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A BURGUESIA INDUSTRIAL EM CONFLITO CNI

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS
INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS
OTÁVIO GILIOLI SPINACE
A BURGUESIA INDUSTRIAL EM CONFLITO: A TRAJETÓRIA DA
CONFEDERAÇÃO NACIONAL DA INDÚSTRIA ENTRE O NEOLIBERALISMO E
O NEODESENVOLVIMENTISMO
CAMPINAS
2019
OTÁVIO GILIOLI SPINACE
A BURGUESIA INDUSTRIAL EM CONFLITO: A TRAJETÓRIA DA
CONFEDERAÇÃO NACIONAL DA INDÚSTRIA ENTRE O NEOLIBERALISMO E
O NEODESENVOLVIMENTISMO
Dissertação apresentada ao Instituto de
Filosofia e Ciências Humanas da
Universidade Estadual de Campinas como
parte dos requisitos exigidos para a obtenção
do título de Mestre em Ciência Política. 
Orientadora: Prof.ª Dr.ª Andréia Galvão
ESTE TRABALHO CORRESPONDE À
VERSÃO FINAL DA DISSERTAÇÃO
DEFENDIDA PELO ALUNO OTÁVIO
GILIOLI SPINACE, E ORIENTADA PELA
PROF.ª DR.ª ANDRÉIA GALVÃO. 
CAMPINAS
2019
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS
INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS
A Comissão Julgadora dos trabalhos de Defesa de Dissertação, composta pelos Professores
Doutores a seguir descritos, em sessão pública realizada em 26 de março de 2019, considerou
o candidato Otávio Gilioli Spinace aprovado.
Prof.ª Dr.ª Andréia Galvão
Prof. Dr. Armando Boito Júnior
Prof. Dr. Wagner Pralon Mancuso
 A Ata de Defesa com as respectivas assinaturas dos membros encontra-se no SIGA/Sistema
de Fluxo de Dissertações/Teses e na Secretaria do Programa de Pós-Graduação em Ciência
Política do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas.
A meu pai e meu avô.
AGRADECIMENTOS
A elaboração desta pesquisa contou com a ajuda de muitas pessoas, sem as quais
não seria exagero dizer que ela não seria possível. Cabe, por isso, reservar um espaço para
agradecer a todos que colaboraram nesse processo. 
Agradeço, em primeiro lugar, à professora Andréia Galvão, pela atenção e apoio
dispensados na orientação deste trabalho, e por todo o conhecimento transmitido. A
professora Andréia colaborou não apenas em seu papel de orientadora, mas ao longo do
período de mestrado se tornou uma referência acadêmica que certamente terei daqui em
diante. 
Agradeço também aos professores Armando Boito e Alvaro Bianchi pelos
comentários, sugestões e correções feitos na banca de qualificação. Depois de algum tempo na
Universidade, é comum colher relatos de colegas que passaram por maus momentos em
bancas. Definitivamente não foi esse meu caso, pois tive o privilégio de contar com a leitura
generosa de ambos ao meu trabalho. Quero agradecer também ao professor Wagner Mancuso
pela participação na banca de defesa. 
Aos professores, colegas e funcionários do IFCH e da Unicamp que tornaram a
tarefa de elaborar uma dissertação um pouco menos difícil. 
O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento
de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001.
À minha família, e em especial minha mãe, Ivone, e meu irmão, Murilo, por me
apoiarem em todos os meus objetivos, desde sempre, e me acompanharem em todos os
momentos.
A todos os meus amigos e amigas, que me ajudaram de inúmeras maneiras, pelas
quais não tenho como agradecer devidamente. Aos colegas de CMJ, Angélica e Carlos, pelo
convívio diário; à Cintia, pelas conversas mais do que agradáveis na reta final da pesquisa;
aos amigos de longa data Allan, Gabriel e Gustavo; aos amigos da História 011 e da
República Casa Nostra, que fizeram o tempo em Barão Geraldo se tornar muito mais
agradável; ao Gui, Goiano, Michel, Menini, Moralez e Viking, por terem me acompanhado
neste caminho e pela grande amizade construída ao longo desses anos. 
E à Ana Luiza, por todo o companheirismo desses anos, e com quem tenho o
privilégio de dividir os melhores dias. 
RESUMO
O objetivo da pesquisa é analisar a ação política da Confederação Nacional da Indústria (CNI)
enquanto representante do conjunto da burguesia industrial no Brasil, e seu posicionamento na
disputa entre neoliberalismo e neodesenvolvimentismo no período que vai de 1990, com a
posse de Fernando Collor, a 2016, com o impeachment de Dilma Rousseff. Com grande
capacidade de formulação econômica, a CNI apresenta uma trajetória oscilante entre apoio e
rejeição ao programa neoliberal ortodoxo, defendido principalmente pelo capital financeiro e
pela burguesia associada ao grande capital internacional. Depois de inicialmente apoiar uma
agenda neoliberal nos anos 1990, os industriais se distanciaram gradualmente desse programa
e formaram uma frente política ampla e heterogênea com setores da classe trabalhadora. Essa
frente logrou vencer as eleições presidenciais de 2002, 2006, 2010 e 2014 com um programa
que procurava amenizar os efeitos da política neoliberal retomando alguns princípios do
desenvolvimentismo, sem, no entanto, romper totalmente com o modelo anterior. No primeiro
governo de Dilma Rousseff foi realizada uma inflexão em direção ao aprofundamento do
programa neodesenvolvimentista, que coincidiu com o afastamento da burguesia industrial
dessa frente, e resultou em uma crise política. Esse processo viabilizou a restauração do
neoliberalismo em sua versão ortodoxa, mesmo após a reeleição de Dilma em 2014. Nosso
intuito é identificar evidências que caracterizem o movimento pendular da CNI, através dos
documentos e formulações produzidos pela entidade e seus dirigentes, à luz da bibliografia
sobre classes sociais e da análise de sua ação política. Para isso, utilizamos uma perspectiva
relacional, que permita compreender a atuação da CNI através das relações de forças nas
quais a entidade está inserida.
Palavras-chave: Confederação Nacional da Indústria; Neoliberalismo;
Neodesenvolvimentismo. 
ABSTRACT
The aim of the research is to analyze the political action of the Brazilian National
Confederation of Industry (CNI) as representative of the industrial bourgeoisie in Brazil, and
its position in the dispute between neoliberalism and neo-developmentalism, in the period that
begins in 1990, with the election of Fernando Collor, to 2016, in the impeachment of Dilma
Rousseff. With great capacity for economic formulation, the CNI presents an oscillating
trajectory between support and rejection of the orthodox neoliberal program, defended mainly
by the financial capital and the bourgeoisie associated to the great international capital. After
initially supporting a neoliberal agenda in the 1990s, industrialists gradually moved away
from this program and formed a broad and heterogeneous political front with working-class
sectors. This front managed to win the presidential elections of 2002, 2006, 2010 and 2014
with a program that sought to soften the effects of neoliberal politics by retaking some
principles of developmentalism, without, however, totally breaking with the previous model.
In the first government of Dilma Rousseff, an inflection was made towards the deepening of
the neo-developmentalist program, which coincided with the departure of the industrial
bourgeoisie from that front, and resulted in a political crisis. This process enabled the
restoration of neoliberalism in its orthodox version, even after the re-election of Dilma in
2014. Our intention is to identify evidences that characterize the pendulum movement of the
CNI, through the documents and formulations produced by the entity and its leaders, under
the light of the bibliography on social classes and the analysis of its political action. For this,
we use a relational perspective, which allow us to understand the CNI’s action through the
relations of forces in which the entity is inserted. 
Keywords: Brazilian National Confederation of Industry; Neoliberalism; Neo-
developmentalism. 
SUMÁRIO
Introdução.................................................................................................................................10Metodologia, fontes e estrutura da dissertação....................................................................17
A ação coletiva da burguesia sob uma perspectiva relacional.............................................18
Capítulo 1. Constituição e trajetória da Confederação Nacional da Indústria..........................24
1.1 – A formação da CNI e a consolidação do sistema corporativo....................................24
1.2 – Crise de representação e surgimento do sistema extracorporativo..............................32
1.3 – Redemocratização e constituição do “novo” sistema corporativo..............................40
1.4 – A burguesia industrial brasileira: uma burguesia nacional ou interna?.......................45
Capítulo 2. Neoliberalismo e neodesenvolvimentismo: continuidades e rupturas...................52
2.1 – Neoliberalismo: origens e definições..........................................................................52
2.2 – Neoliberalismo e classes sociais..................................................................................58
2.3 – Neoliberalismo e burguesia industrial no Brasil.........................................................66
2.4 – O neodesenvolvimentismo como alternativa ao neoliberalismo.................................74
Capítulo 3. A CNI na crise do neodesenvolvimentismo...........................................................91
3.1 – A agenda da CNI: entre o neoliberalismo e o neodesenvolvimentismo......................92
3.2 – A nova matriz econômica: o programa dos industriais.............................................111
3.3 – A burguesia industrial em conflito: a crise da frente neodesenvolvimentista...........118
Considerações finais...............................................................................................................136
Referências bibliográficas.......................................................................................................143
10
Introdução
O objetivo desta pesquisa é analisar a atuação da burguesia industrial na política
brasileira durante o processo de ascensão, enfraquecimento e retomada do neoliberalismo a
partir da crise do governo de Dilma Rousseff. Para isso, teremos como objeto a Confederação
Nacional da Indústria (CNI), sua principal organização de classe, considerando os conflitos
entre classes e frações de classe nos quais esteve envolvida no período compreendido entre os
anos 1990 e 2016.
