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Seminário Nacional sobre Urbanização de Favelas 13 a 15 de novembro de 2014 São Bernardo do Campo SP FAVELAS FA V E LA S Seminário Nacional sobre Urbanização de Favelas objetiva debater as características, alcance e limitações das intervenções recentes em urbanização de assentamentos precários e refletir sobre os avanços e desafios do Programa de Aceleração do Crescimento – Urbanização de Assentamentos Precários (PAC-UAP) nas cidades brasileiras. O apoio promoção 1 Seminário Nacional sobre Urbanização de Favelas 13 a 15 de novembro de 2014 São Bernardo do Campo SP FAVELAS 2 promoção Universidade Federal do ABC – Programa de Pós Graduação Planejamento e Gestão do Território (PPGPGT-UFABC) apoio Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) Ministério das Cidades Cities Alliance Anpur Consórcio Intermunicipal do ABC Prefeitura do Município de São Bernardo do Campo Laboratório de Habitação e Assentamentos Humanos (LABHAB) Mackenzie comissão organizadora Profa. Dra. Rosana Denaldi (UFABC) Ana Gabriela Akaishi (UFABC) Profa. Dra. Cláudia Paiva (UFABC) Paulo Emilio Buarque Ferreira (FAU Universidade Mackenzie SP) Nilza Aparecida de Oliveira (PMSBC) comissão científica gt1 programa, projeto e obra para favela Coordenação: Ricardo Moretti (UFABC) Maria Lúcia Refinetti Martins (FAU-USP) Maria de Lurdes Zuquim (FAU-USP) Rosana Denaldi (UFABC) Simone Aparecida Polli (UFPR) Luciana Travassos (UFABC) Seminário Nacional sobre Urbanização de Favelas FAVELAS 3 GT2 tratamento e gestão de risco nos projetos de urbanização de favela Coordenação: Fernando Rocha Nogueira (UFABC) Cláudia Francisca Escobar de Paiva (UFABC) Eduardo Soares de Macedo (IPT) Noris Costa Diniz (UnB) Roberto Quental Coutinho (UFPE) gt3 reassentamento e a dimensão social dos projetos de urbanização Coordenação: Karina Leitão (FAU-USP) Luciana Lago (IPPUR/UFRJ) Luiz Renato Bezerra Pequeno (UFCE) Maria do Carmo Brant (PUC-SP) Regina Dulce Barbosa Lins (UFAL) Silvia Helena Passarelli (UFABC) equipe ufabc Profa. Dra. Claudia Francisca Escobar de Paiva Prof. Dr. Fernando Nogueira Profa. Dra. Kátia Canil Prof. Dr. Ricardo Moretti Profa. Dra.Rosana Denaldi Ana Gabriela Akaishi Aloá Dandara Amanda Mamede Amanda Clemente Aramis H. Gomes Camila Brity Camila Pereira Claudia C. Mascarenhas David Batista de Paula Débora Prado Zamboni Ellen Carulli Eric A. C. da Costa Felipe Bravin Benitez Ferreira Francisco S. V. Coelho Gabriel Alvarez Gabriella Castro Gilmara da Silva Gonçalves Ingrid Sakamoto Isabela Thobias Juliana Petrarolli João C. S. Barbosa João Vitor Macarini Juliane Galindo Kaio Nogueira Karina Ayumi Saito Marilia Leite Patricia C. do Carmo Pedro Yukas Pollyanna Silva Renan Telles Cardoso Rogério Rodrigues Roberta Pegorer Lara de Moraes Rodileir Silva Morais Sabrina Nascimento Tamires Santos Victor Mendes Del Prete 4 apoio promoção Seminário Nacional sobre Urbanização de Favelas FAVELAS 23 ROCiNhA: dESCARTE iNCORRETO dO LixO E AS iMPLiCAçõES PARA A qUALidAdE dE VidA dA POPULAçãO LOCAL – UMA qUESTãO SOCiOAMBiENTAL URBANA Maria Izabel de Carvalho ENTULhO NAS COMUNidAdES AFETAdAS PELO PROGRAMA ViLA ViVA EM BELO hORizONTE: GESTãO OU AMPLiAçãO dE RiSCOS SOCiOAMBiENTAiS Cecília Reis Alves dos Santos; Paula Oliveira Mascarenhas Cançado; Lívia Bastos Lages; Tays Natalia Gomes; Paula Miller Starling; Márcia Helena Batista Corrêa da Costa qUESTõES SOCiOAMBiENTAiS dE LARANJAL dO JARi/AP: iNTERVENçõES POR OBRAS dO ACASO Eliana do Socorro de Brito Paixão; Ana Maria de Oliveira Cunha GT3: REASSENTAMENTO E A diMENSãO SOCiAL dOS PROJETOS dE URBANizAçãO SESSãO 3.3: REASSENTAMENTO NO âMBiTO dO PROGRAMA MCMV 14 nov • 8h30 – 10h30 • Sala a5 / Bloco Beta Coordenador: Luciana Lago (UFRJ) FAVELA PARTidA: POLíTiCAS dE REASSENTAMENTO E LUTA PELA PERMANêNCiA NA FAVELA dE iNdiANA Juliana Canedo dA FAVELizAçãO à REiNTEGRAçãO: O PROGRAMA MiNhA CASA MiNhA VidA COMO ALTERNATiVA à EFETiVAçãO dO diREiTO à MORAdiA NA CidAdE dE NATAL, RN Jéssica Morais de Moura; Marcio Pereira Barreto; Ada Laís Soares de Morais URBANizAçãO dE ASSENTAMENTOS PRECÁRiOS E iNTEGRAçãO dE iNVESTiMENTOS MUNiCiPAiS COM O PAC E O PMCMV – O CASO dE SãO BERNARdO Nilza Aparecida de Oliveira; Tássia de Menezes Regino 93 GT3 | 68 | dA FAVELizAçãO à REiNTEGRAçãO: O PROGRAMA MiNhA CASA MiNhA VidA COMO ALTERNATiVA à EFETiVAçãO dO diREiTO à MORAdiA NA CidAdE dE NATAL, RN Jéssica Morais de Moura (UFRN) - jessica_morais_moura@hotmail.com BACHAREL EM GESTãO DE POLíTICAS PúBLICAS - UFRN, MESTRANDA EM ARQUITETURA E URBANISMO - PPGAU/UFRN, SUBCOORDENADORA DE ACOMPANHAMENTO E CONTROLE DA SECRETARIA DE ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE DO PLANEJAMENTO E DAS FINANçAS Marcio Pereira Barreto (UFRN) - marciobarretojc@gmail.com LICENCIADO EM GEOGRAFIA - IFRN, BACHAREL EM GESTãO DE POLíTICAS PúBLICAS - UFRN, MESTRANDO EM ARQUITETURA E URBANISMO - PPGAU/UFRN Ada Laís Soares de Morais (SEMURB) - ada.lais@hotmail.com TéCNICA EM TURISMO - IFRN, BACHAREL EM GESTãO DE POLíTICAS PúBLICAS - UFRN, GESTORA DE POLíTICAS PúBLICAS DA SECRETARIA MUNICIPAL DE NATAL DE MEIO AMBIENTE E URBANISMO As cidades brasileiras são marcadas por graves problemas no tocante à precariedade habitacional de inúmeras famílias que sobrevivem em péssimas condições de habitat. Assentamentos precários, favelas, loteamentos irregulares, aglomerações informais, seja qual for a denominação, o fato é que existem centenas de indivíduos que possuem os seus direitos constitucionais violados, vivendo em situações extremamente precá- rias. O presente trabalho apresenta como objeto de estudo a transformação habitacional causada na vida de aproximadamente 403 famílias que antes residiam em três assen- tamentos precários da cidade de Natal –RN (Assentamento Anatália, Assentamento 8 de Outubro e Assentamento Monte Celeste) e que foram recentemente beneficiadas com unidades habitacionais do Programa Minha Casa Minha Vida. O Residencial Vivendas do Planalto, conjunto do PMCMV construído em bairro vizinho ao dos assentamentos, apresenta-se como alternativa para solucionar a problemática que, só no território na- talense, é composta por cerca de 70 assentamentos precários. O trabalho desenvolvido discute sobre relevantes questões referentes à provisão habitacional, considerando um estudo de caso da cidade de Natal para refletir sobre o processo de urbanização brasi- leiro e o cenário atual no que concerne a efetivação do Direito à Moradia. PALAVRAS-CHAVE: PRECARIEDADE HABITACIONAL; DIREITO à MORADIA; PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA. (I).F c o .Y, o (t E í-\ I - l \7 ã õ ' F z ô ! Í ò .b ^ Ë 1 - o ( ú Ë E Ë ' ú \ È È Ë { Ë€geg os o G lJ- ; d ì * Ë C J o - , o o ( D t rfi5 ofït ü o I N . ' l - c, o o \ . 9 ' õ b b o ' ï o- r(E o .9 E o o o o I o q o- È È í n . P v ) E F G Ë € Ê = ; c É ' N E 2 ' r Ë E E ' 5 o . g G õ - - o n 3 b 8 E E : s q Ë g € E * F É ' " G Ë c ã É F = q È c o É , õ H ã : s j f i Ë 8 E ' Ë f EË 4 8 : E J . : Ë g , H € 3, 9 2 : s , A € í o o ü ^ ' t o. g i Ë : Ë Ë # * Ï g E ï Ë Ë o = € Ë, t ; E g t ^ , r lg E g ã E s 3 € f i Ë 3 5 ãr ! , r o . g ã z E ë , 8 : Ë : : :r ì O o ( J Ë Ë Ë È E R = 9 o o É € 9 ' 3 3 ã E ; , Ê . Ë ' Ê ! È Ë È ï Ë i " ã s Ë q : ã ; o , r o t o Ë E f . i e E g S ï Ë ' g 6 g q ) 2 Ë g F : = . E ã ; o ' Ë : gE s = n Ë ; s ã S g E € o o g IL T l-u, Itl U t n , ( ! l c) (tr q)':trt 0 l(lt c)4 € .T (g ,,ct l- q) l- .c! c)ín GT .9 (J (g () l- "(g g) u, l- 3 o C o J I'* I r ü g Seminário URBFAVELAS 2014 São Bernardo do Campo - SP - Brasil DA FAVELIZAÇÃO À REINTEGRAÇÃO: O PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA COMO ALTERNATIVA À EFETIVAÇÃO DO DIREITO À MORADIA NA CIDADE DE NATAL-RN. Jéssica Morais de Moura (UFRN) - jessica_morais_moura@hotmail.comBacharel em Gestão de Políticas Públicas - UFRN, Mestranda em Arquitetura e Urbanismo - PPGAU/UFRN, Subcoordenadora de Acompanhamento e Controle da Secretaria de Estado do Rio Grande do Norte do Planejamento e das Finanças Marcio Pereira Barreto (UFRN) - marciobarretojc@gmail.com Licenciado em Geografia - IFRN, Bacharel em Gestão de Políticas Públicas - UFRN, Mestrando em Arquitetura e Urbanismo - PPGAU/UFRN Ada Laís Soares de Morais (SEMURB) - ada.lais@hotmail.com Técnica em Turismo - IFRN, Bacharel em Gestão de Políticas Públicas - UFRN, Gestora de Políticas Públicas da Secretaria Municipal de Natal de Meio Ambiente e Urbanismo 1 Da Favelização à Reintegração: o Programa Minha Cas a Minha Vida como alternativa à efetivação do Direito à Moradia na cidade de Natal-RN. RESUMO As cidades brasileiras são marcadas por graves problemas no tocante à precariedade habitacional de inúmeras famílias que sobrevivem em péssimas condições de habitat. Assentamentos precários, favelas, loteamentos irregulares, aglomerações informais, seja qual for a denominação, o fato é que existem centenas de indivíduos que possuem os seus direitos constitucionais violados, vivendo em situações extremamente precárias. O presente trabalho apresenta como objeto de estudo a transformação habitacional causada na vida de aproximadamente 403 famílias que antes residiam em três assentamentos precários da cidade de Natal – RN (Assentamento Anatália, Assentamento 8 de Outubro e Assentamento Monte Celeste) e que foram recentemente beneficiadas com unidades