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122 - Temas Emergentes

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1 
O CONSERVADORISMO MODERNO: 
esboço para uma aproximação 
The modern Conservatism: a sketch for an approach 
Jamerson Murillo Anunciação de Souza1 
Resumo: Procura-se apreender algumas determinações do pensamento conservador 
moderno. O ponto de partida é o patamar acumulado de conhecimento e crítica ao 
conservadorismo que a profissão de Serviço Social estabeleceu desde seu processo de 
renovação. O objetivo é fazer uma aproximação teórica às novas características que o 
sistema de ideias conservador adquire na atualidade. 
Palavras-chave: Conservadorismo moderno. Serviço Social. Razão. 
Abstract: We have tried to apprehend some determinations of the modern conservative 
thinking. The starting point is the accumulated level of knowledge and the criticism of 
Conservatism that the Social Work profession has established since its process of 
renewal. The aim is to make a theoretical approximation to the new characteristics that the 
conservative system of ideas has acquired nowadays. 
Keywords: Modern Conservatism. Social Work. Reason. 
1. INTRODUÇÃO
A abordagem do tema do conservadorismo moderno impõe questões e demanda 
pressupostos. A relevância dele para o Serviço Social se expressa, entre outras 
dimensões, no significativo acúmulo de estudos sobre as determinações políticas, 
econômicas e culturais que lhe conferem substância2. Tais estudos respondem por uma 
demanda objetiva, que é a defesa e consolidação da direção social estratégica inscrita no 
chamado "projeto ético-político" do Serviço Social. Essa defesa, contraditória em relação 
ao movimento histórico da sociedade burguesa, requisita a explicitação e a crítica, teórica 
e política, do que se designa como conservadorismo, tanto em suas expressões sócio-
1 Professor assistente I do departamento de Serviço Social da Universidade Federal da Paraíba – UFPB. 
Doutorando do programa de pós-graduação em Serviço Social da Universidade Federal de Pernambuco – 
UFPE/ Recife, Brasil. E-mail: jamersonsouza@ymail.com. 
2
 Citando apenas alguns poucos fundadores, os escritos de Iamamoto (2011, 2012), José Paulo Netto 
(2005, 2009) e Leila Escorsim Netto (2011). 
mailto:jamersonsouza@ymail.com
2 
 
históricas gerais, quanto em suas incidências e características particularmente 
profissionais. 
 Uma das questões, referidas acima, diz respeito ao método de problematização e 
exposição do conservadorismo na contemporaneidade. Dados os limites de espaço e a 
complexidade que envolve a temática, são necessárias escolhas expositivas que 
enfatizem o desenvolvimento histórico do conservadorismo como sistema de ideias. 
Portanto, não é nosso objetivo abordar o conteúdo conservador (ou até mesmo 
reacionário) de determinados fenômenos e movimentos de caráter político-cultural (com 
raízes econômicas) que se intensificam na cena brasileira contemporânea, a exemplo de 
manifestações aproximadas a ideias integralistas, fascistas, neonazistas, xenofóbicas, 
racistas, entre outras, pois uma abordagem dessa natureza requisita espaço próprio. 
 Esse recorte de método, porém, não significa abstração dessas e de outras 
dimensões propriamente políticas, culturais e econômicas. Elas decorrem, 
prioritariamente, do acirramento das contradições entre as classes sociais fundamentais, 
bem como entre estas e os demais segmentos assalariados e frações burguesas. 
Todavia, parece-nos precipitado derivar, imediata e espontaneamente, do 
conservadorismo (como sistema de ideias), clássico e moderno, a emergência de tais 
fenômenos, que podemos designar, provisoriamente, como manifestações de "extrema-
direita". 
 Apesar de ser possível identificar alguns pontos de contato entre certas ideias do 
conservadorismo moderno (principalmente econômicas e valorativas) com algumas 
palavras de ordem presentes no discurso de movimentos de extrema-direita, por outro 
lado, parece ser precipitado constituir uma identidade direta entre pensamento 
conservador moderno e fenômenos políticos de "extrema direita" na contemporaneidade. 
Estes últimos têm fundamento ontológico e material, no geral e resguardadas proporções 
e mediações particulares, na ativação dos limites absolutos do capital (MÉSZÁROS, 
2002). Dentre as consequências dessa ativação, que é constitutiva da crise estrutural 
desde 1970, estão: a intensificação da exploração do trabalho pelo capital - na tentativa 
de reverter a queda da taxa de lucro, o desemprego crônico e seus desdobramentos, 
além da catastrófica crise ambiental. No que respeita a inspirações ideais, os fenômenos 
de "extrema-direita" estão aproximados de tendências irracionalistas ou de convergências 
decadentes da "miséria da razão" (COUTINHO, 2010). Isso significa um leque de 
3 
 
influências que não se resume ao pensamento conservador em sentido estrito, 
concretizando uma cadeia causal complexa e multifacetária. 
 O conservadorismo clássico (NETTO, L, 2011), surgido no período moderno, 
passou por transformações substantivas ao longo da história. Algumas de suas 
características iniciais foram revertidas, outras, intensificadas, além daquelas que se 
constituem como novas em relação ao período fundador. Essas transformações têm como 
fundamento histórico o desenvolvimento das contradições do sistema do capital 
(desenvolvimento das forças produtivas e relações de produção). Contradições que se 
particularizam do período de consolidação dos monopólios e da atual crise estrutural, que 
se arrasta insuperavelmente (MÉSZÁROS, 2002). Essa crise tem implicações conhecidas 
para a luta de classes e para o terreno amplo das alienações e ideologias. Esse 
fundamento histórico, explorado e antecipado por Marx3 e desenvolvido pela melhor 
tradição marxista4, é pressuposto indispensável para o debate que objetiva atualizar 
algumas determinações centrais do sistema de ideias conservador. 
 Outro pressuposto importante é o patamar de problematização já acumulado pelo 
Serviço Social no Brasil acerca do conservadorismo. Sem prejuízo de outros enfoques, é 
possível perceber certa concentração dos estudos em torno de quatro eixos prioritários. 
Estabelecendo uma síntese, investigou-se o conservadorismo que incidiu na profissão a 
partir: (i) do neotomismo e do estrutural-funcionalismo, cuja influência máxima se fez 
sentir nos momentos de gênese e institucionalização do Serviço Social no Brasil5, (ii) do 
positivismo e da fenomenologia, que repercutiram com força em setores profissionais 
durante o período da renovação e reconceituação6, (iii) do assim chamado 
"neoconservadorismo" de corte genericamente designado como "pós-moderno", que tem 
se robustecido nos últimos quarenta anos no campo da filosofia e das ciências sociais7 
(históricos interlocutores do Serviço Social) e (iv) do chamado conservadorismo clássico8, 
cujas influências sócio-históricas chegam ao Serviço Social através de matizes e 
mediações que requisitam abordagem exclusiva, posto o corte sistêmico (por oposição ao 
pensamento "pós-moderno") que atravessa algumas de suas formulações. 
 
3
 Especificamente, as categorias de concentração e centralização do capital, elaboradas no capítulo XXIII d'O Capital, 
lançam as bases para o desvendamento do processo monopólico (MARX, 1985). 
4
 Entre outros, com algumas distinções teóricas que não infirmam a concepção crítica da sociedade burguesa: Mészáros 
(2002), Hobsbawm (1995), Duménil e Lévy (2014), Mandel (1982) e Harvey (2013). 
5
 Os estudos de Iamamoto (2011) e Iamamoto e Carvalho (2012) são representativos desse enfoque. 
6
 Esse é o terreno no qual vão se mover algumas reflexões de Netto (2005). 
7
 Entre outros, o livro de Santos (2007), apresenta essa preocupação. 
8
 Estudo de Leila Escorsim Netto (2011), onde o conservadorismo clássico é tomado como objeto de estudo a partir de 
seu momento moderno e fundador: períodopós-Revolução Francesa. 
4 
 
 Situadas essas questões e indicados os pressupostos, nosso objetivo é tão 
somente tracejar algumas das propriedades que o sistema de ideias do conservadorismo 
adquire na atualidade, indicando alguns pontos históricos e teóricos de inflexão, de um 
lado e, de outro, seu contato com outras correntes e tradições de pensamento, igualmente 
fundadas na modernidade, a exemplo do liberalismo/liberismo, do utilitarismo e do 
pragmatismo. 
2. O conservadorismo moderno: esboço para uma caracterização 
O conservadorismo clássico, em sua gênese pós-1789, constituiu-se como sistema 
de ideias e posições políticas marcadamente antimodernas, antirrepublicanas e 
antiliberais. Em síntese: antiburguesas. É possível caracterizá-lo como uma reação 
ideológica e política aos avanços da modernidade. Avanços esses identificados, naquele 
momento, no desenvolvimento das forças produtivas e nas transformações das relações 
de produção, que implicaram profundas mudanças sócio-institucionais e culturais. 
Em geral, o raio de ação política dos conservadores girava em torno da defesa de 
determinadas características institucionais do Antigo Regime (NISBET, 1987), 
principalmente aquelas relacionadas com o princípio da autoridade constituída. Apesar de 
negarem, no discurso, filiações ideológicas claras, o resultado e o conteúdo histórico de 
suas objetivações, teóricas e políticas, estiveram a serviço das forças da reação. 
O pensamento conservador surge e se desenvolve no contexto da moderna 
sociedade de classes, marcado por seu dinamismo, por suas múltiplas e 
sucessivas transições; como função dessa sociedade, não é um sistema fechado 
e pronto, mas sim um modo de pensar em contínuo processo de desenvolvimento 
[...] Estruturado como reação ao Iluminismo e às grandes transformações 
impostas pela Revolução Francesa e pela Revolução Industrial, o 
conservadorismo valoriza formas de vida e de organização social passadas, cujas 
raízes se situam na Idade Média. É comum entre os conservadores a importância 
dada à religião; a valorização das associações intermediárias situadas entre o 
Estado e os indivíduos (família, aldeia tradicional, corporação) e a correlata crítica 
à centralização estatal e ao individualismo moderno; o apreço às hierarquias e a 
aversão ao igualitarismo em suas várias manifestações; o espectro da 
desorganização social visto como consequência das mudanças vividas pela 
sociedade ocidental (FERREIRA, BOTELHO, 2010, p. 11, 12). 
É nesse contexto que estão situadas, ressalvadas especificidades que não são 
centrais para nosso debate, as formulações de Edmund Burke (1729-1797), Joseph de 
Maistre (1753-1821), Klemens Von Metternich (1773-1859), Benjamim Disraeli (1804-
1881) e Alexis de Tocqueville (1805-1859). Ainda que alguns conservadores 
contemporâneos, como João Pereira Coutinho (2014), afirmem que as raízes da tradição 
conservadora inglesa remontam ao século XVI, é possível considerar esse conjunto de 
pensadores como fundadores do conservadorismo clássico, com destaque para Edmund 
5 
 