A ação política do empresariado brasileiro tem sido um tema bastante relevante
nas ciências sociais, a exemplo de trabalhos como os de Eli Diniz e Renato Boschi (1978;
2007), Maria Antonieta Leopoldi (2000) e Mancuso (2007). Contudo, no âmbito da análise de
classes, a atuação da burguesia ainda é pouco debatida se comparada à das classes
trabalhadoras. A literatura recente que se dedica a entender o empresariado como ator político
muitas vezes não dialoga com a literatura marxista, ou que se pauta pelo conceito de classes
sociais, e a recíproca é verdadeira, a despeito de grandes trabalhos sobre a burguesia brasileira
produzidos por autores como Caio Prado Jr. (1966) e Florestan Fernandes (1975). Alguns
estudos mais recentes, como os de Armando Boito Jr. (2012) e André Singer (2015), têm
mudado esse cenário ao analisar questões como a natureza de classe dos governos petistas e,
em especial, a relação desses governos com os diferentes setores da burguesia. 
Entidade de cúpula do sindicalismo patronal do setor industrial, a CNI é
representante na esfera institucional – mas não apenas – da burguesia industrial brasileira.
Fundada em 1938 a partir da Confederação Industrial do Brasil (CIB), sua trajetória política
recente desperta interesse, entre outros motivos, por conta de sua inserção peculiar na
conjuntura do neoliberalismo e sua relação, ora de maior proximidade, ora de maior
distanciamento, com o programa neoliberal. Cabe ponderar que, a despeito de sua posição na
hierarquia do sindicalismo patronal, a Confederação Nacional da Indústria não é o espaço
único e absoluto na definição de interesses dos industriais, num sistema representativo
complexo que engloba sindicatos, federações e associações. No entanto, por ser responsável
por representar todo o setor industrial em um país marcado por profundas desigualdades
regionais como o Brasil, a CNI tem a capacidade de organizar diferentes visões e definir uma
pauta política e estratégia de ação conjunta que a diferencia das federações estaduais. Com
efeito, após algum tempo de domínio da FIESP como grande representante do empresariado
11
industrial e de perda de protagonismo para as associações setoriais, a partir da década de 1990
houve um ressurgimento da CNI na articulação dos interesses da indústria, ligado
principalmente a essa capacidade de formular uma pauta conjunta para o setor industrial. 
Através do acompanhamento da atividade política e do desenvolvimento de
estudos técnicos, a CNI passa a definir uma agenda própria com o intuito de intervir mais
claramente no debate político. Essa ação também foi acompanhada pela expansão das
atividades da Confederação no sentido de criar organismos internos capazes de formularem a
“visão da indústria” sobre a política econômica e outras questões de relevância, com vistas a
influenciar o debate no âmbito dos três poderes. É o caso, por exemplo, da criação do Fórum
Nacional da Indústria e da Unidade de Assuntos Legislativos (Pont, 2012, p. 30). Mais do que
influenciar a cena política através de lobby e outros mecanismos de pressão, a recuperação da
CNI como interlocutora da indústria nacional envolve a tentativa de construção de um
programa político próprio que represente os interesses de sua fração de classe. Nesse sentido,
nosso objetivo é entender como esse processo se relaciona com a disputa entre neoliberalismo
e neodesenvolvimentismo no campo político1.
Depois de apoiar os princípios do modelo econômico introduzido no país pelo
presidente Fernando Collor, houve um afastamento gradual entre a burguesia industrial e o
campo neoliberal ortodoxo, que a partir de 1995 passou a ser representado na cena política2
pelo governo Fernando Henrique Cardoso (FHC). Esse afastamento culminou na aproximação
da entidade com setores populares organizados, também insatisfeitos com os resultados dessa
política. O resultado desse processo foi a composição de uma frente ampla e heterogênea, que
serviu de sustentação para um programa neodesenvolvimentista (Boito Jr., 2012).
Desenvolveremos esse ponto um pouco mais adiante. O neodesenvolvimentismo, por sua vez,
foi representado na cena política pelas candidaturas Lula em 2002 e 2006, e Dilma em 2010 e
2014, e procurou retomar a ideia de desenvolvimento nacional pautado no crescimento
econômico e no fortalecimento do mercado interno. Esse processo se deu de forma
contraditória, sem romper com alguns pilares do neoliberalismo.
Em razão da recuperação da CNI como um importante locus de elaboração e
divulgação da agenda política dos industriais, pretendemos investigar quais as pautas
1 O conceito de neodesenvolvimentismo e suas diferenças em relação ao neoliberalismo serão discutidos
detalhadamente no capítulo 2 da dissertação.
2 O conceito de cena política é originário da obra de Marx, e diz respeito ao locus onde ocorre a dissimulação
dos interesses de classe na sociedade capitalista. Marx elaborou uma distinção entre a realidade aparente, ou
superficial; e a realidade essencial, ou profunda, que diz respeito aos interesses de classe. Para analisar a
política, portanto, é necessário ultrapassar os limites da cena política (Boito Jr., 2007).
12
defendidas pela burguesia industrial e como elas se transformam neste período, observando o
posicionamento político da CNI e de suas lideranças. Em quais conjunturas a Confederação seaproxima das organizações de trabalhadores e em quais adota uma postura mais agressiva e
menos conciliatória com os trabalhadores? Que pautas defende em cada um desses
momentos? Como se posiciona em relação aos governos para viabilizar a implantação de suas
pautas? Quais os resultados de seu posicionamento? Tomemos o exemplo da reforma
trabalhista. Essa é uma pauta histórica do conjunto da burguesia, que se manifestou
principalmente ao longo dos anos 1990 sob o argumento de “modernização da legislação
trabalhista”, mas que permaneceu relativamente adormecida durante a maior parte dos
governos petistas. A retomada dessa pauta no final de 2012, expressa uma fissura na frente
política que a burguesia industrial mantinha com a classe trabalhadora, evidenciando seus
interesses distintos, e denota seu afastamento gradual em relação ao governo. Embora a
reforma trabalhista constitua parte permanente do discurso da burguesia brasileira, e mais
especificamente da agenda da CNI, a ênfase concedida a esses e outros pontos aproxima o
conjunto da burguesia. Ao mesmo tempo, como assinalado por articulistas na imprensa a
partir de 2013 (Singer, 2013b), empresários passam a subir o tom na crítica ao que classificam
como intervencionismo excessivo adotado pelo governo Dilma. A própria presidente, à época,
denunciou que estava em curso uma “guerra psicológica” contra seu governo. 
Com o intuito de recuperar apoio entre a burguesia, já em um cenário de cerco ao
governo que se formou após a eleição de 2014, a presidente Dilma intensifica as concessões a
diferentes setores burgueses, em um movimento que vinha pelo menos desde 2013 e que ficou
marcado com a nomeação de Joaquim Levy, um quadro oriundo do sistema financeiro, para o
Ministério da Fazenda. O discurso que sustentou o novo programa econômico consistia na
“recuperação da credibilidade”, o que se traduziu em um pesado ajuste fiscal, na elevação dos
juros, e no fim da política de pleno emprego, para controlar a inflação, entre outras ações. Em
alguma medida, esse programa foi defendido em 2014 não apenas pelo setor financeiro e pela
burguesia associada, mas também por setores da burguesia interna3. À época, a CNI passou a
defender uma “política econômica rumo à estabilidade” (Branco, 2014). 
3 Partimos da análise de Boito Jr. (2012), que se baseia na categorização elaborada por Nicos Poulantzas em
sua obra “Poder político e classes sociais”. O autor aponta a grande burguesia interna como força dirigente
da frente neodesenvolvimentista. Isso significa dizer que essa fração de classe foi responsável por dirigir o
sentido mais amplo da política econômica, e que seus interesses foram privilegiados pelos governos petistas.
Como veremos no capítulo 1, a burguesia interna corresponde à fração burguesa situada entre a burguesia
associada, perfeitamente integrada ao capital estrangeiro, e a antiga burguesia nacional, que a depender da
conjuntura poderia tomar posições anti-imperialistas. 
13
Nossa pesquisa aborda, portanto, a problemática das relações entre industriais,
neoliberalismo e neodesenvolvimentismo. Pretendemos identificar em que momento as teses
neoliberais ganham novamente força entre a burguesia industrial, e como esse movimento
leva ao rompimento da frente neodesenvolvimentista. Nosso intuito é o de entender qual foi o
papel da burguesia industrial nessa conjuntura de crise, e de formular algumas hipóteses sobre
por que, mesmo tendo grande parte de suas reivindicações atendidas, os industriais deixaram a
base de apoio ao governo Dilma. 
