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É inevitável que a abro qui- cOllS1ruímos como 
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fozer seu próprio troboIho; mw objetivo nesfê bvn) , 
continua o mesmo. 
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HERMAN 
HERTZBERGER 
-UCOES 
DÉ ARQUITETURA 
Tradução 
CARLOS mUARDO UMA MACHADO 
Martins Fontes 
__ ._s.2,~~~(j"",,,---- . 
U f'.l I R ~_ . ,., 
G!::::: ~ R lOTe .;',~ .,\ 
:- !~ ;., r' RI 'r·:-.t r R 
Este livro reRete o material discutido nos palestras de 
Hertzberger sobre arquitetura no Universidade Técnico de 
DelFt o partir de 1973 e contém versões elaborados dos 
notas de palestras anteriormente publicados como 'Het 
openbare riik' (Domínio público), 1982, "Ruimte maken, 
ruimte laten' (Criando espaço, deixando espaço), 1984, e 
"Uitnadigende vorm' (Formo convidativo), 1988. 
Eua obra foi publictuUJ origilllJirfUnlt em inglis com o titulo 
LESSONS FOR STUDENTS IN ItRCHlTECI'URE 
por Uilgtvtrij 010 Publishtrs, Amsttrdam, em 199/. 
Copyrighl CI 1991, Uilgtverij 010 P!lblishers. 
Copyright C 1996, Livraria MeTlins FOMes EdilOra LIda., 
$dQ Paulo, para a presente edição. 
1" tdlçá[) 1996 
2' edição 1999 
2' tiragem 2006 
Revisio da tradução 
LuIs Carlos Borges 
Reri.roes arâfi C'JIS 
Silva!la Cobucci úile 
Agnaldo A/W!s de Oliveira 
DifUlfU ].Qnantlli da Silva 
Produção gri nta 
Gtraldo Alvu 
Paginação 
Sludio 3 D~t'lVolvimtnto Editorial 
Dado6õ Intemacíonais de CataJopção na PubUcaçio (CIP) 
(CAmara BrUleira do ü vro, SP, Brasil) 
Herttberger. Hennan . 
Lições de Brquitcrunl I Herman Henzbe'1ler ; (traduç1o Carlo. 
EduardoLimaM.madoJ. - 21ed.-Sio Paulo: Martins Fontes, 1999. 
Título original: Lessons for studenlS in architecture. 
Bibliografia. 
ISBN 85-336-1034-3 
I. Arquitetura 2. Design arquitetônico I. Título. 
99-1477 
tndlct5 para catálogo sl5ttmUico; 
1. AIqUilCtwa 720 
2. Dcsign arquitctônico 720 
CDD·720 
Todos os direitos desta edição para o Brasil reurvados li 
Livraria Martins Fontes Editora Lida. 
Rua Conse/lu!jro Ramo.lho, 330 01325-000 São Paulo SP Brasil 
Tel. (JJ) 3241 36n Fax (JJ)3J01 .1042 
e-mail: info@martinsfontes.com.br htrp://www.mo.rtinsfontes.com.br 
PREFÁCIO 
"Les choses ne sonl pas difficiles à faire, ce qui esl diffici le, 
c' esl de nous meijre en élal de les fa ire." 
IBrancusi) 
É inevitável que a obra que construímos como arquitetos 
sirva de ponto de partida para o nosso ensino, e 
obviamente o melhor caminho para explicar o que se tem a 
dizer é fazê-lo com base no experiência prática: este é, na 
verdade, o fio condutor deste livro. Em vez de apresentar 
separadamente cada obra individual e explicar em seguido 
todos os seus aspectos característicos, os diversos 
componentes textuais foram organizados de tal modo que, 
como um todo, oferecem algo semelhante a uma teoria; é a 
maneira como os elementos são organizados que 
transforma a prática em teoria. 
Quando discutimos nosso próprio trabalho, temos de nos 
perguntar O que adquirimos de quem. Pois tudo o que 
descobrimos vem de algum lugar. A lonte não loi nossa 
próprio mente, mas a cultura a que pertencemos. E é por 
isso que a obra dos outros está presente aqui de maneira 
tão patente á guisa de contexto. Seria possível dizer que 
este livro contém lições, lições dados por Bramonte, Cerdá, 
Chareou, le Corbusier, Duiker & Bijvoet, Van Eyck, Gaudí & 
Jujol, Horto, labrouste, PaI/adio, Peruzzi, Rietveld, Von der 
Vlugt & Brinkman, e por todos os outros que me 
emprestaram seus olhos para que eu pudesse ver e 
selecionar exatamente o que eu precisava para levar 
adiante o meu trabalho. Os arquitetos (e não apenas eles) 
têm o hábito de ocultar suas lontes de inspiração e até 
mesmo de tentar sublimá-Ias - como se isto losse possível. 
Mas, ao lazê-Io, o processo de projetar se torna nebuloso, 
ao passo que, ao revelarmos o que nos moveu e estimulou 
em primeiro lugar, podemos nos explicar a nós mesmos e 
motivar nossas decisões. 
Os exemplos e influências que abundam neste livro 
constituem o contexto cultural dentro do qual um arquiteto 
trabalha e olerecem uma idéia do alcance dos conceitos e 
imagens mentais que devem servir como instrumentos (será 
que o oulpul de idéias de uma pessoa pode ser maior que 
. 2) o mpu/. . 
Tudo o que é absorvido e registrado por nossa mente 
soma-se à coleção de idéias armazenadas na memória: 
uma espécie de biblioteca que podemos consultar toda vez 
que surge um problema. Assim, essencialmente, quanto 
mais tivermos visto, experimentado e absorvido, mais 
pontos de relerência teremos para nos ajudar a decidir que 
direção tomar: nosso quadro de relerência se expande. 
A capacidade para descobrir uma solução 
lundamentalmente dilerente para um problema, i.e., para 
criar Ilum mecanismo" clJferente, depende da riqueza de 
nossa experiência, assim como o potencial expressivo de 
linguagem de uma pessoa não pode transcender o que é 
exprimível em seu vocabulário. É impossível dar receitas de 
como projetar, como todo o mundo sabe. Não tentei lazer 
isto, e a questão de saber se, de algum modo, é possível 
aprender a fazer um projeto não é tratada aqui. 
O objetivo de minhas "lições" sempre loi estimular os 
estudantes, despertar neles uma mentalidade arquitetônica 
que pudesse capacitá-los a fazer seu próprio trabalho; meu 
objetivo neste livro continuo o mesmo. 
Herman Hertzberger 
íNDICE A Domínio Público 
1 Público e Privado 12 
2 Demarcações Territoriais 14 
3 Diferenciação Territorial 20 
4 Zoneamento Territorial 22 
5 De Usuário a Morador 28 
6 O "Intervalo" 32 
7 Demarcações Privadas no Espaço Público 40 
8 Conceito de Obra Pública 44 
9 A Rua 48 
10 O Domínio Público 64 
11 O Espaço Público como Ambiente Construído 68 
12 O Acesso Público ao Espaço Privado 74 
B Criando Espaço, Deixando Espaço 
1 Estrutu ra e Interpretação 92 
2 Forma e Interpretação 94 
3 A Estrutura como Espinha Dorsal Gerativa: Urdidura e 
Trama 108 
4 Grelha 122 
5 Ordenamento da Construção 126 
6 Funcionalidade, Flexibilidade e Polivalência 146 
7 Forma e Usuários: o Espaço da Forma 150 
8 Criando Espaço, Deixando Espaço 152 
9 Incentivos 164 
10 A Forma como Instrumen!o 170 
C Forma Convidativa 
1 O Espaço Habitável entre as Coisas 176 
2 Lugar e Articulação 190 
3 Visão I 202 
4 Visão II 216 
5 Visão 111 226 
6 Equivalência 246 
Biografia, Projetos e Referências 268 
A DOMíNIO PÚBLICO 
• 
10 liÇÕES DE ARQU ITET URA 
• 
1 Público e Privado 12 
2 Demarcações Territoriais 74 
Ruas e Residências, Bali 
Edifícios Públicos 
Aldeio de Morbisch, Áustria 
Biblioteca Nacionol, Paris / H. Labrouste 
Edifício de Escritórios Centraol Beheer, Apeldoorn 
3 Diferenciação Territorial 20 
4 Zoneamento Territorial 22 
Edifício de Escritórios Centra0 I Beheer, Apeldoorn 
Faculdade de Arquitetura do MIT, Cambridge, USA 
Escola Montessori, Delft 
Centro Musical Vredenburg, Utrecht 
5 De Usuário a Morador 28 
Escola Montessori, Delft 
Escolas Apollo, Amsterdam 
6 O "Intervalo" 32 
Escola Montessori, Delft 
De Overloop, Lar para Idosos, Almere 
De Drie Hoven, Lar para Idosos, Amsterdam 
Res idências Documenta Urbana, Kassel , Alemanho 
Cité Napoléon, Paris / M. H. Veugny 
7 Demarcações Privadas no Espaço Público 40 
De Drie Hoven, Lar para Idosos, Amsterdam 
Residências Diagoon, Delft 
Moradias LiMa, Berlim 
8 Conceito de Obra Pública44 
Moradias Vroesenlaan, RoHerdam / J. H. van den Broek 
De Drie Hoven, Lar para Idosos, Amsterdam 
9 A Rua 48 
Moradias Haarlemmer HauHuinen, Amsterdam 
Coniunto Habitacional Spangen, RoHerdam / 
M. Brinkman 
Aloiamento para Estudantes Weesperstraat, Amsterdam 
Princípios de Assentamento 
Royal Crescents, Bath, Inglaterra / J. Wood, J. Nash 
Romerstadt, Frankfurt, Alemanha / E. May 
Het Gein, Moradias, Amersfoort 
Acesso aos Apartamentos 
Familistere, Guise, França 
De Drie Hoven, Lar para Idosos, Amsterdam 
Escola Montessori, Delft 
Kasbah, Hengelo / P. Blom 
10 O Dominio Público 64 
Palais Royal, Paris 
Praça Pública, Vence, França 
Rockefeller Plaza, Nova York 
Piazzo dei Campo, Siena, Itália 
Plaza Mayor, Chinchón, Espanha 
Fonte Dionne, Tonnerre, França 
11 O Espaço Público como Ambiente Construído 68 
Vichy, França 
Les Halles, Paris / V. Ba ltard 
Centros Comunitários / F. van Klingeren 
Torre Ei ffel, Paris / G. Eiffel 
Pavilhões de Exposição 
Laias de Departamentos, Paris 
Estações Ferroviárias 
Estações Ferroviárias Subterrâneas 
12 O Acesso Público ao Espaço Privado 74 
Passage du Caire, Paris 
Galerias de Laias 
Mi nistério da Educação e Saúde, Rio de Janeiro / 
Le Corbusier 
Edifício de Escritórios Centraal Beheer, Apeldoorn 
Centro Musical Vredenburg, Utrecht 
Cinema Cineac, Amsterdam / J. Duiker 
Hotel Solvay, Bruxelas / V. Horta 
Passage Pommeraye, Nantes, França 
- "A Carta" / Pieter de Hoogh 
DOMíNIO PÚBliCO 11 
1 PÚBLICO E PRIVADO 
05 conceitos de "público" e "privado" podem ser 
interpretados como a tradução em termos espaciais de 
IIcoletivo" e HindividuaJ". 
Num sentido mais absoluto, podemos dizer: pública é 
uma área acessível a todos a qualquer momento; a 
responsabilidade por sua manutenção é assumida 
coletivamente. Privada é uma área cu jo acesso é 
determinado por um pequeno grupo ou por uma 
pessoa, que tem Q responsabilidade de mantê-Ia. 
Esta oposição extrema entre o público e o privado - como 
a oposição entre o coletivo e o individual - resultou num 
clichê, e é tão sem matizes e falsa como a suposto oposição 
entre o geral e o específico, o obietivo e o subietivo. Tais 
oposições são sintomas da desintegração das relações 
humanas básicas. Todo mundo quer ser aceito, quer se 
inserir, quer ter um lugar seu. Todo comportamento no 
sociedade em geral é, no verdade, determinado por papéis, 
nos quais o personalidade de cada indivíduo é afirmado 
pelo que os outros vêem nele. No nosso mundo, 
experimentamos uma polarização entre a individualidade 
exagerada, de um lado, e a coletividade exagerada, de 
outro. Coloca-se excessiva ênfase nestes dois pólos, embora 
não exista uma única relação humano que nos interesse 
como arquitetos que se concentre exclusivamente em um 
indivíduo ou em um grupo, ou mesmo que se concentre de 
modo exclusivo em todos os outrosl ou seja, no "mundo 
externo". É sempre uma questão de pessoas e grupos em 
inter-relação e compromisso mútuo, i.e. , é sempre uma 
questão de coletividade e indivíduo, um em face do outro. 
12 LIÇÕ ES DE ARQUITElURA 
Wenn aber der Individualismus nur einen Teil des Menschen 
erlasst so erlasst der Kollektivismus nur den Menschen oIs 
Teil: zur Ganzheit des Menschen, zum Menschen aIs Ganzes 
dringen beide nicht vor. Der Individualismus sieht den 
Menschen nur in der Bezogenheit aul sich se/bst, aber der 
Kollekfivismus sieht den Menschen überhaupf nichf, er siehf 
nur die "Gesellschalt", Beide lebensanschauungen sind 
Ergebnisse oder Aeusserungen des g/eichen menschlichen 
Zusfands . 
Dieser Zusfand isf durch das Zusammensfriimen von 
kosmischer und sozia/er Heim/osigkeit, von Welfangsf und 
lebensangsf, zu einer Daseinsverlassung der Einsamkeit 
gekennzeichnef, wie es sie in diesem Ausmass vermuflich 
noch nie zuvor gegeben hat. Um sich vor der Verzweil/ung 
zu reffen, mif der ihn siene Vereinsamung bedroht, ergreilt 
der Mensch den Ausweg, diese zu glorilizieren. Der 
moderne Individua/ismus haf im wesentlichen eine 
imaginare Gru~dlage. An diesem Charakfer scheiferf er, 
denn die Imaginafion reicht nichf zu, die gegebene Situafion 
laktisch zu bewalfigen. 
Der moderne Kollektivismus isf die lefzfe Schranke, die der 
Mensch vor der Begegnung mif sich se/bsf aulgerichfef 
haf ... ; im Kollektivismus gibf sie, mit dem Verzicht aul die 
Unmiffelbarkeit personlicher Entscheidung und 
Veranfworfung, sich selber aul. In beiden Fallen isf sie 
unlahig, den Durchbruch zum Anderen zu vollziehen: nur 
zwischen ech fen Personen gibf es echte Beziehung. Hier gib f 
es keinen anderen Ausweg aIs den Aulsfand der Person um 
der Belreiung der Beziehung willen. Ich sehe am Horizonf, 
mit der langsamkeif aller Vorgange der wahren 
Menschengeschich fe, eine grosse Unzulriedenheif 
heraulkommen. 
Man wird sich nichf mehr bloss wie bisher gegen eine 
bestimmfe herrschende Tendenz um anderer Tendenz willen 
emporen, sondem gegen die la/sche Rea/isierung eines 
grossen Sfrebens, des Sfrebens zur Gemeinschaft, um der 
echfen Realisierung willen. 
Man wird gegen die Verzerrung und lür die reine Ges falt 
kamplen. Ihr ersfer Schriff muss die Zerschlagung einer 
fa/schen Alternafive sein, der Alfernative "/ndividualismus 
oder Kollektivismus".' 
(Martin Buber, Das Problem des Menschen, Heidelberg, 1948, também 
publicodo ,m Forum 7-1959, p. 249) 
"Se, porém, o individualismo compreende apenas parte da 
humanidade, o coletivismo só compreende a humanidade 
como parte; nenhum deles apreende o todo da 
humanidade, a humanidade como um todo. 
O individualismo vê a humanidade apenas na relação 
consigo mesmo, mas o coletivismo não vê o homem de 
maneiro nenhuma, vê apenas a 'sociedade'. Ambas as 
visões de mundo são produtos ou expressões dó mesma 
condição humana. 
Esta condição caracteriza-se pela con fluência de um 
desomparo cósmico e sociol, de uma angústia diante do 
mundo e da vida, por um estado existencial de solidão, que 
provavelmente nunca se manifestaram antes nesse nível. 
Na tentativa de fugir do desespero trazido pelo isolamento, 
o homem, como escapatória, procura glorificá-lo. 
O individualismo moderno possui um fundamento 
imaginário. Neste aspecto, ele fracassa, pois a imaginação 
é incapaz de lidar factualmente com uma situação dada. 
O coletivismo moderno é a última barreira que o homem 
construiu para evitar o encontro consigo mesmo [ ... i; no 
coletivismo, com a renúncia à imediaticidade da decisão e 
da responsabilidade pessoal, ela se rende. Em ambos os 
casos é incapaz de efetuar uma abertura para o outro: só 
entre pessoas reais pode haver uma relação real. 
Não há alternativa, neste caso, a não ser a rebelião do 
indivíduo em favor da libertação do relacionamento. Vejo 
surgir no horizonte, com a lentidão de todos os processos 
da história humana, um grande descontentamento. 
As pessoas não mais se levantarão como fizeram no 
passado contra certa tendência predominante e a favor de 
uma tendência diferente, mas contra a falsa realização de 
um grande anseio, o anseio pelo comunitário, em nome da 
verdadeira realização. 
As pessoas lutarão contra a distorção e pela pureza. 
O primeiro passo deve ser a destruição de uma fa lsa 
escolha, a escolha: 'individualismo ou coletivismo'.' 
Os conceitos de "públicoR e uprivado" podem ser 
vistos e compreendidos em termos relativos como uma 
série de qualidades espaciais que, diferindo 
gradualmente, referem-se ao acesso, à 
responsabilidade, à relação entre a propriedade 
privada e a supervisão de unidades espaciais 
específicas. 
DOMíN IO PÚ BLICO 13 
2 DEMARCACÕES , 
TERRITORIAIS 
Uma área aberta , um quarto o~ um espaço podem ser 
concebidos como um lugar mais ou menos privado ou 
como u'!10 área pública, dependendo do grau de 
acesso, da forma de supervisão, de quem o utiliza, de 
quem tomo conta dele e de suas respectivas 
responsabi lidades. 
O seu quarto, por exemplo, é um espaço privado em 
comparação com a sala de estar e a cozinha da casa 
em que mora. Você tem o chave do seu quarto, do 
qual você mesmo cuida. O cuidado e a manutençãoda 
sala de estar e da cozinha são basicamente uma 
responsabilidade compartilhado por todos 05 que 
moram na casa, que têm a chave da porta de entrada. 
Numa escola, cada sala de aula é privada em 
comparação com o hall comunitário. Este hall, por sua 
vez, é, como a escola em sua totalidade, privado em 
comparação com a rua. 
RUAS E RESIDÊNCIAS, BAU (1-4) 
Os quartas de várias habitações em Bali são muitas vezes 
pequenas casas construidos separadamente, agrupadas em 
volta de uma espécie de pátio inte rno, no qual se entra por 
um portão. Depois que atravessamos o portão, não temos a 
sensação de que estamos entrando numa residência, 
embora isso seja o que acontece de fato. As unidades 
separadas do residência - área de cozinha, dormitórios e, 
às vezes, uma câmara mortuória e um berçário - possuem 
uma intimidade maior e são, certamente, de acesso menos 
fácil para um estranho. Deste modo, a' casa abrange uma 
seqüência de gradações distintas de acesso. 
14 LIÇÕES DE ARQUITETURA 
[JJ] 
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[[J • O ... D . . . . 
4 ~ 
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~ID [ZJ I: .. . ·: 8 .· ·.· S • 
1. Dormitório poro os pais 5. Dormitório 
2. Aliar 6. Cozinho 
3. Templo familiar 
.4. Área. de estar/ convidodos 
7. Depósito de arroz 
8. Eira 
Muitas ruas em Bali constituem o território de uma família 
extensa. Nessas ruas estão situadas as casas das diversas 
unidades familiares, que iuntas compõem a família extensa. 
Essas ruas têm um portõo de entrada, que é muitos vezes 
provido de uma pequeno cerca de bambu encarregada de 
manter as crianças e os animais do lado de dentro, e, 
embora seiam basicamente acessíveis a qualquer um, 
tendemos o nos sentir como intrusos ou, no máximo, como 
visitantes. 
Além das diversas nuances nas demarcações territoriais, os 
balineses fazem uma distinção dentro do espaço público: a 
área do templo, que compreende uma série de recintos 
sucessivos com entradas claramente marcadas, aberturas 
nas cercas ou portões de pedra (conhecidos como t;andi 
bentar). Esta área do templo serve como rua e como 
playground para as crianças. Para o visitante também é 
acessível como rua - pelo menos quando não estõo 
acontecendo manifestações religiosas - , mas, mesmo assim, 
visitante sente certa relutância. Como alguém estranho ao 
lugar, sente"se honrado por ter permissão de entrar. 
No mundo inteiro encontramos gradações de 
demarcações territoriais, acompanhadas pela sensação 
de acesso. Às vezes o grau de acesso é uma questão 
de legislação, mas, em gerat é exclusivamente uma 
questão de convenção, que é respeitada por todos. 
EDIFíCIOS PÚBliCOS 
Os chamados edi fícios públicos, tais como o hall do correio 
central ou uma estação ferroviária, podem Ipelo menos 
durante as horos em que ficam abertos) ser vistos como um 
espaço de rua no sentido territorial. Outros exemplos de 
graus diferenciados de acesso ao público estão listados 
abaixo, mas a lista, naturalmente, pode ser ampliada para 
incluir oulras experiências pessoais: 
• os pátios quadrangulares das universidades na Inglaterra, 
como em Oxford e Cambridge; são acessíveis a todos pelos 
pórticos, formando uma espécie de subsistema de caminhos 
para pedestres que atravessa todo o centro da cidade. 
• edifícios públicos, como, por exemplo, o hall do co:reio, 
a estaçõo ferroviária, etc, . 
• os pátios de blocos de moradia em Paris, onde a 
concierge em geral reina suprema. 
• ruas "fechadas", encontradas em grande variedade por 
todo o mundo, às vezes patrulhadas por guardas de 
segurança privada. 
DOMíNIO PÚBliCO IS 
Estação Central, 
Hoorlem, Holanda 
6 7 
lO 11 
Ruo ho/ondeso, 
século XIX 
AlDEIA DE MÓRBISCH, ÁUSTRIA 16-B} 
As ruas na aldeia austríaca de Morbisch, perto da fronteira 
húngara (publicado em Forum 9-1959), têm portões largos, 
como os que dão acesso a fazendas - mas aqui dõo acesso 
a ruas laterais ao longo das quaís se situam residências, 
estóbulos, celeiros e hortas. 
Estes exemplos mostram como são inadequados os 
termos público e privado, enquanto as áreas 
chamadas semiprivadas ou semi públicas, que muitos 
vezes estão espremidas na zona intermediária, são 
equívocas demais paro acomodar as sutilezas que 
devem ser levadas em conto ao projetar cada espaço 
e cada área . 
• Onde quer que indivíduos ou grupos tenham a 
oportunidade de usar partes do espaço público para 
seus próprios interesses, e apenas indiretamente no 
interesse dos outros, o caráter público do espaço é 
temporária ou permanentemente colocado em questão 
por meio do uso. Exemplos desse tipo podem ser 
encontrados em qualquer parte do mundo. 
Em Bali - mais uma vez usada como exemplo - o arroz é 
espalhado para secar em amplas óreas dos caminhos 
16 LIÇÕES DE ARQUITETURA 
,. 
-___ ~ _ _ 'J_ ~_---' 
públ icos e até mesmo no meio-fio das estradas de 
macadame, onde permanece intocado pelos veículos e 
pelos pedestres, pois toaas estão conscientes do 
importância do contribuição de cada membro da 
comunidade para a colheita de arroz. 19} 
Um outro exemplo de mistura do público com o privado é a 
roupa pendurada para secar nas ruas estreitas de cidades 
do sul da Europa: uma expressão coletiva de simpatia pela 
lavagem de roupa de cada fa míl ia, que fica pendurada 
numa rede de cabos que atravesso a rua de uma casa a 
outra. 
Nápoles 
Outros exemplos são as redes e navios sendo reparados 
nos cais de aldeias e portos pesqueiros, e o Dogon: a lã 
estirada na praça da aldeia. 
o uso do espaço público por residentes, como se fosse 
"privado", fortalece a demarcação por parte do 
usuário desta área aos olhos dos outros. A dimensão 
extra dada ao espaço público por essa demarcação 
sob a formo de uso para objetivos privados será 
discutida detalhada mente mais adiante, mas antes 
devemos procurar saber quais as conseqüências que 
traz para o arquiteto. 
BIBLIOTECA NACIONAL, PARIS, 1862-1868 / H. LABROUSTE 112) 
Na principal sala de leitura da Biblioteca Nacional em 
Paris, os espaços de trabalho individual, dispostos um em 
frente ao outro, são separados por uma I'zono'l média mais 
elevada; as lâmpadas no centro dessa prancha fornecem 
luz para as quatro superfícies de trabalho diretamente 
adjacentes. Esta zona central é mais acessível do que os 
espaços de trabalho individual, mais baixos, e tem como 
claro objetivo o uso compartilhado por aqueles que se 
sentam de ambos os lados. 
EDIFíCIO DE ESCRITÓRIOS CENTRAAl BEHEER 113·19) 
Há muitos anos, antes de se estabelecer a moda de 
"escrivaninha lisa", as escrivaninhas dos escritórios eram 
providas de pranchas que, quando as escrivaninhas eram 
colocados uma contra a outra, formavam uma zona central 
semelhante às que dividem as mesas de le itura da 
Biblioteca Nacional em Paris. Por meio dessa articulação, 
reserva-se um lugar para os objetos compartilhadas por 
diversos usuários, tais como telefones e vasos. O espaço 
sob as pranchas cria uma área maior de armazenamento 
privado para cada usuário ind ividual. A articulação em 
termos de maior ou menor acesso (pública) também pode 
revelar sua utilidade nas detalhes. 
DOMíNIO PÚSlICO 17 
13 
12 u 
15 16 
17 16 
19 
18 liÇÕES DE ARQU ITET URA 
Portos de vidro entre espaços igualmente públicos e 
portanto igualmente acessíveis, por exemplo, proporcionam 
ampla visibilidade de ambos os lados, de modo que as 
colisões podem ser facilmente evitadas. Portas sem painéis 
transparentes têm de dar acesso a espaços mais privados, 
menos acessíveis. Quando um código desse tipo é adotado 
coerentemente em todo o edifício, é entendido racional ou 
intuitivamente por todos os usuários do prédio e assim pode 
contribuir para esclarecer os conceitos subjacentes à 
organização do acesso. Uma classificação adicional pode 
ser obtida mediante a forma dos painéis de vidro, o tipo do 
vidro empregado: semitransparente ou opaco, ou a 
meia-porta. 
Quando, ao projetar cada espaço e segmento, temos 
consciência do grau de relevância da demarcação 
territorial e das formas concomitantesdas 
possibi lidades de "acesso" aos espaços vizinhos, 
podemos expressar essas diferenças pela articulação 
de forma, mate ria l, luz e cor, e introduzir certo 
ordena'mento no projeto como um todo. Isto, por sua 
vez, pode aumentar a consciência dos moradores e 
visitantes quan to à composição do edifício, formado 
por ambientes diferentes no que diz respe ito ao 
ccesso. O grau de acesso de espaços e lugares fornece 
padrões poro o projeto. A escolha de motivos 
arqui tetônicos, sua articulação, forma e material são 
determinados, em parte, pelo grau de acesso exigido 
por um espaço. 
DOMíNIO PÚBlICO 19 
20 
21 12 23 
U 
-3 DIFERENCIACAO , 
TERRITORIAL 
20 l iÇÕ ES DE AlQUllElURA 
-._-.-: •. •. ; , --"._ -.;;-._-~ -'!:l ; .... '~:-'7 -::'~~J~:-,,:i 
't~l 
Escora Monfessori, De/fi 
Hotel Solvoy, Bruxe/os, 1896/V. Horto 
{ver tombém págino 84} 
Ao marcar as gradações de acesso público às 
diferentes áreas e partes de um edifício em uma 
planta, obtemos uma espécie de mapa mostrando a 
Ildiferenciação territorial". Este mapa mostrará 
claramente que aspectos de acesso existem na 
arquitetura, quais são as demarcações de áreas 
específicas e a quem se destinam, e que espécie de 
divisão de responsabilidades pode ser esperada no 
que diz respeito aos cuidados e à manutenção dos 
diferentes espaços, de modo que essas forças possam 
ser intensificadas (ou atenuadas) na elaboração 
posterior da planta. 
DOM iNIO PÚBliCO 21 
15 26 
1J 28 
29 
4 ZONEAMENTO 
TERRITORIAL 
30 
r. -
22 lI ÇÔES DE ARQUITETURA 
o caráter de cada área dependerá em grande parte 
de quem determina o guarnecimento e o ordenamento 
do espaço, de quem está encarregado, de quem zela e 
de quem é ou se sente responsável por ele. 
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I 
-I 
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L ' 
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EDIFíCIO DE ESCRITÓRIOS CENTRAAl BEHEER (30, 31 1 
Os efeitos surpreendentes obtidos pelos fu nc ionários do 
Centraol Beheer na maneiro como ordenaram e 
persona lizaram o espaço de seus escritórios com cores de sua 
escolha, vasos e obietos de estimação, não são apenas a 
conseqüência lógica do fato de o acabamento dos interiores 
ter sido deliberadamente entregue aos usuários do edifíc io. 
Embora a nudez do interior severo e cinzento sejo um convite 
t :':"\ {,:=ry 
~_:. ~~~/ 
I ... 
~ . -:-, ." 
DOMINIO PÚ BLICO 23 
31 
32 
3J 
óbvio poro que os usuórios dêem os toques de acabamento 
ao espaço de acordo com seus gostos pessoais, isto, por si só, 
não é garantia de que irão fazê-lo. 
É preciso algo mais para que isso aconteça: para começar, a 
própria forma do espaço deve oferecer as oportunidades, 
incluindo os acessórios básicos, etc., para que os usuários 
preencham os espaços de acordo com suas necessidades e 
deseios pessoais. Mas, além disso, é essencial que a 
liberdade de tomar iniciativas pessoais esteio presente na 
estruturo organizacional da instituição, e este aspecto tem 
24 LIÇÕ ES DE ARQUITElUIA 
conseqüências muito maiores do que se pode pensar à 
primeira vista. Pois a questão fUndamentai é saber quanta 
responsabilidade a alta direção está disposta a delegar, isto 
é, quanta responsabilidade será dada aos usuários 
individuais dos escalões mais baixos. 
É importante ter em mente que, neste caso, um empenho tão 
excepcional para investir amor e cuidado no ambiente de 
trobalho só se tornou possível porque a responsabi lidade de 
ordenamento e acabamento dos espoços foi deixada aos 
usuários, de maneira muito explícita. Foi graças a isso que as 
oportunidades oferecidas pelo arquiteto foram efetivamente 
aproveitados, gerondo um resultado de êxito surpreendente. 
Mas, se este edifício foi originalmente construído como uma 
expressão espacial da necessidade de um ambiente mais 
humano (embara muitos suspeitassem que isso teria sido 
motivado por considerações relativas ao recrutamento de 
pessoal), há no momento uma tendência paro a 
desumanização, em gronde parte decorrente de cortes nos 
custos, que afetam particularmente o quadro de funcionários. 
Mas pelo menos pode-se dizer que o edifício oferece uma 
resistência louvável a essa tendência, e que, com um pouco 
de sorte, conseguirão conservar o seu esti lo. O que desaponta 
é que o que pensóvamos ser um passo in icial rumo o uma 
responsabilidade maior poro com os usuários revelou ser 
apenas o último passo que pode ser dado no momento. 
Hoie, isto é, em 1990, restou muito pouco da decoroção 
expressivo e colorida dos ambientes de trobalho. O apogeu 
da expressividade pessoal da década de 1970 deu lugar à 
li mpeza e à ordem. Parece que o impulso de expressão 
pessoal desapareceu e que neste momento as pessoas tendem 
mais ao conformismo. Talvez em rozão do medo diante do 
crescente desemprego da década de 1980, considero-se mais 
sensato assumir uma posição menos extrovertida, e os efeitos 
dessa situação iá podem ser vistos na atmosfera fria e 
impessoal da maioria dos escritórios de hoie. 
FACULDADE DE ARQUITETURA DO MIT, CAM8RIDGE, USA 
OFICINA DE TRA8ALHO 1967 132, 331 
O grau de influência que os usuários podem exercer, em 
casos extremos, sobre seu ambiente de trobalho ou de 
moradia é claromente demonstrodo nos aiustes feitos à 
arquitetura existente pelos estudantes de arquiteturo do Mil 
Os estudantes opuseram-se a ter de trabalhar em 
pranchetas de desenho arrumados em fi las longas e 
rígidas, todas voltadas na mesma direção. Usando restos de 
material de construção, eles construíram o tipo de espaço 
que queriam - no qual podiam trabalhar, comer, dormir e 
receber seus orientadores. 
Seria de esperar que cada novo grupo de estudantes 
deseiasse fazer seu próprio aiuste, mas o situação evoluiu 
de outro maneiro. O resultado da feroz disputa com as 
autoridades locais de prevenção a incêndios foi que todas 
as estruturas teriam de ser derrubadas, a rT)enos que um 
sistema completo de sprink/ers fosse instalado. Depois que 
essa providência foi tomada, a situação tornou-se 
permanente, e a ambiente, se é que ainda existe, pode ser 
visto como um monumento ao entusiasmo de um grupo de 
estudantes de arquitetura. Mas não devemos nos 
surpreender se tudo já não foi eliminado lou venha a sê-lo) 
- a burocracia da administração centralizadora voltou a 
assumir o controle. 
A inFluência dos usuários pode ser estimulada, pelo 
menos nos lugares certos, Le., onde se pode esperar o 
envolvimento necessário; e como isto depende do grau 
de acesso, das demarcações territoriais, da 
organização da manutenção e da divisão de 
responsabilidades t é essencial que o projetista esteja 
plenamente" consciente desses fatores nas suas 
gradações adequadas. Nos casos em que a estrutura 
organizacional impede os usuários de exercerem 
qualquer inFluência pessoal em seu ambiente, ou 
quando a natureza de determinado espaço é tão 
pública que ninguém se sente inclinado a exercerem 
influência nele, não há motivo pora que o arquiteto 
tente fazer uma contribuição nesse sentido. 
No entanto, o arquiteto ainda assim pode tirar 
vantagem da reorganização que o ato de ocupar um 
novo edifício sempre requer e tentar exercer a lguma 
influência na reavaliação da divisão de 
responsabilidades, pelo menos no que diz respeito ao 
ambiente físico. Uma coisa pode levar à outra. Pelo 
simples fato de apresentar argumentos capazes de 
assegurar à alta direção de que delegar 
responsabilidades pelo ambiente aos usuários não 
resulta necessariamente em caos, o arquiteto coloca-se 
em posição de contribuir para melhorar as coisas, e 
certamente é seu dever fazer pelo menos uma tentativa 
!lesse sentido. 
ESCOlA MONTESSORI, DElFT )3A, 35) 
Uma prancha de madeira acima da porta, com uma 
largura extra para que sobre ela possam ser colocados 
objetos - como neste caso entre a sala de aula e o hall-, 
presta-se mais a ser usada se for acessivel pelo lado 
adequado, i.e., pela lado de dentro da sala de aula. A 
estante acima pode criar um efeito estético agradável se a 
vidraça for recuada, mas é improvável que seja usada . 
EDIFíCIO DE ESCRITÓRIOS CENTRAAlBEHEER )36-39) 
Embora o cuidado pelas espaços dos escritórios no edifício 
Centra0 I Beheer, nos quais cada funcionário tem sua 
própria ilha particular para trabalhar, seja da 
responsabilidade dos usuárias, nenhum membro do quadro 
de funcionários sente-se diretamente responsável pelo 
espaço central do edifício. A área verde neste espaço 
central é mantida por uma equipe especiallcf. Obras 
DnMí NI O PÚBliCO 2S 
J4 35 
36 37 
38 
39 40 
Públicas), e os quadros nas paredes são colocados por uma 
equipe de profissionais. 
Estes empregados também fazem seu trabalho com grande 
dedicação e cuidodo, mas há uma diferença de atmosfera 
marcante entre a área comunitária e os espaços individuais 
de trabalho com toda a sua diversidade. 
Nos balcões de lanches deste espaço central , o serviço é 
fei to pela mesma moça todo dia; o serviço de lanches foi 
organizado de tal modo que cada garçonete foi alocada 
num balcão específico. Ela se sentia responsável por aquele 
balcão e, com o tempo, acabou por considerá- lo seu 
26 lIÇÓES DE ARQUITElURA 
domínio, dando-lhe um toque pessoal. Estes balcões de café 
já foram removidos, e bancos e máquinas de café foram 
instalados em seu lugar. Todo o edifício está passando por 
uma renovação e uma limpeza, e duronte este processo um 
grande número de ajustes será feito para otender aos 
requisitos de um locol de trabolho contemporâneo. 
CENTRO MUSICAL VREDENBURG (40) 
A idéia subjacente que teve êxito no Centraal Beheer não 
se aplica aos balcões de lanches do Centro Musical em 
Utrecht. Ali a situoção varia consideravelmente de um 
concerto para outro, com diferentes balcões e diferentes 
balconistas servindo o público. Já que, no caso, não se 
esperava uma afinidade especial entre os empregados e os 
espaços específicos de trabalho, havia motivo suficiente 
para que as áreas de lanches fossem completadas e 
inteiramente mobiliadas pelo orquiteto. 
Em ambos os edifícios - no Centra0 I Beheer e no Centro 
Musical - as paredes dos fundos são providas de espelhos. 
No primeiro, porém, eles foram instalados pelos 
funcionários e no segundo foram escolhidos pelo arquiteto 
de acordo com os mesmos princípios gerais que regem todo 
o edifício. Os espelhos da parede dos fundos permitem que 
se possa ver quem está à frente, atrás e perto de nós. 
Eles evocam as pinturas de teatro de Manet (41), que usou 
espelhos para desenhar o espaço dentro do plano do 
quadro e, assim, definir o espaço mostrando as pessoas e 
como estão agrupadas. 
O Centro Musical tem um quadro de funcionários 
competente e dedicado que cuida do lugar. 
o mesmo não pode ser dito, por exemplo, dos vagões de 
refeição das ferrovias holandesas: os garçons 
constantemente trocam de trem. Seu único compromisso 
consiste em deixar ó vagão limpo e asseado para o turno 
seguinte, Imagine como as coisas seriam diferentes se o 
mesmo garçom trabalhasse sempre no mesmo trem, Embora 
o vagão-restaurante tenha desaparecido - dos trens 
holandeses pelo menos - , uma nova forma de serviço 
surgiu nas viagens aéreos. Mas as refeições servidas nos 
aviões são mais uma imposição ao passageiro do que um 
serviço; são servidas em horas que convêm mais à 
companhia do que ao passageiro (além de serem muito 
caras, pois estão incluídas no preço iá bastante alto da 
passagem), 
Do LuHhan,a 
Borclbuch, 6/ 88 
DO MiN IO PÚ8L ICO 27 
41 
41 
'3 
S DE USUÁRIO 
A MORADOR 
A tradução dos conceitos de "público" e "privado" à 
luz de responsabilidades diferenciadas torna mais fácil 
para o arquiteto decidir onde devem ser tomadas 
medidtJ5 para que os usuários/habitantes possam dar 
suas contribuições ao projeto do ambiente e onde isto 
é menos relevante. Na organização de um projeto em 
função de plontas-baixas e de cortes, e também de 
acordo com o princípio das insta lações l podem-se criar 
as condições para um maior senso de responsabilidade 
e, conseqüentemente, também um maior envolvimento 
no arranjo e no mobiliamento de uma área. Deste 
modo os usuários tornam-se moradores. 
ESCOlA MONTESSORI, DElFT )44-471 
As solos de aula desta escala são concebidos como un idades 
autônomos, pequenos lares, por assim dizer, já que todos 
estão situados 00 longo do halJ do escola, como uma ruo 
comunitária_ A professora, o "tia", de cada cosa decide, junto 
com as crianças, que aparência terá o lugar e, portanto, qual 
será o seu tipo de atmosfera_ 
Cada sala de aula também tem seu pequeno vestíbulo, em vez 
do usual espoço comunitário pora toda a escola, que em 
geral significa a ocupação total do espaço por filas de 
cabides e sua inutilização para qualquer outro fim_ E, sé cada 
sala de aula tivesse seu próprio banheiro, isto também 
,. 
:f' 
28 liÇ ÕES DE ARQU ITETUR A 
contribuiria para aprimorar o sentido de responsabilidade da 
criança (a proposto foi rejeitada pelas autoridades 
educacionais sob o pretexto de que seriam necessários 
banheiros separados para meninos e meninas - como se fosse 
assim na casa deles -, o que exigiria o dobro de banheiros). 
É perfeitamente concebível que as crianças de cada sala 
mantenham seu IJlarH limpo, como os pássaros fa zem com seu 
ninho, dando deste modo expressão à ligação emocional com 
seu ambiente diário_ 
A idéia Montessori, na verdade, compreende os chamados 
deveres domésticos como parte do programa diário pora 
todas as crianças_ Assim, dá-se muito ênfase 00 cuidado com 
o ambiente, fortalecendo com isso a afinidade emocional das 
crianças com o espaço à sua volta. 
Cada criança também pode trazer sua própria planta para a 
sala de aula e cuidar dela_ (A consciência do ambiente e a 
necessidade de cuidar dele ocupam um lugar proeminente no 
conceito de Montessori. Exemplos típicos são a tradição de 
trabalhar no assoalho sobre tapetes especiais - pequenas 
áreas temporárias de trabalho que são respeitados pelos 
outros - e a importância atribuída ao hábito de arrumar as 
coisas em armários abertos.) Um passo à frente, no sen tido de 
uma abordagem mais pessoal poro os espoços que circundam 
diariamente as crianças, incluiria a possibilidade de regular o 
aquecimento central de cada sala . Isso aumentaria a 
consciência das crianças quanto ao fenômeno da calor e ao 
cuidado que temos de tomar para nos mantermos aquecidos, 
ao mesmo tempo em que as tornaria mais conscientes dos 
usos da energia. 
Um Uninho seguro» - um espaço conhecido à nossa 
volta, onde sabemos que nossas coisas estão seguras e 
onde podemos nos concentrar sem sermos perturbados 
pelos outros - é olgo de q~e cada indivíduo precisa 
tanto quanto o grupo. 
Sem isso, não pode haver colaboração com os outros. 
Se você não tem um lugar que pano chamar seu, você 
não sabe onde está! 
Não pode haver aventura sem uma base para onde 
retornar: todo mundo precisa de alguma espécie de 
ninho para pousar. 
o domínio de um grupo particular de pessoas deveria ser 
respeitado tanto quanto possível pelos "estranhos". Por esta 
razão, há certos riscos ligados ao chamado uso 
multi funcional. Vamos tomar como exemplo uma sala de 
aula: se é usada para outras finalidades fora do horário 
escolar, por exemplo, paro atividades do vizinhança, toda 
a mobília tem de ser deslocada temporariamente e, claro, 
nem sempre é colocada de volta a seu lugar adequado_ Em 
tais circunstâncias, figuras de barro modelado deixadas 
para secar, por exemplo, podem ser quebradas 
"ac identalmente" com facilidade, ou então o apontador de 
lápis de alguém pode desaparecer. 
45 
DOMíNIO PÚBLICO 29 
{} 
É importante que as crianças possam exibir as coisas que 
fizeram, digamos, na aula de trabalhos manuais, sem medo 
de que possam ser destruídas, e que possam também deixar 
trabalhos inacabados sem que haja o perigo de serem 
retirados ou "arrumados" por "estranhos/I, Afinal de contas, 
uma faxina complela feila par outra pessoa pode fazer 
30 LIÇÕ ES DE ARQUITEIUIA 
alguém senlir-se perdido em seu próprio espaço na manhã 
seguinte. 
Uma sala de aula, concebida como o domínio de um 
grupo, pode mostrar suaprópria identidade ao resto da 
escola se lhe for dada o oportunídade de fazer uma 
exposição das coísas com os quais o grupo está 
especialmente envolvido Icoisas que as crianças fizeram 
dentro ou fora da sala de aulal. Isto pode ser executado de 
modo informal usando-se a divisória entre o hal! e a sala 
de aula como espaço de exposição e abrindo-se muitas 
janelas com peitoris generosos na divisória. 
Um pequeno mostruário Ineste caso, até iluminado) é um 
desafio para o grupo apresentar-se de maneira mais 
formal. O exterior da sala de aula pode então funcionar 
como uma espécie de "vitrinell que mostra o que o grupo 
tem a I/oferecer", 
Desse modo, cada turma pode apresentar uma imagem com 
que os outros podem se relacionar e que marca a transição 
enlre cada sala de aula e o espaço comunitário do hal!. 
ESCOlAS APOLLO 148·50) 
Se o espaço entre as salas de aula foi usado para criar 
áreas semelhantes a alpendres, como na escola Montessori 
de Amsterdom, essas áreas podem servir como lugares de 
trabalho adequados onde se pode estudar sozinho, i,e., 
sem estar na sala de aula mas também sem ficar isolado 
desta. Esses lugares consistem numa superfície de trabalho 
com il uminação própria e num banco encostado a uma 
parede baixa, Para regular o contato en tre a sala de aula e 
o hall da maneira mais sutil possivel , foram instaladas 
meias·portas, cu ja ambigüidade pode gerar o grau 
adequado de abertura para o hall e, ao mesmo tempo, 
oferecer o isolamento necessário a cada situação. 
Aqui encontramos mais uma vez Icomo na escola de Delk) 
o mostruário de vidro contendo o museu-miniatura e a 
expos ição da sala de aula. 
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AS A9 
50 
DOMíNIO PÚBLICO 31 
6 O "INTERVALO" 
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o significado mais amplo do conceito de intervalo foi 
introduzido em Forum 7, 1959 (la plus grande réolité 
du seuil) e em Forum 8, 1959 IDas Gestalt gewordene 
Zwischen: lhe concretization of lhe in·between) 
A soleira fornece a chave para a transição e a conexõo 
entre áreas com demarcações territoriais divergentes e, 
na qualidade de um lugar por direito próprio, constitui, 
essencialmente, a condição espacial para o encontro e 
o diálogo entre áreas de ordens diferentes. 
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32 IIÇÕ fS Df ARQUllfTURA 
o valor deste conceito é mais explícito na soleira par 
excellence, a entrada de uma casa. Estamos lidando 
aqui com o encontro e a reconciliação entre a rua, de 
um lado, e o' domínio privado, de outro. 
A criança sentada no degrau em frente à sua casa está 
suficientemente longe da mãe para se sentir independente, 
para sentir a excitação e o aventuro do grande 
desconhecido. 
Mas, ao mesma tempo, sentada ali no degrau, que é parte 
da rua assim como da casa, ela se sente segura, pois sabe 
que sua mãe está por perto. A criança se sente em casa e 
ao mesmo tempo no mundo exterior. Esta dualidade existe 
graças à qual idade espacial da soleira como uma 
plataforma, um lugar em que os dois mundos se superpõem 
em vez de estarem rigidamente demarcados. 
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E5COLA MONTE550RI, DElFT (52·56) 
A entrada de uma escola primária devia ser mais do que 
uma mera abertura através da qual as crianças são 
engolidos quando os aulas começam e expelidas quando 
elas terminam. Deveria ser um lugar que oferecesse algum 
tipo de conforto para os crianças que chegam cedo e para 
os alunos que não querem ir logo para casa depois das 
aulas. 
As crianças também têm seus encontras e compromissos. 
Muros baixos em que se possa sentar são o mínimo a se 
oferecer; um canto bem abrigado é melhor, mas o melhor 
mesmo seria uma área coberta para quando chove. 
A entrado de um iordim-de-infôncia é freqüen tado pelos 
pois - ali eles se despedem de seus filhos e esperam por 
eles quando as aulas terminam. Os pois que esperam os 
filhos têm assim uma belo oportunidade para se conhecer e 
para combinar visitas das crianças às cosas dos colegas. 
Em sumo, este pequeno espaço públi co, como local de 
encontro para pessoas com interesses comuns, cumpre uma 
importante função social. Como resultado do mais recente 
transformação, em 1981 [56), esta entrada não mais existe. 
DOMíNIO PÚ8l1CO 33 
52 5~ 
53 55 
56 
57 
59 
58 
DE OVERLOOP, lAR PARA IDOSOS {57, 58) 
Uma órea coberta na porta do frente, o começo da 
"soleira" / é o lugar em que dizemos olá ou adeus aos 
visitantes, limpamos a neve das botas e penduramos o 
guarda-chuva. 
As entradas cobertas para os apartamentos do abrigo De 
Overloop, em Almere, são equipadas com bancos perto das 
portas da frente. As portas da frente estão dispostos de 
duas em duas para forma r um alpendre combinado, o qual, 
porém, é dividido em entradas separadas por uma divisório 
vertical que se proieta a partir da fachada. As meias-portas 
permitem a quem esteio sentado do lado de foro manter 
contato com o interior do apartamento, de modo que se 
pode pelo menos ouvir o telefone tocar. Esta zona de 
entrada é vista como uma extensão da caso, como se pode 
perceber pelos capachos colocados do lado de foro. 
34 II(OES DE ARQUlmUiA 
Graças à saliência da cobertura, ninguém precisa esperar 
na chuva até que a porto seio aberta, enquanto a 
atmosfera hospitaleira do lugar dá a quem chega o 
sensação de que iá está quase dentro da caso. 
Pode-se dizer que o banco na porta da frente é um motivo 
tipicamente holandês - pode ser visto em muitas pinturas 
antigasl mas, no nosso século, Rietveld, por exemplo, criou 
o mesmo arranjo, completado por uma meia-porta, em sua 
famosa casa Schroder. Utrecht, 1924 159) . 
. ~ 
'-
DE DRIE HOVEN, LAR PARA IDOSOS 1601 
Em situações nas quais possa ser necessário um contalo 
entre o interior e o exterior - num [ar para idosos{ por 
exemplo, alguns dos moradores passam boa parte de seu 
tempo na solidão de seus próprios quartos por causa da 
mobilidade reduzida, esperando que alguém vá visitá-los, 
enquanto outros moradores que ficam do lodo de fora 
também gostariam de algum contato - , em tais situações, 
uma boa idéia é instalar portas qlm duas seções, de 
maneiro que o porte de cimo posso ser mantido aberto e a 
porte de baixo fechado. Essas "meio-portas" constituem um 
cloro gesto de convite: o porto está aberto e fechado 00 
mesmo tempo, i.e., suficientemente fechado para evitar que 
as intenções dos que estão lá dentro fiquem 
demasiadamente explícitos, mos aberto o bastante para 
fac ilitar o converso casual com quem está passando, o que 
pode levar o um contato mais íntimo. 
A concretização da soleira como intervalo significa, em 
primeiro luga r e acima de tudo~ criar um espaço para 
as boas-vindas e as despedidas, e, portanto, é a 
tradução em termos arqu itetônicos da hospitalidade. 
Além disso, a soleira é tão importante para o contato 
s'Ocia l quanto as paredes grossas para a privacidade. 
Condições para a privacidade e condições para manter 
os contatos sociais com os outros são igua lmente 
necessórias. Entradas, alpendres e mu itas outras 
formas de espaços de intervalo forn ecem uma 
oportunidade para a lIacomodaçãorl entre mundos 
contíguos . Esto espécie de dispositivo dá margem a 
certa articulação do edifício em foco, o que requer 
espaço e dinheiro, sem que sua função possa ser 
faci lmente demonstrável - e ainda menos quantificável -, 
e, por esse motivo, torna-se muitas vezes difícil de 
realizar, exigindo esforço e trabalho de persuasão 
constante durante a fase de planejamento. 
RESIDÊNCIAS DOCUMENiA URBANA (61-701 
O edifício em forma de meandro, denominado Ilserpente'!! 
é composto de segmentos, cada um deles proietado por 
arquitetos diferentes. As escadas comunitários foram 
colocadas numa situação de ampla lum inosidade, bem 
maior que a do espaço residual costumeiro, em geral de 
pouco luminosidade. 
