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ELEONOR SCHUCHARDT Bullying e algumas propostas de ações de enfrentamento dessa problemática MESTRADO EM EDUCAÇÃO UNISAL AMERICANA – SP 2012 ELEONOR SCHUCHARDT Bullying e algumas propostas de ações de enfrentamento dessa problemática UNISAL AMERICANA – SP 2012 Dissertação apresentada ao Centro Universitário Salesiano de São Paulo, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Educação, sob a Orientação da Profª Drª Renata Sieiro Fernandes. Schuchardt, Eleonor S415b Bullying e algumas propostas de ações de enfrentamento dessa problemática / Eleonor Schuchardt. – Americana: Centro Universitário Salesiano de São Paulo, 2012. 83 f. Dissertação (Mestrado em Educação). UNISAL – SP. Orientadora: Profª Drª Renata Sieiro Fernandes. Inclui bibliografia. 1. Violência escolar. 2. Bullying. 3. Educação – Brasil. I. Título. CDD – 371.58 Catalogação elaborada por Maria Elisa Pickler Nicolino – CRB-8/8292 Bibliotecária Chefe do UNISAL – Unidade de Ensino de Americana. Eleonor Schuchardt Bullying e algumas propostas de ações de enfrentamento dessa problemática Trabalho de Conclusão de Curso defendido e aprovado em __/__/__, pela comissão julgadora. _____________________________ Profª Drª Renata Sieiro Fernandes UNISAL ___________________________________ Prof. Dr. Antonio Carlos Miranda UNISAL _____________________________________ Profª Drª Regiane Aparecida Rossi Hilkner MEMBRO EXTERNO UNISAL Americana 2012 Dissertação apresentada como exigência parcial para obtenção do grau de Mestre em Educação. AGRADECIMENTOS A Deus, por me dar a oportunidade de galgar novos caminhos, novos horizontes e subir, hora alegre, hora triste, os degraus dessa vida tão maravilhosa e cheia de surpresas. À minha família, especialmente à minha mamãe, que me incentivou em todos os momentos dessa caminhada, tirando forças de onde parecia não existir. Mesmo quando a vontade de parar chegava, ela me mostrava com um belo sorriso o árduo caminho que deveria prosseguir. A meu irmão Rodolfo pelo incentivo e pelas preocupações. Ao meu companheiro e amigo, Júlio, pela paciência, nos momentos em que tive que me dedicar mais aos estudos do que a ele. Aos meus amigos Edicarlo, Rosa, Soneli e Lourdes (Lurdinha), que sempre acreditaram que eu chegaria até o final. À minha amiga Luciana Gotti pela consideração e grande ajuda. Agradeço também à Profª. Drª Regiane Aparecida Rossi Hilkner e ao Prof. Dr. Antonio Carlos Miranda, que muito contribuíram para a finalização desta dissertação. Desejo reconhecer também, minha gratidão à Profª Drª Maria Luisa Amorim Costa Bissoto, pelas intervenções que muito colaboram para enriquecer este trabalho e ao auxílio luminoso do Prof. Dr. Luis Carlos Miranda. Agradeço ao Prof. Dr. Renato Soffner e à Vaníria pela contribuição a mim oferecida demonstrando entendimento diante dos fatos ocorridos na trajetória deste percurso em minha vida. Colaboraram no sentido de me mostrar os conceitos a ser seguidos no que se refere aos padrões deste conceituado Centro Universitário. Agradeço em especial à minha Orientadora Profª Drª Renata Sieiro Fernandes, que, com todo profissionalismo, foi mais que uma orientadora, foi amiga e foi irmã. Soube me conduzir à conclusão deste trabalho com toda arte, que somente uma grande Professora Pesquisadora como ela saberia fazer. A você Professora Renata, meu muito obrigado. Meu muito Obrigado à Unisal, que me acolheu em seu Programa de Mestrado em Educação, contribuindo para meu crescimento pessoal e profissional. A todos os funcionários do Unisal, pois no dia-a-dia construímos uma amizade de estimado valor. A todos, que de alguma forma contribuíram para a produção deste trabalho, os meus sinceros agradecimentos. “Se soubesse que o mundo se desintegraria amanhã, ainda assim plantaria a minha macieira. O que me assusta não é a violência de poucos, mas a omissão de muitos. Temos aprendido a voar como pássaros, a nadar como peixes, mas não aprendemos a sensível arte de vivermos como irmãos”. Martin Luther King RESUMO Esta dissertação tem por tema a violência causada pelas ações de bullying especialmente entre jovens no espaço escolar e as propostas de prevenção e enfrentamento que estão sendo pensadas e postas em prática no Brasil. A problemática que envolve o bullying refere-se ao ambiente hostil e agressivo em que se transforma o recinto escolar devido aos atos de violência física ou psicológica e que pode culminar em prejuízos sociais e emocionais para os envolvidos direta ou indiretamente nessas ações. A problemática se centra nas razões e nas formas pelas quais as propostas ou medidas brasileiras de combate ou prevenção ao bullying na escola vêm dando certo ou não, ou seja, se tem tido maior ou menor acertos e eficácias e por que. Justifica-se também a escolha deste tema e o desenvolvimento desta pesquisa pelos vários acontecimentos desse tipo ocorridos em diversas escolas e nos mais variados Estados. Assim, a violência envolvendo os jovens começa a ter uma conotação de algo corriqueiro no ambiente escolar, o que gera por parte da equipe escolar, família e comunidade em geral, a busca por reflexões, ações e soluções para esta problemática. O objetivo desta pesquisa ao oferecer material teórico e reflexivo a partir de exemplos de ações de combate ou prevenção ao bullying é promover a conscientização e reflexão do fenômeno do bullying e da violência escolar entre os jovens e todos os envolvidos no processo educativo, pertencentes ou não ao recinto escolar. Um dos focos de abordagem é a preocupação em relação às práticas docentes que devem ser desenvolvidas em sala de aula com ênfase na solidariedade, no respeito e na promoção de uma Educação para a PAZ. O referencial teórico que embasa a pesquisa são livros e artigos (pesquisa bibliográfica) que abordam o tema sobre o tema violência e bullying em suas mais variadas datas de publicação, por autores diversificados. Em especial, porém, podemos citar como referência de pesquisa os autores: Olweus, Candau, Blaya, Ives de la Taille e Abramovay. A metodologia desenvolvida caracteriza-se por uma pesquisa de cunho qualitativo com levantamento e estudo da bibliografia relativa ao tema e comentários de sete casos nacionais e internacionais de combate e prevenção a casos de violência e bullying, oriundos de tentativas de lidar com as problemáticas referentes à violência entre jovens no ambiente escolar. Os exemplos apresentados são: “O papel do diretor nesse combate: investir na consolidação de uma equipe unida e determinada”; “Quando a escola é agressora: o isolamento e o entorno não são culpados pela escola agressora”; “O melhor caminho para combater a violência: a aproximação com a comunidade para se criar alianças”; “A força da equipe: acompanhamento, junto à comunidade dos jovens envolvidos com droga que apresentam problemas de aprendizado”; “Mediadores da paz: implantação da cultura de paz no convívio escolar” e, “A solidariedade entre as crianças: o foco é sempre o lado emocional da criança”. Como considerações finais é possível pensar que mesmo em meio a tanta violência, sendo uma delas o bullying,podemos visualizar várias formas para se mitigarem os problemas encontrados no cotidiano escolar, entre elas, a aceitação das diferenças, a união entre a equipe escolar, gestão escolar dentro dos preceitos democráticos, um conselho de escola atuante e uma comunidade escolar presente, todos sendo aliado na formação de um cidadão que tenha valores éticos e principalmente fazer da escola o alicerce de uma sociedade realmente pautada na democracia. Com isso, torna-se possível trabalhar o ser resiliente que supera e sabe conviver com os problemas, sem que os mesmos o façam sofrer. Palavras – Chaves: educação, violência, bullying, omissão e resiliência. ABSTRACT This dissertation focus on the violence caused by the bullying actions, especially among young school people, and the proposals for preventing and coping being designed and implemented in Brazil. The problems involved refer to the hostile an aggressive environment of school grounds due to acts of physical and psychological damage that may lead to social and emotional damage for those involved directly or indirectly in these actions. The issue focuses on the reasons and the ways in which Brazilian measures to combat or prevent bullying in the school are going well or not, or if it has had more or less hits and efficiencies and why. It also justifies the choice of this theme and the development of this research for several events in different schools and states, since the violence involving young people begins to have a connotation of something commonplace in the school environment, requiring the school staff, family and community to search for ideas, actions and solutions to this problem. This research also aims to provide theoretical and practical material from examples of actions to combat or prevent bullying as to promote awareness and reflection of the phenomenon among young people and everyone involved in the educational process, even those not belonging the school grounds. One focus of approach is the concern about the teaching practices that should be developed in the classroom with an emphasis on solidarity, respect and promotion of Education for Peace. The theoretical framework that supports the research is books and articles on the topic of violence and bullying even published recently by different authors, but especially Olweus, Candau, Blaya, Ives de la Taille and Abramovay. The methodology is characterized by a qualitative research study and a survey of