dest inado às obras de remodelação e reapare lhamento da Centra l do Bras i l . R io de Janei ro , 13/11/1952. 3 A CSN e a Á lca l i s fo ram pr iva t i zadas e rees t ru tu radas , com enxugamen to do quad ro de t raba lhado res e modern i zação dos equipamentos. 4 Engenha r i a Emí l i o I b rah im . Memór ias . ht tp : / /www.emi l io ibra im.eng.br /guandu.shtml , 2006. 5 Engenha r i a Emí l i o I b rah im . Memór ias . ht tp : / /www.emi l io ibra im.eng.br /guandu.shtml , 2006. . 6 Engenha r i a Emí l i o I b rah im . Memór ias . ht tp : / /www.emi l io ibra im.eng.br /guandu.shtml , 2006. Caderno de Geograf ia - Belo Horizonte - V.16 - Nº .26 - 200732 Histór ia soc ia l da metrópole: a conf iguração espacia l des igual do saneamento bás ico Caderno de Geograf ia - Belo Horizonte - V.16 - Nº .26 - 2007 33 Cat ia Antonia da S i lva << /ASCII85EncodePages false /AllowTransparency false /AutoPositionEPSFiles true /AutoRotatePages /All /Binding /Left /CalGrayProfile (Dot Gain 20%) /CalRGBProfile (sRGB IEC61966-2.1) /CalCMYKProfile (U.S. Web Coated \050SWOP\051 v2) /sRGBProfile (sRGB IEC61966-2.1) /CannotEmbedFontPolicy /Warning /CompatibilityLevel 1.4 /CompressObjects /Tags /CompressPages true /ConvertImagesToIndexed true /PassThroughJPEGImages true /CreateJDFFile false /CreateJobTicket false /DefaultRenderingIntent /Default /DetectBlends true /DetectCurves 0.0000 /ColorConversionStrategy /LeaveColorUnchanged /DoThumbnails false /EmbedAllFonts true /EmbedOpenType false /ParseICCProfilesInComments true /EmbedJobOptions true /DSCReportingLevel 0 /EmitDSCWarnings false /EndPage 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