Para delimitar melhor o problema, é necessário partir de uma visão mais ampla da
conjuntura neoliberal no Brasil. Nesse sentido, a bibliografia é relativamente consensual ao
classificar o período que vai de 1990, com o início do governo Collor, até 2002, com o
término do segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso – considerando as diferentes
conjunturas que atravessaram esses 12 anos – como de alinhamento do Brasil ao
neoliberalismo, que pode ser entendido, em linhas gerais, como uma política de
desestatização, desregulamentação e abertura da economia brasileira (Saes, 2001, p. 87). No
entanto, mais do que a política executada pelo Estado brasileiro, cabe pensar em que medida o
neoliberalismo se relaciona com interesses de classes. A relativa unidade política da burguesia
em torno do neoliberalismo durante a maior parte da década de 1990 no Brasil pode induzir
ao erro de inferir que a política neoliberal atinge de maneira equivalente as diferentes classes
sociais e frações de classe. Boito Jr. (1999, pp. 50-51) mostra que os efeitos das principais
políticas neoliberais, a saber: desregulamentação do mercado de trabalho, supressão de
direitos sociais, privatizações e concessões, abertura comercial e desregulamentação
financeira, impactam de maneira diferente as frações burguesas. Esse processo foi responsável
por provocar contradições e disputas dentro da coalizão que sustentou o neoliberalismo, e
provocaram conflitos em torno da aplicação do programa, principalmente a respeito da
velocidade e do alcance da implementação das chamadas “reformas para o mercado”. 
A partir da primeira crise cambial pós-Plano Real, em 1999, o caráter radical da
política neoliberal foi reforçado com a institucionalização do que ficou conhecido como “tripé
macroeconômico”, conjunto de medidas que marcou a política econômica do segundo
governo FHC, e consistia em metas de inflação mantidas com altas taxas de juros, câmbio
flutuante e superávits primários elevados. Embora a CNI tivesse apoiado o programa
neoliberal num primeiro momento, o ritmo e a amplitude da abertura comercial, bem como a
política de juros elevados e a sobrevalorização do real, dificultavam ainda mais as condições
14
da burguesia industrial num contexto de acirramento da competição global. O afastamento
gradual do setor industrial do governo FHC, que já não contava com apoio significativo vindo
do conjunto da classe trabalhadora, que não teve seus interesses contemplados por essa
política, culminou com a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva nas eleições de 2002, com um
programa que procurava apoio nos setores burgueses que perderam com a política neoliberal. 
Uma vez no poder, contudo, o governo Lula não logrou reverter o “tripé”. O que
justificaria, então, diferenciá-lo dos governos anteriores? Segundo Bastos (2017, p. 14), o
governo Lula cometeu “três heresias” relevantes em relação à agenda neoliberal: freou a
política de privatizações, um dos temas de disputa ideológica mais acirrada no governo FHC;
recuperou o papel dos bancos públicos no estímulo ao investimento produtivo; e sustentou o
crescimento do mercado interno através da política de valorização do salário mínimo, do
fortalecimento do emprego formal e de políticas de transferência de renda.
A partir dessa breve consideração, é possível ter uma dimensão do caráter
complexo dos governos petistas, que foram sustentados por um arco de forças frágil,
contraditórias entre si, e sem alinhamento a um projeto de longo prazo. Esse conjunto de
forças, envolvendo uma parcela da burguesia e setores das classes trabalhadoras, permanecia
unido pela defesa de algumas medidas, como o crescimento econômico; a recuperação de
setores-chave da indústria; a melhora nas condições de distribuição de renda dos
trabalhadores e na própria oferta de empregos, importantes para o fortalecimento do mercado
interno. Em razão disso, optamos por utilizar o conceito de frente neodesenvolvimentista,
como elaborado por Boito Jr. (2012), por remeter a uma frente ampla e heterogênea,
permeada por contradições, composta principalmente por três forças principais: a burguesia
interna, que se aproximou do Partido dos Trabalhadores no final dos anos1990; o movimento
sindical, este historicamente ligado ao PT; e os trabalhadores da massa marginal, ou
subproletariado, que se deslocaram para o apoio a essa frente durante o governo Lula. 
Os governos neodesenvolvimentistas, na interpretação do autor, representam uma
melhora da posição da burguesia interna no bloco no poder em relação ao período anterior, o
que significou ter uma série de interesses atendidos pela política de governo. A burguesia
interna, porém, não é um bloco monolítico com um programa político bem definido. Pelo
contrário, é uma fração de classe que reúne diversos setores econômicos, com diversas
divisões internas, mas que possuem como principal demanda comum a proteção do Estado
contra o grande capital internacional (Boito Jr., 2012, pp. 95). Nesse sentido, a manutenção da
15
frente exige a conciliação mínima dos interesses entre os diferentes setores capitalistas, e
dessa fração da burguesia com os trabalhadores. Dentro dessa composição heterogênea,
focamos nossa atenção nas ações de um dos segmentos da burguesia interna, a saber, a
burguesia industrial. 
Ainda que não tenha sido definido de forma clara pelos seus defensores, nem
rompa em sua integralidade com o programa neoliberal aplicado nos anos 1990, o
neodesenvolvimentismo apresenta pontos de contraposição ao neoliberalismo. Desse modo,
tal arranjo político não exclui, tampouco interdita, o “poder estrutural” do capital financeiro
na conjuntura neoliberal e sua capacidade de influenciar a política, mesmo que este não faça
parte da frente que está no governo (Bastos, 2017, p. 11). Ao mesmo tempo, nutre importantes
conflitos com os setores mais interessados na manutenção do modelo neoliberal ortodoxo. 
Tendo em vista esse amplo – porém frágil – arco de forças, a frente
neodesenvolvimentista obteve sucesso em apoiar os governos petistas, ao menos no período
entre 2003 e 2014, dentro do qual destacamos momentos de elevada instabilidade política,
como na chamada “crise do mensalão” em 2005 e na crise econômica mundial de 2008. 
Com a eleição de Dilma Rousseff, em 2010, houve uma inflexão na política do
governo em direção às demandas da burguesia industrial, apresentadas em especial pela CNI e
FIESP, a fim de manter o crescimento econômico depois da crise internacional e implantar
uma agenda industrialista. Podemos sintetizar esse programa em nove ações principais:
redução dos juros; uso intensivo do BNDES; reindustrialização; desonerações à produção;
investimento em infraestrutura; reforma do setor elétrico; desvalorização do real; controle de
capitais; e proteção ao produto nacional (Singer, 2015, pp. 46-49). 
Essas medidas tomadas no governo Dilma, por sua vez, compunham o eixo
principal da política batizada de “nova matriz econômica” (NME) e sinalizavam o
rompimento com o modelo do tripé macroeconômico. Dessa forma, a NME ia além do
programa inicial proposto pelo governo Lula, o que foi suficiente para que analistas alinhados
com novos projetos de desenvolvimento4, como Bresser-Pereira (2013, p. 13), afirmassem que
4 Entre o que denominamos “novos projetos de desenvolvimento”, podemos estabelecer algumas
diferenciações: enquanto o novo-desenvolvimentismo, perspectiva desenvolvida principalmente por Luiz
Carlos Bresser-Pereira, enfatiza a preocupação com os preços macroeconômicos, em especial a manutenção
da taxa de câmbio em patamares que promovam a competitividade da indústria nacional e estimulem o
investimento privado, o social-desenvolvimentismo, ligado principalmente a economistas da Escola de
Campinas, volta suas preocupações ao papel do investimento público no crescimento econômico. Apesar de
possuírem diferenças importantes, ambas as perspectivas foram apresentadas no debate econômico da última
década como alternativas ao neoliberalismo. Sobre este debate, ver, entre outros, Bastos, 2012; Bresser-
Pereira, 2013; Morais e Saad-Filho, 2011; Singer, 2015.
16
Dilma “certamente pensa em liderar um projeto nacional com amplo apoio da sociedade”. Por
uma série de motivos que discutiremos mais à frente, as medidas adotadas pelo governo
Dilma, em grande parte com apoio da CNI, não lograram atingir seu objetivo principal, qual
seja, o de promover o crescimento econômico puxado pela indústria. Tal fato acabou por
amplificar os ataques à NME de setores alinhados ao neoliberalismo e, como apontado
anteriormente, a reação do governo diante desses ataques foi um recuo gradual, colocando em
xeque qualquer perspectiva de política desenvolvimentista depois de vencer a eleição de 2014.
Feita essa exposição preliminar, nosso principal objetivo consiste em entender o
papel desempenhado pela burguesia industrial nas conjunturas neoliberal e
neodesenvolvimentista, a partir da ação de uma de suas mais importantes entidades
representativas, a Confederação Nacional da Indústria. Ao longo desse período, identificam-se
três momentos distintos: o apoio inicial dos industriais ao neoliberalismo nos anos 1990; a
defecção gradual do campo neoliberal e aproximação da frente neodesenvolvimentista entre
2002-2012; e a crise dessa frente a partir de 2013, com o afastamento da burguesia industrial e
a restauração do neoliberalismo em sua versão ortodoxa. Como explicar essas mudanças de
posição? Baseamo-nos na bibliografia existente para compreender a primeira mudança, entre
os anos 1990 e 2000, uma vez que há muitas análises produzidas a esse respeito. Assim, nossa
principal hipótese diz respeito à segunda mudança. Consideramos que a burguesia industrial
realizou um movimento pendular durante o primeiro mandato de Dilma Rousseff, a exemplo
do que ocorreu outras vezes no processo de desenvolvimento capitalista no Brasil. Um
movimento que envolveu, por um lado, o rompimento com a frente neodesenvolvimentista –
que parecia estável o suficiente para seguir em direção a uma nova perspectiva de
desenvolvimento – e, por outro, uma inflexão dos industriais, que mesmo tendo diversas de
suas demandas atendidas, não mantiveram o apoio ao governo. Ao contrário, o que se viu foi
um distanciamento cada vez maior do setor industrial em relação ao neodesenvolvimentismo
e seu realinhamento ao campo neoliberal. 