habitacionais do Programa Minha Casa Minha Vida. O Residencial Vivendas do Planalto, conjunto do PMCMV construído em bairro vizinho ao dos assentamentos, apresenta-se como alternativa para solucionar a problemática que, só no território natalense, é composta por cerca de 70 assentamentos precários. O trabalho desenvolvido discute sobre relevantes questões referentes à provisão habitacional, considerando um estudo de caso da cidade de Natal para refletir sobre o processo de urbanização brasileiro e o cenário atual no que concerne a efetivação do Direito à Moradia. PALAVRAS-CHAVE: Precariedade habitacional; Direito à Moradia; Programa Minha Casa Minha Vida. INTRODUÇÃO A precariedade habitacional marca inúmeras paisagens das cidades brasileiras. Morando debaixo de lonas, tábuas, papelões e qualquer outro material que possa se transformar numa espécie de abrigo, vive um grande número de famílias no Brasil e, nesses locais, se observam condições mínimas de higiene e salubridade, quando elas existem. Esse é o cenário presente nas favelas, assentamentos informais e loteamentos clandestinos, onde moradores com direitos extremamente violados constituem suas famílias e desenvolvem suas atividades cotidianas. O presente trabalho busca refletir exatamente o contrário desse cotidiano: a transformação na habitação de aproximadamente 403 famílias beneficiadas pelo Programa Minha Casa Minha Vida na cidade de Natal-RN, e que agora deixam de ser moradoras de áreas impróprias e passam a residir no conjunto habitacional Vivendas do Planalto. Compreender o processo de reintegração promovido pelo programa, bem como discutir sobre o conceito de efetivação do Direito à Moradia, se faz indispensável no atual contexto de desenvolvimento das cidades e das políticas públicas de garantia dos Direitos Humanos. Nessa perspectiva, o trabalho é composto por quatro sessões, desencadeando um processo reflexivo que parte de uma discussão sobre a urbanização desenfreada e os reflexos para o setor habitacional, fazendo um registro histórico da composição 2 do déficit habitacional brasileiro e se apoiando em diversos estudos realizados principalmente por Erminia Maricato e Raquel Rolnik, especialistas no assunto. Posteriormente, inicia-se a discussão sobre a violação do Direito à Moradia na cidade de Natal-RN, apresentando informações e dados estatísticos que dizem respeito ao número de famílias que vivem em situações de risco, residindo em favelas, loteamentos ou assentamentos informais. Nesta sessão, há uma descrição das favelas que foram removidas para o conjunto do PMCMV, contemplando informações levantadas pelos órgãos municipais sobre a sua formação e o registro fotográfico com ilustrações e mapas temáticos do atual caso de Natal, no que diz respeito à habitação popular precária. Após esses capítulos iniciais que situam o leitor desde o processo de urbanização e formação dos aglomerados urbanos informais até a situação vivenciada na cidade de Natal, parte-se para a discussão mais relevante, onde apresenta-se o Programa Minha Casa Minha Vida como alternativa a efetivação do Direito à Moradia. Informações mais gerais sobre o programa são introduzidas a fim de se discutir sobre o estudo de caso de Natal-RN, através da construção do conjunto habitacional Vivendas do Planalto que promoveu o reassentamento de famílias que antes habitavam em três favelas do município (Assentamento Anátalia, Assentamento 8 de Outubro e Assentamento Monte Celeste). Nesse sentido, se faz fundamental compreender que a remoção dessas famílias para um local mais seguro e que oferece condições dignas de um habitar faz parte de uma iniciativa governamental que, atendendo às pressões sociais de uma população historicamente marginalizada, passou a promover alternativas para a provisão da casa própria, reintegrando famílias que antes viviam em condições muitas vezes sub-humanas. Tais reflexões são sintetizadas nas considerações finais deste trabalho, reunindo elementos que sinalizam para uma avaliação bastante positiva desse espectro do programa MCMV, apesar dos inúmeros desafios que ele ainda tem há enfrentar. Como procedimentos metodológicos que nortearam a elaboração deste trabalho, esclarece-se que essa pesquisa advém do desdobramento de estudo anterior realizado por Moura (2013) que mapeou e identificou aspectos referentes a segregação de desterritorialização dos conjuntos habitacionais do Programa Minha Casa Minha Vida na Região Metropolitana de Natal. Além disso, o trabalho está relacionado com a aplicação de questionários em conjuntos do MCMV em outros municípios do Estado do Rio Grande do Norte, cumprindo as etapas de edital aprovado pelo Ministério das Cidades, o qual tem como título “Análise Estratégica e Qualitativa do Programa Minha Casa, Minha Vida: Mapeando Resultados Socioeconômicos e Definindo Procedimentos de Monitoramento, Avaliação e Retroalimentação”, e que ainda se encontra em fase de execução. Como a entrega do conjunto Residencial Vivendas do Planalto e a ocupação das casas ainda é bastante recente, o presente estudo contempla em sua essência questões teóricas, subsidiadas pela análise dos normativos técnicos do PMCMV e por informações municipais levantadas principalmente na Secretaria Municipal de Habitação, Regularização Fundiária e Projetos Estruturantes – SEHARPE e na Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo – SEMURB. 3 A abordagem participativa contempla os registros levantados pelos órgãos municipais, os quais divulgaram notas de entrevistas nas quais os moradores reassentados afirmam que essa transformação habitacional é uma luta que acabou com sentimentos de vitória. Tais abordagens contribuíram para que a pesquisa tivesse um viés mínimo participativo, uma vez que não se foi possível aplicar técnicas de aplicação de questionários e/ou realização de grupos focais, dada a ocupação recente do conjunto habitacional. Em suma, este trabalho visa fomentar a discussão sobre as recentes iniciativas de combate a habitação irregular precária, apresentando uma proposta implementada na cidade de Natal-RN e articulando autores que descrevem sobre o processo de urbanização e formação das cidades brasileiras, buscando, sobretudo, avançar na luta sobre a construção de cidades mais justas no tocante ao habitar e ao viver. 1 A URBANIZAÇÃO DESENFREADA E OS REFLEXOS NO SETOR HABITACIONALCom o crescimento das cidades, acompanhado do intenso êxodo rural, a urbanização inevitavelmente não se deu de maneira gradual. Por isso, entre outros fatores, o planejamento urbano deixou lacunas no que concerne à produção de moradia e de infraestruturas de serviços urbanos indispensáveis a vivência da população. O contingente populacional menos favorecido economicamente, em particular o que saiu do campo para a cidade, não encontrou estruturas que possibilitassem o seu desenvolvimento humano pleno. Os indivíduos, não tendo condições de se manter nas estruturas formais das áreas mais centrais da cidade, a não ser, em certos casos, as áreas mais degradadas do centro antigo, passaram a ocupar terrenos na periferia e em favelas, muitas vezes impróprios para a moradia (VALENÇA, 2010). As cidades brasileiras enfrentam ainda nos dias atuais graves consequências dessa ocupação desenfreada do território. São inúmeras habitações consideradas irregulares e o número estimado pelo IBGE chega a um total de 11.425.644 de pessoas, o equivalente a 6% da população do país, que vive no Brasil em aglomerados subnormais (CENSO 2010). Além do mínimo de condições habitacionais, considera-se como aglomerados subnormais, as ocupações de locais públicos ou particulares quem sofrem com a ausência ou a inadequação de serviços públicos de qualidade, além de estarem distribuídas de maneira desordenada no território. Os dados revelados pela pesquisa do Déficit Habitacional Municipal no Brasil 2010, da Fundação João Pinheiro, em parceria com o Ministério das Cidades, apontou um déficit de 6,940 milhões de unidades habitacionais, classificando como “déficit” não somente a falta de casas, mas sim as inadequadas condições de habitabilidade e salubridade. Mike Davis (2006) na sua obra denominada “Planeta Favelas”, discorre sobre esse caótico cenário de intensa urbanização e, consequentemente, violação do direito à moradia. Num contexto de favelização e de empobrecimento das cidades, o autor informa que a população das favelas cresce na base de 25 milhões de pessoas a cada ano – conforme dados da UN-Habitat. No Brasil, o crescimento explosivo das cidades a partir dos anos 1980, originou as periferias abandonadas, mais tarde denominadas de favelas, e que surgiram quando as grandes levas de trabalhadores 4 ficaram sem alternativa de moradia. Maricato (2007) descreve o cenário causado pelo aumento do desemprego e da pobreza urbana, relatando que as imagens das cidades brasileiras deixaram o imaginário de modernos centros industriais que iriam superar o atraso e a violência e passaram a representar crianças abandonadas, epidemias, enchentes, desmoronamentos, tráfego, poluição do ar, poluição dos rios, favelas e violência. Trata-se da “Cidade (I)legal”, descrita por Valença (2008) e que é composta por ilegalidades, informalidades e irregularidades, termos que caracterizam as cidades contemporâneas, sobretudo no que se refere