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UNIVERSIDADE AGOSTINHO NETO FACULDADE DE LETRAS Departamento de Língua e Literaturas em Língua Portuguesa NEOLOGISMOS EM “UNDENGUE”, DE JACINTO DE LEMOS: PARA UM GLOSSÁRIO TRABALHO DE FIM DE CURSO DE LICENCIATURA APRESENTADO PARA A OBTENÇÃO DO GRAU DE LICENCIADO EM LÍNGUA E LITERATURAS EM LÍNGUA PORTUGUESA Por: João Fernando André Tutor: Jordão Buaza Caculo, Me. Luanda/2019 NEOLOGISMOS EM “UNDENGUE”, DE JACINTO DE LEMOS: PARA UM GLOSSÁRIO Por: João Fernando André Tutor: Jordão Buaza Caculo, Me. Luanda/2019 ÍNDICE DEDICATÓRIA………...…………………………….…….……………..………iii AGRADECIMENTOS………………………..…………..……………….………iv RESUMO……....…………………….……………………...………………...…….v ABSTRACT…....…………………….……………….…………….………...……vi ÍNDICE…....…………………….……………….………………..……...………..vii 0. INTRODUCÃO…………….……………….………………....……………….1 0.1. Razão da escolha do tema…. …………...……….………………..…………….1 0.2. Problema….…………………………. ……………………...………………….1 0.3. Objectivos……………………………. ……………..………………………….1 0.3.1. Geral….…………………………………...………………………….……….2 0.3.2. Específicos….……...………………………………………………………….2 0.4. Metodologia……………….……….……………..……………………………..2 0.5. Relevância do estudo……………...…………..………………………………...3 0.6. Delimitação do estudo………..…………..………...…………………………...3 0.7. Estrutura do Trabalho………….…..…………..…………………...…………...4 0.8. Dificuldades encontradas………..…………………..……………...…………...4 0.9. Estudos anteriores………...……..…………………..………………...………...4 CAPÍTULO I – O ESCRITOR E A SUA OBRA «UNDENGUE» ...............……5 1.1.Escritor…………………….…...……………...……………...…….………........5 1.1.1.Atribuições honrosas……………..………….……………...…….…………...5 1.2. Obras Publicadas………..…………….………………...……...……………….5 1.3. Resumo da obra ‘‘Undengue’’………..……..……….……....…….……….…..6 CAPÍTULO II – FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ……………………………..7 2.1. Diferença Palavra vs Termo....………………………….….……..…….......…..7 2.1.1. Palavra………..………………. ……..………..…………….………….....….7 2.1.2.Termo.......…………………..…………...…..………………….…..…….........7 2.2. Conceitos de neologia e neologismo ……...……………..………………...…...8 2.2.1. Neologia……....……………………………............................................…….8 2.2.2. Conceito de neologismos………...…………..……….……………………….8 2.2.2.1. Tipos de neologismos…………….…..…………………………………….9 2.3. Criação de neologismos…………..……………………….………………...….9 2.3.1. Neologismo de forma …………………………………..….………...….…..10 2.3.1.1. Derivação……………………………………..……………………………10 2.3.1.2. Composição………………………………….…………………………….11 2.3.1.2.1. Compostos por justaposição……..…………..…………………………..11 2.3.1.2.2. Compostos por aglutinação…………………...….…..……………….…11 2.3.1.3. Hibridismos………..………………………….…………………………...12 2.3.1.4. Empréstimos……………………………..…………………………..…….12 2.3.2. Neologismo semântico…………………………..…………………………..13 2.4. Neologismos na Literatura……………………..………………………………14 2.4.1. Lexicalização……………...…………. ……………...……………………...14 CAPÍTULO III – APRESENTAÇÃO, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DOS DADOS………………………..………………......………..…..………………….17 3.1. Conceito de corpus………….………………………...….……………………17 3.2. Constituição do Corpus………………….…………...…..……………………17 3.3. Análise e interpretação dos dados …...…..……….……………...……………18 CAPÍTULO IV – GLOSSÁRIO …………………….…………………………...28 4.1. Conceito de glossário…………………………..……………….……………...28 4.2. Estrutura de glossário…………………………….…………….……………...28 4.2.1. Modelo de glossário ……………………..…………………………………..29 CONCLUSÃO……………………………..……………….……………………...45 SUGESTÕES ……………………………….…………..………………………...46 BIBLIOGRAFIA………………………….………...…..…………………...……47 DEDICATÓRIA Aos meus pais: Francisco Domingos André e Engrácia Fernandes AGRADECIMENTOS “Só conta história quem sofre.” (Engrácia Fernandes, minha amada mãe) O meu sincero obrigado ao Mestre Jordão Caculo, aos professores do Departamento de Língua e Literaturas em Língua Portuguesa da Faculdade de Letras da Universidade Agostinho Neto e a todos os meus professores do Ensino Geral. A todos eles devo, acima de tudo, a descoberta de que “as árvores, os rios, as pedras são cousas que verdadeiramente existem”. O meu muito obrigado também aos meus colegas, àqueles que percorreram este caminho comigo e que viveram com a mesma intensidade esta aventura, àqueles que já o tinham percorrido e que me ajudaram a perceber quais os trilhos certos e, sobretudo, ao Gonçalo Domingos Kizela, meu irmão e amigo: foi a ele, entre estes, que coube a maior fatia de paciência para me aturar e quem mais colaborou com o que fiz. Nada disto teria ainda sido possível sem a ajuda do INAGBE (Instituto Nacional de Gestão de Bolsas de Estudos) e da minha família. Aos meus pais, aos meus irmãos, aos meus tios, o meu maior obrigado. Os meus sinceros agradecimentos também àqueles que me são mais próximos; ao Joaquim Vieira Dias, pelo apoio; ao Manuel da Costa Gil; à Jandira, claro, por tudo, mesmo tudo. RESUMO Este trabalho científico, «Neologismos em “Undengue”, de Jacinto de Lemos, para um glossário», tem o intento de descrever e classificar, do ponto de vista morfossemântico, os neologismos encontrados na obra “Undengue”; destacar o processo de formação de palavras mais produtivo na referida obra, resumir a mesma e propor a constituição de um glossário. Assim, com base nos pensamentos dos teóricos já conhecidos no estudo dos neologismos e outros recursos de formação de palavras em língua portuguesa, ficou sabido que os neónimos, naquela obra, são símbolo de angolanidade e dão expressividade a ela. Também ficou patente que os neologismos mais frequentes, nela, são os criados por empréstimo, propriamente, os kimbundismos, ilustrando, desta feita, a relação entre a lexicologia e a literatura. Palavras-chave: Neologismo, Undengue, Expressividade, Angolanidade ABSTRACT This work, «Neologisms in“Undengue”, of Jacinto de Lemos, for a Glossary», has the aim of describe and classify, according to morphology and semantics, the neologisms found into the work “Undengue”, summarize it, and propose the constitution of a glossary. So, based on the theoretical regarding in studies of neologisms and another resources of word formation in portuguese language, remain known that the neologisms, in that work of art, are symbol of angolanity and they give expressiveness to that book. Also remain evident that the most frequent neologisms, in the work, are the servants starting from the borrowing resource, in particular, the kimbundisms, illustrating, that way, the relationship between Linguistics and Literature. Key-words: Neologisms, Undengue, Expressiveness, Angolanity 0. INTRODUÇÃO A língua é um sistema aberto. Na medida em que o tempo vai passando e vão surgindo novas realidades, ela permite que se lhe insiram novos vocábulos no seu repositório lexical. O léxico de uma língua pode ser enriquecido com a criação de novas palavras. Ora, as novas unidades lexicais podem surgir através da utilização dos processos morfológicos de criação de palavras que a língua fornece ou, também, por meio de outros processos não-morfológicos. Desta feita, a partir do uso artístico de novos vocábulos, fazemos a nossa monografia, isto é, por meio dos neónimos que existem na obra literária «Undengue», do escritor angolano Jacinto de Lemos. 0.1. Razão da escolha do tema Sendo amantes da linguística e da literatura, queríamos fazer um estudo que unisseas duas áreas de conhecimento. Assim, pensamos que o campo da neologia seria o melhor para o nosso intento. Ora, lemos a obra «Undengue» e procuramos fazer uma recolha dos neologismos que nela se encontram para, então, resumirmos a mesma e analisarmos as unidades neológicas mais frequentes nela do ponto de vista morfossemântico. 0.2. Problema O léxico de uma língua actualiza-se com novas palavras. Estas novas palavras podem surgir da sociedade ou, também, por meio dos escritores, como podemos constar na obra «Undengue». Assim, vamos apresentar os neologismos mais frequentes na referida obra e sugerir a criação de um glossário. Porém, antes, vamos procurar dar resposta à seguinte questão de partida: - Qual é o processo de formação de palavras mais produtivo entre as criações de neónimos em «Undengue»? 0.3. Objectivos 0.3.1. Geral - Entender os processos morfossemânticos existentes na construção dos neologismos. 