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LEGISLAÇÃO CIVIL APLICADA II Karina Carvalho Bernardes Efeitos dos contratos Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Analisar os efeitos dos contratos. Explicar o direito de retenção, a exceção de contrato não cumprido e as arras. Definir e explorar vícios redibitórios e evicção. Introdução Neste capítulo, você vai estudar os efeitos dos contratos em relação às partes contratantes, aos terceiros e ao objeto. Você também vai explorar os contratos bilaterais perfeitos e imperfeitos, dos quais derivam o direito de retenção, a exceção do contrato não cumprido, os vícios ocultos (redibitórios), a evicção e as arras, além de aprender os conceitos e as peculiaridades desses institutos. Análise dos efeitos dos contratos O contrato é o resultado de um acordo de vontades que devem ser exter- nadas de forma livre, sem vícios (por exemplo, erro, dolo ou coação). Essa exteriorização pode ser de forma expressa (escrita, verbal ou gestual) ou tácita (decorre de comportamento, como quem recebe um bem em doação e, mesmo sem dizer nada, recolhe o imposto de transmissão). O principal efeito do contrato é a criação de obrigação. Pode ser uma obrigação apenas para uma das partes, como ocorre nos contratos unilate- rais, ou pode ser para ambas as partes, como ocorre nos contratos bilaterais perfeitos e nos imperfeitos — aqueles que na origem são unilaterais, mas que, por alguma circunstância, tornam-se bilaterais. Essa obrigação tem força de lei entre os contratantes. Daí decorre o princípio pacta sunt servanda, que estabelece que os pactos devem ser respeitados. Ou seja, não é permitida a alteração unilateral do contrato, tampouco que uma parte se Legislacao_Civil_Aplicada_II_Book.indb 35 22/05/2018 13:31:16 desobrigue sem o consentimento da outra parte, sob pena de sofrer execução forçada do contrato ou responsabilização em perdas e danos. A obrigação se restringe às partes contratantes, direta ou indiretamente (por mandato ou gestão negocial). Portanto, os contratos são inalteráveis e irretratáveis, ou seja, as partes não podem alterá-lo ou dele se desobrigar, salvo: mediante mútuo consentimento — distrato ou aditamento; houver cláusula expressa prevendo extinção unilateral; resulte da própria natureza da obrigação — por exemplo, fiança, por ser prazo determinado; houver cláusula de arrependimento. O juiz deverá interpretar as cláusulas contratuais como se fossem disposi- tivos legais, de forma que somente poderá deixar de aplicá-las ou modificá-las nas hipóteses de cláusula rebus sic standibus ou por motivo de força maior ou caso fortuito. A cláusula rebus sic standibus, que significa “enquanto as coisas estão assim”, representa a teoria da imprevisão, que diz que, havendo alteração significativa nas condições fáticas do momento da contratação que cause desequilíbrio para um dos contratantes, esse contrato poderá ser alterado ou extinto. A referida teoria só é aplicada quando os novos fatos são extraordinários e imprevisíveis. Quanto à sucessão, é preciso, antes de confirmar se a obrigação lhe alcança ou não, verificar se estamos falando de contrato impessoal ou contrato perso- nalíssimo. O contrato impessoal é aquele em que um terceiro pode executar a obrigação nele constante. Nesse tipo de contrato, a sucessão se obriga até o limite da força da herança, podendo, inclusive, a sucessão receber os créditos. Já o contrato personalíssimo, também conhecido como contrato intuito personae, é aquele em que somente o contratado pode executar a obrigação nele constante, isso porque a contratação só ocorre em razão de qualidades e atributos do contratado, como confiança e qualidade técnica ou artística. No contrato personalíssimo, a obrigação não se transfere aos sucessores, podendo se transformar em perdas e danos, caso já esteja em mora no momento do falecimento. Do contrário, o contrato apenas se extingue. Efeitos dos contratos36 Legislacao_Civil_Aplicada_II_Book.indb 36 22/05/2018 13:31:16 