Burke. Nesse primeiro momento histórico, uma característica marcante é a unidade do 
pensamento filosófico, político e econômico, pois a fragmentação acadêmica dos saberes 
ainda não havia se completado inteiramente. 
Certos princípios do conservadorismo clássico vão ganhar dimensão "científica" 
com as sociologias de August Comte (1798-1857), Hebert Spencer (1820-1903) e Émile 
Durkheim (1858-1917). Ao receber a chancela da “ciência social”, valores da tradição 
conservadora são elevados a conceitos. Ideias conservadoras clássicas acerca das 
relações entre indivíduo, Estado e sociedade, passam a receber o anteparo da 
solidariedade orgânica, da harmonia e da coesão social. 
O positivismo impulsionou o sistema de ideias conservador, ao mesmo tempo em 
que o modificou, pois estabeleceu sua reconciliação com a sociedade capitalista 
consolidada e sua institucionalidade. Realinhou o foco das disputas políticas dos 
conservantistas9, de posições antiburguesas para posições antiproletárias e, por 
derivação, contrarrevolucionárias. A Sociologia como disciplina e “ciência” específica 
passa a vocalizar certas aspirações conservadoras clássicas, principalmente aquelas em 
defesa das instituições estabelecidas. Opera essa vocalização por meio de "métodos 
científicos" que esvaziam a produção de conhecimento sobre a sociedade de suas 
mediações econômicas e políticas. Esse fôlego renovado que valores conservadores 
centrais recebem das "ciências sociais" é repleto de consequências históricas. 
Para efeitos de uma periodização metodológica e provisória, o conservadorismo 
clássico pode ser identificado entre 1789 e 1914. Esse período histórico coincide com o 
intervalo entre dois grandes marcos: vai da Revolução Francesa até o início da primeira 
guerra mundial. Seu fôlego final converge no desfecho do pensamento de Émile 
Durkheim. 10 
A partir de finais da década de 1910 até 1960-70 seria admissível supor como 
período de formação do pensamento conservador moderno. A partir daí, mudanças 
sensíveis ocorrem. Expoentes de distintas áreas do saber elaboram sistemas totalizantes 
de explicação da vida social. Ora enfatizando a política, ora a cultura, o interacionismo, a 
burocracia, a institucionalidade, a moral ou a filosofia, intelectuais de distintas áreas do 
 
9
 Os termos conservadorismo e conservantismo são tomados como sinônimos nesse artigo. 
10
 Os estudos de Leila Escorsim Netto (2011) concentram-se nesse intervalo. 
6 
 
saber reformulam, ampliam ou universalizam determinados temas centrais da tradição 
conservadora11. 
Entretanto, frequentemente essa genealogia não é explicitada ou assumida 
abertamente. Na maior parte das vezes, essas intervenções preferem apresentar-se como 
relativas à moderna democracia política (burguesa). Tais sistemas imprimem, até a 
contemporaneidade, concepções de história e ciência antagônicas às que foram 
formuladas por Marx e pela melhor tradição marxista. Algumas delas foram 
conscientemente construídas para subsidiar alternativas teóricas ao marxismo. 
Como se pode notar, uma geração intelectual após as últimas lições de Émile 
Durkheim, observa-se o surgimento de uma pluralidade importante de saberes, 
ampliadora dos alicerces (concepção de mundo e fundamentos para ação política) do 
conservadorismo. 
Com essa referência, sinalizamos que o pensamento conservador realiza mais um 
giro em seu eixo. Na sequencia de sua incorporação pela nascente sociologia positivista, 
aproxima-se também do liberalismo, seu antigo antagonista. É uma aproximação que não 
se realiza irrestritamente. Os conservadores preservam suas tradicionais ressalvas à 
estruturação de valores que possam ser universalizados, como o individualismo da 
tradição liberal, por exemplo. Isso porque, no seu entender, tais valores tendem a 
subestimar a “complexidade” das possibilidades humanas (COUTINHO, 2014). 
Todavia, cerram fileiras quanto à tendência mais abrangente de reprodução da 
sociedade vigente. As consequências dessas mudanças são inteligíveis quando se pauta 
o processo histórico que permitiu ao conservadorismo transpassar de reação à 
modernidade para posições supostamente progressistas na contemporaneidade. Trata-se 
da consolidação do estágio monopolista de reprodução do capital. Esse é o cenário 
histórico (real) de contradições que requisita, dos "neoconservadores" de então, novas 
bases ídeo-políticas. Destaque (dentre outros) cabe ser feito à contribuição que a 
apropriação do conceito de "totalitarismo", de Hannah Arendt (1989), significou para o 
conservadorismo moderno. O nivelamento das experiências fascistas e socialistas, sob o 
 
11
 Resguardadas as proporções e diferenças teóricas, políticas e de método, assim como de objeto de investigação,as 
quais não podem ser tematizadas aqui, é possível identificar, genericamente, alguns expoentes que representam essa 
tendência, em um ou outro ponto de sua obra: Martin Heidegger (2013), Karl Popper (1980, 1987, 2013), Norberto 
Bobbio (2000, 2004, 2006, 2011), Raymond Aron (1980, 2008), Hannah Arendt (1989, 2011), Talcott Parsons (2010a, 
2010b), Friedrich von Hayek (2013), entre outros. 
7 
 
conceito de “totalitarismo”, ofereceu uma chave mestra conceitual para o pensamento 
conservador. 
O conservadorismo moderno incorporou o conceito de “totalitarismo” nesses 
termos niveladores e, com ele, elaborou uma concepção de mundo que encastela o 
significado ontológico do tempo presente, esvaziando-o do devir histórico. Realiza esse 
encastelamento através, de um lado, da blindagem do presente em relação às “utopias” 
revolucionárias, que desejam transformar radicalmente a sociedade vigente. De outro, 
projetando-se contrários às “utopias” reacionárias, aferradas que são às formas do 
passado. Com essa blindagem "presentista" (nem passado - reacionário, nem futuro - 
revolucionário, somente o presente importa), o conservadorismo moderno acredita estar 
se movendo em bases “progressistas”, uma vez que rejeita, equalizando, tanto as 
"utopias" revolucionárias, quanto reacionárias, ambas concebidas, pejorativamente, como 
idealizações potencialmente "totalitárias". 
Os conservadores modernos, munidos com esse conceito, reclamam-se como 
prudentes defensores do presente democrático (burguês) contra as “perigosas e violentas 
utopias” (fascismo e comunismo) que, além de partilharem bucólicas concepções de 
natureza humana, costumam não poupar vidas humanas em busca de sua idealizada 
“perfeição humana” (COUTINHO, 2014). Em síntese, desde que veio à tona na metade do 
século XX, o conceito de “totalitarismo” tem servido como uma das pedras angulares da 
tradição conservadora moderna. 
O “presentismo”12 opera um traço fundamental da decadência ideológica que 
permeia o pensamento burguês: a desistoricização do tempo presente13. Outro elemento 
que concorre para essa desistoricização é o aprisionamento da razão aos variados 
modelos formais e abstratos, exemplificados com as elaborações do positivismo lógico. 
Como consequência lógica e histórica desse “presentismo”, o conservadorismo moderno 
cancela a possibilidade de construção de qualquer projeto societário alternativo à 
sociabilidade vigente. E esse cancelamento é apoiado com o argumento de que 
“sacrificar” uma geração no presente em nome da construção ("incerta") de um futuro 
formulado sobre princípios revolucionários (encarados como “utópicos” e “totalitários”) é 
uma decisão contrária ao princípio da prudência. Outro princípio que afasta os 
 