De maneira complementar, nossa segunda hipótese é de que as contradições no
interior da frente neodesenvolvimentista, quando tensionadas, influenciaram para seu
rompimento. Essas contradições foram aguçadas a partir de 2012 por uma conjuntura de baixo
crescimento econômico e queda nas taxas de lucro, sem que os industriais pudessem contar
com a salvaguarda dos retornos de investimentos financeiros, atacados pela nova matriz
econômica. A burguesia industrial, principalmente em razão de sua dependência externa,
17
financeira e tecnológica, e do próprio local que o Brasil ocupa na divisão internacional do
trabalho, não logrou construir um projeto político independente dos setores burgueses que têm
maior interesse na retomada do programa neoliberal ortodoxo. Somando-se a isto, a atual
configuração dos grandes grupos empresariais, atravessada pela financeirização neoliberal,
faz com que o capital das empresas seja investido tanto em atividades produtivas quanto
rentistas, como forma de auferir grandes taxas de lucro e maximizar seu valor acionário
independentemente das condições econômicas em geral. Embora uma das atividades seja
predominante, esse “duplo caráter” dificulta que a burguesia industrial conduza um projeto
desse alcance. Enfatizamos que essa configuração não elimina as diferenças entre frações da
burguesia e os tipos de capital, mas exerce influência na definição de interesses de sua parcela
ligada a atividades produtivas. Esse movimento foi acompanhado por uma ofensiva
ideológica docampo neoliberal, que teve seus interesses afetados pela política industrialista
dos dois primeiros anos do governo Dilma, e foi capaz de atrair a burguesia industrial. 
Metodologia, fontes e estrutura da dissertação 
A análise da ação política da CNI no período pesquisado compreendeu uma
pesquisa empírica, a partir da documentação produzida pela entidade, associada a uma
pesquisa bibliográfica acerca das relações de classe nos períodos que denominamos de
neoliberal e neodesenvolvimentista no Brasil. Como apontamos no início, desde os anos 1990
a CNI produz uma grande quantidade de documentos, através dos quais é possível identificar
posicionamentos a respeito de políticas ou temas específicos. Nesse sentido, nossa principal
fonte são os documentos contendo propostas aos candidatos à presidência da república,
elaborados pela CNI desde a eleição de 1994, por constituírem os textos de maior fôlego da
entidade em relação ao que seria seu programa econômico, e refletirem posições tomadas em
diferentes conjunturas. 
O rol de documentos que utilizamos compreende, ainda, outras publicações de
maior alcance temporal, como o Mapa Estratégico da Indústria, que traçou metas para a
indústria brasileira no período 2007-2015 e serviu de referência para a elaboração das
publicações relativas às eleições de 2006 e 2010. Todos os documentos citados foram
organizados pela CNI em parceria com as federações das indústrias estaduais, associações da
indústria e empresários. Desse modo, as posições analisadas de certa forma refletem
18
interesses relativamente consensuais dentro das organizações da indústria, embora, caiba
sempre ressaltar, não sejam unânimes. Ademais, os dirigentes da entidade assinam
constantemente artigos de opinião, seja em periódicos próprios, como a Revista Indústria
Brasileira, ou na grande imprensa, e concedem entrevistas se posicionando acerca de temas
de interesse da CNI.
Utilizamos, ainda, periódicos da imprensa em geral, que vocalizam e veiculam o
pensamento empresarial, dentre os quais destacamos Folha de São Paulo, O Estado de São
Paulo e Valor Econômico, bem como a Revista Exame. Com isso, buscamos englobar um
amplo espectro de publicações que divulgam o pensamento de intelectuais orgânicos e
entidades ligadas à burguesia, e que nos permitem identificar seu posicionamento. 
No processo de análise documental, lançamos mão de um procedimento que
enfatiza a perspectiva histórica da consolidação de posições da CNI e permite entendê-las
através dos conflitos nos quais ela está envolvida, bem como de sua relação com a conjuntura.
Assim, analisamos a documentação sob dois aspectos principais: 1) a definição da posição da
CNI, levando em conta a conjuntura em que foi estabelecida; 2) quais as disputas envolvidas e
como remetê-las a conflitos de classe entre as diferentes frações da burguesia, entre estas e a
classe trabalhadora, e o Estado. 
Essa perspectiva permite analisar a ação das entidades de classe a partir das
relações de forças que se estabelecem ao longo de seu desenvolvimento histórico e se coloca
em oposição às visões essencialistas que procuram deduzir o comportamento político dessas
associações a partir de um determinado aspecto ideal e esperado, encontrado em sua própria
essência, ocultando sua condição de classe social em movimento (Bianchi, 2007, p. 127),
como veremos a seguir. 
A ação coletiva da burguesia sob uma perspectiva relacional
A partir da segunda metade do século XX, houve um debate nos meios políticos e
intelectuais sobre o papel da burguesia industrial brasileira, que havia ascendido politicamente
após a Revolução de 1930. Alguns dos autores que publicaram nesse período, bem como
intelectuais nacionalistas e vinculados ao Partido Comunista Brasileiro, elaboraram algumas
das principais análises sobre esse tema. Abordaremos com mais cuidado esse debate ao tratar
da caracterização da burguesia industrial brasileira, mas o tomaremos, neste momento, como
19
ponto de partida para tecer algumas considerações a respeito do enfoque relacional que
utilizaremos em nossa pesquisa. Nossa principal referência para os comentários a seguir é o
estudo de Bianchi (2010) sobre o associativismo do empresariado paulista nas décadas de
1980 e 1990, que propõe algumas considerações para a utilização desse tipo de perspectiva. 
Em que pesem significativas diferenças nas análises que foram feitas sobre a
burguesia industrial brasileira nas décadas de 60 e 70 do século XX, tanto as que destacavam
a submissão dessa fração da burguesia brasileira, como as que acreditavam em seu potencial
hegemônico, concebem sua ação política a partir de um viés essencialista. Por viés
essencialista nos referimos ao elemento comum presente nessas análises, de que caberia à
burguesia brasileira desempenhar um papel histórico determinado, o de liderar um projeto
hegemônico, apoiada em setores das classes trabalhadoras, e em oposição aos setores
atrasados da sociedade brasileira, identificados nos capitais agrário-exportador e estrangeiro.
O elemento essencialista desse tipo de análise consiste em identificar como principal variável
para a determinação da ação política da burguesia brasileira a realização de uma essência
inerente a essa fração de classe, que corresponderia ao seu papel histórico enquanto fração de
classe (Bianchi, 2010, p. 48). 
Por sua vez, essa essência – e, consequentemente, seu papel histórico – seria
realizada através de uma aliança com a classe trabalhadora que levasse a burguesia industrial
a ocupar um lugar hegemônico no interior da formação capitalista nacional, o que também
incluiria assumir posições anti-imperialistas. Segundo Bianchi (2010, p. 48), essa construção
teórica remonta a um tipo ideal de burguês, que levara a cabo as revoluções liberais na Europa
do século XIX, mas que não correspondia à burguesia que se desenvolvera no Brasil. A partir
daí se construíram análises que, de modo geral, ou acreditavam que a burguesia brasileira
teria condições para replicar as revoluções burguesas da Europa Ocidental e liderar um
projeto nacional de desenvolvimento, ou atribuíam a não realização desse potencial à
incapacidade política da fração industrial, que optara por uma política de conciliação com as
demais frações da classe dominante (Boschi, M., 2000, pp. 19-20). 
Como discutiremos ao analisar a trajetória da Confederação Nacional da Indústria,
a própria experiência histórica demonstra os limites de abordagens essencialistas para a
análise do associativismo. Reconhecer esses limites não implica ignorar as diversas
contribuições presentes nesses trabalhos, mas assumir que a ênfase em características
inerentes a um determinado sujeito histórico não guarda consigo seu potencial de realização,
20
já que não considera as condições históricas de uma determinada conjuntura. Como veremos
no caso da burguesia industrial brasileira, mesmo alguns dos elementos comumente atribuídos
como inerentes a essa fração de classe podem se mostrar imprecisos. Novamente recorremos à
analogia do burguês típico do século XIX: embora a análise empírica permita afirmar que
tanto o burguês europeu do século XIX como o burguês brasileiro do século XX sejam, de
fato, burgueses, as condições históricas que produziram o primeiro não valem para o segundo.
Sob esse ponto de vista, as abordagens essencialistas da ação coletiva tendem a analisar seus
objetos mais pelo que deveriam ser do que pelo que de fato são (Bianchi, 2010, p. 45, grifos
do autor). 
Como alternativa às teorias essencialistas sobre a ação coletiva dos capitalistas5,
Bianchi (2010, p. 37-38) propõe uma abordagem que leve em consideração o papel jogado
pelas relações de forças presentes dentro de uma determinadaformação social. Para isso, seu
ponto de partida são as relações que se desenvolvem entre as diferentes frações da burguesia,
os trabalhadores e o Estado. Cabe ressaltar que essa divisão em três conjuntos de relações –
entre a burguesia, com as classes trabalhadoras e com o Estado – só é possível com fins
analíticos. No processo histórico real, essas relações estão sempre interligadas e se afetam
mutuamente (Bianchi, 2010, pp. 39). A partir dessa consideração inicial, o modelo de
organização da ação coletiva burguesa pode assumir formas diversas, a depender dos conflitos
existentes na sociedade e como expressão de relações de forças. Tais conflitos, por sua vez, se
manifestam em sentido vertical, entre as classes sociais (a exemplo do conflito
capital/trabalho), suas organizações representativas e instituições, inclusive o Estado, e os
conflitos horizontais, que se dão entre as diferentes frações da burguesia (Bianchi, 2010, p.