Os efeitos do contrato também podem alcançar terceiro não contratante, em contratos em favor de terceiro. São aqueles contratos em que o estipulante (contratante) convenciona em seu próprio nome, com outra parte (promitente), uma obrigação que será prestada tendo como beneficiário um terceiro; por exemplo, os contratos de seguro de vida ou de plano de saúde com dependente. Já o contrato por terceiro é aquele em que uma pessoa se compromete, por contrato, a conseguir o consentimento de um terceiro, não participante do contrato, para a realização de um ato. Para ilustrar essa modalidade, pense em um contrato em que a produtora se compromete que determinado cantor vai se apresentar na festa de casamento. Os efeitos desse contrato, em princípio, não atingem o terceiro; contudo, se o terceiro aderir à promessa, ficará obrigado e retirará a obrigação do promitente, devedor primário. Assim, conclui-se que o contratado cumprirá a sua obrigação contratual se obtiver a aceitação do terceiro em satisfazer a obrigação final. Importante ressaltar que: se não obtiver o cumprimento da obrigação pelo terceiro, o contratado se sujeita a perdas e danos (art. 439 do Código Civil) (BRASIL, 2002); a aceitação do terceiro desvincula o contratado; a inadimplência do terceiro dá ao contratante o direito da ação contra este; o credor será sempre o mesmo, mas terá ação perante o contratado até a aceitação e, após, perante o terceiro. Já o contrato de pessoa a declarar ocorre quando se obriga um terceiro não participante do contrato. Nesse tipo de contrato, uma das partes (nome- ante) reserva-se ao direito de indicar outra pessoa (nomeado) para adquirir os direitos e assumir as obrigações do contrato. Um exemplo comum do dia a dia é a venda de carros em lojas de veículos, em que fica estipulado que o proprietário passará o veículo para a pessoa indicada pela loja. Vejamos os requisitos: a indicação deverá ser por escrito; a indicação deverá ocorrer em até cinco dias da conclusão do contrato, salvo se outro prazo não houver sido pactuado (art. 468 do Código Civil) (BRASIL, 2002); a indicação deverá revestir-se da mesma forma utilizada pelas partes para a celebração do contrato (art. 468 do Código Civil, parágrafo único) (BRASIL, 2002). 37Efeitos dos contratos Legislacao_Civil_Aplicada_II_Book.indb 37 22/05/2018 13:31:16 Vejamos também as hipóteses em que o contrato terá efeitos apenas em relação aos contratantes originários: se, findo o prazo legal ou convencional, não houver a indicação da pessoa a declarar (art. 470 do Código Civil, I, 1ª parte) (BRASIL, 2002); se o nomeado se recusar a aceitar a nomeação (art. 470 do CC, I, parte final) (BRASIL, 2002); se, no ato da nomeação, a pessoa indicada for insolvente, e o fato for desconhecido no momento da indicação. No que se refere ao objeto do contrato, a eficácia também será relativa, pois os seus efeitos são puramente obrigacionais: dar, fazer e não fazer. O objeto obriga os contratantes ao cumprimento da obrigação, reciprocamente ou não, conforme estipulado no contrato. No Direito brasileiro, o contrato não gera efeito real (translativo de propriedade), o que significa que o contrato por si só não gera direito de propriedade, quando se fala em bens imóveis, necessitando do respectivo registro do imóvel. Nesse sentido, diz-se que a obrigação confere simples direito pessoal, e não real. É importante, contudo, diferenciar bens móveis de bens imóveis. No caso de bens imóveis, a transferência do domínio somente se opera com o registro do título aquisitivo no Cartório de Registro de Imóveis competente (Lei nº. 6015, de 31 de dezembro de 1973, art. 167) (BRASIL, 1973), conforme verifica-se nos arts. 1.245 e 1.267 do Código Civil brasileiro (BRASIL, 2002). Trata-se, no caso, de tradição solene. Já no caso dos bens móveis, a transferência se dá com a tradição, isto é, a entregado bem. Ou seja, ao comprar um imóvel, é preciso fazer o registro da compra e venda no registro de imóveis; ao comprar um bem móvel, basta a