12
 É sintomático que a epígrafe escolhida por Hannah Arendt (1989), para abrir seu livro As origens do totalitarismo, 
seja uma frase de Karl Jaspers que afirma: “Não almejar nem os que passaram nem os que virão. Importa ser de seu 
próprio tempo”. 
13
 György Lukács (2012, p. 192) oferece uma contribuição valorosa acerca da concepção de tempo histórico em termos 
ontológicos, isto é, do significado dessa dimensão para o ser social. 
8 
 
conservadores dessas posições “totalitárias” é o da “humildade”, que decorre da 
constatação da “imperfeição (intelectual) humana” (COUTINHO, 2014). 
O conservadorismo de nosso tempo pretende, portanto, ser um terceiro termo entre 
as propostas revolucionárias e as revanches reacionárias. Nem sempre é possível 
estabelecer uma identidade teórica e política entre conservadores, para os quais é caro o 
princípio da prudência na política, e reacionários. Esse é um elo importante que abre 
passagem para que os conservadores atuais apareçam como progressistas. Afirmando 
diretamente: quando o antagonista político é reacionário, um conservador pode aparecer 
como elemento de avanço, porque valoriza o dado imediato instituído, em desfavor de 
mudanças potencialmente regressivas14. No entanto, essa aparência demanda a crítica e 
a desmistificação dos setores comprometidos com a emancipação humana. 
O pensamento conservador contemporâneo se particulariza também sob outros 
pontos de vista. Adquiriu contornos específicos no contexto da divisão social internacional 
do trabalho e dos mercados, sem prejuízo de sua estruturação em totalidade. Na França, 
na Inglaterra, Estados Unidos, Alemanha, entre outros, a forma e o conteúdo do 
conservadorismo, mantidas as variantes acima esboçadas, adquiriram influências e 
características conjunturais. No Brasil, congrega propriedades europeias e norte-
americanas. Sofre também mutações desde dentro, recombinando, ecleticamente, 
propostas, valores e ideais com a nossa realidade concreta, desde finais do século XIX. O 
resultado - considerando as condições de inserção subordinada de nossa formação social 
no circuito de capital mundial monopolizado, além das contradições tipicamente 
decorrentes da passagem brasileira à modernização capitalista - é a intensificação das 
tonalidades mais à direita do conservadorismo, aproximando-o de ideias ao sabor dos 
reacionários. 
Essa recombinação incide sobre as grandes concepções orientadoras do ideário 
das classes dominantes no Brasil. É daí que extraem parte de suas ideias sobre o papel 
do Estado, das liberdades civis e políticas, dos mercados, dos grandes proprietários como 
sujeitos políticos, da família, da propriedade e assim por diante. As linhas de 
desenvolvimento dessa apropriação desdobram-se em muitas outras tendências 
intelectuais e forças políticas singulares, subdividida em frações e segmentos, mas 
unificada em projeto de sociedade. “Em suma: quando o pensamento brasileiro 'importa' 
uma ideologia universal, isso é prova de que determinada classe ou camada social de 
 
14
A questão do “trabalho escravo”, na contemporaneidade, poderia exemplificar bem essas distinções. 
9 
 
nosso país encontrou (ou julgou encontrar) nessa ideologia a expressão de seus próprios 
interesses brasileiros de classe” (COUTINHO, 2011 (a), p. 41, grifo do autor).15 
Outra particularidade do conservadorismo moderno está relacionada à formação de 
sua autoimagem. Isto é, à representação que os sujeitos conservadores elaboram acerca 
de si mesmos e de seu significado social e histórico. Segundo as indicações inferidas da 
literatura, essa autoimagem é construída sobre uma espécie de “existencialismo 
conservador”, com tonalidades irracionalistas. A importância de decifrar e fazer a crítica 
da autoimagem conservadora reside na perspectiva de superação dessa visão 
mistificadora. Superação que depende, sobretudo, da perspectiva do método dialético em 
relação às mediações complexas entre produção e reprodução social. Tais relações 
constituem o momento predominante a partir do qual os sistemas de ideias, e de saber, 
tanto surgem quanto se desenvolvem. 
Não são raras as produções que atribuem o conservadorismo a determinados 
“traços de personalidade”. Segundo elas, trata-se de tendências subjetivas, típicas dos 
indivíduos e grupos que são cautelosos e apegados à situação social vigente, tal como se 
apresenta no aqui e agora. Outras caracterizações qualificam o conservadorismo como 
“forma de ser”, uma “atitude mental” que se inclina à crítica de mudanças substantivas. 
Nesse tipo de análise, psicologizante, é conservador aquele que resiste às mudanças 
“arriscadas”, que se apega a formas estabelecidas, institucionalizadas e fortalecidas pela 
tradição. 
Ao reduzir o conservadorismo a “traços de personalidade”, tende-se a se subtrair o 
conteúdo e o significado histórico, específico e contraditório, dessa corrente de 
pensamento e ação em relação à totalidade social. É assim que Quintin Hogg (1947), 
Fossey Hearnshaw (1933) e Hugh Cecil (1912), vão oferecer descrições irracionalistasdo 
conservadorismo. Seus termos vão variar entre “força interior”, “temperamento”, “fé”, 
“espírito”, “instinto”, “disposição”, “inclinação pura e natural da mente humana”, entre 
outros. 
Com esse tipo de definição, qualquer debate é abortado em princípio. Isso porque 
o conservadorismo é elevado à “condição humana”. É também universalizado, na medida 
 
15
 Leandro Konder antecipou essa determinação em 1979, quando escreveu no Jornal da República, do estado de São 
Paulo: “O pluralismo da ideologia da direita pressupõe uma unidade substancial profunda, inabalável: todas as correntes 
conservadoras, religiosas ou leigas, otimistas ou pessimistas, metafísicas ou sociológicas, cientificistas ou místicas, 
concordam em um determinado ponto essencial. Isto é: impedir que as massas populares se organizem, reivindiquem, 
façam política e criem uma verdadeira democracia” (apud COUTINHO, 2011 (b), p. 50). 
 
10 
 
em que todos os indivíduos são apresentados como conservadores em alguma medida, 
nem que seja na inclinação à preservação de si próprio, entes queridos ou círculo de 
amizades. Resta então diluído o conteúdo do conservadorismo através da autoimagem 
que os conservadores produzem. 
Para exemplificar a sistemática desse tipo de elaboração, talvez seja útil resgatar 
ao menos duas afirmações de dois grandes representantes modernos do 
conservadorismo: Michael Oakeshott (1901-1990), caracterizado por Perry Anderson 
(2012, p. 21) como um dos expoentes da “direita intransigente” inglesa, e Russel Kirk 
(1918-1994). 
Oakeshott, herdeiro do conservadorismo clássico, é um dos arautos da atual 
tradição conservadora no mundo. Defende ele, agarrando-se à categoria da razão, tal 
como a concebe o conservadorismo moderno, que: 
(o conservadorismo, J.S.) não é uma crença nem uma doutrina, mas uma forma 
de ser e estar. Ser conservador significa uma inclinação a pensar e a comportar-
se de determinada forma; é preferir certas formas de conduta e certas condições 
das circunstâncias humanas a outras; é dispor-se a tomar determinadas decisões. 
[...] Distinguir as características gerais desta atitude não é tarefa difícil, embora 
elas tenham sido constantemente confundidas. Elas resumem-se a uma 
propensão ao uso e gozo daquilo que se tem, em vez do desejo ou busca de outra 
coisa, a aprazer-se mais com o presente do que com o passado ou o futuro. [...] 
não existe nenhuma idolatria simples pelo que já passou ou já se foi. [...] Assim, 
ser conservador é preferir o familiar ao desconhecido, preferir o tentado ao não 
tentado, o facto ao mistério, o real ao possível, o limitado ao ilimitado, o próximo 
ao distante, o suficiente ao superabundante, o conveniente ao perfeito, a felicidade 
presente à utópica. [...] Para além disso, ser conservador não é apenas ser avesso 
à mudança [...] é também a forma de nos adaptarmos às mudanças, algo que foi 
imposto a todos os homens. (2014, p. 4,5,6, grifos nossos). 
Russel Kirk, cujas reflexões foram recentemente coligidas e publicadas no Brasil16, 
é outro alto signatário do conservadorismo moderno. Conhecido por suas contribuições ao 
pensamento político norte-americano e estudioso de Edmund Burke, desenvolve em 
termos similares uma concepção de conservadorismo: 
Não sendo nem uma religião nem uma ideologia, o conjunto de opiniões 
designado como conservadorismo não possui nem uma Escritura Sagrada, nem 
um Das Kapital, como fonte de dogmas. [...] Talvez fosse adequado, na maioria 
das vezes, utilizar a palavra 'conservador' mormente como adjetivo. Não existe um 
modelo conservador, e o conservadorismo é a negação da ideologia: é um estado 
de espírito, um tipo de caráter, um modo de ver a ordem civil e social. A posição 
chamada conservadora se sustenta em um conjunto de sentimentos, e não em um 
sistema de dogmas ideológicos. [...] Para a preservação de uma diversidade 
saudável em qualquer civilização, devem remanescer ordens e classes, diferenças 
 
16
 Trata-se da obra: A política da prudência (2014), onde se encontra mais um aporte sistemático (e sistêmico) em favor 
explícito do conservadorismo moderno. 
 
11 
 
na condição material e muitos tipos de desigualdade (2014, p.102-108, grifos 
nossos). 
De tais colocações, repletas de consequências sociais, ressaltamos aqui apenas 
quatro pontos que ajudam a perceber mudanças significativas de posição do 
conservadorismo moderno em relação ao conservadorismo clássico: (i) eles dificilmente 
assumem uma filiação teórica ou tradição ideológica, considerada pejorativamente como 
dogmas; (ii) diferentemente dos primeiros conservadores, os contemporâneos valorizam o 
presente e não são nostálgicos de formas sociais passadas; (iii) aproximam-se do 
pragmatismo, ou, no mínimo, de um acentuado empirismo, na medida em que valorizam 
“o possível”, a situação dada tal como se apresenta; (iv) atualmente, conservadorismo 
não significa oposição a qualquer tipo de mudança, mas a determinados tipos específicos 
de mudança, a saber, aquelas que possam ser desencadeadas pelas classes 
dominadas17. 
Essa mudança de significado, ampliando o leque... aproximada às tendências do 
pragmatismo, constrói a possibilidade para uma aproximação com o pensamento liberal. 
 