0.3.1. Específicos - Resumir a obra onde são retirados os neologismos; - Salientar os processos de formação de palavras mais produtivos na referida obra literária; - Constituir um glossário com os neologismos mais frequentes em aquela obra. 0.4. Metodologia A recolha de dados foi feita com base na frequência dos neónimos na obra, ou seja, tendo em conta o número de vezes que cada nova unidade lexical foi utilizada pelo escritor de «Undengue». No que concerne à análise dos dados obtidos no corpus da nossa monografia, usamos o método indutivo. Neste método, «Os pesquisadores tendem a analisar a informação de uma forma indutiva, desenvolvendo conceitos e chegando à compreensão dos fenómenos a partir dos padrões convenientes de recolha de dados. Não procuram informação para verificar hipóteses». Utilizamos, ainda, corpus de exclusão para a análise dos dados, como o Dicionário Electrônico Houaiss da Língua Portuguesa 2.0a e o Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa, porque estas obras serviram de meios para verificarmos se a acepção utilizada pelo escritor do livro já está atestada. Ora, para darmos sustento à nossa monografia, recorremos à pesquisa bibliográfica ou documental. Esta «assenta na busca de ferramentas bibliográficas para a explicação do assunto em causa e visa seleccionar, tratar e interpretar informação bruta existentes em suportes estáveis com o objectivo dela extrair algum sentido, ou seja, este tipo de pesquisa pressupõe recolha de testemunho de todo um trabalho antes feito, onde inserimos algum valor aumentado com fito de que futuros pesquisadores possam desempenhar o mesmo papel». 0.5. Relevância do estudo Em o nosso entender, o estudo da obra «Undengue» é de tamanha importância, porquanto não existe, de acordo com as nossas investigações, um estudo sobre as neologias desta benquista obra. Desta feita, é relevante fazer este estudo, pois uma obra literária tem o condão de ser um local de propagação e repositório de neónimos. 0.6. Delimitação do estudo O estudo baseia-se na obra «Undengue», do escritor angolano Jacinto de Lemos, cujo teor é sobre a adolescência e a juventude de Janeiro, personagem principal da obra, e as vivências nas periferias de Luanda. 0.7. Estrutura do trabalho No que concerne à estrutura do nosso trabalho, fizemos uma abordagem apresentada em duas partes: - Na primeira, encerramos os elementos pré-textuais: a dedicatória, os agradecimentos, o resumo do trabalho, e o índice. - A segunda parte guarda quatro capítulos: o primeiro é reservado ao autor e a sua obra como fonte do nosso objecto de investigação. - O segundo capítulo é reservado à fundamentação teórica de alguns conceitos ligados ao nosso tema, como: o conceito de palavra, termo, neologia, neologismo, tipos de neologismos, etc. - O terceiro capítulo encerra a apresentação dos neologismos encontrados na referida obra, o corpus do nosso trabalho e, em seguida, a análise e interpretação dos dados. - O quarto capítulo encerra a proposta de elaboração de um glossário com os neologismos encontrados em «Undengue» e, mais para lá, a conclusão e a bibliografia. 0.8. Dificuldades encontradas Durante a feitura do nosso trabalho, deparamo-nos com dificuldades de encontrar falantes que tenham o kimbundu como língua materna que nos queriam ajudar a compreender, com naturalidade, os empréstimos, kimbundismos, que o escritor Jacinto de Lemos utiliza na composição do seu romance e, por outro lado, deparamo- nos com a escassez de dicionários bilingues, isto é, kimbundu-português. 0.9. Estudos anteriores No campo dos estudos das neologias em obras literárias, temos alguns estudos, como o de COSTA, João (2010), «Análise de Neologismos em Mia Couto: a utilização da derivação e o caso particular da amálgama» (Porto). E o de JÚLIO, António Gunza (2016), «Neologismos em ‘‘O Cão e os Caluandas’’ de Pepetela» (Luanda). Porém, como já salientamos, não encontramos um estudo sobre as neologias da obra literária «Undengue», do escritor angolano Jacinto de Lemos. CAPÍTULO I – O ESCRITOR E A SUA OBRA «UNDENGUE» 1.1. Escritor Jacinto de Lemos nasceu em Ícolo e Bengo, a 2 de Janeiro de 1961, fez os seus estudos primários e secundários na mesma localidade. Sobre Jacinto de Lemos, diz o crítico literário Kanjimbo que a sua narrativa caracteriza-se pelo modo como apresenta a paisagem social suburbana luandense e as personagens que tipificam o seu universo social, feito, nomeadamente, de humor e relações conflituosas, destacando-se entre os intervenientes crianças, mulheres e homens ociosos ou marginais. Do ponto de vista da linguagem, os diálogos, a narração dos factos, e a descrição dos ambientes em que interagem aquelas personagens, são os aspectos mais visíveis. Por seu turno, o escritor Cristóvão afirma que Jacinto de Lemos é um verdadeiro operário da palavra, um griot, um prosador de palavras simples, límpidas, fluindo como a água da fonte. Ele considera o belo, o ligeiro, cativante e recriado discurso em prosa, assente no linguajar popular. 1.1.1. Atribuições honrosas Como escritor, Jacinto de Lemos teve as seguintes atribuições honrosas: - Menção honrosa do Prémio Sonangol de Literatura pela obra‘‘Undengue’’, em 1986; - Prémio Sonangol de Literatura pela obra ‘‘A Dívida da Peixeira’’, em 2002. 1.2. Obras Publicadas O escritor publicou as seguintes obras: 1. Undengue (1989); 2. O Pano Preto da Velha Mabunda (1997); 3. A Dívida da Peixeira (2001); 4. Chico Nhô (2008). 1.3. Resumo da obra «Undengue» Na obra «Undengue», Jacinto de Lemos narra a história de um homem, desde a sua infância (como o diz o título em kimbundu) até a juventude, as suas aventuras, a sua fase de escolarização, e o seu namoro com uma jovem, Joaninha. No meio das aventuras de Janeiro (personagem principal), o escritor consegue fotografar a periferia de Luanda dos anos 1980 a 1986, ocomportamento daspessoas que habitavam as zonas que perfaziam a periferia de Luanda, as brigas entre as peixeiras e os jovens e, também, o comércio nos mercados informais e o escritor procura denunciar o hábito que os jovens, naquela época, tinham: de ir receber feitiço para vencerem as lutas e serem respeitados pela população das suas zonas e das zonas circunvizinhas. Trata-se de uma obra que marca um tempo, uma sociedade e, em particular, a vida de dois jovens enamorados: Janeiro e Joaninha. Joaninha, moça mulata que era desejada por muitos jovens do seu bairro, e Janeiro, um jovem brincalhão, atrevido e inteligente. Encerrado o primeiro capítulo, onde mostramos o escritor e a obra «Undengue», a biobibliografia e o resumo da obra «Undengue», fonte de obtenção do nosso objecto de estudo, pensamos que podemos partir para o próximo capítulo, onde vamos fundamentar a nossa monografia com conceitos que apoiarão a análisedos dados atinentes ao nosso tema: ‘‘Neologismos em «Undengue», de Jacinto de Lemos: para um Glossário’’. CAPÍTULO II – FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA Aqui, vamos apresentar alguns conceitos que servirão de suporte para a nossa monografia, tendo em conta a visão de alguns estudiosos conhecidos no campo da neologia. 2.1. Diferença Palavra vs. Termo 2.1.1. Palavra Villalva (2007:11) afirma que a definição de palavra é uma questão complexa e tem dado origem a variados debates, dado que os diversos níveis de análise linguística usam critérios e procuram respostas não necessariamente coincidentes. Em o nosso entender, a palavra é todo o item linguístico com um lado sono, outro físico e que se refere a uma realidade do mundo extralinguístico. Ora, na visão da mesma estudiosa (2007:11), para a morfologia, as palavras são estruturas, ou seja, são formas analisáveis em unidades menores a que se dá o nome de constituintes morfológicos. Segundo Undolo (2019:47), o termo palavra, em rigor, deverá designar uma unidade significativa, podendo, pelo menos, ser resultado da associação entre morfema lexical e morfema gramatical. O autor afirma ainda que aquelas que são indivisíveis chamam-se palavras simples. E as divisíveis em partes menores chamam-se palavras complexas. Nascimento e Pinto (2006:18) salientam que as palavras não são as pessoas, as coisas, os factos, as ideias, os sentimentos, as intenções; são, isso sim, os seus substitutos, os seus símbolos, sinais ou signos 2.1.2. Termo Os neónimos e os termos, unidades lexicais especializadas das ciências e das técnicas, representam os conceitos, que, em muitas áreas do conhecimento, não têm um carácter internacional, mas são sensíveis à cultura de um determinado país ou comunidade (cf. Lino et. al., 2010). De acordo com Cíntia (2016), o Termo é a unidade linguística num conceito oracional. Segundo a nossa visão, baseada em alguns autores, se, por um lado, a palavra é polissémica, do outro lado, o termo é monossémico, apresenta um significado específico em uma determinada área técnica, científica ou artística. 