60). 
A organização da burguesia enquanto classe social dominante, portanto, remonta à
necessidade de coordenar interesses diversos, típicos da atividade concorrencial do
capitalismo. Nesse sentido, o surgimento de organizações para mediar disputas no interior da
burguesia, dentre as quais o problema da concorrência, não elimina os conflitos entre essa
classe social, mas tem impacto no contexto econômico, na regulação do conflito social e na
implantação de determinadas políticas. Seguindo lógica parecida, temos a formação de
5 Bianchi (2010) constrói seu modelo de enfoque relacional a partir da crítica, de um lado, ao individualismo
metodológico de Olson, e de outro, da análise sociológica das classes sociais de Offe e Wiesenthal. Nesse
sentido, o autor faz uma longa explanação a respeito das diferenças entre a teoria de Olson, e de Offe e
Wiesenthal, apresentando as duas teorias em conjunto apenas no que se refere ao viés metodológico
essencialista, presente em ambas. 
21
associações de empregadores, preocupadas com as questões relativas ao mercado da força de
trabalho, que surgem em resposta à ação coletiva dos trabalhadores (Bianchi, 2010, p. 37-38). 
As relações com o Estado, por sua vez, também podem impactar na organização e
ação coletiva da burguesia. A intervenção estatal na economia tende a reduzir o poder
patronal no controle dos mercados, fazendo com que a burguesia se sinta ameaçada.
Frequentemente esse tipo de ação pode estimular uma resposta por parte da burguesia, cuja
atuação coletiva é uma maneira de influenciar a própria ação do Estado. Ao contrário,
dependendo da conjuntura ou do tipo de ação estatal, em vez de provocar uma atitude reativa,
ou até inibir o associativismo burguês, o Estado pode induzir a ação coletiva dos capitalistas
através de arranjos políticos que incentivem a representação das classes sociais na
implementação de políticas públicas (Bianchi, 2010, pp. 39). 
Tendo em vista essa breve introdução, podemos dizer que as formas institucionais
derivadas da ação coletiva da burguesia são resultado da consolidação de relações de força e
conflitos sociais, e não produto da realização da essência dos atores envolvidos (Bianchi,
2010, p. 39-40). Procuraremos abordar com mais cautela esse processo recorrendo à
reconstituição da trajetória da CNI para compreendê-la como forma institucional da
representação de interesses da burguesia industrial brasileira. 
A partir desse enfoque relacional, podemos recolocar a questão da ação política da
burguesia, considerando as disputas existentes em um contexto histórico determinado para
definição de seus interesses de classe e constituição de suas formas institucionais. Parte das
análises sobre a burguesia brasileira se pautaram em definir um interesse prévio para essa
fração de classe, sem considerar como os conflitos reais moldam esses interesses. Como
aponta Bianchi (2010, p. 43), 
Os choques entre as diferentes frações do capital, os conflitos existentes
entre as diferentes frações da burguesia, as classes subalternas e suas formas
institucionais, moldam, dando-lhe forma, o processo de reprodução do
capital, redefinindo constantemente suas necessidades. Não é possível,
portanto, falar de um interesse geral desse capital sem analisar as relações de
forças sociais que cristalizam os conflitos citados e o papel de mediadores na
formulação desses interesses ocupados pelos intelectuais orgânicos6. 
6 Bianchi se refere, recuperando Gramsci, aos empresários que exercem atividades de organização desde a
esfera de seu próprio capital até a organização do capital em geral e do conjunto da sociedade. Dessa forma,
existem diferentes níveis de “empresários-intelectuais”, de acordo com suas funções de organização numa
determinada formação capitalista. Voltaremos a esse tema no capítulo 3. 
22
Transportando essas considerações para o campo da organização de classe que se
dá pelas formas institucionais, a mesma perspectiva é válida, ou seja, as manifestações
institucionais de classes e frações de classe não são a realização da essência desses grupos
sociais, mas uma consolidação das relações de forças moldadas pelo conflito social. Como
veremos no item em que fazemos uma reconstituição da formação da CNI, é possível
identificar o papel desses conflitos na consolidação da entidade: entre os industriais e a
burguesia comercial e agrária, a classe operária que se organizava nos grandes centros
urbanos, e o Estado, especialmente na constituição do modelo corporativista do Estado Novo.
Em resumo, analisar os conflitos que atravessam as frações da burguesia permite, dentro de
nossa proposta de trabalho, entender o surgimento e o desenvolvimento de suas associações
de classe, assim como sua ação política. As disputas que ocorrem dentro do próprio setor
industrial também são relevantes nesse processo, na medida em que provocam contradições
que impactam na própria coesão e direção de sua ação política. 
*******
Feitos esses esclarecimentos metodológicos, passemos à estrutura da dissertação.
O texto está dividido em três capítulos. 
No primeiro, esboçamos um breve histórico sobre o desenvolvimento da
burguesia industrial no Brasil, sua organização política e econômica, e a criação do sistema
corporativo, na década de 1930, que consolidou a CNI como entidade de cúpula para
representação da indústria. Com isso, nosso objetivo é compreender como esse sistema de
representação de interesses foi formado, a partir de uma perspectiva relacional, isto é, de
conflitos entre classes, frações de classes e o Estado. Posteriormente, discutimos como a
bibliografia a respeito da burguesia industrial, em especial a partir da segunda metade do
século XX, procurou caracterizar esse segmento da burguesia brasileira para compreender sua
atuação política, defendendo sua identificação com o conceito de burguesia interna. 
No segundo capítulo, intitulado “Neoliberalismo e neodesenvolvimentismo:
continuidades e rupturas”, tratamos do conceito de neoliberalismo, de sua história, e das
implicações da adoção desse modelo na política brasileira, indicando como ele afetou a
indústria instalada no país. Em sequência, apresentamos as contradições e conflitos contidos
no interior do modelo neoliberal que deram condições ao surgimento de uma frente
neodesenvolvimentista. Na parte final do capítulo analisamos como se deu a construção do
neodesenvolvimentismo na cena política, com ênfase para seu caráter heterogêneo e suas
23
contradições internas, e defendemos o uso desse conceito para melhor explicar as relações de
classe nos governos petistas, apontando suas rupturas e continuidades em relação ao modelo
anterior. 
Por fim, no terceiro capítulo abordamos a crise da frente neodesenvolvimentistae
a ruptura da burguesia industrial com o programa industrialista adotado no primeiro governo
Dilma. Para isso, apresentamos as principais medidas que constituíram a nova matriz
econômica e discutimos sua repercussão entre os industriais e a CNI. Em seguida,
reconstituímos as posições defendidas pela CNI a partir das propostas apresentadas aos
candidatos à presidência da república de 1994 a 2014, e verificamos como elas oscilaram
entre o neoliberalismo e o neodesenvolvimentismo. Apresentadas as premissas do debate,
buscaremos algumas pistas sobre as razões que levaram os industriais a romper com a frente
neodesenvolvimentista, procurando identificar quais foram os conflitos políticos e
econômicos que envolveram a frente neodesenvolvimentista e a burguesia industrial. Como
destacamos anteriormente, utilizaremos uma perspectiva relacional como fio condutor para
compreender a ação política da burguesia, suas frações de classe e organizações políticas.
Nesse sentido, desenvolveremos a argumentação em torno de dois eixos principais: os
conflitos horizontais, entre as diferentes frações da burguesia, e o papel do Estado; e os
conflitos verticais, que envolvem a relação capital/trabalho. 
24
Capítulo 1. Constituição e trajetória da Confederação Nacional da Indústria 
1.1 – A formação da CNI e a consolidação do sistema corporativo
Fundada oficialmente em 1938, sob a legislação que formalizou o sindicalismo
patronal durante o Estado Novo, a Confederação Nacional da Indústria ocupa o papel de
organização superior de representação de interesses da indústria brasileira, congregando as
federações, de abrangência estadual, e os sindicatos, estes de caráter regional e divididos por
setor de atividade. Ao resgatarmos a origem do modelo sindical brasileiro, é comum nos
depararmos com análises que apresentam o sistema corporativo – também chamado de
corporativista – como algo monolítico, imposto de cima para baixo pela ditadura varguista e
aceito sem resistência pela frágil burguesia industrial brasileira. O inegável peso do Estado na
formação do sistema de representação de interesses da indústria, contudo, pode omitir o
percurso histórico marcado pela disputa de projetos e por conflitos inerentes ao processo
político. 
Ainda que esse fosse o desejo de parte da burocracia do Estado Novo, é difícil
conceber que a burguesia industrial brasileira se organizou, como num passe de mágica, a
partir de um modelo determinado pelo governo, ou que a estrutura desenhada em 1938 não
tenha sido alvo de múltiplas pressões e que tenha permanecido inalterada desde então.