Em matéria de conservação da ordem burguesa madura e consolidada, que é o 
conteúdo objetivo e histórico do conservadorismo moderno da contemporaneidade, 
poucas correntes de pensamento e ação são tão sólidas quanto o liberalismo. 
A relação do conservadorismo moderno com a categoria da razão é peculiar e 
merece atenção, uma vez que dela deriva as possibilidades de produção de 
conhecimento a partir do ponto de vista conservador. Afirma-se a importância da razão 
como elemento estruturante do processo de conhecimento e desenvolvimento da 
sociedade. Por outro lado, não poupa críticas ao racionalismo, tomado como corrente de 
pensamento. Para os conservadores, o racionalismo é uma subversão da razão, na 
medida em que pretende construir uma sociabilidade segundo princípios de evolução que 
conduziriam à “perfeição”, por intermédio da ideia-força das “possibilidades infinitas” - 
ideia que teria servido de base para as promessas de progresso e desenvolvimento 
humano no período moderno. 
Os conservadores reconhecem a necessidade de aprimoramento das relações 
humanas. Porém, qualificam como arrogantes e descabidas as tentativas de construção 
 
17
 Esses elementos se conjugam numa síntese aproximada ao comentário que Carlos Nelson Coutinho elaborou sobre os 
liberais, algo que podemos estender amplamente aos conservadores: “O liberal defende a mudança que se tornou 
necessária, valendo-se para tanto de formulações ideológicas progressistas; mas, ao mesmo tempo, recusa as 
consequências últimas do progresso, por temor explícito da “anarquia” e do “caos” que vem “de baixo”, das forças 
populares ainda “imaturas” (2011 (b), p. 50). 
12 
 
de relações sociais a partir dos princípios do racionalismo moderno. Isso porque, supõem 
os conservadores, o racionalismo persegue a pueril ideia de “perfeição humana” e “não é 
possível reduzir os problemas de uma comunidade a simples equações ou postulados 
que a razão acabaria por resolver por si só” (COUTINHO, 2014, p. 36). Por outro lado, 
também não abraçam abertamente o irracionalismo. O irracionalismo, extremo oposto da 
razão, por sua vez, abriria espaço demasiado para arbitrariedades subjetivas em termos 
de ação política e social. 
Uma ideia avançada por Oakeshott (2014) deixa entrever qual é a concepção de 
racionalidade a que aderem os conservadores. Segundo ele, o racionalismo entroniza o 
saber técnico-teórico, em detrimento do saber prático. Para os conservadores, a 
experiência, de onde provém o saber prático, fornece os melhores referenciais para 
orientaçãoda ação social. O saber teórico tenderia a deduzir os posicionamentos políticos 
a partir de elaborações ideais, o que significaria fazer abstração das condições objetivas 
de uma dada sociedade (essa conclusão, por parte dos conservadores, decorre da sua 
visão reificada da relação teoria e prática). 
Em nome do cálculo racional e das antecipações lógicas dos desdobramentos das 
ações políticas, os revolucionários (entendidos sempre como “totalitários”) tendem a levar 
a cabo suas doutrinas a qualquer custo. Nesse caso, segundo eles, haveria um hiato, 
talvez de qualidade ética, entre as intenções formuladas teoricamente e a efetividade das 
relações sociais, constatado no abismo entre os ideais “utópicos” dos revolucionários e a 
objetividade sangrenta dos regimes tanto socialistas, quanto fascistas. 
Como se pode notar, os conservadores procuram afastar-se do racionalismo, 
associando-o ao “totalitarismo” da revolução. Seria precipitado equalizar, sem mediações, 
a crítica conservadora e a crítica "pós-moderna" ao racionalismo. Contudo, resta intacto o 
denominador comum da identificação da razão à formalização positivista, associada à 
padronização e hierarquização. Essa definição acentua ao extremo algumas 
características do racionalismo, fazendo-o parecer uma caricatura de si mesmo, ao passo 
em que deixa de mencionar e problematizar outras dimensões dessa corrente de 
pensamento e ação18. Além disso, sequer considera, no debate, a tradição racional que 
tem origem na dialética19 de Hegel e se estende a Marx e aos melhores representantes do 
marxismo. 
 
18
 Para uma introdução ao racionalismo, conferir: HUENEMANN (2012). 
19
 Alvo preferencial dos ataques do filósofo da ciência Karl Popper. 
13 
 
Em síntese, o racionalismo, é sabotado a priori pelo princípio conservador da 
“imperfeição humana”. Esse princípio, apesar de certas semelhanças, não se identifica 
diretamente com a formulação cristã. No conservantismo, ele significa o impedimento 
(ontológico) de que a razão tenha êxito nas suas tentativas de controle e previsão 
absolutas das ações políticas. Isso porque não é possível à razão, em função de sua 
limitação, antecipar e manipular todas as possibilidades de desenvolvimento do real. O 
elemento de acaso (tomado numa concepção afastada da ontologia de Marx e de Lukács) 
interdita em germe a concretização do discurso racionalista. 
Por outro lado, os conservadores procuram prevenir-se contra o fatalismo, que 
aparece como possível desdobramento exponenciado do princípio da “imperfeição 
humana”. Ou seja, não desqualificam a priori as possibilidades de desenvolvimento 
humano, mas reivindicam certo ceticismo em relação à ação social, que talvez possa ser 
aqui qualificado, provisoriamente, como “ceticismo metodológico”. Esse ceticismo tenta 
preservar o princípio da prudência em relação aos conteúdos imprevisíveis, “desejáveis” 
ou “indesejáveis”, da reprodução da sociedade (COUTINHO, 2014). 
Para um conservador, a melhor imagem de ação social e política é aquela em que 
o sujeito persegue o “meio termo”, a via media entre os extremos possíveis da razão e da 
ação. Tanto melhor se esse sujeito tiver clareza de suas funções específicas na 
sociedade e orientar-se racionalmente. Essa orientação racional, nesses termos, significa 
a apropriação dos conhecimentos imprescindíveis para o exercício daquela função, 
conhecimentos majoritariamente selecionados a partir do acúmulo das tradições e das 
situações circunstanciais, ou seja, do saber prático. Os conservadores identificam a ação 
racional à manipulação bem-sucedida de dados empíricos. Agir racionalmente, do ponto 
de vista conservador, é manejar com destreza o “saber prático”. 
São nítidas, nas raízes dessas formulações, as influências da sociologia 
funcionalista de Émile Durkheim20, nominalmente no terreno conceitual da solidariedade 
orgânica, uma vez que o ideal de ação descrito acima se estende às relações 
institucionais. Do mesmo modo, está bem marcado um perímetro de aproximação com o 
pragmatismo e com o empirismo, frente à valorização da experiência como momento 
predominante do processo de conhecimento e ação. Todavia, caberia chamar a atenção à 
ênfase dada pelas vertentes conservadoras à ideia de via media, dada a sua proximidade 
com as propostas de “Terceira Via” (“nem neoliberalismo”, “nem comunismo”, tidos como 
 
20
 “[...] a ideologia conservadora tende sempre a olhar para a sociedade como um organismo vivo.” (COUTINHO, 2014, 
p. 70). 
14 
 
os extremos contemporâneos). Tais propostas, formuladas à luz do conceito de 
“modernização reflexiva”, receberam fôlego com as sociologias de Anthony Giddens 
(1991) e Ulrich Beck (2010). 
A importância da empiria cotidiana para os conservadores, designada por eles 
como “circunstâncias”, não pode ser abstraída. As "circunstâncias" são o dado elementar 
da ação. O imediato conjunto de condições objetivas com que se defronta o sujeito 
conservador. “São as circunstâncias que rodeiam o agente a informar o tipo de ação a 
seguir” (COUTINHO, 2014, p. 44). É com base nelas, ante as quais não cabem 
questionamentos sobre sua causalidade, que os conservadores devem orientar a ação. 
Essa orientação previne a transposição “autoritária”, para a prática, de valores 
formulados em teoria. Com frequência, os conservadores denominam essa orientação 
pragmática como “realista”. O “realismo”, nessa acepção, está resumido à adoção de 
práticas baseadas na reiteração do cotidiano. Para eles, o “realismo” conservador abre 
espaço à preservação e incentivo das singularidades subjetivas, uma vez que não tem 
como objetivo universalizar ou impor valores, tal como as demais ideologias e seus 
respectivos programas. Essa qualidade confere plasticidade e capacidade de antecipação 
tática, conciliatória, ao conservadorismo. 
Quanto às acusações de que o conservadorismo, à medida que equaliza todos os 
valores, poderia incorrer em relativismo cultural, os conservadores recorrem a 
ferramentas irracionais para defender-se. Essas ferramentas variam e apresentam 
características subjetivistas. Vão desde “sentimentos naturais” que se inquietam contra a 
“iniquidade” e a “injustiça”, “valores primários” incutidos pela “providência”, “decências 
fundamentais da vida”, até as “obrigações de justiça” (COUTINHO, 2014). Seriam essas 
as unidades morais últimas, imprescindíveis para o estabelecimento de qualquer 
sociedade “civilizada” e únicas a serem defendidas como prioritárias. 
Estruturas basilares, elas não são prescritivas, mas negativas, dizem respeito às 
restrições relativas às variadas formas de violência, isto é, consistem num sistema 
normativo mínimo. Essa determinação negativa fornece a solução para desfazer a 
aparente antinomia entre a recusa conservadora da universalização de valores abstratos 
e a necessidade de cristalização de um patamar moral básico, garantidor da reprodução 
coesa da sociedade. 
15 
 