entrega do bem para perfectibilizar a compra e venda. Os contratos bilaterais, aqueles que geram obrigações para ambas as partes, acarretam efeitos específicos, não pertencentes aos contratos unilaterais. São efeitos dos contratos sinalagmáticos (bilaterais) o direito de retenção, a exceptio non adimplenti contractus (exceção do contrato não cumprido), os vícios redibitórios, a evicção e as arras. Direito de retenção, exceção de contrato não cumprido, arras Como dito anteriormente, o direito de retenção, a exceção de contrato não cum- prido e as arras são efeitos dos contratos bilaterais. Diante da sua importância Efeitos dos contratos38 Legislacao_Civil_Aplicada_II_Book.indb 38 22/05/2018 13:31:16 e das suas peculiaridades, você estudará cada um separadamente, visando a uma melhor compreensão dos conceitos e das especifi cações de aplicação. Direito de retenção O direito de retenção é um instituto do direito que tem função de garantia, pois visa garantir o cumprimento de uma obrigação por meio da retenção do bem pelo credor, privando, assim, o devedor da posse do bem que lhe pertence até que cumpra a sua obrigação. O direito de retenção possui alguns requisitos: deve ser pautado em obrigação lícita; a conservação do bem retido; caso haja a perda da coisa, junto se perde o direito de retenção; a coisa retida deve ter conexão com o crédito exigível; a inexistência de direito convencional ou legal do direito de retenção. Os efeitos podem transcender as partes, atingindo terceiros; por exemplo, o adquirente da coisa retida, ou os credores, por hipoteca posterior à retenção ou ao débito que lhe deu causa. Em diversas passagens do Código Civil podemos identificar o direito de retenção. No art. 571 do Código Civil, no seu parágrafo único, o direito de retenção pertence ao locatário, que poderá exercê-lo enquanto não ressarcido das perdas e danos, caso lhe seja determinada a devolução da coisa alugada antes do término do contrato (BRASIL, 2002). O locatário também gozará do direito de retenção até o ressarcimento pelas benfeitorias necessárias, que se destinam à conservação do imóvel e à sua não deterioração (por exemplo, manutenção elétrica e hidráulica), ou úteis, isto é, as obras que aumentam ou facilitam o uso do imóvel (por exemplo, construção de garagem ou colocação de portões, telas, etc.), desde que feitas com o expresso consentimento do locador (art. 578 do Código Civil) (BRASIL, 2002). Nos termos do art. 664 do Código Civil, “o mandatário tem direito de reter, do objeto da operação que lhe foi cometida, quanto baste para o pagamento de tudo que lhe for devido em razão das despesas com o mandato” (ver também art. 681 do Código Civil) (BRASIL, 2002, documento on-line). O depositário deve entregar o depósito logo que exigido; contudo, goza do direito de retenção, entre outros casos, se enquadrar-se no que se refere o art. 664 do Código Civil (ver também art. 663 do Código Civil). O comissário terá direito de retenção sobre os bens e valores em seu poder em caráter de 39Efeitos dos contratos Legislacao_Civil_Aplicada_II_Book.indb 39 22/05/2018 13:31:16 reembolso de despesas e depagamento de comissões devidas (art. 708 do Código Civil) (BRASIL, 2002). O transportador, nos termos do art. 742 do Código Civil, terá o direito de retenção da bagagem de passageiros e de outros objetos pessoais quando não receber o pagamento correspondente ao transporte no início ou durante o percurso (BRASIL, 2002). O possuidor de boa-fé terá direito de retenção pelo valor das benfeito- rias necessárias e úteis; já ao possuidor de má-fé não lhe assiste qualquer direito de retenção (arts. 1.219 e 1.220 do Código Civil). (BRASIL, 2002). O credor pignoratício, isto é, aquele que possui direito real (próprio bem dado em garantia) de garantia sobre bem imóvel, tem direito de retenção até que seja indenizado das despesas justificadas, desde que tais despesas não tenham sido ocasionadas por culpa sua (art. 1433 do Código Civil) (BRASIL, 2002). Esses são alguns