Numa residência para váriosfamílias, o ênfase não deve 
recair exclusivamente sobre medidas arquitetônicas 
destinadas a prevenir o barulho excessivo e o 
inconveniência dos vizinhos; uma atenção especial deve ser 
dado em particula r à disposição espacial, que pode 
conduzir aos contatos sociais esperados entre os vários 
ocupantes de um mesmo edifício. Por conseguinte, 
atribuímos às escadas mais importância do que de costume. 
As escadas comunitárias não devem ser apenas uma fonte 
de aborrecimento no que diz respeito 00 acúmulo de 
suieira e à limpeza - devem servir também, por exemplo, 
como um playground para os crianças de famílias vizinhos. 
Por este motivo, foram proietadas com o máximo de luz e 
abertura, como ruas com telhado de vidro, e podem ser 
avistados das cozinhas. Os alpendres de entrado abertos, 
com duas portos, uma após o outro, expõem ao território 
comunitário um pouco mais de seus moradores do que as 
portas fechados tradicionais. 
Embora, naturalmente, tenho-se tomado cuidado poro 
assegurar a privacidade adequada nos terraços, os famílias 
vizinhos não estão de todo isolados umas das outras. 
Procuramos proietar os espaços exteriores de tal modo que 
o vedação necessário roube o mínimo possível dos 
DO MíNIO PÚBliCO 3S 
60 
61 
36 ti ÇÕES DE AIQUITETUIA 
••••• llIl . 
. II .~ li iD 'l!I : 
I!IIII 
62 63 
64 45 
6/, 67 
:ondições espaciais para cantatas entre os vizinhos. Tal 
, ,,cansão do espaço mínimo requerido para "finalidades de 
:":culação" mostrou-se capaz não apenas de atrair as 
:"ianças - serve também como um lugar em que as vizinhos 
;:odem se sentar e conversar. Neste caso os moradores 
': mbém providenciaram os equipamentos. 
Edifício à direito: O. Steidle, arquiteto. DaM·,N la PÚBLICO 37 
68 
69 
70 
Além da tradicional porta da frente, as moradias têm uma 
segunda porta de vidro que também pode ser trancada e 
que conduz à escada, obtendo-se assim um espaço de 
entrada aberto. Uma vez que esse espaço intermediário 
entre a escada e a porta da frente é interpretado de 
maneira diferente por pessoas diferentes - i.e., não apenas 
como parte das escados mas também como uma extensão 
da casa - , é usado por alguns como um hall aberto, no 
qual a atmosfera da casa pode penetrar. Deste modo, 
dependendo de qual das duas porias é considerada como a 
verdadeira porta da frente, os moradores podem expor sua 
38 IIÇÔES DE ARQUITETURA 
individualidade, em geral restrita à intimidade do lar, ao 
mesmo tempo em que a escadaria perde algo de sua 
característica de terra-de-ninguém e pode até adquirir uma 
atmosfera autenticamente comunitária. O princípio do 
caminho vertical para o pedestre, tal como aplicado no 
projeto habitacional de Kossel, foi posteriormente 
elaborado no conjunto habitacional LiMo em Berlim. 
As escadas desse conjunto conduzem a terraços 
comunitários nos telhados. No final , dec idiu-se que não 
seria necessário incorporar as varandas para lazer 
previstas no projeto de Kassel, já que o pátio isolado 
oferecia o espaço de lazer adequado, especialmente para 
as cnanças mOls novas. 
C IÉ NAPOlÉON, PARIS, 1849 / M. H. VEUGNY 171 ·74) 
' . Cité Napoléon, em Paris, fo i uma dos primeiros 
·~;'ltatjvas, e certamente a mais notável, de solução razoável 
:oro o problema da distôncio entre o ruo e o porto do 
'-ente num prédio residencial de muitos andares. Este 
=-3paço interior, com suas escadas e passarelas , evoca as 
,dificoções de vários andores de uma aldeia nos 
-contonhos. Uma razoável quonlidade de luz alcança os 
ondores mais altos através do telhado de vidro. 
Os moradores dos andores de cima obrem suas janelas 
;mo este espaço interior, e o presença de vasos de plantas 
"ostra, pelo menos, que os pessoas dão valor o esse 
2=tolhe. Embora não tenho sido possível - em que pesem os 
: oos intenções dos construtores - transformar esse espaço 
-.ierior (fechado como é em relação à rua lá foro) numa 
'!ia interno verdadeiramente funcional segundo nossos 
"cdrões, não há dúvida de que este exemplo se desloco de 
-caneiro brilhante, sobretudo quando se penso em todas 
oiuelos sombrios escadarias construídos desde 1849. 
,,- o 5 10 
IULJ 
71 72 
73 
DOMíNIO PÚBLICO 39 
75 
76 77 
7 DEMARCACÕES PRIVADAS , 
NO ESPACO PÚBLICO , 
o conceito de intervalo é a chave para eliminar a 
divisão rígida entre áreas com diferentes demarcações 
territoriais. A questão está , portanto, em criar espaços 
intermediários que, embora do ponto de vista 
administrativo possam pertencer quer ao domínio 
público quer ao privado, sejam igualmente acessíveis 
para ambos os lados, isto é, quando é inteiramente 
aceitável, paro ambos os ladosf que o "outro" também 
possa usá-lo. 
DE DRIE HOVEN, LAR PARA IDOSOS 175·77) 
Os corredores servem como ruas num edifício que deve 
funcionar como uma cidade para seus moradores, afetados 
por sérios limitações, jé que a maior porte deles é incapaz 
de deixar a éreo sem ajudo. As unidades de habitaçõo 
situadas ao longo desta Hrua" têm, aos pares, óreas 
semelhantes o alpendres, que, por um lodo, pertencem às 
habitações, mas, por oulro, também fazem parte da Hrua". 
Os moradores colocam suas coisas ali , cuidam deste espaço 
e com freqüência criam plantas e Aores ali , como se este 
fosse parte de suo próprio coso, uma espécie de varando 
no nivel do ruo. Embora o érea do alpendre seja 
completamente acessível aos transeuntes, permanece como 
parte da rua. 
É extremamente difícil reservar os poucos metros quadrados 
necessérios o um objetivo como esse dentro da infinita rede 
de regulamentos e normas que se referem às dimensões 
mínimas e méximas que governam cada um dos aspectos 
do projeto arquitetônico. 
No coso dos obrigas sociais, esse aspecto é considerado, 
40 liÇÕES DE ARQUITETURA 
do ponto de visto admin istrativo, como uma redução 
indevida do tamanho da unidade domiciliar, ou como uma 
expansão indevida do corredor: o funciona lidade de cada 
metro quadrado é, afinal, medida de acordo com a 
utilidade quantificáve l. O amor e o cuidado que os 
moradores investem neste espaço, que, estritamente, não é 
porle do apartamento, dependem de um detalhe 
aparentemente menor, ou seja, a janela que lhes permite 
vigiar os objetos que foram colocados lé fora, não só como 
uma precaução contra o roubo, mos simplesmente porque é 
agradável poder ver as próprias coisas ou verificar como as 
plantas vão indo. O arquiteto preciso de uma dose 
incomum de engenhosidade para que esta idéio consiga 
paslar pela vigilância cuidadosa das autoridades 
responsáveis pela prevenção de incêndios. 
Os quadros de luz no "De Drie Hoven" perto dos portas da 
frente foram instalados em pequenos muretas salientes, de 
tal modo que se pode colocar facilmente um to pete ao lado. 
! . 
Usando pedaços de tapete, os moradores se apropriam do 
cequeno espaço assim criado e o equipam, estendendo desta 
aneira os limites de sua casa além da porta da Irente. 
Se incorporamos as sugestões espaciais adequados em 
osso projeto, os moradores sentem-se mais inclinados 
c expandir sua esfera de inFluência em direção à área 
pública. Até mesmo um pequeno ajustamento, na 
forma de uma articulação espacial da entrada, pode 
ser o bastante para estimular a expansão da esfera de 
influência pessoal, e, deste modo, a qualidade do 
espaço público será consideravelmente aprimorada no 
;nteresse comum. 
; :;'OÊNCIAS DIAGOON 178·831 
:) que poderia ser leito com as calçadas nas "ruas 
":-sidenciais", se coubesse aos moradores a 
' .'ponsabil idode pelo espaço, pode ser imaginado com 
: :::Ee na experiência com as calçadas em frente às 
-ê;,dências Diagoon, em Delk. A área em Irente às 
-"adias não loi projetada como jardim; loi simplesmente 
!"3/!mentada como uma calçada comum e, 
:olseqüentemente, como parte do domínio público, 
~-bora , de modo estrito, não o seja . 
' L ;-; , 
. "-L 
!! óreas pertencentes às diversas casas não loram 
:~marcadas, e o layout não contém nenhuma sugestão de 
:;marcaçõo privado. A pavimentação loi leita com blocos de 
; :;;creto comum, o que desperta automaticamente associações 
:0'" uma rua pública porque as calçadas em geral são 
: :vimentadas com o mesmo material. Os moradores então 
':>meçaram a remover alguns dos blocos de concreto para 
d ocar plontas no lugar. "Dessous les pavés lo plage." 
~ resto dos blocos loi deixado intacto para proporcionar um 
~crminho até a porto ou um espaço para estacionar o carro 
:a lamília perto da casa. Cada morador usa a área em Irente 
: sua casa de acordo com suos necessidades e desejos, 
""" orparando a parte da área de que necessita e deixando o 
'esto acessível para o uso público. 
Se o layoul tivesse partido da idéia de áreas separadas, 
!:rivadas, então sem dúvida todos iriam usá-Ias ao máximo 
~m seu pró·prio benefício, mas surgiria uma divisão 
irreversivelmente abrupta entre o espaço público e o 
privado, em vez da zona intermediária que loi criada, uma 
lusão do território estritamente privado das casas e da área 
pública da rua. Nesta área de intervalo, entre o público e o 
privado, demarcações ind ividuais e coletivas podem 
superpor'se e os conllitos resultantes devem ser resolvidos 
mediante um acordo entre os partes. É aqui que cada 
morador desempenha o papel que revela o tipo de pessoa 
que quer ser e, por conseguinte, como deseia que os outros 
o vejam. Aqui se decide também o que o indivíduo e a 
coletividade podem olerecer um 00 outro. 
DOMi NIO PÚBLI CO 41 
78 
79 811 
81 81 
83 
85 86 
MORADIAS liMA [84·891 
O conjunto de moradias LiMa está localizado na ponta de 
uma área triangular, cuja esqu ina é ocupada por uma 
igreja. Os volumes desta igreja não se 'relacionam 
claramente com o alinhamento arquitetônico geral. 
42 LlÇÓES DE ARQUITETURA 
Construir nesta ilha triangular implica manter a igreja à 
parte como uma estrutura destacada e autônoma. O pátio é 
bastante diferente do tradicional e muitas vezes deprimente 
pátio berli nense, e sua concepção é a de um espaço 
público com seis caminhos de acesso para os pedestres, 
incluindo conexões com a rua e com o pátio vizinho. Estes 
caminhos para pedestres constituem parte das escadarias 
comunitárias. No centro do pá tio há um amplo tanque de 
areia dividido em segmentos, cuias laterais foram 
decoradas com mosaicos pelas próprias famí lias dos 
moradores . 
Não foi difícil despertar o entusiasmo dos moradores - os 
quais já estavam profundamente interessados no projeto do 
pátio - especialmente depois que eles viram as fotografias 
do parque de Gaudí e as Torres Waij. A ajuda técnica e 
organizacional foi fornec ida por Akelei Hertzberger, que 
empreendeu vários projetos semelhantes no passado com 
resultados igualmente bem· sucedidos. 
No começo, foram principalmente as crianças que 
contribuíram com seus "Iadrilhos", mas logo em seguida os 
adultos aderiram, trazendo qualquer pedaço de cerâmica 
que pudessem obter. 
I 
I 
I 
·enhum arquiteto hoje seria capaz de dedicar tanta 
::J lenção a um tanque de creiol nem isto seria necessário, 
:~'que é algo que pode ser deixado para os próprios 
-oradores. É di~ci l imaginar uma maneira melhor de 
'õmonder ao incentivo oferecido. Mas ainda mais 
l1portante é o fa to de que o tanque de areia se tornou 
o 80 que pertencia a eles e um objeto de seus cuidados: se 
. -, fragmento do mosaico cai ou revela ser pontudo 
:emois, por exemplo, algo seró fei to sem que haja 
,scessidade de reuniões especiais l cartas oficiais ou 
cocessos contra o arquiteto. 
Uma área de rua com a qual os moradores estão 
envolvidos, onde marcas individuais são criadas por 
eles pr,;prios, é apropriada conjuntamente e 
transFormada num espaço comunitário. 
DOMíNIO PÚBliCO 43 
87 88 
89 
8 CONCEITO DE 
OBRA PÚBLICA 
Conjunto residencial 
Biilmermeer, 
Amsterdam 
\\I 91 
92 
Fotomonfagem 
44 lIÇÕ,S Df ARQUIHTURA 
Projeto residencial Fomílistere, Guise, França 
o segredo é dar aos espaços públicos uma forma tal 
que a comunidade se sinta pessoalmente responsável 
por eles, fazendo com que cada membro da 
comunidade contribua à sua maneira para um 
ambiente com o qual possa se relacionar e se 
identificar. 
O grande paradoxo do concei to de bem-estar coletivo, 
tal qual se desenvolveu lado a lado com os ideais do 
socialismo, é que ele acaba subordinando as pessoas 
00 sistema que foi construído para libertá-Ias. 
Os serviços prestados pelos departamentos de Obras 
Públicas Municipa is são vistos, por aqueles em cujo 
benefício esses departamentos foram criados, como 
umo abstração opressiva; é como se as obras públicas 
fossem uma imposição vinda de cima; o homem 
comum sente que "não tem nada a ver com e le", e, 
deste modo, o sistema produz um sentimento 
generalizado de alienação. 
Ds jardins públicos e os cinturões verdes em volta dos 
il ecos de apartamentos nas novas áreas urbanas são de 
-~sponsobi lidade dos departamentos de Obras Públicas, 
que fazem o que podem para tornar essas áreas tão 
atraentes quanto possível - dentro dos li mites dos 
orçamentos alocados - em benefício da comunidade. 
Mas os resultados conseguidos desta maneiro não deixam 
de ser rígidos, impessoais e anti econômicos, comparados 
com os que poderiam ser alcançados se todos os moradores 
dos apartamentos tivessem a oportunidade de usar um 
pequeno pedaço de terra Imesmo que fosse apenas do 
tamanho de uma vaga de estacionamento) para seus 
próprios ob jetivos. 
O que foi negado à coletividade poderia ter sido o 
contribuição de cada morador da comunidade. O espaço 
poderia ser usado de modo mais intensivo se nele fossem 
investidos amor e cuidado pessoal. 
Um exemplo desta afirmação pode ser visto no Familistere 
em Guise, na França, um projeto de moradias construído 
para a fóbrica de fogões Godin: uma comunidade de 
moradores e trabalhadores moldado de acordo com as 
idéias de Fourier. Embora construída no século XIX, ainda 
conserva seu in teresse como um exemplo do que pode ser 
feito. 
MORADIAS VROESENlAAN, ROnERDAM, 1931-34 / J. H. VAN 
DEN BROEK 193,941 
As áreas de lazer e conforto comunitárias só podem 
florescer pelo esforço comunitário dos usuários. Essa deve 
ter sido a idéia subjacente aos espaços comunitários 
interiores - sem cercas e divisórias - que foram pro jetados 
nos anos 20 e nos anos 30. 
DOMíN IO PÚBliCO 4S 
95 DE DRIE HOVEN, lAR PARA IDOSOS 195) 
O espaço cercado contendo animais, que deve sua 
existência à iniciativa de um membro da equipe do "De 
Drie Haven" , desenvolveu-se até tornar-se um zoológico em 
miniatura, com um faisão, um pavão, galinhas, cabras, 
uma porção de patos num lago cheio de peixes, Paro os 
idosos que moram no lar, os animais compõem uma visto 
agradável e interessante, e os quartos com vista paro a 
menagerie são os mais procurados. 
Abrigos de fabricação caseiro poro os animais passarem a 
noite foram providenciados por entusiastas, mas, logo que 
esse esquema popular virou um sucesso e a expansão se 
tornou necessário, o Departamento de Inspeção de 
Moradias decidiu que as coisas não podiam mais continuar 
assim; estipularam então que era preciso submeter à 
aprovação de autoridades e comissões competentes uma 
planta de construção elaborado por profi ssionais, 
Poro a população loca l, o menagerie represento um convite 
ao envolvimento nos cuidados com os animais ou 
simplesmente um passeio para ver como eles estão, Quando 
é que as crianças da cidade vêem animais2 Os únicos que 
a maioria delas vê em seu ambiente são animais domésticos 
de estimação, cachorros presos em coleiras, já que parece 
impossível organ izar formas de posse coletiva de animais 
com divisão de responsabilidades pela suo manutenção, 
Uma idéio dessa natureza nem sequer é sugerida - os 
moradores locais, afinal, normalmente não exercem 
nenhuma influência na maneira como seus espaços 
comunitários são organizados e usados, Mos não podemos 
46 LIÇÕES DE ARQUITETURA 
. ': ~.~ :" , 
'/"'-: .,j 
esperar que o setor de Obras Públicas vá cuidar de animais 
por toda a cidade. Paro isso, seria ne<:essário um novo . 
departamento com funcionáriosespecializados, para não 
falar dos milhares de avisos dizendo "Não dê comida aos 
• • 1/ 
anImaiS. 
A distribuição dos espaços e os animais no "De Drie 
Hoven" constituem um fator de indução natural para o 
contato social entre os seus idosos moradores e a 
população local- dois grupos com limitações diferentes, 
Os moradores do lar são forçados pelas circunstâncias a 
ser estranhos na cidade, mas graças a "seu" jardim podem 
oferecer alguma compensação pora os outros - os quais, 
por sua vez, são estranhos na área do "De Drie Hoven", 
Estes exemplos servem para ilustrar como as melhores 
intenções podem levar à desilusão e à indiferença. 
As coisas começam a dar errado quando as escalas se 
tornam grandes demais, quando Q conservação e o 
administração de uma área comunitária não podem 
mais ser entregues àqueles que estõo diretamente 
envolvidos e se torna necessária uma organização 
especial, com sua equipe especializada, com interesses 
e preocupações próprios quanto à sua continuidade e, 
possivelmente, à sua expansão. Quando se atinge o 
ponto em que o principal preocupação de uma 
organizaçõo é assegurar a continuidade de sua 
existência - independente dos objetivos para as quais 
foi criada, ou seja, fazer pelos outros o que não se 
pode esperar que eles mesmos façam -, neste 
momento a burocracia assume o controle. As regras 
tornam-se uma camisa-de-Força de regulamentos_ 
O sentido de responsabi lidade pessoal perde-se numa 
burocracia sufocante de responsabilidades para com 
superiores. Embora não exista nada de errado com as 
intenções do elo individual nesta interminável cadeia 
de interdependências, elas se tornam virtualmente 
irrelevantes porque estão demasiado afastadas 
daqueles em cu jo benefício todo o sistema foi 
inventado. A razão pela qual os habitantes da cidade 
se tornam estranhos em seu próprio ambiente de vida 
é porque o potencial da iniciativa coletiva foi 
grosseiramente superestimado ou porque a 
participação e o envolvimento foram subestimados. 
Os moradores de uma casa não estão de fato 
preocupados com o espaço fora de seus lares, mas 
~'iÜ mbém não podem ignorá-lo. Esta oposição conduz à 
dienação diante de seu ambiente e - na medida em 
'~ue suas relações com os outros são influenciadas por 
ate - conduz também à alienação dia nte dos 
,,,,,:,,.oradores vizinhos, 
O crescimento do nível de controle imposta de cima 
~ra baixo está tornando o mundo à nossa volta cada 
~z mais inexorável: e isso abre caminho para a 
-'J.gressividade que, por sua vez, conduz a um 
>;:::1ri jecimento ainda maior da teia de regulamentos. 
o resultado é um círculo vicioso, a falta de 
c.omprometimento e o medo exagerado do caos 
,,= limentando-se mutuamente. 
A incrível destruição da propriedade pública, 
c~,;truição que está aumentando nas principais cidades 
"' .;) mundo, pode ser provavelmente imputada à 
-=1ienaçõo diante do ambiente de vida. O fato de que 
:;~. abrigos de transporte público e os telefones 
:viblicos venham senda, semana após semana, 
~~mpletamente destruídos é na verdade uma 
~~ormante acusação à nossa sociedade como um todo. 
!Jose tão alarmante, no entanto, é que essa tendência 
.- e sua escala - é enfrentada como se fosse um mero 
?foblema de organização: por meio do expediente de 
reporos periódicos, como se tudo não passasse de uma 
questão rotineira de manutenção, e da aplicação de 
retorças-extras ("à prova de vândalos") . Desta 
rr: oneira, a situação parece estar sendo aceita como 
' apenas mais uma dessas coisas". Todo o sistema 
repressivo da ordem estabelecida é gerado para evitar 
iConflitos, para proteger os membros individuais da 
i.omunidade das incursões de outros membros do 
~esma comunidade, sem o envolvimento direto dos 
.... , divíduos em questão. Isso explica por que há um 
!O::edo profundo da desordem, do caos e do 
.. esperado, e por que os regulamentos impessoais, 
.... objetivos'I, são sempre preferidos ao envolvimento 
pressoal. É como se tudo devesse ser regulamentado e 
quantificável, de modo que permitisse um controle total 
e criasse as condições para que o sistema repressivo 
da ordem nos torne locatários em vez de 
co-proprietários, subordinados em vez de participantes. 
Assim, o próprio sistema cria a a lienação e, embora 
afirme representar o povo, na verdade impede o 
desenvolvimento de condições que poderiam resultar 
num ambiente mais hospitaleiro. 
• O arquiteto pode contribuir para criar um ambiente 
que ofereça muito mais oportunidades para que as 
pessoas deixem suas marcas e identificações pessoais, 
que posso ser apropriado e anexado por todos como 
um lugar que realmente lhes "pertença", O mundo que 
é controlado e ad ministrado por todos e para todos 
terá de ser construído com entidades pequenas e 
funciona is, não ma iores do que as capacidades de 
cada um para mantê-Ias. Cada componente espacial 
será usado mais intensamente lo que valoriza o 
espaço), ao mesmo tem po em que se espera que os 
usuários demonstrem suas intenções. Mais 
emancipação gera mais motivação, e deste modo 
pode-se liberar a energia represada pelo sistema de 
decisões centralizadas. Isto constitui um apelo em 
favor da descentra lização dos responsabilidades, de 
sua restituição onde for possível, e em favor da 
delegação de responsabilidade a quem de direito -
para que possam ser tomadas medidas eficazes, para 
resolver os problemas da inevitável alienação diante 
do "deserto urbano", 
DOMíNIO PÚBliCO 47 
96 
9 A RUA 
Amsterdam, bairro 
operário, a vida nas 
ruas: bem diferente de 
hoie, mos lembre'se 
de como as moradias 
eram apertadas e 
inadequadas naquele 
tempo 
97 
9S 
Gioggia, It6lio. Ruo 
de convivência, sem 
trânsito. Procurando 
um fugor no sombra 
48 liÇÕES DE AlQUllfTURA 
Para além de nossa porta ou do portão do jardim, 
começa um mundo com o qual pouco temos a ver, um 
mundo sobre o qual praticamente não conseguimos 
exercer influência. Há um sentimento crescente de que 
o mundo para além de nossa porta é um mundo hostil, 
de vandalismo e agressão, onde nos sentimos 
ameaçados, nunca em casa. No entanto, tomar esse 
sentimento generalizado como ponto de partida para o 
planejamento urbano seria fatal. 
Certamente seria bem melhor voltar ao conceito otimista 
e utópico da "rua reconquistada", que podíamos ver tão 
claramente diante de nós há menos de duas décadas. 
Nesta visão, inspirada pelo prazer existencialista diante 
da vida no pós-guerra (especialmente o Provo, no coso 
da· Holanda), a rua é de novo concebida como o que 
deve ter sido originalmente, ou seja, um lugar onde o 
contato social entre os moradores pode ser estabelecido: 
como uma sala de estar comunitária. E o concei to de 
que as relações sociais podem até ser estimuladas pela 
aplicação eficiente ele recursos arquitetônicos pode ser 
encontrado em Team X e especialmente em FOTurn, 
onde, como um tema central, esta questão era 
repetidamente levantada. 
A desvalorização desse conceito de rua pode ser 
atribuído aos seguintes fatores: 
I 
I 
I 
i 
I 
l , 
I , 
• o aumento do tráfego motorizado e a prioridade que 
recebe; 
• a organização sem critérios de áreas de acesso às 
moradias, em particular as portas da frente, por causa 
de vias indiretas e impessoais de acesso, tais como 
galerias, elevadores, passagens cobertas (os 
inevitáveis subprodutos de construções muito altas) que 
diminuem o contato com o nível da rua; 
• a anulação da rua como espaço comunitário por 
-causa do assentamento dos blocos; 
• densidades reduzidas de moradias, enquanto o 
número de moradores por unidade também diminui 
ocentuadamente. Assim, o queda da densidade 
populacional vem acompanhada por um acréscimo no 
-espaço de habitações por moradores e na largura das 
ruas. A conseqüência inevitável é que as ruas de hoje 
estão bem mais vazias do que as do passado; a lém 
dissol o melhoria no tamanho e na qualidade das 
moradias significa que as pessoas passam mais tempo 
~entro de casa e menos na ruai 
• quanto melhores as condições econômicasdas 
~essoas, menos ela necessitam dos vizinhos, e tendem 
:;! fazer menos coisas juntas. 
A prosperidade crescente parecei por um lado, ter 
estimulado o individualismo, enquanto, por outro lado, 
permite que o coletivismo assuma proporções além da 
nossa compreensão. 
Devemos tentar lidar com esses fatores - ainda que o 
arquiteto seja incapaz de fazer mais do que exercer 
uma influência incidental nos aspectos fundamentais 
de mudança social mencionados acima - criando 
condições paro uma área mais viável de rua onde quer 
que seja possível. O que significa que isto deve ser 
feito no âmbito da organização espacial, isto é , por 
meios arquitetônicos. 
• Situações em que o rua serve como uma extensão 
comunitária das moradias são familiares a todos nós. 
Dependendo do clima, as partes ensolaradas ou as 
partes com sombra são os mais populares l mas o 
tráfego motorizado está sempre ausente ou pelo menos 
longe o bastante para não impedir que os moradores 
vejam uns aos outros e possam ser ouvidos. 
As ruas de convivência, que não servem mais 
exclusivamente como via de tráfego e que estão 
organizadas de tal modo que há também espaço para 
as crianças brincarem, estão se tornando uma 
presença cada vez mais familiar tanto nos novos 
conjuntos habitacionais quanto nos projetos de 
renovação - pelo menos na Holanda. Os interesses do 
Moradias Spangen. 
Rol1erdam, 1919 / 
M. Brinkman. Ruo de 
convivência, sem 
Irônsito. Procurando 
um lugar ao sol 
DOM iNIO PÚ Bli CO 49 
101 
100 101 
pedestre estão sendo finalmente levados em 
consideração, e com a instituição da woonerf (área 
residencial com severas restrições ao tráfego e 
prioridade total para os pedestres) com base jurídica, 
ele está reconquistando seu lugar ou, pelo menos, não 
é mais tratado como um Fora-da-lei. No entanto, ainda 
que os motoristas sejam obrigados a se comportar de 
modo mais disciplinado, seus veículos ainda constituem 
um embaraço, pois são tão grandes 8, em especial, tão 
numerosos, que ocupam cada vez mais o espaço 
público. 
MORADIAS HAARlEMMER HOUTTUINEN (100·109) 
O temo central no Haarlemmer Houijuinen é o rua como 
espaço de convivência, elaborada em associação com Van 
Herk e Nagelkerke. A decisão de reservar uma área de 
27 metros paro o trânsito - mais relacionada com politica 
do que com planejamento urbano - obrigou·nos a construir 
dentro desse limite de al inhamento imposto; como 
11 
J I......,",,' 
resultado, não sobrou espaço paro jardins nos fundos (que, 1 
de qualquer modo, ficariam permanentemente na sombral. 
Em suma, essas circunstâncias desfavoráveis - i.e., I 
orientação indesejável e ruido de trânsito - deixavam cloro .. , ,.----.,<1 
que o lado norte deveria acomodar a parede de fundo, e, 
deste modo, toda o ênfase recaiu automaticamente na rua 
de convivência do lado sul. Esta ruo de convivência é 
acessivel apenas para os carros dos próprios moradores e 
para os veículos de entregas; o foto de estar fechada ao 
tráfego motorizado em geral e também a sua largura de 
sete metros - um perfil inusitadamente estreito pelas 
padrões modernas - criaram uma situação capaz de evocar 
o antigo cidade. Os equipamentos necessários à ruo, tais 
como luzes, estacionamentos de bicicletas, cercas baixas e 
bancos públicos, estão distribuídos de tal modo que apenas 
uns poucos corras estacionados iá são o bastante poro 
SO LI ÇÕ ES DE AiQU l rETUi A 
obstruir a passagem de qua lquer tráfego adiciona l. Foram 
plantadas árvores para formar um centro a meio-caminho 
entre os duas seções da rua . As estruturos que se projetam 
a partir das fachadas - as escadas externas e as varandas 
- articulam o perfil da rua, fazendo-a parecer menos 
ampla do que os sete metros do frente de uma casa até a 
frente de outro . A conseqüência é uma zona que 
proporciona espaço para os terraços dos residências 
térreas. Estes canteiros com muros baixos não são maiores 
do que as varandas do primeiro andar; é claro que não 
podiam ser menores, mas a questão é saber se ficariam 
melhores se fossem maiores. Como oferecem bem menos 
privacidade do que as sacadas, podemos nos perguntar se 
os moradores do andar térreo não ficam em desvantagem, 
mas, por outro lado, o conlato imediato com os transeuntes 
e com as atividades gerais da rua parece ser atraente para 
muitas pessoas, especialmente quando a rua readquire algo 
de sua antiga qualidade comunitária. Foram deixadas 
faixas em aberto ao lado dos espaços privados externos; 
deli beradamente, ficou indefinida a organização dessas 
faixas . O departamento de obros públicos não resi stiu à 
oportunidade de pavimentar esses espaços. Os moradores, 
par sua vez, estão colocando plantas al i, apropriando-se 
grodativamente dessa área basicamente pública. 
A construção civil na Holanda tem a tradição de dedicar 
muita atenção aos problemas de acesso aos andares mais 
altos, e uma grande variedade de soluções foi desenvolvida 
no país - todas com o objetivo de dar o cada residência 
uma porta de entrada com o máximo de acesso possível 
pela rua. Na verdade, a solução que adotamos é apenas 
uma outra variação de um tema essencialmente antigo: a 
escadaria externa de ferro conduz a um patamar no 
primei ro andar, onde fica a parta do frente da moradia do 
andar de cima; daí a escadaria continua por dentro do 
DOMíNIO PÚSIICO SI 
103 
Rei;nier VinkeJeskode, 
Amsterdam, 1924 / 
1. C. van Epen 
105 10.\ 
107a 
107\ 
108 107, 109 
edifício, passando pelos dormitó rios do moradia do andar 
térreo até a moradia do andar de cima. 
As entradas para as moradias dos andares de cima, 
localizadas em "varandas públicas 11 com vista para a rua l 
não constituem obstáculo para as moradias do andar térreo, 
mas dão a estas uma espécie de abrigo para suas próprias 
entradas. Como as escadas são leves e transparentes, o 
espaço que fica embaixo delas pode ser totalmente usado 
para caixas de correio, bici cletas e para as brincadeiras das 
crianças. Houve um esforço considerável para separar as 
áreas de acesso às habitações dos andares de cima e os 
espaços de jardim em frente das habitações do andar 
térreo. Isso se reAete na definição clara das 
responsabilidades dos moradores quanto à limpeza de suas 
áreas de acesso. A ausência de uma definição assim tão 
clara resultaria sem dúvida numa uti lização menos intensa 
do espaço disponível para cada morador. 
o conceito da rua de convivência está baseado na 
idéia de que os moradores têm algo em comumj que 
têm expectativas mútuas, mesmo que seja apenas 
porque estõo conscientes de que necessitam um do 
outro. Este sentimento, no entantoj parece estar 
desaparecendo rapidamente de nossos vidas. 
A aFinidade entre os moradores parece diminuir à 
medida que aumenta a independência proporcionado 
pela prosperidade. Tal anonimato chega mesmo o ser 
elogiado pelos adeptos do coletivismo e da 
~entralização: se as pessoas se relacionam muito entre 
52 lIÇÕ f S Df ARQ Ul m URA 
Segundo ondar 
Primeiro andor 
Andor térreo 
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DO Mí NIO PÚ BLI CO S3 
" 
" 
110 11 1 
si, há o perigo de um excesso de I'controle social", 
eles argumentam. 
Na verdade, quanto mais isoladas e alienadas as 
pessoas se tornarem em seu ambiente diário, mais 
fácil será controlá-Ias com decisões autoritárias. 
Embora o "controle social" não tenha de ser negativo 
por definiçõo, ele sem dúvida existe e seus eFeitos 
negQth~os são sentidos quando não podemos fazer 
nado sem que sejamos julgados e vigiados pelos 
outros, como em toda comunidade muito concentrada, 
uma vi la, por exemplo. 
Devemos aproveitar todas as oportunidades possíveis 
poro evitar uma separação rígido entre habitações 
e para estimular oque restou do sentimento de 
participar de algo que nos é comum. 
Em primeiro lugarl esse sentimento de comunidade está 
presente em qualquer interaçõo social do cotidiano, tal 
como nas brincadeiras das crianças, no hábito de 
revezar-se para tomar conta das crianças, na 
preocupação em manter-se inFormado sobre a saúde 
do outro, em suma, em todos esses cuidados e alegrias 
que talvez pareçam tão evidentes que tendemos a 
subestimar sua importância. 
• As unidades de habitação funcionam melhor quando 
as ruos em que estão localizados funcionam bem como 
espaços de convivência, o que por sua vez depende 
particularmente de veriFicar o quanto são receptivos, 
i.eo, em que medida a atmosFera dentro das casas pode 
se integrar à atmosFera comunitária da rua lá foro. Isto 
: :;' -....' 
é determinado em grande parte pelo planejamento e 
pelo detalhamento do layou! da vizinhança. 
CONJUNTO HABITACIONAL SPANGEN, ROTTERDAM, 1919 / 
M. BRINKMAN 1110, 1111 
As galerias de acesso no coniunto habitacional Spangen de 
Roijerdam 119191 ainda não foram superadas no que diz 
respeito 00 que oferecem aos moradores. Como só existem 
portas da frente em um lado dessa '/rua de convivência" , os 
moradores têm como companhia apenas seus vizinhos 
imediatos. Isso é uma desvantagem em comparação com 
uma rua normal, onde naturalmente encontramos os 
vizinhos também do outro lado da rua. No entanto, em 
Spangen, o contato entre vizinhos é excepcionalmente 
intensol o que mostra como é importante a ausência do 
trônsito. Ainda assim I a interação que ocorre nos acessos 
da galeria não se estende à rua abaixo, onde ficam os 
fundos dos residências. Não se pode estar em dois lugares 
ao mesmo 'tempo. 
ALOJAMENTO PARA ESTUDANTES WEESPERSTRAAT (11 2·1151 
As unidades de habitação para os estudantes casados no 
quarto andar induziram à construção de uma rua·galeria, 
gue poderia ser vista como um protótipo poro uma rua de 
convivência, livre do trânsito e com vista paro os telhados 
da cidade velha. É um lugar seguro mesmo para as 
crianças pequenas, que podem brincar ali enquanto seus 
pais podem ficar sentados em frente às suas casas. 
O exemplo em gue esse proieta se baseou foi, na verdade, 
o complexo Spangen de 45 anos atrás. 
" .~ 
' ~l ' L~:=~J'L • ____ = 
54 JlÇÓES DE ARQUITETURA 
Um dos problemas nas ruas·ga lerias é a colocação das 
ianelas dos quartos de dormir: se se abrem para a galeria, 
surge a desvantagem de uma privacidade insuficiente. Essa 
situação pode ser melhorada ao se erguer o nível do chão 
do quarto de dormir, de modo que os que estão dentro 
possam olhar pela ia nela com suo visão acima das cabeças 
das pessoas que estão do lado de fora , ao mesmo tempo 
em que a ianela é alta demais para que os que estão do 
lado de fora possam olhar para dentro do quarto. 
O edifício como um todo acabou se tornando muito menos 
aberto, e, em conseqüência, a rua-galeria não é mais 
acessível ao público. 
PRINCíPIOS DE ASSENTAMENTO 111 61 
Pode-se ver como isto funciona, de uma forma elementar, 
nos princípios de assentamento adotados de um modo ou 
de outro em todos os proietos de moradia recentemente 
constru ídos. 
A procura por mais espaço e luz solar para todas as 
unidades habitacionais conduziu, no planeiamento urbano 
do século XX, ao abandono do até então habitual 
assentamento de quadras dentro do perímetro. 
O resultado foi a perda do contraste entre a reclusão 
tranqüilo dos pátios cercados e o agitação e o barulho do 
DOM íNIO PÚBli CO SS 
112 
113 
114 11 5 
11 60. 
117 IIB 119 
trânsito do ruo adjacente. As fachadas dando poro as ruas 
eram as frentes (e por isso os arquitetos concentraram seus 
esforços nelas), enquanto as fachadas mais informais dos 
fundos, com suas varandas e varais de roupa - algumas 
favorecidas por sua orientação, outros muito ao contrário-/ 
formavam o chamado lado de convivência. Este arranja foi 
superado pelo assentamento em faixas, com habitações de 
duas frentes, o que criou a possibilidade de colocar todos 
os jardins ao lado (diagrama a). É importante compreender, 
porém, que com esse tipo de layoul todas as portas da 
frente de uma ~Ieira de casas dão para os jard ins da 
próxima fileira. Assim, todo o mundo vive numa meio·ruo t 
por assim dizer, com os espaços entre os blocos sendo 
essencialmente os mesmos em vez de se alternarem entre o 
espaço do jardim e o espaço da rua. Incidentalmente, a 
principia de assentamento em faixa permite esta forma de 
alternância no medida em que a orientação seja adequado 
(diagrama bJ, mas, mesmo se este não for o casa, vale a 
peno esforçar-se para assegurar que os frentes dos blocos 
(isto é, onde as portos do frente estõo localizadas) fiquem 
uma em frente à outra (diagrama c). Se as entradas das 
habitações ficam uma em frente à outra, todos olham poro 
o mesmo espaço comunitário - você pode ver as crianças 
S6 liÇÕ ES DE ARQUITETURA 
do vizinho saindo apressadas de manhã para a escola lo 
seu relógio está atrasada de novo?). 
Mas ter uma visõo completa de seus vizinhos também pode 
estimular o bisbilhotice, motivo pelo qual, com esse tipo de 
assentamento, é ainda mais importante, do que com o lipo c, 
que as janelas e as partos da frente sejam posicionadas com 
bastante cuidado em relação às da casa oposta, de tal modo 
que se possa oferecer a cada entrada pelo menos alguma 
privacidade, capaz de protegê-Ia contra a indiscrição 
excessivo . No caso dos tradicionais esquemas de quadras 
fechadas de moradias, todos os jardins e todas as entrados 
ficam uns em frente aos outros. As áreas dos jardins têm 
partanto uma natureza diferente daquela das áreas da nua. 
ROYAl CRESCENTS, BATH, INGLATERRA 1767 / J. WOOD, J, NASH 
1117·1191 
Embora certamente nõo tenham sido pro jetadas com o 
objetivo de contribuir para a interação de vizinhos, as 
fachadas curvas dos "crescentes" de Bath sõo 
particularmente interessantes nesse aspecto, 
Por causa do concavidade da curva, as casas dão uma 
para as outras, É o mesmo efeito de quando estamos num 
trem e os trilhos descrevem uma curva: par um momento 
podemos ver os outros vagões cheios de passageiros, cuja 
presença não tínhamos notado ainda. Uma fachada curva 
com as cosas voltadas poro a mesma área contribui para a 
natureza comunitária do área . 
Enquanto o lado côncavo de uma fachada pode encora jar 
o sentimento de comunidade, o lodo convexo dos fundos 
faz com que as casas, por assim dizerl se distanciem umas 
das outras, contribuindo assim para a privacidade dos 
jardins. A solução dos crescentes contempla os dois 
aspectos. 
RÓMERSTADT, FRANKFURT, ALEMANHA, 1927-28 / E. MAv 1120-1231 
Ernst May, como seu colega mais fa moso, Bruno Taut, está 
entre os mais importantes pioneiros do construção de 
moradias no Alemanha. Os numerosos complexos 
habitacionais que construiu em Frankfurt no período 
1926-1930 mostram como tinha uma percepção aguçado 
dos detalhes urbanos que podem melhorar os condiçães de 
vida. A lição que ele ensino é que plantas muito monótonos 
de loteamento, que em geral resultam dos orçamentos 
limitados para o habitação social, podem ser transformados 
num excelente ambiente de moradia, apesar dos meios 
limitados, no medido em que os plantas sejam 
desenvolvidos com um sentido adequado de orientação e 
de proporção. 
Naturalmente, é importante compreender que o arquitetura 
dos moradias e o projeto do ambiente à suo volto foram 
entregues à responsabilidade do mesmo homem, que, além 
disso, não fez nenhuma distinção entre a arquitetura e o 
planejamento urbano, conseguindo assim ajustar moradias 
e ambiente de tal modo que se tornaram portes 
complementares de um todo único. 
O conjunto habitacional Rõmerstadt está situado num suave 
decl ive às margens do rio Nidda. As ruas paralelos seguem 
o direção do vale. Embora pudesse parecer evidente, neste 
caso, com ruas em terraço, planejar coerentemente os 
'ardins no encosto do vale, decidiu-se colocar os portos de 
entrado dos fileiras de cosas uma diante do outra de ambos 
os lodosdo cominho. A desigualdade entre os dois lodos 
de entrado, resultado do orientação e de uma Ileve) 
diferença de nível, foi compensado pelo organização do 
espaço do ruo de tal modo que os cosas que ficavam do 
lodo com jardins situados menos favoravelmente tinham 
uma área verde no frente. 
Um detalhe caracteristica é que o pavimentação do calçado 
termino um pouco antes do fachada , deixando uma estreito 
faixa nua bem 00 lodo do parede do lodo norte. Este é um 
espaço óbvio para os plantas, e os trepadeiras podem subir 
pelo fachada , amenizando o suo rigidez. 
HET GEIN, MORADIAS 1124-1281 
O layoul do conjunto habitacional "Het Gein" em Amersfoort 
é de tal ordem que a ênfase recai especialmente sobre o 
qualidade dos ruas de convivência. O terreno foi dividido, 
no medido do possivel, em blocos retos e longos e ruas 
paralelos. À primeiro visto, isto oferece menos, e não mais 
variedade que o layoul convencional, mos a idéia é que 
ruas retas e tranqüi los constituem um ponto de partido mais 
adequado poro as variaçães dentro dos loteamentos. É 
como um sistema de urdidura e tramo: enquanto o urdidura 
1985 
" I 
--, t Pie • 
.-
18.00 
p, 
'" 
DOMíNIO PÚ BLICO 57 
120 
121 
122 
123 
1934 
lU 125 
127 
116 128 
las ruas) num pedaço de pano constitui uma estrutura for te 
lainda que sem cores se for necessário}, o tramo dá cor ao 
tecido. Um requis ito importante, porém, é que os ruas de 
convivência sejam mantidas livres do trânsito tanto quanto 
possível. Deu-se muita atenção aos perfis das ruas; eles não 
apenas são essenciais para a qualidade de cada moradia 
individual, como também para a maneira como estas se 
inter-relacionam. As fachadas e, por conseguinte, também 
as portas das moradias ficam uma defronte da outra, duas 
a duas, nos dois lados da rua. As ruas têm orientação de 
sudeste para noroeste, o que significa que um lado recebe 
mais sol do que o outro. É por isso que as ruas estão 
assimetricamente organizadas: os espaços de 
estacionamento ficaram num único lodo do ruo - o lado do 
sombra. O outro, o lado do sol, tem uma amplo área 
verde. As habitações com as portos da frente poro o lodo 
do sol e, por conseqüência, com jardins do lodo com mais 
sombra foram compensadas com um espaço extra 11,80 m 
de largura) ao longo da fac hada, que pode ser usado para 
58 LIÇÕ ES OE AlQU IIET URA 
instalar alpendres cobertos, estufas, toldos e outros 
confortos individuais. Estes acréscimos foram fornecidos por 
nós logo no início paro uma série de moradias, o que pode 
estimular os ocupantes de moradias semelhantes a seguir 
estes exemplos, se tjver~m os recursos para isso. A maneira 
como esta zona vier a ser usada por todos os envolvidos 
constituirá a principal fonte de diversidade - não como 
resultado do pro jeto, mas sim como expressão de escolhas 
individuais. Algumas dessas habitações possuem extensões 
no telhado, também existe a garantia de que no futuro 
serão permitidos mais acréscimos numa zona especialmente 
designada para isso. Os galpões dos jardins estão 
localizados perto da caso ou no jardim, dependendo das 
condiçães de luminosidade. Nos jardins parcialmente 
cobertos pelo sombra, isso ainda possibilita o criação de 
um lugar ensolarado com alguma proteção. Os loteamentos 
com uma orientação mais favorável têm o galpão perto do 
coso, de modo que se torno atraente construir algum tipo 
de conexão no espaço entre os dois. 
ACESSO AOS APARTAMENTOS 
As moradias devem ser tão diretamente acessiveis quanto 
possível 9, de preferência, não muito afastadas da rua, 
como em geral acontece nos edifícios de muitos andares. 
Sempre que, como no caso dos apartamentos, você só pode 
chegar à sua casa indiretamente, através dos halls 
comunitários, elevadores, escadarias, ou galerias, há o 
risco de que estes espaços comunitários sejam tão anônimos 
que desencorajem 05 contatos informais entre os moradores 
e acabem degenerando numa vasta terra-de-ninguém. 
Ainda que se leve em consideração a necessidade de certo 
grau de privacidade para cada unidade nos edifícios de 
muitos andores, as pessoas que moram ao lado, acima ou 
abaixo, têm muito a ver umas com as outras, embora faltem 
condições espaciais para isso. Além disso, num bloco de 
apartamentos, é difícil saber onde receber os amigos e 
onde se despedir deles. Devemos acompanhá-los até a 
porta da frente e deixá-los descer sozinhos as escadas ou 
devemos ir com eles até onde o carro ficou estacionad02 
E quanta trabalheira na hora de colocar a bagagem no 
carro quando estamos saindo num feriado l Se as crianças 
ainda são pequenas demais para brincar sozinhas do lado 
de fora, a situação é verdadeiramente problemática. 
Em bairros residenciais devemos dar à rua a qualidade 
de uma sala de estar, nõo só para a interação 
cotidiana como também para as ocasiões especiais, de 
modo que as atividades comunitárias e as atividades 
importantes para a comunidade local possam ser 
realizadas ali. 
"A diversão começa, 
opronfando o carro e 
o trailer." Do Guia 
Turístico ANWB 
A rua também pode ser o lugar para atividades 
comunitáriasr tais como a celebração de ocasiões 
especiais que dizem respeito a todos os moradores 
locais. É impossível projetar a área da rua de tal modo 
que as pessoas resolvam subitamente fazer juntas as 
refeições do lado de fora. 
Mesmo assim, é uma boa idéia guardar este tipo de 
imagem no funda da mente como uma espécie de 
padrão ao qual o projeto dever em princípior ser 
capaz de corresponder. Embora as pessoas nos países 
Ruo residencial, 5axmundhom, Inglaterra, 1887. "Ce/ebrando o Jubileu do 
Rainha Vitória. No década de 1880, o popularidade da rainha Vitória 
havia sobrepujado os primeiras ondas de republicanisma, e atingiu seu 
clímax nos Jubileus de 1887 e 1897, época em que foi amado e 
reverenciada como nenhum outro monarca britânico. Observe que um 
policial, no centro da fotografia, com a iarro na môo direita, está entre 05 
Funcionários que ajudam a servir o população. O dia está bem q~uente pois 
muit05 senhoras na mesa do lodo direito abriram suas sombrinhas para se 
proteger do sol. Um rosto queimado de 501 em uma mulher ero, 
naturalmente, uma coisa o ser evitada o qualquer custo coso quisesse 
manter algum tipo de posição social." (Gordon Winter, A country comera, 
1844- 191 4, Penguin, Londres) 
Rua da co,,"':-' ~ =:. 
Hamburgo, e~· ."".""; :. 
Lowenslrasss = :: 
Falkenried, A;=.- :. •• : 
130 
131 
129 131 
oOM íNIO PÚ8l1CO 59 
133 
IJj 
135 
131 
nórdicos não tenham o hábito de fazer refeições do 
lado de fora, isto acontece de vez em quando, e, deste 
modo, deveríamos zelar para que isto não se tornasse 
impossível a priori pela organização espacial do lugar. 
Talvez as pessoas se sintam até mais inclinadas a dar 
novos usos aos espaços públicos se as oportunidades 
para fazê-lo forem oferecidas explicitamente. 
Tão importante quanto a disposição relativa das 
unidr:des residenciais umas em relação às outras é a 
colocação das janelas, das sacadas, das varandas, 
terraços, patamares, degraus das portas, alpendres -
para verificar se têm as dimensões corretas e como 
estão espacialmente organizadas, i.e., separadas 
adequadamente, mas não de modo excessivo. 
É sempre uma questão de achar o ponto de equilíbrio 
capaz de fazer com que os moradores possam 
refugiar-se na privacidade quando o quiserem, mas 
que possam também procurar contato com os outros. 
A esse respeito, têm uma importância crucial o espaço 
em volta da porta da frente, o lugar onde a casa 
termina e onde começa o espaço da rua de 
convivência. O que a moradia e a rua de convivência 
têm a se oferecer mutuamente é que determina o bom 
ou mau funcionamento de ambos. 
FAMllISTERE, GUISE, FRANÇA 1859-83 (133-136) 
O Familistere de Guise, no norte da França, constitui um 
conjunto de moradias criado pela fábrica de fogões Godin 
de acordo com as idéias utópicas de Fourier. O complexo 
compreende 475 unidades de moradia, divididas em três 
blocos contíguos com pátios internos,assim como uma série 
de instalações como creche, escola e lavanderia. Nos 
amplos pótios cobertos do Familistêre de Guise, as moradias 
à sua volta constituem literalmente os mu ros. Embora a 
forma do pátio e a maneira como as portas do fren te estão 
situadas ao longo das galerias lembrem um presídio e nos 
impreSlionem hoje como algo primitivo, este antigo ' bloco 
de apartamentos" é ainda exemplo proeminente de como 
rua e moradia podem ser complementares. Além diSlo, o 
fato de que eSles pátios estejam cobertos com um telhado os 
torna extremamente convidativos para atividades 
comunitárias tais como aquelas que aparentemente foram 
exercidas aqui no paSlado, quando o complexo de 
moradias ainda funcionava como uma forma autenticamente 
coletiva de habitação. 
"Qualquer tentativa de reformar as relações de trabalho 
está condenada ao fracaSlo , a menos que seja 
acompanhada por uma reforma da construção com o 
objetivo de criar um ambiente confortável para os 
trabalhadores, que esteja completamente sintonizado com 
suas necessidades práticas e também com o fim de fornecer 
aceSlo aos prazeres da vida em comunidade, que todo ser 
humano merece desfru tar." 
(A. Godin, Solutions $odeJes, Paris, 1984) 
60 liÇÕES DE ARQUl1frURA 
DE DRIE HOVEN, lAR PARA IDOSOS (137-1 40) 
\los hospitais, lares poro idosos e grandes comunidades de 
'eor semelhante, o mob ilidade restrito dos moradores torno 
'mperativo conceber o plano quase lite ra lmente como uma 
cidade em escola reduzido. No coso do De Drie Hoven, 
'udo tinha de ser acessível em uma distância relativamente 
:Jrta sob o mesmo teto, porque quase ninguém é capaz de 
jeixar o lugar sem ajudo . Graças às grandes dimensões do 
_cr, foi possível realizar um programo abrangente de 
,~rviços de ta l ordem que o insti tuição pôde aproximar-se 
co natu reza de uma cidade também neste sentido. 
::'5 moradores acomodaram-se a seu ambiente como se ele 
:>sse uma comunidade de aldeia. 