Essas estruturas dão forma ao conjunto de circunstâncias que devem ser evitadas, 
um patamar moral a ser preservado, no caso de mudanças sócio-políticas serem fizerem 
necessárias. Fornecendo conteúdo social a esse patamar, estão: a injustiça, o crime, a 
pobreza, a guerra, compreendidos como “males primários” porque despertam 
“naturalmente” o “desgosto moral” de qualquer sociedade (COUTINHO, 2014), impedindo 
que muitos sujeitos acessem os avanços civilizatórios. Não é difícil capturar a forma 
abstrata e reificada pela qual o conservadorismo aborda essas expressões das 
contradições da sociabilidade capitalista. A consequência dessa abordagem é a proposta 
de “soluções” correspondentemente reificadas, expressadas, entre outras dimensões, nas 
variadas propostas regressivas endereçadas ao Estado e sua institucionalidade. 
A referida capacidade de antecipação“realista” é a pedra de toque do “pluralismo 
político”, ideia central do conservadorismo moderno e que não se confunde com o 
relativismo. Para este último, é preciso “respeitar” as diferenças, até mesmo quando elas 
forem irreconciliáveis. Essa dimensão é que permite evitar a “falácia agregadora” 
(COUTINHO, 2014 p. 48) das “cartilhas ideológicas”, que tendem a hipostasiar seus 
valores exclusivos. O conservadorismo se entende afastado da equalização (por baixo) 
operada pelas ideologias utópicas e seus valores supostamente universais. Sua crítica às 
ideologias consiste na inferida simplificação esquemática realizada por elas (KIRK, 2014). 
Essa simplificação não leva em consideração a complexidade do “real”, segundo o 
conservadorismo. 
A autoimagem do conservadorismo moderno o apresenta como via especial para o 
aprofundamento das liberdades individuais (valor caro aos liberais) e para a expansão das 
capacidades dos indivíduos (ideia cara à tradição marxista). Em qualquer das correntes e 
a depender da conjuntura, o conservantismo tenta aparecer como o canal mais prudente 
e seguro para a condução das mudanças sócio-políticas (estritamente) necessárias. No 
mesmo sentido, parece corporificar as melhores balizas para a razão, entronizando 
princípios valorativos como: a prudência, o “realismo”, a “humildade” e o “ceticismo 
metodológico”. 
 Quanto ao processo de individuação, ideia mestra para qualquer sistema de saber 
que teorize sobre a sociedade, o conservadorismo situa a centralidade das tradições 
(tradicionalismo). Para os conservadores, as tradições, incluindo as rituais e institucionais, 
oferecem os elementos imprescindíveis para a inserção do indivíduo na sociedade. A 
função pedagógica que as tradições exercem sobre os sujeitos é reconhecida e 
16 
 
valorizada pelo conservadorismo moderno. É por essa mediação que valores são 
produzidos, difundidos e incorporados como uma espécie de “segunda natureza”, 
passando a orientar os comportamentos de uma maneira (quase) espontânea, pois 
tendem a se transformar em hábitos e costumes (COUTINHO, 2014). 
Para os conservadores, se uma tradição está viva e atuante, esta evidência 
empírica serve como fundamento para preservá-la. Isso porque a condição de 
sobrevivência histórica de uma tradição é sua capacidade de fornecer subsídios úteis à 
reprodução das sociedades. É por intermédio das tradições que os indivíduos adquirem a 
“gramática” necessária ao desempenho bem-sucedido (racional, na concepção 
conservadora) de suas funções na sociedade. “[...] ao indivíduo cabe receber o que foi 
preservado; desfrutar dessa herança como fiel depositário; e passá-la às gerações 
vindouras em uma cadeia que se percebe como invisível e interminável” (COUTINHO, 
2014, p. 61). Esta concepção de individuação do conservadorismo, expressa em termos 
“jurídicos”, faz abstração da complexa teia categorial mobilizada em todo processo dessa 
natureza. Nesta acepção, a individuação é descrita como reiteração de um patrimônio 
construído por gerações passadas. 
O conservadorismo moderno valoriza os “preconceitos”. Para essa corrente, os 
"preconceitos" são tomados como sistema de valores acumulados. Longe do sentido 
comum que os debates cotidianos fornecem ao termo “preconceito”, geralmente 
associado a algum tipo de discriminação, no entender do conservadorismo, eles são 
balizas seguras para a orientação da ação social (e política) racional (COUTINHO, 2014) 
porque representam o conjunto de saberes adquiridos com o passar do tempo. 
Constituem, igualmente, o arco de ação das reformas sociais possíveis. Reformas que 
aprimorem, preservando, a tradição, já devidamente testada e experimentada 
empiricamente. 
No léxico conservador, as reformas constituem pequenas mudanças nos estritos 
limites do tradicionalismo e funcionam como importantes estratégias de prevenção de 
situações revolucionárias. São mudanças localizadas, específicas, transitórias, pontuais, 
paulatinas, absolutamente necessárias para evitar a degradação de algum traço da 
tradição. Uma concepção de reforma, como se pode notar, contraposta àquela produzida 
pela melhor tradição marxista. 
As relações do conservadorismo com o capitalismo constituem outro elemento 
central para uma problematização dessa temática na contemporaneidade. Elas sintetizam 
17 
 
as demais dimensões esboçadas acima: produção de conhecimento, tradicionalismo (que 
envolve a preservação das instituições) e individuação, fundamentos para a ação social e 
política. 
São conhecidos os conflitos entre o conservadorismo, no seu momento fundador, e 
o capitalismo. Conflitos advindos, prioritariamente, das mudanças relativamente rápidas e 
profundas que o capitalismo imprime nas tradições sociais, políticas, culturais e 
econômicas do antigo regime. A primeira geração de conservadores captou essa 
determinação, mas sob uma perspectiva reificada, não ontológica. Suas críticas giraram 
em torno de condenações morais ao capitalismo, tal como os socialistas utópicos, em 
outro diapasão. Seus argumentos apontavam, sobretudo, para os riscos de decadência 
moral decorrentes da racionalidade contábil capitalista. Os conservadores modernos 
trataram, no entanto, desde a década de 1970, de resgatar na tradição conservadora 
clássica os indícios conciliatórios com a tradição liberal. 
Esse conflito aparente entre as constantes mudanças (institucionais inclusive) 
imanentes ao capitalismo e os princípios do conservadorismo ganhou outra dimensão, 
para os conservadores, com as posições polêmicas de Margaret Thatcher à frente do 
Reino Unido (COUTINHO, 2014). Figura expoente do conservadorismo, causou alvoroço, 
no primeiro momento, ao assumir explicitamente a necessidade de implementação da 
agenda neoliberal. Essa agenda, repleta de medidas de longo alcance, significou 
alterações substantivas nas instituições estabelecidas. 
Ao final de sua administração, esse é o ponto que nos interessa, os conservadores 
pareciam menos reativos às mudanças institucionais no interior do capitalismo. Saiu 
fortalecido o argumento de que, se o capitalismo expressa a natureza comercial nos 
homens, as reformas que servirem à ampliação das liberdades de mercado estarão de 
acordo com essa natureza (COUTINHO, 2014). Isso implica: desregulamentação, 
liberalização, privatizações e reformas tributária, fiscal, monetária, trabalhistas, entre 
outros encaminhamentos político-institucionais. Dessa maneira, a primeira conciliação do 
conservadorismo com o capitalismo, encontrada na sociologia de funcional-positivista, foi 
complementada com a composição (neoliberal) política e institucional de Thatcher. Desta 
feita, para preservar o sistema estabelecido, há de serem assumidas as reformas 
(institucionais) necessárias. 
Desde então, na pauta teórica do conservadorismo, não são mais estranhas 
algumas concepções fundantes do liberalismo/liberismo. Entre outras, toma assento a 
18 
 