2.1. Conceitos de Neologia e Neologismos 2.2.1. Neologia Porque a língua não é estática e os falantes estão em constantes mudanças de pensamentos e, com o passar dos tempos, vão surgindo novas realidades no mundo extralinguístico, têm surgido as novas unidades lexicais. Para o Dicionário Priberam da Língua Portuguesa (2013), a neologia é a criação ou o uso de palavras novas ou de novas acepções. Por outro lado, o dicionário define-a também como o estudo dessas palavras ou dessas acepções novas. Na visão do Dicionário Online de português (2009), a neologia é (i) o processo através do qual novas unidades léxicas (palavras, expressões, vocábulos) são formadas, utilizadas ou empregadas e (ii) o registro de novas unidades léxicas, de novas palavras, expressões. Pensamos que o termo neologia surge da língua grega. À partida, une-se o elemento néos (novos) à unidade logos (discurso, tratado ou ciência). De aí funde-se o termo neologia, significando o estudo de os neónimos de forma ou de sentido. 2.2.2. Conceito de Neologismo Por ser uma realidade dinâmica, a língua está em constante renovação, através, nomeadamente, da criação de novos vocábulos que, assim, enriquecem o seu léxico. Estes vocábulos novos são chamados neologismos. (cf. Estrela, 2013:219). Nos dizeres de (Villalva, 2008:50), neologismos são, pois, palavras que, num dado momento da existência de uma língua são consideradas palavras novas, como telemóvel, cujo aparecimento no final do século xx motivou a integração da palavra no léxico do Português. Assim, com base nos dizeres destas autoras, podemos inferir que todas as palavras que integram o léxico de qualquer língua num determinado momento, quer sejam criadas ou emprestadas de outras línguas, acabam por ser consideradas como neónimos, pois não existem desde a génese da língua. 2.2.2.1. Tipos de neologismos A formação de neologismos ocorre por meio de processos morfológicos e, não- morfológicos. Tendo em conta tais mecanismos, pode-se encontrar diversificados tipos de neónimos na obra literária «Undengue», do escritor angolano Jacinto de Lemos. Sendo assim, abaixo, apresentamos vários tipos de neologismos nas palavras de Vitorino (2018): a) Neologismo lexical, aquele que surge quando nós damos um novo conceito a uma determinada palavra. b) Neologismo semântico, o que surge quando atribuímos uma nova dimensão linguística a uma palavra já existente. c) Neologismos sintático, o que dá uma nova significação a um conjunto de palavras, expressões. d) Neologismo literário, o que está dentro das linguagens poéticas, mais utilizados pelos poetas e) Neologismo popular, o que é criado pelas populações de dadas regiões, o mais comum, utilizado na linguagem popular. f) Neologismo completo, o que é criado dentro da língua. g) Neologismo incompleto, aquele que é muito próximo do neologismo semântico, 2.3. Criação de Neologismos Estrela (2013:220) dá-nos a seguinte lição sobre a criação de neologismos: Neologismo é, não só uma palavra ou expressão de criação recente, mas também uma nova acepção atribuída a uma palavra já existente no léxico, que, assim, sofre um alargamento semântico. A criação de neologismos é inevitável e até desejável, quando é necessário nomear uma nova realidade, mas deve fazer-se no respeito pela estrutura própria da língua. Os neologismos só devem ser aceites, quando ocupam um campo semântico até aí vazio. A prazo, a tendência normal dos neologismos é a da sua integração total na língua, à medida que o seu uso se vai tornando mais frequente e o falante vai, assim, perdendo a sensação de estranheza que, de início, tais palavras novas lhe provocavam. Actualmente, por exemplo, já não é fácil conservar a consciência de que automóvel ou aeroporto tenham sido neologismos. A condição de neologismo de uma dada palavra representa uma das facetas mais transitórias de uma língua. Torna-se, por isso, difícil, marcar, num dado momento, o que é neologismo, o que já deixou de o ser e o que está a tentar entrar na língua, mas, provavelmente, irá ser rejeitado. 2.3.1. Neologismo de forma Do ponto de vista da construção da palavra, podemos destacar dois processos: a composição e a derivação. Sobre estes dois processos de formação de palavras morfologicamente, Bechara (2009) diz que a composição consiste na criação de uma palavra nova de significado único e constante, sempre e somente por meio de dois radicais relacionados entre si. E a Derivação consiste em formar palavras de outra primitiva por meio de afixos. 2.3.1.1. Derivação No que diz respeito à derivação, Estrela et. al. (2013) consideram que as palavras derivadas formam-se por sufixação, por prefixação, por derivação regressiva e por derivação imprópria. À luz dos pensamentos de Pinto (2007), chamam-se palavras derivadas as que se formaram a partir de outra, à qual se juntou um ou vários prefixos e sufixos. Podemos confirmar as teorias desses autores com as seguintes palavras: (1) sociável (2) intramuscular (3) abotoar (4) o jantar Porém, Bechara (2009) explica que na língua literária e técnica, os derivados formam-se dos radicais de tipo latino em vez dos de tipo português quando este sofreu a evolução própria da história da língua: áureo (e não ouro), capilar (e não cabelo), aurícula (e não orelha). Os afixos se dividem, em português, em prefixos (se vêm antes do radical) ou sufixos (se vêm depois). Daí a divisão em derivação prefixal e sufixal. Derivação sufixal: livraria, livrinho, livresco. Derivação prefixal: reter, deter, conter. Matos (2012) defende a ideia de que a derivação é um processo de formação de palavras a partir de outras já existentes onde as palavras derivadas estabelecem com apalavra base uma relação semântica e formal. 2.3.1.2. Composição Segundo Villalvaat. al. (2003:45), a composição é um processo de formação de palavras que consiste na concatenação de duas ou mais variáveis lexicais, que podem ser radicais ou palavras. Noslen (2016) entende que a composição é um processo de formação de novas palavras, unindo palavras que já existem. Segundo o mesmo autor, normalmente, a composição trabalha com dois radicais. Há dois tipos de composição: por justaposição e por aglutinação. Para Matos (2012), a composição é o processo de formação de palavras em que se associam duas ou mais formas de base. 2.3.1.2.1. Compostos por justaposição Para Pinto (2006:63), a composição por justaposição acontece quando os elementos constituintes continuam a manter uma independência de acentuação, mas o significado já é diferente do que tinham inicialmente. Na visão de Noslen (2016), na composição por justaposição, nenhuma das palavras formadoras perdem fonemas ou letras.Como podemos ver em (6), (7) e (8): (6) passatempo (7) girassol (8) guarda-chuva 2.3.1.2.2. Compostos por aglutinação Nos dizeres de Borregana (2003), são compostas por aglutinação as palavras em que os dois termos se unem tao estreitamente que ficam sujeitas ao mesmo acento – o da segunda. Por outro lado, o estudioso Noslen (2016) afirma que na aglutinação pelo menos uma das palavras formadas perdem fonemas ou letras.Como se pode constatar em (9), (10) e (11): (9) planalto (10) planície (11) vinagre 2.3.1.3. Hibridismos Os hibridimos são as palavras formadas por elementos de línguas distintas. Eles surgem por causa do contacto de povos que falam línguas diferentes ou, normalmente, em países onde o multiguismo existe. Segundo Chicuna (2015:59), entende-se por híbridos as unidades lexicais compostas por elementos provenientes de línguas diferentes. 