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DA TORTURA NAS SOCIEDADES PRIMITIVAS

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DA TORTURA NAS SOCIEDADES PRIMITIVAS
1. A lei, a escrita
O advento da escrita e a lei tem uma relação muito intrínseca. A apresentação do código escrito, e o ensinamento do mesmo, favoreceu a concepção e divulgação da Lei positivada no território proclamado. Uma dá suporte a outra; e conhecer a escrita e a leitura, impede a declaração de desconhecimento, a não ser que comprovadamente voluntário, da norma favorecendo a preconcepção de sua dureza. Dura lex, sed lex. 
2. O código, o corpo
Nesse ponto, é apresentado o conto “Na colônia penal” de Kafka, que ilustra uma fantasiosa ficção, que facilmente poderia ser relacionada, em uma metáfora, ao nosso conceito atual de sistema penal. 
No conto, um explorador estrangeiro ao chegar na colônia penal recebe um visita guiada por um dos oficiais que lhe mostrará o funcionamento da máquina, que consiste em uma cama na qual o condenado é preso e por meio das engrenagens e agulhas, a sentença é talhada e escrita ao corpo do detido. A narrativa continua mostrando a forma como o veredito e a aplicação, mostra-se mais importante que a deliberação da culpabilidade. O oficial que direciona a visita aparenta-se um entusiasta da máquina enquanto o visitante só visualiza e exprime as barbáries que ele enxerga nesse sistema. O plot da história vem da forma de o oficial posicionar-se no lugar do sentenciado, após recalibrar as engrenagens, e ao invés de uma condenação ser escrita em suas costas o homem é golpeado initerruptamente pelo objeto. As interpretações assumidas vão muito de encontro com a imaginação de cada um, mas algo que pode ser retirado e que é muito contemplado é a configuração do sistema penal atual que foca na punição em vez de uma ressocialização do réu, mostrando o caráter duro que a lei pode ter. 
A presença do conto de Kafka no texto de Clastres, é com o propósito de salientar como a lei escrita encontra formas e espaços inesperados para aparecer e impor-se. Bem como acontece na declaração de Martchenko, sobre a sua estadia como preso de guerra pela URSS, que utilizavam de tatuagens como marcação e punições degradantes.
3. O corpo, o rito
Os ritos de passagem são tradições muito comuns em diversas comunidades, principalmente as mais resguardadas, primitivas ou tradicionais, mesmo que não seja um pré-requisito único as tais. Esses costumes estão muito atrelados a evolução do indivíduo naquela sociedade, como sua passagem e estabelecimento na vida adulta, e muitas vezes essas iniciações utilizam do corpo como intermediário e exteriorizador. 
O corpo é muito utilizado devido sua proximidade e intimidade com o sujeito e com o segredo a ele partilhado por meio do rito; é como uma forma de lembrete pessoal da aquisição e mediação dessa sabedoria adquirida.
4. O rito, a tortura
É comum em muitas sociedades primitivas, ter uma prova tortuosa como rito de passagem entre uma fase e outra da vida de seu membro. Como exposto no texto na visão de George Caitlin, que acompanhou algumas tribos em seus rituais, em vista de desenhar os acontecimentos, e demonstra sua própria repulsa e incompreensão de o porquê tais manifestações requereriam o uso de instrumentos e práticas de tortura, como um jejum intermitente e noites insones seguidos de provas físicas intensas. 
Toda via, se limitarmos a perspectiva ao nosso ponto de vista, retirando todo o apelo cultural que ele impõe da tribo, estaremos reduzindo sua significação a nossa visão individual de fora do contexto, e com isso perdendo relevância e valor.
5. A tortura, a memória
O motivo do rito de iniciação é fixar na pele o jovem que está passando de um momento de sua vida para o outro. No entanto a razão de muitas vezes esses rituais serem violentos e/ou sangrentos, também, é para fazer lembrar, e por isso fazem da maneira mais exaurida o possível para que marque carne e a memória do iniciando, para que não esqueça o combinado e o segredo que tem para com a tribo.
6. A memória, a lei
Em sociedades primitivas, é comum e corriqueiro a passagem da lei através da oralidade e pedagogia, bem como acontece durante os rituais de passagem, onde o silêncio é visto como o consentimento daquela lei. O ato de marcar no corpo dos jovens vem da ideia de demarca-los como pertencentes ao grupo. A sociedade dita a lei aos seus membros, e as escreve em seus corpos.
No Brasil do século XVI, era comum a associar os indígenas como pessoas sem fé, sem lei e sem rei, no entanto isso é uma falácia. Além de negar toda a tradição e costumes dos povos nativos ao dizer isso, tem-se a visão de que a lei dura seria a única verdadeira ou com condição e patamar de uma, seja pela constituição de um rol escrito ou a pela concepção de poder do soberano.

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