ao acesso à terra e violação do direito à moradia. Lefebvre em 1999 abordou esse processo, conceituando de Revolução Urbana as transformações ocorridas no território e assentando o seu pensamento na hipótese da urbanização completa da sociedade. O autor, partindo da concepção de reconfiguração das relações espaciais, esclarece que as cidades passam por um processo de implosão, marcado por uma intensa concentração de pessoas, de atividades e de serviços. Além disso, paralelamente a este processo, a cidade também passa a conviver com uma dinâmica de explosão, processo caracterizado pela fragmentação espacial e relacionado com a expansão do espaço urbano para territórios vizinhos, espraiando o tecido urbano. Desses conceitos, é possível extrair variadas implicações para as relações sociais, econômicas, políticas e ambientais, considerando que as intensas transformações no território urbano provocam a existência de diversos fenômenos, os quais, quando combinados, sintetizam a estruturação do espaço. Características, como a informalidade, a periferização, a segregação e a desterritorialização, são oriundas desse complexo processo de ocupação das cidades. Daí as cidades híbridas, que, conforme apontamentos de Abramo (2009, p.43), são compactadas e difusas, pois “produz uma estrutura urbana informal [e também formal] mais compacta nas áreas consolidadas e mais difusa nas franjas urbanas”. Essa perspectiva vem incorporando novas realidades, na medida em que se instaurou um intenso processo social de construção de uma cultura de direitos. A luta pelo direito à cidade e pelo direito à moradia surge em contraposição a esse modelo de urbanização excludente, que ao longo de décadas de urbanização acelerada absorveu elevados contingentes de pessoas pobres, sem, entretanto, integrá-las efetivamente às cidades. De acordo com levantamento realizado por Rolnik (2009), a partir do final dos anos 1970, moradores de assentamentos informais, periferias e favelas das cidades, aliados a setores das classes médias urbanas, consolidaram as bases de um movimento pela Reforma Urbana, o qual estava comprometido com a luta pela ampliação da cidadania, incluindo a melhoria de serviços públicos e investimentos em favelas e periferias, garantindo direitos básicos da população. Uma série de intervenções passaram a permear o cenário da construção de uma agenda pública, iniciando novas práticas e políticas de regularização e urbanização de favelas e a promulgação de legislações específicas, capazes de tratar dos direitos dessas demandas historicamente violados, tal como o caso da promulgação do Estatuto da Cidade (lei n. 10.257, em 2000), da Lei do Fundo Nacional de Moradia Social (lei n. 11.124, em 2005), além da criação do Ministério das Cidades em 2003, órgão responsável pela integração das políticas de habitação, 5 saneamento, desenvolvimento urbano e mobilidade urbana e do Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social – SNHIS, em 2005. Nesse sentido, observa-se a construção de um modelo de enfrentamento do déficit habitacional brasileiro, articulado com os três níveis de governo e que teve como trunfo mais recente o Programa Minha Casa, Minha Vida, implantado a partir de 2009. Porém, conforme ressalta Maricato (2011), “essas conquistas são relativamente recentes e as mudanças são lentas, já que envolvem uma cultura histórica – ou de raízes escravistas – de exclusão social”. Em síntese, apesar dos significativos avanços constitucionais, na prática, as cidades brasileiras ainda travam lutas cotidianas na busca da efetivação do direito à moradia, reflexas do processo de produção e apropriação do espaço urbano, o qual há décadas reproduz as desigualdades e as contradições sociais, conforme demonstram-se nas próximas sessões. 2 VIOLAÇÃO DO DIREITO À MORADIA: O PROCESSO DE FAVE LIZAÇÃO EM NATAL-RN A dinâmica urbana no município de Natal mostra-se bastante acelerada e reflete paisagisticamente e socialmente uma segregação territorial e desigualdade social que geram problemas diversos, que vão desde a omissão do Direito à Moradia digna, passando pela limitação ao acesso à bens e serviços públicos, segurança estrutural e tantos outros fatores que auxiliam fortemente na estagnação social de pessoas que historicamente já são marginalizadas. A cidade do Natal, capital do Estado do Rio Grande Norte, contava em 2013 com uma população de aproximadamente 854 mil habitantes, conforme dados levantados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE. No que se refere a o número de habitantes que residem em assentamentos precários, os estudos mais recentes realizados para a elaboração do Plano Local de Habitação Social de Natal, revelam que em 2008 haviam 92.942 habitantes morando em 70 assentamentos precários, distribuídos nas quatro regiões administrativas do município e vivendo em diversas situações de risco e vulnerabilidade. Tais informações permitem considerar que numa cidade que se encontra numnúcleo metropolitano, sendo responsável por mais da metade do desenvolvimento econômico do Estado, existe uma significativa parcela da população que enfrenta diariamente as consequências da violação do direito à moradia. As ocupações irregulares do município se distribuem em todo o território, estando principalmente localizadas à margem do Rio Potengi, nas faixas de mangue - que são ambientes insalubre, sob risco de alagamento -, em assentamentos sob áreas de influência de torres de alta tensão elétrica, em áreas de domínio da via férrea e em Áreas de Proteção Permanente com fragilidades ambientais diversas. Em suma, os fatores de riscos que caracterizam a informalidade dessas ocupações são inúmeros, gerando graves consequências para uma população que não vê alternativas que permitam a transformação na sua realidade habitacional. O mapa abaixo especializa os 70 assentamentos precários da cidade do Natal, identificados pelo Diagnóstico do Setor Habitacional e que subsidia a elaboração do 6 Plano Local de Habitação Social de Natal. Os assentamentos precários delimitados no mapa foram identificados de acordo com levantamento de campo realizado nos anos de 2011 e 2012, por equipe de consultores do Idesplan, que utilizou como critério para a classificação de assentamento precário todas as metodologias existentes - Ministério das Cidades, Plano Municipal de Redução de Riscos - PMRR(2008) e Plano Diretor de Natal - PDN 082 (2007). Mapa 1 - Espacialização dos Assentamentos Precários de Natal – RN. Fonte: IDESPLAN 2013, Diagnóstico do Setor Habitacional. 7 Em virtude de um crescimento urbano consideravelmente acelerado, Natal apresenta intensos problemas socioambientais de exclusão e vulnerabilidade habitacional, existindo áreas com baixos níveis de habitabilidade e sérios problemas estruturais, à exemplo dos assentamentos Anatália, 8 de outubro e Monte Celeste, todos localizados no bairro Guarapes - Zona Administrativa Oeste do município - e que estão sendo objetos de análise desse trabalho, umas vez que passaram por um processo de transformação habitacional e social, através do reassentamento de famílias para um conjunto habitacional do Programa Minha Casa Minha Vida. Abaixo apresenta-se a caracterização desses assentamentos, identificando os principais fatores de risco que impulsionaram a recente realocação dessas comunidades, bem como a delimitação espacial e o registro fotográfico da precária situação habitacional. ASSENTAMENTO ANATÁLIA DE SOUZA ALVES As ocupações do assentamento urbano Anatália de Souza Alves, iniciaram em julho de 2010. Influenciadas pela busca por moradia, cerca de 270 famílias se instalaram de forma irregular no bairro do Guarapes, numa situação de extrema vulnerabilidade social que ilustra fortemente a violação ao direito a moradia, visto que além da ausência de uma condição habitacional digna, os moradores do assentamento sofriam com a dificuldade de acesso à saúde, educação, mobilidade urbana, saneamento adequado e tantos outros direitos básicos. As famílias que ali se instalaram e que tinham seus principais direitos violados moravam debaixo de lonas, tabuas e papelões, não tinham acesso à água potável, sendo a única fonte de acesso a este bem essencial à vida humana um tanque comunitário que não possuía nem mesmo tampa - o que presume a má qualidade dessa água e ambiente propício a reprodução do mosquito da dengue. Além disso, a rede de energia elétrica era improvisada, o que elevava intensamente o risco de incêndio na comunidade. Figura 1 – Energia Improvisada no Assentamento Anatália de Souza Alves. Fonte: Revista Natal, 2013. Tendo em vista que o direito habitacional não se limita a um lugar físico para morar e que a moradia adequada está inserida numa ampla estrutura, que contempla a acessibilidade a escolas, postos de saúde, saneamento adequado, segurança, mobilidade urbana, áreas de lazer, entre outros requisitos, percebe-se claramente 8 que os moradores do Assentamento Anatália tinhas esses direitos cotidianamente negados, se configurando em uma favela desumana e perigosa. ASSENTAMENTO 8 DE OUTUBRO Localizado em um amplo terreno do bairro Guarapes, ao lado do Conjunto Dinarte Mariz, o Assentamento 8 de Outubro foi erguido em uma área onde não existem riscos ambientais, apesar do elevado nível de precariedade das moradias construídas com materiais improvisados e extremamente inadequadas a dignidade humana, o que caracterizava o assentamento como “não passível de adequação”. Além disso, as ocupações também, não seguiam um traçado urbanístico e desta forma não era possível definir um sistema viário, o que contribuía ainda mais para a não consolidação do assentamento. Mapa 2 – Localização do Assentamento 8 de Outubro Fonte: IDESPLAN 2013, Diagnóstico do Setor Habitacional. Aos 780 habitantes do Assentamento 8 de outubro, não era omitido apenas o direito a habitação digna. A comunidade ora apresentada, também sofria com a falta de acesso a serviços básicos de saúde, educação, lazer, saneamento, transporte público, comércios, entre tantos outros direitos que quando cumpridos resguardam a vida digna do cidadão. 