:,rtemente influenciado pelo noção de restituição da 
.organização, o complexo foi dividido em um determinado 
-Jmero de I/olos"/ cada uma com seu próprio IIcenfro", 
Js diversos departame.ntos desembocam numa /Isola 
:omum" central. Esta disposição dos espaços gerou uma 
,oqüência de áreas abertas que, do ponto de vista espacial, 
-~~lete a seqüência: centro de vizinhançal centro de 
comunidade, centro de cidade - um todo compásito dentro 
:':: qual cada lIc1areiro" ou área aberta possui uma função 
específico. Este padrão é dominado pelo "pátio" central, 
que os próprios moradores chamam de "praça da aldeia" . 
Esta "praça da aldeia" não é, estritamente falando, 
bordejada pelos unidades de moradia, como acontece por 
exemplo com os pótios cobertos no Familistere de Guise, 
mas, na medida em que o uso e as relações sociais estão 
envolvidas, constitui o foco do conjunto. É onde acontecem 
todos as atividades que são organizadas pela e para o 
comunidade de moradores: festas, concertos, espetáculos de 
dança e de teatro, desfiles de modo, fe iras, apresentação 
de corais, noites de jogos de cartas, exposições e refeições 
festi vos em eventos especiais! Algo especial acontece ali 
quase que diariamente. Esta "praça do aldeia' é uma 
interpretação bastante livre do auditório convencional para 
eventos especiais, que poderia ficar sem uso metade do 
tempo, se fosse uma solo separada, de localização menos 
central. 
OOM iNIO PÚBlICO 61 
137 138 
139 140 
141 142 
1/3 W 
ESCOLA MONTESSORI, DWT 11'1, WI 
No Escola Montessori, o hal/ comunitório foi concebido de tal 
modo que se relaciono com os solos de aula como uma rua se 
relaciona com as casas. A relação espacial entre as salas de 
aula e o hal/, assim como a formo do hal/, foram concebidas 
como a Ilsalo de estar comunitáriaR da escola. A experiência 
de como isso funciona na escola} por sua vezl pode servir 
como modelo poro o que poderia ser feito numa rua. 
KASBAH, HENGElO 1973 / p, BlOM (1 '3, I "I 
Ninguém esteve mais ativamente engaiado no busco de 
. reciprocidade entre moradia e espaço da rua do que Piet 
Blom. Enquanto o proieto Kasbah (ver Forvm, 7, 1959 e Forvm, 5, 
1960·611 estava preocupado especialmente com O que a 
própria disposição das moradias podia gerar, na "área 
urbana" criada em Hengelo as moradias não formam os 
muros da rua mas sim " o telhado da cidade", deixando o 
grande espaço ao nivel do chão para todas as atividades 
62 lIÇÓES DE AROUITElUIA 
comunitárias e eventos, No entanto, só se faz um uso 
incidental das excepcionais oportunidades de espaço que 
são oferecidas aqui. 
Hó uma boa lição para ser aprendida aqui. As moradias 
eslão isoladas demais da rua embaixo - estão, por assim 
dizer, removidas para longe dela, voltadas para cima, e 
não se pode ver bem a rua das janelas, e até mesmo as 
entradas estão posicionadas indiretamente à rua. Nesse 
sentido, a forma do espaço da rua, como uma espécie de 
cantraforma das moradias, não crio as condições para o 
uso diório. Além disso, esse espaço é provavelmente amplo 
demais para ser preenchido, porque não hó diversões 
suficientes para tal- diversões que poderiam existir de fala 
numa vila autônoma do mesmo lamanho. 
Mas tente imaginar um esquema assim no coração de 
Amsterdam, com um mercado movimentado no rua 
embaixo! Este deve ter sido o tipo de situação que Piet Blom 
imaginou quando concebeu este proieto. 
'. 
i 
!!'I!----J ! 
Ao abandonar o principio do assentamento tradicional 
d~s blocos, os arquitetos tentaram, inspirados 
especialmente por Teom X e Farum, inventar uma 
tendência de novas formas de moradia. Essa tentativa 
conduziu muitas vezes a resultados espetaculares, mas 
a questão de que venham a funcionar de maneira 
adequada é algo que só parcialmente irá depender da 
qualidade das próprias moradias. Um aspecto pelo 
menos tão importante quanto esse está na 
possibilidade de o arquiteta descobrir um caminho, 
usando as moradias como seu material de construção, 
para fazer uma rua que funcione adequadamente. 
A qualidade de uma depende da qualidade da outra: 
casas e ruas são complementares! 
Que o resultado destas construções seja com 
freqüência desapontador, deve~se muitas vezes às 
idéias equivocadas dos arquitetos a respeito do modo 
(omo o espaço reol dos ruas será vivenciado e usado. 
Além da tendência que eles têm em confiar 
excessivamente na eficácia de medidas específicas (o 
~ue muitas vezes se mostra menos viável do que se 
?ensava), o erro mais comum consiste no cálculo 
errado da proporçõo entre a dimensão do lugar 
;>úblico e o número esperado de usuários. 
Se o área da rua é ampla demais, pouca coisa 
:lcontece em poucos lugares, e, apesar de todos as 
'ecos intenções em sentido contrário, o resultado são 
~astos espaços transformados em I'desertos" 
simplesmente por ficarem vazios demais. Muitos 
, rojetos - ainda que bem concebidos - Funcionariam 
'satisfatoriamente se ao menos uma feira funcionasse 
di num sábado ensolarado: o tipo de feira que se 
pode imagin~r facilmente, mos que na rea lidade existe 
cpenas na proporção de uma para cem mil moradias. 
'Jevemos testar continuamente a planta no que diz 
{espeito à densidade da população, indicando grosso 
~oc:lo no projeto o número esperado de pessoas a 
-iczer uso das diferentes áreas em diversas situações. 
Ao fazê~lo, podemos pelo menos verificar. se existe um 
excesso de espaço para recreação, por exemplo. 
Em bora os vastos espaços estimulem a imaginação do 
l~ rquiteto por terem certa atmosfera de serenidade, 
r. ão é certo que o população local sinta o mesmo. Para 
moradias e edifícios em geral pode ser formulada uma 
; rande variedade de formas, contanto que o espaço 
~Q rua seja criado de maneira que sirva como um 
::.gente catalisador entre os moradores locais em 
3'ituações cotidionos, para que, pelo menos, não 
aumente a distância entre os moradores, tantas vezes 
encerrados em moradias hermeticamente fechadas. 
A organização espacial devei em vez disso l servir 
?ara estimular a interação e o coesão social. 
" 
1 
-~. 
Lo. _.: 
, 
... .. ····: 1 Via Mazzanfi, 
Verona, lfá/ia 
DOMíNIO PÚBliCO 63 
10 O DOMíNIO PÚBLICO 
Passeata estudantil no Gol/erio Viftorio Emanuele, Milão. 
·Com a revolta dos estudantes, a educação retornou ó cidade e às ruas e, assim, encontrou um campo 
de experiência rico e diversificado, mais formador ql1e o oferecido pelo antigo sistema escolar. Talvez 
estejamos entrando em uma ero em que educação e experiência foto/ coincidirão novamente, em que 
a escolo como instituição estabelecido e codificado não ferá mais motivo para existir. " 
(do artigo "Architecture cna Educo/ion", Gioncorfo de Cor/o, Horvord Educo/ion Review, J 969) 
147 
].t8 IA9 
Se as casas são domínios privados, a rua é o domínio 
público. Dar igual atenção à moradia e à rua significa 
tratar a rua não apenas como o espaço residual entre 
quadras residenciais, mas sim como um elemento 
fundamentalmente complementar, espacialmente 
64 liÇ ÕES DE ARQU ITETURA 
organizado com tanto cuidado que possa criar uma 
situação na qual a rua passa servir a outros objetivos 
além do trânsito motorizado. Se a rua como uma 
coleção de blocos de edifícios é basicamente a 
expressão da pluralidade de componentes individuais, 
na maior parte privados, a seqüência de ruas e praças 
como um todo constitui potencialmente o espaço em 
que deve tornar-se possível um diálogo entre os 
moradores. 
A rua foi, originalmente, o espaço para ações, 
revoluções, celebrações, e ao longo de todo a história 
podemos ver como, de um período para o outro, os 
arquitetos projetaram o espaço público no interesse da 
comunidade a que de fato serviam. 
Este, portanto, é um apelo para se dar mais ênfase ao 
tratamento do domínio público, para que este possa 
funcionar não só para estimular a interação social 
como também para refleti-Ia. Quanto a todo espaço 
público, devemos nos perguntar como ele funciona: 
para quem, por quem e para qual objetivo. 
Estamos apenas impressionados por suas proporções 
ou será que ele talvez sirva para estimular melhores 
relações entre as pessoas? 
Quando uma rua ou praça nos impressiona como bela, 
não é somente por causa das dimensões e proporções 
agradáveis, mas também pela maneira como ela 
funciona dentro da cidade como um todo. Este aspecto 
não precisa depender apenas dos condições espaciais, 
embora estas muitas vezes ajudem, e estes casos 
obviamente são exemplos interessantes para o 
arquiteto e para o planejador urbano. 
PALAIS RoYAL, PARIS, 1780 / J. V. LUIS 1148·1501 
Em 1780, foram construídas filas de casas com galerias de 
Ioias nos três lados do que antes foro o iardim do Palais 
Royal em Paris. Hoie é um dos espaços públicos mais 
IJI[][I] 
v ···· 
0 0 'O' 00 00 00 00 00 sg o 88 
00 00 
00 00 
' abrigados" da cidade, ao mesmo tempo em que serve 
como um importante atalho da área do Louvre até a 
Biblioteca Nacional. O pequeno parque oblongo extrai sua 
qualidade espacial e sua atmosfera agradável não apenas 
das proporções seguras dos edifícios regularmente 
articulados à sua volta, mas também do laroul 
divers ificado, com áreas de grama, cadeiras, bancos, 
tanques de areia e um café ao ar livre para os moradores 
da cidade escolherem à vontade. 
PRAÇA PÚBUCA, VENCE, FRANÇA (151) 
Em países de clima quente, a rua adquire naturalmente 
mu ito mais importância na vida das pessoas do que nas 
países de clima frio. Praças públicas como as de Vence são 
encontradas em todas as aldeias e cidades dos países 
mediterrâneos. Em muitos lugares a turismo deteriorou 
drasticamente o estilo de vida e, como conseqüêncio, 
iambém a função dos espaços públicos, mas, apesar de 
·udo, esses espaços ainda são extremamente adequados 
cara as atividades comunitárias - e talvez ainda mais 
~estes tempos de mudança, como demonstram, por 
exemplo, os concertos ao ar livre organizados para os 
~ri stas. 
'OCKEFEllER PlAZA, NOVA YORK (152) 
A Rockefel ler Plaza, no coração de Nova York, funciona até 
mesmo no inverno como uma espécie de sala de estar 
'Jrbana, em que pessoas de todo porte vêm patinar no gelo. 
Os patinadores mostram suas proezas para os 
espectadores, e, embora não haja muita coisa acontecendo, 
rranseuntes podem experimentar cerfo sentimento de 
companheirismo, o tipo de sentimento que se pode esperar 
num teatro, numa igre ja ou em qualquer outro lugar onde 
es pessoas se reúnam, e que aqui surge espontaneamente, 
em parte graças às condiçães espaciais que foram criadas. 
150 
DOMiNIO PÚSl ICO 65 
151 
151 
153 Ilj 
155 
PIAZZA DEL CAMPO, SIENA, ITÁLIA {I 53-I 551 
Se há algum espaço público cuja forma fechada e 
localização excepcional dão a impressão de uma sola de 
eslar urbana, a Piazza dei Campo, em Sieno, é esle lugar_ 
Embora um tanto centrada no seu interior, com seus edifícios 
algo ausleros dominados pelo Pallazzo Communale, sua 
cavidade em forma de pires irradiando-se em becos 
íngremes crio uma olmosfera de oberluro e luz. O lodo 
ensolarado do piazzo eslá cheio de cafés ao ar livre que 
são freqüentados o ano inteiro, especialmente por turistas. 
66 liÇÕES DE ARQUITETURA 
1; '~, 
. "- . '~"'.i 
~ .. _- -. 
. :" r-- .. 
A siluação muda complelamenle quando é realizado o 
Palio dell Conlrade, uma corrida de cava los cujos 
compeli dores represenlam os vários bairros da região. Esle 
evento anual, que é ao mesmo lempo uma cerimônia e uma 
dispula, lança um fe iliço em lodo a cidade e em sua 
população, e esle adorável espaço em formalo de concha 
se enche com uma mullidão que ocupa as parles lalerois do 
praça e desfrula uma boa visão da corrido dispulada no 
centro. 
Em lais ocasiões, as cafés 00 ar livre dão lugar às Iribunos, 
e as janelas de cada residência ficam apinhadas seja de 
espectadores poganles, seja de amigos da família _ E, na 
véspera da compelição, 15 mil pessoas jonlam nas ruas de 
lodos os bairros_ 
PIAZA MAYOR, CHINCHÓN, ESPANHA {156, 15/1 
Em Chinchón, uma pequena cidade ao sul de Madri, a 
praça do mercado cenlral se Iransformo numa arena por 
ocasião da corrida de louros anual. Esla plaza, com a 
forma de um anfilealro grego e siluada no depressão da 
encosta de uma colina, está inteiramente cercada por 
edifíc ios, com lojas e cafés nas galerias e moradias na 
parle 0110. 
Todas eslas moradias lêm varandas de madeira que vão de 
um lado da fachada até o oulro, unindo-se para formar um 
círculo conlínuo de fileiras, dando de frenle para a praça. 
Quando há uma lourada, as varandas se Iransformam em 
Iribunas, com filas de ossenlos que os moradores vendem 
para ganhar um dinheiro exlra. Eslas moradias 
~" . 
,' o 
oarticulares, local izadas em lugares proeminentes e 
estratégicos na vida da comunidade, assumem 
:emparariamente condição pública. 
Todas essas varandas, construídas segundo os mesmos 
princípios como uma área adicional de madeira sustentada 
por vigas em fachadas relativamente fechadas 
- evidentemente tendo em vista essa função pública 
~d i cional -, acabam por formar um grande espaço 
, nificado, semelhante ao teatro italiano clássica com suas 
i!eiros vertica is de camarotes. 
rONTE DtONNE, TONNERRE, FRANÇA (158) 
~ugores comunitários para a lavagem de roupa (ou bombas 
de água ou torneiras de localização central em peguenas 
comunidades rurais) sempre foram um ponto de encontro 
muito popular, onde os habitantes do local promovem o 
froca das notícias e dos mexericos mais recentes. A água 
corrente e as máguinas de lavor deram um fim a essa 
prática. "As mulheres agora têm mais tempo para si" é um 
argumento em defesa da modernização gue se ouve 
fregüentemente. Na famosa fonte de Tonnerre, o lugar onde 
a água emerge do fundo da terra foi cercado por um 
simples digue circular. Esta solução intensifica a grandeza 
deste fenômeno natural, e também cria as condições 
simples para um lugar comunitário de lavar roupa 
destinado às pessoas que vivem naquela vizinhança. 
Não construímos mais lugares para lavar roupa (as 
instalações para a lavagem dos carros nõo contam). Mas 
será que ainda há lugares ondeos atividades cotidianas 
dão origem à necessidade de criar serviços comunitários 
em áreas públicas, como estas que ainda são encontradas 
em partes menos prósperas do mundo? 
DOMíNIO PÚBliCO 67 
156 157 
158 
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159 
160 
11 O ESPACO PÚBLICO COMO 
AMB IEN'TE CONSTRUíDO 
68 lIÇÕ E5 DE ARQUITETURA 
Até o século XIX havia poucos ediFícios públicos, e 
mesmo estes não o eram de maneira integral. 
e acesso público a edifícios como igrejas, 
templos, mesquitas, spos, bazares, (anFi-)teatros, 
universidades, etc. sofria certas restrições, impostas 
pelos encarregados de sua manutenção ou pelos 
proprietários. 0 5 verdadeiros espaços públicos 
estavam quase sempre ao ar livre. O século XIX foi 
a época de ouro do edifício público, em princípio 
construído com os recursos fornecidos pela 
comunidade. Os tipos de ediFício que foram 
desenvolvidos nesse período formaram os blocos de 
construção para a cidade, e nós ainda podemos 
aprender com estes exemplos quais meios 
arquitetônicos e espaciais podem ser mais bem 
aproveitados para tornar um edifício mais convidativo 
e hospitaleiro. 
A IrJevolução industrial abriu um novo mercado de 
massa. A aceleração e a massificação dos sistemas de 
produção e distribuição conduziram à criação de lojas 
de departamento, exposições {mundiais], mercados 
cobertos e à construção de redes de transporte 
público, com estações ferroviárias e de metrô, e, 
conseqüentemente, ao crescimento do turismo. 
VICHY, FRANÇA (159, 160) 
Um exemplo particularmente interessante é a "estação de 
águas" com fontes naturais, como Vichy, na França. 
As esperanças e expedativas quanto à5 qualidades medicinais 
da água são um dos temas prediletos na conversa de todos os 
visitantes. Os tratamentos que foram prescritos para eles levam 
algum tempo, o que significa que seus caminhos se cruzam 
regularmente no porque no centro da cidade, onde as fontes 
estão localizadas. As principais passagens do parque são 
cobertas por leves estruturas de metal, o que dá ao transeunte 
a sensação de estar ao mesmo tempo dentro e fora. 
A atmosfera geral é o de um interminável café ao ar livre, 
com inúmeros bancos e cadeiras para que todos aqueles 
que vieram em busca de uma cura para seus males possam 
se sentar e tomar a água medicinal do lugar. A corrente 
permanente de visitantes é um fator determinante da vida 
urbana como um todo: há muitas lojas, restaurantes, um 
cassino e todo o tipo de conforto para os visitantes, os 
quais constituem para os moradores uma importante fonte 
de renda. Deste modo, uma precoce forma de turismo se 
desenvolveu aqui. 
A razão mais importante para o intercâmbio social 
sempre fo i o comércio, que em todas as formas de 
vida comunitária sempre ocorre em certa medida nas 
ruas. Cidade e campo se encontram quando o 
fazendeiro va i para a cidade vender seus produtos e 
gastar o que recebeu em outros produtos. Enquanto 
isso, há troca de notícias. 
I 
I 
lES HALLES, PARIS, 1854-66/ V. SALTARD 11 62-164) 
Os salões do mercado de Paris constituíam um elo 
indispensável na cadeia de distribuição de bens na cidade 
- uma estação de abastecimento, por assim dizer, dentro de 
um sistemá gigantesco, em que produtor e consum idor não 
mantêm mais contato direto um com o outro. Os salões do 
mercado eram compostos de vastas áreas com telhados de 
duas águas e uma área coberto poro carga e descorga. 
Todo essa atividade não deixou de marcar a vizinhança à 
,ua volta: havia, por exemplo, mu itos restaurantes abertos 
du rante toda a noite, alguns dos quais ainda existem, como 
"ma lembrança dos velhos dias. 
A expansão contínua, especialmente no transporte de 
,,,toques de ali mentos, impôs a necessidade de mudar todo 
o centro para outro lugar (Rungis). Os vastos pavilhões de 
aço, uma vez vagos, foram demolidos em 1971 , apesar das 
:ntensas campanhas para impedir que isto acontecesse. 
É sempre difíci l encontrar terrenos paro acomodar 
ospetáculos teatrais, manifestações esportivas e outros 
eventos para grandes públicos, e estes salões teriam servido 
mu ito bem para essas fina lidades. A demolição das salas e 
,ua substituição podem na verdade ser vistas como um 
sím bolo da destruiçõo do espaço público das ruas como 161 163 
Ilarena" da vida urbana . 162 164 
DOMíNIO PÚBLICO 69 
165 
CENTROS COMUNITÁRIOS / F. VAN KUNGEREN 11651 
Os centros comunitários projetados por Van Kl ingeren lele 
os chamava de ágoras) tais como os de Dronten e 
Eindhoven foram tentativas de reunir sob um único teto 
todas as atividades que ocorrem no centro de uma cidade. 
É esse tipo de lugar que gera novos papéis sociais e novas 
trocos - que não podem surgir nas novas áreas e 
vizinhanças urbanas simplesmente porque ninguém pensou 
em tomar as medidos necessárias. 
Por causa do planejamento em termos de "caixas" isoladas, 
com entradas separadas, mais do que em termos de um 
tecido urbano integrado, as "caixas" tendem a produzir um 
efeito adverso sobre a viabi lidade do ambiente como um 
todo e, paradoxalmente, quanto melhor funcionam, mais 
diminuem a qualidade de vida na ruo. Portanto, não passam, 
na verdade, de centros urbanos l/artificiais", que devem sua 
existência à inadequação das condiçães urbanas e à fa lta de 
uma visão abrangente da correlação necessária entre os 
novos bairros residenciais e o núcleo urbano existente. 
Por mais interessantes que esses centros comunitários 
tenham sido como experimento social nos anos 60, não 
surpreende que, sob as condições sociais presentes, com 
muito menos tolerância e espírito comunitário, eles não 
70 lIÇÓ ES DE ARQUlmURA 
sejam mais usados hoje em dia. O barulho das atividades 
que ocorrem nos espaços ao lodo revelou-se 
particularmente perturbador, e logo as pessoas começaram 
a erig ir paredes e outros tipos de divisárias, el iminando 
assim a unidade espacial que era fundamental para o 
pro jeto. 
TORRE EIFFEL, PARIS, 1889 / G. EIFFEL 11661 
A Torre Eiffel , que foi construída para a Exposição Mundial, 
não é apenas o símbolo turístico de Paris, mas também, 
segundo sua concepção original, um monumento às novas 
idéias que surgiram durante o século XIX. Aqui vemos, 
numa forma mais sugesliva do que qualquer outra anterior, 
a expansão concreta da mudança social tal como 
manifestada no crescimento e na centralização do poder. 
Uma conslrução como a Torre Ei ffel demonstra o que se 
torna possível quando inúmeros pequenos componentes, 
cada um com sua funçõo e lugar específico, sôo 
combinados para formar uma entidade concebida como 
centra l, na qual o todo excede amplamente a soma das 
partes. A sutileza desta proeza de engen haria se torna 
mais tangível quando se compreende que um modelo em 
escala da estrutura com 30 centímetros de altura sá pesaria 
7 gramas IGuia Michelin). Quanto maior o controle das 
forças olivas, maior a expansão que pode ser obtida. 
A Torre Eiffel é uma corporificação do princípio de 
centralização - que pode produzir uma força capaz de 
inspi ra r admiração a partir de pequenas forças 
subordinadas. É uma demonstração da rea lização 
orgulhosa de um plano audacioso empreendido com lodo 
inocência, sem nenhuma preocupação com as forças 
monstruosas e avassaladoras que acabariam por ser 
desencadeadas. O tour de force do sistema de distribuição, 
em que os bens produzidos por uma massa de indivíduos 
são distribuídos alravés de um labirinto de canais 
intermediários até a massa dos consumidores, está baseado 
em uma complexa eslrutura de divisão do Irabalho, 
especialização e conlrolos eficientes. E é sem dúvida esse 
tipo de técnica organizacional que alimenla o Moloch 
autopropagodor da expansão em grande escala e a 
diminuição da influência do indivíduo no processo como um 
todo. 
I 
I 
)AVllHÕES DE EXPosiçÃO 
';5 exposições mundiais - aqueles mostruários internacionais 
'o produção em massa, para a qual era preciso criar ou 
~ncontrar novos mercados - requeriam a construção de 
,normes salões de exposição como oPalácio de Cristal em 
_ondres 11851) {167, 168), o Grand Palais 11900) (169) e o 
'.tit Palais em Paris, ambos ainda de pé. Estes vastos salões 
~e aço e vidro foram 05 primeiros palácios para o 
consumidor, que rege e é regido pela sociedade de consumo 
. ~S consumidores consomem e concomitantemente são 
consumidos numa sociedade de consumo). 
:sta época de novos métodos e sistemas de produção dó 
origem também a novos métodos de construção: a introdução 
do aço como material de construção tornou possível erigir em 
pouco tempo estruturas com enormes vãos . Além disso, 
painéis de vidro podiam agora ser inseridos nas molduras de 
aço do telhado, e a transparência resultante dava aos vastos 
salões uma atmosfera arejada, leve. Na verdade, as novas 
estruturas pareciam mais redomas fechando o espaço e 
oferecendo abrigo contra as variações climáticas. Deste 
modo, lembravam mais gigantescas estufas Icomo aquelas 
que ainda existem em Laken, perto de Bruxelas, e nos Kew 
Gardens de Londresl do que os habituais edifícios sólidos. 
IIncidentalmente, o Palócio de Cristal foi um produto direto 
da tradicional estufa.) Os grandes vãos contribuem também, 
sem dúvida, para a sensação de não estarmos dentro de um 
edifício no sentido convencional. Mas se o uso de estruturas 
de aço tornou possíveis estes grandes vãos , e se as novas 
possibil idades oferecidas pelos novos métodos de construção 
foram avidamente exploradas, permanece em aberto a 
questão de saber se eram verdadeiramente funcionais. Talvez 
não, porque, embora o vasto telhado de vidro fornecesse 
uma excelente iluminação para grandes espaços, algumas 
colunas a mais não representariam uma diferença tão grande 
assim de um ponto de vista funcional. Mais uma vez, a mera 
factibilidade parece ter criado a necessidade, do mesmo 
modo que a necessidade exigiu novas técn icas e 
possibilidades. Assim como a Torre Eiffel demonstrava 
claramente uma maneira de pensar, esta maneira de pensar, 
por sua vez, era indubitavelmente inspirada pelas novas 
possibil idades de construção; deste modo, a procura gera a 
oferta e vice-versa (o que veio primeiro, o ovo ou a ..,-
galinha?). É, na verdade, muito difícil deixar de associar os 
grandes vãos dos telhados e a maneira como evoluíram, 
assim como a articulação espacial mínima que exigiam, com 
o surgimento de uma maneira de pensar que conduziu à 
expansão em grande escala e à conseqüente centralização 
de hoje. 
DOMiNIO PÚBLICO 71 
167 168 
169 
Magasin du 
Prinfemps, Paris 
1881 ·1889/ 
p. Sedil/e 
170 171 
171 
LOJAS DE DEPARTAMENTOS, PARIS 
Au Bon Morché, Paris 
1876/L. C. Boi/eau 
A expansão da escala de consumo e de mercado, que 
encontrou sua expressão na salas de exposição de aço e 
vidro do século passado, também se manifestou, num 
âmbito local , nas amplas lojas de departamentos. 
72 lIÇ ÓES OE ARQ UI 1E1 UIA 
Ao contrário dos bazares e de outros tipos de mercados de 
ruo cobertos, nos quais um grande número de vendedores 
individuais se reunia sob um mesmo teto paro vender suas 
mercadorias, a loja de departamentos é um 
empreendimento único, com administração centralizada, 
que afirma administrar uma loja tão grande que se pode 
comprar tudo nela. É, na verdade, uma espécie de 
armazém geral, mas elevado a uma proporção gigantesca 
e com um estoque excepcionalmente variado. 
Enquanto a mercadoria no armazém é guardado atrás do 
balcão, em prateleiras que vão do chão até o teto, 
acessíveis apenas ao vendedor, no loja de departamentos 
os vários pavimentos é que são visíveis de todos os lodos 
do salão central- como as prateleiras no armazém geral, 
mas com a importante diferença de estarem intei ramente 
acessíveis aos compradores. 
O telhado de vidro que pode ser encontrada em quase 
todas as lo jas de departamentos tradicionais Ipor exemplo, 
os Grands Mogosins em Paris) produz o mesmo efeito 
espacial, basicamente, de uma única grande lo ja, embora 
os espaços em volta sejam divididos em departamentos 
diferentes para produtos diferentes. 
A sola central do Galerie Lafayette oferece ao público uma 
acolhida régia, com sua majestosa escadaria livre, 
especialmente convidativa la escadaria acabou sendo 
demolida para se obter alguns metros quadrados a mais 
para a área de vendas). 
Galerie Lafayette, 
Paris, 1900 
f 
I 
I 
ESTAÇÕES FERROVIÁRIAS 
A construção de uma crescente rede ferroviário abriu o 
mundo às viagens e à troco de produtos, tornondo-o menor ' 
e maior 00 mesmo tempo. As estações que foram 
construídos nos cidades e nos vilas constituíam os pedras 
fundamentais do sistema. Geralmente situados num lugar 
proeminente no centro, os estações ferroviárias não apenas 
introduziram um novo tipo de edifício nos cidades como 
trouxeram também todo uma novo gomo de instalações e 
atividades urbanos com elos relacionados, tais como hotéis, 
iugares para comer e beber e, invariavelmente, laias. 
Tornaram-se ainda, com freqüência, um mercado próprio, 
que só parcialmente dependia do consumo dos passageiros 
dos trens. Os salões de muitos estações fe rroviá rios 
:ransformaram-se gradualmente em espaços públicos, 
~rechos cobertos do cidade, onde ainda se pode fazer 
,ompras quando todos os outras laias eslão fechados, onde 
!e pode trocar dinheiro, te!efonar, comprar revistas, usar o 
'oolete, tirar fotos numa cabine, obter informações, pegar 
;m táxi ou fazer uma refeição rápida (ou então uma 
~ostante refinada - muitas estações ferroviários tornaram-se 
:amosos por causa de seus restauranles). Esta concentração 
;xponde-se pela vizinhança imediato, com cafés, 
rastcurantes e hotéis. Na Grã-Bretanha, muitas vezes são 
Jarte do estação. Em sumo, o agitação e o atividade que 
("com o chegado e o partido dos trens levam o uma 
concentração de serviços no área em to rno do estação 
;erroviária maior do que em qualquer outro lugar do 
"dade. 
:5TAÇÕES FERROVIÁRIAS SUBTERRÁNEAS 
':"s entrados e saídas dos redes subterrâneos de lransporte 
_rbano, como os metrôs de Paris e de Londres, têm o 
nesmo impacto das principais estações ferroviárias, ainda 
sue numa escola menor e distribuído por vários pontos do 
::dade. O metrô de Paris em especial, com suos formos 
distintas, é, por assim dizer, uma vasta construção que 
Clompe do solo em lodos os bairros do cidade como um 
-'-.orco familiar e imediatomenle identificável. O que o 
ô51ação ferroviária é para a cidade a enlrada do melrô é 
:ara um bairro : um lugar que alrai diversões e negócios. 
~s solas e passagens labirínlicas das principais inlerseções 
,ôo o refúgio favorilo dos músicos de ruo, especialmenle no 
nverno, quando procuram obrigo neslo parte sublerrânea 
:0 cidade. 
Metrô de Paris, estação da Ploce 
Dauphine, 1889-190 l / H. Guimord 
Estação Centrol, G/osgow, Grã-Bretanha 
DOMiNIO PÚ!IICO 73 
173 
171 
175 
176 
177 17i 
12 O ACESSO PÚBLICO 
AO ESPACO PR IVADO , 
Embora os grandes edifícios que têm como objetivo ser 
acessíveis para o maior número possível de pessoas 
não fiquem permanentemente abertos e ainda que os 
perícfdo5 em que estão abertos sejam de fato impostos 
de cima, tais edifícios realmente implicam uma 
expansão fundamental e considerável do mundo 
público. 
Os exemplos mais característicos desta mudança de 
ênFase são sem dúvida as galerias: ruas internas de 
comércio cobertas de vidro, tais como as construídas 
no século XIX, e das quais muitos exemplos marcantes 
ainda sobrevivem em todo o mundo. As gole rias 
serviram em primeiro lugar para explorar os espaços 
interiores abertos, e eram empreendimentos comerciais 
afinados com a tendência de abrir áreas de venda 
para um novo público de compradores. Oeste modo, 
surgiram circuitos de pedestres no núcleo das áreas de 
lojas. A ausência de trânsito permite que o caminho 
seja bastante estreito para dar ao comprador potencial 
uma boa visão das vitrines dos dois lados. 
74 IIÇOU DE ARQUITETUiA 
PASSAGE DU (AIRE, PARIS, 1779 1175·178) 
Um exemplo interessante do conceito de galeria pode ser 
visto, numa forma elementarl naPassage ou Cairei em 
Paris. A construção completa de um espaço interior 
excepcionalmente modelado foi concebida juntamente com 
a parle exterior segundo um princípio racional de 
ordenamento que, até certo ponto e submetido o certas 
regras, permitiu a livre disposição dos elementos 
órquitetônicos. Muitos dos negócios localizadas aqui estão 
igados às dependências periféricas, permitindo a 
jesenvalvimenta de uma rede informal de passagens entre 
o. pontos-de-venda, somando-se às entradas oficiais. 
SALERIAS DE LOJAS 
~m Paris, ande a galeria de lojas foi inventada e floresceu 
13inda existem muitas galerias, especialmente no primeiro e 
'0 segundo Arrondissement), há três quadras consecutivas 
com passagens infernos de ligação: Passage Verdeau, 
Cassage Jauffray, e Passage des Panoramas. Juntas formam 
_:11 0 pequena cadeia que cruza o Baulevard Monlmartre e, se 
"vessem continuado, seria fácil imaginar como uma rede de 
caminhos cohertos para pedestres poderia ter se desenvolvido 
cdependentemente do padrão das ruas à sua volta. 
As galerias de lojas existem em todo o mundo, em formas e 
o;mensões diversas que dependem das condições locais -
- as muitas vezes já perderam seu encanto original como 
conjunto de lojas caras, embora em vários lugares ainda 
:comodem as lojas mais luxuosas, como por exemplo o 
Salerie St. Hubert, em Bruxelas, e a Galleria ViHorio 
Paris, 29 distrito 
=:ssage des 
=;,10ramas, Paris 
Galerie Vivienne, 
Paris 
DOMiNIO PU Bli CO 75 
179 181 
180 181 
Sfrand Arcoae, 
Sidney 
183 18. 
185 
18.\ 
Emanuele, em Milão, que todos iden tificam como o coração 
da cidade. 
(Para um levantamento, análise e história da galeria ver: J. F. Geist, 
Passagen, ein Bautyp de, 19.Jahrhunderll, Munique, 19691 
o principio do galeria voltou a adquirir relevância local 
quando o volume do trânsito nas ruas do centro dos 
cidades tornou-se tão pesado que surgiu a necessidade de 
áreas exclusivas paro pedestres, i.e., de um "sistema" 
exclusivo para os pedestres ao longo do padrão existente 
das ruas. As galerias típicas do século XIX passavam 
através das quadros, como atalhos, e suo proposto básico 
era fazer com que as óreas internas fossem usadas. 
Embora os edifícios fossem atravessados por essas 
passagens, sua aparência exterior não era afetada: o 
exterior, a periferia, continuava a funcionar de modo 
separado e independente como uma fachada autônoma. 
Em muitos projetos contemporâneos de caminhos cobertos 
para pedestres, o exterior do complexo dentro do qual a 
atividade está concentrada lembra as pouco convidativas 
paredes de fundo de um edifício. Esta inversão - vi rar a 
massa do edifício de dentro para foro - não passa de total 
perversão do principio orientador da ga le ria. 
As passagens altas e compridas, iluminadas de cima 
graças ao telhado de vidro, nos dão a sensação de um 
interior: deste modoJ estão do lado de l/dentro" e de 
"forall ao mesmo tempo. O lado de dentro e o de fora 
acham·se tão fortemente relativizados um em relação 
76 LIÇÕES DE ARQUITETURA 
I 
i 
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1 ,i 
.·1 
, 
I 
'1 
ao outro que não se pode dizer quando estamos 
dentro de um edifício ou quando estamos no espaço 
que liga dois edifícios separados. Na medida em que a 
oposição entre as massas dos edifícios e o espaço da 
rua serve poro distinguir - grosso modo - o mundo 
privado do público, o domínio privado circunscrito é 
transcendido pela inclusão de galerias. O espaço 
interior se torna mais acessível , enquanto o tecido das 
ruas se torna mais unido. A cidade é virada pelo 
avesso, tanto espacialmente quanto no que concerne 
ao princípio do acesso. 
O conceito de galeria contém o princípio de um novo 
sistema de acesso no qual a fronteira entre o público e 
o privado é deslocada e, portanto, parcialmente 
abolida; em que, pelo menos do ponto de vista 
espacial, o domínio privado se torna publicamente 
mais acessível. 
o abandono do assentamento de quadras num 
perímetro fechado, no urbanismo do século XX, 
significou a desintegração do definição espacial nítida 
dada pelo padrão da rua. À medida que crescia a 
autonomia dos edifícios, seu inter-relacionamento 
diminuía, e hoje eles se erguem destitu ídos de 
alinhamento, por assim dizer, como um monte de 
mególi tos irregularmente espalhados, afastados entre 
si, num espaço aberto excessivamente amplo. 
O "corredor de rua" degenerou em "corredor de 
espaço". 
Este novo tipo de assentamento aberto, tão inovador 
para as condições "físicas" da construção de casas em 
particular, teve um efeito desastroso sobre a coesão do 
todo - um destino que prejudicou a maioria das 
cidades. Quanto mais os edifícios se afastam uns dos 
outros como volumes autônomos com Fachadas 
Esquerdo: Galerie 
SI. Hubert, Bruxelas 
Go/leria del/'/ncJusfrio 
Suba/pino, Turim 
189 190 
187 188 
184·188: 
Golleria Vittorio 
Emanuele, Mi/õo 
DOMíNIO PÚ811CO 77 
Eoton Center, Toronto 
191 191 
193 
individualizadas e entradas privadas, menos coesão 
subsiste, e, especialmente, maior é a oposição entre o 
espaço público e o privado, ainda que a~ quadras de 
edifícios possam ser projetadas com galerias de acesso 
ou ruas internas cobertas ou mesmo com um espaço 
privado a seu redor. O urbanismo baseado em 
edifícios como monumentos autônomos, livremente 
dispersos, deu origem a um enorme ambiente exterior 
- na melhor das hipóteses, uma agradável paisagem 
de parque onde sempre nos sentimos "excluídos". 
Os arquitetos modernos e os planejadores urbanos já 
tinham começado a rasgar a cidade antes da Segunda 
Guerra Mundial; esta obra de demolição foi 
continuada pela guerra. Mais tarde a mania do 
"trônsito" deu o coup de grâce nesta fragmentação. 
Assim, hoje estamos todos convencidos da necessidade 
de reconstruir o interior da cidade, de retomar o 
78 liÇÕES DE AiQUllETURA 
interesse e a preocupação com a área da rua, e, 
portanto, com o exterior dos edifícios. Mas não 
devemos permitir que isso nos conduza a uma 
arquite~;Jfa de ruas cheias de muros, como se as 
moradias não passassem de sinais de pontuação ou de 
objetos de cena com o objetivo de dar suporte ao 
cenário. Não devemos nos esquecer de que o 
Movimento Moderno tinha como objetivo específico a 
melhoria dos edifícios, e, especialmente, a melhoria 
das moradias por meio de um assentamento de melhor 
qualidade que assegurasse mais luz, uma visão ampla, 
espaços exteriores mais satisfatórios, etc. A Fisionomia 
de uma cidade é a metade da verdade - moradias 
satisfatórias são a outra metade complementar. 
Os vários exemplos de urbanismo aberto, tais como 
forom projetodos nos dé<odos de 1920 e de 1930, 
ainda são de grande relevância, pelo menos se 
julgarmos cada um deles de acordo com suas 
qualidades específicos. 
r 
r 
! 
" , 
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E SAÚDE, RIO DE JANEIRO, 1936-37 / 
~E (ORBUSIER (l9J.196) 
Em seu conceito, Le (orbusier não se adaptou à ordem da 
quadra tradicional de edifícios, ta l como estabelecida pelo 
Diana urbana. Em vez de uma massa sól ida com fachadas 
~ajesfosas cercando o lugar por fados os lados, Le 
~orbusier proietou seu edifício como uma forma livre, uma 
construção elevada sustentada por colunas, de maneira que 
1ão é preciso andar em volta da quadra, mas apenas 
atravessar a distância diagonalmente por entre as colunas. 
A altura das colunas e a distância entre elas foram 
,elecionadas de tal modo que o espaço resultante tem um 
efeito liberador. A sensação de libertação é ainda mais 
'mpressionante porque não se espera uma situação desse 
:ipo nas redondezas. Assim, estar ali nos traz uma 
,ensação esfimulante e especial. 
A formulação mais importante de Le (orbusier neste 
:antexto é que um espaço amplo, que, dentro da ordem 
nafural das coisas, seria inacessível, já que faz parte do 
domínio privado, é, graças à possibilidade de acesso, uma 
contribuição à cidade como um todo. 
É importante ter em vista, no entanto, que essa solução 
perderia muito de sua qualidade se os blocos circundantes 
fossem projetados deacordo com o mesmo princípio, 
Neste caso, a área como um todo iria apresentar a 
imagem padrão de uma cidade moderna. É justamente a 
surpresa do contraste que torna o princípio tão claro nesfe 
caso. 
Devemos considerar a qualidade do espaço das ruas e 
dos edifícios relacionando-os uns aos outros. Um 
mosaico de inter-relações - como imaginamos que a 
vida urbana seia - requer uma organização espacial 
na qual a forma construída e o espaço exterior (que 
chamamos rua) não apenas sejam complementares no 
sentido espacial e, portanto, guardem uma relação de 
reciprocidade, mas ainda, e de modo especial - pois é 
com isto que estamos preocupados -, na qual a forma 
construída e o espaço exterior ofereçam o máximo de 
acesso para que um possa penetrar no outro de tal 
modo que não só as fronteiras entre o exterior e o 
interior se tornem menos explícitas, como também se 
atenue a rígida divisão entre o domínio privado e o 
público. Quando entramos pouco a pouco num lugar, a 
porta da fren te perde sua significação como a lgo 
singular e abrupto; ela é ampliada, por assim dizer, 
para formar uma seqüência passo-o-passo de áreas 
que ainda não são explicitamente o interior, mas ao 
mesmo tempo já são menos explicitamente públicas. 
A expressão mais evidente deste mecanismo de acesso 
deve ser vista nas galerias, e realmente não 
surpreende, portanto, que a idéia de galeria ainda 
sirva como um exemplo hoje. 
DOMíNIO PÚ6l1CO 79 
19/ 
195 196 
197 198 
199 
2l1li 
EDIFíCIO DE ESCRITÓRIOS CENTRAAl SEHEER [197·200[ 
O plano urbano, integralmente ajustado à "tradicional" 
construção aberta da primeira metade deste século, i.e., 
sem um alinhamento estrito dos edifícios e sem muros de 
rua dentro dos quais o edifício tinha de estar situado, 
80 LIÇÕES DE ARQUITETURA 
exigiu portanto um projeto arqui tetônico autocentrado, sem 
referências aos edifícios no vizinhança imediata. 
Em vez de um volume construído colossal e único, ergueu'se 
um conglomerada mais transparente de numerosos 
componentes menores, graças à diferenciação em blocos 
pequenos, relativamente independentes, separados por 
passagens semelhantes às galerias (i .e., um espaço 
essencialmente acessível ao público). 
E, como há saídas e entradas por todo o complexo, ele 
parece mais um trecho de uma cidade do que um edifício -
lembra sobretudo um pequeno povoado. 
O projeto foi concebido visando permitir não só que os 
funcionários possam deixar seus espaços de trabalho para 
fazer uma pausa, conversar e tomar um cafezinho num dos 
vários balcães do espaço central do complexo - como se 
estivessem dando uma volta no centro da cidade -, mas 
também para que a área possa ser li teralmente pública . 
Esta oportunidade de acesso público seria integra lmente 
explorada se o plano original tivesse sido executado: a 
saber, situando a nova estação ferroviá ria de Apeldoorn 
bem ao lado do complexo, de modo que se pudesse chegar 
até os plataformas através do Centraal Seheer (foram 
desenvolvidos planos em consulta com os ferrovias 
holandesas para instalar pontos·de-venda de passagens 
dentro do complexo) . Enquanto o edifício, como uma 
entidade autônomo, é colocada em perspectiva no nível 
formal por sua articulação de um grande número de 
componentes arquitetônicos menores, no nível prático uma 
articulação similar é conseguida pelo princípio de acesso 
,dotado - isto é, pelo fato de que podemos entrar no 
sdifício a partir de qualquer direção gradualmente e em 
jiversos estágios. 
Sob a influência de um risco cada vez maior para a 
,egurança nos espaços públicos, o Centra0 I Seheer também 
impôs certas restrições ao acesso público. Hoje, todas as 
sntradas são vigiadas por câmeras de televisão, e sente-se 
o necessidade cada vez maior de uma entrada única para 
::> complexo como um todo, o qual, além disso, tornou-se 
:nenos imediatamente legível desde a contração dos dois 
Drédios em um só volume. 
CENTRO MUSICAL VREDENBURG 1201 ·203) 
Aqui foi feita uma tentativa para evitar a forma tradicional 
de sala de concerto como um "templo da música" e chegar, 
em vez disso, a uma atmosfera menos formal t menos 
reverente 81 portanto, mais convidativa aos não-iniciados. 
Além de revolucionar a "imagem" geral, também o 
I'mecanismo" de acesso foi drasticamente al terado. Não 58 
entro por uma entrada imponente, mas sim pouco a pouco. 
Em primeiro lugar, entra-se por uma passagem coberta que 
conduz a muitas entradas (como se estivéssemos numa loja 
de departamentos), para depois se chegar aos loyer; do 
Centro Musical e daí seguir até o auditório. O grande 
número de entradas ao longo do corredor (ou galeria) e 
também ao longo da praça - quando todas estão abertas -
faz com que o edifício se torne tempororiamente parte da 
rua . E, na verdade, é ass im que o edifício funciona durante 
DOMíN IO PÚBLICO 81 
201 203 
202 
os concertos semanais gratu itos na hora do almoço. Nesses 
dias, vemos os compradores passeando pelo edifício, 
muitas vezes demonstrando surpresa I outras vezes ouvindo 
atentamente, embora não tenham vindo para ouvir o 
concerto, e às vezes apenas tomando um atalho até a 
próxima ruo. 
82 IIÇOfS Df ARQUITfTURA 
CINEMA ClNEAC, AMSTERDAM, 1933 / J. DUIKER 1204, 205} 
Duiker não só alcançou um êxito maravil hoso ao ajustar o 
programa arquitetônico intei ro diagonalmente ao espaço 
minúsculo do edifício (em que cada centímetro teve de ser 
usado), como conseguiu também deixar aberta a esquina 
onde se localiza a entrada, de modo que a esquina 
continua funcionando como um espaço público. Deste 
modo, podemos atravessar a esquina por trás da coluna 
alta e, guiados pela marquise curva de vidro, sentir-nos 
tentados a comprar um bilhete para uma sessão contínua 
de cinema. (Esta marquise foi revestida com madeira em 
1980; o anúncio luminoso também foi reti rado, 
desfigurando assim a último das grandes obras de Duiker.) 
O espaço que foi devolvido à rua é um componente integral 
da arquitetura, em parte por causa de sua localização 
especifica numa esquina e em parte por causa dos 
materiais empregados (o mesmo tipo de azulejos no chão e 
no resto do edificio, o morquise de vidrol . Deste modo, é 
ombivalente: privado, mas também público. J 
j 
J 
Embora a expressão da relatividade dos conceitos de 
interior e exterior seja antes de tudo uma questão de 
organização espacial, o Fato de uma área tender para 
uma atmosfera mais parecida com a da rua ou mais 
?orecida com a de um interior depende especialmente 
da qualidade do espoço. 
Além disso, se as pessoas reconhecerão a área em 
questão como interior ou exterior, ou como alguma 
torma intermediária, depende em grande parte das 
dimensões, da Forma e da escolha dos materiais. 
\lo caso do Centra0 I aeheer (206) e do Centro Musical 
vredenburg (207), os espaços dos trechos projetados 
Jarcialmente como áreas de ruas são especialmente altos e 
,;treitos, com iluminação do alto como na galeria de lojas 
·' adiciona l. Este tipo de corte tranversal evoca os becos de 
:!dades antigos, e esta evocação se torna ainda mais 
ciensificada pelo tipo de material apl icado nos assoalhos e 
:.oredes que estamos acostumados a ver no exterior. 
~ medida que penetro mos no Centro Musical, esta 
"nsação é salientada pelo uso de madeira no assoalho e 
~cs paredes. A área comercial adjacente, Haag Catharijne, 
~ pavimentada com mármore, seus espaços são bem mais 
amplas e só incidentalmente iluminados do alta. O caráter 
horizontal, com iluminação predominantemente artificia l, e 
o mármore bril hante, de aparência glamourosa, faz com 
que O Hoog Catharijne lembre mais uma grande loja de 
departamentos do que o espaço público que essencialmente é. 
DOMiNIO PÚBlICO 83 
7fJ7 
2Q8 
m 210 
211 '::,,:: "F::::,:::::::, 
84 liÇÕES DE ARQUllETURA 
HOTEl SOLVAY, BRUXELAS, 1896 / V, HORTA (108,111) 
Embora as portas da fachada formem de modo inequívoco 
a entrada principal do edifício, descobrimos ao entrar que 
elas não levam a um hail convencional, mas dãoacesso a 
um corredor que passa diretamente através do prédio até 
um outro par de portas que dá para um pátio nos fundos, 
Este corredor foi concebido para permitir o ingresso de 
carruagens, paro que as pessoas pudessem descer na 
verdadeira entrada do prédio sem se molhar. 
A verdadeira porta de entrada está situada, portanto, em 
ângulo reto com a fachada, e marca o começo de uma 
seqüência espacial que compreende o hail de entrada e a 
escadaria conduzindo ao primeiro andar, enquanto os 
quartos principais estão localizados ao longo de toda a 
fachada e dos muros do fundo, com o uso, característico de 
Horto, de divisórios de vidro paro criar uma conexão 
aberta com o poço do escada, 
-_::-.... ... 
o corredor que atravesso o prédio dá a impressão de fazer ,,1,:, 
parte da rua, embora, na verdade, seio estritamente ] 
privado, um espaço que faz parte da casa, Esta impressão 
é reforçada pelo uso, neste espaço, de materiais que se 
assemelham 00 do rua, em especial os pedras de 
pavimentação e a borda elevada de pedra, 
Um detalhe característico de Horto é o transição fluente 
entre a fachada e a calçada, de modo que a fronteira entre 
o edifício e o rua, entre o espaço público e o privado se 
dissolve, Na verdade, nem parece existir, iá que os 
materiais do fachada e do calçada são os mesmos, É quase 
impossível imaginar isso sendo feito em comum acordo com 
as autoridades públicos, já que elas sempre adotam uma 
separação estrito entre o espaço públ ico e o privado, 
, 
1 
214 
86 
"A CARTA" / PIETER DE HOOGH 11629-168411215) 
O quadro de Pieter de Hoogh demonstra a relatividade das 
noções de exterior e interior, pela maneira como elas são 
evocadas não só por meio de recursos de distinções 
espaciais, mas também, e principalmente, por meio da 
expressão dos materiais e de suas temperaturas sob 
gradações varióveis de luz. O interior, com seus azulejos 
brilhantes e frios e as janelas severas no fundo, possui uma 
temperatura exterior que contrasta com o brilho quente do 
fachada exterior iluminada pelo sol. A porta de entrada 
aberta e sem degrau cria uma transição suave entre a 
habitação e a rua com suo superfície semelhante a um 
tapete. As funções do exterior e do interior parecem estar 
invertidas, criando um conjunto espacialmente coeso que 
expressai acima de tudo, acesso. 
lIÇÔ ES DE ARQ UITET URA 
Assim como a aplicação ao interior do tipo de 
organ izaçêo espacial e do material referentes ao 
mundo exterior faz tom que o interior pareça menos 
íntimo, as refe rências espaciais ao mundo interior 
fazem com que o exterior pareça mais íntimo. 
Portanto, é a união em perspectiva de interior e 
exterior e a conseqüente ambigüidade que 
intensificam a percepção de acesso espacial e de 
intimidade. Uma seqüência gradual de indicações 
mediante recursos arquitetônicos assegura uma 
entrada e uma saída graduais. O complexo inteiro de 
experiências evocadas pelos recursos arquitetônicos 
contribui para este processo: gradações de altura, 
largura, grau de iluminação (natu ral e artificia!), 
materiais, diferentes níveis do chão. As diversas 
sensações desta seqüência evocam toda uma 
variedade de associações, cada uma delas 
correspondendo a uma gradação específica de 
"interioridade e exterioridade" que se baseia no 
reconhecimento de experiências prévias semelhantes. 