exemplos que se destacam no Código Civil quanto ao direito de retenção que poderão ser úteis para compelir o devedor ao cumpri- mento da obrigação. Exceção de contrato não cumprido A exceptio non adimplenti contractus, isto é, a exceção do contrato não cum- prido, está prevista nos arts. 476 e 477 do Código Civil (BRASIL, 2002). É uma exceção ao princípio de pacta sunt servanda (os pactos devem ser respeitados) e é aplicável somente aos contratos bilaterais (que constituem obrigação para ambas as partes), pois consiste na defesa daquele que é demandado contra a outra parte do contrato, que lhe exige o cumprimento. O demandado alega que não cumpriu a sua obrigação porque aquele que demanda contra ele não cumpriu com a sua parte/obrigação, nos casos em que a lei ou mesmo o próprio contrato não especifi que a quem deve o cumprimento da prestação primeiro. Caberá ao juiz defi nir. Os contratos que contêm a cláusula solve et repete não admitem a exceção do contrato não cumprido, uma vez que essa cláusula afasta a exceção e torna exigível a prestação de uma parte independentemente do que ocorra com a prestação da outra, seja ela cumprida ou descumprida, total ou parcialmente. Efeitos dos contratos40 Legislacao_Civil_Aplicada_II_Book.indb 40 22/05/2018 13:31:16 Se resultar a procedência da exceção de contrato não cumprido, aquele que a alegou não terá a sua obrigação extinta, apenas estará provisoriamente inexigível. Para a aplicação do instituto, é preciso que as obrigações sejam cumpridas simultaneamente, que sejam recíprocas e interdependentes; ou seja, uma deve ser a causa justificadora da outra. A priori, o instituto da exceção de contrato não cumprido poderia ser im- posto apenas nos contratos à vista; porém, nos termos do art. 477 do Código Civil, nas obrigações que são executadas sucessivamente, pode a parte que deve cumprir a obrigação em primeiro lugar recusar-se a fazê-lo até que a outra satisfaça a obrigação que lhe compete, ou dê garantia suficiente de que conseguirá cumpri-la. Isso ocorre quando, depois de concluído o contrato, sobrevier ao contratante uma diminuição em seu patrimônio capaz de com- prometer ou tornar duvidosa a prestação pela qual se obrigou. Não se aplica quando a falta é da administração pública, já que esta pode opor a exceção a seu favor. Ao particular, cabe pleitear a rescisão do contrato e a condenação do ente público ao pagamento das perdas e danos. O instituto da exceção de contrato não cumprido é de grande importância, visto que traz equilíbrio aos contratos e às partes, servindo de ferramenta contra os abusos. Arras ou sinal Arras é uma palavra de origem semita que passou para o grego, tendo como signifi cado “penhor” ou “garantia”; demonstra intenção. Azevedo (2008) apresenta o conceito de arras elaborado por Silvio Rodrigues: [...] constituem a importância em dinheiro ou a coisa dada por um contratante ao outro, por ocasião da conclusão do contrato, com o escopo de firmar a presunção de acordo final e tornar obrigatório o ajuste; ou ainda, excepcional- mente, com o propósito de assegurar, para cada um dos contratantes, o direito de arrependimento (RODRIGUES, 1955 apud AZEVEDO, 2008, p. 236). Se for dado dinheiro a título de arras, este será incluído no montante da prestação; caso seja entregue bem móvel, este deverá ser restituído, se não for da mesma espécie do objeto principal, caso cumprido o contrato. As arras são uma amostra de que a obrigação será cumprida. Elas não existem isoladamente, ou seja, necessitam de um contrato principal para existir, daí seu caráter assessório. As arras podem ser confirmatórias ou penitenciais. Vejamos: 41Efeitos dos contratos Legislacao_Civil_Aplicada_II_Book.indb 41 22/05/2018 13:31:16 Confirmatórias (arts. 417a 419 do Código Civil) — têm por fun- ção tornar concreta a negociação inicial, tornando-a obrigatória e definitiva. Porém, se quem deu as arras não executar o contrato (não o cumprir), perde-as em favor daquele que as recebeu. Por outro lado, se quem as