Partindo dessa premissa, não temos por objetivo ignorar, tampouco negar, o papel central que
o Estado varguista teve na configuração da institucionalidade brasileira, mas procurar resgatar
os conflitos que ajudaram a moldar a CNI ao longo dos mais de 70 anos que nos separam de
sua data de oficialização. Para isso, faremos uma breve reconstituição histórica das
organizações que buscaram representar a burguesia industrial instalada no Brasil e como
deram origem à CNI, com o objetivo de compreender melhor nosso objeto de pesquisa e
subsidiar a análise que buscamos realizar. 
No intuito de se legitimar como representante, de fato e de direito, da burguesia
industrial brasileira, a história da instituição é apresentada como a própria história da indústria
nacional em quase todos os documentos oficiais da CNI que utilizamos nesta pesquisa. Desde
as tímidas tentativas de criar alguma indústria em território nacional, ainda no século XIX, até
o salto industrial promovido no período do nacional desenvolvimentismo. No livro “Trajetória
25
da Confederação Nacional da Indústria”, escrito por Gabriel Hermes e Osório Nunes a pedido
da própria CNI, os primórdios da Confederação são encontrados na “capacidade
empreendedora dos colonos que ousavam produzir tecidos finos às vésperas do alvará de D.
Maria I proibindo o funcionamento de fábricas no Brasil” (Hermes e Nunes, 1994, p. 11).
Ainda que a história da representação de interesses da burguesia industrial esteja intimamente
relacionada com o processo de industrialização, resumi-la à “história da industrialização”,
como geralmente é apresentada, é insuficiente para os objetivos de nossa pesquisa. Desse
modo, se faz necessário recorrer especificamente à trajetória da organização dessa fração de
classe e como se moldaram suas formas institucionais. 
De maneira um pouco mais concreta, podemos localizar o embrião do
associativismo empresarial brasileiro na Sociedade Auxiliadora da Indústria Nacional (SAIN),
criada em 1827, no Rio de Janeiro, então capital do Império. Na realidade, mais do que
representar uma burguesia incipiente em território nacional, a SAIN tinha, em seus
primórdios, caráter acadêmico-consultivo. Vinculada à Secretaria de Negócios do Império, e
em sintonia com a “vocação agrícola” do país, a SAIN, em suas primeiras décadas, se dedicou
à questão agrícola, e em como a mecanização da agricultura poderia impulsionar a produção
nacional (Bueno, 2008, p. 53). Esse trabalho era feito através da promoção de estudos e
debates, e se manifestava principalmente na publicação “O Auxiliador da Indústria Nacional”,
produzida por quase seis décadas (Leopoldi, 2000, pp. 62-63). 
Já por volta de 1870, período de auge da SAIN, a organização havia incorporado
demandas relativas à questão fabril, abrindo espaço, antes restrito aos interesses da agricultura
e do comércio, a posições industrialistas. Nesse período, “O Auxiliador” foi palco de debates
entre protecionistas e livre-cambistas, e a SAIN também passou a discutir a substituição da
mão de obra escrava. A preocupação com a formação da mão de obra livre impulsionou a
criação da “Escola Nocturna Gratuita de Instrucção Primaria para Adultos”, comandada pela
SAIN, no que podemos identificar como uma questão cara à indústria, e que posteriormente
levaria à criação do SESI e SENAI (Bueno, 2008, p. 55; Hermes e Nunes, 1994, pp. 15). 
Em razão de disputas internas e com o fim da monarquia, da qual dependia em
grande medida, a SAIN entrou em decadência e praticamente encerrou suas atividades durante
os anos 1890. Ainda assim, conseguiu sobreviver à virada do século e, em 1904, fundiu-se
com o Centro de Tecelagem e Fiação de Algodão, formando o Centro Industrial do Brasil
(CIB), dando início a um novo capítulo da história da indústria. Apesar da decadência da
26
SAIN, o final do século XIX e início do século XX são importantes para a indústria local. A
adoção de políticas de incentivo pelo ministério da Fazenda, associada a uma reforma
bancária que facilitou o acesso ao crédito, impulsionaram o capital industrial nesse período.
Em sequência, a Primeira Guerra Mundial traz à ordem do dia a necessidade de suprir o
mercado interno, e fortalece, pela primeira vez de maneira significativa, o movimento em prol
da substituição de importações (SÁ, 2008, pp. 46-47). O resultado desse processo é visível
quando observamos os números de estabelecimentos industriais no Brasil: em 1889 eram 600
empresas dedicadas a atividades industriais no país; enquanto em 1920 esse número havia
subido para 14.000 estabelecimentos (Baer, 1965, p. 13 apud Queiroz e Evans, 1977, p. 9), e a
indústria contribuía com 21% do produto físico do país (Leopoldi, 2000, p. 69).
Esse período não representou apenas um salto econômico para a indústria que
nascia no Brasil, mas também teve importância para a organização política da burguesia
industrial, o que implica participar concretamente dos conflitos que buscamos resgatar neste
capítulo. Entre 1898 e 1906 foram registrados 36 movimentos de operários no Rio de Janeiro,
sendo 17 deles grevistas. Em 1903, uma greve de maiores proporções, envolvendo
trabalhadoresdo setor têxtil, sapateiros, gráficos, pintores, chapeleiros e estivadores, passa a
reivindicar a redução da jornada de trabalho para 8 horas e aumento salarial. Os trabalhadores
acabaram derrotados, vítimas de forte repressão policial e de demissões. Contudo, apesar da
derrota, a classe trabalhadora demonstrava ali sua crescente organização. Essa movimentação,
por sua vez, teve reflexos entre o patronato, o que possivelmente contribuiu para a formação
do CIB no ano seguinte (Leopoldi, 2000, p.64). 
Alguns anos depois, em 1917, tem início a primeira greve geral operária do Brasil,
atingindo em cheio o centro industrial do país, que naquele momento já se deslocava do Rio
de Janeiro para São Paulo. Para mediar o conflito, foi apresentado na Câmara dos Deputados
o projeto para instituir o “Código do Trabalho” que, entre outras coisas, fixava a jornada em 8
horas diárias e proibia o trabalho de menores de 14 anos. A oposição ao projeto foi liderada
pelo CIB, que o considerou absurdo, conseguindo que não fosse aprovado (Bueno, 2008, p.
144; Leopoldi, 2000, p. 70). Ainda nesse contexto, duas novas organizações patronais
surgiram em 1919: o Centro da Indústria de Fiação e Tecelagem de Algodão do Rio de
Janeiro (CIFTA-RJ), que rompe com o CIB, e o Centro da Indústria de Fiação e Tecelagem de
São Paulo (CIFT-SP), comandado pelo importante industrial Francisco Matarazzo (Leopoldi,
2000, p. 70). 
27
Durante seus primeiros anos de vida, o CIB atuou simultaneamente na defesa de
empresas individuais, como representante da indústria do Rio de Janeiro e também como
porta-voz da indústria brasileira. Em aspectos gerais, procurou ampliar seu acesso ao
congresso através do lobby e defender medidas de proteção à indústria. Dessa forma,
contribuiu com a construção de um discurso industrialista e conquistou gradualmente espaço
no governo republicano (Leopoldi, 2000, p. 64-68). Em 1912, o militar Serzedelo Correia
deixa a presidência da entidade, dando lugar a Jorge Street, neto de um imigrante britânico e
dono de grandes empresas têxteis no Rio de Janeiro e em São Paulo (Leopoldi, 2000, p. 68).
Esse momento é representativo para a história do CIB e para a própria história da
representação industrial, uma vez que, embora fosse defensor da indústria nacional, Correia
não era um representante orgânico do setor industrial. Pela primeira vez os industriais
passavam a administrar diretamente sua principal entidade de classe. 
Em paralelo à atuação do CIB, a partir da década de 1910 começam a surgir as
primeiras associações setoriais da indústria com caráter permanente. A maioria das
organizações que havia surgido até então se limitava a interceder em questões pontuais, sendo
desmanchadas logo em seguida. Os setores contemplados foram os de maior importância na
economia doméstica até aquele momento: têxtil e calçados. Um detalhe importante é que,
como algumas atividades industriais ainda estavam profundamente ligadas ao comércio
naquele momento, algumas das entidades que surgiam levavam o nome de Centros de
Indústria e Comércio (Leopoldi, 2000, 69). 
Esse aspecto é importante para posicionar historicamente o desenvolvimento da
burguesia industrial, já que os anos 1920 marcam justamente os primeiros conflitos de maior
intensidade com o setor comercial, que levam ao surgimento de organizações exclusivas. No
início do século XX, sua configuração institucional ainda demonstra o caráter de dependência
e subordinação do setor industrial em relação ao setor comercial. Nesse sentido, a Associação
Comercial de São Paulo (ACSP), órgão fundado em 1894, congregou os interesses do
comércio e da indústria paulistas durante os primeiros anos da República. Isso se deveu
principalmente em função do papel decisivo ocupado pelos cafeicultores na formação da
indústria em São Paulo. Embora as associações rurais tenham se organizado à parte de
comércio e indústria, a interdependência econômica desses outros setores se refletiu na ACSP.