Não só cada sensação se refere a uma gradação 
específica de exterioridade e interioridade, como se 
refe re por extensão a um uso correspondente. Eu já 
havia sublinhado antes que o uso de uma área, o. 
sentido de responsabilidade por e la e o cuidado 
dispensado o ela encontram-se todos ligados às 
demarcações territoriais e à administração. Mas a 
arquitetura, graças às qualidades evocativas de todas 
as imagens explicitamente espaciais, formas e 
materiais, possui o capacidade de estimular 
determinado tipo de uso. Conceitos como O de público 
e privado restringem-se, portanto, a meras entidades 
administrativas. 
Ao selecionar os meios arquitetônicos adequados, o 
domínio privado pode se tornar menos parecido com 4 
uma fortaleza e ficar mais acessível, ao passo que, por I .. 
sua vez, o domínio público, desde que se torne mais 
sensível às responsabilidades ind ividuais e à proteção 
pessoal daqueles que estão diretamente envolvidos, 
! pode se tornar mais intensamente usado e portanto mais rico. Enquanto a tendência no fim dos anos 60 
parecia levar a uma abertura maior da sociedade em 
geral e dos edifícios em particula r, assim como a uma 
revivescência da rua - o domínio público por 
excelência -, há atualmente um movimento crescente 
para restringir este acesso e buscar refúgio em sua 
própria "fortaleza", longe da agress ividade, na 
segurança da própria casa. Mas, na medida em que o 
equilíbrio entre a abertura e o fechamento é um 
reflexo de nossa sociedade ba stante aberta, nós nos 
Poíses Baixos, com nosso sól ida tradição, podemos 
ter os melhores condições paro a construção de 
edifícios fundamentalmente mais acessíveis e de ruas 
fundamen talmente mais convidativas. 
j 
'I 
l 
i 
I 
L 
PASSAGE POMMERAYE, NANTES, FRANÇA, 1840-431212-2141 . 
Embora os materiais de construção e as lormas aplicadas 
na maioria das galerias seiam do tipo que pertencem ao 
"exterior", às vezes acontece o contrório, como no Passage 
Pommeraye em Nantes. Esta conexão, atravessando uma 
quadra entre duas ruas em níveis diferentes, é uma das 
mais belas galerias ainda existentes, em especial porque 
;eus dilerentes níveis são ambos visíveis do espaço central e 
ligados por uma grande escadaria de madeíro. 
O uso de madeira, algo que não se espero encontror numa 
5ituação destas{ enfatizo a sensação de estarmos no interior 
- não apenas pelo ele ito visual, mas também pelo eleito 
,onoro, O interior e o exterior encontram-se duplamente 
relativizados aqu i, o que torna essa galeria o exemplo por 
excelência de como é possível eliminar a oposição entre o 
:nterior e o exterior. 
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DOMíNIO PÚBliCO 85 
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DOMiNIO PÚBLICO 87 
B CRIANDO ESPAÇO, DEIXANDO ESPAÇO 
'Der Gegenpod von Zwong ist nicht Freiheit, sondem 
Verbundenheit. Zwong ist eine negotive Wirkfichkeit, und 
Verbundenheit ist die positive; Freiheit ist eine Miiglichkeit, 
die wiedergewonnene Miiglichkeit. Vom Schicksol, von der 
Notur, von den Menschen gezwungen werden: der 
Gegenpol is nicht, vom Schicksol, von der Notur, von den 
Menschen Irei, sondem mit ihm, mit ih" mit ihnen 
verbunden und verbündet sein; um dies zu werden, muss 
mon Ireilich erst unobhãngig geworden sein, ober die 
Unobhangigkeit ist ein Steg und kein Wohnraum.' 
90 liÇÕES DE ARQU ITETURA 
'O oposto do compulsão não é o liberdade, mos o 
integração. A compulsão é uma realidade negativo, 
o integração é o positivo; o liberdade é uma possibilidade, 
o possibilidade reconquistado. Ser compelido pelo destino, 
pelo natureza, pelos pessoas: o oposto não é libertar-se 
do destino, do natureza e dos pessoas, mos aliar-se e 
integrar-se o eles; para que isso aconteço é preciso antes 
ser independente, mos o independência é um caminho, não 
um espaço. H 
(Morti n Buber, Reden über Erziehung, Heidelberg, 1953) 
1 Estrutura e Interpretação 92 
2 Forma e Interpretação 94 
Canais, Amsterdam 
Mexcaltitàn, México 
Estagel, França 
Oude Gracht, Utrecht 
Viaduto Rue Rambouillet, Paris 
Palácio de Diocleciono, Split, Iugoslávia 
Os Anfiteatros de Arles e lucca 
Templos, Bali 
Rockefeller Plaza, Nova York 
Universidade de Colúmbia, Nova York 
3 A Estrutura como Espinho Dorsal Gerativa: 
Urdidura e Trama 108 
Projeto Fort l' Empereur, Argel / le Corbusier 
"As Vigas de Sustentação e o Povo: o Fim do Moradia 
de Massa" / N. J. Habroken 
Projeto de Cosas Flutuantes 
Projeto Habitacional Deventer-Steenbrugge 
De Schalm, Projeto paro um Centro Comunitário 
Projeto para uma Possagem Subterrônea para 
Pedestres, Apeldoorn 
Moradias, WestbroekUniversidade livre, Berlim / Candilis, Josic & Woods 
Projeto para uma Área Residencial, Berlim / 
S. Wewerka 
Villa Savoye, Poissy, França / le Corbusier 
4 Grelha 122 
Ensanche, Barcelona / I. Cerdá 
Manhattan, Nova York 
5 Ordenamento da Construção 126 
Orfanato, Amsterdam / A. van Eyck 
linMij, Amsterdam 
De Drie Hoven, lar para Idosos, Amsterdam 
Edifício de Escritórios Centroal Beheer, Apeldoorn 
Centro Musical Vredenburg, Utrecht 
Ministério de Assuntos Sociais, Haia 
Escolas Apollo, Amsterdam 
6 Funcionalidade, Flexibilidade e Polivalência 146 
7 Forma e Usuários: o Espaço da Forma 1 SO 
8 Criando Espaço, Deixando Espaço 152 
Alojamento para Estudantes Weesperstraat, Amsterdam 
Escola Montessori, Delft 
Praça Vredenburg, Utrecht 
Moradias Diagoon, Delft 
9 tncentivos 164 
Colunas 
Pilastras 
Moradias, Berlim / B. Taut 
Blocos Perfurados para Construção 
10 A Forma como Instrumento 170 
CRIANDO ESPAÇO, DEI XANDO ESPAÇO 91 
1 ESTRUTU RA E 
I NTE RPRETACÃO , 
A Parte A deste estudo abordou a reciprocidade das 
esferas de inFluência pública e privada e o que o 
arquiteto pode fazer para contribuir para este 
equilíbrio - pelo menos se ele estiver consciente, em 
cada situação, de quais responsabilidades específicas 
se aplicam e como elas podem ser interpretadas. 
A segunda parte vai abordar a reciprocidade da forma 
e do U50, no sentido de que a forma não apenas 
determina o uso e a experiênciar mas também é 
igualmente determinada pelos dois na medida em que 
é interpretável e, portanto, pode ser influenciada. 
Tendo em vista que olgo é projetado para todos, isto é, 
como um ponto de partida coletivo, devemos n05 
preocupar com todas as interpretações individuais 
possíveis - não apenas num momento especíFico no 
tempo, mas também à medida que mudam no tempo. 
A relação entre uma interpretação coletiva e uma 
individual tal como a que existe entre Forma e uso pode 
ser comparado à relação entre língua e Fala. A língua é 
um instrumento coletivo, a propriedade comum de um 
grupo de pessoas capaz de usar esse instrumento para 
moldar seus pensamentos e comunicá-los uns aos 
outros, contanto que sigam as convenções da gramática 
e da sintaxe, e contanto que usem palavras 
reconhecíveis, i.e., palavras que signiFiquem alguma 
coisa para o ouvinte. O admirável é que cada indivíduo 
pode ser entendido por outro mesmo quando expresso 
sentimentos e preocupações muito pessoais de uma 
maneira altamente pessoal. Além disso, a Falo não é 
apenas uma interpretação do língua, mas o língua, por 
sua vez, também é influenciada pelo que se Fala, e, no 
devido tempo, a língua muda sob esta inFluência 
constante. Pode-se dizer então que a língua nõo 
apenas determina a Fala, mas a própria língua é ao 
mesmo tempo determinada pela Fala. A língua e a Fala 
relacionam-se dialeticamente. 
o conceito de estrutura tende mais a obscurecer do que 
a esclarecer. Qualquer coisa que tenho sido agrupado, 
mesmo da maneira mais precária, logo tende o ser 
descrita como uma estrutura. IE então surgem os 
associações negativas com o chamado pensamento 
estrutural sobre as instituições e organizações de 
negócios, e, naturalmente, também na política.) Neste 
caso, Hestrutura" reFere-se a novas Formas de opressão 
pelos novos mandatários do poder. Tudo na arquitetura, 
bom ou mau, em que o aspecto construtivo ocupo uma 
92 LIÇÕES DE ARQUITETURA 
posição visual proeminente, e que se liga à repetição 
de componentes pré-Fabricados (de concreto ou de 
qualquer outro material), com grades ou molduras, 
rígidos ou Frouxos ou ambos, é rotulado como 
estruturalismo. O signiFicado original e de maneira 
nenhuma vazio de estrutura e estruturalismo parece ter 
submergido sob o peso do jargão do arquitetura. 
O estruturalismo denotava, inicialmente, um modo de 
pensar que derivava da antropologia cultural e se 
tornou proeminente em Paris durante os anos 60 e que, 
especialmente na Forma desenvolvida por Claude 
lévi-Strauss, exerceu uma Forte influência sobre as 
diversas ciências sociais. O termo está intimamente 
ligado ao nome de lévi-Strauss: suas idéias - sobretudo 
quando tratam das já mencionadas relações entre o 
padrão coletivo e as interpretações individuais - Foram 
particularmente inspiradoras paro a arquitetura. 
Lévi-Strauss, por sua vez, Foi inspirado pelo lingüista 
Ferdinand de Saussure (1857-19131, que fai a primeiro 
a estudar o distinção entre langue e parole, entre 
língua e Fala. A língua é o estrutura por excelência, 
uma estrutura que, em princípio, contém a 
possibilidade de expressar tudo o que pode ser 
comunicado verbalmente. É na verdade um 
pré-requisito para a capacidade de pensar. Pois uma 
idéio só pode ser considerada como existente na 
medida em que pode ser Formulada em palavras; nós 
usamos o língua não apenCls para transmitir nossas 
idéias, a linguagem na verdade dá Forma o estas idéias 
quando as expressamos. A Formulação e o pensamento 
andam de mãos dadas; Formulamos quando pensamos, 
mas também pensamos quando Formulamos. Dentro 
desse sistema - um espaço de valores coerentes - as 
diFerentes inter-relações são estabelecidas como regras, 
mas ainda há muita liberdade de ação no mesmo 
sistema graças, paradoxalmente, às mesmas regras 
fixas que delimitam esta liberdade. 
Na Filosofia do estruturalismo, esta idéia é estendida 
para abranger uma imagem do homem cujas 
possibilidades são constantes e Fixas, como um baralho 
com o qua l podemos jogar vários jogos diFerentes 
dependendo da maneira com que lidamos com ele . 
Culturas diFerentes, sejam as chamadas primitivas, 
sejam as civilizadas, também representam uma 
transFormação do mesmo jogo, por assim dizer; as 
principais direções estão Fixas, enquanto a 
interpretação difere continuamente. 
ILévi+Strauss, La Pensée Souvoge, 1962) 
Depois de estudar e comparar os mitos e lendas de 
diversas culturas, lévi-Strauss observou a recorrência 
dos mesmos temos e, assim, chegou à conclusão de 
que, por meio da aplicação de regras de 
, , 
" 
" , 
transformação, havia um alto grau de correspondência 
na estrutura. Todos os padrões de comportamento em 
diferentes culturas, ele afi rmava, eram transformações 
um do outro; por mais diferentes que fossem, a relação 
com seu próprio sistema, no qual exercem uma função, 
serio, em princípio, constante. 
"00 mesmo modo, se você comparar fJmo fotografia e 
seu negativo - embora as duas imagens sejam 
diferentes -, verificará que as relações entre as partes 
componentes permanecem as mesmas. H (M. Foucault) 
Falando de maneiro mais simples, quando se chega ao 
essencial, pessoas diferentes em situações diferentes 
fazem as mesmas coisas de maneiras diFerentes e 
coisas diferentes da mesma maneira. 
"0 homem é aquilo que fazem dele, mas o importante 
é o que ele faz com o que fazem dele" (J.-P. Sartre) , o 
que significa o grau de liberdade que consegue criar na 
restrição de suas próprias possibilidades. 
O recurso mais simplificado da idéia de estruturo pode 
ser oferecido com base, digamos, no jogo de xadrez. 
Em um con junto simples de regras essencialmente 
infantis que governam a liberdade de movimentos de 
cada peça no jogo, os bons jogadores conseguem criar 
uma série infinita de possibilidades. Quanto melhor o 
jogador, mais rico a iogo, e dentro do conjunto oficial 
de regras surgem outras sub-regras não-oficiais, 
baseadas na experiência, que se desenvolvem até se 
rornarem regras oficiais nas mãos de jogadores 
experientes cuja experiência influencio por sua vez o 
.original dado, e assim, por extensão, contribui para 
regulamentá- Io_ Além disso, o xadrez é um exemplo 
extraordinário de como um conjunto fixo de regras não 
restringe a liberdade mas, pelo contrário, cria 
tiberdade. Noam Chomsky, lingüista americano (que é 
f,embrado especialmente por sua oposição à 
intervenção dos Estados Unidos no VietnamL comparou 
as línguas de modo semelhante ao modo comotévi-Strauss comparou os mitos - e concluiu que 
deveria haver uma capacidade li ngüístico análoga em 
todos os homens. Tomou como ponto de 'partida uma 
'"'gramática gerativa", uma espécie de padrão 
subjacente a todas as línguas e para o qual existe uma 
capacidade inata . Neste sentido, línguas diferentes, ta l 
tomo diferentes formas de comportamento, podem ser 
vistas como transformações umas das outras. De uma 
maneiro genérico, tudo isso não pa rece muito distante 
aos "arquétipos" de Jung. Isso conduz ao sentimento 
de que também a criação da forma e da organização 
espacial de maneira análoga pode ser remetida o uma 
capacidade ina ta a todos os homens nas mais diversas 
culturas para chegar a interpretações sempre diferentes 
das mesmas "arquiformas" essenciais. Além disso, 
Chomsky introduziu os conceitos de "competência" e 
"desempenho". Competência é o conhecimento que 
uma pessoa tem de sua língua, enquanto desempenho 
se refere 00 uso que ela faz deste conhecimento em 
situações concretas. E é com esta reformulação mais 
geral dos termos "língua" e "fala" que se pode 
estabelecer uma ligação com a arquitetura. Em te rmos 
arquitetônicos, pode-se dizer que "competência" é a 
capacidade da formo de ser interpretada, e 
"desempenho" é o modo pelo qual a forma é/foi 
interpretada numa situação específico. 
CR IANDO ESPAÇO , DEIXANDO ESPAÇO 93 
216 
217 
218 
2 FORMA E INTERPRETACAO 
I 
Grosso moelo, a "estrutura" equivale ao coletivo, ao 
gera" ao (mais) objetivo, e permite a interpretação 
quanto ,00 que se espera e ao que se exige dela numa 
situaçõC; específica. Poderíamos também falar de 
estrutura com relação a um edifício ou a um plano 
urbano: uma forma ampla que, mudando pouco ou 
nada, é adequada para acomodar situações diferentes 
porque oferece continuamente novas oportunidades 
para novos usos. 
CANAIS, AMSTERDAM 1216-2201 
O padrão dos cinturões de canais em Amsterdam dó ao 
centro da cidade o seu laroul particular e ajudo a nos 
lócolizarmo5. Os sucessivos semicírculos concêntricos não 
só permitem que nos situemos no centro da cidade, como 
ainda indicam a passagem do tempo - tal como os anéis 
no tronco de uma árvore. É óbvio que sua função original 
como estrutura defensiva pode ser vista hoje simplesmente 
94 LIÇÕES DE ARQUITETURA 
,amo um motivo subjacente de seu layou! particular, que 
'ave e ainda tem, potencialmente, muito para oferecer. Além 
de servir a objetivos de defesa, os canais eram usados 
,obretudo para o transporte de bens importados e 
.xportados aos quais a cidade devia grande parte de sua 
i queza; e, antes da criação do sistema público de esgotos, 
oerviam como bueiros para o lixo da cidade. Hoje os 
:anois constituem os principais cinturões verdes do centrol e 
JS passeios de barco oferecem à massa de turistas a 
'portunidade de apreciar a beleza de sua arquitetura de 
1m ponto de vista especial. Mas representaram também 
ema possibi lidade de conquistar um bom espaço extra -
Jma possibilidade especialmente atrativa na época em que 
a expansão urbana era uma alta prioridade, pois os canais 
"am vistos como uma solução para os problemas de 
'rânsito que assumiram proporções gigantescas nas 
:iécadas de 1950 e 1960. Muitos canais holandeses foram 
aferrados nessa época, o que significa que muitas cidades e 
"i las holandesas sofreram danos irreparáveis. 
:m Amsterdam, o prejuízo se limitou o uma série de canais 
'odiais - felizmente o singular layou! semicircular dos 
principais canais não foi adulterado. Os barcos-residência 
,inda são tolerados em alguns canais porque as 
Jutoridades têm consciência de sua importância como 
moradias substitutas numa época de drástica falta 
je moradias. Mas gostariam de ver·se livres deles o mais 
cedo possível, porque não compreendem como esta 
lariedode informal e em constante mudança contribui para 
a atmosfera vivaz da cidade - especialmente nos lugares 
.m que a aparência geral da cidade é dominada por uma 
arquitetura formal , dignificada, como a que aparece ao 
longo dos canais. 
No entanto, quondo olhamos fotografias antigas, vemos 
que os canais apresentavam um quadro bem mais agitado 
e desordenado no século possado, por causa do comércio 
que se reolizavo oli : o centro da cidade não era apenas 
moldado por uma bela arquitetura, mas também pela 
agitação viva e colorida em torno dos barcos que levavam 
suas cargas diretamente ao coração da cidade. 
A paisagem da cidade muda de forma mais rápida com as 
estações, sobretudo ao longo dos canais, onde as árvores 
produzem no verão efeitos espaciais completamente 
diferentes dos obtidos no inverno, quando estão nuos e as 
diversas fachados delineiam'se nitidamente contra o céu, 
formando uma delimitação quase gráfica do espaço 
urbano. E, por fim, há naturalmente o dramática mudança 
de aparêncio quando os canais congelom e a ênfase se 
desloca dos ruas ladeando os canois para o centro gelado, 
cheio de patinadores. Nestas ocasiões às vezes raras , tanto 
a atmosfera como o sentido de espoço mudam 
completamente por um momento. 
MEXCAlTlTÀN, MÉXICO (221·223) 
"O desejo de criar um ambiente suscetível de ter vários usos 
às vezes pode ser estimulado por circunstâncias locais 
específicas. Em Mexcaltitàn, uma povoado mexicano 
situado no rio Son Pedro, no México, as mudanças 
periódicas no nível da água por causa das pesadas chuvas 
Herengracnt, 
Amslerdam. 1672 / 
G. van Berkherde 
219 22Q 
CRIA NDO ESPAÇO. DEIXANDO ESPAÇO 9S 
122223 
21. 125 
do final do verão transformam as ruas temporariamente em 
canais, de modo que todo o lugar sofre uma verdadeira 
metamorfose. A vida na aldeia é inteiramente determinada 
por estas condições naturais. As ruas continuam a servir de 
modo igua lmente eficiente ao trânsito e ao transporte , ainda 
que 'agregadas' em diferentes situações, cada uma delas 
explorando integralmente o uso potencial específico." 141 
ESTAGEl, FRANÇA [224, 225) 
"Muitos rios que deságuam no Mediterrâneo mudam 
consideravelmente seu volume durante o ano, dependendo 
da estação. Em Estagel , perto de Perpignan, o rio Agly 
surge e desaparece dependendo da estação: ou não existe 
ou corre ao longo de seu velho leito. Mesmo quando está 
seco, porém, o rio domina a pequena cidade. Durante os 
períodos de seca, o leito do rio na cidade - uma vala 
cimentada - se torna parte do espaço público e oferece às 
96 LIÇÕES DE ARQUITETURA 
crianças do lugar um playground especial. Uma valeta que 
passa no centro do leito do rio coleta a água da chuva das 
ruas: este dreno é para o rio o que o rio é para a cidade, 
sua versão em miniatura, em termos de tomanho e de 
tempo, com períodos de seca que se alternam com períodos 
de água abundante. Para as crianças, é um enriquecimento 
do playground - para elas é um rio normal , com toda a 
excitação e às vezes com os problemas que um rio traz 
consigo." (4] 
I 
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I· ! i 
I 
I 
OUOE GRACHT, UTRECHT 1226· 233) 
Em Utrecht, a diferença natural de nível entre a rua e o 
canal resultou num perfil extraordinário e muito eficiente. 
Desde o século XIV as mercadorias eram transportadas 
celos canais em barcaças; eram carregadas e 
descarregadas na beira dos cais em frente aos espaços de 
armazenamento abaixo do nível da rua. Estes espaços 
de armazenamento, ou depósitos, continuam por baixo da 
"lia e formam os porões dos lojas situadas nas ruas acima. 
Jeste modo, a mercadoria podia ser facilmente erguida ou 
·:baixada por uma simples conexão vertical com o cais. 
~'l1 certo ponto, havia um túnel oblíquo através do qual as 
carruagens puxadas a cavalo podiam ir da rua até o cais e 
.ice-verso, fazendo o transporte para qualquer lugar na 
cidade. 
Quando a velha prática de transportes por águo foi 
interrompida, esses cais perderam sua função original, até 
que em época recente começaram a servir como terraços 
para cafés e restaurantes localizados nos antigos depósitos, 
os quais, em sua maioria, foram separados das lojas que 
ficaram acimadeles quando o transporte fluvial das 
mercadorias chegou ao fim e os cais deixaram de ser 
usados. 
Assim, hoje, os velhos cais voltaram a ser usados, embora 
de maneira diferente, e quando o tempo está bom eles 
novamente ficam cheios de gente. Na verdade, são 
excepcionalmente bem localizados, ao longo dos canais, 
onde as altas paredes dos armazéns dos cais oferecem 
proteção contra o vento e o barulho do trônsito. Também a 
distôncia entre as paredes de cada lado do canal, com os 
cais abaixo do nível da rua, ao longo da água, contribui 
para formar um logradouro de proporções agradáveis. 
A curvo neste ponto do canal apenas realça o espaço, 
fechando·o de maneira agradável sem obstruir a visão. 
Finalmente le quem poderia te r projetado iss02), há belas 
árvores no nível mais baixo, o que contribui mais do que 
qualquer outra coisa paro criar a atmosfera única e 
agradável dessa parte do centro antigo da cidade. Embora 
este perfil tenha sido projetado para objetivos urbanos 
específicos, hoje, um século mais tarde, ele se tornou um 
lugar inteiramente indiferente, sem que nenhuma mudança 
fundamental tenha sido necessária . É fácil imaginar a cena 
quando a água dos canais se congela, proporcionando um 
rinque natural de patinação. A bei ra do cais então se torna 
o lugar perfeito para calçar os patins, enquanto a rua 
acima se transforma no domínio dos espectadores . Essa 
transformação fornece ainda mais uma prova de quanto 
esse tipo de fo rma urbana pode acomodar, a fim de 
adequar· se a cada nova situação que surge. E, embora a 
escalo seio muito maior, as margens do Seno, em Paris, 
TT" ....... T~T .. ,.T .... - - - - - . - -
CR IANDO ESPAÇO . DEI XANDO ESPAÇO 97 
2260b 227 
228 
229 230 231 
232 233 
234 
2350 
236 237 23B 
oferecem condições comporáveis. Os c/ochards tiveram que 
desistir de seus tradicionais abrigos sob os pontes: uma 
artéria de trânsito tomou esta zona marginal ao lado da 
água. 
98 liÇÕ ES DE ARQUITETURA 
VIADUTO DA PRAÇA DA BASTIlHA - RUE RAMBOUILLET, PARIS 
(234·243) 
O viaduto foi construído para a estrada de ferro, como em 
tantas outras cidades onde os artérias de trânsito entram no 
conglomerado urbano. Os 72 arcos foram sendo ocupados 
pelo que ia aparecendo. O viaduto servia como uma 
espécie de moldura, uma seqüência de compartimentos bem 
definidos, que podiam ser preenchidos à vontade. 
O viaduto permanece em boa parte intacto, sem grandes 
modifjcações - uma estrutura permanente sempre pronta 
para acomodar novos objetivos que, por sua vez, 
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acrescenlam novos significados às redondezas. É nolável 
verificar como as ocupações pouco levaram em conta a 
forma semicircular da moldura - uma forma pouco 
conveniente para construções e aparentemente sem oferecer 
nenhum incentivo para que se criasse uma contra forma 
específica. Como se fosse a coisa mais óbvia do mundo, 
lodos os arcos foram preenchidos por edificações 
{onslruídas segundo os mesmos princípios de uma casa 
1um espaço livre. O próprio viadulo não serviu como ponlo 
je parlida ou fonle de inspiração, mas lambém não foi 
aercebido como um obsláculo; alé mesmo as ruas lalerais 
;!streifas prosseguiram em seu curso através do comprido 
obsláculo de pedra, que ao mesmo lempo peneira e é 
peneIrado pelo lecido urbano. Agora que não é mais usado 
para trens, torno~·se um passeio público, conduzindo até o 
,10VO edifício da Opera, no lugar da anliga Gore de 
/incennes. Há um plano para preencher as arcadas com 
!'achodas idênlicas, de acordo com as idéias civilizadas e 
'oleiramenle convencionais de hoie em dia sobre ordem. 
'lesle caso, um monumenlo urbano único leria de dar lugar 
J uma solução padronizada. 
239 
2~D 241 
23Sb 
142 243 
Visto do viadulo 
sobre o rue 
Rambouilfel com o 
antiga Gore de /0 
BO'fille (I 859J; o/i 
ergue-se hoje o novo 
edifício da Ópera 
CP IANDO ESPAÇO, DEIXANDO ESPAÇO 99 
144 245 
246 
247 241 
100 liÇÕ ES DE ARQUITETURA 
.' ._' _ .. . ~-' ... _, 
PALÁCIO DE DIOCLECIANO, SPlIT, IUGOSLÁVIA, SÉCULO IV D.C 
1244·2511 
Sob o título de "A casa de um imperador se transforma 
numa cidade para 3.000 pessoas em Split", o arquiteto 
Bakema escreveu um artigo sobre as ruínas deste palácio 
romano, que ainda hoje constitui o núcleo de Split (Fo,"m, 
2·19621. O que antes eram partes da estrutu ra do palácio 
agora servem de paredes para moradias. O que antes 
eram nichos agora são quartos, e o que antes eram salões 
do palácio agora são moradias, e ainda podemos ver por 
todo o porte fragmentos que evocam o função original dos 
estruturas. Este enorme edifício, 00 ser completamente 
absorvido pela cidade em volta, pôde servir à um novo e 
diferente objetivo, com a cidade se mostrando capaz de se 
adaptar inteiramente à formo oferecido, O que vemos aqui 
é uma metamorfose - o estrutura original ainda está 
presente no interior, mos o modo como o velho foi engolido 
UNiRf::> 
BI8L!07cC .;;\ 
S:;,Q ,; 0 ~é do Riv I-' re tc ~ sP. 
I· , 
1-
pelo novo faz com que nos perguntemos o que restaria, do 
ponto de vista estrutural, se subtraíssemos os acréscimos 
posteriores. O processo é irreversível - o palácio está ali 
mesmo, dentro, mas não pode ser ma is recuperado! 
Tampouco é possível conceber que, sob circunstâncias 
diferentes, uma adaptação totalmente diferente ao que 
restou da estrutura original possa algum dia ser real izada; 
de qualquer modo, o que restou da estrutura não oferece a 
menor sugestão de como isso seria possível. 
O exemplo de Spl it é especialmente interessante porque 
demonstra da maneíra mais clara possível a separação de 
forma e função. Vale a pena mencioná-lo aqui porque, já 
em 1962, era uma fonte de inspiração para nosso modo de 
pensor sobre formas arqu itetônicos como os anfiteatros -
ainda que estes, ao contrário do palácio em Split, não só 
permitiram novas formas de uso como também inspiraram 
estas novas aplicações em virtude de sua forma e estrutura 
específicas. 
CRIANDO ESPAÇO, DEIXAN DO ESPAÇO 
151 
101 
252 
Os ANFITEATROS DE ARlES E lUCCA {252-254} 
' O anfiteatro de Arles era usado como forta leza na Idade 
Média; depois foi ocupado por edifícios e foi habitado 
como uma cidade até o século XIX. O anfiteatro de lucca 
foi absorvido pela cidade e ao mesmo tempo permaneceu 
aberto como uma praça pública. Dentro do tecido urbano 
sem nome o espaço oval é um marco, emprestando seu 
nome e identidade aos arredores. Os dois anfiteatros, 
con!!ruídos para o mesmo objetivo, assumiram papéis 
diferentes sob as novas circunstâncias. Cada um assumiu a 
cor do novo ambiente que o absorveu e que foi absorvido 
'As arenas de Nimes e Arles, transformadas em 
vilareios pequenos, isolados, enquanto os 
remanescentes dos duas cidades galo-romanos 
eram abandonados aos lagartos e às cobras - isto 
n05 dó uma boa idéia da deterioraçõo urbana 
depois C/A quedo de Roma. Em Nimes os visigodos 
transformaram a arena numa minicidode de dois 
mil habitonfe5, na qual se enlrava por qualro 
pontes situadas nos quatro portões situados nos 
quatro pontos careleais. As igrejas Foram 
construídos denlro do arena. O mesmo aconteceu 
em Ar/es; as arenas transformaram-se em 
Fortalezas .• 
(Michel Rogoo citando Pierre Lavedon, in Histoire 
de Purnanisme, Anliquilé-Moyen Age, Paris, 1926) 
por ele, e o ambiente por sua vez também foi colorido pela 
antiga estrutura em seu centro. Os anfiteatros não só foram 
aceitos em sua nova forma como parte integral do tecido 
urbano, como também forneceram uma identidade a esse 
tecido. A estrutura oval e seus arredores mostraram"se 
capazes, em ambos os casos, de se modificar mutuamente. 
Estes espaços ovais representam uma lorma arquetípica 
- nesse caso, a do espaço cercado, um interior, um quarto 
amplo que pode servir como local de trabalho, playground, 
praça pública e lugar para morar. A função original foi 
esquecida, mas a forma de anfiteatro mantém sua 
relevância porqueé tão sugestiva que pode oferecer 
oportunidades para uma renovação constante.' (li 
Estes anfiteatros conseguiram manter sua identidade como 
espaços cercados, ao mesmo tempo em que seu conteúdo 
se submeteu à mudança. A mesma forma pode, portanto, 
assumir aparências diferentes sob c'ircunstôncias novas, sem 
102 LIÇÕ ES DE ARQUITETURA 
que a estrutura mude de modo essencial. Além disso, o 
exemplo de Arles - agora que essa arena foi restaurada em 
seu estado original - mostra que esse tipo de processo de 
transformação é basicamente reversível. É difícil imaginar 
um exemplo mais convincente de "competência" e 
' desempenho' na arquitetura. E o fato de que estes dois 
anfiteatros não sejam idênticos apenas sublinha a 
qualidade polêmica da situação: pois, assim como a 
autonomia da forma oval é enfatizada pelo processo de 
transformação, a forma como "arquétipo" também impõe-se 
quase inevitavelmente. 
Os exemplos anteriores, assim como os seguintes, dão 
margem a uma série de conclusões: 
• Em todos estes exemplos, os objetivos múltiplos que 
a estrutura original permitiu não foram deliberada ou 
intencionalmente inseridos na estrutura. É antes sua 
Ucompetência" intrínseca que faz com que se tomem 
capazes de desempenhar funções diferentes sob 
circunstâncias diferentes, e de cumprir deste modo um 
papel diferente dentro da cidade como um todo. 
• Não é certamente verdade que há sempre uma 
forma específica que se ajusta a um objetivo específico. 
Há formas que não só permitem várias interpretações 
como ainda suscitam efetivamente essas interpretações 
quando as circunstâncias mudam. Assim, seria possível 
dizer que a variedade de soluções deve estar contida 
na forma como uma proposta inerente. 
• Em nenhum destes casos a estrutura concreta muda 
sob a inFluência de sua nova Função - e aí está um 
ponto crucia l: a forma é capaz de adaptar-se a uma 
variedade de funções e de assumir numerosas 
aparências, ao mesmo tempo em que permanece 
fundamentalmente a mesma. 
• O grau com que uma forma abriga diferentes 
interpretações passivamente ou suscita essas 
interpretações ativamente por ser sugestiva em si (como 
no coso dos arenas) varia de uma situação poro outro. 
• A forma principal que chamamos estrutura é coletiva 
ar natureza, controlada geralmente por um órgão do 
governo e é essencialmente pública. O controle de seu 
uso pode ter desde o de caráter mais público até o 
mais privado, dependendo dos interesses comerciais 
em jogo. 
• Situações mais ou menos permanentes são em geral 
seguidos pela construção de extensões ou subdivisões 
- muitas vezes de edifíc ios inteiros. Mudanças de 
iunção podem surgir no longo prazo, em poucos anos, 
em uma estação do ano, uma semana ou diariamente. 
Quanto mais breve a duração de uma situação 
particular, menos permanente será a natureza das 
extensões ou dos ajustes, e em caso de uso diário 
podem até mesmo desaparecer por completo de um 
dia poro o outro. Há, portanto, uma importante 
distinção entre os casos em que ajustes ou extensões 
são de fato construídos, e casos em que a uocupação" 
se relaciona exclusivamente com o uso temporário. 
Nos exemplos seguintes, a ênfase está mais nos 
ajustes temporários, como aqueles que são solicitados 
pelo uso diário. 
CRIANDO ES/AÇO, DEIXANDO mAçO 
Anfiteatro, Lucco, 
Itália 
Anfiteotro, Arfes, 
França 
103 
253 
25' 
215 
TEMPLOS, BAlII255·259) 
Ao contrário da ênfase centralizadora num monumento 
únicoj dominante, como no mundo cristão, o hinduísmo, tal 
como praticado em Bali, se caracteriza por múltiplos 
centros de atenção e encontra expressão naquilo que se 
poderia chamar descentralização dos sítios cerimoniais. 
Existem milhares de templos espalhados por toda a ilha, 
isolados ou em grupos. 
Há múlfoplos níveis de atenção em termos de espaço e de 
tempo, dependendo da natureza da celebração: a 
veneração de um ancestralt cerimônias relacionadas com 
boas colheitas e assim par diante. O uso de diferentes 
templos está ligado a ocasiões específicas, de maneira que 
nem todas as templos são usados simultaneamente, mas há 
sempre algo acontecendo em alguns deles. Os templos, 
cujos tamanhos variam desde a de pequenas peças de 
mobilia até o de pequenas casas, são às vezes feitos de 
104 LI ÇÕES DE AR QUI TET UR A 
pedra, mas em geral consistem numa espécie de cabana 
aberta, com uma sofisticada construção de madeira e tetos 
de colmo sobre uma base de pedra. São, essencialmente, 
altares cobertos pontilhando a paisagem. Há templos que 
deixaram de ser usados, dos quais resta pouco mais que o 
esqueleto: cabanas vazias das quais uma ou mais, de 
repente, são guarnecidas e decoradas com belas 
tapeçarias, objetos feitos de bambu e folhas de palmeiras, e 
outros atributos próprios de ocasiões específicas, e sempre 
com oferendas. Cada templo individual portanto funciona 
como uma espécie de moldura que é elaborada e 
equipada, sempre que necessório, com os elementos 
adequados para caracterizar a ocasião particular que 
requer observância. Deste modo, cada templo permite a 
apropriação temporária para um fim específico; ele é, por 
assim dizer, 'vestido" para assumir certo papel, depois do 
que volta a se~ estado passivo original. 
, 
". 
l: 
Naturalmente, isto é uma simplificação da situação real , 
porque também encontramos templos que contêm vários 
templos menores, que por sua vez contêm outros ainda 
menores - estruturas dentra de estruturas - , o que pode 
muito bem ind icar diferenças na relação com um ancestral 
especifico entre os indivíduos ante a comunidade. 
E como se tudo isso não fosse bastante, longas fi las de 
mulheres surgem de repente, vindas de todos os lados e 
carregando fardos multicoloridos sobre suas cabeças: 
oferendas de arroz, coco e açúcar numa incrível variedade 
de formas e cores. Todas as oferendas são colocadas nos 
pequenos templos como um toque final e comestível: o mais 
transitório e suave componente numa seqüência de 
atributos. 
Quando a cerimônia termina e os deuses iá receberam suas 
oferendas, as oferendas de alimento são levadas de volta 
para caso, onde são consumidas, e os restos que ficaram 
no templo são comidos pelos cães. Isto pode chocar o 
racionalismo ocidental como algo contraditório - afinal, ou 
damos comida aos deuses ou nós mesmos a comemos-, 
mas num sentido menos literal e talvez mais intel igente é 
possível fazer ambas as coisas: uma vez que a transação 
religiosa iá foi consumada, a oferenda é apenas um~etisca 
saboroso para os pessoas e para os cães. Assim, um 
mesma e único obieto pode evidentemente desempenhar 
vários papéis em momentos diferentes, como neste coso, 
quando recebe uma interpretação ritual em determ inadas 
ocasiões 9, em seguida, quando a ocasião termina, é 
destituída desse conteúdo e retorno do extraordinário ao 
CRIANDO ESPAÇO, DEIXANDO ESPAÇO lOS 
156 
157 158 
159 
260 261 ordinário. Nas igrejas cristãs l todos os acessórios religiosos 
mantêm sua importância sagrada em tempo integral, 
mesmo quando o igreja não está sendo usada. No mundo 
ocidental não se concebe que um templo possa se 
tornar um lugar em que as crianças brinquem de 
esconde-esconde, como acontece em Bali, onde os crianças 
transformam os templos em seu playground. É difíci l 
imaginar um altar se transformando em brinquedo de 
escolar. Talvez no Ocidente os pessoas não tenham 
imaginação bastante - e também não é muito eficiente -
para construir altares como brinquedos de escalar. Como se 
Deus pudesse objetar a que as crianças subissem em seus 
altares - não, nesta parte do mundo queremos manter tudo 
limpo e certinho e em seu lugar adequado, para que não se 
estabeleça nenhuma confusão quanto a significados. 
ROCKEFELLER PLAZA, NOVA YORK 1260,261( 
A Rockefeller Plaza, a pequena praça rebaixada no meio 
do Rockefeller Center, em Manhanan, assume aparências 
bem diferentes no verão e no inverno. No inverno há os 
patinadores, e nos meses de verão o gelo dá lugar a um 
terraço com muitos assentos entreplantas e guarda-sóis. 
Este espaço claramente definido oferece todas as 
oportunidades pa ra que as ci rcunstâncias mutáveis das 
diferentes estações sejam exploradas ao móximo. 
UNIVERSIDADE DE COlÚMBIA, NOVA YORK 1262) 
Lances de escadaria monumentais são uma característica 
comum em edifícios que pretendem inspirar um sentimento 
de importância e, deste modo, um sentimento de respeito e 
reverência em todos os que entram. Neste caso l o edifício é 
uma biblioteca, o centro nervoso da universidade, um 
templo em que o conhecimento é guardado. E aqui a 
impressionante entrada não convida a uma visita 
espontâneo e informal, além de desencorajar firmemente 
106 II ÇÔES DE AR QUI TET UR A 
pessoas com dificuldade para andar. Não estamos mesmo 
diante de uma biblioteca amistosa! 
É como se alguém que desejasse compartilhar do 
conhecimento devesse sentir que algo será exigida em 
troca. Mas, por mais imponentes que as escadarias 
devessem ser, a fotografia mostra que elas também podem 
ser usodas de maneira bastante informal quando surge a 
ocasião. Como uma tribuna, por exemplo, para alguém 
discursar. Assim, a arquitetura mostra aqui que pode 
funcionar de um modo bem diferente do que se esperava, e 
até mesmo, como neste caso, em que os estudantes estão de 
costas para a biblioteca, para servir a um objetivo 
completamente diferente. 
No âmbito da forma , esta escadaria extrai toda a sua 
importância dos usos a que está destinada, mas esta 
mesma importância pode, sob a influência do uso 
específico que se faça das escadarias l converter-se 
exatamente em seu opostol como vemos aqui. 
Não seria difícil citar mais exemplos de como uma 
forma em grande escala pode, de maneira 
não-intencional, permitir interpretações diferentes. 
No entanto, o que nos preocupa aqui são as aplicações 
potenciais do princípio estabelecido. Se um arquiteto é 
capaz de apreender integralmente as implicações da 
distinção entre estrutura e ocupação, ou, em outras 
palavras, entre Ucompetêncian e "desempenho", ele 
pode chegar a soluções com um alto valor potencial no 
que diz respeito à sua aplicabilidade - Le., com mais 
espaço para interpretação. E, uma vez que o fator 
tempo é incorporado a suas soluções, há mais espaço 
para o tempo. Enquanto, por um lado, a estrutura 
representa o coletivo, por outro, a maneira como pode 
ser interpretada representa as exigências individuais, 
reconciliando assim o individual e o coletivo. 
161 
CRIANDO ESPACO , DflXANDO fSPACO 107 
3 A ESTRUTURA COMO 
ESPINHA DORSAL GERATIVA: 
Ao contrário dos exemplos anteriores, agora não 
estamos preocupados primeiramente com as diferentes 
interpretações 00 longo do tempo, mas com a 
diversidade de interpretações individuais que poderão 
coincidir no tempo, formando, deste modo, um todo, 
graças a uma estrutura que, como um denominador 
comum, por assim dizer, reconcilia a diversidade das 
Formas individuais de expressão. 
263 
Pógina 247 ele "La 
Ville Radieu$e", Pari$, 
'933 / Le Corbusier 
108 
URDIDURA E TRAMA 
O mecanismo de ordenaçõo contido nos exemplos 
seguintes traz à nossa mente uma variedade de 
imagens. Tomemos a imagem de um tecidot constituído 
pela urdidura e pela trama. Pode-se dizer que a 
urdidura estabelece o ordenamento básico do tecido e, 
ao fazê-lo, cria a oportunidade para que se consiga a 
maior variedade e colorido possíveis junto com a 
trama. 
A urdidura deve em primeiro lugar e acima de tudo 
ser forte e possuir a tensão correta, mas, no que diz 
respeito à cor, tem apenas de servir como base. É a 
trama que dá cor, padrão e textura ao tecido, 
dependendo da imaginação do tecelão. Urdidura e 
trama constituem um todo indivisível; uma não pode 
existir sem a outra e cada uma empresta à outra seu 
objetivo. 
PROJETO FOR! l'EMPEREUR, ARGEL, 1930 / LE (ORIUSIER 
(263-2691 
A idéia subjacente a esta megaestrutura alongada que 
segue a orla do mar como uma fila é combinar uma 
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li ÇÕES DE ARQUITE TURA 
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rodovia e um con junto de moradias. Acima e abaixo 
da rodovia ficam assoalhos superpostos que formam os 
sítios artificiais de edificação. Nesses sítios, as unidades de 
moradia podem ser construídas em qualquer estilo pelos 
proprietá rios individuais. 
Esta construção de soIs artificiel, I' chãos artificiais"1 pode 
ser designada como sustentáculo lo próprio le (orb usier 
usou o termo superestrutura I. Teria obviamente de ser 
construída numa operação única como parte da rodovia, e 
pelo Estado. O desenho mostra que le (orbusier pretendia, 
no papel pelo menos, a maior variedade imaginável. 
E certamente em 1930, no auge do Movimento Moderno e 
do Funcionalismo na arquitetura, isto era absolutamente 
revolucionário, ainda que ele tivesse noções algo ingênuas 
sobre o trâns ito, como mais tarde alguns comentadores 
apontaram. Tratava-se, porém, de uma visão 
extraordinária, que, mesmo hoje, mais de cinqüenta anos 
depois, ainda se revela mais inspiradora do que os 
arquitetos estão prontos a admiti r! 
o plano de Le Corbusier pora Argel é a chave para 
nossa linha de pensamento, uma vez que propõe 
explicitamente que seja oferecido aos ocupantes 
individuais a oportunidade, em virtude da força da 
própria megaestruturo, de criar suas casas exatamente 
como desejam, ou de acordo com as idéias de "seus 
próprios" arquitetos . 
Enquanto a estrutura coletiva indica apenas os limites 
espaciais de cada moradia individual, o conjunto das 
moradias determina a aparência do todo. Uma 
"'superestrutura" desse tipo cria as condições, no 
âmbito coletivo, para que os moradores individuais 
desfrutem de uma liberdade excepcional. 
O desenho - que é, aliás, um dos mais sugestivos 
feitos por Le Corbusier - mostra que os projetas e os 
métodos de construção mais divergentes podem 
coexistir harmoniosamente, e que é a megaestrutura 
• 
que não apenas torno possível tal diversidade, como 
ainda 'orna o complexo como um todo infinitamente 
mais rico do que poderia sê-lo 58 fosse feito por um 
único arquiteto, por mais engenhoso que fosse. Mas 
isso não é tudo - o desenho mostra que, quanto maior 
a diversidade das partes, melhor a qualídade do todo! 
Assim, caos e ordem parecem necessitar um do outro. 
, 
CRIANDO ESPAÇO, DEIXANDO ESPAÇO 109 
:" 
168 169 
--
o desenho também mostra algumas moradias bem 
comuns, o tipo de habitação popular (I) que sempre 
aparece num sistema em que as pessoas não têm voz 
ativa no projeto e na construção das casas em que 
vivem. No desenho de Le Corbusier, essas moradias 
não ocupam um lugar proeminente em meio à 
exuberância à sua volta, e parecem não ser mais do 
que a lembrança curiosa de uma época passada. Mas 
este tipo de moradia massificado é a realidade que 
encontramos continuamente 8, na verdade,constitui 
um dos problemas fundamentais que temos de 
enFrentar. As pessoas hoje não parecem mais ter idéia 
de como dar expressão a seu próprio estilo de vida, e 
no entanto sabemos que pessoas em todas as partes 
do mundo sempre construíram o tipo de casa 
que queriam, assim como vestiram o tipo de roupa de 
que gostavam, usaram seus próprios instrumentos e 
comeram seu próprio tipo de comida. Não há, 
portanto, nenhum motivo para supor que a capacidade 
de expressão pessoal por meio da forma seja 
essencialmente diferente da capacidade de expressão 
pessoal por meio da língua. E, se hoje parecemos 
incapazes de fazê-lo, então é razoável supor que a 
impotência da arquitetura hoje é causada por uma 
ruptura muito séria das relações sociais. A moradia de 
mossa, que está superficialmente de acordo com 
nossos circunstôncias industriais, deriva sua posição 
dominante do mecanismo de comportamento 
monocultural que governa nossa sociedade. O mínimo 
que um arquiteto pode fazer numa situação como esta 
é fornecer as linhos gerais das imagens que irão 
mostrar maneiras de despertar as pessoas de seu 
estado de embotamento. Por mais que a proposta de 
le Corbusier (1932) nos aproxime de uma solução 
aparentemente óbvia, por enquanto estamos distantes 
dela. Até mesmo o menor passo dado nesta direção 
logo entra em conflito com as conseqüências de nossa 
sociedade institucionalizado e centralizada, e não nos 
aproximamos da realização de nossos planos. Mas, 
nas poucas vezes em que o conseguimos, podemos 
pelo menos dar-nos a oportunidade de demonstrar o 
princípiol ainda que de modo mais teórico do que 
prático. 
110 LI ÇÕ ES OE AR QUITE TURA 
"As VIGAS DE SUSTENTAÇÃO E O POVO: O FIM DA MORADIA 
DE MASSA', 1961 / N. J. HABRAKEN 
Gostaria de mencionar a contribuição de Habraken 
neste contexto, que, num certo sentido, conforma-se ao 
que le Corbusier tinha em mente quando fez seu plano 
para Argel. ~abraken tentou, pelo menos em teoria , 
chegar a uma base a partir da qual , usando o aparato 
industrial à nossa disposição, as pessoas pudessem ter 
mais liberdade para escolher como querem morar. 
As vigas, unidades estruturais especialmente projetadas 
e fornecidas pelo Estado completas, com os requisitas 
técnicos básicos, podem servir como sítios para 
edificações sobre os quais as pessoas podem erguer 
casas pré-fabricadas ou módulos de casas, que são 
vendidos por numerosas firmas. O morador pode 
escolher o ti po de casa que quer a partir de uma 
determinada gama de possibilidades e fazer os ajustes 
que julgar necessários para adequá-Ia a seu gasto. 
Deste modo, ele envolve-se de maneira ativa num 
processo no qual normalmente não tem voz ativa. 
Contudo, os problemas surgem de imediato, já que 
também aqui as casas tornam-se totalmente 
comercializadas e, portanto, sujeitas às vicissitudes da 
competição e dos mecanismos de mercado. Isto significa 
que são niveladas pelo mínimo denominador comum - o 
da mediocridade - , e assim voltamos ao ponto de 
partida. O que torna a proposta interessante é a 
tentativa de criar as condições para uma exploração 
mais sensata e eficaz do rico potencial industrial de 
nossa sociedade. Cada um de nós se pergunta de vez 
em quando por que as casas não podem ser produzidas 
como os carros e, de um ponto de vista tecnológico, é 
muito difíci l entender por que existe esse problema com 
casas. 
A resposta é menos simples do que a pergunta, mas 
uma coisa fico bem clara: é especificamente o problema 
do assentamento, com sua infinita variedade de 
requ isitos e regras, que entra em conflito com a 
repetição, que é o esteio da tecnologia moderna . Se ao 
menos pudéssemos separar o problema da casa do 
problema do "sítio para edificação", que o Estado 
poderia fornecer como uma moldura urbana sofisticada, 
então, pelo menos do ponto de vista teórico, 'Jm dos 
,\ sonhos do século XX poderia se tornar realidade. Mas 
as poucas tentativas que foram feitas para realizar esse 
,anho não conseguiram sequer produzi r uma fração da 
imagem poética que le Corbusier nos mostrou há mais 
de cinqüenta anos. 
PROJETO DE CASAS FLUTUANTES (270-273) 
Casas flutuantes , geralmente atracadas em grupos por 
ordem das autoridades, constituem o exemplo mais 
visível na Holanda de uma acomodação (admitida mente 
permanente) na qual os moradores aínda têm voz ativa. 
O resultado, sobretudo em termos de aparência externa , 
roi uma situação ricamente diversificada. 
Esta liberdade de expressão se deve, sem dúvida, à 
ausência de forma e aparência tradicionais, oficiais. 
gesde o começo, a natureza deste fenômeno foi 
.,tabelecida por soluções domésticas para o problema 
da moradia. 
'sfo não conduziu a si tuações caóticas nem à desordem 
; eral que as autoridades tanto temiam, sem dúvida 
~orque a forma total e o tamanho das casas têm como 
base as barcaças sobre as quais são constru ídas, que 
~ão variam mui to. Além disso, elas ficam atracadas no 
;;,ntido do comprimento ao longo do cais, do qual tiram 
ogua, gás e eletricidade. Deste modo, estas casas 
"'presentam interpretações livres e pessoais de 
"lementos essencialmente padronizados, ligados aos 
,erviços públicos por amarras permanentes. 
os lugares onde as aglomerações de cosas flutuantes 
constituem ba irros inteiras, em geral na periferia das 
: idades, foram construídos molhes como um serviço 
~úblico : uma espinha dorsal mínima que fornece a 
,,,Ira-estrutura básica, como acesso e energia. É esta 
' espinha pública" que alinha a diversidade, por assim 
~izer, e, por conseguinte, introduz certa ordem. 
Podemos imaginar o planejamento de bairros residenciais 271 271 
Autuantes em áreas com muita água, até mesmo cidades 273 
inteiras no água, com uma rede de passeios de madeira 270 
em vez de ruas para fornecer a infra-estrutura. 