9 Figura 2 - Assentamento 8 de Outubro Fonte: IDESPLAN 2013, Diagnóstico do Setor Habitacional. Devido aos vários problemas estruturais apresentados, essa foi uma das comunidades que famílias foram contempladas pelo programa MCMV, tendo uma completa transformação habitacional e que agora passarão a conviver num espaço que assegura as condições mínimas de vivência. ASSENTAMENTO MONTE CELESTE Também localizado no bairro do Guarapes, o assentamento Monte Celeste ocupa parte da Zona de Proteção Ambienta 4 – ZPA 4, a qual é formada por dunas que contribuem para a drenagem natural da área e para a manutenção da vazão e perenidade do rio Jundiaí/Potengi e a do rio Pitimbu. Além de ocupar uma ZPA, a comunidade em questão também está inserida numa faixa de domínio de Alta Tensão e está sob risco de deslizamento – visto sua ocupação ser em solo dunar. Devido a sua localização, a comunidade sofria com a dificuldade do acesso de veículos, que era limitado e afetava diretamente nos serviços de coleta de lixo, o que causava acúmulo de resíduos sólidos e consequentemente tornava o ambiente insalubre, o que contribuía fortemente com o aumento de riscos a saúde dos moradores. Além disso, e assim como nos assentamentos precários apresentados anteriormente, está ocupação irregular foi situada distante da área urbanizada mais próxima e não tinha acesso aos principais serviços públicos. Figura 3 – Assentamento Monte Celeste. Fonte: IDESPLAN 2013, Diagnóstico do Setor Habitacional 10 Mapa 3 – Localização do Assentamento Monte Celeste. Fonte: IDESPLAN 2013, Diagnóstico do Setor Habitacional. Entre tantos problemas cotidianos, os moradores do Assentamento Monte Celeste, ainda tinham que conviver com a ausência de abastecimento de água, esgotamento sanitário e iluminação pública, o que se faz perceber a total falta de condições de habitabilidade, salubridade e principalmente dignidade humana que os moradores enfrentavam nesse assentamento irregular. Diante das informações expostas, fica clara a fragilidade habitacional existente na capital do Rio Grande Norte. São inúmeras família carentes de habitação digna, saúde, educação, segurança, vivendo em condições insalubres e desumanas. São 70 assentamentos precários com moradores que buscam o direito à moradia e que, ao serem marginalizados e esquecidos, “sobem o morro”, “ocupam lagoas”, “adentram o mangue” e vivem em áreas de risco com o simples intuito de terem um lugar para se abrigar. Nesse contexto, cabe, no entanto, refletir sobre alternativas de transformação dessa realidade, tal como a recente reintegração de famílias oriundas dessesassentamentos e que foram beneficiadas com um programa habitacional de construção da casa própria que tem colaborado com a alteração desse cenário, proporcionando para essas famílias um novo horizonte, com direitos mais respeitados e uma sociedade mais justa, conforme se aborda adiante. 11 3 O PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA COMO ALTERNATIVA PARA EFETIVAÇÃO DO DIREITO À MORADIA: ESTUDO DE CASO DO CONJUNTO VIVENDAS DO PLANALTO – NATAL/RN “É uma conquista. Uma vitória de muito tempo de luta. Aqui tudo é difícil. A gente carregou muita água. A energia vivia num ‘corta, corta’. E o pior era a falta de segurança”. (Ex-moradora do Assentamento Anatália e beneficiária do PMCMV em entrevista à Prefeitura Municipal de Natal, em maio de 2014). As precárias condições habitacionais de famílias que vivem em assentamentos informais marcam um profundo cenário de violação do Direito à Moradia. Até aqui, foram apresentadas reflexões sobre as situações atuais das cidades brasileiras, ilustrando principalmente o caso do município de Natal. O fato é que essa característica não é peculiar de apenas um município brasileiro, mas sim da maioria das cidades que sofreram com um processo de urbanização desenfreada, aliado à um longo período de omissão de intervenções estatais no território. A moradia adequada foi reconhecida como direito humano em 1948, com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, tornando-se um princípio universal, aceito e aplicável em todas as partes do mundo como fundamental para a vida das pessoas. Vários tratados internacionais após essa data reafirmaram que os Estados têm a obrigação de promover e proteger este direito, tal como a Constituição Brasileira de 1988 que em seu artigo 6º estabelece: “Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.” Mais que um teto e quatro paredes o direito à moradia integra o direito a um padrão de vida adequado. Não se resume a apenas um teto e quatro paredes, mas ao direito de toda pessoa ter acesso a um lar e a uma comunidade, seguros para viver em paz, dignidade e saúde física e mental. Em contraposição a esses significativos avanços na esfera legislativa, a situação atual ainda é permeada por uma extrema violação dessa conquista. No Brasil, durante décadas, as políticas habitacionais não foram capazes de promover transformação habitacional para as classes de renda mais baixas, ficando a cargo da própria população a tentativa de mudança dessa realidade. Sinalizando para uma nova trajetória da política habitacional brasileira, o Programa Minha Casa, Minha Vida surge no ano de 2009, sendo aprovado pela Medida Provisória nº 459, publicada em 25 de março de 2009, posteriormente convertida na Lei nº 11.977 de 7 de julho de 2009 e pelo Decreto no 6.962, de 17 de setembro de 2009. As conquistas consolidadas até então no Plano Nacional de Habitação – PLANHAB (2008) serviram como um dos arcabouços para a implementação do referido programa que, em seu início, tinha como meta a construção de um milhão de moradias, tendo para isso alocado aproximadamente R$ 34 bilhões de recursos. O PMCMV estrutura-se em três faixas de renda (com diferentes modalidades entre elas), sendo a primeira destinada a famílias com renda mensal inferior a R$ 12 1.600,00, que podem receber subsídios de até 96% do valor do imóvel. Para a segunda faixa, no segmento de renda familiar acima de R$ 1.600 até R$ 3.275, os juros cobrados são menores que os de mercado e os subsídios podem chegar a R$ 25 mil por família, sendo que, quanto menor a renda familiar, maior o valor subsidiado. Na terceira faixa, a partir da renda familiar de R$ 3.275 até R$ 5.000, não existe subsídio no valor do imóvel, mas as taxas de juros também são menores que as de mercado. Segundo informações do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada - IPEA (2012, p.4), “O advento do MCMV institui um novo momento no quadro institucional municipal, o qual está associado à produção pública de habitação de interesse social”. Levando em consideração esses fatores, aponta-se que o programa habitacional Minha Casa, Minha Vida tem como objetivo desde o seu início, promover o acesso à moradia nas áreas urbanas e rurais, através da construção, reforma e aquisição de imóveis para as famílias em área de déficit habitacional. Sem considerar os inúmeros desafios do programa, tais como o fator de localização das moradias construídas, o que se pretende discutir é a iniciativa de implementação de um programa capaz de oferecer condições adequadas de moradia para famílias que viviam em situações extremas, tais como os moradores dos assentamentos informais tratados neste trabalho. Para a seleção dos beneficiários das unidades habitacionais do MCMV – faixa 1, são levados em consideração uma série de critérios, os quais permitem selecionar indivíduos que tem os seus direitos violados, tais como ser maior de 18 anos ou emancipado, não ser proprietário de imóvel, ser residente e domiciliado na localidade e possuir renda familiar entre zero e três salários mínimos. No caso do Residencial Vivendas do Planalto, conjunto do PMCMV construído no município de Natal-RN e que contemplou unidades habitacionais para famílias residentes em três assentamentos, as informações coletadas na Secretaria Municipal de Habitação, Regularização Fundiária e Projetos Estruturantes – SEHARPE e na Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo – SEMURB (2014) esclarecem que o conjunto foi viabilizado numa parceria entre a Caixa Econômica Federal, construtoras e Prefeitura, promovendo 896 apartamentos que se configurarão no novo lar de famílias dos assentamentos 8 de outubro, Monte Celeste, Anatália e para famílias beneficiárias que conquistaram a moradia por meio de sorteio1. As famílias oriundas dos assentamentos precários2 e beneficiadas pelo Programa Minha Casa, Minha Vida no conjunto Vivendas do Planalto, conseguiram ter o seu 1 De acordo com informações da Prefeitura do Natal (2014) O executivo municipal em parceria com o Governo Federal prepara mais dois empreendimentos do programa Minha casa, Minha Vida. Um é o “Morar Bem” a ser entregue em agosto e o outro é o “Village da Prata”, que tem previsão de ser iniciado ainda em 2014, com prazo de um ano para terminar. O “Morar Bem” fica em Pajuçara, na Zona Norte, e terá 176 apartamentos, em um investimento total de R$ 10,6 milhões. Já o “Village de Prata” ficará localizado no Guarapes, Zona Oeste, e terá 1.792 apartamentos e tem investimento de R$ 109,312 milhões. 