ideia do capitalismo como universalização natural das relações de troca e intercâmbio, 
desdobramento do homo economicus. As ideias sobre as funções do Estado, dos 
mercados, do individualismo (autodeterminação pelo mercado), também deixaram de 
causar desconforto aos ("neo") conservadores. 
A reconciliação do conservadorismo com o liberalismo completou-se na 
incorporação da ideia de que o lucro é a mediação fundamental do desenvolvimento, 
individual e coletivo. Daí em diante, o mercado livre passa a ser visto como portador e 
fundador das possibilidades de explicitação das capacidades humanas. Os ("neo") 
conservadores se adiantaram, desde então, ao trabalho de recuperar na tradição 
conservadora clássica, todos os indícios que poderiam aproximar Edmund Burke a Adam 
Smith. Realizada essa tarefa, tornou-se possível reclamar os princípios liberais com a 
rubrica da tradição conservadora, acrescida da força da tradição liberal. 
Essa reconciliação, em síntese, aparece comos seguintes termos: o capitalismo 
“[...] é a concepção menos romântica de ordem pública que uma mente humana já 
concebeu” (KRISTOL, Irving. apud COUTINHO, 2014, p. 88). Ou, nas palavras do 
historiador conservador português João Pereira Coutinho, “o capitalismo não parece 
despertar o mesmo fervor que outros ideais econômicos ou éticos [...] um conservador 
deve começar por valorizar uma ‘sociedade comercial’” (2014, p. 88). 
Evidentemente, os fundamentos da acumulação do capital, que supõem a 
exploração do trabalho como determinação ontológica e mediante a qual se produz e 
valoriza o valor, sequer acenam nesse terreno e o modo de produção capitalista é 
encarado, reificadamente, como se fosse apenas a universalização (natural e 
espontânea) das trocas mercantis. Segundo a visão conservadora, reconciliada com os 
preceitos liberais, trata-se, apenas, de zelar pelas qualidades morais necessárias à sadia 
permanência dos indivíduos dos mercados. 
Em poucas palavras, Samuel Gregg reúne determinações centrais que farão parte 
das preocupações teóricas e políticas dos “neoconservadores”: “A vida comercial exige, 
por exemplo, que os indivíduos corram riscos prudentes, confiem nos outros e sejam 
diligentes, industriosos e confiáveis.” (apud COUTINHO, 2014, p. 93, grifos nossos). Essa 
nova agenda conservadora, que envolve a centralidade e a universalização dos riscos, 
bem como a necessidade de resgatar a confiança, nos indivíduos e instituições, passa a 
ser parte importante, também, de algumas correntes teóricas da sociologia 
contemporânea. 
19 
 
3. CONSIDERAÇÕES FINAIS 
Construindo uma síntese, é possível afirmar que o conservadorismo moderno, em 
linhas gerais: (i) opera a desistoricização do tempo presente, baseada numa concepção 
de mundo "presentista"; (ii) há uma aproximação entre o sistema de ideias conservador e 
outras tradições de pensamento da burguesia: o liberalismo, o pragmatismo e o 
empirismo; (iii) o conservadorismo moderno também hiperdimensiona e hipostasia o 
saber prático; (iv) faz uma dura crítica ao racionalismo e procura distância do 
irracionalismo, entronizando uma concepção de razão extraída das formulações 
positivistas; (v) valoriza a função das tradições no processo de individuação; (vi) engrossa 
a fileira da defesa de reformas sociais que não afetem a estrutura da sociedade vigente e, 
nesse sentido, coloca-se como o veículo prudente para conduzir as "mudanças 
necessárias", sem recair nas variadas formas de "totalitarismo". 
As anotações aqui registradas têm caráter aproximativo e provisório. Com essa 
característica, sinalizamos a necessidade de maior concretização de algumas 
determinações, a exemplo das relações entre a crise estrutural do capital e as tendências 
do cenário ideológico da burguesia. Do mesmo modo, são necessários avanços no 
sentido de qualificar melhor a recepção do conservadorismo clássico pelo pensamento 
social brasileiro, clareando suas relações com a nossa passagem sui generis à 
modernização capitalista. Essa assimilação, que avança até o conservadorismo moderno, 
dá indícios de desenvolvimento que podem ser designados, parafraseando Roberto 
Schwarz (2014), como "as ideias em seu devido lugar", uma vez que, aqui, os traços que 
se acentuam do sistema de ideias conservador são, precisamente, aqueles mais à direita. 
 
Recebido em 7/1/15 Aprovado em 10/3/15 
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Errata: 
No artigo O conservadorismo moderno: esboço para uma aproximação, de autoria de Jamerson 
Murillo Anunciação de Souza, publicado no periódico Revista Serviço Social & Sociedade nº 122, 
edição de abr-jun/2015, 
Onde se lia: 
Essa mudança de significado, ampliando o leque... aproximada às tendências do pragmatismo, 
constrói a possibilidade para uma aproximação com o pensamento liberal. 
 
Leia-se: 
Essa mudança de significado, ampliando o leque de possibilidades teóricas e políticas, apoiada 
também sobre uma concepção “presentista”, aproximada às tendências do pragmatismo, constrói 
a possibilidade para uma aproximação com o pensamento liberal. 
 