recebeu não executar o contrato, deverá devolvê-las, acrescidas do equivalente com atualização monetária segundo índices oficiais, juros e honorários de advogado. O art. 419 do Código Civil ainda dispõe que a parte inocente pode, inclusive, pedir indenização suplementar, se provar maior prejuízo, valendo as arras como taxa mínima. Pode, também, exigir a execução do contrato, com as perdas e danos, nesse caso valendo as arras como o mínimo da indenização (BRASIL, 2002). Penitenciais — quando existe a possibilidade de arrependimento do negócio para qualquer dos contratantes. As arras penitenciais são uma exceção prevista no art. 420 do Código Civil, sendo que a cláusula de arrependimento deve estar expressa no contrato. Tem função unicamente indenizatória (BRASIL, 2002). Quem der o sinal e se arrepender da contratação perde em favor de quem as recebeu. Se quem as rece- beu exercer a cláusula de arrependimento, deverá devolver as arras mais o equivalente. Em ambos os casos não será devida indenização suplementar. Azevedo (2008) apresenta os seguintes exemplos relacionados às arras: Você é o adquirente e firma contrato de compra e venda de um bem imóvel com outra pessoa, cujas prestações serão pagas de modo sucessivo. Concluída a ne- gociação, você (comprador) entrega ao vendedor uma importância em dinheiro a título de sinal e princípio de pagamento; aí se tem as arras. Elas são o marco inicial e confirmatório do negócio, que com elas se aperfeiçoa. Agora, suponha que você se arrependeu do negócio, pois achou o imóvel dos seus sonhos em outro bairro mais perto do seu trabalho. No contrato, vocês incluíram expressamente a cláusula de arrependimento, então temos as arras penitenciais. A consequência será a perda do valor entregue a título de sinal em favor de quem o recebeu. Importante salientar que não cabe à outra parte requerer qualquer indenização suplementar. Efeitos dos contratos42 Legislacao_Civil_Aplicada_II_Book.indb 42 22/05/2018 13:31:16 Vícios redibitórios e evicção Vejamos de forma mais detalhada o que são os vícios redibitórios e a evicção. Vícios redibitórios (arts. 441 a 446 do Código Civil) Os vícios redibitórios são os problemas identifi cados nas coisas recebidas em decorrência de contratos comutativos, que tornam a coisa imprópria para uso ou diminuem o seu valor. Os contratos comutativos são contratos de prestações certas e determinadas, nos quais as partes podem antever as vantagens e os sacrifícios, que geralmente se equivalem. São requisitos para configuração do instituo dos vícios redibitórios: prejuízo sensível ao uso ou ao valor das coisas; vício oculto, aquele que é imperceptível pelo adquirente em diligência comum quando da aquisição; o problema deve já ser existente ao tempo da entrega; contrato oneroso (não gratuito) e comutativo (aquele em que as partes sabem de antemão as suas obrigações). O instituto do vício redibitório está previsto no Código Civil, nos arts. 441 a 446; o fundamento é o princípio da garantia quanto à coisa. Fique atento, pois o Código de Defesa do Consumidor (CDC) apresenta algumas diferenças em relação ao Código Civil, uma vez que regula a relação de consumo e, portanto, trata de vício em produto ou serviço (veja os arts. 18 a 27 do CDC). Quando configurado o vício, é possível o ajuizamento de dois tipos de ações, chamadas de ações edilícias: ação redibitória e ação estimatória. O prazo para ajuizamento dessas ações é de 30 dias se for bem móvel e de 1 ano se for bem imóvel, sendo que a contagem do prazo vai se dar a partir: da data da entrega efetiva, quando o adquirente não estava na posse da coisa; da data da alienação, quando o adquirente estava na posse da coisa; nesse caso, porém, existe uma peculiaridade – o prazo fica reduzido à metade; 43Efeitos dos contratos Legislacao_Civil_Aplicada_II_Book.indb 43 22/05/2018 13:31:16 do momento em que o adquirente obteve ciência do vício, porque o vício, além de oculto, só poderá ser percebido mais tarde, dada a sua natureza. Aqui a