2Assentamentos precários são aqueles produzidos na informalidade, com precariedade da unidade habitacional, deficiência de infraestrutura (muitas vezes em áreas de risco de escorregamento ou alagamento) e carente de serviços urbanos, caracterizados pela ilegalidade urbanística e/ou fundiária. Compreendem tanto as favelas como os loteamentos irregulares (BRASIL, 2010). 13 Direito à Moradia digna efetivado e respeitado, após anos de lutas e reivindicações em suas localidades, seus territórios. Destarte, o território é o centro de diversas atividades econômicas, políticas e sociais, pois nele ocorre a produção de novos lugares urbanos e territorialidades. Nesse sentido, entende-se o território na concepção de Santos (1999, p.8) como “(...) o fundamento do trabalho, o lugar da residência, das trocas materiais e espirituais e do exercício da vida”. Com isso, o território é visto como um campo de relações de poder onde o Estado atua de várias formas, seja provendo a cidade ou bairro de serviços públicos ou fazendo grandes investimentos em áreas específicas. No caso do presente estudo, os benefícios maiores foram direcionados para a realocação das famílias aos seus novos locais de morada, abarcandorebatimentos também na urbanização e no aspecto social do bairro do Planalto, além da reintegração ao território, através do estabelecimento de conexões simples de prestação de serviços públicos tão comuns a bairros regulamentados. Figura 4 – Conjunto Residencial Vivendas do Planalto. Fonte: Tribuna do Norte, 2014. Diante dessas questões, nota-se que o MCMV proporciona a infraestrutura urbana e de moradia básica, fazendo com que as famílias antes marginalizadas em assentamentos precários, possam agora ter sua casa própria, modificando as condições totalmente adversas, insalubres, sem a mínima infraestrutura e acesso aos serviços essenciais em que se viviam antes do processo de realocação. 14 Figura 5 – Assentamentos Anatália e Monte Celeste em Natal/RN. Fonte: José Aldenir, 2014. O Programa Minha Casa, Minha Vida enquanto política de provisão de moradia social alcança o público alvo ao qual se propõe e, logo, consegue efetivar o Direito à Moradia aos seus beneficiários através da possibilidade de aquisição de uma casa própria que resguarda condições estruturais plena de vivência, tais como a existência de banheiro, rede elétrica e abastecimento de água. Além disso, a construção das casas e conjuntos do programa é acompanhada de uma série de serviços voltados para a infraestrutura pública e urbana (saneamento básico, energia, água encanada, iluminação pública), fazendo com que aquilo que os moradores irão encontrar em seus apartamentos seja incomparável ao que existia em suas antigas localidades. Levando em consideração tal fato, é perceptível a conquista alcançada pelos moradores, à exemplo das falas de um deles que já se encontra em sua nova residência e que há quase quatro anos conviveu com fossa aberta, insetos, falta de água e de energia: “Isto aqui está representando tudo. Graças a Deus, consegui minha moradia digna onde pretendo viver por muitos anos. Voltar pra lá, jamais”! Diante de contexto, observa-se claramente que ocorre aí o processo de reterritorialização, que segundo Little (1994, p.11) se “caracteriza por uma relocalização/reorganização espacial”, ou seja, as famílias saíram de um espaço onde já tinham certos laços identitários (assentamentos) para algo novo onde diariamente irão constituir novas relações. 15 O empreendimento representa um novo lar, contemplando uma estrutura de 112 blocos de dois pavimentos com quatro unidades em cada pavimento. O local é do tipo aberto e a área de equipamentos comunitários dispõe de praça, playground, centro de convivência e quadra poliesportiva. Cada apartamento possui sala, dois quartos, WC social, hall e cozinha conjugada com a área de serviço e uma área de 43,18m². A unidade habitacional foi orçada em R$ 52.000 mil reais e a prestação a ser paga pelo beneficiário variam de R$ 25,00 até R$ 80,00. Durante o processo de reterritorialização dos moradores com a área, o programa contempla a execução de um Plano de Trabalho Técnico Social - PTTS com as famílias que inclui cursos, oficinas, palestras, conversão do condomínio, eleição de síndicos e administração do Centro Comunitário. Essa iniciativa possibilita que o processo de reintegração considere facetas sociais indispensáveis para a vida comunitária, promovendo encontros que socializem os moradores e estabeleçam práticas comuns de zelo e cuidado com o que representa anos de lutas. Em linhas gerais, as análises feitas sinalizam o PMCMV como instrumento da política habitacional no país, que embora apresente inúmero desafios, consegue de fato efetivar o Direito à Moradia através da transformação de um processo excludente de favelização para um processo de total reintegração social. 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS Com o referido estudo, buscou-se fazer reflexões e análises sobre o reassentamento e a reintegração de famílias em áreas de precariedade urbana, habitacional e social no município de Natal/RN. O cenário atual do Brasil e da cidade de Natal alerta para a necessária mudança no tocante à produção de políticas públicas que busquem consolidar direitos fundamentais ao cidadão, garantindo um desenvolvimento humano justo e pleno. Nessa perspectiva, a inércia estatal que marcou anos da agenda pública conta agora com alternativas que são capazes de transformar a realidade habitacional de inúmeros brasileiros. Embora ainda existam desafios iniciais que fazem com que as famílias reassentadas enfrentem uma série de dificuldades na nova habitação, a melhora é gradativa e o direito a uma moradia digna é, de fato efetivado. Essa postura é assumida pelo Programa Minha Casa, Minha Vida, o qual tem papel de suma importância, pois serve como instrumento dessa efetivação de moradia para a população dos assentamentos precários. Além disso, é importante sinalizar um fator referente à localização espacial do Conjunto Vivendas do Planalto, o qual foi erguido em uma área de plena expansão imobiliária na cidade do Natal/RN (o bairro do Planalto), região essa que também recebe uma série de investimentos em infraestrutura urbana e serviços, fazendo assim com que o conjunto e seus novos moradores possam ser integrados ao território local de forma mais intensa. Em suma, o presente trabalho não esgota as discussões sobre o tema, mas sim abrange o leque de análises sobre essa área de estudo, que com o passar dos anos, poderá ser lembrando e replicado como “case de sucesso” na busca da efetivação do Direito à Moradia. 16 REFERÊNCIAS ABRAMO, Pedro. A cidade com-fusa: mercado e a produção da estrutur a urbana nas grandes cidades latino-americanas . In: Anais do XIII Encontro da Associação Nacional De Pós-Graduação e Pesquisa em Planejamento Urbano e Regional. Florianópolis, 2009. Disponível em <http://www.anpur.org.br/revista/rbeur/index.php/rbeur/article/view/181> Acesso em junho de 2014. DAVIS, Mike. Planeta FAVELA . São Paulo: Boitempo, 2006. DIAS, Lucimberg Camargo. Remoção da população de assentamentos precários e áreas de risco em Cuiabá (MT). Argumentum, Vitória/es, v. 4, n. 1, p.137-151, jun. 2012. FERNANDES, Edésio. Cidade legal x ilegal. In: VALENÇA, Márcio Moraes (org.). Cidade (i)legal . Rio de Janeiro: Mauad X, 2008. 