As unidades de moradia num assentamento sobre a água 
seriam muito mais variadas na aparência do que seria 
possível em nossas vilas e cidades comuns sobre a terra. 
E que senso de liberdade há em saber que podemos nos 
mudar com nossa casa para um lugar diferente, quando, 
por exemplo, quisermos estar em determinado bairro por 
um motivo qualquer. (Esta idéia surgiu com um plano de 
renovação urbana no centro de Amsterdam em 1970, 
quando as pessoas que eram obrigadas a deixar 
temporariamente suas casas por causa do programa de 
renovação podiam ir para uma casa flutuante num canal 
próximo, sem que fosse preciso abandonar contra sua 
vontade o ambiente familiar.) 
CRIAND O ESPAÇO, DEIX AND O ESPAÇO 111 
PROJETO HABITACIONAL DEVENTER-STEENBRUGGE 12741 
O projeto se limita a uma grade aberta, não mais do 
que o padrão de ruas e o parcelamento básico. 
As casas limitam· se, essencialmente, com duas ruas, e 
desse modo podem ler duas portas de frenle: assim, 
consegue·se evitar o perigo do excessivo controle social 
(caso ele venha a ser despertado de algum modo pela 
ênfase no espírito de comunidade). 
Portanto, a expectativa é que cada uma das diversas 
ruas adquira seu caráter específico a partir dos 
moradores e de suas atividades, permitindo que uma 
ampla variedade de soluçães possa se manifestar em um 
padrão de ruas com um traçado idêntico . 
Frente e fundos são adequados à construção, pelos 
próprios moradores, de extensães da casa como, por 
exemplo, garagem, galpão, local de trabalho, um 
quarto extra, um telheiro ou uma pequena loja. Para 
facilitar essa tarefa, foram levantados muros baixos nos 
limites entre os lotes, como um estímulo e um lembrete 
para os moradores daquilo que eles próprios podem 
empreender. 
O espaço da rua é constituído pelo todo, ao qual cada 
morador dá a sua contribuição: o espaço que os 
moradores deixam e constroem um para o outro. 
Na rua, o dependência mútua que já governava a 
del imitação das áreas privadas se torna o fator 
primordial , e, na verdade, deve possibilitar aos próprios 
moradores tomar decisães coletivamente, na cond ição 
de moradores da mesma rua. 14] 
112 IIÇÔES DE ARQUITETURA 
DE SCHALM, PROJETOPARA UM CENTRO COMUNITÁRIO 
1275-2771 
Já que a interação entre as pessoas se manifesta na rua, 
podemos conceber um centro comunitário como uma rua 
capaz de acomodar uma variedade de acréscimos 
potenciais, segundo as necessidades que possam surgir e 
de acordo com os recursos disponíveis. O centro 
comunitário deve ser planejado de tal modo que possa 
evoluir ao longo dos anos, graças à sua capacidade de 
adaptar-se a necessidades específicas; em outras 
palavras, deve ser sempre possível acrescentar novos 
elementos e alterá-los ou até mesmo demoli-los de 
acordo com as necessidades que surgirem. 
Dessa maneira, nosso ponto de partida foi o que se 
poderia chamar de uma espinha dorsal, uma rua com 
um teto transparente e em ângulo reto com vários muros 
marcando as zonas intermediárias entre a rua central e 
os futuros acréscimos. Por mais caótico que o complexo 
de componentes posso ser, a rua que funciona como 
-.J:-::r.:.: r I=-'.:-:-r ~·- r.-'-· __ L 
T I. r".r"' L t " :c [ 
espinha dorsal deve transformar o todo num caos 
permanentemente ordenado. Se houver necessidade de 
espaço para uma ocasião especial (i.e., temporária) 
como, por exemplo, comemorações, feiras, exposições, 
muitas vezes o melhor a fazer é improvisar instalações 
como marquises, abrigos, hangares, barracas e 
similares. Elas oferecem muito mais possibilidades do 
que estruturas permanentes, que tendem a ser pequenas 
demais ou grandes demais e eliminam o elemento 
surpresa. Em caso de necessidade de acomodação mais 
permanente, pode-se fazer uso de galpões, escritórios 
ou hangares pré-fabricados, prontamente disponíveis no 
mercado. O essencial é que 05 próprios moradores 
criem seus ambientes e que, nesse processo, os 
arquitetos limitem-se a proporcionar aos moradores os 
instrumentos adequados. Este proieto, um produto típico 
do iníc io dos anos 70, levantou algumas questões, iá 
que o resultado não se revelou inteiramente satisfatório. 
É evidente que os usuários não foram capazes de 
realizar tudo o que se esperava deles. Não foram 
capazes de ir além de encomendar componentes de 
construção inteiramente pré-fabricados, montá-los e 
pintá-los. A l/rua leve" converteu-se numa massa 
informe. Aparentemente, a rua com muros como motivo 
formal não foi suficientemente forte para resistir ao 
impacto das estruturas cruzadas (a "trama't e ainda 
menos de gerá-Ias como fora proietado originalmente. 
Embora este proieto combine uma ampla variedade de 
elementos e possa em muitos aspectos ser qualificado 
como um sucesso do ponto de vista de uma aventura 
grupal da própria comunidade, isto não se evidenciou 
de maneira nenhuma no âmbito da unidade formal. 
O que 05 indivíduos conseguem em seus domínios 
privados não é necessariamente conseguido por um 
grupo num espaço comunitário. O proieto é um exemplo 
do que acontece quando se dá demasiada liberdade ao 
usuário. O resultado é desapontado r quando se 
compara com a riqueza das possibil idades espaciais 
que um arquiteto poderia ter oferecido a eles. 
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CRI ANDO ESPAÇO , DEIXANDO ESPAÇO 113 
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278 279 280 
281"'" 
PROJETO PARA UMA PASSAGEM SUBTERRÂNEA PARA PEDESTRES 
1278-2811 
Uma passagem subterrânea localizada sob uma artéria 
de trânsito pesado constituía uma parte importante da 
rede rebaixada para pedestres que devia ligar o centro 
da cidade à estação ferroviária. 
Era isto pelo menos o que o centro de planeiamento de 
Apeldoorn tinha em mente na época em que o edifício 
Centrgal Seheer estava sendo proietada, e nessa época 
havia motivo suficiente para ligar esse futuro caminho 
para pedestres ao edifício_ Surgiu então a idéia de se 
abrir uma passagem subterrânea bem ampla, com o 
obietivo de fazer com que seu uso fosse além do trânsito 
de pedestres. Desta maneira seria possível não só evitar 
a desolação que em geral caracteriza esses túneis como 
ainda fazer com que essa construção, como um serviço 
público, fornecesse acomodação para instituições em 
busco de espaço mos sem possibilidade de pagar 
aluguéis comerciaist como, por exemplo, centros de 
atividades para iovens, espaços de ensaio para grupos 
teatrais, etc .{ assim como também para o comércio 
informal. Mas, então, por que não considerar a 
possibilidade de um mercado coberto! 
114 LIÇÕ ES DE ARQUITETUR A 
A experiência com espaços públicos cobertos mostra 
que não se trata de uma idéia rea lista e, ta l como 
acontece com o plano urbano, reside numa estimativa 
exagerado do que é factível. 
O plano era o seguinte: em vez de usar os amplos vãos 
comumente empregados nos subterrâneos com a 
finalidade de restringir o número das pontos de 
sustentação, seriam usadas várias colunas - colunas 
relativamente largas, que pudessem servir, sem 
necessidade de aiustes adicionais, à demarcação de 
unidades espaciais mais ou menos fechadas (cantos, 
nichos), em suma, à compartimentoção que fosse 
iulgada necessário . (Cada coluna é composto de duas 
colunas menores cercadas por um muro, que, por sua 
vez, pode acomodar nichos adiciona is ou vitri nes). 
A idéia era demonstrar que, 00 adotar a disposição em 
linha reta de colunas maciços, al inhadas no sentido do 
L 
caminho dos pedestres, a sugestão para que elas fossem 
usadas seria evidente - em outras palavras, que o 
material de construção seria ordenado para assegurar o 
máximo de competência. 
MORADIAS, WESTBROEK 1282-289) 
O projeta estrutural desta área residencial, de escala 
pequena e só parcialmente construída, não se baseia 
em princípios de construção mas sim na natureza do 
local de construção. Séculos atrás, a área foi 
artificialmente dividida por meio de um sistema 
de parcelamento que consistia em longas valas 
paralelas - uma caraderística tradicional da paisagem 
local, que devia ser preservada a qualquer custo. 
Nos Países-Baixos, é uma prática comum preparar sítios 
inadequados para a construção depositando 
inicialmente um leito de areia com a espessura de vários 
metros com a finalidade de servir como fundação para 
estradas, drenas, etc. ; isto naturalmente apaga todos os 
traços da paisagem, criando uma tábula rasa, na qual 
pode ser realizado um plano inteiramente abstrato sem 
levar em conta a natureza do terreno. Mas, neste caso, 
houve um emprego feliz da articulação "natural" do 
sítio sobre o qual se baseava o plano urbano. 
O principal objetivo do plano era construir nos faixas 
estreitas entre as valas, e, camo as faixas não eram 
suficientemente largas poro acomodar uma rua com 
moradias e jardins em ambos os lados, os edifícios 
foram oca na lodos juntos, o que resultou num perfil de 
ruas muito estreitas atravessando estruturas 
parcialmente superpostas. Graças a esta solução, foi 
possível manter no mínimo nível possível o espaço 
requerido para a fundação de areia e para a 
infra-estrutura de ruas e drenas, isto é, o mais longe 
possível das valas (ou, melhor dizendo, dos pequenos 
canais) poro prevenir o desabamento dos margens pela 
pressão lateral. O layou! específico foi , portanto, 
inteiramente engendrado pelas restrições e 
possibilidades do sítio original. 
Desta maneira, as valas ou pequenos canais foram 
mantidos no plano; as margens foram reforçadas 
segundo métodos variados, e nos pontos onde marcam 
os limites de jardins particulares acabaram por adquirir 
uma aparência variada sob a influência de sua nova 
função. Não só a articulação existente e o parcelamento 
da paisagem permitiram um layout altamente específico 
neste caso, como também a arquitetura resultante deu 
uma nova aparência às valas. 
CR IAN DO ESPAÇO , DEIXANDO ESPAÇO 115 
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116 lIÇÓ ES DE ARQUITETURA 
A eslrutura básica pôde desempenhar deste modo um 
papel crucial na disposição dos edifícios, e vice·versa: a 
estrutura básica e os edifícios influenciaram'se 
reciprocamente no âmbito da forma. Em retrospecto, 
poderíamos argumentar que o plano tal como foi 
realizado não revela de maneira suficiente as intenções 
urbanísticas subiacentes. A principal razão para isto, à 
parte o fato de que o plano não foi completado, é que 
ele não foi desenvolvido por mais de um arquiteto. 
A escalo do proieto era pequena demais para permitir o 
envolvimento de mais arquitetos, e, infelizmente, o 
potencial verdadeiramente gerador do motivo básico -
que pelo menos se manifesta nas margens das valas -
não pôde ser integralmente explorado em relação com 
os próprios edifícios . 
Durante a década de 1960, foram esboçados muitos 
planos, sobrefudo nos círculos do Team X, nos quais o 
princípio de distinção entre estrutura e complemento iá 
estava incluído. Estes planos, nos quais a rigidez de 
funções exclusivas e a desintegração subseqüente foram 
eliminadas com sucesso, podem realmente ser vistos 
como antecipando e inspirando o que hoie podemos 
chamar estruturalismo na arquitetura. 
UNIVERSIDADE liVRE, BERLIM, 1963 / CANDIUS, JOSIC & 
W OODS 1290·2941 
Este proieto, na versão original , propunha uma fórmula 
para organizar espacialmente uma universidade 
moderna como uma rede de inter'relações e 
oportunidades para a comunicação. Em vez de partir 
da tradicional divisão em faculdades , cada uma sediada 
como uma fortaleza em seu próprio edifício, com sua 
própria biblioteca, etc., o ponto de partida neste 
edifício foi uma único estrutura contínua funcionando 
como um conglomerado acadêmico coberto, no qual 
todas as partes componentes poderiam se posicionar 
mutuamente segundo uma relação lógica. Mas, assim 
como as idéias mudam ao longo do tempo, também as 
inter-relações mudam, e com elos os diversos 
componentes; propôs'se, portanto, a criação de espaços 
que pudessem ser levantados ou desmanchados dentro 
de uma rede fixa e permanente de ruas internas. 
A explicação está contida nas seguintes formulações de 
Shadroch Woods: 
Na) Nossa intenção, neste plano, é escolher uma 
organização mínima que forneça o máximo de 
oportunidades para o tipo de contato, de intercâmbio e 
de feed·back que constituem a verdadeira roison d'être 
da universidade, sem comprometer a tranqüilidade do 
trabalho individuo/. 
b) Estávamos convencidos de que era necessário ir além 
do estudo analítico das diversas laculdades ou atividades 
L 
nos diversos prédios; imaginamos uma síntese de funções 
e departamentos, em que todas as disciplinas pudessem 
se associar e as barreiras psicológicas e administrativas 
que as separam não fossem reforçados por meio do 
articulação arquitetônica ou da identificação 
fragmentária das partes à custa do todo. 
c} A teia de circulação primário e secundária e de 
serviços está aberta à possibilidade de modificação para 
que possa ser usada eficientemente. No primeiro estágio 
de planejamento, ela só existe como uma rede 
aproximada de direitos de circulação. Só será construída 
quando for requisitada para fornecer circulação e 
serviço. Nõo é uma megaestrutura, mas antes uma 
organização de estrutura mínima. Esta organização 
mantém seu potencial de crescimento e mudança, dentro 
dos limites do ambiente tecnológico e econômico. 
d} Nenhuma das áreas recebeu mais importância que a 
outra, quer na dimensão, quer na intensidade das 
atividades ali localizadas. Um aspecto inerente ao plano 
é o fato de não ser centralizado pelo uso. A decisão 
arbitrária de um arquiteto quanto à natureza e à 
localização de 'centros' foi substituída pela escolha real 
dos usuórios do sistema. fi 
(5hodroch Woods, World Archilec/ure, Londres, 1965, pp. 113-114) 
Woods era certamente adepto de ' crescimento e 
mudança", da idéia de que mudança e crescimento (e 
aparentemente jamais a diminuição) deveriam ser 
tratados como as constantes mais importantes - e isto é 
exatamente o oposto do que estamos advogando - mas 
ele recebeu o que merecia já que a Universidade Livre, 
tal como foi construído, acabou por se revelar, afinal, 
mais uma estrutura rígido. 
Contudo, há razões de sobra poro pelo menos levar em 
consideração a idéia básica, ainda relevante e de 
inegável importância, de um ordenamento mínimo neste 
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CRIANDO ESPAÇO . DEIXA NDO ESPAÇO 117 
Explicação com 
diagramas de 
5. Woods 
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caso, uma organização espacial necessária a um 
intercâmbio ótimo, capaz de gerar, em principio, a 
liberdade de escolha quanto à maneira de preencher a 
estrutura básica. 
PROJETO PARA UMA ÁREA RESIDENCIAL, BERLIM, 1965 / 
S. WEWERKA 1295-298) 
"A rua pode ser considerada como o mais antigo 
elemento do planejamento urbano. A rua sempre foi a 
sala de estar do povo. A idéia de colocar o espaço 
urbano familiar novamente em uso deu origem a este 
projeto. O espaço público deve se tornar mais uma vez 
o cenário, com uma melhor organização espacial, de 
todas as atividades para as quais foi usado desde 
tempos imemoríaís. 
118 liÇÕES DE ARQ UI TETURA 
Ao contrário do chamado plano de construção, o 
esquema de zoneamento proposto indica apenas as 
destinações e os meios de acesso, mas não a formo dos 
edifícios. Deste modo, pode surgir uma variedade de 
formas diferenciadas de moradia e de espaços de rua. 
As funções específicas de certas áreas podem mudar no 
futuro, necessitando de certos ajustes que, porém, não 
têm de comprometer a unidade da organização como 
um todo. Afinal, existem, espalhadas por todo o plano, 
passarelas para pedestres sobre as rodovias, assim 
como conexões de cruzamento cobertas tanto para 
pedestres como para veículos (a depender das 
exigências específicas de cada local) . 
O conjunto da área construída (formada por estruturas 
de moradias e estruturas de ruas) pode ser visto como 
um grande recipiente, no qual toda a velha gama da 
existência urbana pode assumir seu curso vivo, familiar. 
Foram feitas tentativas sérias de dar ao carro um papel 
adequado, em vez de começar pela que é melhor para 
o veículo. O trânsito foi eliminado da área, o que 
contribuiu bastante para simplificar a problema. Os 
moradores do lugar pelo menos poderão caminhar, 
;ogar, dirigir e estacionar onde quiserem, e sempre 
saberão qual é o seu lugar." (Slefon Wew"ko, 1964) 
"Este projeto é, essencialmente, apenas um tipo 
intensivo de loteamento do sítio de construção mediante 
o construção de muros, uma grade que deve ser 
preenchida segundo uma série de possibilidades 
definida por certas regros do jogo. 
Podem ser feitas aberturas nos muros, que, por sua vez, 
também podem ser totalmente eliminados para criar 
espaços públicos ou praças; a altura dos blocos pode 
variar, podem ser feitas passarelas para pedestres para 
ligar os blocos, e assim por diante. 
Esta grade abre um mundo de possibilidades ao 
Wofts Towers, 
Los Angeles, 
1921-54/5. Rod;o 
arquiteta. Em outras palavras, a grade é capaz de gerar 
ou até mesmo de provocar soluções. As limitações de 
trabalhar com o tema proposto não têm um efeito 
restritivo mas, como agentes catalisadores, possuem na 
verdade um efeito estimulante. Assim, as limitações do 
tema resultam em mais liberdade lé um paradoxo que 
liberdade e limitação gerem um ao outro?). 
Projetistas diferentes trabalhando independentemente 
podem usar a grade como um "plano diretor", que eles 
podem complementar com suas próprias soluções 
especificas. Do mesmo modo, uma grande variedade de 
programas pode ser implementada. No layoul, os 
componentes podem ser desenvolvidos de acordo com 
seus próprios critérios. O plano permite uma tal 
variedade de in terpretações que, a despei todo que é 
substi tu ído e por quem, o complexo como um todo 
sempre teró certa ordem. 
O essencial é que a grade pode ser interpretada em 
todos os níveis - jó que fornece apenas o padrão 
objetivo, o padrão subjacente, por assim dizer, o 
protolorma, que adquire sua verdadeira identidade em 
vi rtude das próprias interpretações que recebe, 
especialmente pelos programas inseridos e a maneira 
especifica como é realizado. Seja ló o que for inserido, 
sempre estará diretamente ordenado, o que não 
significa ordenação no sentido de I'subserviência", mas 
antes no sentido de "tendência". A grade funciona como 
uma estrutura gerativa que contém dentro de si o 
tendência bósica que é transmitida a cada solução. 
E, uma vez que a grade confere aos componentes 
individuais a tendência comum, não só as partes 
determinam a identidade do todo, mas o todo contribui 
para a identidade das partes. A identidade das partes e 
do todo seró reciprocamente gerativa." [3J 
À parle a qualidade excepcional dos planas de Woods 
e Wewerka como idéias, o que podemos aprender em 
especial com eles é que nõo devemos concentrar nossa 
atenção na mudança a ponto de excluir o resto, mas 
sim na estrutura que, em sua constância, é capaz de 
absorver a mudança. 
No exemplo dado acima, a imagem da urdidura e da 
trama, a estrutura coletiva é portanto a urdidura, na 
qual as interpretações individuais são tecidas como Q 
trama. Foi o estrutura coletiva, que, em si, pouco ou 
Le P%is Idec: 
1879-1912 / 
FacfelH dev:. 
CilANDO 1SPAÇO, DEIXANDO mAçO 119 
nada significo, que suscitou os interpretações 
individuais, que não surgiriam se não houvesse um 
contexto. Além disso, é a estrutura que indica a 
coerência, sem o qual haveria apenas uma massa 
avossalodora de expressões - o que chamamos caos. 
A consciência dos efeitos repressivos de equiparar as 
unidades de moradias nos edifícios de apartamentos a 
sistemas de armazenamento em grande escala 
alcançou o clímax nos anos 60. A conseqüência foi um 
repúdio radical de tudo que simplesmente se referisse 
a sistemas e- ordens impostos de cima. Ao mesmo 
tempo, deu-se muita ênfase à riqueza resultante da 
expressão individual. Basta pensar nas "Watts Towersll 
de Som Rodia, ou no "Palais IdéalR do carteiro Cheval, 
e em toda o arquitetura fantástico que pessoas levadas 
por uma educação extrema criaram com suas próprias 
mãos! E, mesmo assim, a vitória da criatividade e do 
dedicação individual sobre tudo que é imposto pelos 
poderes estabelecidos ê uma simplificação excessiva. 
Assim como a linguagem ê necessária para nos 
expressarmos coletivamente em termos de estrutura, 
também é necessária uma estrutura formal coletiva 
para que possamos nos expressar espacialmente em 
nosso ambiente. Se há alguma coisa que se destaca 
entre todos estes exemplos, é certamente o paradoxo 
de que a restrição de um princípio estruturador 
(urdidura, espinha dorsal, grade) aparentemente não 
resulta em diminuição mas sim em expansão 
das possibilidades de adaptação e, portanto, das 
possibilidades individuais de expressão. O tema 
estrutural correto não restringe a liberdade, mas 
conduz à liberdade! Assim, a maneira como a 
estrutura é preenchida não é mais subserviente 
à estrutura do que a estrutura ê subserviente à 
maneira como é preenchida. Eu ainda estou pensando 
120 liÇÕ ES DE ARQUITETURA 
em termos de urdidura e trama: a urdidura pode servir 
para manter todo o tecido unido, mas a aparência do 
produto final ainda é determinada pelo trama. 
Mas estrutura e preenchimento não são apenas 
equivalentes, são também recíprocos, e aqui, portanto! 
a idéio de urdidura e trama não mais se aplica - da 
mesma maneira que a fala também cria a língua l e 
não só o inverso, elas se geram mutuamente, e quanto 
melhor for a qualidade de cada uma delas menos 
importante será a distinção entre as duas categorias. 
VILLA SAVOYE, POISSY, 1929-32 / l E CORBUSIER {302-30S) 
É difícil encontrar um exemplo melhor de um plan libre do 
que a Villa Savoye de le Corbusier em Poissy: Les Heures 
Claires lHAs Horas ClarasH)_ 
O plan libre demonstra uma exploração coerente das novas 
possibilidades oferecidas pela aplicação da estrutura de 
concreto. 
Uma característica desses primeiros exemplos de planos 
livres eram, além das colunas livres , as paredes 
freqüentemente curvadas, que proclamavam quase 
ostentosamente sua li bertação da função de suportar o 
peso. Quando somos confrontados com uma moldura 
concreta desse tipo, esperamos inevi tavelmente que os 
colunas estejam distribuidos segundo algum arranjo regular, 
governado por critérios construtivos, e, à primeiro visto, nos 
sentimos inclinados o pensar que elas foram arran jadas 
como estó indicado na figura a, mas não é absolutamente o 
coso. 
É possivel que le Corbusier tenha partido de um sistema 
regular, mas, durante o desenvolvimento do projeto, tenha 
sentido o impulso não só de adaptar as paredes às 
posições das colunas, mas também de deslocar as colunas 
em relação com as paredes para obter a configuração 
correta . Em virtude das condiçães oferecidos pelas paredes 
........... 
I 
cI~ .+++... I--
blf-----LLL- t-I 
, 
I 
·· .. ·· .. ··t···i· + .. -
• I+------l--'-t-'--····f-~-_1 
! 
e pelos colunas, os dois sistemas deram espaço um poro o 
outro, e assim criaram os condições de li berdade um no 
outro. O edifício, como uma máquina branca, uma nave 
espacial de outro planeta aterrissado no meio do natureza, 
represento, mais do que qualquer outro, o mecanismo do 
arqu itetura do século XX. 
CRIANDO ESPAÇO, DEIXANDO ESPAÇO 121 
303 
30J 
305 
4 GRELHA Planto, Timgad, Algério 
o princípio de ordenamento mínimo da cidade por 
meio de uma grelha é conhecido desde que se 
invento~ o planejamento urbano. Há cidades que, por 
causa de uma série de acontecimentos, não evoluíram 
segundo um processo gradual de crescimento. Nelas, 
desenvolvidas de acordo com um plano preconcebido e 
fixo, toda vez que as circunstâncias locais deixaram de 
fornecer por conta própria um incentivo automático 
para a lguma espécie de ordenamento, sentiu-se a 
necessidade de algo semelhante a uma grade: um 
"projeto" para o que devia ser feito em seguida. 
Qualquer que tenho sido o ponto de partida em cada 
caso específico, encontramos ao longo do história 
variações sobre o mesmo tema, isto é, as quais 
garantem numa fórmula única as condições de 
distribuição de terra, seja em grande escala seja no 
longo prazo, e o acesso a cada lote de terra. O ponto 
de partida é quase sempre o lote retangular ou 
quadrado: ruas cercando quadras cujas dimensões 
correspondem ao método de construção escolhido, 
oinda que em princípio elas possam ser preenchidas 
de várias maneiras, já que a natureza do 
preenchimento depende das carocteristicas do período 
em que ele é exigido. 
122 LlÇÓ ES DE ARQUIT ETURA 
ENSANCHE, BARCELONA, 1859 / I. CERDÁ 1307·3101 
O plano de Ildefonso Cerdá para Barcelona, na segunda 
metade do século XIX, teve como objetivo garantir uma 
qualidade superior à oferecido por uma ordenação 
primário de ruas e quadras, dentro da qual se podia fazer 
o que bem se entendesse. Ele estabeleceu o tamanho das 
praças em relação à altura de certos construções, para 
garantir condições adequados de moradia em todos os 
setores. Propôs também que porte dos quadras deveria ficar 
sem edifícios. Nada disto foi mantido na execução porque, 
como acontece freqüentemente, os exigências de qualidade 
poro o moradia não conseguiram prevalecer sobre o poder 
dos proprietários de terras e incorporadores. A proposta de 
Cerdá de um princípio de construção formado por fa ixas 
que podiam alternar a direção por quadras, por mais 
simples que possa parecer, conseguia criar possibilidades 
de variação virtualmente inexauríveis, o que poderia 
conduzir a um padrão incrivelmente rico do espaço urbano. 
E isso não se aplica somente aos volumes no âmbito 
abstrato, pois há também a alternância com o verde, que 
constitui, por si mesma, um fator deorganização na 
definição e na variação do espaço. E ainda não nos 
referimos à elaboração posterior das quadras por vários 
arquitetos, cada um com sua própria assinatura, o que 
automaticamente assegurava que não haveria dois lugares 
idênticos dentro desse sistema lúcido e coeren te. 
O aspecto mais engenhoso desse plano reside na clara 
definição das esquinas, e na maneira como esses edifícios 
de esquina voltam-se regularmente com uma fachada 
diagonal para as ruas que se cruzam. As quatro diagonais 
ampliam cada interseção, formando desse modo uma 
pequena praça, capaz de fornecer um alivio bem-vindo à 
monotonia das ruas compridas. Mas, mesmo na forma em 
que esse plano acabou sendo realizado, com quadras 
assentadas de maneiro fechada e edifícios bem mais altos 
do que estava previsto no plono original, o efeito desse 
orranjo do esquina sobre o farout como um todo ainda é 
notável e cheio de sugestões para que os arquitetos se 
li bertem - como foi o caso de Gaudi - da rigidez das 
soluções mais óbvias. 
119,",," 
310 
Casa Mi/á, Barce/ono, 1906· 10 ! A. Gc_~ 
CRIANDO ESPAÇ O, DE IXANDO ESPAÇ O 123 
311 312 
MANHATTAN, NOVA YORK 1311 ·31.) 
Nas grandes cidades americanas que se desenvolveram 
rapidamente, encontramos a grelha aplicada em sua formo 
mais elementar e com seus resultados mais característicos. 
É difíci l imaginar melhor maneira para domar a coleção 
selvagem de formas arquitetônicas, que vai desde estruturas 
achatadas até arranha·céus - já que é quase impossível 
exercer controle neste mundo da inexorável livre empresa. 
Monhanan é inegavelmente o exemplo mais excitante de 
todos. Não apenas vemos desfilar diante de nossos olhos a 
mais fascinante gamo de soluçães arquitetônicas como se 
fosse uma paisagem cheia de variaçães, mas ainda, graças 
à formo curiosamente alongado do península, nos foz 
perceber dois traços contraditórios: de um lado, os ruas 
largas 00 longo do eixo longitudinal, que são tão 
compridas que se pode ver o ponto de fuga no horizonte, 
el do outro ladol as ruas laterais mais estreitos cobrindo o 
distância relativamente curto de uma margem à outra. 
Enquanto experimentamos a vastidão do cidade em 
Manhanan, cada rua lateral proporciona a visão do água 
mais adiante. Neste caso l a grade contribui de uma 
maneira muito especial paro a forma como experimentamos 
o espaço urbano. 
Uma das primeiros coisas a impressionar o visitante em 
Manhanan é a fria e determinada regularidade com que o 
grade foi aplicada, até que simplesmente não pôde mais 
ser levada adiante. O resultado é que as bordas um tonto 
irregulares não só parecem aleatórias como também, em 
certo medida, insensíveis. Mas igualmente notável é que 
124 IIÇÓES DE ARQUITETURA 
também o sejam os lugares onde surgiram os soluções mais 
interessantes. Seria de esperar, dentro de um sistema 
retangular tão rigoroso, que os extremidades pudessem 
terminar de uma maneira condizente com as possibilidades 
oferecidos pelo grade. Mos, como com tonto freqüência 
acontecei é o confronto entre um princípio e outro que 
revelo a natureza de cada um . Isto se torno talvez ainda 
mais evidente quando o padrão longitudinal regular é 
cortado pelo Broodway, o velho cominho rural que 
permaneceu virtualmente intocado como se fosse inerente à 
paisagem. A Broadway foi incorporado à grade como um 
fator inevitável, e em todos os pontos em que encontra o 
grade provoca uma ruptura, desafiando os arquitetos o 
achar uma solução imaginativo para essa irregularidade. 
Um exemplo célebre de uma solução desse tipo é o edifício 
FlaHron em Madison Squore. É nesses lugares que o 
natureza da gr~de se manifesta de maneiro mais 
convincente. 
A concepção mais equivocada quanto 00 sistema da 
grelha é a idéia de que ele conduz quase que 
inevitavelmente à monotonia, e que seu efeito é 
opressivo. Estes perigos realmente existem, mas aqui 
temos exemplos suHcientes para provar quer numa 
extensão gigantesca de edifíciosr os aspectos negativos 
se tornam secundários. Se o ordenamento da grelha 
realmente expandirá as possibilidades de variação em 
vez de reduzi-Iasr é algo que irá depender, em 
primeiro lugar e acima de tudo, da descoberta do 
/ 
verdadeiro equilíbrio entre as regulamentações e a 
liberdade de escolha. 
A grade é como uma mão trabalhando a partir de 
princípios extremamente simples - ela com certeza 
estabelece as regras gerais l mas é por demais flexível 
quanto ao detalhamento de cada sítio. Como umo base 
objetiVai ela delineia o layout do espaço urbanor e 
essa disposição reduz a proporções aceitáveis o efeito 
inevitavelmente caótico das inúmeras decisões 
isoladas. Em sua simplicidade, a grade é um meio 
mais eficiente de obter algum tipo de regulamentação 
do que muitos sistemas de regras mais complexas que, 
embora ostensivamente mais flexíveis e abertos, 
tendem a sufocar o espírito imaginativo. No que se 
refere à economia de meios, parece-se muito com um 
tabuleiro de xadrez - e quem pode pensar num leque 
maior de possibilidades surgindo de regras simples e 
diretos do que as de que o jogador de xadrez dispõe? 
CR IANDO ESPAÇO, DEIXANDO ESPAÇO 125 
31S 31 6 
S ORDENAMENTO -DA CONSTRUCAO , 
Em termos simples, seria possível dizer que o 
ordenamento da construção é a unidade que surge 
num edifício quando as partes tomadas em conjunto 
determi~am o todo, e inversamente, quando as partes 
isoladas derivam desse todo de modo igualmente 
lógico. A unidade resultante do projeto que emprega 
consistentemente essa reciprocidade - partes 
determinando o todo e determinadas por ele - pode 
num certo sentido ser vista como uma estrutura. 
O material (a informação) é escolhido deliberadamente, 
adaptado oos requisitos da obra em questão, e, em 
princípio, as soluções das vórios situações de projeto 
(i.e., as suas inter-relações de um lugar Q outro) são 
permutas ou, pelo menos, derivados diretos das 
partes. O resultado será um relacionamento daro, 
pode-se dizer até mesmo familiar, entre as várias partes. 
Seguindo essa linha de raciocínio, vemos que há uma 
comparação óbvia com aquele notável exemplo de 
estrutura: a língua. 
Cada frase deriva seu significado dos palavras que o 
compõem, 00 mesmo tempo em que cada palavra 
deriva seu significado da frase como um todo. 
Naturalmente, cada edifício bem projetado tem urna 
idéia coerente, uma unidade temático distinto, uma 
unidade de vocabulário, material e método de 
construção. Mas aqui o essencial é o projeto baseado 
numa estratégia coerente. Começando pelos 
componentes, temos de percorrer todo o edifício várias 
vezes paro verificarmos se todas as extremidades 
podem ser reunidas sob o denominador comum de um 
tema (testando assim a hipótese). Esta exploração, por 
sua vez, conduz ao ajuste da hipótese ou do tema. 
Este método de trabalho implico, na verdade, o 
preenchimento da própria estrutura do projeto, por 
assim dizer, e, mediante o feecJback do resultado, 
acaba-se por chegar a um ordenamento no qual as 
126 LIÇÕ ES DE AlQUl lET URA 
condições para todas as inserções concebíveis já 
estejam presentes. Em outras palavros, uma estrutura 
que foi programada para acomodar todas as inserções 
possíveis. Assim, é possível chegar objetivamente a 
uma unidade de espaço, componentes, materiais e 
cores, de tal forma que possa acomodar um máximo 
de usos variados. Este processo de pensamento, 
concebido sob a inspiração do estruturalismo, procura 
acertar contos com o esforço algo contraditório do 
funcionalismo para descobrir uma forma específica e 
uma organização espacial específica para cada função. 
O projeto que procura o máximo denominador comum, 
o conjunto de todos os requisitos em discussão numa 
tarefa particular Ii.e., o programa em seu sentido mais 
amploL emprega uma estratégia diferente e exige uma 
visão fundamentalmente diferente do arquiteto. 
ORFANATO, AMStERDAM, 1955-60 / A. VAN EYCK 1315-321) 
A primeira estrutura executada com um ordenamento da 
construção, no sentido de umaunidade na qual as partes e 
o todo se determinam reciprocamente, é o orfanato de Aldo 
van Eyck. A organização desse edifício, com suas "ruas" e 
"praças" e unidades de construção independentes, é como 
a de uma pequena cidade autônoma. Ele desperta essas 
associações ainda que não conheçamos a exortação de 
Van Eyck: "Faça de cada coisa um lugar, faça de cada casa 
e de cada cidade uma porção de lugares, pois uma casa 
é uma cidade minúscula e uma cidade é uma casa 
enorme./I 
Esta identificação com uma ' pequena cidade" é talvez o 
passo mais criativo e uma ruptura de grande significado. 
Na fase do proieto, uma vez estabelecida essa "conexão", 
uma série de associações posteriores emerge, 
acrescentando uma nova dimensão à qualidade dos lugares 
comunitários, IIpúblicos", Corredores se tornam #ruas", a 
iluminação interior se torna lI iluminação de rua" e assim 
por diante. Embora um edifício não possa nunca ser 
uma cidade, ou mesmo alguma entidade intermediária, 
ainda assim pode tornar-se semelhante a uma cidade e, 
desse modo, transformar-se numa casa melhor. Essa 
imagem recíproca da casa-cidade conduz a uma 
articulação coerente de grande e pequeno no interior e no 
exterior, em seqüências de unidades contingentes que se 
interl igam sem tensão ou esforço. Quando essa articulação 
é levada a cabo até a sua menor dimensão, não só os 
edifieios e as cidades adquirem um significado recíproco, 
mas também os edifieios e a mobília , pois as peças da 
mobília J/construída'l são como pequenas casas diante das 
quais nos sentimos ai nda mais inferiorizodos do que num 
quarto amplo. Assim, cada parte recebe a dimensão que se 
adapta melhor a seu objetivo, i.e. , o tamanho certo pelo 
qual ela se torna o que é. 
Hoje tudo isso pertence ao conhecimento comum, portanto, 
eu me pergunto se existe alguém que acredite não ter sido 
inAuenciado par essas formulações. No entanto, o que 
sempre me surpreende é que, por mais absorvente que a 
elaboração até a menor parte possa ser, o essência do 
conjunto maior permanece invariavelmente poderoso . 
O todo irradia a tranqüilidade de um equilíbrio que 
compreende uma extraordinário complexidade de forma e 
de espaço numa única imagem. Parece-me que o segredo 
está na inexorável unidade de materia l, fo rma, escala e 
construção, combinados em um ordenamento de construção 
de tal clareza que eu sempre o associei mais com a ordem 
clássica do que com o casbah. lEu sei, Aldo quer os dois: 
clareza, mas lab iríntica; casbah, mas organizado. Nem um 
nem o outro, mas os dois ao mesmo tempo, o que reclama 
um mecanismo mais abrangente. A essa altura, com todos 
os meios que o século XX põe à nossa dispos ição, já 
deveríamos estar em condições de realizar algo assim.) 
Talvez os dintéis também tenham algo a ver com isto, 
marcados como são pelas aberturas horizontais colocadas 
para dar a impressão de um alargamento das colunas no 
alto, como um capitel. A zona contínua de dintéis forma um 
horizonte por todo o edifieio, tonto do lado de dentro 
quanto do lado de fora. 
O que desse modo se torna claro paro mim é que a 
maneira coma uma paisagem é libertada por seu horizonte 
é similar à maneira pela qual o potencial coesivo do 
ordenamento da construção pode dar ao edifieio um 
horizonte do qual - estranho paradoxo - ele extrai sua 
liberdade. 
São as unidades do telhado em forma de abóbada, as 
colunas arredondadas e, acima de tudo, a cadeia de dintéis 
que tornam passível a interpenetração de exterior e interior. 
Convidam, por assim dizer, um jogo de paredes, que levam 
o exterior para dentro e o interior paro fora. A escola 00 
ar livre de Duiker vem à nossa mente. Ali, a superlieie de 
vidro em volta do limite exterior das salas de aula abre 
espaço para amplas galerias abertas las salas de aula do 
lado de Iara), enquanto a moldura de concreto continua a 
permitir a "leitura" da mossa inteira do edilieio. Por meio 
do vigamento, da maneira que só Duiker sabia fazer, as 
cantos se tornam ainda mais leves e transparentes. 
CR IAN DO ES PAÇO, DEIXANDO ESPA ÇO 127 
317 318 319 
llO 321 
32' 
lnoi> 
m 
No Orfanato, a superfície exterior também se volta para 
dentro para formar pórtico, galeria ou varanda dentro da 
periferia, mas o inverso tombém ocorre: o interior irrompe 
em três lugares, suprimindo os cantos internos que, de outra 
maneira, restringiriam o movimento e a visão desses 
lugares. Soluções desse tipo são certamente espantosas. 
Meu primeiro contato superficial com o Orfanato, ainda em 
construção naquela época, já foi su ficiente para me 
convençer de que esse novo e admirável edifício pertencia 
a um tipo inteiramente novo, baseado num mecanismo 
diferente e proclamando um outro tipo de arquitetura. 181 
llNMu 1322·331) 
O espaço de trabalho que foi construído no telhado de uma 
fábrica da começo deste século teve como primeiro ob jetivo 
ampliar as instalações. Nessa época, a expeclativa era de 
que, à medida que os diversos departamentos da fábrica se 
expandissem, fosse necessário realizar uma série de 
ampliações: 
1 . a impossibilidade de prever que departamentos iriam 
precisar de expansão e quando; 
2. a nalureza e o potencial de investimento da companhia 
128 liÇÕ ES DE ARQUITETURA 
permitiam apenas que um número limitado de unidades 
fossem construídas simultaneamente; 
3. a qualidade das instalações existentes era 
suficientemente boa para justi fi car sua conservação e, 
embora um tanto sombrio e disposto de maneira ineficiente, 
o edifício ainda serviria após alterações pouco importantes. 
Para direcionar o crescimento esperado no futuro e evitar 
que as extensões se transformassem numa colcha de 
retalhos, tomou'se a decisão de projetar as unidades de 
construção com base em vórios motivos inter-relacionados. 
Deste modo seria possível usar diversas combinações para 
criar uma variedade de espaços maiores. Os princípios 
fundamentais do projeto foram os seguintes: 
a. Para acomodar as mudanças constantes dentro do 
negócio, cada unidade tinha de satisfazer a uma ampla 
escola de requisitos industriais - i.e., não poderia ser 
estritamente adaptada a um programa específico, mos 
deveria ser suficientemente flexível para acomodar diversas 
funções sem que a unidade precisasse ser reajustada; 
b. Após cada ampliação, as instalações construídas 
deveriam estar completas, independentemente do estágio 
subseqüente da construção; cada novo acréscimo devia, 
portanto, formar um todo acabado. 
Por conseguinte, cada unidade deveria ter uma identidade 
própria, suficientemente forte para se afirmar por si, 
independente do ambiente específico e, além disso, 
contribuir para a identidade do todo mais amplo do qual 
constitui parte. Neste caso, o uso um tonto demonstrativo 
dos componentes pré·fabricados não é uma conseqüência 
do necessidade de repetir, mos sim - e isto parece 
paradoxal - uma conseqüência do desejo de individualizar 
cada componente. Os componentes devem ser autônomos 
para que possam servir a múltiplas funções, enquanto a 
forma deve ser escolhida de tal modo que as diversas 
unidades possam ser constantemente harmonizadas. 
Os prédios originais foram construídos de modo que 
permitissem que um outro andar fosse acrescentado em 
cima e eram, portanto, fortes o suficiente para servir de 
base às ampliações graduais que deveriam cobrir essa 
formação artificial de pedra. As novas estruturas realçam a 
cor das anteriores, ao mesmo tempo em que as estruturas 
anteriores contribuem para a criação e para a formação 
das novas. O velho e o novo mantêm suàs identidades ao 
mesmo tempo em que as confirmam mutuamente. 
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CRIANDO ESPAÇO, DEIXANDO ESPAÇO 129 
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332 
333 334 
33S 
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DE DRIE HOVEN, LAR PARA IDOSOS 1332·341 1 
Este con junto poro pessoos idosos e incapacitadas consiste 
em seções de asilo, de assistência e de moradias 
independentes e instalações centrais de lazer. Cadauma 
das seções tem suas próprios regras e regulamentos, já que 
administrações diferentes são responsáveis pelas várias 
seções. O projeto global teve de acomodar uma variedade 
considerável de dimensões no que diz respeito à variação 
de altura e largura de corredores, quartos e pavimentos. 
E já que as combinações dessas diversas categorias de 
acomodação deviam ser intercambiáveis ao máximo, para 
que os residentes, cuia condição melhorasse ou piorasse, só 
~@"iihiííi_f"1 
~~~~~~ 
-~ -.."'~ .. ---~ ~ '-" .... 
130 II ÇOES DE ARQU ITETUR A 
fossem removidos de uma seção para outra o mínimo 
possível, era óbvio que o conjunto devia ser concebido não 
como um aglomerado de edifícios separados, mas como 
uma área urbana, uma cidade em miniatura em que todos 
as instalações de lazer e conforto fossem, em princípio, 
acessíveis a todos os moradores. 
Estas considerações conduziram à idéia de se criar uma 
moldura estrutural contínua, baseada no mesma unidode 
modular, capaz de responder às exigências de um 
programa altamente variado e complexo. A menor unidade 
capaz de servir como componente básico para quartos de 
qualquer tamanho foi calculada em 92 centimetros. 
Os programas de exigências das respectivas categorias 
fo ram subseqüentemente adaptados o um ordenamento 
global de construção, consistindo estruturalmente num 
sistema de colunas, vigas e assoalhos, i.e. , uma ordem 
condicionada a priori pela unidade de medida adotada de 
92 centimetros e, por conseguinte, capaz de assimilar uma 
ampla gama de exigências específicas. 
A sincronização e padronização das dimensões por todo o 
complexo não era importante apenas para o uso 
intercambiável, mas também para a obtenção do método de 
construção mais racional e rápido, reduzindo assim os 
cuslos ao mínimo e manlendo os limiles do orçomento. 
Para reduzir ao minimo o número de elemenlos de 
construção, forom escolhidos dinléis de três tamanhos para 
três tipos de vãos: 2 x 92 = 184 cm; 3 x 92 = 276 cm; 4.x 
92 = 368 cm. A soma desses vãos produz medidas padrão 
de 5 x 92, 6 x 92, ele., como um sislema de moedas 
(5 cenlavos, 10 centavos e 25 centavos). 
Com o "kit de construção" resultante, composto por vári os 
elementos, os espaços e massas de construção podem ser 
combinados à vontade. O layoul inicial desse complexo 
consistia em unidades agrupadas em torno de três pálios de 
tamanhos sucessivamente maiores. O contraste do efeito 
espacial era ainda mais forta lecido com eslruturos de dois e 
três andares cercando o maior dos Irês pátios, estruturas 
de três e quatro andares cercando o pátio médio, e de 
cinco e seis andares cercando o pátio menor. A progressão 
de dais a seis andares alcança seu ponto arquitetônico 
culminante no cenlro do conjunto, expressado por uma 
janela espacialmente extrovertida acima do ouditário (à 
qual eu atribuí grande importância, assim como também ao 
fa to de que os diagonais dos três pátios fo rmam ângulos 
retos). Uma boa dose de energia foi gosto com esses 
procedimentos, já que estávamos confiantes no programa 
de requisitos. No entanto, logo ocorreram mudanças sob a 
influência de um súbito desenvolvimento nas idéias e nas 
abordagens quanto à assistência aos mais velhos. 
Embora muitas das novas propostas pudessem ser 
adaptadas por meio de uma série de modificações que não 
implicavam alterações fundamenlais no plano original, 
tornou-se evidente, após certo tempo, que o circuito 
fechado de acordo com o qual o plano fora organizado era 
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~1R!ç E 
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~-1Tíf'i'f'i1E: .: : :: :~ ~ ~ ~+-
~~~~k~+~~~cf 
rígido e hermético demais para adaptar'se a todas as 
cnudanças que haviam se tornado necessárias nesse 
~eríodo. Por fim, O plano teve de ser abandonado. A lição 
1ue aprendemos com essa experiência foi a de que, 
~uando aderimos rigidamente a uma organização tão 
'''pecífica e explíc ita da forma principal, nosso plano está 
destinado ao fracasso. De fato, o melhor é começar sempre 
de uma estrutura básica mais aberta e flexível , capaz de 
bcorporar os ajustamentos que se fizerem necessários. 
epois desse fracasso, foi desenvolvido um novo conceito, 
de acordo com o qual finalmente o projeto pôde ser 
realizado. O primeiro posso, desta vez, foi estabelecer 
quais serviços eram relevantes poro todos os prédios - tais 
como escadarias, elevadores, quadro de luz, rede elétrica, 
sistema de ventilação e sistema de esgoto. Todos eles foram 
{Cncentrados em tubulações verticais, loca lizados a 
1 ~ 
I 
: : . : 
distôncias racionais e regulares por todo o complexo. 
O resultado foi uma constelação de torres que, no ômbito 
do construção, adqui ri0 uma espécie de função 
estabilizadora dentro do complexo como um todo. 
O programa de requisitos, traduzido num esquema 
espacial, foi superposto a essa grade "objetiva", assinalada 
pelos torres, e ajustado às dimensões da área de 
construção. Os pontos fixos de sustentação, as torres, 
serviram conseqüentemente para dar certo ordenamento ao 
espaço como um todo, enquanto o "kit de construção" de 
elementos de concreto (pré·fabricadoslgarantiu a coerência 
fina l e a un idade dos vários componentes que se formaram 
"a partir de dentro". 
A estrutura de construção do De Drie Hoven, composta por 
vigas e colunas idênticos, está abertamente presente em 
todo o edifício, embora a maneira como foi preenchida 
varie de um lugar para o outro. O conceito do projeto de 
uma estrutura desse tipo afirma que é possível uma grande 
díversidade de preenchimentos, como reflexo de usos 
diferenciados , sem pre juízo para a coerência visual e 
organizacional do todo. Além disso, as conversões que se 
tornaram necessárias como resultado de novos insights 
podem ser faci lmente realizados no contexto da estrutura, 
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CRIANDO ESPAÇO , DE IXANDO ESPAÇO 131 
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/ 
132 LI ÇÕES DE AiQUII ETUIA 
que continua a desempenhar sua função de sustentação e 
que, em si mesma, não é ou quase não é afetada pela 
alteração de paredes, portas, tetos, ele. 
Se, por um lado, não deixa de ser doloroso para o 
arquitelo verificar que os componentes que ele projetou com 
tanta dedicação acabaram por desaparecer ou enlão foram 
alterados até a desfiguração por outras pessoas, sem 
consulta prévia, por outro lado também é uma espécie de 
triunfo verificar que sua idéia, como conceito global, 
permanece de pé. A estrutura pode ser comparada a uma 
árvore que todo ano perde suas folhas. A árvore 
permanece o mesmo, mas as folhas se renovam a cada 
primavera. O uso vario de acordo com a época, e os 
usuários exigem que o edifício se adapte à evolução de 
seus insights. Às vezes isto implica um passo atrás na 
qualidade espacial, mas às vezes, também, significa um 
passo à frente, um aprimoramento da situação original. 
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EDIFíCIO DE ESCRITÓRIOS CENTRAAl BEHEER 1342·353) 
A idéia proposta anteriormente em dois concursos de 
projetos para prefeituras em Valkenswaard 1343·344) e 
Amsterdam 1345·346), respec!ivamente, e que, finalmente, 
veio a se materializar no edifício de escritórios Centra0 I 
aeheer, é a de um edifício concebido como uma espécie de 
povoado, composto por um grande número de unidades 
espaciais iguais, como um grupo de ilhas. Essas 
unidades espaciais constituem o bloco básico do edifício; 
são re lativamente pequenas e podem acomodar os diversos 
componentes do programa (ou "funções", se preferirem!, 
porque suas dimensões, assim como sua forma e 
organização espacial, se ajustam a essa proposta. Elas são, 
portanto, polivalentes. 
Enquanto o De Drie Hoven envolvia um programa com uma 
grande diversidade de dimensões e de requisitos espaciais 
. o que necessariamente resultou num ordenamento de 
construçãoúnico, capaz de gerar uma grande variedade . , 
no caso deste edifício de escritórios, o programa, análogo 
00 princípio básico escolhido do quadrado como unidade 
espacial, ainda que simples no sentido elementar, 
mostrava 'se capaz de responder virtualmente a todos os 
requisitos espaciais. Graças à sua polivalência, as 
., . --
~-- .' ..... .. :_ -.. _-- -
diferentes unidades espaciais podem, se necessário, assumir 
outros papéis· e esta é a chave para a capacidade de 
absorver mudança. 
Projetar um edifício de escritórios pode ser bastante simples 
em princípio, mas foi esta mesma necessidade de 
adaptabilidade que conduziu ao resultado. Constantemente 
surgem mudanças dentro da organização, requerendo por 
conseguinte ajustamentos freqüentes no tamanho dos diversos 
departamentos. A construção deve ser capaz de acomodar 
essas forças internas, enquanto o edifício como um todo deve 
continuar a funcionar em todos os aspectos du rante o tempo 
todo. Isto significa que a adaptabilidade permanente é uma 
pré'condição do projeto. Em cada situação nova, para 
assegurar o equilíbrio do sistema como um todo, i.e., para 
que ele continue a funcionar, os componentes devem ser 
capazes de servir a objetivos diferentes. 
A construção foi projetada como uma extensão ordenada, 
composta por uma estrutura básíca, que se manifesta como 
uma zona essencialmente fixa e permanente por todo o 
edjfício, e por uma zona complementar variável e 
interpretável. 