2.3.1.4. Empréstimos Villalva (2008:64) afirma: ‘‘A introdução de palavras de uma língua de origem numa língua alvo é um processo antigo e frequentemente atestado. A recepção destas palavras estrangeiras é que nem sempre é idêntica. Não é raro encontrar gramáticos e falantes que criticam ou rejeitam o uso de palavras não vernáculas, tendo até termos como estrangeirismo, decalque ou galicismo uma certa conotação pejorativa. Assim se explica que o uso de uma palavra como detalhe (do Francês détail) ou gafe (do Francês gaffe) seja desaconselhado por puristas, que recomendam, em sua substituição, pormenor e deslize, respectivamente. Por vezes, a introdução de empréstimos suscita mesmo polémica, dado que se trata de um processo relacionado com a história social da comunidade linguística que os veicula e daquela que os acolhe.’’ Segundo o Dicionário electrônico Houaiss da língua portuguesa 2.0a (2007), o empréstimo é a incorporação ao léxico de uma língua de um termo pertencente a outra língua [Dá-se por diferentes processos, tais como a reprodução do termo sem alteração de pronúncia e/ou grafia (know-how), ou com adaptação fonológica e ortográfica (garçom, futebol).] No que concerne àgénese dos empréstimos, Sablayrolls (ApudChicuna, 2015) aventa a seguinteteoria: «le classment des emprunts se fait solvente selon les sources auxquelles les lexies sont empruntéens. Il ne faut cependant pas confrondre langue d´origine de la lexie et langue à laquele la langue emprunteuse l´emprunte: certaines lexies passent par plusieurs langues». Na visão de Villalva (2008:65), a ocorrência de empréstimos é, no entanto, um fenómeno incontornável e muitas vezes difícil de evitar, dada a inexistência de léxico autóctone com idêntico valor referencial. A sua introdução pode ocorrer por via directa ou pode ser mediada por uma outra língua; e pode ser objecto de (maior ou menor) conformação fonética e morfológica ao Português tomando como base a realização fonética da palavra na língua de origem ou a sua forma gráfica. Os empréstimos que transitam directamente são empréstimos directos, como os seguintes: Castelhano: mantillaPortuguês: mantilha Os que são introduzidos na língua de chegada por intermédio de uma outra língua são empréstimos indirectos. É o que se verifica nos seguintes casos: Grego: pharmakéiaLatim: pharmaciaPortuguês: farmácia Atenta-se que a conformação dos empréstimos às propriedades morfológicas e fonológicas do Português e, consequentemente, a sua realização fonética e o modo como são grafados, não são sistemáticas (ibidem). Verificam-se hesitações tão mais frequentes quanto mais recente for a introdução do empréstimo, relacionadas com o facto de a adaptação poder privilegiar a sonoridade da palavra de origem (alterando-se a grafia na forma de chegada) ou a sua forma gráfica (alterando-se a pronúncia e fazendo apenas alguns ajustes na grafia da forma de chegada): Inglês - lunch>lanche As propriedades gramaticais das palavras, nomeadamente o género dos nomes, também podem ser modificadas. É frequente que o género atribuído a um empréstimo seja o masculino, mesmo que na língua de origem essas palavras tivessem género feminino, mas também se regista o caso inverso (ibidem): Francês - une robe >um robe 2.3.2. Neologismo semântico A língua, não sendo estática, mas sim dinâmica, vai permitindo com que, com o passar dos anos, uma dada unidade lexical ganhe outros significados, ou seja, outros valores semânticos, de acordo com a comunidade linguística que a utiliza. Também, no lugar de Neologismo semântico, podemos chamar de Extensão ou derivação semântica. Que, segundo Villalva (2008:57), consiste na atribuição de um novo significado a uma palavra já existente: papel (do Latim PAPÝRUS, nome de uma planta), por exemplo, começa por referir uma ‘substância formada por matérias vegetais ou de trapos reduzidos a massa, e disposta em folhas, para se escrever, embrulhar, etc’. Posteriormente, passou a ser usado como sinónimo de ‘obrigação, dever’, mas também passou a referir a ‘parte de uma peça teatral que cabe a cada actor’. Para Pinto (2007), há neologismo semântico quando atribuímos a uma palavra um sentido novo, que antes não tinha. Acontece, portanto, um alargamento ou extensão de sentido. Matos (2012) salienta que «dada a necessidade de referenciar novas realidades, as palavras podem adquirir novas significações, alargando o âmbito do seu significado». 2.4. Neologismos na Literatura Os escritores são, por natureza, pessoas que têm muito a dizer. Ao escreverem, muitas vezes, as palavras já existentes nas línguas não são, para eles, suficientes para expressarem dadas emoções. Ora, com o intuito de enriquecerem os léxicos das línguas naturais e demonstrarem as suas capacidades de recriação, eles vão, ao longo do curso da história, criando novas unidades lexicais. Porém, na maioria das vezes, todas as unidades lexicais criadas por estes não chegam a sair das obras para serem utilizadas pelos falantes das sociedades. Assim, os seus neónimos ficam encerrados, meramente, nas suas obras literárias para fins estilísticos ou de catarse. 2.4.1. Lexicalização Fato com que nos devemos acostumar no estudo do léxico de uma língua é o que se chama lexicalização, idiomatização ou desmotivação, isto é, um processo de opacificação que as palavras vão sofrendo ao longo da sua permanência e uso na língua. (cf. Sandmann, 1997:67) Segundo Villalva (2007:34), a existência de uma palavra complexa é frequentemente afectada por fenómenos de natureza formal ou semântica, como as assimilações fonéticas, o desrespeito pelas propriedades gramaticais dos constituintes ou as alterações do significado. A intervenção de um ou mais destes fenómenos provoca um efeito de erosão na palavra complexa, conduzindo à sua lexicalização, ou seja, à perda da informação sobre a sua estrutura interna, e, em última análise, à sua progressiva transformação em palavra simples. As palavras lexicalizadaspodem ser analisadas morfologicamente, mas não podem determinar padrões de formação de palavras. Continuando o seu pensamento, a mesma autora (2007:44) diz que formas como bezidróglio, que teve uma vida efémera num concurso de televisão dos anos 70 do século XX, ou como escanifobético, podem ser inventadas, sendo o produto da criatividade dos falantes, basta que a sequência fonética resultante seja reconhecível como uma palavra dessa língua e que a sua categorização sintáctica seja plausível. Este tipo de invenção de palavras, totalmente imotivado, é um processo por vezes utilizado na criação literária. Como podemos ver em um dos textos de Mário Cesariny e em algumas unidades lexicais criadas pelo escritor moçambicano Mia Couto: (12) meumaresperantotòtémico minhamàlanimatógrafurriel minhanoivadiagem serpente meuèliòtròpolipo polar meu fiambre de sol de roseira minha musa amiantulipálida meulustrefrenado céu grande minhaafiàurora manhã minhafôgoécia de estátuas minhalabrioquimia cerrada minha ponta na terra meu arsgrima meudiamantermita acordado! Urânia, de Jorge de Sena Puríliaamancivalvaemergidanto, imarculado e rósea, alviridente, naazúreajuventilconquinomente transcurva de aste o fido corpo tanto... Tenras nadáguas que oculvivam quanto palidiscuro, retradito e olente é mínimo desfincta, repente, rasga e sedente ao duro latipranto. Adónica se esvolve na ambolia de terso antena avante palpinado. Fímbril, filível, viridorna, gia emtúlidamancia, vaivinado. Transcorre uníflo e suspentreme o dia noturno ao lia e luçardente ao cado. (13) Abensonhada, argumentiras, destremido e vivibundo (COSTA, João, 2010:73) CAPÍTULO III – APRESENTAÇÃO, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DOS DADOS 3.1. Conceito de corpus O corpus é determinante para uma investigação, pois dele dependem os objectivos e a descrição a afectuar. (cf. Chicuna, 2015) Segundo o Dicionário Eletrônico Houaiss de Língua Portuguesa (2007), o corpus é o conjunto de documentos sobre determinado tema. Para Galisson e Coste (apud Chicuna 2012:125), corpus é o conjunto finito de enunciados tomados como objecto de análise. Frey (1997) diz que os objectivos do trabalho condicionam a constituição e a dimensão do corpus. 