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Resumo excludentes de ilicitudes

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Excludentes de Ilicitudes
Eloisa P. A Valerio
● Ilicitude é a contrariedade do fato típico praticado pelo agente em relação ao ordenamento jurídico, ou seja, além de típico, a conduta desenvolvida pelo agente também é contrária ao ordenamento jurídico.
● Em que pese o fato praticado pelo agente seja típico, pode, em determinadas circunstâncias, incidir causas que excluem a ilicitude desse fato. Em outras palavras, o fato será típico, mas não será ilícito.
● As causas legais de exclusão de ilicitude estão previstas no artigo 23 do Código Penal.
1. Estado de Necessidade
→ Estado de necessidade é a causa de exclusão da ilicitude da conduta de quem, não tendo o dever legal de enfrentar o perigo atual, a qual não provocou por sua vontade, sacrifica um bem jurídico ameaçado por esse perigo para salvar outro, próprio ou alheio, cuja perda não era razoável exigir.
→ O artigo 24, “caput”, e seu § 1º, do Código Penal, prevê os requisitos para a incidência do estado de necessidade. Tais requisitos são cumulativos, devendo todos estarem presentes para configurar a causa excludente de ilicitude.
→ Os requisitos para configurar o estado de necessidade são:
a) Perigo atual: A situação de perigo caracteriza o estado de necessidade. O agente pratica um fato típico, para se salvar de uma situação de perigo. Trata-se de hipótese de o agente estar diante de um fato que exponha seu bem jurídico a uma probabilidade de dano. 
Exemplo: essa situação de perigo pode decorrer de ação humana (lesionar uma pessoa durante fuga para se salvar de um incêndio provocado por alguém); por um fato da natureza (subtrair um barco para se salvar de uma inundação); por comportamento de um animal (danificar um patrimônio para se salvar de ataque de um cão bravio).
b) Ameaça de direito próprio ou alheio: A expressão “direito”, contida no artigo 24 do Código Penal, deve ser interpretada de forma abrangente, atingindo qualquer bem jurídico, próprio ou de terceiro exposto a perigo, tais como a vida, a integridade física, a honra, a liberdade e o patrimônio. Em relação ao terceiro, não se exige qualquer relação jurídica entre o agente que age em estado de necessidade e o terceiro, sendo, pois, dispensável qualquer relação de parentesco, amizade ou subordinação entre o agente e o terceiro necessitado. Assim, perfeitamente possível arguir estado de necessidade para defesa de bem jurídico de pessoa desconhecida.
c) Situação de perigo não causada voluntariamente pelo sujeito: o Código Penal é expresso no sentido de não viabilizar a possibilidade de se invocar estado de necessidade quem provocou a situação de perigo voluntariamente. De fato, parece sintomática e lógica a previsão do legislador, já que o ordenamento jurídico não pode referendar sacrifício de um direito, beneficiando com uma causa de exclusão de ilicitude agente que provocou, de forma voluntária, uma situação de perigo. 
Exemplo: Tício mora no 3º andar de prédio de sua propriedade. Com ele reside colega de escritório. Com a intenção de receber seguro, Tício ateia fogo no edifício. O incêndio, porém, assume rapidamente proporções inesperadas e bloqueia praticamente todas as saídas. Tício, neste momento, percebendo que o colega usa uma corda para descer pela janela mata o companheiro para pegar a corda e salvar-se. O homicídio do companheiro de escritório não encontra no estado de necessidade causa de justificação, uma vez que Tício criara o perigo que ensejou a situação aflitiva.
d) Ausência do dever legal de enfrentar o perigo: Nos termos do artigo 24, § 1º, do Código Penal, “Não pode alegar estado de necessidade quem tinha o dever legal de enfrentar o perigo”. Assim, por força desse dispositivo, quando a lei impuser ao agente o dever de enfrentar o perigo, deve ele buscar salvar o bem ameaçado sem sacrificar outro qualquer, ainda que tenha de correr os riscos inerentes à sua função. 
e) Inevitabilidade do comportamento lesivo: ao tratar do estado de necessidade, o Código Penal, no seu artigo 24, exige, como pressuposto, a inexistência de um outro meio de evitar o perigo, isto é, quando o dano produzido pelo agente for inevitável. Assim, o agente estará autorizado a praticar um fato típico quando for absolutamente imprescindível para evitar a lesão ao bem jurídico. Se possível afastar o perigo por qualquer outro meio, deve o agente se abster de sacrificar bem jurídico alheio. Isso porque o estado de necessidade apresenta um caráter de subsidiariedade, ou seja, entre sacrificar o bem jurídico e se afastar da situação de risco, deverá por essa solução optar o agente. Se o perigo pode ser afastado por uma conduta menos lesiva, a prática do comportamento mais lesivo não configura a excludente.