A estrutura básica é o sustentáculo, por assim dizer, de 
todo o conjunto. É a construção principal, abrangendo o 
CR IANDO ESPAÇO. DEIXANDO ESPAÇO 133 
• 
3.2 
134 liÇÕES DE ARQUITETURA 
sistema de dutos e coincidindo com as principais "vias de 
trânsito" dentro do complexo. A estrutura básica se 
manifesta de duas maneiras: uma estrutura contínua 
lespinha dorsal) e interrupções regulares ao longo da 
periferia do complexo sob a forma de pequenas torres las 
vértebras). As zonas interpretáveis estão ajustadas ao 
desempenho de todas as funções previstas, o que gera 
exigências específicas sobre o espaço, dando margem, por 
conseguinte, a soluções "complementares" divergentes. 
É essa zona interpretável que pode ser preenchida com os 
ingredientes primários das diversas partes componentes. 
A estrutura básica e a zona interpretável como um todo 
esperam, portanto, um preenchimento complementar, ao 
mesmo tempo em que permanecem essencialmente as 
mesmas: o edifício como um todo deriva sua identidade do 
conjunto das diversas interpretações. 
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352 353 
CR IANDO mAçO, DEIXANDO mAço 135 
J55 
354 
JJó 357 358 
CENTRO MUSICAL VREDENBURG [355·36D) 
Visto de fore, o conjunto como um todo parece ter uma 
forma aleatória, e não corresponde às nossas expectativas 
quanto a um edifício autônomo. O ponto de partida no 
projeto - Le. , evitar o efeito de um "templo" da música ao 
integrer a estrutura aos arredores tanto quanto possível - e 
o principio de acesso subseqüente resultaram em um 
arrenjo periférico composto de múltiplos facetas. E, como 
todos essas facetas forem compostos pelos mesmos 
materiais, elas representam, na verdade, apenas diferentes 
facetas da mesmo todo. Em outras palavras, deu·se mais 
atenção à legibilidade das partes da que à coerência do 
todo, já que o todo está representado nessas partes. Isto 
significa que a todo pode ser visto de muitos lodos 
diferentes. Os elementos constitutivos tornam-se mais 
independentes, são emancipados, por assim dizer, 8 1 em 
136 LIÇÕ ES DE AiQUITETUi A 
virtude das diversas maneiras como são Mmontadosll nos 
contos, as relaçães que estabelecem entre si também 
diferem constantemente. Deste modo, apesar de suas 
periferias distintos, o uniformidade dos materiais e de 
elementos constitutivos, assim como o maneira como 
esses elementos se integram, fazem com que o conjunto 
como um todo fole a mesma linguagem arquitetônica 
(embora os revestimentos de madeiro no interior constituam 
uma carecleristica adicional). Mediante o aplicação dos 
mesmos materiais básicos dentro e fora , o interior e o 
exterior são colocados em perspectiva, reforçando assim o 
expressão global de acesso. 
Um papel importante no ordenamento do construção é 
desempenhado pelo uso repetido de colunas, com suo 
linguagem formal enfático e facilmente reconhecível. Elos 
estão dispostos segundo um esquema de grede, em 
distâncias iguais, demarcando desse modo áreas iguais por 
todo o edifício. Representam o cadência do edifício e dão 
ritmo ao espaço, como os notações que indicam o tipo de 
intervalo e de compasso numa peço musical. 
O arranjo dos colunas constitui um sistema de ordenamento 
mínimo que permite um preenchimento bastante flexível de 
suas diversos partes, e que tem o efeito de regular a 
grande diversidade de elementos constitutivos que emergem 
da complexidade do programa. 
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Ao mesmo tempo em que serve para unificar o todo, este 
sistema de colunas contribui para que cada espaço seio 
proietado de acordo com suas exigências específicas e com 
sua localização. Este princípio não diverge essencialmente 
do plan libre, desenvolvido nos primeiros anos desse século 
como uma nova maneira de explorar todas as 
possibilidades oferecidas pela aplicação de um esqueleto 
de concreto composto de colunas e plataformas (354). Entre 
as características típicas dos primeiros exemplos do plano 
livre, estão em geral as paredes curvadas assim como as 
colunas livres com seus próprios espaços; essas 
características contrastam com a maneira segundo a qual o 
plano livre é geralmente aplicado hoie em dia, com as 
colunas servindo como um ponto de partida para as 
paredes. Numa estrutura que abrange um número 
proporcionalmente maior de quartos ou de espaços 
fechados , o último "método" é obviamente mais adequado. 
Quando as colunas são livres, é preferível que seiam 
cilí ndricas porque pelo menos se adaptam de modo muito 
mais amistoso e suave à presença de multidões. 
Ao permanecerem no "caminho'" sem, porém, constituírem 
obstóculo, as colunas man ifestam toda sua força, e sua 
personalidade é reforçada posteriormente pelos capitéis 
quadrados, uma "ênfase" da forma exigida pelo 
construção. A principal função desses capitéis alinhados é 359 
coordenar as conexões com os tetos que surgem de diversos 
direções e com alturas diferentes. Além disso, sua largura 360 
extra mantém o parede contígua à distância, aiudando 
deste modo a criar certo espaço em torno de cada coluna. 
As colunas no fachada servem paro manter os paredes o 
uma distância maior ou menor, dependendo do quantidade 
de vidro exigido em cada lugar. As aberturos na fachada 
estão em geral localizadas na "zona das colunas", e só às 
vezes aparecem como IIburacosll nas paredes. 
As colunas dispostas livremente nos espaços que as 
envolvem constituem um motivo recorrente com uma série 
de variações por todo o edifício, produzindo uma imagem 
reconhecível e característica. Na verdade, o coluna foi 
proietada para fazer com que cada lugar pudesse 
despertar experiências espociais diferentes, ao mesmo 
tempo em que a coluna nua permanece a mesmo seio qual 
for a sua localização específica. Dependendo da abertu ra 
ou do fechamento criado, ela aparece com uma roupa 
diferente: vestida por uma parte diferente. Deste modo a 
coluna determina o aspecto de um lugar, e também sua 
própria imagem é determinada, por sua vez, por este lugar. 
A estrutura da coluna pode ser vista como um sistema que 
gera liberdade: uma "competência" que fornece um 
incentivo para o "desempenho" próprio de uma situação 
específico j e, portanto, como um instrumento capaz de 
produzir um ordenamento de construção coerente, apesar 
da ausência de espaços repetitivos. 
CRI ANDO ESPAÇO , DélX ANDO ESPAÇO 137 
31i 
312 
313 
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138 lIÇOES DE ARQU ITET URA 
MiNiSTÉRiO DE ASSUNTOS SOCIAiS (361-379) 
Em vez de um volume com uma sucessão sem fim de 
andores de escritórios, o edifício foi articulado em 
segmentos; o volume foi dividido em vários edifícios mais 
ou menos ostensivamente separados, agrupados lado o 
lado e diante uns dos outros 00 longo de uma zona central 
alongada: i,e" vários pequenos edifícios de escritórios 
formando um conjunto. Cada um desses ' blocos de 
edifício' mais ou menos separados é formado por uma 
série de octógonos interconectados e pode acomodar um ou 
mais departamentos, cada um deles diretamente acessível a 
partir da zona centra l. 
As unidades de escritório consistem em uma ou mais ilhas 
octogonois sucessivos ou superpostas de + 420 m', nos 
quais os espaços podem ser arranjados de diferentes 
maneiras, Cada unidade espacial abriga uma média de 32 
pessoas em salas com uma, duas ou três áreas de trabalho. 
Embora o edi~cio tenha sido basicamente projetado como 
células de escritório, presta-se, em princípio, também a 
formos organizacionais mais abertas onde e quando houver 
tal necessidade. 
O edifício parece formado por um aglomerado de 
octógonos interligados - esta é, pelo menos, a primeira 
impressão do periferia, quer visto do lodo de fora, quer do 
lodo de dentro. Também o subdivisão em unidades de 
escritório segue o padrão de octógonos, 
De um ponto de vista construtivo, o edifício é um esqueleto 
formado regularmente por grande número de elementos 
idênticos de concreto pré-fabricado, montados no local. 
Estes elementos foram combinados para obter uma 
repetição de unidades espaciais semelhantes, 
As vigas principais, posicionadas diagonalmente, formam 
um zona contínua de condutos através de todos os andores. 
O padrão foi escolhido com o fim de criar regularmente 
espaços quadrados que fossem zonas secundárias foro da 
zona básica da estruturo principal; essas zonas secundárias 
podiam ser deixadas abertos entre os pisos dos andares 
arrematados por vigas secundárias. 
É a forma diagonal selecionada para arrematar essas 
zonas secundárias que atravessa as formas octogonais do 
andar como um todo, por assim dizer, e é também aqui que 
se obtém o desejada articulação rítmica, 
Desse modo, a estrutura escolhida poro o ed ifíc io torna 
possível ' preencher" as diferentes partes do programa de 
acordo com a organização desejada_ A'disposição regular 
"objetiva" dos colunas oferece mais campo para que ha ja 
variação nos preenchimentos e reaiusfes, de modo que o 
edifício mostrar-se-á relativamente adaptável às 
necessidades futuras. 
A estrutura serve para íntroduzir ordem e não irá restringir 
efetivamente a liberdade de preenchimento mas, ao 
contrário, irá ampliá-Ia. A estrutura é o fio comum 
arquitetônico que perpassa o con junto inteiro, tornando 
legíveis seus diversos componentes e desse modo 
I 
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I 
j 
I 
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ordenando-os. Além da divisão e da organização espocial, 
a estrutura também gera o ponto de partida para as 
insta laçõe~ técnicas, num padrão semelhante de tubos de 
condutos por todo o edifício, plenamente integrado à 
construção. 
A principal direção das unidades de escritórios - e esta é a 
direção das vigas principais que constituem a estrutura 
básica - é consistentemente diagonal com relação à direção 
do edifício como um todo. 
A maneira como o salão centrol, no condição de principal 
artéria espacial, atravessa toda a extensão do edifício é 
acompanhada, portanto, pela direção das vigas 
secundárias que, embora de um calibre mais leve do que as 
vigas principais, exercem uma função de, pelo menos, igual 
importância do ponto de vista espacial. 
Um dos temas mais curiosos do projeto desse edifício foi a 
integração destas duas direções básicas deli beradamente 
escolhidas. O problema resumia-se a fazer com que as 
vigas principais e as vigas diagonais secundárias se 
reunissem de tal modo que as últimas pudessem assegurar 
uma definição convincente e contínua do espaço em toda a 
sua extensão. A solução para o suporte das vigas, 
provenientes de oito direções, foi proporcionada pelos 
capitéis quadrados das colunas, os quais, formando 
tabuleiros de um metro quadrado e divididos em oito 
zonas, podiam, em principio, acomodar vigas de todas as 
di reções. Os pontos de intersecção, vinte dos quais eram 
necessários para atender todas as exigências espaciais do 
edifício, foram projetados individual e coletivamente como 
um único motivo plástico. As pesadas vigas principais, 
provenientes de várias direções, e as vigas secundárias 
mais leves foram harmonizadas dotando as vigas mais altas 
de um perfil que unisse as dimensões de ambos os tipos; 
além disso, os capitéis de colunas não foram orientados 
para as vigas principais, mas para as secundárias (que se 
tornaram as vigas de extremidade nos vãos). 
365 
366 367 
• 
.. _~ 
b 
, 
, 
CR IA NDO ESPAÇO , DEIXANDO ESPAÇO 139 
3ó8 
J.l9 
370 
140 liÇÕ ES DE ARQUITETU RA 
A conseqüência desta escolha de direção é que a direção 
do salão central se manifesta tão fortemente quanto a das 
vigas principais do edifício. Desse modo as in tersecções 
criadas resumem todo o princípio estruturat e, assim, como 
um ponto de um metro cúbico onde tudo se encontra, elas 
representam o conceito estrutural e construtivo do edifício 
como um todo e, em virtude da diversidade dentro da 
unidade, sõo os elementos mais importantes do 
ordenamento do edifício. 
Graças à repetição em grande escala dos elementos 
construtivos e à possibilidade de expandir total ou 
parcialmente os pisos, o edifício foi eminentemente 
adequado à execução com elementos de concreto 
pré-fabricados. Uma vantagem era que a qualidade do 
acabamento a ser obtida era suficientemente boa para que 
os elementos pudessem servir como simples concreto. 
A estrutura de suporte é construída essencialmente por 
quatro elementos: colunas, vigas, tubos e pisos. As vigas 
apoiadas nos capitéis de colunas eram guarnecidas de um 
lado por uma saliência projetada que serviu num estágio 
posterior como uma ligação simples para o vão formado 
pelo piso do andar. O grau necessário de precisão foi 
fornecido pela pré-fabricação das vigas. A estrutura 
371 
371 373 
37. 375 376 3TI 
ClIANDO ESPAÇO, DEIXANDO ESPAÇO 141 
378 379 
3BO 381 
recebeu sua estabilidade dos tubos de condutos, moldados 
na local. Para os pisos entre os vigas podia-se usar tanto 
unidades pré-fabricados quanto concreto feito no loca l. 
O espaço de estacionamento, embaixo da fachada do 
edificio, foi executado com colunas distribuídas de maneira 
idêntica à dos andares_ A decisão de adotar um sistema em 
que os componentes pré-fabricados pudessem ser montados 
no local representou uma redução considerável do custo, e 
foi isto que tornou possível erigir uma estrutura tão 
complexa com um orçamento limitado_ 
ESCOlAS ApOllO (380-3BB) 
Estas duas escolas resultaram do mesmo programa espacial 
de requisitos estabelecidas pelo Ministério de Educação e, 
coma se desenvolveram a partir da mesmo ordenamento de 
construção, como um projeto comum, há muitas 
M1 .. 
~ 
142 LIÇÕES DE ARQUllETURA 
semelhanças entre elas_ Mas há também um série de 
diferenças importantes entre os dois edifícios, em razão do 
msentamento diferente e, conseqüentemente, em razõo da 
orientação diferente das janelas das salas de aulas, e 
também como resultada dos diferentes princípios 
lubjacentel àldual comunidadel de escolal. Contudo, OI 
mesmos meios arquitetônicos foram usados para resolver os 
problemal elpecíficol aprelentadol pelol edifíciol, 
resultando daí uma grande coerência entre os elementos 
que compõem as duas unidades. 
Nõo IÓ encontramos aqui um vocabulário arquitetônico 382 383 
comum, mas tombém uma gramática arquitetônica comum ~ 
no lentido de que cada ,olução individual reprelenta uma 38.i 386 
declinação diferente de um mesmo rodical. O princípioestrutural subjacente pode ser reI um ido em 20 pontos que 
CRIANDO ESPAÇO , DE IX ANDO ESPAÇO 143 
387 
lSS 
podem ser classificados de acordo com a maneiro como 
são interpretados, por exemplo, dentro-fora; esqueleto ou 
aplicação consistente de tijolos, peitoris, componentes de 
aço; normal ou muito grande; vigas cruzadas ou conexões 
em T. Todos os elementos são ligados por uma espécie de 
144 UÇÔ fS DE ARQUI1fTUiA 
parentesco, algo que resultou das considerações, ainda na 
fase de projeto, sobre os implicações de cada ponto para 
todos os outros pontos, de maneira que cada passo 
subseqüente remete 00 primeiro. 
A unidade de meios inerente a um ordenamento da 
construção pode nos lembrar a class ificação dos estilos 
arquitetônicos, de acordo com a qual o onipresente 
estilo classicista vai ao encontro, de modo ostensivo, 
dos critérios que estabelecemos para um ordenamento 
da construção. 
Num estilo arquitetônico cada elemento tem sua função 
fixa e se deixa combinar com outros de acordo com 
regras específicas. Neste sentido, um estilo 
arquitetônico representa uma espécie de linguagem 
formal por meio da qual podemos expressar 
determinadas coisas mas não outras, já que cada 
elemento e cada co"mbinação de elementos se referem 
inevi tavelmente a certo significado fixOi deixando 
assim pouca ou nenhuma margem para a 
interpretação. Mas, além disso, as limitações técnicas 
do "kit de construção" determinam seu potencial 
espacial. Por exemplo, não se pode fazer vigas 
canti léver - quando se aplicam princípios classicistas e l 
por conseguinte, nõo pode haver nenhum canto aberto 
sem uma coluna (como nos prédios de Ouiker e de 
RietveldJ -I pois os meios para fazê-los simplesmente 
não são proporcionados pelo kit de construção. 
Na verdade l se a história da arquitetura tem algo a 
ver com estilos arquitetônicos, é especialmente no fato 
de que eles conseguiram libertar-se de seu jugo. 
O arquiteto extrai suo raison d'être dos esforços 
contínuos poro romper com o padrão convencionat 
algo que ele precisa Fazer, pois o que tem a dizer não 
pode ser dito com os meios disponíveis . 
O ordenamento de construção de um projeto é o 
resultado de umo compreensão mais profunda dos 
usos que lhe serão atribuídos, agora e no fu turo. 
O ordenamento de construção antecipa deste modo o 
"desempenho" que se pode esperar dele: E a partir da í 
uma "competência" é Ire}construída por meio de um 
processo indutivo. 
Por tanto, cada desígnio arquitetônico contém um 
incentivo para desenvolver uma nova ordem, Le., uma 
ordem emanando da natureza específico deste. Assim 
como coda ordem representa um mecanismo 
específico, ela também tende a ser exclusiva desse 
mecanismo. Diferentes objetivos são enfatizados em 
diferentes momentos, mas a questão central com a 
estrutura é o paradoxo de um ordenamento que cria 
liberdade - um horizonte presente em todo o plano. 
389 
Homem pondo peixes poro secor, Senegal 
CRIANDO ElPAÇO, DEIXANDO ESPAÇO 145 
6 FUNCIONALIDADE, 
FLEXIBILIDADE E 
POLlVALÊNCIA 
Na arquitetura funcionalista, a forma derivava da 
expressão de eficiência (o que não significava 
automaticamente que toda arquitetura funcional isto 
fosse igualmente eficaz). No "cidade Funcional" e no 
"ediFício funcional", eram as diferenças que se 
manifestavam particularmente. Isto conduziu a uma 
especificação extremada de requisitos e dos tipos de 
utilidade, cujo resultado inevitável acabou sendo mais 
fragmentação que integração, e se houve alguma coisa 
a que esses conceitos não resistiram, foi 00 tempo. 
Na verdade, os bons funcionalistas, preocupados e na 
verdade obcecados como estavam por seu "estilo 
internacional" I conseguiram evitar as armadilhas 
habituais, e a maior parte de seus edifícios cúbicos 
brancos e arejados estão de fato adoptados a 
múltiplos objetivos. Mas o chamado urbanismo 
funcionol, em especial, oferece uma demonstração 
muito claro da extensão em que o pensamento sobre 
soluções poro os problemas arquitetônicos fo i 
prejudicado pela segregação de funções, que acabou 
prevalecendo sobre a integração. A rápida 
obsolescência de soluções demasiadamente específicos 
conduz não só à disfuncionalidade como também a 
uma grave Falta de eficiência. 
Basta pensar nas garagens de pisos inclinados, que 
ainda hoje são construídas em grande escala. Pode 
muito bem ser um sistema barato e. Fácil de construir, 
mas nunca mais o edifício irá servir para qualquer 
outra coisa, se houver necessidade de mudança -
como, por exemplo, numa época em que muito menos 
pessoas tenham carro. 
146 IIÇÓES DE ARQUIHTUR A 
Flexibilidade se tornou a palavra mágica, tinha de ser 
a panacéia para curar todos os males da arquitetura. 
Contanto que o projeto dos edifícios Fosse neutro, 
pensava-se, eles poderiam servir a vários usos e 
poderiam, portanto, pelo menos em teoria, absorver e 
abrigar a influência de épocas e situações de 
mudança. Isto seria pelo menos um posso à Frente, 
mos, na verdade, a neutralidade consiste apenas na 
ausência de identidade, em outras palavras, na Falta 
de traços característicos. O problema da mudança não 
é tanto uma questão de ter de adaptar e mudar traços 
característicosr mas de, antes de tudo, possuir esses 
traços característicos! 
"Flexibilidade significa - já que não há uma solução 
única que seja preFerível a todas os outras - o 
negação absoluto de um ponto de vista Fixo, deFinido. 
O plano Flexível tem seu ponto de partida na certeza 
de que a solução correta não existe, já que o 
problema que requer solução está num estado 
permanente de fluxo, i.e., é sempre temporário. 
A Flexibilidade parece inerente à relatividade, mas, na 
verdade, está ligada apenas à incerteza, à Falta de 
coragem em nos comprometermos e portanto à recusa 
da responsabilidade inevitavelmente ligada a cada 
ação que empreendemos. Embora uma form ulação 
flexível adapte-se a cada mudança que surja, não 
pode ser nunca a melhor e mais adequada solução 
para nenhum problema; pode fornecer qualquer 
solução em qualquer momento, mas nunca a 
melhor solução. A Flexibilidade representa, portanto, 
o conjunto de todas as soluções inadequadas para 
um problema . Dado isto, um sistema que se mantém 
Flexível por cousa da mudança dos objetos que devem 
ser acomodados dentro dele produziria a mais neutra 
das soluções para problemas específicos r mas nunca a 
solução melhorr a mais adequada ... 
r 
f 
I 
A única abordagem construtiva para uma situação que 
está sujeita à mudança é uma formo que parto da 
própria mudança como fator permanente - isto é, 
como um dado essencialmente estático: uma forma que 
seja polivalente. Em outras palavras, uma forma que 
se preste a diversos usos sem que ela própria tenha de 
sofrer mudanças, de maneira que uma flexibilidade 
mínima possa produzir uma solução ótima. Nas 
cidades de hoje, somos confrontados com um grande 
número de moradias, cuja construção requer métodos 
de produção com enormes quantidades de 
componentes - os quais , no entanto, são uniformes. 
Ao equiparar a uniformidade dos unidades de 
moradias - resultado desses métodos de produção -
com a igualdade dos habitantes, chegamos ao ponto 
em que moradias uniformes foram reunidas em blocos 
de edifícios un iformes, mon6tonos. 
O plano urbano uniforme e a planta uniforme dos 
andares estão baseados no segregação de funções , e é 
a obediência cega aos ditames dessas funções que fez 
com que se tomassem as distinções entre morar e 
trabalhar, comer e dormir, etc. como ponto de partida 
para conceber os espaços para objetivos diferentes de 
maneiras diferentes, com base em que atividades 
diferentes fazem exigências específicas diferentes aos 
espaços em que serão instaladas. Foi o que nos 
disseram nos últimos 25 anos, mas, mesmo que morar 
e trabalhar ou comer e dormir possam ser chamados 
apropriadamente de atividades, isto não significa que 
façam exigências específicas sobre os espaços em que 
serõo localizadas - são as pessoasque fazem 
exigências específicas, porque elos querem interpretar 
a mesma e única funçõo à sua próprio maneira, de 
.acordo com seus gostos específicos. 
Se, na cidade funcional e na planta Funcional dos 
onda res, a identidade daqueles que conceberam a 
idéia em primeiro lugar se perde sem deixar rastro, 
nõo se pode responsabilizar a uniformidade das 
unidades habitacionais, mas a maneira como elas são 
uniformes, ou seja, admitindo uma único função, em 
um conceito prescrito e rigorosamente padronizado. 
As casas e as cidades que estõo sendo construídas 
-ctualmente não permitem e nõo permitirão 
absolutamente nenhuma mudança fundamental. 
Ao prescrever coletivamente onde as pessoas terão de 
colocar suas mesas e camas - geração após geração -
nós estamos produzindo essa uniformidade. Esta 
cristalização coletiva da liberdade individual de ação 
atribuiu um objetivo predeterminado a cada lugar da 
casa e da cidade - e o fez de modo tão pouco 
inspi rado que todas as variações que constituem a 
identidade são eliminados na raiz. O que faz com que 
as velhas casas situadas nos canais sejam tão boas 
para morar é que se pode trabalhar, descansar ou 
dormir em qualquer quarto, pois cada quarto excita a 
imaginação do morador para que ele o use da 
maneira que quiser. A grande diversidade no centro 
antigo de Amsterdam, por exemplo, não é causada 
pela existência de princípios subjacentes mais ricos ou 
mais variados (os princípios subjacentes aos edifícios 
do século XX são certamente mais complexos), mas 
sim pelas seqüências de espaços nos quais, ainda que 
não sejam em geral muito diferentes uns dos outros, o 
potencial para a interpretação individual é inerente à 
sua maior polivalência. 
As interpretações coletivas dos padrões de moradia 
individual devem ser abandonadas. Precisamos agora 
de uma diversidade de espaço em que as diversas 
funções possam ser sublimadas poro que se tornem 
formas arquetípicas, que tornem os interpretações 
individuais do padrão de moradia comunitário 
possíveis em virtude de sua capacidade de acomodar, 
absorver e, na verdade, de induzir cada uma das 
funções e das alterações desejadas." [11 
CRIANDO ESPAÇO, DE IX ANDO ESPAÇO 147 
190 191 
o texto acima e todos os exemplos que citamos até 
agora constituem um apelo para que passemos a 
projetar de ta l modo que os edifícios e as cidades 
possam ter a capacidade de se adaptor à diversidade 
e à mudança e também conservar a sua identidade. 
O que estamos procurando é uma maneira de pensar e 
de agir que possa conduzir a um "mecanismo" 
diferente (em termos lingüísticos poderíamos folor de 
um p~radigmal, que seja menos fixo, menos estático, e 
que seja! portanto, mais bem equipado para 
responder ao desafio que a sociedade do século XX, 
com toda a sua complexidade, propõe ao arquiteto. 
O essencial, portanto, é chegar a uma arquitetura que, 
quando os usuários decidirem dar-lhe um uso diferente 
do que foi originalmente concebido pelo arquiteto, não 
seja perturbada a ponto de perder sua identidade. 
Para dizê-lo de modo mais contundente: a arquitetura 
deveria oferecer um incentivo para que os usuários a 
influenciassem sempre que possível, não apenas para 
reforçar sua identidade, mas especialmente para 
rea lçar e afirmar a identidade de seus usuários. 
O estruturalismo mostrou como este processo é efícaz 
na língua, e minha referência insistente a ele é porque 
encontramos a í uma direção para a arquitetura . 
Embora a arquitetura seja concebida freqüentemente 
como um sistema de comunicação, ela não é apenas 
uma língua, apesar de uma série de a nalogias, tais 
como os conceitos de "competência" e "desempenho", 
que não se aplicam exclusivamente à língua, mas são 
igualmente adequados ao uso da forma - e dos quais, 
148 liÇÕ ES DE ARQUITETURA 
em princípio, também devemos ser capazes de extrair 
a forma. Não é preciso dizer que a eficácia deve 
sempre vir em primeiro lugar, já que é o único critério 
além de qualquer controvérsia - embora seja da 
máxima importância estabelecer o que se quer dizer 
exatamente com o termo. Sem dúvida, existem objetos 
e formas que não têm mais de um único objetivo, em 
geral instrumentos técnicos, e que devem simplesme~te 
funcionar! fazer o seu trabalho, nem mais nem menos. 
Mos a maior parte dos objetos e das formas possuem, 
além do objetivo para o qual foram projetados e ao 
. qual geralmente devem seu nome, um valor adicional 
e potencial e, portanto, maior eficácia. Esta maior 
eficácia, que chamamos polivalência e que se 
aproxima da IIcompetência", é a característica que 
desejo enfatizar como um critério do projeto. 
O excerto seguinte, de um texto de 1963, aborda estes 
mesmos princípios básicos. Serve também como uma 
introdução ao próximo capítulo. 
"A reciproddade da forma e do programan 
liA característica mais importante de uma cidade é, 
talvez, a contínuo mudança inerente a um ambiente 
urbano, que experimentamos como uma situação 
normal, cotidiana. A cidade está sujeita a constante 
mudança; a cidade nunca se submeteu e continua a 
não se submeter às regras do cresdmento orgânico e 
da evolução funcional, de acordo com as quais o 
homem tentou dar-lhe forma. Cada dia, cada estação, 
e em longo prazo, surgem mudanças temporárias e 
duradouras, incidentais e regulares: pessoas mudam-se 
de uma casa para outra e edifícios são modificados, e 
o resultado são deslocamentos nos focos da teia de 
relações, que, por sua vez, dão origem a outros 
deslocamentos na intensidade. Assim, cada 
intervenção traz uma mudança no significado das 
outras formas construídas, em maior ou menor 
extensão. 
Para que cada cidadão e cada coisa da cidade 
mantenham sua identidade em todos os momentos, é 
necessário que a situação seio completa em si em 
todos os momentos. 
O processo de mudança deve afigurar-se 
constantemente a nós como uma situação permanente; 
é por isso que a possibilidade de mudança deve se 
tornar, em primeiro lugar e acima de tudo, um fator 
constante, que contribui para o significado de 
cada forma individual. Para fazer frente à mudança, 
os formas construídas devem ser feitas de tal modo 
que permitam múltiplas interpretações, i.e., que 
possam ao mesmo tempo absorver e exsudar múltiplos 
significados, sem, contudo, perder sua identidade 
neste processo. 
Quaisquer moradias uniformes, portanto, devem, no 
mesmo periodo, como qualquer lugar na cidade em 
qualquer momento, ser capazes de acomodar 
significados alternativos. 
A analogia deixa claro que tempo e lugar podem ser 
eliminados e substituídos por um único ponto focal de 
partida, i.e., que significados são capazes de mudar 
seu domicílio. 
Fica igualmente cloro que nem a neutralidade, que é o 
resultado inevitável da flexibilidade (tolerável para 
todos, perfeita para ninguém), nem a especificidade, 
que é a conseqüência de excesso de expressão 
(perfeita - mas para quem?), podem produzir uma 
solução adequada. Não é em algum ponto entre esses 
dois extremos, a falta de comprometimento e o 
exceS50 de autoconfiança, que reside a possibilidade 
de uma 50/uçõo, mas além deles: ou seja, num ponto 
de vista com o qual cada um possa se relacionar à sua 
maneira, um ponto de vi5ta que possa, portanto, 
assumir um significado diferente - e, portanto, 
divergente - para cada indivíduo. 
Para poder ter diferentes significados, cada forma 
deve 5er interpretável no sentido de poder aS5umir 
papéis diferentes. E só pode assumir esses papéis 
diferentes se os diferentes significado5 estiverem 
contidos na essência da forma, de maneira que seiam 
uma provocação implícita mais do que uma sugestão 
explícita. 
Uma forma destituída dos 5ignificados a ela ligados, 
embora possua pluralidade, iá que os 5ignificados 
podem ser extraídos dela, está reduzida a seu objetivo 
mais primário. 
Se queremos responder à multiplicidade na qual a 
sociedade se manifesta, devemos libertar a forma dos 
grilhões dos significados cristalizados. Devemo5 
procurar continuamente as formas arquetípicasque, 
pelo fato de poderem ser associadas a múltiplos 
significados, são capazes nõo só de absorver mas 
também de gerar um programa. 
Forma e programa produzem-se mutuamente." [3] 
CRIANDO ESPAÇO, DEIXANDO ESPAÇO 149 
7 FORMA E USUÁRIOS: 
O ESPACO DA FORMA , 
Até aqui l a noção de estrutura foi usada como uma 
rlmolduTa" (de relações constantes) com a copacidade 
potendol de produzir liberdade de interpretação - 8, 
portanto, de alcance - em cada situação individual. 
lidamos até agora sobretudo com formas urbanas que 
foram interpretadas por várias pessoas 
simultaneamente, 8, conseqüentemente, em situações 
coletivas, associações coletivas aparentem!,nte estavam 
envolvidos. 
Em termos da estruturo e de seus projetistas, nossa 
principal preocupação foi com a relação entre 
projetista e estrutura, com os usuários desempenhando 
um papel subserviente, mais como objeto do que como 
sujeito - pois, embora possamos estabelecer que uma 
forma foi interpretada como estrutura, isso não explica 
o que induziu as pessoas a fazê-lo. 
Ora, ao considerarmos a forma num sentido geral 
como uma espécie de estrutura, a relação entre forma 
e usuários torna-se mais uma vez possível quando os 
usuários são indivíduos, e desse modo o noção de 
forma pode se desprender do jugo da abstração. Este 
deslocamento do foco de atenção para o que uma 
forma pode significar para aqueles a quem diz 
respeito le que entram em relação com elo) levanta 
indiretamente a questão da relação entre o criador da 
forma, o projetista e os usuários. 
Partindo da interpretabilidade como uma característica 
inerente à forma, chegamos à questão de saber o que 
torna uma forma - na condição de estrutura -
interpretável. 
A resposta deve ser: a capacidade de acomodação da 
forma, poderíamos dizer sua "competência", que 
permite seja preenchida por associações e conduza o 
uma dependência mútua com os usuários. 
Assim, o que nos preocupa aqui é o espaço da forma, 
do mesmo modo como um instrumento musical oferece 
liberdade de ação ao executante. 
150 IIÇÕfS Df A!QUlmURA 
Nos exemplos anteriores , por exemplo, as arenas, 
lidamos também com a capacidade de acomodação em 
sentido literal, mas o que chamamos agora 
"competência" - ou seja, a implicação da capacidade 
de obrigar significados - lança uma luz diferente sobre 
todas os formas com as quais a arquitetura está 
envolvido . 
"". não estamos nos referindo aqui a uma noção 
de forma que pressuponha e mantenha uma relação 
formal e inalterável entre objeto e observador. Não 
estamos preocupados com o aparência visual como 
uma concha em torno de um objeto, mas com a forma 
no sentido de capacidade de acomodar e de suporte 
potencial de significado. A forma pode ser investida de 
significado, mas também pode ser privada dele em 
virtude do uso que a forma recebe e pelos valores que 
lhe são atribuídos e acrescentados, ou até removidos -
tudo depende da maneira como os usuários e as 
formas interogirem. 
O que queremos afirmar é que sua capacidade de 
absorver e comunicar significado determina o efeito 
que a forma pode ter sobre os usuários, e, 
inversamente, o efeito dos usuórios sobre a forma . 
Pois a questão central aqui é a interação entre forma e 
usuários, o que um faz ao outro, e como um se 
apropria do outro. 
,. 
l 
I 
I. 
Projetar devia ser uma questõo de organizar o 
material de tal modo que seu potencial fosse 
inteiramente explorado. Tudo o que fosse moldado 
deliberadamente deveria funcionar melhor, i.e., 
deveria ser ajustado para fazer o que é esperado dele 
por pessoas diferentes em situações diferentes e em 
épocas diferentes. Em tudo que formos construir, 
devemos tentar não só ir ao encontro das exigências 
da função no sentido estrito, mas também fazer com 
que o objeto construído possa cumprir mais de um 
propósito, qU,e possa representar tontos papéis quanto 
possível em benefício dos diversos usuários 
individuais. Cada usuário será capaz então de reagir a 
ele c sua própria maneira, interpretando-o de modo 
pessoal para integrá·lo a seu ambiente familiar. 
Como as palavras e as frases, as formas dependem do 
modo como são /llidas" e dos imagens que são 
capazes de suscitar para o "leitor". Uma forma pode 
evocar imagens diferentes em pessoas diferentes e em 
situações diferentes, e, deste modo, assumir um 
significado diferente, e esta experiência é a chave 
paro uma consciência modificada do formo . Uma 
consciência que nos tornará capazes de fazer coisas 
que possam se adaptar melhor a mais situações. 
A capacidade de absorver significados, e também de 
abandoná-los sem mudar essencialmente, faz da forma 
um portador potencial de significado - em suma, 
significével. .. " [4] 
CRIA NDO ESPAÇO, DEIXANDO ESPA ÇO 151 
8 CRIANDO ESPAÇO, 
DEIXANDO ESPACO 
I 
Deveríamos fazer projetos de tal modo que o resultado 
não se referisse abertamente a uma meta inequívoca, 
mas que ainda admitisse o interpretação, para assumir 
sua identidade pelo uso. O que fazemos deve constituir 
uma oferta , deve ter a capacidade de provocar, 
sempre, reações específicas adequadas a situações 
específicas; assim, não deve ser apenas neutro e 
flexível - e, portanto, não-específico - , mas deve 
possuir aquela eficácia mais ampla que chamamos 
polivalência. 
152 LIÇÕ ES DE ARQUIIETURA 
A LOJAMENTO PARA ESTUDANTES WEESPERSTRAAT (392·394) 
A rua de convivência no quarto andar é iluminada por 
meio de grandes blocos de concreto com luz. Estes blocos 
ficam rente ao chão, para que a luz não incomode os 
moradores, e, ao mesmo tempo, sua visão das janelas do 
alto também não sofre obstrução. A função primordial 
desses blocos é a iluminação, mas em virtude de sua forma 
e colocação oferecem a oportunidade para uma variedade 
de outros usos. 
"No que se refere à forma e à posição, esses blocos foram 
condicionados, por assim dizer, a exercer uma variedade 
de papéis, e, de fato, são interpretados como bancos, 
superfícies de trabalho, e - em tempo de calor - como 
mesas de piquenique. Estes blocos de luz foram colocados 
num ponto tão central que agem como pontos focais em 
qualquer circunstância. São como magnetos aos quais se 
prendem todos as coisas que acontecem na área 
comunitária de passeio, e podem se tornar um incentivo à 
vida na rua, essa mistu ra multicolorida de manifestações de 
interesses individuais e coletivos. 
Não estipular nenhuma medida significa, pelo menos em 
teoria, que existe uma porção de oportunidades para 
improvisações espontâneas com o espaço e - certamente 
para o arquiteto - bastante espaço para sonhar. Mas então 
- é o que tememos - na medida em que o ambiente é 
organizado de acordo com significados fixos e sim bolos· 
formas concomitantes, no sentido de o que está certo e o 
que não está certo, os próprios moradores não serão 
capazes de fazer muita coisa por iniciativa própria." 141 
I 
f , , 
:SCOLA MONTESSORI, DE1FT 1395-417) 
~s vidraças com saliências largas sobre as portas, entre as 
,alas de aula e o saguão na Escola Montessori, em Del ~, 
codem ser usadas para abrigar vasos de plantas, livros, 
'1lodelos, figuras de barro e todo o tipo de bugigangas. 
estes "armários" abertos formam uma moldura que pode 
,er preenchida de acordo com as necessidades específicas 
, os desejos de cada grupo. 
O ponto central do saguão da escola é o pádio de tijolos, 
1ue é usado tanto para assembléias formais quanto para 
·euniões espontâneas. À primeira vista, poderio parecer 
'Iue o potencial do espaço seria maior se o bloco pudesse 
,er removido de vez em quando e, como era de esperar, 
me foi , de fato, um tema para longas discussões. É a 
permanência, a imobilidade e o "estar no meio do 
caminho", que constituem a questão central, pois, na 
verdade, é essa presença inescapável como ponto focal que 
". 
contém as sugestões e os incentivos para a resposta a cada 
situação que surge. O bloco se torna uma "pedra de 
toque", e contribui para o articulação do espaço de tal 
modoque aumenta a gama de suas possibilidades de uso. 
Em cada situação a plataforma levantada suscita uma 
imagem particular, e, já que permite diversas 
interpretações, pode exercer uma variedade de papéis, 
mas, inversamente, as próprias crianças são estimuladas a 
assumir maior variedade de papéis no espaço. As crianças 
costumam usá-Ia para sentar-se ou paro colocar os 
materiais durante as aulas de trabalhos manuais, lições de 
música e todas as outras atividades que ocorrem no saguão 
da escola. Incidentalmente, a plataforma pode ser ampliada 
em todas os direções com um conjunto de seções de 
madeira, que podem ser retirados do interior do bloco para 
se transformarem num palco de verdade para espetáculos 
de dança e apresentações musicais. As próprias crianças 
ClIANDO mAço, DE IXANDO ESPA ÇO 153 
395 396 397 
399 
398 400 
'01 '02 
'03 
.0; .05 
.06 .07 . 00 
154 II(OES OE ARQUITETUR A 
podem montar as várias partes e depois separá-Ias de 
novo, sem ajuda do professor. Durante o interva lo para o 
lanche, as crianças podem brincar nele e em volta dele ou 
se reunir para olhar juntas as ilustrações de seus livros, 
enquanto sobra bastante espaço a seu redor. Para elas, é 
uma ilha em meio a um mar de assoalho brilhante. 
O piso no saguão do jardim-de-infância tem uma cavidade 
quadrada no meio, que é preenchida por blocos de 
madeira soltos. Eles podem ser tirados e colocados em 
torno do quadrado para formar um arran jo de assentos. 
Os blocos são construídos como bancos baixos, que podem 
ser facilmente movidos pelas crianças por todo o saguão ou 
podem ser empílhados para formar uma torre. As crianças 
também as usam para fazer trens. Sob vários aspectos, a 
quadrada é o aposto da plataforma de tijolos no outro 
saguão. Assim como o bloco desperta imagens e 
associações ligadas ao ato de escalar uma colina para se 
ter um panorama melhor, o buraco quadrado provoca uma 
sensação de reclusão, de refúgio{ e desperta associações 
com o ato de descer um vale. Se o bloco-plataforma é uma 
ilha no mar, o buraco quadrado é um lago, que as 
crianças, ao lhe acrescentarem um trampolim, 
transformaram em piscina. 
O espaço que fica atrás do edifício da escola é articulado E 
dividido numa série de espaços oblongos separados por 
muros baixos. As faixas entre os muros paralelos têm como 
principal objetivo servir para jardins e tanques de areia, 
mas também podem ser usados para outros objetivos. Como 
cada compartimento separado, essa área murada como um 
I 
I i 
'I . ,I 
todo pode ser vista como uma moldura, suscetível de ser 
preenchida em situações diferentes. Este ordenamento 
constitui um quadro fixo de referência, para iniciativas 
individuais e coletivas. 
o material usada nos muros baixos que marcam a 
separação de compartimentos consiste em blocos 
perfurados de construção, que, por sua vez, fornecem 
aberturas ou compartimentos menores que podem ser 
usados de várias maneiras. Alguns, por exemplo, se 
transformam em vasos de plantas cercando um pequeno 
jardim, enquanto outros se convertem em recipientes num 
balcão para a venda de "sorvetes". Ou então podem se 
colocar bastões nos buracos - e aí temos o começo de uma 
tenda ... Em suma, o formato das perfurações oferece 
oportunidades infinitas de uso informal. 
OJ AN DO ESPAÇO, DEIXANDO ESPAÇO 155 
409 410 m 
412 m 
113 
IIS Iló 117 
'18 
' 19 '11 
'20 422 
PRAÇA VREDENBURG 1418-422) 
Quando se decidiu reorganizar o espaço da praça 
Vredenburg, em Utrecht, para alojar o feira 
tradicionalmente realizada ali, foi proposto o plantio de 
árvores. 
156 lI ÇÓES DE ARQUITET UR A 
Árvores vão bem com fei ras e tornam a área menos nua e 1 
desolada nos dias em que não há feira. Já que existia um I 
estacionamento sob a praça, construíram-se caixas de 1 
tijolos que contivessem a quantidade mínima de solo ! 
necessário para que as árvores crescessem, O tamanho j 
dessas caixas e as distâncias entre elas foram determinados 
com base nos barracas do feiro, de modo que as árvores 
pudessem servir como pontos fixos para posicionar as 
fi leiras de barracas com espaço suficiente na frente e atrás 
de cada fileira. 
Os feirantes que foram alocados ou que escolheram ficar 
nos espaços perto dessas caixas para as árvores costumam 
usá-Ias como um mostruário extrai informal. Como 
resultado, as caixas adquirem com freqüênc ia uma 
aparência exótica, que, de certo modo, lembra os templos 
de Bali. 
A construção das caixas para as árvores foi uma boa 
oportunidade para instalor na mesma operação os serviços 
elétricos necessários à feira e à iluminação das ruas. 
As caixas foram projetadas para prover assentos à sombra 
nos dias em que não há feira - o princípio de objetivos 
múltiplos, que, do nosso ponto de vista, deveria estar 
presente em tudo que se faz no ambiente urbono. 
~ 
} 
, 
Os exemplos citados anteriormente centraram-se na 
aplicação de componentes que funcionam 
temporariamente em certas "situações de USOH, após 
os quais revertem a seu estado original, para voltar a 
sofrer uma nova metamorfose, quando surgir a 
necessidade. Poderíamos dizer que a relação entre 
suas características e os usuários é temporária, já que 
a apropriação pelos usuários é também temporária e 
ocasional. Num contexto de áreas que exigem 
cuidados, poderíamos dar um passo à frente e deixar 
uma série de componentes inacabados, para oferecer 
aos usuário's a oportunidade de completá-los da 
maneira mais adequada às suas necessidades e 
preferências particulares. 
MORADIAS OIAGOON (423-445) 
"A idéia subjacente aos esqueletos de cosas, das quais oito 
protótipos foram construídos em Oeln, é que, em príncípio, 
elas são inacabadas. O plano é, em certa medida, 
não-definitivo, poro que os próprios moradores possam 
decidir como dividir seu espaço - onde querem dormir, 
onde querem comer, etc. Quando as circunstôncias 
familiares mudam, a habitação pode ser adaptada para 
responder às novas necessidades, e até mesmo ser 
ampliada. O projeto real deve ser visto como uma moldura 
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provisória que deve ser preenchida. O esqueleto é um 
meio-produto, que todos podem completar de acordo com 
suas necessidades e desejos. 
A casa consiste basicamente em dois núcleos ~xos , com 
vórios níveis separados que constituem as unidades da 
moradia e podem abrigar vórias funções: morar, dormir, 
estudar, brincar, relaxar, iantar, etc. Em cada unidade, i.e. , 
em cada nível, uma seção pode ser separado para 
constituir um quartol a área restante formando uma galeria 
interna que atravessa toda a sala de estar (vazio). Estas 
'galerias', que podem ser mobi liadas de acordo com os 
gostos dos membros da família , constituem a órea de 
convivência do família como comunidade de pessoas. Não 
há nenhuma divisão estrita entre as áreas de estar e de 
dormir (como, por exemplo, a imposição de 'subir a 
escada'). Cada membro da família tem sua próprio parte 
do coso - a ampla sala de estar comunitária" 14J 
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(.IANDO ESPAÇO, DEIXANDO ESPAÇO 157 
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"Os arquitetos não deviam apenas demonstrar o que é 
possível, deveriam também, e especialmente, indicar 
as possibilidades que são inerentes ao proieto e estão 
00 alcance de todos. É da máxima importância 
compreender que há muito o aprender com as reações 
individuais dos moradores às sugestões contidas no 
proieto. As moradias ainda são projetados segundo o 
que as administrações, investidores, sociólogos e 
arquitetos pensam que as pessoas querem. E o que 
eles pensam não pode ser outra coisa além do 
estereóti po: tais soluções podem ser mais ou menos 
adequados, mas nunca inteiramente satisfatórias . São 
interpretações coletivas dos desejos individuais de uma 
multidão elaboradas por um pequeno grupo. O que 
sabemos de fato dos desejos individuais dos pessoas, 
e como podemos descobrir quais são essesdesejos? 
O estudo do comportamento humano, por mais árduo 
e completo que seja, não consegue penetrar a pele 
grossa do condicionamento que deu origem a este 
158 liÇÕES DE ARQU ITETURA 
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comportamento e que suprime o verdadeiro exercício 
pessoal da vontade. Uma vez que jamais 
conseguiremos saber o que cada pessoa realmente 
desejo paro si, ninguém jornais será capaz de inventar 
para outros a moradia perfeita. Na época em que as 
pessoas construíam suas próprias casas, elas também 
não eram livres, porque toda sociedade consiste, por 
definição, num padrão básico ao qual seus membros 
são subservientes. Cada um é condenado o ser como 
ele quer que os outros o vejam - este é o preço que o 
indivíduo tem de pagar à sociedade poro pertencer a 
ela, e desse modo ele é ao mesmo tempo possuidor e 
possuído por padrões coletivos de comportamento." 
t 
I 
I 
Mesmo que as pessoas construíssem suas próprias 
casas não conseguiriam escapar disso. Mas, pelo 
menos, todo mundo deveria ter a liberdade de dar sua 
interpretação pessoal ao padrão coleti,!o." [4] 
liA intensidade com que uma pessoa irá se relacionar com 
o vizinho depende em grande parte do tipo de fronteira 
que existe entre os jardins. Uma cerca é essencialmente um 
meio de obter o máximo de isolamento. A ausência de 
qualquer fronteira implica, por outro lado, ser visto 
constantemente pelo vizinho, sem que um possa evitar o 
outro. Ao fornecer simplesmente os rudimentos de uma 
divisão entre os propriedades adjacentes, como um convite 
para que cada um reaja como desejar, cria-se um incentivo 
e legitimam-se os medidos que cada um gostaria de tomar, 
mas que, de outra maneira} hesitaria em tomar por conta 
própria . 
Uma pequena base de blocos perfurados fornece o 
fundação para um muro de tijolos, mas pode servir também 
como suporte para uma cerca de madeira." [4] 
o terraço levantado nos fundos cria possibi lidades para 
uma interpretação pessoal. Em primeiro lugar, a escada, 
que estava restrita ao min imo absoluto durante a 
construção, pode ser substituído por arranjos alternativos 
para o acesso ao jardim. 
Em segundo lugar, há o espaço aberto sob o pequeno 
'erraço, deixado aberto deliberadamente, apesar da 
decisão costumeira de fechar essas áreas - uma decisão 
que os arquitetos tendem o aceitar para evitar confusão e 
desordem, sem perceber as vantagens potencia is de um 
pequeno espaço abrigado adicional. Por fim, esse pequeno 
'erraço, limitado por muros dos três lados, é altamente 
adequado para uma extensão lateral do sala de estar. 
'Os te rraços adjacentes nos telhados um em frente ao outro 
astão separados, nesse caso, por uma barra de metal, na 
condição de uma demarcação sumária entre as duas áreas. 
Grades e barras são um convite poro que se pendurem e 
amarrem coisas leves, materiais temporários como lonas ou 
esteiras. Mais uma vez, encontramos aqui a base de blocos 
perfurados, que podem ser usados como vasos de plantas." 141 
CRIANDO ES PAÇ O, DEIXANDO ES PAÇO 159 
160 liÇÕES DE ARQUITEfUIA 
o desafio oferecido por esses terraços inacabadas no 
telhado produziu uma grande diversidade de soluções. U,.-
morador usou-o para construir uma estufa lo que resu ltou. 
afina l, num telhado armado convencional ). Esta idéia não 
ocorrera ao arquiteto. A estrutura foi desmontada após 
alguns anos para dar espaço a um quarto de meia-água -
mos o importante aqui não é a engenhosidade da 
construção, mas o fato de alterações desse tipo e nessa 
escala serem realmente factíveis. 
Na frente, perto da entrada, um pequeno "pátio" foi 
sugerido arqu itetonicamente pela presença de uma viga 
" 
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vertical de concreto, Como a viga serve para sustentar a 
terraço em cima e como o espaço que fica atrás da viga é 
aberto, não há de fato um pórtico coberto, embora fosse 
muito fácil construí-lo, instalando, por exemplo, um telhado 
de vidro, E, dependendo das necessidades e gostos 
individuais do morador ou moradora, e do que o situação 
sugerir à sua imaginação, o espaço também pode até ser 
fechado completamente poro obrigar a bicicleta, mas 
também pode ser usado poro criar uma extensão lainda 
que bem pequena) para o hall de entrada , 
Vista da sala de estar acima, a viga de concreto marca um 
espaço que pode, em princípio, ser transformado em uma 
sala de estar ao ar livre com acesso pela "janela" - com 
loca lização e proporções deliberadamente escolhidas para 
que, dependendo da interpretação pessoal, possa ser usada 
quer como uma janela grande, quer como uma porta 
pequena, As garagens não foram oferecidas formalmente 
pela planta, embora isto não seja incomum nesse tipo de 
casa, Mas o espaço deixado para o carro no nível da 
rua pode ser usado para este fim , e os portas da garagem 
podem ser facilmente instaladas - contudo, esse espaço pode 
também ser usada para criar um quarto extra: um 
escritório, estúdio ou oficina, diretamente acessível pelo 
lado de fora, se for necessário, De qualquer modo, muitas 
pessoas deixam seu carro do lado de fora e muitas dão 
mais importância ao luxo de um quarto extra da que a 
prolongar a vida de seu carro por alguns anos, 
"As janelas podem ser projetadas como uma moldura, que 
pode ser preenchida, de acordo com a escolha dos , 
moradores, por janelas ou painéis fechados, A moldura em 
si é um fator constante e representa, pode-se dizer, o 
contexto e o ordem dentro dos quais a liberdade de cada 
indivíduo e todas as liberdades reunidas podem ser 
tomadas como parte integral do todo, A moldura é 
projetado para acomodar todos os preenchimentos 
CRIANDO ESPAÇO, DEIXANDO ESPAÇO 161 
UO L/1 
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possíveis dentro do limite de certos regr05, no sentido de 
que a soma de todos os preenchimentos sempre formará um 
todo coerente." 141 
" Dp tudo quanto foi dito, poderíamos concluir que só 
n05 resta projetar cápsulas nuas, tão antienFóticas e 
neutras quanto possível, para permitir aos moradores 
o máximo de liberdade paro realizar seus desejos 
específicos. Por mais que pareça paradoxal, é 
altamente questionável se um ta l grau de liberdade 
não irá resultar numa espécie de paral isia, pois, 
embora se apresentem muitas possibilidades, é 
extremamente difícil escolher a que será melhor para 
nós. É como estes cardápios fartos que oFerecem uma 
tal variedade de pratos que o apetite, em vez de 
aumentar, diminui. Quando hó muitas possibilidades 
de escolha, torna-se virtualmente impossível chegar a 
uma decisão, quanto mais à melhor delas - o excesso 
pode ser tão ruim quanto a extremo limitação. 