http://portalconservador.com/livros/Michael-Oakeshott-Ser-Conservador.pdf%20html
http://portalconservador.com/livros/Michael-Oakeshott-Ser-Conservador.pdf%20html
224 Serv. Soc. Soc., São Paulo, n. 122, p. 224-249, abr./jun. 2015
¿Qué es el neodesarrollismo? 
Una visión crítica. Argentina y Brasil
What is neo-developmentism? A critical view. Argentina and Brazil
Claudio Katz*
Resumen: El	 ensayo	neodesarrollista	 de	Argentina	 ha	 quedado	
afectado	por	la	renuncia	a	una	mayor	apropiación	estatal	de	la	renta	y	
por los subsidios improductivos a los capitalistas. Se reforzaron los 
perfiles	extractivos	y	los	desequilibrios	industriales.	Brasil	no	afrontó	
crisis	y	rebeliones	de	la	misma	envergadura	y	su	política	económica	
ha sido más conservadora. El neodesarrollismo es un programa de 
economías medianas afectadas por agroexportaciones, que disuaden 
la inversión fabril. Se intenta reorientar ese excedente pero se retroce‑
de	frente	a	los	conflictos	que	suscita.
Palabras claves: Modelos económicos. Crisis. Capitalismo. América 
Latina
Abstract: Argentina´s	neo-developmental	trial	was	affected	by	the	renunciation	of	a	larger	state	
appropriation	of	the	income	and	by	the	unproductive	subsidies	to	capitalists.	Both	the	extractive	profiles	
and the industrial imbalances were reinforced. Brazil did not face crises and rebellions on the same 
scale,	 and	 its	 economic	policy	has	been	more	 conservative.	Neo-developmentism	 is	 a	program	of	
medium	economies	affected	by	agro-exports	that	deter	the	industrial	investment.	It	aims	at	reorienting	
that	surplus,	but	it	moves	backwards	when	it	is	faced	with	the	conflicts	raised.
Keywords: Economic models. Crisis. Capitalism. Latin America.
* Licenciado en Economía, Universidad de Buenos Aires, Argentina. Doctor de la Universidad de Buenos 
Aires.	Facultad	de	Filosofía	y	Letras,	área	Geografía, e-mail: <claudiokatz1@gmail.com>. 
http://dx.doi.org/10.1590/0101-6628.021
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En	Argentina	se	implementó	el	principal	ensayo	del		neodesarrollista	de la última década. El país volvió a encabezar los virajes econó‑micos	 de	 la	 región,	 como	ya	 ocurrió	 en	 los	 años	 50-60	 con	 la	sustitución	de	 importaciones	y	en	 los	90	con	el	neoliberalismo	
extremo.	Reafirmó	su	papel	de	experimentador	de	mutaciones	significativas	
en América Latina. Este rol de adelantado es reivindicado por los autores que 
ponderan el modelo, en comparación a los esquemas ortodoxos de otras 
economías.1
Un corto ensayo
El esquema intentado en Argentina logró cierta efectividad en la fase 
inicial del gobierno kirchnerista. Durante ese período (2003‑2007) se reunieron 
las	condiciones	para	lograr	alto	crecimiento,	con	baja	inflación	y	recuperación	
del empleo.
Las políticas neodesarrollistas aportaron un tercer ingrediente a los fun‑
damentos objetivos de este ciclo. El primer determinante fue la depreciación de 
los	 salarios	 y	 la	 consiguiente	 recomposición	de	 la	 rentabilidad	que	 legó	 el	
derrumbe del 2001. El segundo motor de la expansión fue la valorización inter‑
nacional de las agroexportaciones.
Las iniciativas neodesarrollistas introdujeron cambios en la administración 
del	estado	y	un	nuevo	arbitraje	entre	los	grupos	dominantes.	Pero	este	curso	
mantuvo muchos vasos comunicantes con el esquema precedente. Subordinó 
la	meta	de	reindustrializar	a	 la	continuidad	de	exportaciones	primarizadas	y	
apuntaló a los sectores empresarios más internacionalizados.
El	modelo	limitó	inicialmente	la	valorización	financiera	y	adaptó	el	rumbo	
de la economía a la nueva relación social de fuerzas impuesta por la rebelión del 
2001.	Hubo	contemporización	con	las	demandas	populares	y	se	recurrió	a	una	
mayor	escala	de	asistencialismo.
1. Bresser Pereira, Luiz Carlos. Globalización y competencia. Buenos Aires: Siglo XXI, 2010. p. 129, 
141‑142.
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Durante	cuatro	años	se	pudo	gestionar	la	economía	con	los	parámetros	del	
modelo	Bresser-Ferrer.	Hubo	 superávit	fiscal	 primario,	 alto	 tipo	de	 cambio,	
bajas	tasas	de	interés	y	expansión	del	consumo.	Pero	la	acelerada	disipación	de	
esta	coyuntura	anticipó	el	escaso	margen	existente	para	mantener	ese	curso.
En	el	2007-2010	comenzó	la	inflación	y	se	frenó	el	crecimiento.	El	mode‑
lo persistió con los nuevos impulsos aportados por la introducción de un ingre‑
so	universal	asistencial	y	la	estatización	de	los	fondos	de	pensión.	Con	esas	
medidas	se	intentó	sostener	un	esquema	ya	amenazado	por	el	deterioro	de	sus	
principales variables.
Esos	desequilibrios	emergieron	con	fuerza	a	partir	del	2011.	La	inflación	
se	intensificó,	la	producción	se	estancó,	el	déficit	fiscal	reapareció	y	fallaron	
todas las iniciativas implementadas para revertir el declive. El control de cam‑
bios,	la	pesificación	y	la	expansión	de	la	emisión	no	atenuaron	el	resquebraja‑
miento del modelo.
A	comienzo	del	2014	resurgieron	finalmente	las	tensiones	clásicasde	la	
economía argentina que condujeron a las repetidas debacles del pasado. La 
reiteración de esos colapsos se encuentra actualmente contrarrestada por el li‑
mitado	nivel	de	endeudamiento	público	y	privado,	la	solvencia	de	los	bancos	y	
la continuada valorización de las exportaciones. Por esta razón el PBI se contrae, 
pero	con	apuestas	a	un	rebote	ulterior.	Numerosos	capitales	internacionales	ya	
preparan su arribo para adquirir empresas.2
Sin embargo, la continuidad del proceso neodesarrollista ha quedado se‑
veramente afectada por el debilitamiento político‑electoral del kirchnerismo. 
Es	muy	probable	que	en	los	próximos	años,	Argentina	atraviese	un	giro	políti‑
co	semejante	al	observado	al	final	de	los	grandes	ciclos	de	las	últimas	décadas.	
Ya	ocurrió	a	mitad	de	los	70,	durante	los	80	y	en	el	2001-03.	En	los	tres	casos	
el	peronismo	registró	una	convulsión	mayúscula	y	pudo	reconstituirse,	pero	sin	
recuperar	la	fidelidad	popular	que	rodeó	a	su	gestación.	Ha	sobrevivido	más	
que otras fuerzas semejantes de América Latina transitando por una amplia 
2.	Nuestra	visión	general	en:	Katz,	Claudio.	La	economía	desde	la	izquierda	I.	coyuntura	y	ciclo,	II.	
Modelo	y	propuestas.	Argenpress, 29 nov. 2013. Disponible en: <http://www.argenpress.info/2013/11/la‑
‑economia‑desde‑la‑izquierda‑i.html>. 
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gama	de	variantes,	que	incluyeron	el	nacionalismo	inicial,	la	radicalidad	popu‑
lar,	el	giro	represivo	y	el	neoliberalismo.
A diferencia de sus antecesores, el kirchnerismo encabezó una adminis‑
tración	 con	fisonomía	 centro-izquierdista	y	 retórica	 progresista.	Restauró	 el	
sistema	político,	 otorgó	 importantes	 concesiones	 democráticas	 y	 sociales	 e	
improvisó	un	proyecto	diferenciado	del	peronismo	tradicional.	Pero	no	logró	
generar una identidad política sustituta.3
Este	período	concluye	con	un	giro	conservador	de	adaptación	a	las	de‑
mandas del establishment.	Este	viraje	incluye	una	gran	devaluación	y	acha‑
tamientos de los salarios. A la luz de los enormes desequilibrios acumulados 
durante	los	últimos	años	es	muy	dudosa	la	persistencia	del	curso	económico	
actual.
Múltiples desajustes
La	elevada	tasa	de	inflación	es	la	principal	manifestación	de	las	tensiones	
generadas por el modelo. Ese incremento de los precios supera en los últimos 
seis	años	la	media	global	o	latinoamericana	y	se	ha	estabilizado	en	torno	al	
25-30%	anual.	No	decae	en	las	coyunturas	recesivas	y	su	porcentaje	real	fue	
desconocido	durante	largo	tiempo	por	la	manipulación	oficial	de	las	estadísti‑
cas. La gestión cotidiana de la economía quedó afectada por esta distorsión de 
un indicador clave.
El incremento de los precios obedeció inicialmente al reducido nivel de 
inversión frente a una demanda recompuesta. Ese cuello de botella se reforzó 
posteriormente por el manejo concentrado de numerosos sectores. La remarca‑
ción permitió mantener el nivel general de las ganancias una vez disipada la 
capacidad ociosa.4
3. Nuestro enfoque en: Katz, Claudio. Nuevo escenario, nuevas posibilidades. La Página de Claudio 
Katz.	Textos	de	Ciencias	Sociales,	22	mayo	2014.	Disponible	en:	<http://katz.lahaine.org/?p=230>.	
4.	Schorr,	Martín;	Manzanelli,	Pablo.	Inflación	oligopólica.	Disponible	en:	<www.pagina12.com.ar>,	
24-3.	Inflación		Página12, Suplementos Cash, 10 mar. 2013. Disponible en: <http://www.pagina12.com.ar/
diario/suplementos/cash/17‑6669‑2013‑03‑10.html>.
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Algunos	economistas	cuestionan	este	diagnóstico	de	“inflación	por	oligo‑
polio”, estimando que la carestía deriva de una “puja distributiva” entre empre‑
sarios	y	trabajadores.	Argumentan	que	en	otros	países	la	misma	concentración	
de	los	negocios	no	se	traduce	en	inflación.5
Pero tampoco la disputa social por el ingreso genera allí el mismo incre‑
mento de los precios. En esos países los mismos desequilibrios desembocan en 
otro	tipo	de	tensiones,	puesto	que	el	recurso	inflacionario	no	está	incorporado	
al manejo corriente de la actividad. Por simple experiencia, los capitalistas ar‑
gentinos apelan más a la remarcación que sus pares de otros países. Es una 
conducta	muy	asociada	con	la	elevada	expatriación	de	capitales	y	el	manejo	de	
inversiones dolarizadas.
Los	rebrotes	inflacionarios	obedecen,	además,	a	la	preeminencia	de	una	
estructura exportadora de alimentos que encarece todos los costos agrarios, al 
compás de la valorización internacional de esos productos. Finalmente, en los 
últimos	años	 la	 inflación	se	 intensificó	por	 la	decisión	oficial	de	sostener	el	
consumo a través de una intensa emisión. Este ritmo de creación de moneda 
quedó	divorciado	del	respaldo	en	divisas	y	de	los	montos	requeridos	para	la	
producción. Por esta razón se acentuó la depreciación del peso.
El	 déficit	 fiscal	 constituye	 el	 segundo	punto	 crítico	 del	modelo.	Ya	 se	
aproxima	al	3%	del	PBI	y	afecta	duramente	a	las	provincias,	que	destinan	la	
mitad	de	sus	presupuestos	al	pago	de	salarios.	Ante	la	ausencia	de	financiación	
el	gobierno	promueve	recortes	a	los	subsidios	del	transporte	y	la	energía	para	
calmar las presiones del establishment.
El	tercer	campo	de	turbulencia	ha	sido	la	caldera	cambiaria	que	estalló	a	fin	
del 2013. El gobierno implementó la devaluación que pretendía evitar. Intentó 
contener la estampida cambiaria vendiendo reservas, pero terminó generando una 
hemorragia que redujo peligrosamente el respaldo de los pesos en circulación.
También se introdujeron formas de control cambiario que los neoliberales 