3.2. Constituição do corpus No presente subcapítulo, apresentamos o corpus da nossa monografia, composto por meio das várias leituras que fizemos e pelas ocorrências, ou seja, o número de vezes que cada unidade neológica ocorre no romance. Por meio das quais, constituímos um inventário dos neologismos encontrados na obra ‘‘Undengue’’, do escritor angolano Jacinto de Lemos. Ora, a partir do levantamento feito, organizamos 28 unidades neológicas, que podem ser verificadas na lista abaixo. 1. Buááá 2. Capata 3. Cavalona 4. Chá sem açúcar 5. Chumbação 6. Dicutumonar 7. Difunzas 8. Distraíção 9. Disuka 10. Fitucada 11. Fuefuetar 12. Fuma 13. Jingongo 14. Matriale 15. Mbuuaaaummmm 16. Muzangala 17. Nguzo 18. Quinamas 19. Sá 20. Sabotação 21. Safua-safua 22. Sengar 23. Testar 24. Tumates 25. Ualalááááá 26. Uenji 27. Ulumba 28. Vingação 3.3. Análise e interpretação dos dados (1) Buááá A presente unidade é um neologismo fonológico, construído a partir da abordagem das normas neolúdicas, criação onomatopaica. Tendo em conta o contexto, é uma onomatopeia que o escritor Jacinto de Lemos cria para imitar o som do rasgar de um objecto, no caso, vestuário. Como se pode ver na seguinte passagem da obra: «A calça buááá, se dividiu no meio…» (p. 94) (2) Capata Capata é um neologismo morfológico. A sua formação é feita por malabarismo lexical, ou seja, o escritor aproveita-se dos recursos imagéticos para o criar. Na obra, é um substantivo feminino e tem significado de coragem, bravura. Como se pode verificar no contexto: «Monandengue também com capata dele de homem estava chorar comporrada, mas a fazer cansar a sá Berta». (p. 39) «Senhoras cavalonas, cheias de capata de lutar, lhe fecharam no meio com outras galhetas, lhe levantaram e lhe arrumaram no chão». (p. 57) (3) Cavalona O item neológico cavalona está formado por derivação sufixal: caval– + –ona. Trata-se de um nome feminino, tendo em conta o seu determinante e pela razão de o referido sufixo nominal latino –ona ocorrer, quando usado na Língua Portuguesa, nos nomes femininos. Na obra «Undengue», ele aparece como um substantivo feminino e significabruta, forte. Vejamos as seguintes passagens da obra: «Nga Zefa, peixeira e cavalona dali da quitanda das Corridas, presenciou uma vez esta confiança dos monas e lhe falou p´ra xingar as mães deles com puta que parius, filhos daisso e daquilo». (p. 16) «Vocês não têm fama de cavalonas desta quitanda? Porquê que não bate?» (p. 52) (4) Chá sem açúcar O neologismo Chá sem açúcar é um neologismo sintagmático. É feito por meio da combinação dos elementos sintagmáticos. Chá sem açúcar, não se referindo ao acto de tomar chá sem açúcar, metaforiza apenas um significado a estes elementos, no caso, réplica, contestação. Na visão de Alves (2004:50), há neologismo sintagmático «quando os membros integrantes de um segmento frasal encontram-se em uma intima relação sintáctica, tanto morfológica quanto semanticamente, de forma a constituírem uma única unidade léxica». Como ocorre neste caso, em (4). Como se pode verificar no contexto: «Bem dizer já andava com sede de dar um chá sem açúcar no professor». (p. 85) (5) Chumbação A unidade neológica chumbação é um neologismo morfológico, formado por derivação sufixal: chumb– + –ação. No radical do verbo chumbar (chumb–) é adicionado o elemento posposto –ação. Na obra, a referida unidade, significa reprovação. De realçar que o Dicionário Eletrônico Houaiss da Língua Portuguesa (versão 2.0a- Abril de 2007) traz uma acepção do verbo chumbar com o significado de reprovar em exame. Atentemos para a seguinte passagem do romance: «E começou a citar o nome daqueles que iam nos exames e também daqueles que já estavam na chumbação e a explicar do porquê que uns estavam na lista da chumbação e outros na lista da proposta». (p. 86) (6) Dicutumonou O neologismo dicutumonou, pretérito perfeito do verbo dicutumonar (enervar, zangar),está formado por duas partes, uma base, radical, kimbundu dicutumon–e a desinência portuguesa –ou. Trata-se de um verbo formado por hibridismo. O elemento dicutumon– foi importado da unidade dikutu (dobrar), do kimbundu. Na obra, ele significa agir de modo diferente, mudar de atitude, enervar-se. Verifiquemos o seguinte contesto: «Cota com este fala-fala dos assistentes dicutumonou». (21) (7) Difunzas A referida unidade é um empréstimo. A importação ocorreu a partir do substantivo kimbundu difunza (grande confusão, briga, luta). O escritor pluraliza o nome difunza do kimbundu, adicionando-o o morfema «-s» no final. Segundo a norma da língua portuguesa, o grafema «s» é a marca do plural das palavras do português, normalmente. Podemos verificar no seguinte contesto: «As viagens pararam, as difunzas também foram reduzindo no seu número». (p. 59) (8) Distraíção Em (8), trata-se de um neologismo morfológico. Formado por lexicalização de forma, ou seja, o autor recorre aos recursos imagéticos para o criar. Ao invés de distracção, o autor escreve distraíção, alterando a fonologia do contínuo sonoro, e, consequentemente, o sistema morfológico da palavra vernácula, ou seja, adiciona o segmento «í»à palavra distracção. Pelo contexto, ela significa desatenção, desleixo. Constata-se nos trechos abaixo: «Foi nesta distraíção que o mais-velho carvalho aproveitou pôr fim àquela luta. Cota, assim que largou o muzangala, bateu os pés no chão, fez voz grossade bandido antigo». (p. 28) «Tinhas de lhe apanhar na distraíção. Caso contrário, não lhe conseguias». (p. 69) (9) Disuka Esta é uma unidade do kimbundu. Trata-se de um empréstimo, da língua kimbundu para o português. Jacinto de Lemos utiliza o mesmo para dar estilo e angolanidade a sua obra «Undengue», mostrando a situação de adestrato (Câmara JR: 1977) do português com o kimbundu, língua nacional de Angola. Ora, pelo contexto, porque o escritor narrava sobre um acto de Nga Zefa, a protagonista da primeira narrativa que compõe o seu romance «Undengue», significa embate. Como se pode verificar no contexto: «Senhora já não acabou de falar por causa da disuka com o cota. E tod´ela maluca com a disuka, apanhou a banheira de alumínio que trazia e procurou a cabeça do cota Carvalho». (p. 18) (10) Fitucada A presente unidade é um neologismo morfológico. É o particípio do verbo fitucar (exaltar, zangar) e também é um adjectivo. É formada por meio de hibridismo, uma parte, o radical, do verbo fituka, do kimbudu (zangar-se, revoltar-se), fituka–, e o elemento –da, que é, normalmente, marca dos particípios dos verbos regulares da língua portuguesa. Como se pode verificar no contexto: «Mais-velho, sentado num luando ali no quarto, contou os casos desde a começada da luta até no fim. Nga Zefa, toda fitucada, inda foi contra ele porque andou lhe dizer p´ra ele xingar os monas». (p. 55) (11) Fuefuetar Em (11), temos um neologismo morfológico, propriamente, um hibridismo. Formado com um radical, fuefuet– , do verbo kimbundu kufwefweta(murmurar). A este radical é acrescido a desinência dos verbos regulares da primeira conjugação em português: –ar. No contexto, semanticamente, significa segredar, confidenciar. Podemos constatar esse facto no seguinte passagem da obra: «- Ah, vocês ainda não sabem? – perguntou a velha na vizinha, na medida em que lhe encostava p´ra fuefuetar bem os casos». (p. 66) «Velha olhou na direcção onde estava a nora, depois na porta do quintal e voltou a fuefuetar». (p. 67) (12) Fuma Esta unidade lexical é um kimbundismo, pois, na língua kimbundu, segundo o nosso informante (João Gaspar, professor de língua kimbundu) a unidade lexicalfumaestá ligada ao acto de ser famoso, ter fama. Na obra, este verbo tem o significado de: fama, respeito, honra. Pode-se verificar no seguinte contexto: «Era mesmo da fuma. Tinha fama de verdade». (p. 59) «A fuma dessas peixeiras começou já mesmo em Malanji e veio descendo, descendo até Luanda». (p. 59) «E se não se porem a pau, esta derrota vai terminar com a fuma deles. Conhecidos como a malta do ZÉ». (p. 75) (13) Jingongo Em (13), trata-se de uma importação. O escritor faz empréstimo do item lexical jingongu (dores)- da língua kimbundu- para causar mais estilo e dar angolanidade literária a sua obra, aportuguesando-o, porquanto esta