the literature on the subject and presents comments of cases aimed at combating and preventing violence and bullying, from attempts to deal with the problems pertaining to youth violence in schools. The examples presented are: the director’s role in this combat, investing in the consolidation of a team united and determined; when school is the aggressor, the isolation and the environment are not to blame for the offending school; the best way to combat violence: the approach to the community to create alliances; the strength of the team’s follow up, in the community of young people involved with drugs who have learning problems; peace mediators; implantation of the culture of peace in the school life, and solidarity among children, since the focus is always the emotional side of the child. As a conclusion, it is possible to think that even in the midst of so much violence we can see several ways to mitigate the problems encountered in everyday school life, including the acceptance of differences, unity between the school staff, the management of the school within the precepts of democracy, an active school council and school community presence, all being together in the formation of a citizen who has ethical values and especially make the school the foundation of a society truly based on democracy that we can work out being resilient and knowing that this overcomes the life with the problems, and not suffering. Key-words: education, violence, bullying, omission and resilient. SUMÁRIO INTRODUÇÃO ................................................................................................. 13 CAP. 1 VIOLÊNCIA ESCOLAR ........................................................................ 18 1.1 Breve panorama da violência................................................................... 18 1.2 Gestão Escolar ........................................................................................ 28 CAP. 2 HISTÓRICO E ANÁLISE DAS CARACTERÍSTICAS DO BULLYING .. 34 2.1 Origens do bullying ..................................................................................... 34 2.2 Pesquisas de Olweus ................................................................................. 36 2.3 O bullying no Brasil .................................................................................... 37 2.4 Características do bullying ......................................................................... 38 2.5 Personagens do bullying (vítima/agressor/espectador) .............................. 40 2.6 Como identificar os personagens do bullying ............................................. 44 2.7 Consequências do bullying ......................................................................... 46 2.8 Locais de assédio ....................................................................................... 51 CAP. 3 A RESPONSABILIDADE DA ESCOLA SOBRE A PRÁTICA DO BULLYING EM SEU INTERIOR ...................................................................... 53 3.1 Como a escola pode agir perante o bullying? ............................................ 56 3.2 Regras básicas de comportamento ............................................................ 57 3.3 Regras do regimento escolar ..................................................................... 58 3.4 Quando o professor é o agressor ............................................................... 59 3.5 A omissão da escola sobre a prática do bullying ........................................ 60 3.6 A responsabilidade da família sobre o bullying (vítima/agressor) ............... 61 3.7 O bullying mediante a lei ............................................................................ 63 3.8 Exemplos de combate ao bullying .............................................................. 67 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................. 78 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................. 82 INTRODUÇÃO Podemos dizer que Bill Waterson, o criador da personagem Calvin (“Calvin e Haroldo”, no inglês “Calvin and Hobbes”), em suas histórias em quadrinhos, aborda o tema do bullying colocando sua personagem em situações embaraçosas, as quais não possuem o apoio ou a colaboração dos adultos que se encontram afastadas da situação, muitas vezes até desconhecendo os fatos que estão ocorrendo. Faz uso de violência física e psicológica sendo que seu agressor mais frequente é Moe. Os quadrinhos acima referenciam e evidenciam esta situação. Outras personagens que também sofrem com o bullying e que merecem ser relembradas são o Minduim (Charlie Brown, das tiras em inglês “Peanuts”), do criador Charles Schulz. Esta personagem sofre com os desaforos da personagem Lucy. Citamos ainda, o Bart Simpson, do criador da série Os Simpsons, Matt Groening, que passa por situações complicadas com jovens de idade mais elevada em seu ambiente escolar. Em diferentes momentos deste trabalho são apresentados exemplos de quadrinhos que evidenciam a problemática desta pesquisa sendo que os mesmos estão presentes também em formato texto estabelecendo relação com o referencial teórico utilizado. O fato de, essas situações, serem abordadas em mídia impressa como as histórias em quadrinhos, as quais são veiculadasem revistas, em jornais e em mídia televisiva, aproxima as pessoas das mais variadas localizações geográficas ao fenômeno do bullying, bem como de suas provocações, e das dificuldades enfrentadas, uma vez que, expõem as vítimas e as ações do agressor do bullying. As histórias em quadrinhos nos mostram ainda, a omissão ou do desconhecimento que há por parte dos adultos no que se refere a este fenômeno como também as discussões e reflexões que provêm disso. É uma forma de abordar o assunto e as problemáticas envolvidas. Quando idealizamos a escola como um espaço onde depositamos nossas esperanças de formação de um cidadão capaz de agir eticamente e constatamos que tem sido um lugar de expressão e manifestação da violência, nos questionamos sobre a possibilidade real de concretização do objetivo maior com que a escola trabalha, ou seja, para a vivência na coletividade e o exercício da cidadania. Acreditamos que ao se compreender o fenômeno do bullying, como um exemplo das manifestações da violência é possível buscar e encontrar caminhos novos para se implantar a cultura da paz nas escolas e formar cidadãos éticos, por meio da prevenção e da luta a essas práticas que têm sido recorrentes. Muitos são os desafios para se realizar o combate à violência escolar e eles devem se orientar por alguns parâmetros importantes na escolha das estratégias mais oportunas, como: a) adequação ao público envolvido; b) realização de um levantamento no recinto escolar e no seu entorno com o objetivo de descobrir as razões destes problemas; c) todos os membros da escola, pais, alunos, professores devem somar esforços para construir e concretizar projetos de enfrentamento. Muitas escolas têm posto em prática algumas estratégias que contam com resultados em longo prazo, e isso não deve atrair ou provocar a desistência, pois ainda somos movidos pela esperança. O que não pode haver é a omissão ou a negligência. No Brasil, o conceito adotado para definir a violência contra crianças e adolescentes tem por base o poder. Segundo Bourdieu (2002) este “poder” se pauta no mau uso da autoridade, isto ocorre quando um indivíduo que possui poder suprime opiniões, a autonomia de outros sujeitos que lhe são “submetidos”, visando alcançar objetivos e obter vantagens previamente definidos (dominação, prazer sexual, lucro, entre outros). A relação violenta nega os direitos de um dos sujeitos da relação que se encontra na situação de dominado e isso interferem e desestruturam sua identidade. Em razão disso é que esta pesquisa tem como objetivo buscar a compreensão do fenômeno bullying nas escolas e as estratégias de prevenção e enfrentamento postas em prática para, dessa maneira, contribuir para a diminuição da violência que tem acontecido no cotidiano escolar. Precisamos construir pontes entre a escola e a comunidade com o objetivo de haver uma relevante participação de todos visando coibir os problemas no recinto escolar e em seu entorno. Sendo a escola um espaço de socialização, deve-se refletir sobre suas práticas pedagógicas em relação ao bullying e como cada um dos envolvidos na relação educativa desenvolverá seu papel e suas funções na realização dessas ações. Para Delors (2001), a educação é um caminho que conduz o desenvolvimento humano de forma harmoniosa, combatendo formas de pobreza, exclusão social, intolerâncias e opressões. É um caminho para se buscarem valores que promovam transformações na sociedade, na cultura e isso envolve opções, escolhas, ou seja, é um ato político e envolve ética, responsabilidade e compromisso. Qualquer fenômeno educativo que busca tratar de suas questões de forma crítica, descobrindo suas causas, relações, precisa se pautar em uma perspectiva ou abordagem sistêmica. Essa abordagem trata da ideia de que um determinado objeto ou tema de estudo possui diversas dimensões que podem ser mais aprofundados os estudos e melhor entendidas por meio da conjugação de conceitos e princípios oriundos de diversas ciências. O bullying é um caso que vai envolver reflexões provindas de diferentes áreas do conhecimento. As reflexões e pesquisas feitas inclusive atualmente servem de suporte para a área da educação e seus profissionais terem visões estratégicas para elaborar e mediar os conflitos tendo como principal objetivo a construção de um ambiente de respeito e solidariedade