Como já mencionamos, com o grau de desenvolvimento e organização atingidos
pela indústria, a década de 1920 marcou o início dos primeiros conflitos com o setor
28
importador, principalmente em razão da questão tarifária. Não apenas pela disputa política em
torno de questões como esta, mas diante da própria crise do regime oligárquico que se
desenhava no horizonte, em 1928 a elite da burguesia paulista cria o Centro das Indústrias do
Estado de São Paulo (CIESP), presidido por Francisco Matarazzo, e tendo como membros
importantes nomes da indústria como Jorge Street, Roberto Simonsen, Horácio Lafer, José
Ermírio de Moraes, entre outros. (Leopoldi, 2000, pp. 71-72).
Os anos 1920 foram, portanto, de formação das primeiras entidades
representativas da burguesia industrial brasileira, que se manifestava ainda em caráter
regional nos principais polos industriais do país: Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais e
Rio Grande do Sul. A forma institucional desse movimento se deu a partir da criação de
entidades privadas, basicamente associações que se reuniam em um centro industrial regional.
Fora os já citados casos do Rio de Janeiro, com o CIB – que também se pretendia uma
entidade nacional –, e São Paulo, com o CIESP, foram criados o Centro Industrial de Juiz de
Fora (CIJF), em 1926, em Minas Gerais, e o Centro da Indústria Fabril do Rio Grande do Sul
(CINFA), em 1930 (Leopoldi, 2000, pp. 74-75). 
Quando chegou ao poder com a Revolução de 1930, Vargas se deparou com o
cenário que acabamos de descrever brevemente. Cabe, agora, tentar explicar quais foram os
conflitos que transformaram este modelo “corporativista privado” (Leopoldi, 2000, p. 75),
pré-Vargas, no modelo corporativista efetivamente consolidado durante o Estado Novo. Antes
de tecermos nossas considerações, retomamos um comentário feito no início do texto para
anunciar a premissa da qual partimos: a construção do modelo corporativista de representação
de interesses da indústria não foi uma imposição do governo Vargas à burguesia industrial,
tampouco seu inverso é verdadeiro. Esse sistema, e consequentemente a Confederação
Nacional da Indústria, são produtos de diversos choques entre forças sociais, em especial da
disputa entre, de um lado, a burguesia industrial e seu modelo próprio de representação criado
ao longo das primeiras décadas do século XX e, de outro, o governo Vargas e o modelo de
sindicalização almejado pela burocracia estatal, que procurava manter as entidades sob maior
controle do aparelho de Estado. 
Partindo dessa premissa, os anos 30, com a ascensão de Getúlio Vargas ao poder,
são de formulação do sistema corporativo que seria adotado, definitivamente, em 1938. Ainda
em 1931, através do decreto 19.770, o governo provisório estabeleceu as normas para a
sindicalização das classes patronais e trabalhadoras, mesmo sob protestos dos industriais. O
29
decreto previa que as organizações de classe seriam divididas em sindicatos, de âmbito
regional e setorial, federações, em âmbito estadual, e uma confederação, de abrangência
nacional. O registro e controle dessas entidades estariam a cargo do Ministério do Trabalho,
Indústria e Comércio, criado no ano anterior. Em troca, as lideranças industriais aumentariam
seu espaço no Estado e suas organizações receberiam o status de órgãos técnicos e consultivos
(Leopoldi, 2000, p. 76). 
As principais reclamações da burguesia industrial davam conta de que a legislação
proposta por Vargas não se adaptava às organizações já existentes, e que a regulamentação do
sindicalismo patronal não deveria atender os mesmos critérios adotados para a sindicalização
de trabalhadores. Apesar disso, os industriais optaram pela oficialização de suas associações
buscando, principalmente, ter maioracesso ao Estado. A primeira delas é o CIESP, que a
partir de 1931 se transforma em Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP).
Em seguida foi a vez do CIB que, a despeito de suas aspirações nacionais, em seus quase 30
anos de história permanecia fortemente vinculado à indústria do Rio de Janeiro. O antigo
Centro Industrial do Brasil dá lugar à Federação das Indústrias do Rio de Janeiro, então
denominada pela sigla FIRJ. A Federação fluminense se torna importante nesse contexto, pois
é durante a gestão da entidade por Francisco de Oliveira Passos que ganha espaço Euvaldo
Lodi, jovem industrial com raízes no setor siderúrgico de Minas Gerais, e que se tornaria o
primeiro presidente da CNI após sua oficialização em 1938 (Leopoldi, pp. 77-78). 
A representação nacional dos industriais, por sua vez, passou a estar a cargo de
uma entidade que também atendia pela sigla CIB, fundada em 1933, mas dessa vez –
seguindo os critérios estabelecidos pela legislação sindical – era denominada Confederação
Industrial do Brasil. Na realidade, antes de ser uma confederação, de fato, com abrangência
nacional, a CIB estava vinculada às entidades estaduais existentes no país até então. Além da
FIESP e da FIRJ, o Centro Industrial de Juiz de Fora (CIJF) e o Centro das Indústrias do Rio
Grande do Sul (CIFRS). Ao contrário do que ocorreria na maior parte da existência da CNI, a
CIB foi comandada por grandes nomes ligados à burguesia industrial em seus respectivos
estados. Entre 1933 e 1938, estiveram no comando da entidade, nesta ordem: Francisco de
Oliveira Passos (RJ); Luís T. A. Pereira (SP); Euvaldo Lodi (MG/RJ); Gastão de Brito (RS); e
Roberto Simonsen (SP), em 1937 (Leopoldi, 2000, p. 80). 
Através de uma forte união entre os industriais dos estados representados, a CIB
conseguiu pressionar o governo em direção a algumas de suas demandas, sendo a principal
30
delas a diferenciação dos critérios de reconhecimento dos sindicatos de trabalhadores e
patronais. Além disso, a articulação promovida pela CIB foi fundamental para fortalecer a
representação classista na Assembleia Constituinte de 1933. Entre outras medidas
influenciadas pela CIB, a legislação sindical de 1934 permitiu a criação de associações
regionais de caráter privado, em paralelo às federações oficiais. Isso permitiu à representação
da indústria brasileira a manutenção de uma entidade privada em conjunto com as Federações
estaduais (Leopoldi, 2010, p. 80-81). 
A CIB manteve um caráter semioficial até 1938, quando se transformou em
Confederação Nacional da Indústria, se adequando à legislação do Estado Novo. Contudo,
não acabariam aí os conflitos entre a representação patronal e a burocracia de Estado:
Na prática, contudo, o corporativismo da Constituição de 1937 assumiu
características bem diversas das do projeto original. Foi o poder de veto dos
setores organizados da indústria e do comércio que inviabilizou o sonho
corporativo estadonovista. A FIESP e a CNI comandaram a luta contra a
“corporativização” dos industriais nos moldes desejados pelo governo. Nessa
ocasião os industriais mostraram que se, por um lado, vinham usufruindo das
vantagens oferecidas pela estrutura corporativista anterior (…), por outro,
impunham limites à ação do Estado sobre as entidades representativas do
setor (Leopoldi, 2000, pp. 81-82). 
Nos dois anos seguintes, CNI e FIESP, presididas respectivamente por Euvaldo
Lodi e Roberto Simonsen – este acumulando o posto de vice-presidente da CNI, disputaram
com o governo os moldes da estrutura sindical que nascia. Entre os pontos de divergência, os
industriais se opunham ao sistema de “organização vertical” proposto pelo governo, que
almejava a criação de federações regionais setoriais, no lugar das “federações ecléticas” então
existentes. Entre os demais pontos que foram alvo de disputa com a burocracia do Estado
Novo estavam as exigências sobre a taxa de filiação para reconhecimento de sindicatos; a
possibilidade de manter as associações de caráter privado; a limitação para reeleição de
membros da diretoria das entidades; e a classificação utilizada pelo Ministério do Trabalho
para a definição de setores da indústria, considerada inadequada pelas entidades oficiais
(Leopoldi, 2000, pp. 82-84). Em alguns casos, como na luta pela manutenção de entidades
privadas, a burguesia industrial se uniu à comercial, que também tinha interesse semelhante.
Dessa forma, retomando a discussão sobre a perspectiva relacional na análise da ação
coletiva, as disputas em torno da estrutura sindical no governo Vargas são representativas de
31
como conflitos e afinidades entre os diferentes setores sociais são construídas na disputa
política real, e não derivam apenas da essência de cada um desses atores. 
De maneira geral, os princípios que delinearam as propostas dos industriais eram
de que o controle que caberia ao governo sobre a representação patronal deveria ser restrito –
o espaço almejado dentro do governo exigia algum sacrifício – e que as associações de
empregadores não deveriam ter o mesmo tratamento das organizações de trabalhadores. O
debate em torno da diferenciação entre a organização sindical de trabalhadores e empresários,
especificamente, se prolongaria pelos anos seguintes. Frequentemente surgia, da parte de
líderes industriais, a justificativa de que as organizações dos trabalhadores defendiam
interesses profissionais, enquanto as entidades patronais eram responsáveis pela defesa de
interesses econômicos diretamente relacionados com os interesses nacionais (Leopoldi, 2000,
p. 84). Na realidade, a burguesia industrial, então liderada por Lodi e Simonsen, não estava
apenas disputando a construção de um modelo de representação de interesses, mas dava sinais
de também estar formulando seu projeto político. 
O resultado prático da ofensiva dos industriais, principalmente através da CNI e
da FIESP, foi que 
o corporativismo desejado pelos burocratas do Estado Novo (dentre eles
Oliveira Vianna) teve de se adaptar aos limites colocados pelos industriais:
em 1940 uma série de decretos “corrigiu” a legislação sindical, atendendo a
uma série de reivindicações das associações privadas e oficiais da indústria e
do comércio (Leopoldi, 2000, p. 85).