Não apenas é um pré·requisito para cada escolha 
que a gama de possibil idades possa ser apreendida 
(e que, portanto, seja IimitadaL mas é necessário 
também que quem vai fazer a escolha possa visualizar 
as possibilidades uma a uma segundo seu próprio 
modo de pensar. Ele deve ser capaz de concebê·las de 
acordo com sua própria experiência. Em outras 
palavras, elas devem provocar associação, para que 
ele possa compará·las mentalmente com proposições 
das quais já tinha consciência ou que possam surgir de 
sua experiência subconsciente. Ao comparar a imagem 
despertada pelo novo estímulo com as imagens já 
coletadas por experiências prévias, seu potencial pode 
ser avaliado e, conseqüentemente, tornar· se uma 
extensão de seu mundo familiar, de sua personalidade. 
Assim, se o mecanismo de seleção necessita de 
162 liÇÕES DE AiQUITElURA 
reconhecimento ou identificação das imagens já 
armazenadas pela experiência, é da maior 
importância que tudo que seja oferecido possa 
despertar o maior número possível de associações. 
Quanto mais associações puderem ser feitas, maior 
será a capacidade do indivíduo para responder a elas 
- isto é, maior será a chance de que as associações 
provocadas adquiram uma re levância específica para 
o usuário numa determinada situação. Cada forma, 
portanto,em vez de ser neutra, deveria conter a maior 
variedade possível de proposições, que, sem impor 
qualquer direção especíFica, sejam capazes de 
despertar constantemente associações. É um 
incitamento para motivar e estimular o homem a 
adaptar seu ambiente a suas necessidades e apossa r·se 
dele. Por esse motivo, devemos conFrontá ~ lo com 
estímulos que irão permitir interpretações e usos que 
se adequem melhor a seus propósitos. 
Estes estímulos devem ser elaborados para despertar 
imagens na mente das pessoas, imagens que, 00 
serem projetadas no mundo da experiência, resultarão 
em associações que encorajem o uso individual, isto é, 
o uso mais adequado para a sua situação num dado 
momento. 
O ponto focal em toda esta história, e os exemplos 
aqui citados pretendem enfatizá ~lo, é que as pessoas, 
em sua dependência de si mesmas e dos outros, com 
as restri ções fundamentais que isto impõe, são 
incapazes, sem ajuda externa, de libertar-se dos 
sistemas de significação e dos sistemas subjacentes de 
valores e avaliações que os limitam. A liberdade 
guarda um grande potencial para muitos, mas deve 
haver uma centelha para que o engenho comece a 
Funcionar. 
Vamos tomar, por exemplo, um espaço escuro ou um 
nicho - para a maioria das pessoas, ele vai sugerir um 
canto isolado e seguro, mas para cada indivíduo ele 
terá um significado diFerente, uma relevância para 
suas circunstâncias particulares: pode ser apenas um 
canto retirado para re laxar, para estudar 
tranqüilamente, para dormir, para usar como uma 
câmara escura ou apenas para armazenar comida ou 
pertences privados. 
Para que uma casa tenha a capacidade de despertar 
todos esses tipos de associação e ser capaz de 
abrigó·los, deve ter em a lguma parte um canto 
isolado - e, do mesmo modo, pequenos quartos, 
sótãos, porões, e janelas sob beirais induzem outros 
tipos de associações. Quanto mais rica for a variedadE' 
oferecida, maior será a capacidade da casa para 
corresponder aos mais ricos e variados desejos de seUl 
moradores. 
A severidade e a pobreza da maior parte das novas 
moradias torna-se evidente neste aspecto, 
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contrastando tristemente com o que uma velha casa 
tinha a oferecer - possivelmente burlando os 
regulamentos de construção. Basta pensar nas infinitas 
possibilidades de reformar e mobiliar oferecidas pelas 
casas antigas. Mesmo que, como ocorre num edifício 
novo, sejam baseadas em estereótipos, ainda têm 
muito mais a oferecer por causa da maior riqueza de 
estímulos pora novas associações, o que possibilita 
que seus moradores realmente se apropriem do 
espaço." [4[ 
CRIANDO ESPAÇO , DEIXANDO ESPAÇO 163 
9 INCENTIVOS 
Coso poro o 
Exposição de 
Construção de Berlim 
I Mies van der Rohe 
'Pia, lihr.' / 
te Corbusier 
164 
o projeto ajustado para oferecer o máximo de 
"incentivo" reclama uma abordagem nova e diferente 
por par.te do arquiteto. É necessária uma mudança no 
foco de atenção: o arquiteto deve transferir sua 
concentração habitual do programa de construção, que 
em geral reflete apenas uma interpretação coletiva, 
para a situação múltipla, individual ou coletiva, que se 
manifesta no cotidiano de tudo aquilo que construímos. 
Para trazer este variado sortimento de dados até a 
superfície, o arquiteto só tem um recurso à dispos ição: 
a imaginação. Ele deve usar ao máximo sua 
imaginação para ser capaz de identificar-se com os 
usuários e, assim, compreender como seu projeto 
chegará até eles e o que eles esperam. Esta 
capacidade imaginativa específica, que pode ser vista 
como parte indispensável da competência normal do 
arquiteto e que, como tal, deveria ser adquirida como 
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IIÇÔES DE ARQU ITET URA 
qualquer outra habi lidade, é o único meio de se 
chegar aos fatos verdadeiramente básicos: o programa 
por trás do programa (de construção). 
Como processaremos todos esses fatos, que resultarão 
num projeto capaz de induzir os usuários a 
associações, é uma outra história. Mas alguns dos 
aspectos mais concretos deste processo, que dizem 
respeito à "anatomia" de uma construção, podem 
ajudar a explicar direta ou indiretamente a qualidade 
de "indução" ou de "incentivo" das características 
arquitetônicas dos exemplos do capítulo anterior. 
Sem dúvida, nos casos em que deliberadamente 
deixamos algo inacabado porque esperamos que os 
usuários seiam capazes de completá-lo melhor do que 
nós, a forma básica empregada deve, no âmbito 
técnico e prático, prestar-se a tal objetivo. 
Do ponto de vista anatômico, todas os partes 
incompletas não devem ser apenas receptivas à 
adaptação e à adição, devem também, em certa 
medida, ser projetadas para acomodar várias 
soluções, e devem, acima de tudo, pedir que sejam 
completadas, por assim dizer. As partes que não são 
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o 
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explicitamente auto-suficientes, mas, ao contrário, 
existem em relação com outros componentes, devem 
ser formadas de ta l modo que possam ser reunidas ou 
combinadas, em outras palavras, que induzam o 
usuário a empreender essa ação. No sentido mais 
literal, também, o produto semi~acabado deve consistir 
numa indução, e isto é algo que só pode ser realizado 
quando já se começo com esta idéia. 
Os princípios mais elementares, como, por exemplo, 
que é mais fácil fazer um acréscimo em um plano reto 
do que em um plano curvo ou inclinado, 
desempenham aqui um papel fundamenta l, 
especialmente quando é razoável presumir que não 
haverá nenhum arquiteto por perto para ajudar 
quando chegar a hora de tomar a decisão. 
I 
I 
I 
COlUNAS 
Para levantar paredes ou divisórias, as colunas retangulares 
não são necessariamente melhores como ponto de partida, 
mas sem dúvida são mais fáceis para trabalhar do que as 
cilíndrícas. É importante ter isto em mente, sobretudo nos 
casos em que as colunas constituem as pedras angulares da 
organízação do espaço. Pois, na verdade, esse é quase 
sempre o caso - exceto no antigo plan libre, onde colunas 
livres definem seu próprío espaço sem levar em conta as 
paredes divisórias. As colunas no edífício de escritórios 
Centraal Beheer, ass ím como no De Drie Hoven, receberam 
um perfil com capacidade máxima para acomodar paredes 
adjacentes e dívisórias baixas. Suas proporções também 
foram ajustadas para tais objetivos. No Centro Musical (que 
pode ser caracterizado como uma seqüência de amplos 
espaços que se misturaram com um número relativamente 
pequeno de divisórias), as colunas são cilíndricas (448,449). 
Colunas livres e cilíndricas, num espaço amplo em que se 
juntam mu itas pessoas, funcionam de modo mais 
satisfatório para multidões, pois não ficam no meio do 
caminho. Nas escolas Apollo, colunas retangulares foram 
usadas nas junções de paredes, enquanto as quatro colunas 
livres do hall são cilíndricas (450). Elas se erguem, 
indiferentes, no meio de toda a agitação, onde podem ser 
lidas como intersecções da construção espacial. 
Não só a forma como também a dimensão das partes 
componentes e, naturalmente, a dimensão dos espaços 
entre as diversas partes determinam sua capacidade 
de acomodação, que, por sua vez, tem forte influência 
sobre Q gama de possibilidades quanto à disposição 
da mobília. Como conseqüência, muitas vezes é melhor 
Fazer uma coluna um pouco maior do que o 
estritamente necessário, se isto produzir uma 
"superfície de ligação" maior e, portanto, com mais 
possibilidades de utilização. 
'. 
(IIANDO mAço, DEIXANDO mAço 165 
Moradias Diagoon 
451 '52 
455 
'53 45' 
PIlASTRAS 
Além das colunas, as pilastras, que ocorrem em todas as 
construções em várias formas, podem servir a vários 
objetivos, dependendo de onde estejom localizadas e do 
espaço que deixam aberto. Tomemos, por exemplo, uma 
loreira, do tipo que interrompe uma das longas poredes em 
tantas casas antigas, e que não se pode ignorar ao 
mobilior o quorto: na verdade, a pilastra morca o espaço e 
fornece um ponto de partida, já que o espaço dos dois 
ladosafeta fortemen te as possibilidades e limitações do 
166 IIÇÕ E5 DE ARQUITETURA 
quorto como um todo (será que a cama cabe no nicho ou é 
grande demais?). 
Nas moradias-esqueleto, que são "condicionadas" tanto 
quanto possível para acomodar acréscimos e alterações, os 
pilares dos dois lados do pavimento que poderia ser 
designado como espaço de garagem tiveram sua posição 
relativa determinada para oferecer múltiplas soluções 
potenciais na forma de fachadas ou portos da garagem. 
Uma solução menos óbvia foi escolhida aqui com o fim de 
aumentar a gama de possibilidades. Um "ponto de partida' 
desse tipo apresenta um problema, para o qual cada 
usuário encontra a solução mais adequada a seus objetivos. 
Se você tiver bom olho paro essas coisas, perceberá 
em toda a parte exemplos de casas com alterações e 
acréscimos, fe itos ao longo do tempo pelos próprios 
morodores, provovelmente sem autorização das 
autoridades ou dos proprietários, e, em gera" muito 
bem sucedidos. 
É provável que tais acréscimos tenham sido feitos em 
lugares que ofereciam incentivos nesse sentido, ta is 
como varandas que "pediam" poro ser cobertas, e 
porticulamente em galerias, que podiam ser facilmente 
fechadas. 
De Drie Hoven, 
Lar para Idosos 
Centra0! Beheer, 
Edifício de Escritórios 
li 
j 
Hufeisensiedlung, 
Ber/im·Brilz, 1925·27 ! 
B. Tout 
MORADIAS, BERLIM 1925·27 / B. TAUT (456-460) 
Não parece provável que as caraclerísticas que encora jam 
este ti po de acréscimo ou alteração tenham sido 
deliberadamente incluídas pelo arquiteto, embora nos 
sintamos inclinados o pensar que sim no caso do conjunto 
de moradias de Bruno Ta ut em Berlim - que de foto parece 
ter sido projetado paro acomodar todos os alterações que 
os moradores fizera m desde que os casas foram 
construídos. 
Bruno Taut, no fase inic ial da construção de moradias de 
mossa anônimos, fo i sem dúvida um dos primeiros 
arquitetos o ficar do lodo dos usuários. Só muito tempo 
depois, quando viemos o conhecer os efeitos opressivos dos 
fil eiras intermináveis de moradias idênticos, é que 
começaram o surgir propostos para que se fizesse alguma 
coisa, no sen tido de um princípio arquitetônico, o respeito 
deste anonimato destruidor do espírito. 
456 457 458 
459 460 
CRIANDO ESPAÇO, DEIXANDO ESPAÇO 167 
De Dr;e Hoven, 
tor paro Idosos 
, 61 
j62 
4ó3 '61 
Escola Monfes5ori, Delft 
168 !l ÇÓfS Df ARQUITEI URA 
BLOCOS PERfURADOS PARA CONSTRUÇÃO 
Este tipo de incentivo é inerente aos blocos de concreto 
perfurados, que representam um exemplo básica e, ao 
mesmo tempo, extremo de reciprocidade de forma e uso. 
Os buracos nesses blocos literalmente exigem um 
preenchimento (pelo menos quando os blocos têm 
cavidades de um só lado - de outro modo eles se tornariam 
janelas). 
Nas si tuações em que os blocos perfurados foram 
aplicados, como nas varandas do lar para idosos De Drie 
Hoven, nas apartamentos no plano para moradias 
Haa rlemmer HouHuinen em Amsterdam ou no projeto de 
moradias em Kassel, eles foram Ioga colocados em usa -
na maior parle das vezes como vasos de plantas. É clara 
que, de qualq uer modo, as pessoas que queriam vasos ou 
jard ineiras teriam faci lmente enconlrado oulras soluções 
para acomodar suas plantas. Mas, coma esses blocos 
parecem inacabados e pedem, por ass im dizer, para ser 
usados, eles constituem um incentiva para que se faça 
alguma coisa com eles. 
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Ao adotor o princípio de reciprocidade de Forma e uso 
como ponto de partida, a ênfase se desloca claramente 
para o que se poderia descrever como uma maior 
liberdade para os usuários e moradores. Contudo, isso 
não deve ser entendido como se o arquiteto devesse 
seguir as instruções dos usuários quanto ao que 
ele deve fazer - e particularmente quanto ao que não 
deve fazer. 
Quando postulamos indiretamente que seja dado aos 
usuários um papel maior na configuração de seus 
ambientes, o objetivo primordial não é estimular maior 
individualidade, mas sim retomar o equilíbrio entre o 
que devemos fa zer por eles e o que devemos deixar 
para que eles façam. 
Oferecer lJincentivos lr que despertem associações nos 
usuáriosr quer por sua vez, conduzam a ajustamentos 
específicos adequados a situações específicas/ 
pressupõe - não obstante o des locamento de ênfase -
um projeto mais elaborador baseado num programa 
de requisitos mais detalhado e mais su ti l. A razão 
para criar incentivos é e levar o potencial inerente ao 
máximo. Em outras palavras: colocar mais em menos, 
ou tirar menos do que se pode tirar mais. Pode-se 
dizer que para cada situação aplica-se o seguinte: 
incentivo + associação = interpretação. 
Nesta questão, o próprio l/incentivo" é uma espécie de 
constante, que produz uma multiplicidade de 
interpretações por meio de associações variáveis. E/ se 
substi tuirmos Jlincentivo" por "competência" e 
" interpretação" por I/desempenho,rr estaremos de volta 
à analogia lingüística l já descrita. (Incidentalmente, 
quem pode deixar de notar as a renas em minia tura, 
rudimentares, nos blocos perfurados?) 
Assim como a posição do arquiteto diante da estrutura 
coletiva é in terpreta tiva - i.e ., a de usuório -I sua 
posição diante dos usuários de sua arquitetura é a de 
tornar seu pro jeto interpretável por eles. Deve ficar 
claro paro o arquiteto a té onde ele pode ir e onde ele 
não deve fazer imposições: ele deve criar espaço e 
deixar espaço, nas proporções adequadas e com o 
equilíbrio adequado. 
CRIANDO ESPAÇO, DEIXANDO ESPA ÇO 169 
~6S 
10 A FORMA COMO 
INSTRUMENTO 
"Quanto mais influência pudermos exercer 
pessoalmente sobre as coisas à nossa volta, mais nos 
sentiremos emocionalmente envolvidos com elas, mais 
atenção daremos a elas e mais inclinados estaremos a 
tratá-Ias com cuidado e amor. 
Só podemos desenvolver afeição pelas coisas com as 
quais nos identificamos - coisas sobre as quais 
podemos projetar nossa própria identidade e nas 
quais podemos investir tanto cuidado e dedicação que 
elas se tornam parte de nós mesmos, absorvidas pelo 
nosso próprio mundo pessoal. Todo esse cuidado e 
dedicação faz com que o objeto pareça precisar de 
nós! não apenas no sentido de que podemos decidir 
em grande parte o que acontece a ele, mas também no 
sentido de que o objeto passa a ter um lugar na nossa 
vida; esse tipo de relacionamento também pode, 
evidentemente, ser considerado como um processo de 
apropriação mútua. Quanto mais uma pessoa está 
envolvida com a Forma e o conteúdo de seu ambiente, 
mais esse ambiente será apropriado por ela e, assim 
como toma posse de seu ambienter o ambiente se 
apossa dela. 
À luz desta apropriação recíproca de pessoas e coisas, 
é justo afirmar que os incentivos oferecidos por nós, 
na qualidade de arquitetas, representam um convite 
para que os moradores os completem e lhes dêem um 
"colorido", ao mesmo tempo em que, por outro lado, 
as pessoas também convidam as coisas para que 
completemr dêem colorido e preencham sua própria 
existência. 
O usuário e a forma se reforçam mutuamente e 
interogem - e tal relacionamento é análogo ao que 
existe entre indivíduo e comunidade. Os usuários se 
projetam na forma, assim como os indivíduos se 
revelam em seus diversos relacionamentos com os 
outros, como interatuantes, deste modo tornando~se o 
que são. 
A forma dirigida a um fim determinado funciona como 
um aparato, e onde Forma e programa se solicitam 
mutuamente o próprio aparato se torna um 
instrumento. Um aparato Funcionando adequadamente 
faz o trabalho para o qual está programado, o que é 
esperado d~le - nem mais, nem menos. Ao apertar os 
botões certos, os resultados esperados são obtidos, o 
mesmo para todos, sempre o mesmo. 
Um instrumento (musical) contém essencialmente tantas 
possibilidades de uso quantos Forem os usos que lhe 
170 UÇÓES DE ARQU llElURA 
derem - um instrumento deve ser tocado. Dentro dos 
limites do instrumento, cabe ao instrumentista extrairdele o que puder, segundo os limites de sua própria 
capacidade. Desta maneira O instrumento e o 
instrumentista revelam suas respectivas capacidades 
um para o outro, complementando-se e realizando-se 
mutuamente. A Forma tomada como um instrumento 
oferece a ocasião para que cada pessoa Faça o que 
mais deseja e, acima de tudor para que o Faça à sua 
própria maneira." [4] 
o texto a seguir, de 1966, originalmente publicado em 
Forum 7-1967 com o título de "Identidade", pode 
servir como um resumo: 
"No projeto de cada ediFício, a arquiteto deve 
constantemente ter em mente que os usuários devem 
ter a liberdade de decidir por si mesmos como querem 
usar cada parte, cada espaço. Sua interpretação 
pessoal é infinitamente mais importante do que a 
abordagem estereotipada do arquiteto ao aderir de 
modo estrito a seu programo de construção. 
A combinação de funções que juntas constituem o 
programa é ajustada a um padrão estabelecido de 
vida - uma espécie de maior fator comum, mais ou 
menos adequado a todos - e, como resultado 
inevitável, que todos se vêem Forçados a se ajustar à 
imagem que se espera que projetemos, segundo a qual 
se espera que devemos agir, comer, dormi r, entrar em 
nossas casas - uma imagem, em suma, a que cada um 
de nós se assemelha apenas vagamente, e que, por 
esse motivo, é totalmente inadequada. 
Em outras palavras, não é de modo nenhum difícil 
criar um arquitetura lúcida quando as exigências que 
ela em princípio deve enfrentar Forem suficientemente 
não-explícitas! 
São as discrepâncias que nascem da necessidade 
individual de cada um de interpretar uma funçõo 
especíFica, dependendo das circunstâncias e do lugar, 
à sua maneira, que acabam fornecendo a cada um de 
nós uma identidade própria, e, já que é impossível 
Icomo sempre Foi) adequar todos às mesmas 
ci rcunstâncias, devemos criar esse potencial para a 
interpretação pessoal, projetando as coisas de ta l 
maneira que elas possam ser efetivamente 
interpretadas. 
Não basta apenas deixar espaço para o interpretação 
pessoal, ou seja, deixar de projetar em um estágio 
inicial. Isto com certeza resultaria num maior grau de 
flexibilidade, mas a flexibilidade não contribui 
necessariamente para um melhor funcionamento das 
coisas (pois a Flexibilidade não pode jamais produzir 
os melhores resultados imagináveis para uma 
determinada situação). Enquanto não houver uma real 
expansão das escolhas oferecidas para as pessoas, o 
i 
I ' padrão estereotipado não desaparecerá, e esta 
I . expansão só pode ser alcançada se começarmos por 
tornar possível que todos as coisas à nossa volta 
desempenhem papéis variados, i.e., que assumam 
cores va riadas e tombém permaneçam fiéis a si 
mesmas. Só quando todos esses diversos papéis forem 
levados em consideração ao receberem prioridade no 
estágio do projeto, i.e., ao serem incluídos como 
aspectos importantes no programa de requisitos, só 
então podemos esperar que cada indivíduo seja 
induzido a formar sua próprio interpretação dos 
aspectos em questão. Os diversos papéis, ao 
receberem prioridade na forma de provocação, serão 
sugeridos em vez de ser explicitados. Dentro da 
moldura de condicionamento que Q formo recebeu 1 o 
i 
i· 
i 
usuário ganha a liberdade de escolher paro si mesmo 
o padrão que considera mais adequado, de selecionar 
seu próprio cardápio l por assim dizer; ele pode ser 
mais fiel o si mesmo, suo identidade é enriquecido. 
Cada lugar, cada componente, terá de ser 
harmonizado ao programa em sua totalidade, i.e ., a 
todos os programas esperados. Se condicionamos a 
forma para que elo acomode uma diversidade máxima 
de uso, então podem ser extraídas infinitamente mais 
possibilidodes da totalidade, sem que isto signifique 
distanciar-se do sentido básico do projeto. 
Os JretornosJ podem ser incrementados pelas 
possibilidades de uso que estão embutidas no projeto 
como intenções sob a superfície.1I [30] 
Paris, Pare des Buffes Chaumont 
466 
CRIANDO ESPAÇO, DEIXANDO ESPAÇO 171 
--
-, 
-', 
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,-.,." 
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" ',' 
1 
• 
I 
I 
I 
I 
C FORMA CONVIDATIVA 
Quando examinamos um dos muitos livros sobre arquitetura 
que estão sendo publicados hoie em dia e vemos todas 
aquelas.Jotografias brilhantes, tiradas, sem exceção, em 
perfeitas condiçães de tempo, não podemos deixar de nos 
perguntar o que se passa na mente dos arquitetos, como 
eles vêem o mundo; às vezes chego a pensar que eles têm 
uma profissão diferente da minha! Pois a arquitetura não 
pode ser outra coisa senão o interesse pela vida cotidiana, 
tal como vivido por fodas as pessoas; é como o vestuário, 
que não deve apenas nos vestir, mas aiustar-se bem a nós. 
E, se é moda hoie em dia preocupar-se com as aparências 
exteriores, ainda que habilmente investidas de referências a 
coisas superiores, então a arquitetura foi degradada a um 
tipo inferior de escultura. O essencial é que, seio ló o que 
se faça, onde quer que se organize o espaço· e de que 
maneira, ele terá inevitavelmente certo grau de influência 
sobre a situação das pessoas. A arquitetura, na verdade, 
tudo aquilo que se constrói, não pode deixar de 
desempenhar algum tipo de papel nas vidas das pessoas 
que a usam, e a principal tarefa do arquiteto, quer ele 
goste, quer não, é cuidar para que tudo o que faz seio 
adequado a todas estas situações. Não é apenas uma 
questão de eficócio no sentido de ser prótico ou não, mas 
de verificar se o proieto está corretamente afinado com as 
relações normais entre as pessoas e se ele afirma o 
igualdade de todas as pessoas. A questão de saber se a 
arquitetura tem uma função social é totalmente irrelevante, 
pelo simples motivo de não existirem soluções socialmente 
indiferentes; em outras palavras, toda intervenção nos 
ambientes das pessoas, seio qual for o obietivo específico 
do arquiteto, tem uma implicação social. Assim, no 
verdade, não somos livres para ir em frente e proietar 
exatamente o que nos agrada - tudo o que fazemos traz 
conseqüências para as pessoas e para seus relacionamentos. 
Um arquiteto não pode fazer muita coisa, o que torna 
ainda mais importante não desperdiçar as poucos 
oportunidades existentes. Se você acha que não pode 
melhorar o mundo com seu trabalho, pelo menos não o 
piore. A arte da arquitetura não consiste apenas em fazer 
coisas belas - nem em fazer coisas úteis, mas em fazer 
ambas ao mesmo tempo - como um alfaiate que faz roupas 
bonitas e que servem. E, se possível, roupas que todos 
possam usar, não apenas o Imperador. 
Tudo o que proietamos deve ser adequado a cada situação 
que suría; em outras palavras, não deve ser apenas 
confortóvel mas também estimulante - e é esta adequação 
fundamental e ativa que eu gostaria de designar como 
' forma convidativa': a forma que possui mais afinidade 
com as pessoas. 
174 LIÇÕ ES DE AIQUllfTUIA 
. I 
o Espaço Habitável entre as Coisas 176 
Calçada Levantada, Buenos Aires 
Aloiamenta para Estudantes Weesperstraat, Amsterdam 
La Capelle, França 
Corte de Justiça, Chandigarh, índia / Le Corbusier 
Centro Musical Vredenburg, Utrecht 
De Evenaar, Escola, Amsterdam 
Escolas Apollo, Amsterdam 
Praça de São Pedro, Roma 
2 lugar e Articulação 790 
Dimensões Corretas 
Moradias Haarlemmer Hounuinen, Amsterdam 
"Os Comedores de Batata" / Vincent van Gogh 
De Drie Hoven, Lar para Idosos, Amsterdam 
Escola Montessori, Delh 
Edifício de Escritórios Centraol Beheer, Apeldoorn 
Reforma de Residência, Amsterdam 
São Pedro, Roma 
Centro Musical Vredenburg, Utrecht 
3 Visão t 202 
Escola Montessori, Delh 
Aloiomento para Estudantes Weesperstraat, Amsterdam 
Pavillon Suisse, Paris / Le Corbusier 
Sacadas 
Pavil lon de l'Esprit Nouveau, Paris / Le Corbusier 
Moradias Documenta Urbana, Kassel 
Moradias liMa, Berlim 
Escola Thau, Barcelona / Martorell, Bohigas & Mackay 
Centro Musical Vredenburg, Utrecht 
De Overloop, Lar poro Idosos, Almere 
Parque Guell , Barcelona / A. Gaudí, J. M. Juiol 
Saciologia do Sentar 
Escolas Apollo,Amsterdam 
4 Visão ti 276 
Fóbrica Van Nelle, Ronerdam / M. Brinkman, L. C. van 
der vlugt 
Casa Rietveld-Schrõder, Utrecht / G. Rietveld 
De Overloop, Lar para Idosas, Almere 
De Evenaar, Escola, Amsterdam 
5 Visão til 226 
Pavi lhão da Exposição Mundial, Paris / F. le Play 
Cinema Cineac, Amsterdam / J. Duiker 
Centro Musical Vredenburg, Utrecht 
Villa Savoye, Poissy, França / Le Corbusier 
Passagem Subterrânea para Pedestres, Genebra, Suíça / 
G. Descombes 
Capela, Ronchamp, França / Le Corbusier 
Alhambra, Granada, Espanha 
Mesquita, Córdoba, Espanha 
Residência Particular, Bruxelas / V. Horta 
Maison de Verre, Paris / P. Chareau, B. Biívoet 
e L. Dalbet 
Residência Van Eetvelde, Bruxelas / Y. Horta 
Castel Béranger, Paris / H. Guimard 
Escolas Apollo, Amsterdam 
Biblioteca Ste. Genevi"ve, Paris / H. Labrouste 
6 Equivalência 246 
Escala ao Ar livre, Amsterdam / J. Duiker 
De Overloop, Lar para Idosos, Almere 
Villa Rotonda, Vicenzo, Itólia / A. Palladio 
Hierarquia 
Mesquita, Córdoba, Espanha 
São Pedro, Roma 
Pintores Holandeses 
Le Corbusier, Formal e Informal 
Edifício do Parlamento, Chandigarh, índia / Le Corbusier 
Reservatório de Água, Surkei, índia 
FORMA CONVIDATIVA 175 
, , 
1 O ESPACO HABITÁVEL 
-------
, 
ENTRE AS COISAS 
Ao abordar o objeto projetado mais como um 
instrumento do que como um aparato, como fizemos 
na seÇao anterior desses estudos (parte B), já 
estávamos na verdade advogando o que equivale a 
maior eficiência. Ao discutir exemplos da capacidade 
da forma para desempenhar diversos papéis sob 
circunstâncias mutáveis, não apenas pela criação das 
condições necessárias mas também pelo incentivo real 
ao uso diferenciado, esta seção tratará de estender tol 
idéia a um princípio geral. Pois o que precisamos é de 
uma expansão das possibilidades de todas as coisas 
que projetamos, para torná-Ias mais úteis, mais 
aplicáveis e, portanto, mais adequadas a seus 
objetivos, ou adequadas a mais objetivos. 
Se uma coisa é adaptada muito especificamente para 
certo objetivo, funciona da maneira como foi 
programada para funcionar, Le. , como se espero que 
_ '".:~-lliIIo~r+:.:., .:"-"'\';i. 
I ~ -.L.":B 
·t~!""":, --- --- - --'-- -.- -
• 
176 lIÇÕfS Df ARQUllHURA 
funcione. É o tipo de funcionalismo sobre o qual os 
funcionalistas falavam, mas é também o mínimo de 
utilidade que se pode esperar da arquitetura. E, para 
realizar mais do que este mínimo no diversidade das 
situações que surgem, estou reivindicando formo e 
espaço com maior potencial de Jlacomodação", tal 
como um instrumento musical que soa da maneiro 
como o instrumentista quer que ele soe. O importante 
é incrementar esse Jlpotencial de acomodação" e, 
dessa maneira, tornar o espaço mais receptivo a 
diferentes situações. Quando se começa a procurar, 
encontramos facilmente, até mesmo nos lugares mais 
inesperados, exemplos de uso que os projetistas 
certamente jamais imaginaram. 
As pessoas usam seu ambiente em cada situação da 
melhor forma que podem, e freqüentemente as coisas 
à sua volta, sem intencional idade, oferecem 
oportunidades inesperadas que são apreendidas Jlde 
passagem", por assim dizer. 
, 
• • • o 
! , 
"'Irregularidades', tais como diferenças de nívet 
ocorrem em toda a parte, e f em vez de nos 
esforçarmos em minimizá-Ias, deveríamos, ao 
contrário, nos concentrarmos em articulá-los tão 
conscientemente que possam ser exploradas ao 
máximo. Parapeitos, balaustradas, pilares e canaletas 
são formas de articulação e representam maiores 
possibilidades de conexão. Podem ser usados como 
e lementos primitivos daqui lo que poderíamos chamar a 
gramática básica da arquitetura. E ao aparecerem, 
como de fato aparecem, em formas e tamanhos 
diFerentes constituem um estímulo constante para o uso 
na vida cotidiano . 
A providência mais elementar para capacitar as 
·pessoas a se apossarem de seu ambiente imediato é 
provavelmente o assento (sentar-se tem tudo a ver, 
lingüisticamente, com assentamento). Um lugar para 
sentar oFerece uma oportunidade de apropriação 
temporária, ao mesmo tempo em que cria as 
circunstâncias para o contato com outros. Não só um 
soFá ou uma cadeira comuns seriam incapazes de um 
uso assim tão casual e variado, como também 
Falhariam em estimular tal uso. Objetos que se 
apresentam explícita e exclusivamente paro um 
objetivo específico - por exemplo, para sentar-se -
parecem ser inadequados para outros objetivos. 
A extrema funcionalidade de um projeto torna-o rígido 
e inflexíve t isto é, oFerece ao usuário do objeto 
projetado muito pouco liberdade poro interpretar sua 
função de acordo com sua vontade. É como se já 
estivesse decidido a priori o que se espera do usuário, 
o que e le pode e o que ele não pode Fazer. O usuário 
é, deste modo, subserviente à forma e à concomitante 
'aceitação' dada a prior;; ele só pode usar o objeto, 
apropriar-se dele temporariamente, quando o que 
deseja fazer com ele corresponde ao que o forma está 
ditando. 
O ~ue é ditado por um sofá pode ser considerado a 
síntese do que os responsáveis por sua existência têm 
a oferecer: os fabricantes de mobília, os compradores, 
uma ideologia, uma sociedade, uma cultura. 
O conceito 'banco' é mantido por uma série de 
associações tão poderosas que o usuário tem pouca 
chance de ver além dessas associações para escolher 
I aquilo de que mais necessita naquele momento - e que 
I' pode muito bem ser uma mesa em vez de um banco, 
ou apenas um lugar paro colocar uma bandeja para o 
!:afé. No caso de um encontro casual, pode ser apenas 
_<~ ponto para apoiar o pé: um pequeno gesto que 
pode ser um sinal de que você não se opõe à idéia de 
um contato mais pessoal. Se a resposta o esse primeiro 
gesto, provisório e não comprometedor, não se revela r 
desagradável, então as duas partes podem assumir 
sucessivamente posições mais permanentes, sempre de 
acordo com o comprometimento ou não· 
comprometimento que cada um deseja." [4] 
CALÇADA LEVANTADA, BUENOS AIRES (468) 
"Quando a calçada é tão alta que podemos nos sentar ou 
nos encostar nela, em ruos com declive, por exemplo, o 
lugar, se estiver situada favoravelmente [como numa 
esquina), pode tornar-se um lugar onde as pessoas se 
encontram e descansam. É onde iovens iogadores de 
futeba[ acham seu pública, e um lugar que qualquer 
vendedor de rua que deseie chamar a atenção dos 
transeuntes quer usar: um lugar visível, mas com a 
vantagem natural de oferecer alguma proteção para as 
mercadorias expostas." 141 
FOIMA CONVIDAlIVA 177 
468 
469 
,70 m 
m 
t -+-55-----t-t 
35 
+ 
ALOJAMENTO PARA ESTUDANTES WEESPERSTRAAT (470-472( 
"Um parapeito comprido, largo, deve parecer 
razoavelmente discreto à primeira vista, um lugar onde se 
possa fazer uma pausa, recostar"se ou sentar-se, apenas 
por um momento ou pora uma conversa mais longa 
conforme o caso. Às vezes serve como um espaço para a 
refeição quando o restaurante está cheio, e foi usado para 
o bufê de uma ceia de Natal." 141 
UPara que o contato possa se estabelecer 
espontaneamente é indispensável certa informalidade, 
certo descompromisso. É a certeza de que podemos 
interromper o contato ou nos retirarmos quando 
quisermos que nos encoraja a prosseguir. 
O estabelecimento de contato é, de certo modo, como 
o processo de sedução, em que ambos os lados fazem 
178 liÇÕES DE ARQU ITETURA 
reivindicações iguais sabendo que o retirada é possív.!Í 
a qualquer momento. 
Aqui também, as associações despertadas em nós 
pelas imagens que armazenamos em nossa consciênci:: 
- associações coletivas, pode-se dizer - desempenham 
um papel decisivo. Basta pensar num casal de 
namorados l para logo imaginá-lo sentado num banco" 
com todas as associações concomitantes de vínculos 
luturos_" [41 
LA CAPEllE, FRANÇA (473) 
IINõo é preciso muito para que as co isas sirvam como umJ 
espécie de estruturo à qual a vida cotidiana pode ligar-se. 
O simples corrimão em que pessoas idosas podem se 
apoiar quando sobem oudescem uma rua íngreme é, pare 
todas as crianças da vizinhança, um desafio para mostrar 
sua agilidade_ Serve como um brinquedo de p/ayground e 
no verão é sempre usado para construir cabanas e 
esconderi jos_ Na Holanda , além disso, as donas de caso 
usam o corrimão para tirar a poeira dos tapetes, 
Um corrimão de ferro está literalmente 'à mão' para uma 
ampla gama de USO" para todo o tipo de situação diária, 
comum, e tran,forma a rua num p/ayground. 
Os playgrounds projetados, orientados para um propósito, 
que se espalham por toda a cidade são, por enquanto, 
indispensáveis como refúgio para as crianças. Mas, como 
as próteses, são também um lembrete doloroso de como a 
cidade, que devia em si mesmo ser um playground para 
seus cidadãos e suas crianças, foi drasticamente mutilado 
neste sentido." 141 
J 
. I 
CORTE DE JUSTiÇA, CHANDIGARH, 1951 -55 / LE CORBUSIER 
(.474-477) 
As construções "Br ise-Solei l", tão empregadas na último 
fase da arquitetura de Le Corbusier, consistem em uma 
grade fixa de concreto formada por planos horizontais e 
verticais; além de proteger do sol, é claro, as estruturas em 
forma de favos, com seus nichos profundos, servem também 
o outros objetivos menos evidentes. O que fascinou Le 
Corbusier nesta estrutura foi , sem dúvida, basicamente a 
sua forte plasticidade, e eu não me surpreenderia se 
soubesse que ele jamais considerou que ela poderia ser útil 
por uma série de outras razões além de sua plasticidade 
expressiva e de suas propriedades como anteparo, 
acrescentando, portanto, uma qualidade extra ao edifício 
como um todo. 
Nos exemplos anteriores, a qualidade nasceu de 
fatores mais ou menos fortuitosi de qualquer modo, 
não resultou de um projeto deliberado, mas também 
deve ser possível transformar essa qualidade em 
exigência explícita do projeto. Atender essa exigência 
adicional de qualidade não custa muito dinheiro e 
pode ocorrer naturalmente se quisermos. Isso significa 
que podemos fazer mais com o mesmo material, 
organizando-o de maneira diferente, dando mais 
proeminência ao que já estava ali - é uma questão de 
prioridades. 
~ - -
fORMA CONVIDATIVA 179 
476 m 
478 
m 410 
CENTRO MUSICAL VREDENBURG 1478·4821 
Um saguão de teatro não pode ter assentos demais. Só uma 
pequena parte do públi co acha um lugar para se sentar 
durante os intervalos; assim, quanto mais informais forem 
180 LIÇÕ ES OE ARQUITETURA 
.-... ~-_ . ...,....----.,.-- -
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os assentos, melhor. Para oferecer assentos extra , foram 
construídas amuradas de alvenaria onde era possível: 
menos confortáveis do que um banco acolchoado, sem 
dúvida, mas não menos úteis. Outro problema típico 
--
j 
I 
I 
I 
durante um intervalo é achar um lugar onde colocar 
xícaras, copos e garrafas. A solução tende a ser o uso de 
qualquer superfície plana disponível. Fornecer um espaço 
exclusivamente para esse objetivo seria provavelmente levar 
as coisas longe demais; é suficien te que os parapeitos, 
balaustradas, divisórias, etc. , seiam suficientemente largos l 
acrescentando, por exemplo, uma prancha de madeira 
paro resolver esse pequeno mas persistente problema. 
No nível superíor do galeria de lojas, os balaustradas de 
metal curvam'se em intervalos regulares, abrindo espaço 
para um pequeno banco, de onde se pode avistar a galeria 
inferior nas duas direções. O encosto elevado - um pouco 
majestoso demais, talvez - foi a concessão que teve de ser 
feita às autoridades responsáveis pelo edifício, já que os 
regulamentos aplicados à altura dos parapeitos tinham de 
ser estritamente observados; o desenho mais natural e, de 
certo modo, mais elegante do modelo que precedeu a 
versão definitiva foi descartado. Os assentos foram 
removidos porque supostamente atraem muitos "vadios" que 
se põem à vontade nesta área coberta, sobretudo à noite; 
eles deixam muita sujeira e há muitas queixas de 
transeuntes agredidos. Este é um problema em todas as 
cidades do mundo, e deve ser um paradoxo amargo que 
As ferrovias holandesos têm o compromisso cle" 
manter limpas e bem ordenados os óreas 
públicos. O grande número de jovens que 
vagueiam na Estação Cen/ral de RoffereJam 
depararem recentemente com uma politica de 
-clesencorajamento· sob a forma de, entre 
outras coisas, varas providos de agudas pontas 
de aço instolodas nos espaços de pedro onde 
era possivel sentar. E essa medido anres de tudo 
aterrorizante vem a ser porte de uma componho 
das Ferrovias holandesas conlra o desordem e o 
depredação! (Bouw ", '9B7) 
um gesto amistoso também seja um convite para hóspedes 
menos desejáveis. Mas, quando se abrem portas, deve·se 
deixar todo mundo entrar! A tendência para tornar as 
coisas tão impessoais e inacessíveis não chega a 
surpreenderj mas suas conseqüências são muitas vezes 
absurdas. 
I 
f L.::. __ 
fOIMA CONVIDATIVA 181 
481 481 
I 
~ ... 
. 84 . 85 
' 8j 
.87 .88 
.1 ' . 
DE EVENAAR, EscolA {483-490) 
A escadaria na entrada da nova escola primária "De 
Evanaar', em Amsterdam, recebeu uma articulação extra 
para tornar mais fluente o acesso do nível do ruo até a 
escola. A justaposição dos dois lances da escada acabou 
criando a sugestão para arquear os componentes do 
corrimão. Isto deu origem à decisão de fazer os elementos 
do parapeito na curva do patamar produzirem dois 
pequenos lugares para sentar. Certamente, a forma aqui 
criada (como os assentos nos cantos da galeria do Centro 
Musical) é dominante e nada fortuita, mas, em ambos os 
casos, é uma derivação lógica da situação dada . Aqui a 
forma oferece explicitamente sua função , ao contrá rio da 
chapa curva de aço perfurado no alto do escada, onde, no 
entanto, as crianças logo descobriram as oportunidades 
implícitas para sentar-se. 
182 LIÇÕES DE ARQUI TET URA 
I 
I 
I 
t /:' 
~I 
I~ 
/ 1' 
I 
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~ 
I 
ESCOLAS ApOLLO (491-493) 
"Parapeitos de janela, prateleiras e pranchas numa sala de 
aula, todos oferecem oportunidades poro que as crianças 
exponham trabalhas manuais, que geralmente não são 
apenas frágeis, mas também numerosos_ Este é o tipo de 
coisa que torna a criança capaz de se apropriar de um 
espaço, de se sentir à vontade nele. É por isso que 
acrescentamos pranchas e simi lares onde era possível e 
adequado." [lOJ 
FO.M A CONVIDAT IVA 183 
489 4111 
m 
"É raro que as colunas hoie em dia tenham umo base 
defin ida separadamente ou o tradicional capitel das 
colunas das ordens clássicas. Elas simplesmente 
desaparecem no chão. Mas há situações em que uma seção 
alargada da coluna, um pouco acima do solo, oferece 
._-
-----
. . -
184 liÇÕ ES DE ARQU ITETUR A 
vantagens adicionais interessantes. Na entrada de um 
iardim-da-infância, por exemplo, os pais se reúnem para 
esperar as crianças e levá-Ias para casa. Seria um tanto 
exagerado instalar bancos especiais apenas para esses 
pais, e é até duvidoso se eles seriam necessórios. O mais 
adequado, então, é o assento informal que esses discos 
oferecem, os quais são bem-vindos quando se tem de 
esperar mais do que o previsto. Durante o recreio das 
crianças/ os discos sõo usados paro deixar os casacos e as 
pastas - certamente bem melhor do que um canto no 
chão ... E por fim, mas, absolutamente, não menos 
importante, esta coluna serve inevitavelmente como 'pique' 
para quem está brincando de 'esconde-esconde'." 1101 
I 
PRAÇA DE SÃO PEDRO, ROMA, DESDE 1656 / G. H. BERNINI 
1494, 495) 
"Cada uma dos inumeráveis colunas do quádruplo colunata 
do Praça de São Pedro, de Bernini, em Roma, tem uma 
base quadrada suficientemente larga para que os pessoas 
se sentem confortavelmente, e os colunas são tão grossas 
que proporcionam sombra aos que se sentam ali. Estes 
múltiplos 'assentos' rodeando o espaço oval, onde a 
possibilidade de isolamento é maior, oferecem uma 
hospitalidade informal para todos, mesmo quando o resto 
do praça está deserto. Quantos colunas entre as que estão 
sendo projetadoshoje em dia em todo o mundo oferecem 
uma qualidade adicional semelhante aos que no futuro 
terão de viver com elas?" [6) 
~--------_._--- --
i' .... -
-.--
-~ ...--------_ ... 
~ -..... -' :::.. .--=-- -:-----
-, .. ---
São Pedro, 1754! 
G. P. Pon;n; 
fORMA CONVIDATIVA 18S 
496 
m 
498 
i ' 
186 l iÇÕES DE ARQUITETURA 
:- ..-r-
i i ··' 
: . r;-;' 
~_...J..,.. ... _ ... t * 
J 
DE EVENAAR, ESCOlA 1496-498) 
Parapeitos ao lodo de escadas são geralmente incl inados, 
paralelos ao corrimão. Esta é, de fato, a solução mais óbvia 
em muitos casos, indicando de maneira lógica a presença da 
escada. Mas quando é colocado numa posição em que 
oferece vista de algo, como no caso da escola /IDe Evenaar", 
ele convida a pessoa a debruçar-se, ou até mesmo a 
sentar-se. Quando alguma coisa estó acontecendo, as 
pessoas querem parar um pouco e observar - e isto já é 
razão suficiente para que a arquitetura contribua para criar 
uma capacidade potencial de assentos. Nesse caso, foi uma 
boa idéia colocar, em vez do costumeiro parapeito inclinado, 
um parapeito dividido em degraus largos o suficiente para 
apoiarmos os cotovelos ou então nos sentarmos. E se, como 
nesse caso, a parede for de alvenaria, o projeto é muito mais 
fácil de executar, já que não é preciso cortar os tijolos. Deste 
modo, sem que houvesse intenção, a execução evoca a 
elaboração de Serlage e Laos. 
ESCOlAS ApOllO 1499,501-503) 
"Todo ti po de degrau ou sa li ência na entrada de uma 
escola acaba se transformando num assento para as 
crianças, especialmente quando hó uma co luna convidativa 
para oferecer proteção e servir de encosto. Realizar 
isto gera a forma . Aqui, mais uma vez, vemos que a forma 
gera a si própria, e é menos uma questão de inventar da 
que de ouvir atentamente o que os homens e os objetos 
querem ser." [l O) 
Quanto a certos tipos de espaços, sabemos de antemão que 
eles serão usados de bom grado, e ter isto em mente é 
importante para tornar a periferia da edifício tão 
convidativa quanto possível, ativando cada componente 
onde for possível - e isso inclui , por exemplo, o espaço em 
frente à entrada do jardim-de-infância sob a escada que 
conduz à escola. Tais espaços freqüentemente degeneram 
em cantos escuros e malcheirosos, onde a su jeira se 
acumula e onde circulam gatos, mas não pessoas. Ao fazer 
com que o lance da escada se erga a partir de uma 
plataforma levantada, essa situação pode ser evitada, ao 
mesmo tempo em que se dó um valor mais positivo à área 
sob o escada. É a formo mais literal de tornar mais 
hab itável o espaço entre as coisas. 
Del/errlos ter cuidado para não deixar buracos e cantos 
.perdi,dos e sem utilidade, e que, como não servem 
para nenhum objetivo, são "inabitáveis ll • Um arquiteto 
não deve desperdiçar espaço ao organizar seu 
material, pelo contrário, deve acrescentar espaço, e 
não só nos lugares óbvios que chamam a atenção de 
qualquer maneira , mas também em lugares que em 
geral não despertam atenção, i.e., entre as coisas. 
Os exemplos anteriores mostram como se pode 
incrementar a funciona lidade de um projeto 
arquitetônico levando sistematicamente em canta o 
espaço dos intervalos. 
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0.° 
FORMA CONVIDATIVA 187 
D 
Escalo Montessor;, 
De/ft 
500 
501 
502 50J 
._. -~ 
_________ da parede, no qual sempre vemos algumas pessoas 
sentadas ou encostadas. E os automóveis dos velhos 
tempos tinham um estribo para facilitar Q entrada dos 
• 
--- . ...::: 
---.::: - -- -. -----:;... 
Sem dúvida, freqüentemente deparamos com exemplos 
desse tipo de qualidade extra em nosso ambiente sem 
que nenhum arquiteto tenha deliberadamente 
pretendido esse aspecto, mas é justo dizer que em 
geral deveríamos tentar tornar os objetos mais 
substanciais, menos bidimensionais - pensando em 
termos de zonas. Paredes livres, se não alcançam o 
teto e são suficientemente grossas, podem servir como 
prateleiras. Um dos aspectos mais admiráveis das 
igrejas italianas é que elas têm um soco de pedra 
chegando à altura do joelho acompanhando boa parte 
passageiros e serviam como excelentes assentos 
durante um piquenique. 
A extensão do espaço usável mediante o acréscimo de 
planos extras horizontais linformais) representa a 
recompensa pela explicitação do que era um requisito 
implícito. Se este valor adicionado é visto basicamente 
como uma ampliação de lugares para sento r e colocar 
coisas, a vantagem pode parecer algo limitada ó 
primeira vista. Mas o essencial aqui é o compromisso 
do projetista ou do arquiteto (em geral e em particular) 
de criar esse valor adicionado onde for possível, pois 
os usuários transformarão estes dados adicionais em 
novas vantagens. 
Tal intensificação do material deveria, idealme~te, 
tornar-se uma segunda natureza para o arquiteto, uma 
questão mais de marca pessoal da que de dado extra, 
não tanto uma questão do que se projeta, mas do 
como se projeta. É ao conteúdo que devemos 
adicionar, não ao projeto (o perigo de projeções 
artificiais e de espalhafato está sempre presente). 
Um pré-requisito poro criar o forma convidativa é a 
empatia, o qualidade que faz com que a hospitalidade 
consista em antecipar os desejos dos convidados. 
Aumentar o "potencia l de acomodação" significa 
maior adequação ao que se exige do forma; uma 
forma, portanto, mais direcionada para as 
necessidades das pessoas em diversas situações e que/ 
conseqüentemente, tenha mais Q oferecer. 
O espaço habitável entre os coisas representa um 
deslocamento da atenção do âmbito oficial para o 
informal, onde se condiz o vida cotidiana, e isto quer 
dizer entre os significados estabelecidos da funçõo 
explícita. 
188 lIÇÓfS Cf ARQUlmURA 
I 
I 
I:· 
:.'. 
I ' ; 
r-: . . 
i-
i 
I 
"tes dames du bois 
de 800/09'" (I 925} 
'Cité industrielfe", 
1901-4 / T. Gorni" 
:, ; 
"Piquenique na 
praia' , Flórida 
(l941) 
50. 