legislação estipula um prazo máximo para ciência do vício — 180 dias para bem móvel e 1 ano para bem imóvel. Acesse o link a seguir para explorar um quadro comparativo dos vícios redibitórios no Código Civil e no CDC: https://goo.gl/R2fJsE Vejamos as características das ações cabíveis: Ação redibitória — tem como objeto a rescisão do contrato, caso em que são devolvidos os valores pagos mais as despesas do contrato. Importante ressaltar que cabe pedir indenização por perdas e danos se o alienante sabia do vício. Ação estimatória (quanti minoris) — o objetivo aqui é o abatimento do preço diante do vício que desvaloriza o bem. Para entender os prazos para ciência do vício e para ajuizamento da ação, vamos supor que você compre um carro com vício oculto e só venha a perceber 170 dias depois da compra. Ou seja, está dentro do prazo para ciência do vício, que é de 180 dias para tomada de ciência do problema, quando bens móveis. Em seguida, inicia o segundo prazo, o da garantia para ingressar com uma das ações mencionadas; no caso, por se tratar de bem móvel, esse prazo é de 30 dias. Contudo, se você só teve ciência do vício 190 dias após a aquisição, você perdeu o prazo de ciência, prejudicando o seu direito. Nesse caso, o prazo para ajuizamento de uma das ações nem começa a contar. Efeitos dos contratos44 Legislacao_Civil_Aplicada_II_Book.indb 44 22/05/2018 13:31:17 Evicção (arts. 447 a 457 do Código Civil) Na evicção, ocorre a perda da coisa adquirida onerosamente em virtude de decisão judicial ou administrativa, por fato anterior à aquisição. O exemplo clássico de evicção é a aquisição onerosa de um bem de quem não é o dono, vindo a perder a coisa por ação movida pelo verdadeiro proprietário. Quando falamos de evicção, surge a figura de três personagens: o alienante (aquele que transferiu o direito sobre a coisa, mas não era o proprietário), o evicto (aquele que adquiriu o direito sobre a coisa, mas foi vencido na ação movida pelo verdadeiro titular do direito) e o evictor, ou evencente (aquele que venceu a demanda contra o adquirente/evicto porque era o verdadeiro proprietário/titular dos direitos sobre a coisa). O instituto da evicção é aplicado tanto na perda da posse como na perda do domínio (propriedade), e pode ser total ou parcial. O contrato deve ser oneroso, e a evicção pode ocorrer mesmo na aquisição por hasta pública. Ocorrendo a evicção (perda total ou parcial do bem), o evicto pode ajuizar ação contra o alienante tendo como garantias: a devolução integral do preço ou das quantias pagas (valor da coisa na época que se evenceu); indenização dos frutos que porventura foi obrigado a restituir; indenização pelas despesas do contrato e decorrentes da evicção (por exemplo, escritura pública, registro e pagamento de imposto de transmissão, assim como eventual ocorrência de correção monetária ou juros); ressarcimentos por custas judiciais e honorários de advogados pelo evicto constituído; pagamento das benfeitorias necessárias ou úteis que foram feitas, se não abonadas pelo reivindicante. Se a evicção for parcial, mas considerável (perda de 70% do bem, por exemplo), o evicto tem duas opções: pedir restituição da parte do preço cor- respondente ao desfalque ou pedir a rescisão do contrato com a devolução total do valor pago (art. 455 do Código Civil) (BRASIL, 2002). 45Efeitos dos contratos Legislacao_Civil_Aplicada_II_Book.indb 45 22/05/2018 13:31:17 O alienante não responderá se o direito do evictor sobre o bem só se der após a transferência ao adquirente. O adquirente, para exercer o direito que lhe resulta da evicção, deverá notificar do litígio o alienanteimediatamente após a ação. Essa notificação se externiza pela via da denunciação da lide (veja art. 70, I, do Código de Processo Civil). Existe possibilidade de alteração das garantias (art. 488 do Código Civil): ao contratar, podem as partes reforçar, diminuir ou excluir a responsabilização pela evicção (BRASIL, 2002). Podem convencionar, inclusive, que em caso de evicção, além