Em resumo, o processo de consolidação das associações de classe, e mais
especificamente em relação ao sistema corporativo implantado no primeiro governo Vargas,
esteve mais próximo de um embate de forças, que envolveu a ação consciente da burguesia
industrial, do que uma mera imposição do governo. Isso não significa, é claro, que o governo
tenha saído derrotado desse processo, ou que tenha encontrado nos industriais uma força de
oposição. Pelo contrário, durante os anos seguintes houve uma intensa colaboração entre a
CNI e Getúlio Vargas. No entanto, a percepção de que esse processo foi moldado por
conflitos permite compreender com mais clareza a ação da burguesia industrial. 
32
1.2 – Crise de representação e surgimento do sistema extracorporativo
O período 1943-1945 marcou o auge da aliança entre a burguesia industrial e o
governo Vargas. Encerrado o debate sobre a oficialização dos sindicatos patronais, as
lideranças da indústria passaram a ter papel central nas ações econômicas do governo. Além
do importante desenvolvimento industrial do período, foi nesse momento em que, a pedido de
Vargas, o setor ficou responsável pelos recém-criados Serviço de Aprendizagem Industrial
(SENAI) e Serviço Social da Indústria (SESI) (Leopoldi, 2000, 86-87). Esses dois órgãos,
integrantes do chamado de Sistema S, se constituíram como os principais veículos para
divulgação do pensamento industrial no setor educacional (Rodrigues, 1997, p. 28). Os
recursos para manutenção de SESIe SENAI são provenientes do imposto sindical pago pelas
empresas, que é repassado às Federações e à CNI. Abordaremos essa questão mais à frente. 
Os anos seguintes, contudo, não permitiram a continuidade do que ocorrera entre
1943-1945. Vargas, de quem Lodi era grande interlocutor, deixa a presidência em 1945.
Embora as lideranças da indústria mantivessem boa relação com o novo governo, houve o
enfraquecimento das lideranças “getulistas” no interior do sistema corporativo. Em 1948, com
a morte de Simonsen, Lodi se torna a única grande liderança da “velha guarda” da indústria,
que já passava por uma renovação geracional com a formação de novos quadros, muitos dos
quais provenientes de empresas estrangeiras, ocupando postos na FIESP e na FIRJ.
Simultaneamente, o mineiro passa a sofrer críticas crescentes dentro da FIRJ, entidade que
presidia simultaneamente à CNI. As acusações davam conta de que o industrial mineiro
centralizara excessivamente sua ação na Confederação e, consequentemente, seria responsável
pelo esvaziamento da entidade estadual (Leopoldi, 2000, pp.87-88). Ou seja, o sistema que
havia atingido seu auge nos anos 1940 começa a dar sinais de crise na década seguinte, e o
conflito que se manifestava como geracional, também possuía raízes em conflitos entre
diferentes setores da burguesia industrial. 
Já na esteira da crise do segundo governo Vargas, as críticas que Lodi vinha
sofrendo se intensificaram a ponto de gerarem grandes pressões acerca de sua continuidade no
comando da CNI. Os ataques ao industrial não se resumiram a seu papel enquanto líder
empresarial, mas também por sua posição de parlamentar aliado do então presidente. Em meio
a um crescente cerco ao varguismo, dois episódios marcaram a perseguição a Lodi, sendo
decisivos para seu futuro e, consequentemente, da CNI: o industrial teve que responder a uma
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CPI no Congresso sobre a concessão de empréstimos ao jornal “Última Hora”, que apoiava o
presidente; além de ter sido acusado de fornecer recursos para a guarda pessoal de Vargas,
que havia se envolvido no atentado da Rua Tonelero contra o líder oposicionista Carlos
Lacerda (Leopoldi, 2000, pp. 241; 281-282). A campanha contra Lodi, como é possível
imaginar, não estava ligada apenas a denúncias de condutas ilegais, mas era indissociável da
dinâmica política mais ampla que levou ao fim do governo Vargas. No interior do sistema
corporativo, o declínio dos antigos líderes da indústria facilitou a ascensão de quadros liberais
ou ligados a empresas estrangeiras. O próprio ataque às lideranças getulistas, levado a cabo,
tanto dentro das organizações patronais como na cena política, esteve ligado a disputas por
interesses políticos e econômicos. Como exemplo podemos citar as movimentações visando
facilitar a importação de veículos, em clara oposição ao projeto de Vargas de instalar uma
indústria automobilística no país, e também criando dificuldades para o setor de autopeças
(Leopoldi, 2000, p. 241). 
Com o suicídio de Vargas, Lodi se afasta da cena política, deixando também o
comando da CNI e da FIRJ, que passam, respectivamente, para Augusto Viana Ribeiro dos
Santos e Zulfo Mallmann. O afastamento de Lodi poucos anos depois da morte de Roberto
Simonsen, e intimamente relacionado com a crise do governo Vargas, marca uma nova fase
da história da representação de interesses da indústria brasileira, com o declínio das primeiras
lideranças do sistema corporativo e a convivência com a entrada cada vez maior de capital
estrangeiro no país. 
Já em um novo contexto, a política econômica e industrial dos anos 1950 colocou
dois desafios para a CNI e o conjunto da burguesia industrial. Em primeiro lugar, a política de
desenvolvimento industrial adotada, que incluiu a criação da Petrobras e, posteriormente, o
incremento da indústria automobilística, passa a privilegiar interesses setoriais em detrimento
da “indústria em geral”, representada junto ao governo pela CNI. Não por acaso, nesse
período surgem algumas das mais importantes associações privadas da indústria, se
aproveitando, inclusive, do decreto de 1940, então apoiado pela CNI, que permitiu a criação
das associações privadas em concorrência com as entidades do sistema corporativo.
Associações como ABDIB (Associação Brasileira da Indústria de Base, 1955), Anfavea
(Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores, 1956), e Associação da
Indústria de Autopeças (1951) – que daria origem ao Sindipeças dois anos mais tarde –
surgem nesse contexto, em um processo que continua na década seguinte. A fragmentação em
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interesses setoriais acaba por enfraquecer o “projeto nacional” simbolizado por Simonsen e
Lodi, o que, no longo prazo, enfraquece também a CNI. 
Ao mesmo tempo, e guardando relação com o crescimento das associações
privadas, esse período é marcado pela maior abertura da economia brasileira ao capital
estrangeiro, principalmente durante o governo de Juscelino Kubitschek (1956-1961). Ou seja,
o quadro geral com o qual a CNI e o conjunto da burguesia industrial se depararam a partir de
meados da década de 50 foi de fragmentação na representação de interesses imposta pelo
desenvolvimento do parque industrial nacional e o aumento da entrada de capital estrangeiro
no mercado brasileiro. 
O posicionamento da CNI e da burguesia industrial em geral a respeito dessa
questão é controverso. A perspectiva desenvolvimentista do segundo governo Vargas e,
principalmente, do governo JK, promoveu o aumento da entrada de capital estrangeiro no
Brasil, concentrado nos setores de ponta da indústria. A posição das lideranças da indústria
frente a essa questão foi dúbia. Ao mesmo tempo em que não se colocam contra a entrada de
capital estrangeiro no país, e até são favoráveis em alguns casos, pedem proteção do Estado
para os setores em que o capital nacional já está estabelecido. Abordaremos com mais cuidado
a relação da CNI com o capital estrangeiro no item em que discutimos a natureza dessa fração
de classe no capitalismo brasileiro. Podemos adiantar, contudo, que esse comportamento em
relação ao capital estrangeiro será constante na trajetória da CNI. Ao longo de sua história, a
entidade não se colocou frontalmente contra a entrada do capital estrangeiro no Brasil, pelo
contrário, como mencionamos, em muitos casos se mostrou favorável à entrada de capital que
pudesse contribuir com a expansão do parque industrial brasileiro, independentemente de sua
origem. 
Durante os dois anos em que esteve sob a presidência de Augusto Viana, em um
período de turbulência, a CNI não conseguiu superar a crise que se instalara ainda sob o
comando de Lodi. O Departamento Econômico da Confederação, liderado por Ernesto Street,
José Octavio Knaack de Souza e João Paulo de Almeida Magalhães, se colocava como “órgão
de defesa da ideologia sustentada pelos líderes da indústria” (Leopoldi, 2000, p. 240). A
“ideologia da indústria”, reivindicada pelo Departamento Econômico, se constituía
principalmente em oposição à política de Eugênio Gudin, então Ministro da Fazenda do
governo Café Filho. Além de Gudin, os alvos preferenciais do Departamento Econômico
eram instituições como a Fundação Getúlio Vargas e o Conselho Nacional de Economia,
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cujas posições eram apontadas como “antiindustriais”. Os anos de 1954 e 1955 foram
marcados, portanto, pela disputa entre a posição da burocracia da CNI, ainda herdeira da
tradição de Lodi e Simonsen, e as posições liberais adotadas pelo Ministério da Fazenda,
sintetizadas pelo programa de estabilização monetária de Gudin, que vinculava o processo
inflacionário ao desenvolvimento industrial. O debate se tornou público, e a posição adotada
pela CNI e pela FIESP era de que a política de estabilização

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