palavra, em kimbundu, deriva de ngongu (dor, sofrimento). Como se pode verificar no seguinte contexto: «Mateus não podia morrer ainda agora. Porque o jingongo que ´stou apanhar com estes filhos, esta hora podia…» (p. 18) (14) Matriale A referida unidade é um neologismo fonológico. É formado por meio das normas neolúdicas, ou seja, trata-se da utilização do malabarismo lexical numa unidade já existente, no caso, «material». Em nosso entender, o escritor faz a sincope do fone «e», e o acresce, no fim do referido item lexical para obter um outro significado, em forma de paragoge. Na obra, podemos concebê-la, semanticamente, como pénis. Podemos constatar no seguinte estrato: «A calça buááá, se dividiu no meio, matriale todo p´ra fora, pessoas ali, UÓÓÓÓ». (p. 94) «- Pessoa mesmo que não quer ver matrialedo home da outra, mas, deixa. Estes miúdos t´obrigam a ver essas coisas…» (p. 95) (15) Mbuuaaaummmm Qual em (1), mbuuaaaummmmn é um neologismo fonológico, construído a partir da abordagem das normas neolúdicas, criação onomatopaica. Ora, se nos atermos ao contexto, é uma onomatopeia que o escritor Jacinto de Lemos criou para imitar o som da buzina de um caminhão. Como se pode verificar no contexto: «Assustou só ali no meio da estrada, mbuuaaaummmmn o berro do carro grande». (p. 96) (16) Muzangala Muzangala é, qual em alguns neologismos que vamos analisando por aqui, um empréstimo da língua kimbundu. Ele tem a significação de jovem, moço. Podemos constar no seguinte estrato: «Muzangala Isidro, que não contou com aquela queda, tanto ele como o companheiro, não teve tempo de desarmar. Os pés varreram o chão, levaram pedrinhas, papeis, cascas de canas, caroços de mangas…» (p. 24) «Sem perder tempo, deu um acalco no muzangala que estava lhe socar. Este foi parar na gentada.» (p. 25) (17) Nguzo O referido item lexical é emprestado da língua kimbundu. É sabido que Angola é uma nação multilingue. Jacinto de Lemos, na obra «Undengue», aportuguesa algumas unidades lexicais da língua kimbundu para maior expressividade e estilo a sua obra. Ngunzu, em kimbundu, significa força, energia. Como podemos visualizar no seguinte estrato: «Ah, aqui ´stou à pega! Se não fazer nguzo, que chega, estes gajos vão me varrer, mais, do bom varrer… - pensou o dicota». (p. 23) (18) Quinamas Em (18), trata-se de um empréstimo. O escritor aportuguesa a unidade lexical kinama (singular deinama,pernas), da língua kimbundu, dando-a, assim, características do sistema morfológico da língua portuguesa. Sabido é que o morfema «s», quando colocado no final das palavras, em português, é marca do plural. Ora, para indicar duas pernas, o autor aportuguesa o referido vocábulo. Como podemos observar o uso da referida unidade neológica no seguinte estrato retirado do romance: «Zé e o Chiquinho tinham já se pegado nas quinamas p´ra se vumunarem». (p. 131) (19) Sá A presente unidade é um neologismo morfológico. É formado por meio das normas neolúdicas, ou seja, trata-se de uma lexia inusitada. Pelo seu uso seguido de um nome próprio, na obra, tem o significado de senhora, dona. É uma forma de tratamento. Vejamos as seguintes passagens do romance: «Na tarde do dia seguinte, sá Berta como tinha raiva de bater no miúdo Janeiro, quando lhe apareceu ali na frente, lhe provocou mesmo até que lhe bateu». (p. 38) «Sá Berta ficou maluca com as dores, grito de socorro apareceu». (p. 40) (20) Sabotação Sabotaçãoé um neologismo morfológico, formado por derivação sufixal: sabot– + –ação. No radical do verbo sabotar, sabot–é acrescido um elemento posposto, –ação. Pelo contexto, refere-se ao acto de sabotar, sabotagem. Por exemplo, no seguinte contesto: «Muitos queriam ouvir o Professor, começaram ficar chateados com esta sabotação». (p. 85) (21) Safua-safua Esta é uma unidade formada por meio do redobro ou reduplicação. Pode ser visto como um neologismo morfológico, formado por elementos não existentes no léxico do português, mas sim no kimbundu. Para o nosso informante, Safua-safua, em kimbundu, é um ideofone que remete para o acto de fazer algo apressadamente.É uma lexia inusitada, tendo em conta as normas neolúdicas. Em nosso conceber, ela foi formada por meio da utilização de recursos imagéticos, porquanto ela é usada no momento da trama, com o significado de coisa à toa, suja, rasgada, complexa. Como podemos ter em conta no seguinte exemplo: «Foi então que chegou outro muzangala, amigo chegado do Isidro. Miguel, nome dele. Rapaz de olhos vermelhos, cabelo safua-safua, camisa amarrada na banda do umbigo, calção esquartejado na bainha, cheios de letras de amor, parecia um calu- puro, afinal, não. Era mbora do Santomé». (p. 23) (22) Sengar Este item lexical é, tal como em (11), um neologismo formado por hibridismo, isto é, uma parte da língua kimbundu, seng–, e outra da língua portuguesa, -ar, a desinência. Na obra, Sengar é um verbo, no infinitivo, significando comprar. Realça-se que o elementoseng– foi importado, propriamente, do verbo kusenga (Separar, divorciar, desprezar). É sabido que, linguisticamente, o português, em Angola, está em situação de adestrato, ou seja, convive com as línguas nativas ou nacionais. Como se pode verificar no seguinte contexto: «Agora com loja de madeira a servir todos populares do bairro, às vezes pessoas doutros bairros vão também sengar aí na loja, ninguém podia mesmo com ele». (p. 144) (23) Testar Trata-se de um neologismo semântico, pois que o significante testar já existe no léxico do português, porém com outros significados (segundo o Dicionário Eletrônico Houaiss da língua portuguesa, 2007, testar poderá significar legar, atestar, encher, provar ou golpear a bola com a testa). Pelo contexto de utilização, refere-se a atirar ou deitar. Como exemplo, temos o contesto abaixo: «Lhe pegou e lhe testou no chão. Lhe levantou de novo pronto p´ra lhe testar segunda vez, mas nesta hora rapaz também não estava mais se conhecer só de raiva». (p. 39) (24) Tumates A referida unidade é um neologismo morfológico. Formado por meio de elementos, fonético-morfológicos, que constam da língua portuguesa, o referido significante, criado no plural, significa testículos. Ela é formada por meio da alteração no segmento da palavra tomates, isto é, ocorre dissimilação no fone «o», transformando-se em«u». No seguinte contexto, temos o exemplo: «Mais-velho, sem mais saída […] apertou os tumates do gajo.» (p. 25) «Todos se trapalharam e um deles é que domou a mão do cota a puxar os tumates do muzangala». (p. 26) (25) Uenji Esta é uma unidade proveniente da língua kimbudu. Trata-se de um empréstimo directo do Kimbundu, língua de partida, para o português, língua de chegada. Ela não altera o seu significado do kimbundu, esta mantém o seu significa denotativo: negócio. «Sá Berta senhora rabujenta, mas, boazinha no fundo, fez jantar p´ra os doze muzangalas que estavam aí presentes, apesar dalguns rejeitarem o convite da funjada, preferiram varrer aqueles abacates meio bons do uenji. Negocio que lhe fracassou neste dia». (p. 37) (26) Ulumba Tal e qual em (27), trata-se de um empréstimo directo, da língua kimbundu para a língua portuguesa. Mantendo o seu significado denotativo: juventude, mocidade. Podemos constatar no contexto abaixo: «Uma coisa que na vida não espera, é o tempo. O tempo vem e passa. Arrasta tudo que encontrar. De bom, de mau, leva. Só deixa ficar no coração da pessoa, a lembrança de um dia. Desta infância. Desta infância que vou vos contar. Infância do meu amigo Janeiro, que fez Nga Zefa, irmã do cota Carvalho, voltar nos seus tempos de ulumba». (p. 16) (27) Vingação Qual em (5), vingação é um neologismo morfológico, formado por derivação sufixal, a partir do radical ving– (do verbo vingar) mais o elemento posposto –ação: ving– +–ação. Na obra, ele é criado para ser utilizado, estilisticamente, no lugar do tradicional vocábulo que expressa a acção de se vingar: vingança. Vejamos a utilização do neologismo no seguinte estrato: «Miúdos com raiva deles de monandengues rabujentos e assanhados, fizeram vingação no professor, no dia dos exames». (1009) (28) Ualalááááá Trata-se de uma unidade tida como neologismo fonológico, formado por meio das normas neolúdicas, ou seja, é uma criação onomatopaica. De acordo com o contexto, foi criada para imitar o barulho do movimento rápido de Janeiro (protagonista do romance) quando este não foi agarrado por Mário (que lhe queria dar uma surra). O nosso informante afirma que este item lexical, nas sociedades ambundu, é utilizado para irritar alguém durante uma dada brincadeira. Como se pode verificar no contexto: «Miúdo só fez dessa, depois dessas, ualalááááá…» (70) CAPÍTULO IV – GLOSSÁRIO 4.1. Conceito de glossário Para o Dicionário Electrónico Houaiss da Língua Portuguesa (2007), um glossário é um pequeno léxico agregado a uma obra, principalmente para esclarecer termos pouco usados e expressões regionais ou dialetais nela contida; vocabulário. Segundo Correia (apud Júlio 2016), um glossário é uma lista restrita de vocábulos de um determinado domínio do conhecimento, de um determinado registo linguístico, específicos da obra de um autor, constituída por neologismos, arcaísmos e regionalismos. Muitas vezes, essa lista pode ser apresentada, por exemplo, como anexo a uma obra. Nos dizeres do Dicionario Universal (2006), um glossário é um vocabulário em que se explicam palavras pouco conhecidas. 