em uma cultura de paz ou de Educação para a Paz. O conhecimento jurídico e da legislação sobre o bullying se faz necessário para orientar e sustentar o campo pedagógico na tomada de decisões por parte dos gestores, coordenadores e professores. É nessa perspectiva que se estrutura esta dissertação. A metodologia utilizada se deu por meio de levantamento e estudo bibliográfico pela busca das seguintes palavras-chave: bullying, violência e gestão escolar, envolvendo tanto as produções acadêmicas e de conteúdo de pesquisa como as produções oriundas de diferentes mídias como jornais, revistas, sites, entrevistas já que, como foi dito no início, é um assunto de destaque e preocupação social. Cremos que trazer para a pesquisa a produção não acadêmica mostra um entrecruzamento de conteúdos que visa enriquecer as análises, além do que, muito do que é veiculado pela mídia – e em especial, pelos quadrinhos que são trazidos neste trabalho – têm como base tanto experiências ou vivências pessoais ou indiretas como resultados de pesquisa. A partir do estudo dessas fontes foram escolhidos casos nacionais e internacionais que trazem estratégias de prevenção e enfrentamento do bullying no universo escolar para serem descritos e analisados. O referencial teórico utilizado baseou-se especialmente em Olweus, Candau, Blaya, Ives de la Taille, Abramovay e de suas reflexões foram extraídas possíveis “chaves” de interpretações do fenômeno e do que está sendo focado ou privilegiado pelas formas de enfrentamento e combate ao bullying em suas peculiaridades e particularidades. Esta dissertação estrutura-se da seguinte maneira: No Capítulo I, enfoca-se a violência e suas manifestações no ambiente escolar. Com prioridade, destaca-se a violência gerada por meio das manifestações de bullying. Destaca-se ainda a função da equipe gestora para a construção de uma cultura de paz no convívio do ambiente escolar e salienta- se que o gestor deve ter um papel preponderante na mediação dos conflitos. No Capítulo II, faz-se uma análise das origens do bullying e observam- se relatos de pesquisas sobre o tema bullying no Brasil, as características desse fenômeno, análise dos personagens envolvidos com o bullying (vítimas, agressor e expectador). No Capítulo III aborda-se a responsabilidade da escola sobre a prática do bullying em seu interior, estudam-se alguns casos considerados como exemplos que obtiveram êxito na resolução dos conflitos gerados pelo bullying. Também são apresentadas as propostas ou medidas brasileiras de combate ou prevenção ao bullying na escola que vêm sendo realizadas em vários Municípios dos Estados de Santa Catarina, Rio de Janeiro e São Paulo, com base em leis, mas não temos resultados atuais, visto que são medidas recentes e os respectivos resultados aparecem em longo prazo. Na parte final, conclui-se por meio desta pesquisa que a existência de bullying na escola se dá pela omissão ou desconhecimento e a cumplicidade e responsabilidade de todos os membros da comunidade escolar para ajudar, prevenir e combater o fenômeno junto aos demais sujeitos presentes na escola, ressaltando-se a ênfase no desenvolvimento da habilidade de resiliência como uma capacidade positiva que permite superar as dificuldades e as marcas da violência. CAPÍTULO 1 – VIOLÊNCIA ESCOLAR 1.1. – Breve panorama da violência Um breve panorama histórico é necessário para que se possa entendercomo as crianças e adolescentes foram, no decorrer do tempo, envolvidos ou se envolveram em situações e relações de maus tratos por várias instituições ou sujeitos sociais. Em vista disso e por meio de transformações socioculturais passou a haver ênfase no “sujeito de direito’’ que é aquele que necessita de intervenção de vários segmentos da sociedade pública e civil para ser protegido”. Na medida em que é preciso haver regulamentação e proteção, ou seja, intervenção de várias ordens, isso indica que os direitos não estão sendo respeitados ou garantidos cultural e socialmente. Esta proteção ficou fundamentada no Estatuto da Criança e Adolescente (ECA) – 1990 em seu artigo 5° e são reflexos da Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), aprovado pela Assembleia Geral das Nações Unidas, no mesmo ano. O referido artigo trata do direito das crianças e do cidadão e está explicitado também na Constituição Federal do Brasil (1988) em seus Artigos “A violência, seja qual for a maneira como ela se manifesta, é sempre uma derrota”. Jean-Paul Sartre http://pensador.uol.com.br/autor/jean_paul_sartre/ 6º e 205º como direitos de todos e dever do Estado, que nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligencia, discriminação, exploração, violência, crueldade e pressão, punido na forma da lei, qualquer atentado, por ação ou emissão aos seus direitos fundamentais. O que fazer e pensar diante desta questão? O entendimento e o significado que a cultura de cada sociedade dá para o que é entendido por violência costumam não ser consensuais e muitas vezes são chocantes para nós. Em muitas das análises e entendimentos, o que prevalece é o pensamento sobre a falta de solidariedade, de respeito e principalmente a falta de tolerância entre sujeitos e grupos sociais. A “Declaração de Princípios sobre Tolerância” (UNESCO1, 1995), afirma que a tolerância é necessária de ser estimulada e desenvolvida entre os sujeitos e também no âmbito da família e da comunidade. A promoção da tolerância, o aprendizado da abertura e flexibilização, da escuta mútua e da solidariedade, devem ser realizados nas instituições formais de nossa sociedade, nas escolas e nas universidades, na educação não formal, bem como nos lares e nos locais de trabalho. Nos quadrinhos abaixo, Calvin se vê impotente em relação às ameaças e intromissões do Moe. O garoto faz uso de seu tamanho desigual e de sua força como elementos de vantagem sobre o outro. A tolerância, a abertura, a escuta e demais atitudes citadas acima não estão presentes por parte de um dos lados da relação. 1 Organização das Nações Unidas para a Educação e a Cultura. Segundo Abramovay, “além da multiplicidade de formas assumidas pela violência, existem, diferenças entre períodos históricos e culturais no que tange à compreensão sobre o tema” (2005, p.54). Isto implica pensar que os valores e o pensamento sobre determinados aspectos culturais têm suas marcas temporais e espaciais, sendo passíveis de serem transformadas. E é sob essa premissa que as ações educativas se pautam. Como diz Odália: A guerra é um ato violento, o mais violento de todos, contudo esse caráter essencial parece passar a ser secundário se o submergir sob razões que vão desde a defesa da pátria às incompatibilidades de ideológicas. (1983, pg. 23). A autora traz o fator da incompatibilidade ideológica como um dos elementos promotores de guerras, entretanto, relativiza o fato dependendo do ponto de vista de quem a promove. O agressor pode justificar o seu ato violento em resposta a outro ato violento como forma de defesa. Ao se tratar da guerra ou dos conflitos de interesses na sociedade, Freud diz que a violência é um recurso próprio dos animais e dos seres humanos e: É, pois um princípio geral que os conflitos de interesses entre os homens são resolvidos pelo uso de violência. É isto que se passa em todo o reino animal, do qual o homem não tem motivos para se excluir. (FREUD, 1932, pg. 198). Levando-se em consideração que a violência é algo intrínseco aos homens e que faz parte da cultura e das relações sociais, faz-se importante pensar na mediação como uma estratégia para a boa convivência. Abramovay destaca que “além da multiplicidade de formas assumidas pela violência, existem diferenças entre períodos históricos e culturais no que tange à compreensão sobre o tema”. (2005.p.55) As manifestações da violência nem sempre se apresentam de modo explícito. De acordo com Abramovay, a violência se caracteriza por variadas formas e está presente em diversos lugares. “Não necessariamente se fazem necessárias provas, corpos, para configurar como violência” (ABRAMOVAY 2005, p.54). A autora apresenta três classificações da violência, a direta, a indireta e a simbólica. A violência direta se refere aos fatos físicos que resultam em prejuízo deliberado à integridade da vida humana (...) envolve todas as modalidades de homicídio (assassinato, chacinas, crimes de guerra, suicídios, acidentes de trânsito e massacres civis). A violência indireta envolve todos os tipos de ação coerciva ou agressiva que implique prejuízo psicológico ou emocional (...) a violência simbólica abrange relações de poder interpessoais que cerceiam a livre ação, pensamentos e consequência dos indivíduos. (ABRAMOVAY, 2002, pg. 27-28). Para Costa (2003), a violência é a agressividade aplicada com fins de destruição, por meio de agressões físicas, brigas e conflitos que podem se desencadear através de expressões que agridem fortemente a humanidade. Neste caso, a ação é traduzida como violência não só pela vítima, mas também pelo agente e pelo observador. Faz-se violência quando existe um grande desejo de destruição. O autor deixa claro que o objetivo do ato é causar danos (físicos, morais, psicológicos, etc.). Nem mesmo as brincadeiras são ingênuas, podendo ter gradações de violência ou agressividade. Podemos pensar que talvez a mídia colabore com isto, devido à sua programação diária, mas podemos analisar também que a mídia oferece material para elaboração simbólica e que isso é necessário para os sujeitos usarem como “válvula de escape”. Sem dúvida, é uma via de dois sentidos, mas podemos levantar ainda, a falta de cuidado dos