Exemplo: se para se salvar do ataque de um cão bravio, pode o agente empreender fuga, não poderá matar o animal e depois alegar estado de necessidade, porquanto havia outra forma de impedir a lesão ao seu bem jurídico.
f) Inexigibilidade de sacrifício do interesse ameaçado: a ponderação de bens está insculpida no final do art. 24 do Código Penal, ao admitir o estado de necessidade, para proteger direito próprio ou alheio “cujo sacrifício, nas circunstâncias, não era razoável exigir-se”. A admissibilidade do estado de necessidade é orientado pelo princípio da razoabilidade ou proporcionalidade. Isso significa que se deve observar a proporcionalidade entre o bem sacrificado e o bem protegido, não sendo razoável admitir o sacrifício de uma vida para preservar um patrimônio. Em síntese, somente se admite a invocação da excludente do estado de necessidade, quando para salvar bem de maior ou igual valor ao do sacrificado. Há ponderação de bens. 
2. Legítima Defesa
→ Nos termos do art. 25 do CP, “Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem”.
→ É uma causa de exclusão da ilicitude que consiste em repelir injusta agressão, atual ou iminente, a direito próprio ou alheio, usando moderadamente dos meios necessários.
→ A Lei 13.964/2019 introduziu o parágrafo único ao artigo 25 do Código Penal, segundo o qual Parágrafo único. Observados os requisitos previstos no caput deste artigo, considera-se também em legítima defesa o agente de segurança pública que repele agressão ou risco de agressão a vítima mantida refém durante a prática de crimes.”
→ Em que pese já se enquadrar no “caput” do artigo 25 do Código Penal, o legislador optou por especificar a conduta do agente de segurança que se depara com agressão ou risco de agressão a vítima mantida refém durante a prática de crimes.
Exemplo: agente de segurança efetuar disparos contra o sujeito que, durante a prática de roubo a banco, mantém vítima refém. 
→ A legítima defesa, nos termos em que é proposta pelo nosso Código Penal, exige a presença simultânea dos seguintes requisitos:
a) Agressão injusta, atual ou iminente: Exige-se, para caracterizar a legítima defesa, a existência de uma agressão injusta. Injusta será a agressão que não estiver protegida por uma norma jurídica, isto é, não for autorizada pelo ordenamento jurídico. Além de injusta, a agressão deve ser atual ou iminente. 
→ Atual é a agressão que está acontecendo, ou seja, o efetivo ataque já em curso no momento da reação defensiva.
→ Iminente é a que está prestes a ocorrer. Nesse caso, a agressão ainda não teve início, mas poderá ocorrer em momento imediato.
Exemplo: agressor que anuncia o ataque, e parte, munido de uma faca, em direção à vítima para matá-la, que reage desferindo um disparo de arma de fogo contra o agressor, fazendo cessar a agressão.
→ A agressão que se anuncia para o futuro e a agressão passada não autoriza a legítima defesa. De fato, não se admite legítima defesa contra suposta agressão que nem sequer poderá ocorrer, nem tampouco em relação à agressão pretérita, pois caracterizaria vingança.
b) Reação com os meios necessários: meios necessários são aqueles à disposição do agredido eficazes e suficientes para repelir a agressão injusta, devendo ser a menos
lesiva possível ao agressor. O ofendido deve eleger, dentre os que se encontram ao seu alcance, o meio capaz de fazer cessar a agressão.
Exemplo: se o agressor franzino atacar o ofendido de próprio punho, a princípio, um pedaço de madeira ou uma barra de ferro seria suficiente para fazer cessar a agressão. Se o ofendido, nesse caso, eleger uma arma de fogo para repelir a injusta agressão, estará incorrendo em excesso, pois usou mais lesivo para cessar o ataque. 
c) Uso moderado dos meios necessários: após eleger o meio necessário, o agredido deverá fazer uso moderado desses meios, suficiente para fazer cessar a agressão injusta. É o emprego dos meios necessários dentro do limite do razoável para conter a agressão. A proporção entre o ataque e a defesa empreendida deve ser verificada no caso concreto, considerando-se a natureza e a gravidade da agressão, e a extensão da reação. 