cuestionaron a viva voz, culpando al intervencionismo estatal por la “inestabi‑
5. Crespo, Eduardo; Fiorito, Alejandro. Es la puja distributiva”. Disponible en: <www.pagina12.com.
ar>, 17/03. “Es la puja… Página12, suplementos Cash, 17 mar. 2013. Disponible en: <http://www.pagina12.
com.ar/diario/suplementos/cash/17‑6669‑2013‑03‑10.html>.
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lidad de los mercados”.6	Pero	esa	injerencia	fue	muy	acotada	y	sólo	buscó	de‑
tener las presiones devaluatorias. Como Argentina no fabrica los dólares que 
utiliza para solventar sus compras externas, necesita algún tipo de regulación 
estatal cuando las divisas comienzan a escasear.
El gobierno intentó contrapesar el “mercado libre” que manejan los ban‑
cos	y	los	exportadores.	No	violó	ninguna	ley	de	la	naturaleza,	ni	tampoco	los	
principios de una economía sana. El control de cambios fue introducido en 
forma	tardía	y	se	manejó	con	total	arbitrariedad.	En	lugar	de	penalizar	a	los	
especuladores, los funcionarios toleraron la apropiación bancaria de los men‑
guantes dólares.
Después de transitar por todos los rumbos posibles, el gobierno se embar‑
có en un ajuste que cuestiona todos los principios neodesarrollistas. Elevó 
drásticamente	 las	 tasas	de	 interés	y	forzó	un	encarecimiento	del	crédito	que	
asfixia	el	consumo.	De	un	estancamiento	en	la	creación	de	puestos	de	trabajo	
se	pasó	a	una	coyuntura	de	menor	empleo,	en	un	marco	de	alta	informalidad	
laboral.	Este	 contexto	 se	ubica	muy	 lejos	de	 la	depresión	del	2001,	pero	 el	
modelo se ha quedado sin combustible.
Lo más traumático son las medidas de restricción salarial que convierten 
a	los	ingresos	populares	en	la	variable	de	ajuste.	La	inflación	licúa	los	salarios,	
las	jubilaciones	y	los	programas	de	gasto	social.	El	gobierno	oculta	las	cifras	
de pobreza e indigencia para no transparentar que su promedio actual se ase‑
meja a los decenios anteriores. Nadie puede exhibir como un logro de la “dé‑
cada	ganada”,	que	la	pobreza	afecte	hoy	al	trabajador	y	no	al	desocupado,	o	que	
el asistencialismo evite las situaciones de extrema hambruna.
Argentina	 ha	 vivido	muchas	 veces	 estas	 coyunturas	 críticas.	 Pero	 las	
condiciones	actuales	difieren	significativamente	en	el	plano	político	y	econó‑
mico de los antecedentes traumáticos legados por el “rodrigazo” (1975), la 
hiperinflación	(1989)	o	el	colapso	general	(2001).	La	tensión	actual	notiene	
6. Esta postura difunden economistas ortodoxos como: Melconian, Carlos. Faltan dólares, sobran pesos... 
Y seguiremos así. La Nación, Economía, 04 ago. 2013. Disponible en: http://www.lanacion.com.ar/1607100‑
-faltan-dolares-sobran-pesos-y-seguiremos-asi>.	Ferreres,	Orlando	 (2013).	 “Cómo	 salir	 del	 camino	de	 la	
decadencia”. La Nación, Opinión, 05 jul. 2013. Disponible en: <http://www.lanacion.com.ar/1598171‑como‑
‑salir‑del‑camino‑de‑la‑decadencia>.
230 Serv. Soc. Soc., São Paulo, n. 122, p. 224-249, abr./jun. 2015
el alcance del pasado, pero ilustra la impotencia de la receta neodesarrollista 
para evitar los temblores que atormentan a la economía.
Crisis global y demanda
Los	problemas	del	esquema	ensayado	en	Argentina	son	reconocidos	por	
sus propios promotores. Suelen atribuir esas fallas al impacto de la crisis global 
que	 irrumpió	 en	 el	 2008.	Afirman	que	 el	modelo	 permitió	 contrarrestar	 las	
consecuencias más dramáticas de esa convulsión, pero sin neutralizar todos sus 
efectos.	Establecen	 comparaciones	 con	Europa	 y	 remarcan	 las	 virtudes	 del	
crecimiento nacional frente al resto de Sudamérica.7
Pero	la	crisis	mundial	afecta	en	forma	muy	diferente	a	cada	región	o	país.	
Basta comparar la prosperidad de China con el derrumbe de Grecia para notar 
esas	disparidades.	El	contraste	que	se	establece	entre	Argentina	y	Europa	del	
Sur olvida que la primera economía soportó en el 2001, el vendaval que actu‑
almente	 sacude	 al	Viejo	Continente.	Los	 ciclos	 de	 prosperidad	 y	 depresión	
global no están sincronizados.
Ciertamente	el	divorcio	del	mercado	financiero	internacional	y	la	prioridad	
asignada al consumo, diferencian al modelo argentino de la apertura neoliberal, 
imperante en otros países de Sudamérica. Pero el impacto de la crisis mundial 
ha	sido	limitado	y	semejante	en	ambos	casos,	dada	la	afluencia	común	de	divisas	
que	generó	la	apreciación	de	las	exportaciones.	Los	precios	récord	de	la	soja	y	
los ingresos aportados por la agroexportación durante la última década, supera‑
ron	en	cinco	veces	el	promedio	de	los	90	y	en	diez	veces	la	media	de	los	80.
Los principales desequilibrios del experimento neodesarrollista radican 
en el propio modelo. Ese esquema supuso que bastaba con alentar la demanda 
para	incentivar	el	despegue	de	un	círculo	virtuoso	de	inversión	y	crecimiento.	
Inspirados	en	la	heterodoxia	keynesiana,	sus	promotores	 imaginaron	que	el	
simple aliento al consumo impulsaría a toda la economía hacia un sendero de 
7.	Feletti,	Roberto.	La	crisis	global	y	el	futuro	de	la	región.	La Nación, Economía, 10 jun. 2013. Dis‑
ponible	en:	<http://www.lanacion.com.ar/1596613-la-crisis-global-y-el-futuro-de-la-region>.
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crecimiento auto sostenido. Pero lo que funcionó en el 2003‑2007 perdió con‑
sistencia	en	el	2008-2010	y	se	tornó	inviable	desde	el	2011.
Bajo el capitalismo los empresarios no sólo se interesan por el comporta‑
miento	de	las	ventas.	Priorizan	las	ganancias	y	evalúan	los	costos.	El	empuje	
del	consumo	es	reactivador	en	ciertas	coyunturas,	pero	obstruye	la	rentabilidad	
en otras circunstancias.
Los heterodoxos suelen cometer una ingenuidad simétrica al ideario neo‑
clásico, al imaginar grandes expansiones de la oferta productiva por el mero 
repunte de la demanda. Esperan una reacción inviablemente positiva de los 
empresarios frente a esa mejora, olvidando la gravitación de otras variables 
como	el	riesgo	o	el	beneficio.	Su	idealización	del	capitalismo	les	impide	perci‑
bir las contradicciones de este sistema.
Con	esas	ilusiones	apostaron	una	y	otra	vez	a	la	autocorrección	del	mode‑
lo, mediante sencillos empujes de la demanda que terminaron generando im‑
pulsos	inflacionarios,	solventados	con	elevado	gasto	público	y	alta	emisión.	Lo	
que funcionó durante la salida de la convertibilidad por la existencia de impor‑
tantes	recursos	ociosos,	perdió	viabilidad	en	la	coyuntura	posterior.
Esas políticas permitieron incluso ciertos resultados de corto plazo frente 
a la recesión del 2009. Aprovecharon la subsistencia de un gran colchón de 
fondos públicos para reanimar la economía. Pero ese excedente se disipó pos‑
teriormente. Cuando en el 2013‑2014 desapareció el margen para posponer 
ajustes, el gobierno recurrió a las políticas ortodoxas de contracción de la de‑
manda, que el neodesarrollismo suele objetar enfáticamente.
La renta convalidada
El	ensayo	neodesarrollista	ha	fallado	por	la	incapacidad	del	gobierno	para	
incrementar la apropiación estatal de la renta de la soja. Esta medida es una 
condición	insoslayable	para	estabilizar	un	modelo	de	expansión	productiva	y	
mejoras sociales. El kirchnerismo pretendió aumentar la captación pública de 
ese excedente subiendo los impuestos a las exportaciones de la soja (retenciones). 
Pero	fue	derrotado	en	la	confrontación	del	2008	con	el	agronegocio	y	desde	ese	
momento abandonó todo intento de retomar la iniciativa en este campo.
232 Serv. Soc. Soc., São Paulo, n. 122, p. 224-249, abr./jun. 2015
Ese	desenlace	marcó	un	punto	de	 inflexión.	No	 le	 impidió	al	gobierno	
preservar	(y	recrear)	su	hegemonía	política,	pero	le	quitó	al	estado	los	recursos	
necesarios para la reindustrialización. Persistió cierto crecimiento, pero con los 
motores del desarrollo totalmente apagados.
Argentina es una economía agroexportadora asentada en la extraordinaria 
fertilidad	de	la	tierra.	Ese	ventajoso	acervo	de	recursos	naturales	constituye	
una maldición bajo el capitalismo, puesto que establece un alto piso de renta 
comparativa para cualquier otra inversión. Ninguna actividad ofrece un nivel 
de rendimiento semejante al agro. Esta asimetría históricamente determinó la 
preeminencia	inicial	de	la	ganadería	y	los	cereales	y	su	reemplazo	actual	por	
la soja.
La industria no pudo competir durante la centuria pasada con el latifundio 
terrateniente	y	no	logra	rivalizar	en	la	actualidad	con	los	Pools de Siembra. Un 
sector	primario	que	ofrecía	escasas	ofertas	de	trabajo	a	los	chacareros,	ya	no	
crea empleo en la era de la siembra directa. La aglomeración en villas miserias 
que generaba el éxodo rural del interior ha devenido en informalidad laboral 
masiva, a partir del deterioro de la industria.
Los	distintos	proyectos	de	industrialización	que	se	implementaron	desde	
la segunda mitad del siglo XX apuntaron a contrarrestar esta tendencia a la 
primarización estructural. Pero todos afrontaron el mismo límite que impone la 
elevada	renta	agroexportadora	al	estrecho	beneficio	fabril.	Como	la	fertilidad	
natural	de	la	tierra	asegura	costos	muy	inferiores	al	promedio	mundial,	la	vieja	
tentación de privilegiar el agro (o a su extensión agroindustrial) invariablemente 
se renueva.
Esa primacía agroexportadora reapareció con fuerza en las últimas décadas 
de	modernización	de	la	producción	agrícola	(modificaciones	genéticas,	agroquí‑
micos,	maquinaria	de	última	generación)	y	aumento	de	la	demanda	internacional	
(por	especulación	financiera,	compras	de	China-India	y	agrocombustibles).
Este	escenario	volvió	a	disuadir	el	tibio	intento	oficial	de	sostener	la	ac‑
tividad fabril, más allá de alguna sustitución de importaciones. Los capitalistas 
de	la	soja	mantuvieron	su	renta	y	el	estado	se	quedó	sin	los	ingresos	necesarios	
para desenvolver un modelo productivo. En estas condiciones el gobierno 
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archivó	su	proyecto	y	se	resignó	a	gestionar	el	status	quo	de	una	economía	sin	
dinamismo industrial.
Algunos	 autores	 extraen	otro	balance	del	 conflicto	 con	 los	 agrosojeros.	
Estiman	que	ese	choque	derivó	en	una	radicalización	progresista	del	oficialismo	
e incentivó medidas favorables al modelo neodesarrollista (como la estatización 
de	los	fondos	de	pensión	y	la	asignación	universal).8
Pero	esta	caracterización	invierte	lo	ocurrido	y	no	explica	los	desequilibrios	
que	finalmente	empujaron	al	kirchnerismo	al	ajuste.	Ignora	que	al	renunciar	a	un	
manejo	mayor	de	la	renta

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