pais em selecionar o que é mais conveniente para as crianças e adolescentes assistirem e que acaba influenciando seus modos de pensar e agir. A conscientização deve ser uma ação estimulada pela via da educação. É muito comum a ocorrência de problemas, no dia-a-dia da escola, pois este é um lugar de frequência assídua, de encontros, de sociabilidade e socialização dos sujeitos. É no ambiente escolar que os sujeitos de mesma ou de diferentes idades, de mesmo gênero ou de gêneros diferentes se encontram e se relacionam e, portanto, relações desiguais estão presentes. Quando os conflitos passam a ser rotineiros podem atingir níveis altos de violência e seus efeitos tendem a ser prejudiciais ao desempenho escolar, além do que danos físicos, emocionais ou psicológicos podem ser causados às pessoas vindas a comprometer suas relações. Desta forma, é inadmissível que haja omissão ou negligência dos adultos e, especialmente, da equipe escolar. As manifestações de violência que acontecem na escola são, por exemplo, as agressões verbais, as quais podem ser “consideradas incivilidades, xingamentos, desrespeito, ofensas, modos grosseiros de se expressar, discussões, que se dão muitas vezes por motivos banais ou ligados ao cotidiano da escola.” (ABRAMOVAY, 2005). Outras formas de violência que são manifestadas no recinto escolar são as agressões físicas que ganham atenção pelo “grau de violência e agressividade envolvido nas disputas, pelos instrumentos e mecanismos utilizados paraatacar o adversário, e pelo fato de os alunos estarem ora como vitimas, ora como agressores.” (ABRAMOVAY, 2005, p.171). Este tipo de violência envolve alunos, mas podem ocorrer conflitos entre alunos e adultos da escola, principalmente professores, é o que destaca Abramovay (op.cit.). A violência simbólica ocorre quando existe o mau uso da autoridade (poder), quando o sujeito que possui poder suprime opiniões, impede a autonomia de outros indivíduos que passam a ser-lhe “submetidos”. Muitas vezes pode ser observado este tipo de violência na sala de aula vindo da parte do professor para o aluno, na medida em que aquele de alguma forma priva a liberdade do outro e tenta demonstrar poder sobre ele. Tais atitudes do professor nem sempre são percebidas pelo aluno como atos violentos e nem o fato de que ele é vítima desses atos, uma vez que o professor dificilmente admitirá que esteja abusando de sua autoridade e que isso poderá trazer prejuízos ao aluno imediatamente ou em longo prazo, principalmente em seu desempenho na escola. A princípio, não existem sujeitos específicos no interior da escola que podem estar envolvidos em conflitos. Qualquer pessoa ligada a esta instituição, direta ou indiretamente, ou outros sem vínculo, podem cometer atos de violência neste espaço. Todos esses tipos de violência são, por exemplo, mostrados nas tiras do Calvin de que nos valemos até o presente momento e que também serão vistas mais adiante envolvendo outras personagens. O que mais contribui para a possível relação entre jovem e violência pode ser destacada no estado de vulnerabilidade social e de descuido em situações familiares e por parte dos adultos, desde a infância, pois o sujeito é biopsicossocial e os fatores que influenciam são, de fato, multifatoriais. A vulnerabilidade social se apresenta: Como o resultado negativo da relação entre a disponibilidade dos recursos materiais ou simbólicos dos atores, sejam eles indivíduos ou grupos, e o acesso à estrutura de oportunidades sociais, econômicas, culturais que proveem do Estado, do mercado e da sociedade. (ABRAMOVAY, 2002, p. 29). Destaca-se ainda que a relação entre juventude e violência é: Um produto de dinâmicas sociais, pautadas por desigualdades de oportunidades, segregações, uma inserção deficitária na educação e no mercado de trabalho, de ausência de oportunidades de lazer, formação ética e cultural em valores de solidariedade e de cultura de paz e de distanciamentos de modelos que vinculam esforços e êxitos. (ABRAMOVAY, 2002, p.56). Observa-se também, em alguns casos, que a própria escola tende a contribuir com a falta de desempenho social, educacional e profissional dos alunos. Isto acontece quando não há confiança nos alunos, quando se possui uma representação negativa da juventude, não dando oportunidades aos alunos para demonstrarem habilidades, quando não oportuniza a participação, quando não compreende os problemas sociais ou pessoais pelos quais o jovem está enfrentando. Ao agir desta forma a escola e os adultos fazem ou podem fazer com que o jovem não confie na escola, não tenha sentimento de pertencimento, não tenha possibilidade de ascensão e mudança. Associado a esta desestabilidade escolar e, se o referencial familiar for desequilibrado ou instável, o sujeito encontrará nos grupos dos quais toma parte as suas referências ou ancoragem. Podemos citar como exemplo a participação e o envolvimento nas gangues escolares ou nas tribos (ABRAMOVAY, 2002). A escola pode gerar violência ao mesmo tempo em que também pode ser atingida pelos conflitos externos, pois não está apartada da sociedade. Ela reflete e absorve. E promove e propaga. Sabendo-se disso é preciso cuidado, atenção, responsabilidade e compromisso com a conscientização e reflexão de forma a se evitarem ou minimizarem as situações geradas ou refletidas no universo da escola e de seus sujeitos. Um fator que traz grande influência negativa ao ambiente escolar são os conflitos familiares. A isso Candau destaca que: A violência familiar, sofrida por crianças e adolescentes, tem sido motivo de grande preocupação dos educadores. Apesar de estar localizada, quase sempre, fora dos muros escolares, tal forma de violência interfere significativamente no cotidiano escolar. (CANDAU, 1999, pg. 35) Este fator pode prejudicar as relações sociais do aluno e interferir no seu desempenho escolar. Dependendo da gravidade e caso sofra violência vinda de qualquer membro da família, este pode ser um fator que impulsiona o próprio aluno a ser violento no ambiente escolar. Se pensarmos, principalmente, na criança como um ser vulnerável e ainda dependente do auxílio e da tutela adulta, os efeitos sobre ele podem ser mais fortemente marcantes. Toda pessoa necessita de amparo ao longo da vida e a criança deve ser conduzida pelos pais e professores para se desenvolver como ser pleno no que tange ao cognitivo, afetivo-emocional, física, psíquico, sociocultural e espiritual. Portanto, a família e a escola devem zelar pela qualidade do ambiente educativo e devem planejar e cuidar para que espaços viabilizem o desenvolvimento harmonioso e saudável dos indivíduos. O bem estar infantil está associado à capacidade da criança superar algumas limitações sociais, primeiramente com o apoio de adultos responsáveis e de serviços públicos de garantia de seus direitos, e posteriormente, por meio de seus próprios repertórios. Não é possível pensar em cooperação, reciprocidade e direitos quando as relações que se estabelecem dentro de uma escola são assimétricas, isto é, estão fundadas no respeito unilateral, numa coação tanto intelectual quanto moral. A equipe gestora e as práticas pedagógicas necessitam contemplar e considerar as vozes infantis e juvenis como uma das possibilidades de conhecer o universo simbólico de seus alunos. Para tanto, devemos buscar uma proposta pedagógica centrada na própria infância e juventude relativizando as concepções e hipóteses dos adultos. Quando o ponto de vista do outro é levado em consideração, isso pode contribuir para transformar os processos e práticas de formação inicial e continuada do professor. As formações nem sempre tem auxiliado os professores na construção de um conjunto de saberes que viabilize uma ação educativa condizente com as necessidades, características e peculiaridades dos alunos e, sobretudo, que lhes permitam entender a produção de saberes a partir do contexto sociocultural no qual os sujeitos experimentam o mundo. Familiares que agridem e violam suas crianças, geralmente, foram ou são vítimas de outras agressões e violações, entretanto, nenhum determinismo justifica a violência. As pessoas não podem acreditar e se deixar influenciar pelas frases “bateu porque apanhou”, “violentou porque foi violentado”, temos que acreditar que a liberdade e a dignidade humana podem superar determinações morais, culturais e genéticas. Toda pessoa necessita de sistemas de suporte ao longo de sua vida e precisa aprender a construir processos de resiliência. A resiliência é um conceito psicológico “emprestado” da física que define a capacidade de cada sujeito para lidar com os problemas, superar obstáculos ou resistir à pressão de situações adversas, tais como choque ou estresse, sem entrar em desequilíbrio emocional ou, se ao acaso desestruturar-se, ter condições de voltar ao equilíbrio. A resiliência é uma combinação de habilidades que propiciam ao ser humano condições para enfrentar e superar problemas e adversidades, ou seja, é uma atitude de sobrevivência emocional. A família, seguida pela escola, deveriam ser os principais sistemas e agentes de socialização, de suporte e de promoção da resiliência. Acredita-se na resiliência desde que o individuo seja assistido pela família e pelas políticas públicas (YUNES, 2003). http://pt.wikipedia.org/wiki/Psicologiahttp://pt.wikipedia.org/wiki/F%C3%ADsica Podemos destacar como um princípio do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) em relação à escola: Artigo 5º - Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais. Diante deste artigo entende-se que um dos desafios e compromissos da comunidade educativa é o de construir, a cada dia, em cada turma e para cada aluno, o maior equilíbrio possível entre forças éticas, adversas e de tensão. Não podemos deixar de estimular e manter o diálogo como uma forma de enfrentamento da violência na escola. Tanto a palavra e o diálogo como a reflexão e a conscientização bem como a resiliência, são habilidades ou capacidades a serem desenvolvidas e fomentadas, a fim de que possa haver mudanças em nossa cultura visando à transformação dos sujeitos e da sociedade. 