4.2. Estrutura de glossário Para a feitura de o glossário de neologismos, evidenciámos Bimbi (apud Júlio 2016:50), que «propõe uma estrutura por meio de uma ficha lexicográfica, que dispõem de um conjunto estruturado de campos, permitindo armazenar conteúdos de cariz linguístico». Para alguns estudiosos citados por Bimbi (apud Júlio 2016), a ficha constitui um meio indispensável para a consecução de um produto lexicográfico, no sentido de permitir o registo de dados linguísticos. Trata-se de um documento multifuncional e complexo que está subdividido em campos. Desta feita, abaixo mostramos o formato da ficha lexicográfica para o glossário de neologismos em «Undengue»: Entrada lexicográfica Categoria Gramatical Definição Contexto Fonte Nota Etimologia 1. A parte da Entrada lexicográfica indica o neónimo; 2. A área categoria gramatical apresenta as informações morfológicas dos neónimos contextualizados; 3. A parte da definição encerra a significação do neónimo; 4. A área contexto dá indicações do uso do referido neónimo, facultando o seu entendimento; 5. A parte fonte contém informações ligadas ao escritor e a obra onde encontramos o neónimo; 6. O campo nota pode apresentar algumas informações históricas, ortográfica ou fonética, atinentes ao neónimo em situação; 7. O campo etimologia contém informações da origem da palavra nova, pois com a etimologia podemos conhecer o étimo e a evolução da palavra desde a sua origem até hodiernamente. 4.2.1. Modelo de glossário Neste ponto, preenchemos o quadro acima ilustrado. Outrossim, mostramos uma microestrutura do glossário com os neónimos mais frequentes na obra «Undengue». (10) Buááá Entrada lexicográfica Buááá Categoria Gramatical Substantivo onomatopaico (s. onom.) Definição Nome atribuído ao rasgo da calça. Contexto «A calça buááá, se dividiu no meio […], pessoas ali na gritaria». (p. 94) Fonte Jacinto de Lemos, in Undengue, 2015 Nota Item neológico formado com base nas normas neolúdica: criação onomatopaica Etimologia (11) Capata Entrada lexicográfica Capata Categoria Gramatical Substantivo feminino (s.m.) Definição O acto de ter coragem, vontade ou bravura. Contexto «Monandengue [miúdo Janeiro] também com capata dele de homem estava chorar comporrada, mas a fazer cansar a sá Berta». (p. 39) Fonte Jacinto de Lemos, in Undengue, 2015 Nota Trata-se de um item neológico formado com base na lexicalização. Etimologia (3) Cavalona Entrada lexicográfica Cavalona Categoria Gramatical Substantivo feminino (s. f.) Definição Nome atribuído a uma pessoa pela sua força e a brutalidade. Contexto «Nga Zefa, peixeira e cavalona dali da quitanda das Corridas, presenciou uma vez esta confiança dos monas e lhe falou p´ra xingar as mães deles com puta que parius, filhos daisso e daquilo». (p. 16) Fonte Jacinto de Lemos, in Undengue, 2015 Nota Neologismo feito por meio da derivação sufixal. Etimologia (12) Chá sem açúcar Entrada lexicográfica Chá sem açúcar Categoria Gramatical Substantivo masculino (s. m.) Definição Nome dado ao desejo decontestar. Contexto «Senhora não era do grupo da senhora Sabrita, mas também veio bem disposta. Bem dizer já andava com sede de dar um chá sem açúcar no professor».(p. 85) Fonte Jacinto de Lemos, in Undengue, 2015 Nota Neologismo sintagmático, formado por meio da combinação dos elementos sintagmáticos. Etimologia (13) Chumbação Entrada lexicográfica Chumbação Categoria Gramatical Substantivo feminino (s. f.) Definição Acto ou efeito de reprovar, constar da lista de reprovados. Contexto «E [o professor Jandombo] começou a citar o nome daqueles que iam nos exames e também daqueles que já estavam na chumbação e a explicar do porquê que uns estavam na lista da chumbação e outros na lista da proposta». (p. 86) Fonte Jacinto de Lemos, in Undengue, 2015 Nota Substantivo criado a partir da derivação sufixal. Etimologia De chumb+-ação (14) Dicutumonou Entrada lexicográfica Dicutumonou Categoria Gramatical Verbo transitivo (v. tr.) Definição Aportuguesamento do vocábulo kimbundudikutu (dobrar), 3ª pessoa do singular no pretérito perfeito do verbo (neologismo) dicutumonar (enervar, zangar) Contexto «Cota com este fala-fala dos assistentes dicutumonou». (21) Fonte Jacinto de Lemos, in Undengue, 2015 Nota Formação híbrida, radical kimbundu e desinência portuguesa. Etimologia Da palavra kimbundu dikutumon mais o morfema português -ou (15) Difunzas Entrada lexicográfica Difunzas Categoria Gramatical Substantivo feminino (s. f.) Definição Aportuguesamento do substantivo kimbundudifunza (confusão, briga), no plural. Contexto «Agora estão já bocado cansadas. As viagens pararam, as difunzas também foram reduzindo no seu número». (p. 59) Fonte Jacinto de Lemos, in Undengue, 2015 Nota Empréstimo do kimbundu, kimbundismo. Etimologia Do Kimbundu difunza (16) Distraíção Entrada lexicográfica Distraíção Categoria Gramatical Substantivo feminino (s. f.) Definição Acto de estar distraído, distrair (-se). Contexto «Tinhas de lhe apanhar na distraíção. Caso contrário, não lhe conseguias». (p. 69) Fonte Jacinto de Lemos, in Undengue, 2015 Nota Formado de acordo com a lexicalização de forma. Etimologia De distração (17) Disuka Entrada lexicográfica Disuka Categoria Gramatical Substantivo feminino (s. f.) Definição O mesmo que embate, choque ou encontro impetuoso. Contexto «Senhora já não acabou de falar por causa da disuka com o cota. E tod´ela maluca com a disuka, apanhou a banheira de alumínio que trazia e procurou a cabeça do cota Carvalho». (p. 18) Fonte Jacinto de Lemos, in Undengue, 2015 Nota Empréstimo, Kimbundismo. Etimologia Do Kimbundu disuka (10) Fitucada Entrada lexicográfica Fitucada Categoria Gramatical Adjectivo (adj.) Definição O mesmo que ficar enervada, zangada ou aborrecida. Contexto «Mais-velho, sentado num luando ali no quarto, contou os casos desde a começada da luta até no fim. NgaZefa, toda fitucada, inda foi contra ele porque andou lhe dizer p´ra ele xingar os monas». (p. 55) Fonte Jacinto de Lemos, in Undengue, 2015 Nota Formado por hibridismo: kimbundu e português. Etimologia Do Kimbundu kufituka (11) Fuefuetar Entrada lexicográfica Fuefuetar Categoria Gramatical Verbo transitivo (v. tr.) Definição Segredar, dizer coisas em voz baixa. Contexto «- Ah, vocês ainda não sabem? – perguntou a velha na vizinha, na medida em que lhe encostava p´ra fuefuetar bem os casos». (p. 66) Fonte Jacinto de Lemos, in Undengue, 2015 Nota Norma neolúdica, neo-humor Etimologia (12) Fuma Entrada lexicográfica Fuma Categoria Gramatical Substantivo feminino (s. f.) Definição O mesmo que fama ou reputação. Contexto «Afuma dessas peixeiras começou já mesmo em Malanji e veio descendo, descendo até Luanda». (p. 59) Fonte Jacinto de Lemos, in Undengue, 2015 Nota Kimbundismo Etimologia Do Kimbundu kufuma (13) Jingongo Entrada lexicográfica Jingongo Categoria Gramatical Substantivo masculino (s. m.) Definição O mesmo que sofrimento, dor. Contexto «Mateus não podia morrer ainda agora. Porque o jingongo que ´stou apanhar com estes filhos, esta hora