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Seminário URBFAVELAS 2014 São Bernardo do Campo - SP - Brasil DA FAVELIZAÇÃO À REINTEGRAÇÃO: O PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA COMO ALTERNATIVA À EFETIVAÇÃO DO DIREITO À MORADIA NA CIDADE DE NATAL-RN. Jéssica Morais de Moura (UFRN) - jessica_morais_moura@hotmail.com Bacharel em Gestão de Políticas Públicas - UFRN, Mestranda em Arquitetura e Urbanismo - PPGAU/UFRN, Subcoordenadora de Acompanhamento e Controle da Secretaria de Estado do Rio Grande do Norte do Planejamento e das Finanças Marcio Pereira Barreto (UFRN) - marciobarretojc@gmail.com Licenciado em Geografia - IFRN, Bacharel em Gestão de Políticas Públicas - UFRN, Mestrando em Arquitetura e Urbanismo - PPGAU/UFRN Ada Laís Soares de Morais (SEMURB) - ada.lais@hotmail.com Técnica em Turismo - IFRN, Bacharel em Gestão de Políticas Públicas - UFRN, Gestora de Políticas Públicas da Secretaria Municipal de Natal de Meio Ambiente e Urbanismo 1 Da Favelização à Reintegração: o Programa Minha Cas a Minha Vida como alternativa à efetivação do Direito à Moradia na cidade de Natal-RN. RESUMO As cidades brasileiras são marcadas por graves problemas no tocante à precariedade habitacional de inúmeras famílias que sobrevivem em péssimas condições de habitat. Assentamentos precários, favelas, loteamentos irregulares, aglomerações informais, seja qual for a denominação, o fato é que existem centenas de indivíduos que possuem os seus direitos constitucionais violados, vivendo em situações extremamente precárias. O presente trabalho apresenta como objeto de estudo a transformação habitacional causada na vida de aproximadamente 403 famílias que antes residiam em três assentamentos precários da cidade de Natal – RN (Assentamento Anatália, Assentamento 8 de Outubro e Assentamento Monte Celeste) e que foram recentemente beneficiadas com unidades habitacionais do Programa Minha Casa Minha Vida. O Residencial Vivendas do Planalto, conjunto do PMCMV construído em bairro vizinho ao dos assentamentos, apresenta-se como alternativa para solucionar a problemática que, só no território natalense, é composta por cerca de 70 assentamentos precários. O trabalho desenvolvido discute sobre relevantes questões referentes à provisão habitacional, considerando um estudo de caso da cidade de Natal para refletir sobre o processo de urbanização brasileiro e o cenário atual no que concerne a efetivação do Direito à Moradia. PALAVRAS-CHAVE: Precariedade habitacional; Direito à Moradia; Programa Minha Casa Minha Vida. INTRODUÇÃO A precariedade habitacional marca inúmeras paisagens das cidades brasileiras. Morando debaixo de lonas, tábuas, papelões e qualquer outro material que possa se transformar numa espécie de abrigo, vive um grande número de famílias no Brasil e, nesses locais, se observam condições mínimas de higiene e salubridade, quando elas existem. Esse é o cenário presente nas favelas, assentamentos informais e loteamentos clandestinos, onde moradores com direitos extremamente violados constituem suas famílias e desenvolvem suas atividades cotidianas. O presente trabalho busca refletir exatamente o contrário desse cotidiano: a transformação na habitação de aproximadamente 403 famílias beneficiadas pelo Programa Minha Casa Minha Vida na cidade de Natal-RN, e que agora deixam de ser moradoras de áreas impróprias e passam a residir no conjunto habitacional Vivendas do Planalto. Compreender o processo de reintegração promovido pelo programa, bem como discutir sobre o conceito de efetivação do Direito à Moradia, se faz indispensável no atual contexto de desenvolvimento das cidades e das políticas públicas de garantia dos Direitos Humanos. Nessa perspectiva, o trabalho é composto por quatro sessões, desencadeando um processo reflexivo que parte de uma discussão sobre a urbanização desenfreada e os reflexos para o setor habitacional, fazendo um registro histórico da composição 2 do déficit habitacional brasileiro e se apoiando em diversos estudos realizados principalmente por Erminia Maricato e Raquel Rolnik, especialistas no assunto. Posteriormente, inicia-se a discussão sobre a violação do Direito à Moradia na cidade de Natal-RN, apresentando informações e dados estatísticos que dizem respeito ao número de famílias que vivem em situações de risco, residindo em favelas, loteamentos ou assentamentos informais. Nesta sessão, há uma descrição das favelas que foram removidas para o conjunto do PMCMV, contemplando informações levantadas pelos órgãos municipais sobre a sua formação e o registro fotográfico com ilustrações e mapas temáticos do atual caso de Natal, no que diz respeito à habitação popular precária. Após esses capítulos iniciais que situam o leitor desde o processo de urbanização e formação dos aglomerados urbanos informais até a situação vivenciada na cidade de Natal, parte-se para a discussão mais relevante, onde apresenta-se o Programa Minha Casa Minha Vida como alternativa a efetivação do Direito à Moradia. Informações mais gerais sobre o programa são introduzidas a fim de se discutir sobre o estudo de caso de Natal-RN, através da construção do conjunto habitacional Vivendas do Planalto que promoveu o reassentamento de famílias que antes habitavam em três favelas do município (Assentamento Anátalia, Assentamento 8 de Outubro e Assentamento Monte Celeste). Nesse sentido, se faz fundamental compreender que a remoção dessas famílias para um local mais seguro e que oferece condições dignas de um habitar faz parte de uma iniciativa governamental que, atendendo às pressões sociais de uma população historicamente marginalizada, passou a promover alternativas para a provisão da casa própria, reintegrando famílias que antes viviam em condições muitas vezes sub-humanas. Tais reflexõessão sintetizadas nas considerações finais deste trabalho, reunindo elementos que sinalizam para uma avaliação bastante positiva desse espectro do programa MCMV, apesar dos inúmeros desafios que ele ainda tem há enfrentar. Como procedimentos metodológicos que nortearam a elaboração deste trabalho, esclarece-se que essa pesquisa advém do desdobramento de estudo anterior realizado por Moura (2013) que mapeou e identificou aspectos referentes a segregação de desterritorialização dos conjuntos habitacionais do Programa Minha Casa Minha Vida na Região Metropolitana de Natal. Além disso, o trabalho está relacionado com a aplicação de questionários em conjuntos do MCMV em outros municípios do Estado do Rio Grande do Norte, cumprindo as etapas de edital aprovado pelo Ministério das Cidades, o qual tem como título “Análise Estratégica e Qualitativa do Programa Minha Casa, Minha Vida: Mapeando Resultados Socioeconômicos e Definindo Procedimentos de Monitoramento, Avaliação e Retroalimentação”, e que ainda se encontra em fase de execução. Como a entrega do conjunto Residencial Vivendas do Planalto e a ocupação das casas ainda é bastante recente, o presente estudo contempla em sua essência questões teóricas, subsidiadas pela análise dos normativos técnicos do PMCMV e por informações municipais levantadas principalmente na Secretaria Municipal de Habitação, Regularização Fundiária e Projetos Estruturantes – SEHARPE e na Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo – SEMURB. 3 A abordagem participativa contempla os registros levantados pelos órgãos municipais, os quais divulgaram notas de entrevistas nas quais os moradores reassentados afirmam que essa transformação habitacional é uma luta que acabou com sentimentos de vitória. Tais abordagens contribuíram para que a pesquisa tivesse um viés mínimo participativo, uma vez que não se foi possível aplicar técnicas de aplicação de questionários e/ou realização de grupos focais, dada a ocupação recente do conjunto habitacional. Em suma, este trabalho visa fomentar a discussão sobre as recentes iniciativas de combate a habitação irregular precária, apresentando uma proposta implementada na cidade de Natal-RN e articulando autores que descrevem sobre o processo de urbanização e formação das cidades brasileiras, buscando, sobretudo, avançar na luta sobre a construção de cidades mais justas no tocante ao habitar e ao viver. 1 A URBANIZAÇÃO DESENFREADA E OS REFLEXOS NO SETOR HABITACIONAL Com o crescimento das cidades, acompanhado do intenso êxodo rural, a urbanização inevitavelmente não se deu de maneira gradual. Por isso, entre outros fatores, o planejamento urbano deixou lacunas no que concerne à produção de moradia e de infraestruturas de serviços urbanos indispensáveis a vivência da população. O contingente populacional menos favorecido economicamente, em particular o que saiu do campo para a cidade, não encontrou estruturas que possibilitassem o seu desenvolvimento humano pleno. Os indivíduos, não tendo condições de se manter nas estruturas formais das áreas mais centrais da cidade, a não ser, em certos casos, as áreas mais degradadas do centro antigo, passaram a ocupar terrenos na periferia e em favelas, muitas vezes impróprios para a moradia (VALENÇA, 2010). As cidades brasileiras enfrentam ainda nos dias atuais graves consequências dessa ocupação desenfreada do território. São inúmeras habitações consideradas irregulares e o número estimado pelo IBGE chega a um total de 11.425.644 de pessoas, o equivalente a 6% da população do país, que vive no Brasil em aglomerados subnormais (CENSO 2010). Além do mínimo de condições habitacionais, considera-se como aglomerados subnormais, as ocupações de locais públicos ou particulares quem sofrem com a ausência ou a inadequação de serviços públicos de qualidade, além de estarem distribuídas de maneira desordenada no território. Os dados revelados pela pesquisa do Déficit Habitacional Municipal no Brasil 2010, da Fundação João Pinheiro, em parceria com o Ministério das Cidades, apontou um déficit de 6,940 milhões de unidades habitacionais, classificando como “déficit” não somente a falta de casas, mas sim as inadequadas condições de habitabilidade e salubridade. Mike Davis (2006) na sua obra denominada “Planeta Favelas”, discorre sobre esse caótico cenário de intensa urbanização e, consequentemente, violação do direito à moradia. Num contexto de favelização e de empobrecimento das cidades, o autor informa que a população das favelas cresce na base de 25 milhões de pessoas a cada ano – conforme dados da UN-Habitat. No Brasil, o crescimento explosivo das cidades a partir dos anos 1980, originou as periferias abandonadas, mais tarde denominadas de favelas, e que surgiram quando as grandes levas de trabalhadores 4 ficaram sem alternativa de moradia. Maricato (2007) descreve o cenário causado pelo