1.2. – Gestão Escolar na Prevenção da Violência Compreende-se por gestão escolar como a organização do trabalho educativo voltado para um objetivo definido, a saber: a realização e a apropriação do conhecimento escolar. Referimo-nos aos meios empregados para que a prática educativa e o trabalho educativo alcancem seus objetivos de propor e possibilitar a formação necessária para que os alunos sejam integrados e pertencentes a uma determinada forma de sociedade na qual estamos inseridos. A gestão, sob caráter político e na perspectiva crítica deve visar uma educação transformadora que promova a compreensão das contradições sociais a partir do conhecimento produzido historicamente pela humanidade. Gestão democrática é um reflexo da evolução politica da sociedade, pois tem uma participação fundamental no processo de constituição das relações sociais no interior da escola numa perspectiva critica e em que a organização do trabalho educativo ocorra numa direção coletiva. A perspectiva crítica se dá pela busca de apresentar, analisar, refletir e compreender o trabalho sob um olhar histórico e pautado pelas contradições sociais, na tentativa de superá-las. Esse olhar crítico a que nos referimos é em relação à organização do trabalho coletivo escolar, compreendendo-o como uma forma de trabalho realizado pelo conjunto da escola, por todos aqueles envolvidos com a organização do trabalho pedagógico, O termo “trabalho coletivo” tem sido enfatizado no campo educacional já há algum tempo. Por parte dos educadores, houve toda uma mobilização, principalmente ao longo da década de 1980, para que fossem garantidos espaços de formação de professor, construção do projeto politico- pedagógico da escola, discussão dos problemas comuns do processo de ensino entre outras [...] No processo de trabalho organizado sob forma coletiva, o resultado do trabalho de um é o ponto de partida para o trabalho do outro, promovendo uma dependência direta dos trabalhadores entre si, o que obriga cada um a empregar o tempo necessário à sua função. (OLIVEIRA, 2006, p. 94, 96). A violência e a indisciplina são também processos externos ao ambiente escolar, produzidas pelo contexto social, econômico e politico da realidade em que vivemos. A prática docente muitas vezes reproduz dentro da escola as contradições sociais de uma forma de organização social pautadas pelas relações de dominação e de poder, ou seja, pelas marcas da violência. Pensar a violência e a indisciplina no âmbito da gestão escolar constitui- se como uma necessidade do desenvolvimento do trabalho educativo na perspectiva democrática, deve zelar pela boa educação valorizando e incentivando iniciativas que tendem a desenvolver uma cultura de paz ou uma Educação para a Paz, em que haja e prevaleçam as boas relações, o respeito mútuo, a tolerância e a dignidade humana. A gestão Escolar assume aqui um papel fundamental no qual deve oferecer recursos materiais, físicos e pedagógicos para o desenvolvimento de projetos que visem diminuir, prevenir e combater a ocorrência do bullying e outras manifestações de violência no espaço escolar. A escola deve buscar conciliar o que ocorre fora de seus muros e o que ocorre no seu recinto, pois o papel da gestão educacional contribui no desenvolvimento da capacidade permanente de exercício da crítica como condição intrínseca para o desenvolvimento do sujeito com base na autonomia. Essa é a condição política que a educação se impõe diante de uma prática pedagógica que busca compreender e superar os processos de violência dentro do espaço escolar. Ao mesmo tempo pensar a gestão escolar democrática envolve a realidade do espaço público como espaço de contradições e poder. Para Bedin (2010), a escola deve ser reinventada, no que tange ao poder, para que consiga realizar a sua verdadeira missão que é educar. Quando pensamos em escola democrática pode ser difícil conceder e permitir a participação dos outros membros da escola na gestão, assim como sua adesão. Mas este exercício deve ser feito. Outra problemática é a parte de gerenciamento das verbas que consome grande parte do tempo do diretor. Nestas circunstâncias, o lado pedagógico sempre fica em segundo plano, ou então, a coordenação assume essas funções, agindo como se fosse a direção. A busca de soluções é sempre complicada, pois constantemente esbarra no tempo e na falta de interesse de muitos. Para que realmente exista uma escola democrática há a necessidade de desenvolver uma gestão escolar colegiada e, para tanto, nos referimos à constituição do Conselho Escolar como instância promotora dos mecanismos de participação social e mesmo política na gestão da escola. Como resultado do processo de redemocratização da sociedade brasileira, na década de 80 deu-se início a implantação dos Conselhos Escolares em várias regiões do Brasil. Os conselhos escolares surgem de fato no cenário educacional brasileiro no inicio da década de 80, embalados pelo movimento de redemocratização do país. Isso foi resultado da reorganização da sociedade civil que buscava no limite da sociedade capitalista, construir e ampliar espaços de organização e participação popular em todos os setores da sociedade no caso, da busca de uma nova organização de trabalho e de administração das escolas públicas brasileiras. [...]. (ALMEIDA, 2006, p.26). O Conselho Escolar ganhou uma dimensão não apenas de fórum colegiado para pensar a escola pública, mas antes de tudo para transformar a escola num espaço de reflexão, medida estimulada pelas políticas educacionais. A Constituição de 1988 traz no artigo 206 inciso VI a contingência legal que garante a organização do sistema de ensino nas bases democráticas e essa democratização fica reforçada com a LDBEN/9394/96 que deixa clara a opção pela gestão democrática no ensino público brasileiro. Construir uma cultura da participação envolve a mobilização da comunidade escolar no sentido de que a educação é um direito e um dos primeiros aspectos para a constituição de uma cidadania ao mesmo tempo em que é um pressuposto para o desenvolvimento da participação da sociedade na escolarização pública. Entretanto, para que este processo entre em ação, depende-se da mobilização da sociedade organizada para exigir e reivindicar políticas públicas para a educação. O que todos os educadores, gestores, pais e alunos devem buscar consciente e garantidamente, é o direito da criança e do adolescente estudarem num ambiente saudável e isto inclui que todos sejam aceitos e respeitados em suas diferenças. Para isto, é necessário estimular uma pedagogia da admiração e afirmação da vida, da alegria de viver, acreditando sempre que a mudança de um promoverá a mudança de todos (CANDAU, 1999). A gestão tem um papel primordial para lidar com as situações de violências, necessitandode ajustes conceituais e práticos, tendo em vista a gama de peculiaridades e necessidades para a tarefa educativa que se coloca. A contribuição de Chrispino e Chrispino (2002, p.83 e 84) que apresentam um quadro-resumo dos tópicos de sua proposta de “Mediação de Conflitos” pode ser um começo para elucidar os conflitos escolares, mas também pode ser o caminho que cada gestor irá adequar a sua realidade escolar. Seguem abaixo, os tópicos designados pelos autores: Política Pública: introdução da Mediação de Conflitos e redução da violência no espaço escolar. Justificativa: a escola tem sofrido com inúmeros episódios de violência em vários níveis e com conflitos envolvendo diversos atores. Isto tem causado dificuldade para o alcance de seus reais objetivos. Etapa Principal: criar condições para que a escola possua a cultura de mediação do conflito entre todos os seus atores. Etapas Necessárias: conhecer a cartografia da violência e do conflito no ambiente escolar por meio de uma Avaliação da Violência Escolar; criar em curto prazo um Plano de Segurança nas escolas; estabelecer a necessidade de adequar lentamente os prédios escolares numa visão de escola segura; capacitar pessoal e mudar a dinâmica da gestão. Estratégias: Sensibilizar para a necessidade de se discutir o assunto; conscientizar para a necessidade de mudar a maneira como a escola trata o assunto, e operacionalizar ações efetivas para diminuir e reduzir a violência escolar. Abordagem e Parcerias: iniciar discussão junto aos diretores sobre a maneira de ver e entender o conflito e a violência na escola. Construir o processo junto com professores, alunos e comunidade. Avaliação Final: existência de Plano de Segurança da Escola –“PAZ nas Escolas” e a instalação de Mediadores de Conflito no ambiente escolar. Ganho Indireto: o aprendizado da mediação do conflito na escola torna-se patrimônio cultural do futuro cidadão. Espera- se que esse tipo de cultura possa ser utilizado em outros setores da relação social (CHRISPINO e CHRISPINO, 2002, p.83 e 84). Para que esta proposta seja colocada em prática pensamos muito mais em posturas que envolvem atitudes democráticas, participativas e vontade política por parte dos gestores e professores e uma visão humanitária por parte de nossos governantes para