Exemplo: se a vítima está sendo atacada pelo agente munido de uma faca, poderá se utilizar de uma arma de fogo para repelir a injusta agressão (eis o meio necessário), mas deverá agir com moderação. Nesse caso, se um disparo foi um suficiente para fazer cessar a agressão, o ofendido não poderá efetuar o segundo disparo, sob pena de incorrer em excesso e responder pelo resultado produzido pela desproporção da defesa em relação ao ataque.
d) Excesso: Há excesso quando o agente extrapola os limites da legítima defesa, intensificando a reação, dolosa ou culposamente, elegendo meio além do necessário ou fazendo uso imoderado dos meios necessários para repelir a injusta agressão. Nesse caso, embora num primeiro momento o agente estivesse sob o amparo da legítima defesa, presente o excesso, os requisitos da excludente de ilicitude deixará de existir, devendo o agente responder pelas desnecessárias lesões causadas ao bem jurídico ofendido. O excesso pode ser doloso ou culposo.
→ Há excesso doloso quando o sujeito, de forma consciente, extrapola o necessário para repelir a agressão, valendo-se de meios mais lesivos ou usando de forma imoderada os meios que elegeu para reagir à injusta agressão. 
→Constatado o excesso doloso, o agente responde pelo resultado dolosamente. No caso, o agente, que num primeiro momento estava em legítima defesa, responderá pelo crime de homicídio doloso.
Exemplo: quando o agente, para se defender de um tapa, efetua disparos de arma de fogo contra o agressor. Ou, ainda, quando, após fazer cessar a agressão, o agente segue em diante na reação até matar o então agressor. 
→ No excesso culposo não há intenção em extrapolar os limites da repulsa à agressão injusta, supondo o agente ainda estar sofrendo a agressão, que, na verdade, havia cessado. Nesse caso, o agente responderá pelo resultado produzido a título de culpa.
3. Estrito cumprimento do dever legal
→ O Código Penal não dispôs sobre o conceito e requisitos do estrito cumprimento do dever legal, relegando à doutrina e jurisprudência estabelecer as características dessa causa excludente de ilicitude. 
→ Estará ao abrigo do estrito cumprimento do dever legal, o agente que praticar um fato típico em face do cumprimento de um dever observando rigorosamente os limites impostos pela lei, de natureza penal ou não.
Exemplo: policial que prende o agente em flagrante ou mediante cumprimento de mandado de prisão, embora atinja o seu direito de liberdade, não comete o crime previsto no art. 148 do Código Penal, porque cumpre o dever que lhe é imposto por lei.
→ Da mesma maneira, inexiste violação de domicílio criminosa (CP, art. 150) se policial invade residência alheia para realizar prisão em flagrante pela prática de crime que está sendo praticado no local.
→ A excludente é destinada precipuamente aos agentes que exercem atividade pública, tal como funcionário público ou agente público que age por ordem da lei. Também alcança o particular que exerce função pública, ainda que temporariamente, como, por exemplo, o jurado, mesário da Justiça Eleitoral.
4. Exercício regular do Direito
→ Assim como o estrito cumprimento do dever legal, não há no Código Penal dispositivo estabelecendo o conceito e as características do exercício regular do direito, limitando-se o legislador a indicar que se trata de excludente de ilicitude, nos termos do artigo 23, III, do Código Penal.
→ Qualquer direito, público ou privado, penal ou extrapenal, regulamente exercido, afasta a antijuridicidade. Mas o exercício deve ser regular, isto é, deve obedecer a todos os requisitos objetivos exigidos pela ordem jurídica.
→ A Constituição Federal dispõe que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei (CF/88, art. 5º, II). Logo, se a lei autoriza o agente a praticar determinada conduta, não poderá, à evidência, considerá-la ilícita. 
→ A expressão direito é empregada em sentido amplo, abrangendo todas as formas de direito subjetivo, penal ou extrapenal, como, por exemplo, a faculdade do uso moderado dos meios de correção e disciplina, decorrentes do poder familiar, nos termos do artigo 1634, inciso I, do Código Civil.
→ Conforme parte da doutrina, o costume também legitima certas ações e fatos típicos, como, por exemplo, o trote acadêmico, em que as violências, injúrias e constrangimentos que os veteranos praticam contra os noviços não se consideram atos antijurídicos em face do direito penal, porque longo e reiterado costume consagra o “trote” como instituição legítima.
→ A prática de determinadas atividades esportivas produzem, invariavelmente, lesões corporais, tais como o futebol, o boxe e a luta livre. Nesses casos, o fato típico praticado não será ilícito, desde que a conduta desenvolvida pelo agente observe os estritos limites das regras do esporte praticado. Se, no entanto, o desportista não observar as regras que disciplinam o esporte praticado, responderá pelo resultado lesivo que produzir, segundo seu dolo ou sua culpa. 
→ Assim, se um jogador de futebol desferir um violento pontapé no rosto do adversário caído ao solo, responderá pelo resultado produzido, qual seja, lesão corporal, já que extrapolou os limites das regras da atividade desportiva que exercia.

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