aumento do desemprego e da pobreza urbana, relatando que as imagens das cidades brasileiras deixaram o imaginário de modernos centros industriais que iriam superar o atraso e a violência e passaram a representar crianças abandonadas, epidemias, enchentes, desmoronamentos, tráfego, poluição do ar, poluição dos rios, favelas e violência. Trata-se da “Cidade (I)legal”, descrita por Valença (2008) e que é composta por ilegalidades, informalidades e irregularidades, termos que caracterizam as cidades contemporâneas, sobretudo no que se refere ao acesso à terra e violação do direito à moradia. Lefebvre em 1999 abordou esse processo, conceituando de Revolução Urbana as transformações ocorridas no território e assentando o seu pensamento na hipótese da urbanização completa da sociedade. O autor, partindo da concepção de reconfiguração das relações espaciais, esclarece que as cidades passam por um processo de implosão, marcado por uma intensa concentração de pessoas, de atividades e de serviços. Além disso, paralelamente a este processo, a cidade também passa a conviver com uma dinâmica de explosão, processo caracterizado pela fragmentação espacial e relacionado com a expansão do espaço urbano para territórios vizinhos, espraiando o tecido urbano. Desses conceitos, é possível extrair variadas implicações para as relações sociais, econômicas, políticas e ambientais, considerando que as intensas transformações no território urbano provocam a existência de diversos fenômenos, os quais, quando combinados, sintetizam a estruturação do espaço. Características, como a informalidade, a periferização, a segregação e a desterritorialização, são oriundas desse complexo processo de ocupação das cidades. Daí as cidades híbridas, que, conforme apontamentos de Abramo (2009, p.43), são compactadas e difusas, pois “produz uma estrutura urbana informal [e também formal] mais compacta nas áreas consolidadas e mais difusa nas franjas urbanas”. Essa perspectiva vem incorporando novas realidades, na medida em que se instaurou um intenso processo social de construção de uma cultura de direitos. A luta pelo direito à cidade e pelo direito à moradia surge em contraposição a esse modelo de urbanização excludente, que ao longo de décadas de urbanização acelerada absorveu elevados contingentes de pessoas pobres, sem, entretanto, integrá-las efetivamente às cidades. De acordo com levantamento realizado por Rolnik (2009), a partir do final dos anos 1970, moradores de assentamentos informais, periferias e favelas das cidades, aliados a setores das classes médias urbanas, consolidaram as bases de um movimento pela Reforma Urbana, o qual estava comprometido com a luta pela ampliação da cidadania, incluindo a melhoria de serviços públicos e investimentos em favelas e periferias, garantindo direitos básicos da população. Uma série de intervenções passaram a permear o cenário da construção de uma agenda pública, iniciando novas práticas e políticas de regularização e urbanização de favelas e a promulgação de legislações específicas, capazesde tratar dos direitos dessas demandas historicamente violados, tal como o caso da promulgação do Estatuto da Cidade (lei n. 10.257, em 2000), da Lei do Fundo Nacional de Moradia Social (lei n. 11.124, em 2005), além da criação do Ministério das Cidades em 2003, órgão responsável pela integração das políticas de habitação, 5 saneamento, desenvolvimento urbano e mobilidade urbana e do Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social – SNHIS, em 2005. Nesse sentido, observa-se a construção de um modelo de enfrentamento do déficit habitacional brasileiro, articulado com os três níveis de governo e que teve como trunfo mais recente o Programa Minha Casa, Minha Vida, implantado a partir de 2009. Porém, conforme ressalta Maricato (2011), “essas conquistas são relativamente recentes e as mudanças são lentas, já que envolvem uma cultura histórica – ou de raízes escravistas – de exclusão social”. Em síntese, apesar dos significativos avanços constitucionais, na prática, as cidades brasileiras ainda travam lutas cotidianas na busca da efetivação do direito à moradia, reflexas do processo de produção e apropriação do espaço urbano, o qual há décadas reproduz as desigualdades e as contradições sociais, conforme demonstram-se nas próximas sessões. 2 VIOLAÇÃO DO DIREITO À MORADIA: O PROCESSO DE FAVE LIZAÇÃO EM NATAL-RN A dinâmica urbana no município de Natal mostra-se bastante acelerada e reflete paisagisticamente e socialmente uma segregação territorial e desigualdade social que geram problemas diversos, que vão desde a omissão do Direito à Moradia digna, passando pela limitação ao acesso à bens e serviços públicos, segurança estrutural e tantos outros fatores que auxiliam fortemente na estagnação social de pessoas que historicamente já são marginalizadas. A cidade do Natal, capital do Estado do Rio Grande Norte, contava em 2013 com uma população de aproximadamente 854 mil habitantes, conforme dados levantados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE. No que se refere a o número de habitantes que residem em assentamentos precários, os estudos mais recentes realizados para a elaboração do Plano Local de Habitação Social de Natal, revelam que em 2008 haviam 92.942 habitantes morando em 70 assentamentos precários, distribuídos nas quatro regiões administrativas do município e vivendo em diversas situações de risco e vulnerabilidade. Tais informações permitem considerar que numa cidade que se encontra num núcleo metropolitano, sendo responsável por mais da metade do desenvolvimento econômico do Estado, existe uma significativa parcela da população que enfrenta diariamente as consequências da violação do direito à moradia. As ocupações irregulares do município se distribuem em todo o território, estando principalmente localizadas à margem do Rio Potengi, nas faixas de mangue - que são ambientes insalubre, sob risco de alagamento -, em assentamentos sob áreas de influência de torres de alta tensão elétrica, em áreas de domínio da via férrea e em Áreas de Proteção Permanente com fragilidades ambientais diversas. Em suma, os fatores de riscos que caracterizam a informalidade dessas ocupações são inúmeros, gerando graves consequências para uma população que não vê alternativas que permitam a transformação na sua realidade habitacional. O mapa abaixo especializa os 70 assentamentos precários da cidade do Natal, identificados pelo Diagnóstico do Setor Habitacional e que subsidia a elaboração do 6 Plano Local de Habitação Social de Natal. Os assentamentos precários delimitados no mapa foram identificados de acordo com levantamento de campo realizado nos anos de 2011 e 2012, por equipe de consultores do Idesplan, que utilizou como critério para a classificação de assentamento precário todas as metodologias existentes - Ministério das Cidades, Plano Municipal de Redução de Riscos - PMRR(2008) e Plano Diretor de Natal - PDN 082 (2007). Mapa 1 - Espacialização dos Assentamentos Precários de Natal – RN. Fonte: IDESPLAN 2013, Diagnóstico do Setor Habitacional. 7 Em virtude de um crescimento urbano consideravelmente acelerado, Natal apresenta intensos problemas socioambientais de exclusão e vulnerabilidade habitacional, existindo áreas com baixos níveis de habitabilidade e sérios problemas estruturais, à exemplo dos assentamentos Anatália, 8 de outubro e Monte Celeste, todos localizados no bairro Guarapes - Zona Administrativa Oeste do município - e que estão sendo objetos de análise desse trabalho, umas vez que passaram por um processo de transformação habitacional e social, através do reassentamento de famílias para um conjunto habitacional do Programa Minha Casa Minha Vida. Abaixo apresenta-se a caracterização desses assentamentos, identificando os principais fatores de risco que impulsionaram a recente realocação dessas comunidades, bem como a delimitação espacial e o registro fotográfico da precária situação habitacional. ASSENTAMENTO ANATÁLIA DE SOUZA ALVES As ocupações do assentamento urbano Anatália de Souza Alves, iniciaram em julho de 2010. Influenciadas pela busca por moradia, cerca de 270 famílias se instalaram de forma irregular no bairro do Guarapes, numa situação de extrema vulnerabilidade social que ilustra fortemente a violação ao direito a moradia, visto que além da ausência de uma condição habitacional digna, os moradores do assentamento sofriam com a dificuldade de acesso à saúde, educação, mobilidade urbana, saneamento adequado e tantos outros direitos básicos. As famílias que ali se instalaram e que tinham seus principais direitos violados moravam debaixo de lonas, tabuas e papelões, não tinham acesso à água potável, sendo a única fonte de acesso a este bem essencial à vida humana um tanque comunitário que não possuía nem mesmo tampa - o que presume a má qualidade dessa água e ambiente propício a reprodução do mosquito da dengue. Além disso, a rede de energia elétrica era improvisada, o que elevava intensamente o risco de incêndio na comunidade. Figura 1 – Energia Improvisada no Assentamento Anatália de Souza Alves. Fonte: Revista Natal, 2013. Tendo em vista que o direito habitacional não se limita a um lugar físico para morar e que a moradia adequada está inserida numa ampla estrutura, que contempla a acessibilidade a escolas, postos de saúde, saneamento adequado, segurança, mobilidade urbana, áreas de lazer, entre outros requisitos, percebe-se claramente 8 que os moradores do Assentamento Anatália tinhas esses direitos cotidianamente negados, se configurando em uma favela desumana e perigosa. ASSENTAMENTO 8 DE OUTUBRO Localizado em um amplo terreno do bairro Guarapes, ao lado do Conjunto Dinarte Mariz, o Assentamento 8 de Outubro foi erguido em uma área onde não existem riscos ambientais, apesar do elevado nível de precariedade das moradias construídas com materiais improvisados e extremamente inadequadas a dignidade humana, o que caracterizava o assentamento como “não passível de adequação”. Além disso, as ocupações também, não seguiam um traçado urbanístico e desta forma não era possível definir um sistema viário, o que contribuía ainda mais para a não consolidação do assentamento. Mapa 2 – Localização do Assentamento 8 de Outubro Fonte: IDESPLAN 2013, Diagnóstico do Setor Habitacional. Aos 780 habitantes do Assentamento 8 de outubro, não era omitido apenas o direito a habitação digna. A comunidade ora apresentada, também sofria com a falta de acesso a serviços básicos de saúde, educação, lazer, saneamento, transporte público, comércios, entre tantos outros direitos que quando cumpridos resguardam a vida digna do cidadão. 