505 
506 507 
Betondorp, Amsterdom, 1922/ D. Greiner 
FORMA CONVIDATIVA 189 
508 
m 
2 LUGAR E ARTICULACÃO 
I 
Dimensões Corretas 
A primeira consideração de importância decisiva ao se 
projetar um espaço é determinar para que ele servirá 
ou não servirá, e r conseqüentemente, qual será o 
tamanho adequado. A primeira e mais óbvia conclusão 
é: quanto maior for o espaço, mais possibilidades ele 
oferecerá. Isto implicaria simplesmente fazer tudo tão 
grande quanto possível. E, naturalmente, isso não dá 
certo. Numa cozinha grande demais, temos de 
procurar e carregar coisas mais do que o estritamente 
necessário. É simplesmente uma questão de 
comodidade, de ter à mão tudo de que se necessito. 
Atividades e usos diferentes exigem dimensões 
190 li ÇÕE S DE ARQUITETURA 
espaciais diferentes. Um espaço suficientemente 
grande poro jogar pingue-pongue não é 
necessariamente adequado paro que um pequeno 
grupo dOe pessoas se sente em torno de uma mesa para 
conversarr por exemplo. Que dimensões dar a um 
espaço é sempre uma questão de avaliar a distância e 
a proximidade exigida entre as pessoas, dependendo 
da situação e do objetivo do espaço. O equilíbrio certo 
entre distância e prox imidade é um ponto importante 
quando se dispõem assentos, especialmente em torno 
de uma mesa: nem longe demais, porque desencorajo 
o contato intenso quando este é necessário, nem perto 
demaisr porque todos se sentem espremidos. Essa 
sensação pode até ter um eFeito paralisador: num 
elevador cheio de estranhos, a conversa se torna 
aFetada e acaba morrendo. 
MORADIAS HAARlfMMER HOUTTUINEN (508·510) 
Os iardinzinhos no calçada da frente, cercados por um 
muro baixo de ti ia los, não são maiores do que os varandas 
nos anda res de cima. Não poderiam ser menores, claro, 
mas também não é certeza que seriam mel ho res se fossem 
maiores. São suficientemente grandes para oferecer o 
espaço necessário para um pequeno grupo de pessoas, e asnecessidades das diversas famílias não parecem variar 
muito nesse aspecto. Deve haver espaço suficiente para 
algumas cadeiras em torno de uma pequena mesa, que 
pode ser redonda, quadrada ou oblonga, mas raramente se 
desvia do tamanho padrão. (Tudo isto é tão previsível 
quanto o fato de que a largura da ca lçada é inadequada.1 
As varandas dos apartamentos superiores são relativamente 
"'lI .. .. ... .., "". 
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,. --fl 
Dfm~~]J 
espaçosos, ao contrário da situação usual, em que as 
pessoas nos andores de baixo, com jardins no frente, têm 
mais espaço à suo disposição do que os moradores dos 
andores de cima. Metade do área destas varandas é 
coberta: em porte por uma proteção de vidro e em parte 
pelo recuo da fachada. Uma vantagem adicional deste 
recuo é que há espaço bastante para uma porta lateral que 
conduz à cozinha adjacente, o que contribui ainda mais 
para integrar os espaços do interior e do exterior. 
A divisória entre as duas varandas adjacentes tem um 
parapeito de 60 centímetros na porte do frente, para que 
os vizinhos possam se comunicar facilmente, se quiserem. 
VINCENT VAN GOGH, "Os COMEDORES DE BATATA", 1885 15121 
Em vez de tomar as regras de dimensão mínima instituídas 
pelos autoridades habitacionais e pelos regulamentos de 
construção, podemos tomar o espaço ocupado pelas 
pessoas sentados em volta de uma mesa como uma espécie 
de unidade. Este tema é freqüentemente tra tado pelos 
pintores, que, com seu olho paro a composição! muitas 
vezes tomam uma unidade como ponto de partido espacial. 
Um lômpada pendurada sobre a mesa define precisamente 
o centro de atenção. A luz que difunde à sua volta faz com 
que as pessoas e seus atributos modelem, juntos, o espaço, 
conduzindo por fi m a uma fusão entre as pessoas e o lugar. 
A maneira como esta "última ceia dos pobres" mostra a 
integração de pessoas e espaço faz dela uma lição de 
arquitetura particularmente instrutiva. 
Uma sala pequena demais para seu objetivo é 
inadequada! assim como um espaço grande demais, 
pois, ainda que se-mostre suficientemente grande para 
conter muita coisa t isso não significa necessariamente 
que seja adequada para deixar as pessoas à vontade. 
Têm de ser como roupas nem apertadas demais a 
ponto de se tornarem desconfortáveis, nem largas 
demais a ponto de atrapalharem os movimentos. 
A maior parte dos arquitetos, quando não são tolhidos 
por regras e regulamentos, tende a criar espaços 
grandes demais em vez de pequenos demais. Tudo é 
tão aberto e espaçoso quanto possível , eliminando as 
objeções usuais e compreensíveis! mas os arquitetos 
não compreendem que podem estar desperdiçando 
possibilidades com seu gesto grandioso, tornando as 
coisas mais impossíveis do que possíveis . Quanto 
maiores são as dimensões, maior Q dificuldade de 
usá-Ias com o máximo de vantagem. Os planejadores 
FORMA CONVID AT IVA 
510 511 
, De Drie Hoven, 
Lar para Idosos 
191 
511 
513 
place C/emenceau, 
Vence, Fronce & 
Rockefeller P/azo, 
Nova York 
Bib/iothêque 
Notiona/e, Paris & 
Ampitheotre, Arles, 
França 
SU SIS 
516 517 
urbanos e os arquitetos não estão tentando 
constantemente, sob pressão política ou não, reservar 
cada vez mais e mais espaços separados para bondes, 
bicicletas e outras formas de trânsito - esse serviço 
resultando no fato de as casas terem de ser ainda 
mais afastadas, como se fossem roupas de criança 
precisando de desaperto? 
Onde quer que haja desperdício de espaço para o 
trânsito, os edifícios se tornam isolados, distantes entre 
si. Isso faz com que seja impossível que o espaço 
urbano evolua organicamente a pa rtir do gabarito dos 
edifícios altos e distantes para crio r, desse modo, certo 
medida de intimidade e reclusão. Esta a tmosfera de 
intimidade existe nos centros antigos de algumas 
cidades, onde não se permite que o trânsito reine 
supremo. E, a menos que ha ja contato e compreensão 
entre os lados opostos da rua (será que a inda se pode 
conversar com todo esse barulha do trânsito?), 
podemos esquecer a possibilidade de funcionamento 
razoável do espaço públíco. 
DE DRIE HOVEN, LAR PARA IDOSOS 15131 
"Em vez da colocação de assentos perto da janela como é 
comum nas alas de hospital, cada dais quartas de dormir 
têm uma sola em comum, no espaço criado pela ampliação 
do corredor. Divisórias baixas de tijolos, cercando os 
assentos fixos, separam o espaço do corredor, isolando-as 
até certo ponto do vaivém de pessoas, ao mesmo tempo em 
192 lIÇÓ ES DE 'RQUI1ETURA 
que oferecem uma visão do que está se passando. 
O arranjo estimula o contato informal entre a equipe do 
hospital , mesmo quando em serviço, e os residentes. 
As pessoas que ficam ali sentadas têm uma visão lateral 
para o corredor. As janelas dos quartos de dormir também 
podem ficar abertas, permitindo algum contato. 
Estes nichos, contrabandeados através da barreira dos 
padrães estritos dos metros quadrados, podem acomodar 
facil mente quatro pessoas (no máximo seis ). É um lugar 
para receber visitas, fazer uma refeição, e freqüentemente 
há uma televisão ou um rádio. A parede dos fundos tem 
tontas prateleiras quantas é possível, oferecendo espaço 
para que as pessoas guardem seus pertences mais 
queridos, para os quais não há lugar no quarto de dormir. 
O tamanho destes espaços e a maneira como são 
mobiliados criam impressão de uma sala de estar básica, 
sob medida para as pessoas que estão morando ali . Se 
fossem mais largas I certamente seriam menos funcionais." [7; I 
O uso que se faz do espaço determina suas proporções 
corretas, e, como as condições a rquitetônicas e 
espaciais de um lugar encorajam certas formas de uso e 
desencorajam outras, os arquitetos têm uma tremenda 
influência, quer quei ram quer não, sobre o que pode 
acontecer e acontecerá num espaço. Suas decisões 
quanto ao tamanho podem, por si próprias, ditar para 
que serve um espaço e para o que não serve. 
Espaços como as arenas já descritas (nas portes A e 
BI, a Rockefeller Plaza, as praças públicas de Veneza, 
e também espaços interiores como o da Bibliothêque 
Nationale em Paris, possuem um tamanho que está 
afinado com o uso em uma série de situações que, 
embora diferentes, assemelham-se por se concentrarem 
em uma atividade comum. Natura lmente, os 
patinadores na Rockefeller Plaza, como os leitores na 
Bibliothêque Nationale, tendem a estar imersos em 
suas próprias atividades, mas, assim como os 
patinadores compartilham um público comum, os 
leitores comparti lham uma atmosfera de concentração 
penetrante. 
Isto se aplica igualmente a espaços amplos e pequenos: 
as dimensões têm de estar à altura do que vai acontecer 
ali (ou inversamente, o que vai acontecer ali tem de 
estar à altura das dimensões). Devemos atentar para 
que as dimensões de espaço, grandes ou pequenas, 
sejam adequadas às funções a que devem servir. 
Fornecer o lugar 
Embora os arquitetos tenham se preocupado sempre 
com o IJl ugar'l, Aldo van Eyck foi o primeiro a formule 
o conceito de foi modo que não se pode ignorá-lo. 
Entre seus muitos textos que li~am com lugar e espaça 
duas afirmações basta nte conhecidos são citadas aqu i. 
"Seio qual for o significado do espaço e do tempo, 
lugar e ocasião significam mais. Pois o espaço na 
imagem do homem é lugar, e o tempo na imagem do 
homem é ocasião." 
"Faça de cada coisa um lugar, faça de cada casa e 
de cada cidade uma porção de lugares, pois uma casa 
é uma cidade minúscula e uma cidade é uma casa 
enorme." 
Aldo von Eyck, 1962 
ESCOlA MONTESSORI, DElFT 151 B·5201 
"Sempre que uma classe de jard im-de-infância é deixada 
por sua própria conta, as crianças tendem a formar 
pequenos grupos, menores do que se poderia esperar; e 
revela-se que esses construtores de castelos e pais e mães 
de mentirinha se sentem mais à vontade nos espaços 
pequenos do que nos grandes. Com isto em mente, parecia 
uma boa idéio criar vários pequenos tanques de areio em 
vez de um só mu ito grande. (Sempreque vemos crianças do 
jardim-de-infância brincando juntas num grupo grande, 
podemos ter certeza de que há um professor por trás, 
monitorando esta atividade comunitária.) 
A escola Montessori em Delh tem um tanque de areia 
dividido em vários pequenos compartimentos - o ideal para 
castelos de areia. Crianças na idade dos castelos de areia 
em geral brincam sozinhas, ou em grupos de duas ou três; 
dific ilmente hó quatro crianças brincando em grupo, e 
cinco ou mais é ainda mais raro ou não acontece nunca. 
Em tanques de areia grandes, os crianças com tendências 
mais expansionistas podem perturbar faci lmente a 
concentração e a intimidade das outros simplesmente 
porque não há demarcação do espaço reivindicado. Por 
isso, nesse caso, o tamanho dos tanques de areia é 
compotivel com seu uso e até o estimula. O tamanho certo é 
formado pelo totalidade das dimensões adequadas 00 uso 
esperado, e, inversamente, um determ inado tamanho 
atrairó o uso poro o qual é mais adequado." 17J 
O tanque de areia como um todo, subdividido em uma 
série de compartimentos paro acomodar da melhor maneira 
possível o uso para o qual foi projetado, oferece um 
exemplo elementar do princípio de articulaçõo. 
Articulação 
O espaço deve sempre ser articulado para criar 
lugares, unidades espaciais cujas dimensões e níveis 
de demarcação possam torná- Ias capazes de 
acomodar o padrão de relações dos que vão usá-Ias. 
A maneira como o espaço é articulado constitui um 
fator decisivo: determinará se o espaço será adequado 
para um grande grupo de pessoas, por exemplo, 
ou para grupos pequenos, separados. 
Quanto mais articulação houver, menor será a unidade 
espacial, e, quanto mais centros de atenção existirem, 
mais o efeito total será individualizante - isto é, muitas 
atividades poderão ser conduzidas ao mesmo tempo 
por grupos separados. 
FORMA CONV IDATIVA 193 
518 
m 
52<1 
521 
A área é a mesma 
em A, B, C e D 
522 5230b 
524 
Toda esta ênfase na articulação de pequenas unidades 
espaciais é muitas vezes interpretada como negligência 
em relação à escala mais ampla, mas isso é um 
equívoco. Um espaço amplo articulado com ousadia 
não desencorajo necessariamente seu uso por um 
D 
único grupo central, ou, inversamente, um espaço 
amplo inarticulado não deixa necessariamente de criar 
as condições para vários u~os 00 mesmo tempo. 
Na verdade, é possível articular um espaço de tal 
modo que seja adequado tanto para o uso 
centralizado como para o uso descentralizado, caso 
em que podemos adotar tanto o conceito de grande 
escala como o conceito de pequena escola, 
dependendo de como queremos interpretar o espaço. 
Mas estamos falando simplesmente do princípio: não é 
preciso dizer que é a natureza da articulação - o seu 
"comprimento de onda", a sua qualidade, isto é, como 
o princípio será posto em prática - que determina o 
potencial do espaço. 
"Devemos articular as coisas para torná-Ias menores, 
isto é, não fa:z.ê-Ias maiores do que o necessário, e 
mais administráveis. E, como a articulação aumenta a 
aplicabilidade, o espaço se expande simultaneamente. 
Portanto, o que fazemos tem de se tornar menor e 
ao mesmo tempo maior; suficientemente pequeno para 
que possa ser usado e suficientemente grande para 
que ofereça o máximo de uso potencial. A articu lação 
conduz, portanto, à "expansão da capacidade" e, 
assim, a um rendimento maior do materia l disponível. 
Necessi ta-se desta maneira de menos material, graças 
à sua maior intensidade. 
-Todas as coisas deveriam receber dimensões corretas, 
e as dimensões corretas são aquelas que as tornam 
tão manuseáveis quanto possível . Se decidirmos parar 
de fazer coisas do tamanho errado, logo se tornará 
claro que quase tudo deve ser feito um pouco menor. 
As coisas só devem ser grandes quando forem 
compostas de um conjunto de unidades pequenas, pois 
dimensões excessivas criam imediatamente distância e 
separação, e, ao insistirem em projetar numa escala 
demasiado ampla, grandiosa e vazia, os arquitetos se 
tornaram produtores em grande escala de distância e 
alienação. A grandeza baseada em multipl icidade 
implica complexidade maior, e esta complexidade 
oumenta o potencial interpretativo graças à maior 
diversidade de relações e à interação dos componentes 
individuais que juntos formam o todo." [4] 
194 LI ÇÕES DE ARQUl lET URA 
EDIFíCIO DE ESCRITÓRIOS CENTRAAl BEHEER )522-527) 
A articulação da espaça fo i a principio sub jacente 
ao projeto do edifício de escritórios Centra0 I Beheer. 
O ponto de partida foi a doutrina de que todo o trabalho, 
assim como toda a atividade recreativa, se desenvolve em 
pequenos grupos, não individualmente nem coletivamente. 
Um estudo da situação demonstrou que os diversos 
componentes do programa podiam ser interpretados como 
espaços, ou lugares, de 3 x 3 metros, ou de seus múltiplos. 
E, como na prática as coisas não têm essa precisão 
numérica, foram levadas em conta as margens necessárias 
para absorver excessos nas áreas de circulação_ Se é 
possivel dizer que este edifício tem potencial não só para 
absorver mudanças internas de longo alcance, como 
também para dar a impressão de que poderia receber 
objetivos diferentes, isto se deve à sua articulação_ Assim, 
por exemplo, quando uma exposição de arte é montada no 
prédio (como âcontece regularmente), o ambiente pode ser 
simples e rapidamente transformado num espaço com as 
qualidades de uma galeria. 
Contudo, o sonho de um espaço construido em harmonia 
com qualquer programa de uso possível não foi 
integralmente realizado aqui , embora parecesse algo ao 
nosso alcance. 
O segredo da articulação de uma variedade de lugares é, 
na verdade, que este sonho jamais poderá ser plenamente 
realizado. Pois o tamanho das unidades espaciais a que 
chamamos lugares está baseado nas necessidades espaciais 
do que poderíamos chamar os padrões de interação social. 
fORMA CONVIDATIVA 195 
525 
526 5'0 
518 
Foyer Vredenburg, 
Centro Musical 
519 530 
lugor 
definjtivo 
lugar 
possível 
Moradia, Amsterdam 
A: original 
8: depois do 
reforma 
o edifício, portanto, pode servir como uma estrutura básica 
apenas para obietivas que se adaptem a ele . A gama de 
possibilidades de um edifício é determinada pela densidade 
de sua estrutura e da articulação dela derivada. Embora 
funcione muito bem como um edifício de escritórios, oferece 
um ambiente bastante insatisfatório para uma festa da 
empresa com toda a equipe, por exemplo. Deste modo, não 
chega a surpreender que para tais eventos se use o espaço 
do saguão do edifício ao lado. Este saguão é parte integral 
do coniunto como um todo e é, portanto, de fácil acesso. 
Pode-se medir um pavimento de acordo com sua 
capacidade para criar lugares, obtendo-se deste modo 
uma impressão do potencial do pavimento para 
acomodar atividades mais ou menos separadas. 
O pavimento tradicional na arquitetura holandesa 
compreende dois quartos interligados, separados por 
armários embutidos com portas corrediças. Ao longo 
dos anos, muitas pessoas decidiram remover estes 
obstáculos para obter um espaço único, amplo. 
Q 
" ,," 
196 lIÇÔES OE ARQUITETURA 
Contudo, descobriram que o novo espaço, maior, era 
não só mais difícil de organizar e mobiliar, mas 
também que o espaço-extra criado pelo novo a rranjo 
mostrava-se desapontador. O velho arran jo articulado 
oferecia mais estímulos poro a criação de lugares e 
também mais diferenciação espacial. Ass im, quando 
a rticulamos um espaço, parece que esta mos criando 
uma área maior. Ao mesmo tempo a IIcapacidade de 
lugar" pode ser incrementado quando os ocupantes 
necessitarem de usos diferenciados. 
REFORMA DE RESIDÉNClA 
A reforma em pequena escala, sem nada de espetacular, de 
uma res idência comum, tinha como obietivo aiustar o andar 
térreo a um uso ma is diferenciado, para que pudesse 
abrigar mais atividades independentes. O plano original de 
pavimento seguia o padrão tradicional de cozinha, sala de 
iantar e sala de estar; depois de ser aiustado auma famil ia 
com ocupações mais diferenciadas, o andar térreo contém 
pelo menos mais três espaços de trabalho, assim como uma 
mesa extra e cadeiras na cozinha. O espaço adicional dos 
cantos esquecidos foi usado para aumentar o número de 
lugares e, deste modo, a capacidade do espaço 
comunitário como um todo, 
A "capacidade de lugar" é uma qualidade da parte do 
pavimento que não é necessária à passagem de um 
lugar poro outro. Um critério decisivo para a 
qualidade da planta de um pavimento é que o espaço 
de pavimento disponivel seja usado da forma mais 
eficiente possível, que não haja mais "espaço" de 
circulação do que o estritamente necessário, i.e., que o 
espaço seja organizado de tal modo que se obtenha a 
máxima capacidade de lugar. É fácil testar a 
capacidade de lugar da planta de um pavimento, 
conferindo quais áreas s,ão essenciais como zonas de 
circulação ou quais áreas serão, com toda 
probabil idade, usadas para esse fim, e 
subseqüentemente estabelecendo quais áreas 
remanescentes atendem às exigências mínimas de um 
"Iugar". Em seguida, deve-se considerar se as 
dimensões dos lugares e o grau de abertura ou de 
fechamento realmente correspondem ao ti po de uso 
que se dará a esses lugares. Avaliando continuamente 
a planta de um pavimento por meio desse 
mapeamento, aumentar a capacidade de lugar de 
nosso espaça torna-se um procedimento conafural. 
QOO 
~ 
~ 
Cl ~ O 
Residêncio V. Horf: 
SÃO PEDRO, ROMA, DESDE lA52 1531·534) 
Quando examinamos uma dos primeiros plantas atribuídas 
o Baldassare Peruzzi', anterior à planto de Michelangelo 
segundo o qual o igreja acabou sendo construído, ficamos 
impressionados com a articulação intricado e imaginativa, 
ainda que o planto não passe de um diagramo. Vemos uma 
série de espaços que produzem um padrão 
surpreendentemenle rico sem que os linhas gerais se 
percam. Parece que eslamos lidando com uma escala 
complelamente diferenle daquela da planla de Michelangelo. 
A parle que seríamos iniciolmenle inclinados a chamar 
espaço principal não difere, em suo arliculação e 
proporções, dos espaços siluados junlo a ele. Como 
conseqüência, não se pode realmenle falar em espaço 
principal ou em espaços seéundários. Nenhuma parle 
isolado domino qualquer oulra. 
A planla conslruída de Michelangelo é, na verdade, 
• 
essencialmente a mesma em princípio, mas as medidas 
foram alleradas. Isso criou proporções diferenles, fazendo 
com que o espaço cenlral se lornasse dominanle. Os oulros 
espaços receberam um papel subordinado e suas 
demarcações foram reduzidas a 101 ponla que se larna 
exlremamenle improvável a idéia de usá· los 
independentemente do espaço principal. A área principal 
parece absorver o resto l e esse efeito sem dúvida seria 
aumentado se levássemos em consideração também O corte, 
comparando a altura da planta de Michelangelo com uma 
outra, imaginária, com a mesma proporção de altura e 
largura da planla de Peruzzi. 
Aqui podemos verificar o que uma mudança de articulação 
faz ao espaço, como algumas mudanças de medida podem 
alterar um espaço a tal ponto que ele perde sua 
capacidade de demarcação no que diz respeito o pequenos 
grupos separados. 
Plentas poro o 
Basílica de São Pedro 
Giu/iono Da Song% 
Perl/ui (à direito) 
Micne/ongefo 
Bromanle (à direita} 
531 532 
533 53' 
• Esta planto foi 
prO'l'Ovelmente 
elaborado em 
colaboração com 
8romonte. As vários 
plantos paro São Pedro 
foram atribuídas o 
arquitetos diferentes, e 
é impossível dizer 
exatamente quem 
projetou determinado 
planto, como mostram 
05 informações de 
diversos fontes. 
Fontes: L Benevolo, 
Storio dello CiIlÓ I 
Norberg Schulz, 
Meoning in Weslern 
Archiledure / Pevsner, 
An Outline of European 
Archilecrure / Von 
Ravesteyn, -De 
doorbroak nocr de SI. 
Pieter te Rome· , in 
Forvm, 1952 
fORMA CO NVIDAlIVA 19'1 
5J5 
Este conceito de capacidade de demarcação ou "qualidade 
de lugar" diz respeito à capacidade variável de um espaço 
de ser convidativo para grupos maiores ou menores, 
dependendo de suas proporções e de sua forma . Isto 
parece estar baseado no equilíbrio exato entre fechamento 
e abertura, intimidade e exterioridade, que assegura a 
existência de focos suficientes nos vários lugares para que 
as pessoas possam se envolver, a ponto de compreenderem 
que éstão juntas num grande todo espacial. 
' Se comparamos as diferentes plantas de São Pedro como 
as plantas atribuidas a Bramante, Peruzzi, da Sangallo e 
Michelangelo, constatamos também que, embora haja 
pouca diferença entre elas no que diz respeito ao princípio, 
existem diferenças bem nítidas quanto à articulação e ao 
grau em que o espaço central é dominante. 
As diferenças entre essas plantas são sutis mas vitais no que 
diz respeito às l/possibil idades" de uso. Assim, as 
proporções do espaço central em relação com o resto na 
planta "oficial" de Bramonte são um pouco diferentes 
daquelas da planta de Peruzzi , tornando o espaço central 
da primeira planto muito mais importante. Além disso, os 
quatra espaços entre as torres e o espaço central - igrejas 
em si mesmas, por assim dizer, cópias em miniatura do 
todo - , que são tão característicos no planta de Peruzzi, 
estão ausentes. Esses espaços se tornaraml por assim dizer, 
um saguão de entrada e, por conseguinte, espaços de 
passagem. Os quatro nárteces semicircula res nas 
extremidades do espaço central também desapareceram 
(irão reaparecer em outra planta atribuída a Bramante). 
Em suma, isto significa uma grande perda na capacidade 
de demarcação para grupos distintos. Deste modo, vemos 
198 LIÇÕES DE ARQUITETURA 
que o qualidade excepcional do plano de Peruzzi deriva 
essencialmente desta inserção de outra mundo espacial 
completo entre as torres e o espaço principal. Além disto 
as proporções estão de tal modo inter-relacionadas que: 
independência de todas os partes e a sua interdependêro = 
mantêm-se em perfeito equilíbrio." 161 
CENTRO MUSICAL VREDENBURG 1535-539) 
Na qualidade de lugar ande as pessoas se reúnem, um 
centro musicol é um domínio excepcional para encontre: 2 
contatos. Espera-se que o edifício seja espacialmente 
organizada de tal modo que ofereça pela menos amplo 
oportunidade para contatos sociais. IE uma questão 
sobretudo de articulação carreta, isto é, da adaptação co,. 
proporções ao padrão de relações entre os usuários e o 
edifício.) Por conseguinte, as dimensões têm de ser 
compatíveis com o tamanho das grupos que as pessoas 
formam naturalmente, em diferentes lugares e situações. 
As pessoãs devem ter liberdade para decidir se querem ;~ 
unir o um grupo ou fi car sozinhas, se querem ser vistm : . 
não, se querem conversar com outros pessoas ou evitá·!c. 
Embora toda a atenção do público concentre-se em um 
evento central que ocorre diante de um grupo único, ac-" 
e depois da apresentação esta massa única se desinteg re 
em muitos pequenos grupos. Em termos espaciais, isto E} 1:-
um grande número de lugares, interl igados mas com cer-: 
grau de separação, bem diferente da situação no auditó' : 
O foto de que um grande número de pessoas usa 00 
mesmo tempo o edifício exige um único e vasto espaço r;_ 
dividido. É apenas no auditório que se necessita de um 
espaço único, não dividido, para acomodar mu itas pess:: 
I" 
I 
I 
I' 
I 
juntos. O arranjo dos assentos consiste em compartimentos 
semelhantes o balcões intercalados com um grande número 
de passagens e escadas que seguem o formo do anfiteatro 
de cimo o baixo; as saídos estão localizados em vários 
pontos, através dos quais os vis itantes são naturalmente 
conduzidos aos loyers em todos os níve is. 
Há um grande número de balcões de bufê nos vários 
andares, para que as pessoas possam ser servidas sem 
demoro durante os intervalos. Além dos escadas no 
auditório, há ligações entre os diferentes níveis e os loyers 
fora do auditório, por meio de pores de escadas 
localizadas simetricamente nos quatro contos do volume 
central. Em vez de umas poucas escadas grandes, optamos 
mais uma vez por várias escadaspequenas suficientemente 
largos poro serem usados por duas ou três pessoas sem 
interromperem o conversa. Ao projetor o área dos layers, 
que envolve o auditório principal como uma película tênue, 
usaram-se 00 máximo as possibilidades oferecidas por 
cada loca l, tais como uma visto paro a praça, paro o 
galeria interno ou, por outro lado, completo isolamento. 
Nos estágios inicia is do planto, parecia que o espaço em 
torno do auditório principal apenas circundaria o auditório 
da maneira convencional. Mas, ao longo do processo, 
transformou-se gradualmente nu ma sucessão de unidades 
espaciais com uma grande variedade de qualidades, em 
que se alternam luz do dia e luz artificial, tetos altos e 
baixos, ocasionalmente côncavos, 9, ao longo do caminhol 
FORMA CONVIDATIVA 199 
5J6 
S37 
538 S39 
5.0 5.1 
nichos com la peça rias e áreas mais largas - ludo 
conlribuindo para a criação de uma rica variedade de 
lugares. Mesmo alguém gue alravesse a passagem mais 
eslreila de um ponlo a oulro percorre uma área gue é bem 
mais do gue uma simples zona de circulação. Os foyers 
possuem vários assentos: informais, como muretas, mas 
lambém assenlos propriamenle dilos como bancos de 
madeiras, acompanhados de mesinhas, ou nichos providos 
de alm9fadas. Onde o foyer se alarga, há grandes mesas 
redondas com codejras em valIa. A diversidade de 
qualidades foi acenluada em alguns lugares com o uso de 
maleriais suaves ao lado dos acabamenlos de madeira: 
lapeçarias de Joosl van Roojen, que dão inlensidade ao 
menor dos cantos. 
Quando se caminha pelo edifleio, o variedade de lugares 
compreende desde canlos reservados, onde se pode ficar 
longe da mullidão, alé lugares que oferecem uma visão 
geral de ludo o que eslá aconlecendo, e áreas de onde se 
avista o inferior do auditório ou a cidade. 
Desse modo, a arliculação aumenla a gama de percepçães 
espaciais. Além disso, o design variegado dessas pequenas 
unidades espaciais conlribui para o capacidade de 
acomodação do lodo, já que as pessoas lendem a se 
dispersar, digamos, no espaço aberlo e indiferenciado de 
um saguão. 151 
o conceito de escala, usado indiscriminadamente para 
denotar tamanho, determina a percepção de um 
espaço ou edifício como muito grande ou muito 
pequeno, isto é, se o espaço é maior ou menor do que 
aquilo a que estamos acostumados. 
Os adjetivos "grande escala" e "pequena escala'" nada 
dizem acerca das medidas efetivos: algumas coisas 
sõo muito grandes e outras muito pequenas 
simplesmente porque precisam ser assim, o que não as 
200 liÇÕ ES DE ARQUITETURA UNIRP 
B1E3LIOT SC A 
S.!\o José do Rio Preto ~ sP. 
torno necessariamente demasiado grandes ou 
demasiado pequenas. 
O aspecto essencial a ter em mente é a articulação -
pois assim a confusão que cerca o conceito de escala 
não mais obscurece nossa visão. 
Consideremos um transatlântico - é uma construção 
em grande escala ou em pequena escala? É claro que 
é uma grande embarcação (embora seja uma mera 
mancha no oceano), e não se adaptaria a uma rua, 
mas, a inda ass im, é composto de um grande número 
de pequenas cabines, cubículos, corredores e escadas 
- todos unidades de dimensões bem menores do que 
suas contrapartidas em terra. 
Designamos como #articulação" a definição rítmica de 
paredes e Fachadas que dá origem a certa 
plasticidade. Este é um tema recorrente ao longo de 
toda a história da arquitetura, e não sem razão, pois é 
o elemento de plasticidade que provou, mais de uma 
vez, ser o meio mais eficaz de expressar as 
características externas de um edifício e de um estilo 
a rquitetônico particular. E, assim como o ritmo na 
música organiza a peça em segmentos, dando~lhe 
assim lucidez, do mesmo modo o elemento rítmico na 
arquitetura torna inteligíveis as distâncias e os 
tamanhos. É bem ma is difícil identiFicar o tamanho dos 
objetos achatados e inarticulados do que o de objetos 
divid idos em unidades com tamanhos que são 
Famil iares e que, ass im, permitem~nos ver o todo como 
a soma das partes. É por isso também que um objeto 
de dimensões muito grandes pode ser reduzido pela 
articulação gráfico a proporções mais facilmente 
apreendidas, que o tornam menos vasto e mais 
perceptível - em outras palavras, menos parecido com 
um monólito. A articulação pode, portanto, servir 
como meio de a umentar a legibilidade e, assim, 
contribuir essencialmente para a percepção do espaço. 
Mas só pode fazê-lo sob uma condição: o que é 
percebido no âmbito gráfica deve corresponder à 
organização espacial sugerida pela imagem total. 
Assim l se o exterior de um edifício indica uma divisão 
em várias unidades espaciais pequenas sem nenhuma 
relação com o arranja interior, como ainda acontece 
freCjüentemente, esse tipo de articulação tem coma 
objetivo apenas ornamenta r a fachada , e, 
conseqüentemente, introduz um elemento sem 
significação plástica. As fachadas históricas de casas 
antigas, 00 serem amalgamados e convertidas em 
hotéis ou escritórios, por exemplo, são reduzidas o 
mera decoração urbana. É apenas quando os 
elementos gráficos e/ ou plásticos na fachada 
referem-se de fato às divisões do espaço interno que 
nos ajudam o compreender como o espaço está 
organizado e que espécie de padrão foi adotado. 
Na arquitetura, todos os meios devem ser usados para 
formar e, conseqüentemente, confirmar o espaço 
fechado de tal modo que ele esteja apto o acomodar 
um padrão social da máxima riqueza e variedade. 
Estátua do Liberdade, 
Nova rorl, '883 / 
Estruturo de aço, 
G. Eiffe/, 
escultor, Bortholdi 
512 5<3 
541 5t5 
Praça de São Ivkr::::~ 
Veneza 
FORMA CONVIDAT IVA 201 
547 
l48 
... .1 
3 VISÃO I 
Devemos procurar sempre o equilíbrio entre visco e 
reclusão, ou sejol buscar uma organização espacial 
que torne qualquer um, em qualquer situação, capaz 
de escolher sua posição em relação aos outros. 
Na seção dedicada à articulação, o conceito de divisão 
recebeu inevitavelmente mais atenção do que o de 
combinação, houve mais ênfase na separação do que 
na unificação. Mesmo assim, a abertura dos diversos 
lugares é tão fundamental quanto sua separação; na 
verdade, os dois são complementares, de modo que 
fechamento e abertura só existem graças um ao outroi 
eles se relacionam dialeticamente, por assim dizer. 
O grau com que os lugares são separados ou abertos 
em re lação aos outros, e a manei ra como isto é feito, 
está nas mãos do arquiteto e, conseqüentemente, 
podemos regular o contato desejado numa situação 
particular para afirmar a intimidade onde ela é 
202 liÇÕ ES DE ARQUIT ETURA 
'-,. 
!. 
\~ 
necessária e, ao mesmo tempo, não restringir 
excessivamente e alcance de visão do "outre". 
Ao introduzir diferenças de nível, aumentamos a gama 
de possibilidades, mas, com níveis diferentes, devemos 
levar em conta que as pessclas que estão ne alto 
olham para as que estão embaixo; as posições, 
j 
portanto, não são iguais, e devemos cuidar para que 
os lide baixo" tenham Q possibilidade de evitar o olhar 
dos que estão "em cima". 
ESCOLA MONTESSORI, DElFT [546·549) 
A idéia sub jacente à diferença de níveis nas salas de aula é 
permitir que algumas crianças pintem ou modelem na seção 
mais baixa da salo, e, 00 mesmo tempo, que as crianças 
na outra seção possam fazer trabalhos que exijam 
concentração sem serem perturbadas pelas outras que estão 
envolvidas em atividades menos árduas. O professor, de pi 
pode fac ilmente supervisionar toda a turma. 
Embora, do ponto de vista do professor como supervisor 
das atividades, fosse melhor colocar os "trabalhadores" na 
seção ma is baixa, isto não fo i feito para que os 
trabalhadores aplicados não ficassem com o sentimento de 
"esfarem por baixol/. Neste caso havia razões adicionais 
para tal arranjo, como localizar a área de lIauto-
expressão" perto do corredor, e também o requisito de 
il uminação direta da seção "normal" da classe pelas 
janelas da fachada. 
ALOJAMENTO PARA ESTUDANTES WEESPERSTRAAT [550·552) 
Obviamente, são as linhas de visão quegovernam uma 
divisão adequada entre as áreas que estimulam o contato 
visual e as que oferecem ma is intimidade; a maneira como 
lidamos com a altura dos espaços, especialmente nos 
espaços com seções elevadas, é, portanto, de importância 
primordial. O patamar espaçoso sobre a escada é mais 
elevado que a seção do restaurante no nível de baixo (esta 
área é hoje usada como uma discoteca), de maneira que as 
pessoas sentadas no parapeito baixo ficam no mesmo nível 
das pessoas que passam pela área do restaurante. Isto 
fac ilita o contato informal. 
FORMA CONVIDATIVA 203 
551l 
551 
551 
559 
SSS j5.\ 
551 158 
\ 
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l - I .!, 
c 
PAVlllON SUISSE, PARIS, 1932 / LE COR8USIER 1553·5581 
O patamar semelhante a uma passagem depois dos seis 
degraus da escada - que faz recuar a escada - fornece um 
espaço de onde se pode ver por cima do parede do solo de 
estar comunitária, e de onde também se pode ser visto. 
Assim, a visão de quem este io subindo ou descendo a 
escada se abre, ao mesmo tempo em que oferece certo 
grau de privacidade aos que estão na sala de estar, 
protegendo-os do olhar dos que eslão enlrando pelo hall. 
SACADAS 
As sacadas são freqüentemente construídas ao longo da 
largura de um edifício, e esta não é uma má idéia do ponto 
de vista do cuslo e do conveniência de construção. Uma 
desvantagem, porém, é que essas sacadas não podem ser 
muito largos porque roubam o luz dos andores que ficam 
embaixo. Embora um apartamento desse tipo num prédio 
204 liÇ ÕES DE ARQUllfTUiA 
desse tipo tenha um número respeitável de metros 
quadrados adicionais na sacada, não há muito o que fazer 
com um espaço tão longo e tão estreito. Se o espaço tivesse 
uma forma diferente - mais para um quadrado, por 
exemplo -, poderia abrigar uma mesa para que várias 
pessoas pudessem fazer uma refeição ao ar livre. O espaço 
quadrado da socada oferece ainda maior isolamento, por 
causa de sua profundidade, e pode também ser 
parcialmente protegido. Além disso, parte da sala de estar 
vem iuntar-se diretamente à fachada exterior, resultando 
assim num espaço cheio de luz. e do qual se pode ver a rua 
sem ter de ir à sacada. 
PAVlllON DE rESPRI] NOUVEAU, PARIS, 1925 / LE COR8USIER 
1560-5641 
Se alguma vez existiu um arquiteto com um olho agudo 
poro este tipo de organização espacial elementar, este 
homem foi Le Corbusier. Em todo o mundo há exemplos de 
como ele, olhando através de lentes diversas, por assim 
dizer, rompeu os velhos clichês e transformou-os em novos 
Hmecanismos espaciais", 
Não podemos esquecer que em seu proieto para o ville 
radieu,e - embora posteriormente repudiado, e não sem 
razão, pela falta de espaço urbano na planta - todas os 
moradias têm galerias abertas, grandes aposentos abertos 
com altura de dois pavimentos. Ele exibiu um exemplo de 
"galeria-socada" no pavi/lon de I'esprit nouveau, construído 
para a Exposição Internacional de Artes Decorativas em 
Paris em 1925 e agora recon,;tru ído em Bolonha, Itália. 
No entanto, quando ele teve de enfrentar as exigências 
práticas de praietar grandes planos habitacionais como o 
Unité, em Marselha, viu-se obrigado, por razões 
financeiras, a recorrer às sacadas estreitas convencionais, 
embora também essas fossem mais estudados e mais 
espaçosos do que é usual hoie em dia. 
"I 
1 
i • 
j-J ' ' " 
i .. : 
fOR MA CON VID ATIVA 
rl , , 
['Unité d'habitatiorl, 
Marseill" 1945/ 
Le Corbusier 
5605ó4 
561 56J 
562 
563566 
Povillon de /'Esprit 
Nouveou, 
reconstruído em 
B%nho, Itália 
20S 
567 
S68 S70 
569 
Usando os princípios elementares da .organização 
espaciat é possível introduzir muitas gradações de 
abertura e isolamento. O grau de isolamento, como o 
grau de abertura, deve ser cuidadosamente dosado, 
para que sejam criadas as condições para uma grande 
variedade de contatos, indo desde Q decisão de 
ignorar os que estão à sua vol ta até o deseio de 
juntar-se a eles f de modo que as pessoas possam, pelo 
menos em termos espaciais, escolher como querem se 
colocar diante dos outros. Também a individualidade 
de todos deve naturalmente ser respeitada tanto 
206 lIÇÕ1S 01 ARQU llfTURA 
quanto possível, e devemos zelar para que o ambiente 
construído não imponha o contato social , mas, ao 
mesmo tempo, jamais imponha a ausência de contato 
social. O arquiteto não é um mero construtor de 
paredes; ele é também um construtor de aberturas que 
oferecem visão. Ambos - paredes e aberturas - são 
cruciais. 
MORADIAS DOCUMENTA URBANA [567·570[ 
Nesta parte da projeta de moradias, o tema do vão de 
escada como "rua vertical" foi combinado com o princípio 
do vara nda como cômodo exterior. As varandas bem 
espaçosas estão justapostas em cada andar de tal modo 
que se projetam alternadamente para a frente e para o 
lado, para que o espaço vertical não seja restringido pela 
varanda do andar de cima. 
Assim estas varondas compreendem uma parte isolada, 
semelhante a uma galeria aberta, e também uma parte 
mais aberta e extrovertida, semelhante a um te rraço, com 
um vão livre vertical de dois andares ou aberta. A parte 
isolada é protegida de um lado por blocos de vidro opacos. 
Este projeto faz com que seja possível sentar'se do lado de 
fora sem ser observado e sem ser obrigado a tomar 
conhecimento dos vizinhos, ou, se for preferível, escolher 
uma posição mais lIexposfall , com uma visão das outras 
varandas e inteiramente à vista delas também. Assim, 
estamos livres para decidir se vamos ficar sozinhos ou 
conversar com os vizinhos - nem que seja só para pedir 
emprestado um pouco de açúcar ou fa zer um comentário a 
respeito do tempo. 
" 
MORADIAS LIMA [SnS79[ 
Os temas que desenvolvemos em Kassel foram retomados 
mais uma vez no projeto de moradias lindenstrasse em 
Berlim J a cidade com as varandas maiores e mais 
intensivamente usadas, onde Hugo Haring projetou suas 
adoráveis varandas espaçosas. O número de unidades de 
moradia era maior no projeto de Berlim do que no de 
Kassel} e as diferentes exigências quanto à situação 
específica resultaram numa variedade de justaposições e 
alinhamentos que exploram ao máxima as diversas 
vantagens da localização. 
Moradia, 
Siemensstadl, Berlim, 
1929·31 / H. Haring 
571 572 
573 
574 575 
fORMA CON VIDAIIVA 207 
.... .:;:...--~ 
576 577 578 
579 
708 lI ÇÓEl DE ARQUITETURA 
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"""" ....... rr:i[ II -1-í 4 
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'Ho.I;II_:_-"i-J) lí-=r T~~p . 
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ESCOLA THAU, BARCELONA, 1972-75 / MARTORELL, BOHIGAS & 
MACKAY {580-583) 
"A escada principal desta escola de vórios andares eleva-se 
ao longo da fachada, dando acesso aos sucessivos andares 
em diversos pontos do edifício: os entradas não estão 
localizadas uma acima da outra verticalmente. Como O 
escada se estende por toda o fachada, o espaço acima é 
ma is alto na base da escada. Como os vórios andares 
abrem-se de frente para as escadas, cada andar tem uma 
vista integral do espaço do lado de fora através do fachada 
de vid ro - e portanto também das pessoas que estão na 
"\ 
~ 
\'" 
escada. O layout de cada andar é claro à primeira vista; 
hó contato constante entre as pessoas que sobem e descem 
os escadas e as que estão paradas (sentadas ou 
debruçado si. Em vez da superposição convencional das 
unidades espaciais, temos aqui um todo unificado, com a 
escada servindo como um meio para unir os andares; é 
uma ilustração de como se pode oferecer suporte espacial 
para o que as crianças das várias turmas têm em comum, 
Aqui , ir e vir se torna umo atividade comunitária cotidiana, 
com uma chance razoóvel para que cada um possa 
entrever um amigo de uma turma di ferente," 19) 
FORMA CONVIDATIVA 209 
581 
582 583 
584 SSS 
586 
sse 
587 
CENTRO MUSICAL VREDENBURG (584·5861 
O coração informal do edificio é o loyer dos artistas. 
É onde os músicos e técnicos se preparampara o 
espetáculo, e também onde se descontraem depois do 
espetáculo, muitas vezes até bem tarde. Este espaço, que é 
usado constantemente, está situado perto dos vestiários, dos 
depósitos e de outras áreas de serviço. Há uma ligação 
visual com a passagem pública acima, de modo que os que 
estão passando por ali podem vislumbrar o que está 
acontecendo nos bastidores no andar de baixo do Centro 
Musical, ao mesmo tempo em que as pessoas no loyer dos 
210 IIÇÓ ES DE ARQUITElURA 
artistas têm apenas de olhar para cima para ver o mundo 
exterior. 
Isto pode ser visto como uma tentativa, em escala limitada, 
de transpor a lacuna entre a vida colidiana na rua e um 
espaço habitualmente comprimido entre as outras áreas de 
serviço nos fundos. 
O importante é chamar a atenção das pessoas que 
trabalham no edificio para os visitantes e vice,versa. Uma 
situação semelhante pode ser encontrada no edificio de 
escritórios Centra0 I Beheer, onde se pode olhar para a área 
de lavagem dos pratos e ver o seu prato sendo limpo, ao 
mesmo tempo em que as pessoas encarregadas da limpeza 
- um trabalho que não é dos mais atraentes - não precisam 
se senlir banidas e excluídas do contalo. [131 
DE OVERlOOP, LAR PARA IDOSOS (587, 588) 
Como De Drie Hoven, o outro proieto de moradia para 
idosos, De Overloop, tem um espaço semelhante a uma 
l/praça de aldeia" no centro em que estão todos os serviços 
comunitários. Neste caso, os moradores podem também 
fazer suas refeições na área central, ou tomar chá ou café 
em vários momentos do dia. Em suma, é onde tudo 
acontece e onde se pode fugi r ao isolamento das unidades 
individuais de moradia. 
Partimos da idéia de que todas as "ruas inferiores" com 
unidades de moradia deviam convergir para o espaço 
central, para que os moradores precisassem apenas andar 
uma pequena distância para chegar lá. E iá que nenhum 
dos andares deveria ser excluído, o espaço cenlrallinha de 
se estender verticalmente até o alto do edificio. O grande 
vão assim criado contém os elevadores com ianelas 
verticais, através das quais os moradores podem ser vistos 
ao entrar ou sair do hall central. Os elevadores são os 
meios de transporte verlical mais usados e';;;geral, mas há 
também escadas. 
Estas escadas estão situadas de maneira diferente em cada 
andar, iá que sua localização é mais determinada pela 
variação do que pela repetição de direção e visibi lidade no 
espaço. Esta caraclerística distingue-as das escadas 
secundárias situadas no fim de cada ala, que seguem o 
princípio normal do vão de escada. 
PARQUE GUEll , BARCELONA, 1900-14 ! A. GAUDí, J. M. JUJOl 
[589-591) 
O sinuoso banco-parapeito de Gaudi, que cerco o terraço 
principal do Parque Guell em Barcelona, curva-se de tal 
modo que nossa visão depende inteiramente do lugar onde 
nos sentamos. Quando o parapeito faz a curva para 
dentro, podemos sentar-nos de frente para os outros num 
semicírculo, e quando a curva é para fora , temos como 
vista a ampla área central , que, embora cercada pelo 
parapeito sinuosa, dá a impressão de ser o exterior. 
O ponto decisivo, isto é, os arcos que marcam a transição 
do côncavo para o convexo, oferecem um posto de 
observação ambíguo. O banco com seu S contínuo constitui 
uma sucessão constante de lugares extrovertidos e 
introvertidos em todas as gradaçães e com encostos 
adequados em toda a sua extensão; visto em sua totalidade, 
ele-incorpora uma ampla gama de qualidades que o 
tornam adequado tanto para um piquenique quanto para 
um momento de relaxamento solitário, contemplar a cena 
do terraço principal à nossa frente, ou esperar por alguém. 
Este banco cansiste numa faixa continua e fasc inante de 
padrões ornamentados de cerâmica colorida (feitos 
provavelmente não apenas por Gaudi, mas também por seu 
discípulo Jujol), uma colagem do século XX avant la leffre. 
Seja qual for a cor de suas roupas, qualquer um que se 
sente aqui é assimilado naturalmente pelo todo mais amplo, 
tornando-se assim parte de uma composição magnifica. 
SOCiOlOGIA DO SENTAR 
Há mu itas situações em que nos enconlramos frenle a frente 
com outras pessoas ou de costas para elas - algo que os 
projetistas dos vários meios de transporte público, tais como 
trens, bondes e ônibus devem levar em conta. Esta 
proximidade com pessoas que, em sua maior parte, são 
completamente desconhecidas pode levar a contalos 
forçados, mas também pode conduzir a encontros mais 
animados, que podem ser muito breves, mas também se 
tornarem duradouros. A forma de organizar os assentos 
nessas situações não difere essencialmente da maneira 
como um arqui teto lida com a organização de um edifício. 
Antigamente, os bondes tinham bancos dos dois lados de 
um corredor largo, de modo que todos se sentavam de 
castas para a janela e de frente para o corredor central; o 
resultado era um espaço comunitária semelhante a uma 
sala de espera, onde se podia ocasionalmente olhar para 
os outros passageiros sem nenhum embaraço. No entanto, 
na maior parte das vezes, o corredor está cheio de 
passageiros em pé que obstruem completamente o visão. 
A maior capacidade de passageiros foi sem dúvida a razão 
principal para esse arran jo, que ainda pode ser encontrado 
nos metrôs de Nova York e Tóquio. Uma vantagem 
adicional é que tanto os passageiros que estão sentados 
quanto os que estão de pé podem se aproximar quando há 
necessidade de abrir espaço poro outros passageiros: o 
forMA CONVIDATIVA 211 
589 590 
591 
592 593 
59< 
595 596 
espaça destinado a cada passageiro não é prescrito, 
depende de uma procura Autuante. Os trens geralmente 
possuem bancos ao longo do vagão para duas ou três 
pessoas, de frente umas para as outras, ou então de costas, 
aos pares. O desenho dos trens tradicionais, com seus 
compartimentos separados, parecidos com pequenas salas 
com portas corrediças de janelas de vidro ao longo de um 
corredor estreito, permite que se escolha os companheiros 
de viagem - pois este admirável arran jo pode implicar 
várias horas em contato estreito com estranhos. Uma vez 
escolhido o lugar, vê-se muito pouco do que acontece no 
resto do trem, a não ser passageiros que entram ou saem de 
seu compartimento ou que passam pelo corredor em busca 
de um assento ou então desembarcando em cada parada. 
Uma vez no compartimento, temos uma visão completa de 
nossos companheiros de viagem, ou então podemos olhar 
pela janela ou para os passageiros no corredor, que 
Weeperstroot, 
Alo;amento para 
estudantes 
212 liÇÕES DE ARQUITETURA 
constitui o único lugar no trem em que se fica de pé. 
05 trens e ônibus modernos, como os aviães, têm filas de 
assentos voltados para a frente, como na sala de aula 
tradicional. Embora fiquemos bem perto dos outros 
passageiros, provavelmente não teremos nenhum contato 
com eles, exceto talvez pelos vizinhas imediatos. 
A crescente popularidade desse tipo de disposição dos 
assentos, em que o contato com outros é virtualmente 
inexistente, reflete uma inequívoca tendência para o 
individualismo também em outros ambientes. O mesmo 
pode ser visto nas plataformas de trem e em outros espaçc; 
púb li cos onde há concentração de pessoas esperando; os 
antiquados bancos compridos foram quase todos 
substituídos por assentos individuais distanciados. 
Estonovo formo de sentar-se lado o lodo, mas com 
separação, numa fi leira, foi inventada paro evitar que os 
usuários sejam perturbados pelos que estão sentados ao 
lado, e para evitar que as pessoas se deitem nos bancos. 
Mas o resultado é que duos pessoas não podem mais 
sentar-se juntas, nem é mais possível ab ri r espaço para 
outros: as distâncias já foram fixadas de antemão e, deste 
modo, o uso do assento deixou de ser flexível. 
lugares usados por muitas pessoas durante um pequeno 
período de tempo, como cafés, balcões, restaurantes, etc., 
são mobiliados com um grande número de mesas ou de 
balcões idênticos, projetados com o objetivo de economizo-
espaço. O resultado é que sempre nos sentamos na 
companhia de seis ou oito pessoas,

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