que tenham um mínimo de conscientização em reafirmar que a educação é a prioridade de qualquer país que queira ser considerado de primeiro mundo. É preciso repensar a necessidade de uma mudança na formação de professores e gestores frente aos temas de solidariedade, respeito, preconceito e principalmente o amor pelo ser humano como forma de combater a violência escolar visando à mediação de conflitos e a Educação para a Paz. Para Charlot (1997), a escola possui um papel central no processo de aprendizagem. Ele lembra que pais e estudantes a enxergam como um espaço de aquisição do saber, de status e de possível mudança social. Charlot (1997) diz ainda das dificuldades de se analisarem os diferentes aspectos da violência escolar, em que nem sempre é fácil separar a análise dos fenômenos, a referência às normas e a reflexão sobre as soluções. A partir de 1960, quando a escola se ampliou para receber uma parte da população que estava fora dos muros escolares, a massificação não correspondeu à melhora na qualidade do ensino e da aprendizagem, tornando evidente a exclusão das crianças e jovens pertencentes às classes populares. A escola tornou-se então, ao longo do tempo um espaço de geração e de reprodução da violência em suas mais diferentes manifestações. Os fatores que contribuem para os conflitos e violência no cotidiano escolar são os mais variados e um dos casos que cresce de forma intensa e agravada é o bullying. CAPÍTULO 2 – HISTÓRICO E ANÁLISE DAS CARACTERÍSTICAS DO BULLYING 2.1. Origens do Bullying O primeiro país a se preocupar com o fenômeno bullying escolar foi a Suécia, na década de 1970. Na busca de soluções para o problema, investigaram-se as causas buscando formas de prevenção e soluções alternativas para os casos já existentes. O professor Dan Olweus, pesquisador da Universidade de Berger foi o primeiro a observar esta problemática nos intervalos e em locais distantes da área administrativa da escola. Tal observação se tornou o marco de suas pesquisas. Dan Olweus desencadeou um projeto de intervenção envolvendo o governo e a sociedade civil numa campanha nacional de conscientização sobre “Bullying é uma violência que cresce com a cumplicidade de alguns, com a tolerância de outros e com a omissão de muitos”. Gabriel Chalita a violência escolar. O projeto alcançou repercussão em outros países como Inglaterra, Canadá e Portugal que também tinham que lidar com o fenômeno do bullying. O bullying passou a ser objeto de atenção das autoridades educacionais na Noruega somente no ano de 1983, com a morte de três alunos na faixa etária de 10 a 14 anos, causadas pelos maus tratos que recebiam de seus companheiros de escola, fato que tornou o ambiente escolar carregado de medo e tensão. Na Espanha, foram realizadas investigações para a prevenção da violência escolar por meio de campanhas e programas fomentados pelo Ministério da Educação e Ciência e pelas universidades espanholas. Um deles é o SAVE (Sevilha contra a Violência Escolar), desenvolvido pela Universidade local no ano de 1996, em Sevilha, com o objetivo de desenvolver a educação de sentimentos e valores, melhoria de convivência e dos relacionamentos interpessoais. Na Inglaterra, atualmente, desenvolvem-se alguns projetos com base nas campanhas realizadas na Noruega. Um dos projetos desenvolvidos foi “NÃO SOFRA EM SILÊNCIO”, realizado nos anos de 1991 e 1993. Tal projeto envolveu escolas do ensino primário e secundário com orientação disponibilizada às crianças envolvidas com o bullying. Este material educativo buscou preservar a segurança das crianças, valorizando e incentivando o desenvolvimento da amizade, a mediação de conflitos e apoio psicológico. Este programa teve ainda por objetivo promover o respeito interpessoal, adquirir confiança em si mesmo, elevando a autoestima, aspectos relacionados a resiliência. No ano de 1993, se realizou na Irlanda, a 1ª Conferência sobre o Bullying, por meio de programas educativos contando com representação teatral sobre prevenção da violência. Em 1996, a 1ª Convenção Internacional sobre o Bullying, desenvolveu programas e estratégias para prevenir o fenômeno com a criação de cursos de capacitação para professores. No curso de pedagogia se inseriram disciplinas voltadas para a formação de professores a fim de se tornarem aptos a identificar e realizar a mediação diante do bullying, evitando assim o conflito. A Europa enfatizou o fenômeno no ano de 2001 e isto só ocorreu por ser um grande fator causador de tentativas de suicídio entre adolescentes e jovens, o que mostra uma ausência da habilidade de resiliência. Um relatório Internacional de Saúde Mundial, realizado em 2004, mostra que o bullying é um problema crônico da sociedade e que tem persistido ao longo do tempo, embora as pesquisas só se ativeram a temática mais recentemente, a partir dos anos 80 e com mais ênfase nos anos 2000. 2.2. Pesquisas de Olweus Olweus realizou pesquisas sobre agressões e violência com aproximadamente 84.000 estudantes, 300 a 400 professores e 1.000 pais entre vários níveis de ensino. Foi um processo lento em que se observaram direta e indiretamente as características dos comportamentos que cada um dos grupos apresentava. Fez uso de um questionário contendo 25 questões com respostas de múltipla escolha que tinha como objetivo verificar com que frequência ocorriam as agressões, os locais de maior risco, os tipos de agressões e as percepções individuais. Desse estudo desenvolvido em escalanacional se pôde calcular que, aproximadamente, 15% do total de alunos das escolas de educação primária e secundária da Noruega figuravam como agressores ou como vitimas de agressões. As pesquisas se estenderam a vários países fazendo-se as devidas adaptações à realidade de cada comunidade. Em Portugal, a pesquisa realizada por Olweus contou com a participação de 7.000 sujeitos. Com a coleta de dados e o processar das informações, o pesquisador constatou que 22% dos alunos entre 6 e 16 anos já haviam sido vítimas de bullying. Os primeiros resultados foram informados por Olweus e por Roland no ano de 1989. Ambos revelaram que, um entre sete estudantes estavam envolvidos em caso de bullying. Em 1993, Dan Olweus publicou o livro ‘’Bullying at school’’, onde apresenta e discute o problema, os resultados de seu estudo, projetos de intervenção e uma relação de sinais e sintomas que identificariam vítimas e agressores. Por suas iniciativas nos anos 80 e pelo teor de seus dados e análises, Olweus é reconhecidamente um teórico de ancoragem nos estudos sobre a problemática do bullying. 2.3. O bullying no Brasil No Brasil, os primeiros estudos sobre bullying foram realizados pelo coordenador Aramis Lopes Neto. O Programa “Diga não ao Bullying” teve como objetivo reduzir o comportamento agressivo entre estudantes. Foi realizado pela Associação Brasileira Multiprofissional e Proteção a Infância e Adolescência (ABRAPIA), uma organização não governamental (ONG). Esta ONG sempre cuidou da violência contra as crianças, mas, infelizmente não conseguiu continuar o seu trabalho. No ano de 2006 fechou suas portas por falta de verbas. A pesquisa da ABRAPIA foi realizada com alunos de escola do Ensino Fundamental no Rio de Janeiro. Os objetivos eram ensinar e debater com os professores e alunos formas de evitar a violência no interior da escola e as consequências das agressões. A pesquisa revelou que 40,5 % dos alunos entrevistados estavam diretamente envolvidos nesse tipo de violência como autores ou vítimas de bullying. Os agressores faziam de vítimas pessoas com alguma característica que servia de foco para justificar suas agressões, por exemplo: obesidade, baixa estatura, deficiência física, outros aspectos étnicos ou religiosos. Segundo Oliboni que relata sobre o fenômeno bullying em nosso país: No Brasil o bullying também foi estudado por Canfield, em 1997, esta desenvolveu um estudo exploratório sobre o bullying em 4 escolas públicas da cidade de Santa Maria (RS). Utilizando um modelo adaptado do questionário de Olweus, Canfield constatou que o bullying, também, é uma realidade entre os alunos brasileiros. (OLIBONI, 2008, p. 12). No ano de 2000, Fante (2005) pesquisou um grupo de 430 estudantes de 5ª a 8ª séries do Ensino Fundamental e das 1ª e 2ª séries do Ensino Médio de uma escola privada de Barretos (SP) e identificou que 81% dos alunos estiveram envolvidos em algum ato de violência no decorrer daquele ano letivo. Destes, 41% foram identificados como casos de bullying, sendo 18% de alunos alvos, 14% de autores e 9% de alvo/autores. Quanto ao local de maior incidência do bullying, em primeiro lugar, apareceu a sala de aula, seguido dos corredores. Entre os autores, 73% declararam reproduzir contra seus colegas a violência sofrida em casa (OLIBONI, 2008). A pesquisa feita pela ABRAPIA com apoio financeiro da PETROBRAS e em parceria com o IBGE (Instituto Brasileiro de Opinião Publica e Estatística) e a Secretária de Educação do Município do Rio de Janeiro entre novembro e dezembro de 2002 e março de 2003, através de questionários distribuídos a alunos de 5ª a 8ª série, de 11 escolas, sendo 9 públicas e 2 particulares constatou que da prática do bullying 60,2% era em sala de aula, 16,1% no recreio, 15,9% no portão 7,8% em corredores.” (SAAVEDRA e NETO, 2003, p. 19). No princípio, tratava-se o bullying como brincadeira da idade, mas posteriormente observou-se a gravidade do ato por meio de casos que demandavam a atenção e interferência conjunta do poder público, de educadores e comunidades na busca por se mitigar esse problema. Apesar de se falar muito sobre o assunto pouco ou nada de concreto e eficiente se tem feito a respeito, o que o torna uma grave problemática atual. Uma lei de autoria do deputado Vieira Cunha (PDT-RS) quer instituir um “Programa Nacional de combate ao bullying” a ser colocado em prática pelo Ministério da Educação em parceria com o estado e municípios (www.2camara.gov.br) e propõe a conscientização da sociedade e a implantação de uma campanha nacional na mídia e a capacitação dos profissionais da educação e psicólogos especializados. Um dos possíveis motivos do crescimento da evasão escolar e da repetência pode ser o bullying, pois a escola é considerada por algumas crianças, vítimas de agressões, como um local hostil e não um ambiente de aprendizado. 