podia…» (p. 18) Fonte Jacinto de Lemos, in Undengue, 2015 Nota Empréstimo, kimbundismo Etimologia Do Kimbundu jingongu (14) Matriale Entrada lexicográfica Matriale Categoria Gramatical Substantivo masculino (s. m.) Definição Pénis, órgão genital masculino. Contexto «- Pessoa mesmo que não quer ver matrialedo home da outra, mas, deixa. Estes miúdos t´obrigam a ver essas coisas…» (p. 95) Fonte Jacinto de Lemos, in Undengue, 2015 Nota Voltado às normas neolúdicas e a fonologia. Etimologia De material (15) Mbuuaaaummmm Entrada lexicográfica Mbuuaaaummmm Categoria Gramatical Substantivo masculino (s.m.) Definição Imitação do som da buzina deum camião). Contexto «Assustou só ali no meio da estrada, mbuuaaaummmmn o berro do carro grande». (p. 96) Fonte Jacinto de Lemos, in Undengue, 2015 Nota Criação onomatopaica, voltada às normasneolúdicas. Etimologia (16) Muzangala Entrada lexicográfica Muzangala Categoria Gramatical Substantivo masculino (s. m.) Definição Jovem ou moço. Contexto «Muzangala Isidro, que não contou com aquela queda, tanto ele como o companheiro, não teve tempo de desarmar. Os pés varreram o chão, levaram pedrinhas, papeis, cascas de canas, caroços de mangas…» (p. 24) Fonte Jacinto de Lemos, in Undengue, 2015 Nota Empréstimo do kimbundu (língua angolana). Etimologia Do kimbundu muzangala (17) Nguzo Entrada lexicográfica Nguzo Categoria Gramatical Substantivo masculino (s.m.) Definição Força, fúria. (tentativa de aportuguesamento de ngunzu) Contexto «Ah, aqui ´stou à pega! Se não fazer nguzo, que chega, estes gajos vão me varrer, mais, do bom varrer… - pensou o dicota». (p. 23) Fonte Jacinto de Lemos, in Undengue, 2015 Nota Kimbundismo, empréstimo. Etimologia Do Kimbundu ngunzu (18) Quinamas Entrada lexicográfica Quinamas Categoria Gramatical Substantivo feminino (s. f.) Definição Aportuguesamento do substantivo kimbunduKinama (perna). Pernas. Contexto «Zé e o Chiquinho tinham já se pegado nas quinamasp´ra se vumunarem». (p. 131) Fonte Jacinto de Lemos, in Undengue, 2015 Nota Empréstimo, Kimbundismo. Etimologia Do Kimbundu kinama (19) Sá Entrada lexicográfica Sá Categoria Gramatical Substantivo feminino (s. f.) Definição Senhora, dona. Contexto «Sá Berta ficou maluca com as dores, grito de socorro apareceu». (p. 40) Fonte Jacinto de Lemos, in Undengue, 2015 Nota Lexia inusitada, norma neolúdica. Etimologia De senhora (20) Sabotação Entrada lexicográfica Sabotação Categoria Gramatical Substantivo feminino (s. f.) Definição Acto de sabotar. Contexto «Muitos queriam ouvir o Professor, começaram ficar chateados com esta sabotação». (p. 85) Fonte Jacinto de Lemos, in Undengue, 2015 Nota Formação por derivação sufixal. Etimologia De sabot+-ação (21) Safua-safua Entrada lexicográfica Safua-safua Categoria Gramatical Adjectivo (adj.) Definição À-toa, sujo. Contexto «Rapaz de olhos vermelhos, cabelo safua-safua, camisa amarrada na banda do umbigo, calção esquartejado na bainha». (p. 23) Fonte Jacinto de Lemos, in Undengue, 2015 Nota Formação por composição justaposta. Etimologia (22) Sengar Entrada lexicográfica Sengar Categoria Gramatical Verbo transitivo (v. tr.) Definição Comprar, acto de ir às compras. Contexto «Agora com loja de madeira a servir todos populares do bairro, às vezes pessoas doutros bairros vão também sengar aí na loja, ninguém podia mesmo com ele». (p. 144) Fonte Jacinto de Lemos, in Undengue, 2015 Nota Em Angola, esta unidade é um regionalismo, compreendido como o acto de divórcio ou separação entre os conjugues. Ora, no romance, Jacinto de Lemos dá outro significado a este verbo, a dizer: comprar. É um neologismo formado por hibridismo. Etimologia (23)Testar Entrada lexicográfica Testar Categoria Gramatical Verbo transitivo (v. tr.) Definição Extensão semântica do verbo testar: Atirar ou Deitar. Contexto «Lhe pegou e lhe testou no chão. Lhe levantou de novo pronto p´ra lhe testar segunda vez, mas nesta hora rapaz também não estava mais se conhecer só de raiva». (p. 39) Fonte Jacinto de Lemos, in Undengue, 2015 Nota Neologismo semântico. Etimologia De atestar (24) Tumates Entrada lexicográfica Tumates Categoria Gramatical Substantivo masculino (s. m.) Definição Testículos, cada uma das duas gônadas masculinas, de formato ovóide. Contexto «Mais-velho, sem mais saída […] apertou os tumates do gajo.» (p. 25) Fonte Jacinto de Lemos, in Undengue, 2015 Nota Norma neolúdica, malabarismo lexical. Etimologia De tomates (25) Uenji Entrada lexicográfica Uenji Categoria Gramatical Substantivo masculino (s. m.) Definição O mesmo que negócio, comércio. Contexto « […] Apesar dalguns rejeitarem o convite da funjada, preferiram varrer aqueles abacates meio bons do uenji. Negocio que lhe fracassou neste dia». (p. 37) Fonte Jacinto de Lemos, in Undengue, 2015 Nota É um empréstimo do kimbundu. Etimologia Do Kimbundu wenji (26) Ulumba Entrada lexicográfica Ulumba Categoria Gramatical Substantivo feminino (s. f.) Definição O mesmo que juventude, mocidade. Contexto «Infância do meu amigo Janeiro, que fez NgaZefa, irmã do cota Carvalho, voltar nos seus tempos de ulumba». (p. 16) Fonte Jacinto de Lemos, in Undengue, 2015 Nota Kimbundismo, Empréstimo. Etimologia Do Kimbundu ulumba (27) Vingação Entrada lexicográfica Vingação Categoria Gramatical Substantivo feminino (s. f.) Definição O mesmo que desforra. Contexto «Miúdos com raiva deles de monandengues rabujentos e assanhados, fizeram vingação no professor, no dia dos exames». (109) Fonte Jacinto de Lemos, in Undengue, 2015 Nota Formado por derivação sufixal. Etimologia De vingança. (28) Ualalááááá Entrada lexicográfica Ualalááááá Categoria Gramatical Substantivo onomatopaico (s. onom.) Definição Nome atribuído ao som produzido porum movimento rápido. Contexto «Miúdo só fez dessa, depois dessas, ualalááááá…» (70) Fonte Jacinto de Lemos, in Undengue, 2015 Nota Norma neolúdica, onomatopeia. Etimologia CONCLUSÃO Depois de várias leituras meticulosas à obra «Undengue» de Jacinto de Lemos, e das questões de partida que deram origem a essa monografia, percebemos que os neologismos mais frequentes na obra são os informais, onde o recurso mais utilizado é o empréstimo, propriamente, os kimbundismos (com 13 neónimos). Em «Undengue», os neologismos servem como meio de expressividade, angolanidade e deleite, usados pelo escritor para marcar o seu estilo de escrita. Para além dos kimbundismos, o recurso mais frequente na obra, vimos ainda outros processos de formação de palavras - morfológicos e não-morfológicos – como são os casos da derivação sufixal (com quatro neónimos), da extensão semântica (com dois neónimos), de alguns processos ligados à lexicalização de forma, às normas neolúdicas, onomatopeias, malabarismos lexicais, lexias inusitadas (com oito neónimos) e a composição por justaposição (curiosamente, o recurso menos utilizado na referida obra, com um neónimo). Destarte a literatura, utilizando a função poética da linguagem, tem o condão de levar os indivíduos leitores, seus eternos amantes, ao deleite, à informação, formação, consciencialização e, por fim, ao domínio dos diferentes modos de como a língua é utilizada pelos escritores, em particular, e pelos falantes, em geral, numa determinada sociedade (dialectos, socioletos, gírias, calão). SUGESTÕES Feito o nosso trabalho científico, gostaríamos de apresentar, meramente, três sugestões, a dizer: Que sejam feitos mais trabalhos linguísticos (nas áreas da Fonética, Fonologia, Morfologia, Sintaxe, Semântica e Lexicologia) dentro da obra literária «Undengue», de Jacinto de Lemos; Sabendo que só há literatura porque existem as línguas, sugerimos que sejam feitos mais trabalhos que interliguem a Linguística à Literatura, propriamente, relacionados ao enriquecimento do léxico das respectivas línguas naturais; E, por último, que a Faculdade de Letras da Universidade Agostinho Neto crie, nos seus cursos de línguas e literaturas, um «Plano de Leitura» de obras de escritores angolanos lidos no país e na diáspora, visto que a cultura livresca ainda é um problema no seio de muitos estudantes universitários em Angola. BIBLIOGRAFIA ALVES, Ieda Maria, Neologismo. Criação Lexical, Ática, São Paulo, 1994. 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