do direito à devolução do valor pago, o evicto terá direito a um acréscimo de 50% sobre o valor a ser devolvido. Por outro lado, podem diminuir ou excluir, estipulando que, em caso de evicção, o evicto não terá direito à devolução do preço por inteiro (diminuição) ou do valor total pago (exclusão). Contudo, o art. 499 do Código Civil garante que, mesmo havendo a cláusula de exclusão da responsabilidade, o evicto tem direito a receber o valor do preço pago. Assim, na lei constam dois tipos de exclusão da responsabilidade pela evicção: a parcial e a total. Exclusão parcial: permanece o direito de receber o valor pago pelo bem, mesmo com cláusula que exclui a garantia (cláusula genérica de exclusão da responsabilidade; por exemplo, fica excluída a garantia que decorre da evicção), visando garantir o princípio do não enriquecimento sem causa. Contudo, não poderá requerer os demais direitos decorrentes da evicção, como indenização pelos frutos, despesas, benfeitorias, entre outros. Exclusão total: ocorre quando presentes três requisitos: a) cláusula de exclusão de garantia (exemplo acima); b) o evicto tenha ciência do risco da evicção, ou seja, ciência do risco de perda da coisa (saiba da ação judicial em trâmite); c) o evicto/adquirente assume o risco da coisa, sendo que a ciência e a assunção do risco não precisam necessariamente estar expressas na cláusula, podendo ser comprovadas de outra forma (testemunha, e-mail, etc.). Chama-se cláusula específica de exclusão de garantia. Efeitos dos contratos46 Legislacao_Civil_Aplicada_II_Book.indb 46 22/05/2018 13:31:17 AZEVEDO, A. V. Teoria geral das obrigações e responsabilidade civil. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2008. BRASIL. Lei nº. 6.015, de 31 de dezembro de 1973. Dispõe sobre os registros públicos, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/ L6015original.htm>. Acesso em: 8 maio 2018. BRASIL. Lei nº. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm>. Acesso em: 8 maio 2018. Efeitos dos contratos47 Legislacao_Civil_Aplicada_II_Book.indb 48 22/05/2018 13:31:18 Leituras recomendadas BITTAR, C. A. Curso de Direito Civil. São Paulo: Forense Universitária, 1994. t. 3. DINIZ, M. H. Tratado teórico e prático dos contratos. São Paulo: Saraiva, 2002. GARCIA, W. Super revisão: doutrina para concurso e OAB. São Paulo: Foco. 2012. GOMES, O. Contratos. Rio de Janeiro: Forense, 1997. LISBOA, R. S. Manual de Direito Civil: contratos e declarações unilaterais: teoria geral e espécies. 3. ed. São Paulo: RT, 2005. v. 3. NYMBERG, P. O direito de retenção sobre coisa alheia móvel beneficiada. Disponível em: <https://dotti.adv.br/o-direito-de-retencao-sobre-coisa-alheia-movel-beneficiada- -patricia-nymberg/>. Acesso em: 8 maio 2018. RODRIGUES, S. Direito Civil. São Paulo: Saraiva, 2001. v. 3. VENOSA, S. de S. Direito Civil: contratos em espécie. 9. ed. São Paulo: Atlas, 2009. Leituras recomendadas BITTAR, C. A. Curso de Direito Civil. São Paulo: Forense Universitária, 1994. t. 3. DINIZ, M. H. Tratado teórico e prático dos contratos. São Paulo: Saraiva, 2002. GARCIA, W. Super revisão: doutrina para concurso e OAB. São Paulo: Foco. 2012. GOMES, O. Contratos. Rio de Janeiro: Forense, 1997. LISBOA, R. S. Manual de Direito Civil: contratos e declarações unilaterais: teoria geral e espécies. 3. ed. São Paulo: RT, 2005. v. 3. NYMBERG, P. O direito de retenção sobre coisa alheia móvel beneficiada. Disponível em: <https://dotti.adv.br/o-direito-de-retencao-sobre-coisa-alheia-movel-beneficiada- -patricia-nymberg/>. Acesso em: 8 maio 2018. RODRIGUES, S. Direito Civil. São Paulo: Saraiva, 2001. v. 3. VENOSA, S. de S. Direito Civil: contratos em espécie. 9. ed. São Paulo: Atlas, 2009. 49Efeitos dos contratos Legislacao_Civil_Aplicada_II_Book.indb 49 22/05/2018 13:31:18 Encerra aqui o trecho do livro disponibilizado para esta Unidade de Aprendizagem. Na Biblioteca Virtual da Instituição, você encontra a obra na íntegra. Conteúdo:
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