2.4. Características do bullying “O bullying é definido como subtipo de comportamento agressivo que gera atos violentos. Comportamentos que visam causar danos ou prejudicar alguém.” (SILVA, 2010). http://www.2camara.gov.br/ O comportamento agressivo e o bullying são compreendidos como processos decorrentes entre uma pessoa e seu ambiente físico, social e cultural. O bullying não se restringe a um determinado nível socioeconômico, está presente em todas as classes sociais. Atitudes protagonizadas pelos agressores no bullying envolvem abuso de poder e ocorrem sem motivação consciente. Comportamentos violentos de forma verbal, física, psíquica, constante a uma mesma pessoa por inúmeras vezes são considerados bullying. A agressão proativa e reativa faz parte da característica do bullying também, pois a agressão reativa é aquela que o individuo tem como resposta de “sangue-quente”, é impulsiva, automática, defensiva a uma ameaça eminente. Já a proativa não ocorre como uma resposta defensiva e emocional a uma ameaça, ela é organizada com propósito e de maneira premeditada, sem qualquer característica automática ou impulsiva. Mas talvez o pior efeito produzido pelo agressor proativo seja condenar a vitima à ‘inexistência’, ou à ‘invisibilidade’, isto é o que faz geralmente uma mente premeditada, força o grupo a ignorar o colega, fazendo de conta que o mesmo não existe, desqualificando sua competência intelectual, ou rejeitando um pedido seu, dentre outros. Esse tipo de vitima passa a sofrer baixa autoestima e em alguns casos sequer tem forças para desabafar com alguém. Outro efeito produzido na vitima é se conformar para conviver com a situação se tornando uma voluntária servil do dominador. Para Neto (2003), há casos de pessoas que não suportaram tamanha pressão psicológica advindas do bullying e se suicidaram. Em virtude de graves consequências oriundas dessa prática, torna-se necessário repensar a violência oriunda do bullying que vem ocorrendo em todas as esferas da sociedade e desenvolver trabalhos com o objetivo de se estimular habilidades de resiliência nos sujeitos tanto quanto buscar uma forma de acabar com esse comportamento que tantas vidas têm prejudicado. Recentemente, dois livros foram lançados pela editora brasileira Cosac e Naify que contam histórias verídicas e autobiográficas envolvendo vivência de bullying e exercício de resiliência. A autora de ambos os livros é a atriz Julianne Moore e ela os escreveu como forma de ajudar seus filhos a enfrentar esse tipo de situação. O primeiro livro chama-se Morango sardento (MOORE, 2010) e conta a história da atriz, durante a infância, quando era chamada de “morango sardento” em razão de suas sardas e do cabelo ruivo. O apelido a incomodava e fazia menção a um suco em pó para ser dissolvido na água. Diz a atriz que isso a desorientava e mais tarde ela veio a saber que muitas outras pessoas receberam esse apelidopelas mesmas características. Ela tentava de muitas formas se livrar de suas sardas, inclusive, tomando banho com suco de limão. O segundo livro chama-se Morango sardento e o valentão da escola (MOORE, 2011) e nele ela narra as desventuras e dificuldades para lidar e enfrentar o valentão Pedro Bomba, temido por sua habilidade no jogo e por não titubear antes de arremessar a bola com força e violência nos menores no playground da escola. Em ambos os livros, a autora e atriz apresenta formas de lidar com essas situações de forma a ter saúde mental suficiente para não se deixar desmotivar ou esmorecer frente a situações difíceis e complicadas em que se vê sozinha para enfrentá-las. São exercícios de resiliência como forma de enfrentamento e de sobrevivência. Isso reforça a necessidade de se estimular e desenvolver essa habilidade como um recurso interno de estruturação emocional e psicológica. 2.5. Personagens do Bullying – Vítima/Agressor/Espectador Ao tratar do bullying privilegiarei SILVA (2010) porque a autora foca no aspecto psicológico. O bullying engloba três tipos de personagens, para ela são: a) as vitimas da agressão, isto é, os agentes passivos que sofrem a agressão; b) os agressores, agentes da ação; c) o espectador, ou testemunha, que são coniventes, incentivando mesmo que com medo, sem participar diretamente do ato de violência. (SILVA, 2010). O termo vítima vem do latim “victimia e victus” que significa vencido, dominado, ou seja, os que sofrem os infelizes resultados consequentes dos próprios atos, dos atos dos outros ou do acaso. De acordo com Silva (2010), existem três tipos de vítimas: a) a típica; b) a provocadora; c) a agressora. A típica é, em geral, tímida, submissa, pouco sociável, com aspectos físicos frágeis e com dificuldades de se impor. Geralmente apresenta algo que a difere dos outros, algo que não está dentro dos padrões impostos. De acordo com Silva (2010, p.38), Essas crianças estampam suas inseguranças na forma de sensibilidade, passividade, submissão, falta de coordenação motora, baixa autoestima, ansiedade excessiva e dificuldades de se expressar. (SILVA, 2010, p. 38). A vítima provocadora é aquela que provoca reações agressivas com as quais não pode lidar e tenta reagir a essas agressões. Na maioria das vezes, são crianças ou adolescentes hiperativos e impulsivos (SILVA, 2010). Observa- se na vítima a satisfação ao chamar a atenção dos outros. Dessa maneira, é como se a vítima dissesse “ei, olhem pra mim eu preciso de ajuda” (SILVA, 2010). E finalmente, a vítima agressora é a que reproduz com outra pessoa mais frágil os maus tratos que sofre. Isso contribui para que o bullying ganhe proporções ainda maiores, pois se torna um círculo de comportamentos agressivos. Silva observou que: A maioria das vítimas de bullying possui personalidade afetiva, repleta de sensibilidade, empatia e senso moral em relação aos demais. Geralmente apresentam elevados níveis de inteligência, concentrando-a em atividades nas quais se sente atraído desde cedo, e em sala de aula fica com o olhar perdido e só faz o que realmente lhe interessa. (SILVA, 2010, p. 81) Além da preocupação com as vítimas, é necessário compreender os motivos que levam uma criança ou um jovem a expressar sua agressividade na escola e, muitas vezes, sob a forma de crueldade. Segundo Silva, “os agressores apresentam, desde muito cedo, aversão às normas, não aceitam ser contrariados ou frustrados, geralmente estão envolvidos em pequenos delitos e o desempenho escolar costuma ser regular ou deficitário” (SILVA, 2010 p. 43). Desde cedo apresentam manifestações de desrespeito como maus tratos a irmãos, colegas, animais de estimação, empregados domésticos ou funcionários da escola, além da ausência de culpa ou remorso (SILVA, 2010). De acordo com Neto (2005) o objetivo do agressor é a realização da afirmação de poder interpessoal por meio da agressão. As consequências da falta de limites impostos pelos pais geram uma criança com deformação na percepção do outro. Para essas crianças, o que importa é o seu prazer, fato que ocorre devido à permissividade concedida nos seus primeiros anos de vida (ZAGURY, 2006). Ainda, de acordo com Neto, Algumas crianças que vivem em condições familiares adversas parecem ter maior predisposição para desenvolverem a agressividade. Entre os fatores de risco pode ser identificado: a falta de afetividade e envolvimento com os pais, o excesso de tolerância ou de permissividade em relação ao comportamento agressivo e a prática de maus tratos físicos ou de explosões violentas. (2008, p.6). Se esse tipo de comportamento é apresentado na escola, a equipe escolar tem o dever de comunicar a família e verificar se o problema pode ser solucionado pelos pais ou se existe a necessidade de procurar ajuda de um profissional habilitado a lidar com esse tipo de problema. Além de contar com autores e vítimas, o bullying tem um terceiro personagem fundamental na cena, a testemunha, peça crucial que presencia as agressões, mas que não age em relação a elas. São classificadas como passivas por suas posturas e pelo medo de ser a próxima vítima. Não defendem as vítimas mesmo sabendo que o que ocorre é uma atitude não aceitável socialmente. Se a testemunha for uma criança com estrutura psicológica abalada, possivelmente sofrerá consequências psíquicas, traumáticas ao presenciar tais fatos (SILVA, 2010). Já as testemunhas ativas participam das agressões apoiando o agressor e incentivando ou rindo da vítima. As testemunhas neutras são indiferentes às situações de bullying e dificilmente demonstram qualquer tipo de sensibilidade diante dos acontecimentos. A omissão diante do bullying se configura em uma ação criminosa e imoral da mesma forma que a omissão de socorro no caso de um acidente de trânsito (SILVA, 2010). Em muitos casos, pode-se afirmar que o espectador pode ser o estimulante das ações do agressor. Este, eventualmente, se sente mais forte ao perceber que há um espectador. 