9 Figura 2 - Assentamento 8 de Outubro Fonte: IDESPLAN 2013, Diagnóstico do Setor Habitacional. Devido aos vários problemas estruturais apresentados, essa foi uma das comunidadesque famílias foram contempladas pelo programa MCMV, tendo uma completa transformação habitacional e que agora passarão a conviver num espaço que assegura as condições mínimas de vivência. ASSENTAMENTO MONTE CELESTE Também localizado no bairro do Guarapes, o assentamento Monte Celeste ocupa parte da Zona de Proteção Ambienta 4 – ZPA 4, a qual é formada por dunas que contribuem para a drenagem natural da área e para a manutenção da vazão e perenidade do rio Jundiaí/Potengi e a do rio Pitimbu. Além de ocupar uma ZPA, a comunidade em questão também está inserida numa faixa de domínio de Alta Tensão e está sob risco de deslizamento – visto sua ocupação ser em solo dunar. Devido a sua localização, a comunidade sofria com a dificuldade do acesso de veículos, que era limitado e afetava diretamente nos serviços de coleta de lixo, o que causava acúmulo de resíduos sólidos e consequentemente tornava o ambiente insalubre, o que contribuía fortemente com o aumento de riscos a saúde dos moradores. Além disso, e assim como nos assentamentos precários apresentados anteriormente, está ocupação irregular foi situada distante da área urbanizada mais próxima e não tinha acesso aos principais serviços públicos. Figura 3 – Assentamento Monte Celeste. Fonte: IDESPLAN 2013, Diagnóstico do Setor Habitacional 10 Mapa 3 – Localização do Assentamento Monte Celeste. Fonte: IDESPLAN 2013, Diagnóstico do Setor Habitacional. Entre tantos problemas cotidianos, os moradores do Assentamento Monte Celeste, ainda tinham que conviver com a ausência de abastecimento de água, esgotamento sanitário e iluminação pública, o que se faz perceber a total falta de condições de habitabilidade, salubridade e principalmente dignidade humana que os moradores enfrentavam nesse assentamento irregular. Diante das informações expostas, fica clara a fragilidade habitacional existente na capital do Rio Grande Norte. São inúmeras família carentes de habitação digna, saúde, educação, segurança, vivendo em condições insalubres e desumanas. São 70 assentamentos precários com moradores que buscam o direito à moradia e que, ao serem marginalizados e esquecidos, “sobem o morro”, “ocupam lagoas”, “adentram o mangue” e vivem em áreas de risco com o simples intuito de terem um lugar para se abrigar. Nesse contexto, cabe, no entanto, refletir sobre alternativas de transformação dessa realidade, tal como a recente reintegração de famílias oriundas desses assentamentos e que foram beneficiadas com um programa habitacional de construção da casa própria que tem colaborado com a alteração desse cenário, proporcionando para essas famílias um novo horizonte, com direitos mais respeitados e uma sociedade mais justa, conforme se aborda adiante. 11 3 O PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA COMO ALTERNATIVA PARA EFETIVAÇÃO DO DIREITO À MORADIA: ESTUDO DE CASO DO CONJUNTO VIVENDAS DO PLANALTO – NATAL/RN “É uma conquista. Uma vitória de muito tempo de luta. Aqui tudo é difícil. A gente carregou muita água. A energia vivia num ‘corta, corta’. E o pior era a falta de segurança”. (Ex-moradora do Assentamento Anatália e beneficiária do PMCMV em entrevista à Prefeitura Municipal de Natal, em maio de 2014). As precárias condições habitacionais de famílias que vivem em assentamentos informais marcam um profundo cenário de violação do Direito à Moradia. Até aqui, foram apresentadas reflexões sobre as situações atuais das cidades brasileiras, ilustrando principalmente o caso do município de Natal. O fato é que essa característica não é peculiar de apenas um município brasileiro, mas sim da maioria das cidades que sofreram com um processo de urbanização desenfreada, aliado à um longo período de omissão de intervenções estatais no território. A moradia adequada foi reconhecida como direito humano em 1948, com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, tornando-se um princípio universal, aceito e aplicável em todas as partes do mundo como fundamental para a vida das pessoas. Vários tratados internacionais após essa data reafirmaram que os Estados têm a obrigação de promover e proteger este direito, tal como a Constituição Brasileira de 1988 que em seu artigo 6º estabelece: “Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.” Mais que um teto e quatro paredes o direito à moradia integra o direito a um padrão de vida adequado. Não se resume a apenas um teto e quatro paredes, mas ao direito de toda pessoa ter acesso a um lar e a uma comunidade, seguros para viver em paz, dignidade e saúde física e mental. Em contraposição a esses significativos avanços na esfera legislativa, a situação atual ainda é permeada por uma extrema violação dessa conquista. No Brasil, durante décadas, as políticas habitacionais não foram capazes de promover transformação habitacional para as classes de renda mais baixas, ficando a cargo da própria população a tentativa de mudança dessa realidade. Sinalizando para uma nova trajetória da política habitacional brasileira, o Programa Minha Casa, Minha Vida surge no ano de 2009, sendo aprovado pela Medida Provisória nº 459, publicada em 25 de março de 2009, posteriormente convertida na Lei nº 11.977 de 7 de julho de 2009 e pelo Decreto no 6.962, de 17 de setembro de 2009. As conquistas consolidadas até então no Plano Nacional de Habitação – PLANHAB (2008) serviram como um dos arcabouços para a implementação do referido programa que, em seu início, tinha como meta a construção de um milhão de moradias, tendo para isso alocado aproximadamente R$ 34 bilhões de recursos. O PMCMV estrutura-se em três faixas de renda (com diferentes modalidades entre elas), sendo a primeira destinada a famílias com renda mensal inferior a R$ 12 1.600,00, que podem receber subsídios de até 96% do valor do imóvel. Para a segunda faixa, no segmento de renda familiar acima de R$ 1.600 até R$ 3.275, os juros cobrados são menores que os de mercado e os subsídios podem chegar a R$ 25 mil por família, sendo que, quanto menor a renda familiar, maior o valor subsidiado. Na terceira faixa, a partir da renda familiar de R$ 3.275 até R$ 5.000, não existe subsídio no valor do imóvel, mas as taxas de juros também são menores que as de mercado. Segundo informações do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada - IPEA (2012, p.4), “O advento do MCMV institui um novo momento no quadro institucional municipal, o qual está associado à produção pública de habitação de interesse social”. Levando em consideração esses fatores, aponta-se que o programa habitacional Minha Casa, Minha Vida tem como objetivo desde o seu início, promover o acesso à moradia nas áreas urbanas e rurais, através da construção, reforma e aquisição de imóveis para as famílias em área de déficit habitacional. Sem considerar os inúmeros desafios do programa, tais como o fator de localização das moradias construídas, o que se pretende discutir é a iniciativa de implementação de um programa capaz de oferecer condições adequadas de moradia para famílias que viviam em situações extremas, tais como os moradores dos assentamentos informais tratados neste trabalho. Para a seleção dos beneficiários das unidades habitacionais do MCMV – faixa 1, são levados em consideração uma série de critérios, os quais permitem selecionar indivíduos que tem os seus direitos violados, tais como ser maior de 18 anos ou emancipado, não ser proprietário de imóvel, ser residente e domiciliado na localidade e possuir renda familiar entre zero e três salários mínimos. No caso do Residencial Vivendas do Planalto, conjunto do PMCMV construído no município de Natal-RN e que contemplou unidades habitacionais para famílias residentes em três assentamentos, as informações coletadas na Secretaria Municipal de Habitação, Regularização
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