2.6. Como identificar os personagens do bullying Os autores do bullying são comumente indivíduos com pouca empatia, que estão na maioria dos casos em situação desfavorável em uma relação e possuem uma família que pouco se preocupa com eles. Não são protetoras, tendem a ter doenças na família e pais permissivos. Geralmente estes pais exercem sobre os filhos uma supervisão pobre, toleram e oferece como modelo, para solucionar os conflitos o comportamento agressivo ou explosivo. É possível que apresentem culpa e remorso por suas atitudes, o que significa que seus comportamentos são transitórios e que precisam de ajuda, pois sofrem com seus atos e com as consequências destes. Mas, por outro lado, alguns jovens de até 18 anos, podem apresentar transtorno de conduta. Esse transtorno não é algo passageiro, é um grave transtorno de difícil controle no qual apresentam mentiras constantes, crueldade com animais, irmãos ou colegas, falta de responsabilidade, comportamento desafiador, fugas, violação de regras, fraudes, atos de vandalismo, manipulação e até mesmo histórico de homicídio. Silva (2010) acredita num projeto de educação que os tire da situação de controle no sentido de impor limites, deixando claro que eles devem seguir algumas regras e comportamentos. No ambiente escolar, os agressores estão sempre se envolvendo em confusões, desentendimentos e discussões com outros alunos ou até mesmo professores (SILVA, 2010). Fazem ameaças, atribuem apelidos pejorativos, constrangem alguns colegas, fazem brincadeiras de mau gosto e pegam materiais de outros colegas sem autorização. Em casa, habitualmente apresentam atitudes hostis, desafiadoras e agressivas em relação à família, não respeitam hierarquias, manipulam, mentem, adotam maneiras arrogantesde se vestir, aparecem com objetos que não possuíam, voltam da escola com roupas amarrotadas etc. Há, em alguns casos, personagens que se comportam em suas casas como se nada estivesse acontecendo e negam todas as acusações feitas contra eles. Os espectadores ou testemunhas costumam não apresentar sinais explícitos que denunciem a situação na qual estão vivendo e dificilmente fazem comentários sobre o que presenciam. Segundo Silva, no ambiente escolar, Frequentemente encontram-se isoladas ou perto de alguém que possa protegê-las (inspetor de alunos), isto no intervalo, apresentam postura retraída na sala de aula, dificuldade de perguntar algo na frente dos outros alunos, faltas frequentes, insegurança, ansiedade, são tristes, deprimidas, aflitas, em geral, são as últimas a serem escolhidas para atividades em grupo; acabam perdendo o interesse por atividades escolares, perdem materiais, e, em casos mais complicados, podem apresentar hematomas. Em casa, podem se queixar de dores, alegarem sintomas físicos para faltar à aula, apresentar mudanças de humor, irritação, tem poucos amigos, passam a gastar mais dinheiro na cantina da escola (para presentear os agressores e evitar perseguições) e se tornam descuidados com tarefas escolares. (SILVA, 2010, p. 48) O silêncio é a mola propulsora para a continuidade das agressões e torna este problema um círculo vicioso e sem solução, pois o medo gera “fantasmas” que oprimem emocionalmente. 2.7. Consequências do bullying Toda a forma de bullying praticado contra uma pessoa na sua infância ou adolescência poderá se refletir em sua vida adulta e as consequências para a vítima ou para o agressor são significativas e marcantes para a vida. Ninguém é igual ao outro e cada um possui uma genética própria, assim como vivências psicológicas próprias, cada qual com habilidades e dificuldades. E devido a estas características ímpares observam-se comportamentos diversos relacionados ao bullying. Os problemas e as consequências mais comuns dos atos de bullying para a saúde das vitimas são: Sintomas psicossomáticos: são diversos sintomas físicos, tais como cefaleia (dor de cabeça), cansaço crônico, insônia, dificuldades de concentração, náuseas (enjoo), diarreia, boca seca, palpitações, alergias, crise de asma, sudorese, tremores, sensação de “nó” na garganta, tonturas ou desmaios, calafrios, tensão muscular, formigamentos. (SILVA, 2010, p.25). Transtorno do pânico: este sintoma é o que mais demonstra o quanto o ser humano sofre. Sua caraterística é o medo intenso e infundado que parece surgir do nada, sem qualquer aviso prévio. A pessoa é tomada por uma sensação enorme de medo e ansiedade, acompanhada de uma série de sintomas físicos (taquicardia, calafrios, boca seca, dilatação das pupilas, suores etc), sem razão aparente. Um ataque de pânico dura, em média, entre vinte a quarenta minutos. A pessoa que passa por esses momentos angustiantes tem a sensação de que pode morrer a qualquer momento. (SILVA, 2010, p.25 e 26). Fobia escolar: provoca intenso medo de ir para a escola, ocasionando faltas, em excesso, problemas de aprendizado e evasão escolar. A fobia escolar aglutina os sintomas psicossomáticos e síndrome do pânico. (SILVA, 2010, p. 26). Fobia social (Transtorno de Ansiedade Social – TAS): esta fobia é mais conhecida por timidez patológica. A vítima sofre de ansiedade excessiva e persistente, tem pavor de ser o centro das atenções. Depois de algum tempo, este indivíduo deixa de frequentar qualquer evento social e passa a se esquivar deles. Esta atitude causa prejuízos a sua vida profissional, social e afetiva. Esta fobia pode ter sido deflagrada em função das inúmeras humilhações sofrida em seu passado escolar. (SILVA, 2010, p. 27). Transtorno de Ansiedade Generalizada (TAG): é uma sensação de medo e insegurança persistente. Geralmente são pessoas impacientes que vivem com pressa, aceleradas, negativistas e que tem a impressão constante de que algo de ruim pode acontecer a qualquer momento. Sofrem de insônia e irritabilidade, precisam ser tratadas ou estes sintomas vão se transformar em transtornos mais graves. (SILVA, 2010, p.27). Depressão: entender que depressão é somente uma sensação de tristeza, de fraqueza ou de baixo astral é muito simplista, trata-se de uma doença que afeta o humor, os pensamentos, a saúde e o comportamento. Os sintomas mais característicos de um quadro depressivo são: tristeza persistente, ansiedade ou sensação de vazio; sentimentos de culpa, inutilidade e desamparo; insônia ou excesso de sono; perda ou aumento de apetite; fadiga e sensação de desânimo; irritabilidade e inquietação; dificuldades de concentração e de tomar decisões; sentimentos de desesperança e pessimismo; perda de interesse por atividades que anteriormente despertavam prazer; ideias ou tentativas de suicídio. A depressão em crianças ou adolescentes foi por muito tempo ignorado. Hoje este quadro mudou. Sabe-se que existe um alto nível de incidência de sintomas depressivos na população escolar. Este quadro pode demonstrar uma situação de bullying. (SILVA, 2010, p.28). Anorexia e bulimia: são os transtornos alimentares. A anorexia nervosa se caracteriza pelo pavor descabido e inexplicável que a pessoa tem de engordar, com grave distorção de sua imagem, mesmo que já esteja muito magra ou até esquelética, se acha acima do peso. É uma doença grave, de difícil controle e deve ser diagnosticado o mais breve possível. (SILVA, 2010, p.29). A bulimia nervosa se caracteriza pela ingestão compulsiva de alimentos, com grande quantidade de calorias, logo em seguida, sente-se culpa pelo excesso. Na tentativa de eliminar os alimentos ingeridos, a pessoa desenvolve diversas ações compensatórias (rituais purgativos) que são os vômitos autoinduzidos (várias vezes ao dia), abuso de diuréticos, laxantes, excesso de exercícios físicos e longos períodos de jejum. Os dois casos são patológicos, necessitando de diagnóstico e tratamento. Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC): este transtorno é o que mais intriga os psicólogos e psiquiatras. Mais conhecido como “manias”, também se caracteriza por pensamentos negativos, intrusivos e recorrentes (obsessões) causando muita ansiedade e sofrimento. Para aliviar e banir estes pensamentos ruins passa-se a adotar comportamentos repetitivos (mais conhecidos como compulsão) de forma sistemática e ritualizados. A pessoa pensa insistentemente que pode se contaminar ou adquirir uma doença grave ao tocar em maçanetas, objetos ou simplesmente ao apertar a mão de alguém; fica tão prisioneira desses pensamentos negativos que passa a lavar as mãos várias vezes ao dia. (SILVA, 2010, p.30). São comuns banhos excessivos e demorados, checar ou verificar tudo antes de dormir, as portas, as janelas e se o fogo do gás esta ligado. Se este ritual não for feito, a mente não consegue parar de pensar que algo muito grave poderá acontecer a ela ou a seus parentes. O bullying pode causar um estresse muito forte e deflagrar o TOC. Transtorno do Estresse Pós-Traumático (TEPT): é derivado de qualquer situação que traga medo intenso, como é o caso de pessoas que passaram por experiências traumáticas como vivenciar a morte de perto, acidentes, sequestros, catástrofes naturais etc. A característica é ter ideias intrusivas e recorrentes do evento traumático como se fosse um filme se repetindo, como lembranças de todo o horror. O TEPT pode levar a um quadro de depressão, ao embotamento emocional (frieza com as pessoas queridas), à sensação de vida abreviada, a perda de seus prazeres, afetando diretamente todos os seus setores vitais. O número de TEPT em adolescentes que estiveram envolvidos com bullying vem crescendo significativamente, especialmente quando sofreram agressões ou presenciaram
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