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FABIANO FAGUNDES LUTO NO VIRTUAL: verificação da relação entre as fases do luto e a extinção operante a partir da vivência compartilhada em uma rede social virtual Palmas – TO 2012 12 FABIANO FAGUNDES LUTO NO VIRTUAL: VERIFICAÇÃO DA RELAÇÃO ENTRE AS FASES DO LUTO E A EXTINÇÃO OPERANTE A PARTIR DA VIVÊNCIA COMPARTILHADA EM UMA REDE SOCIAL VIRTUAL Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) elaborado e apresentado como requisito parcial para obtenção do título de Psicólogo pelo Centro Universitário Luterano de Palmas (CEULP/ULBRA). Orientadora: Profª. Dra. Ana Beatriz Dupré Silva Palmas – TO 2012 13 Ficha catalográfica elaborada pela Bibliotecária – Maria Madalena Camargo – CRB8/298 Fagundes, Fabiano F156l Luto no virtual: verificação da relação entre as fases do luto e a extinção operante a partir da vivência compartilhada em uma rede social virtual / Fabiano Fagundes. – Palmas, 2012 61fls.; 29cm Orientação: Profª. Dra. Ana Beatriz Dupré Silva TCC (Trabalho de Conclusão de Curso). Psicologia - Centro Universitário Luterano de Palmas. 2012 1. Análise de contingências. 2. Luto. 3. Redes sociais virtuais. I. Título II. Psicologia. CDU: 159.9.072 14 15 Ao Cravo e à Rosa 16 AGRADECIMENTOS Agradeço à professora Ana Beatriz, pela orientação valiosíssima e pelo apoio que me deu em tantos momentos difíceis. Agradeço também às professoras Irenides e Lauriane, pela participação em minha banca junto com a professora Ana Beatriz. A vocês três meu muito obrigado pelas palavras, pelas contribuições. Obrigado por aquele gesto milimétrico de aprovação, de apoio, de carinho que vocês deixavam escapar ali da banca (ou será que eu estava percebendo demais?) e que me empurravam pra frente. E obrigado pelas orientações que foram muito importantes para chegar a este resultado. Agradeço, de forma muito especial, a Cristina e a Parcilene que, passando pelo mesmo processo, não me deixaram desistir quando a coisa ficou feia (e como ficou). Só cheguei aqui por culpa de vocês! Vocês sabem disso! Obrigado a Madianita pelo apoio sempre presente ali na mesa ao lado, pela paciência e palavras de estímulo (e pelas barras de cereais). Obrigado aos professores de Sistemas pela paciência comigo nestes dias, não é mesmo Fernando, Jackson e Edeilson? E, é claro, obrigado a Diemy e a Kelen, pela torcida silenciosa nos momentos em que sabiam que o silêncio era a melhor ajuda. Muito, muito obrigado mesmo, Deley, Pierre e Pedro por inventarem coisas pra não me deixar pra baixo enquanto estava enfrentando este tema particularmente tão difícil. Só eu sei a paciência que cada um de vocês teve comigo, de diferentes formas, em diferentes momentos. Valeu o apoio, pessoal da Psicologia, alunos e professores, de hoje e de ontem, que me acompanharam nesta jornada. E obrigadão aos alunos de Sistemas e de Computação que, na maior parte das vezes sem saber, foram peças de resistência em momentos de muita dificuldade. Dar aulas para vocês, felizmente, é algo que sempre ajuda a recarregar as baterias. Ao meu pai, a minha mãe, aos meus irmãos, pela presença e pela ausência. Não sei qual foi mais importante ou mais sofrida nestes dias. Mas com certeza, a ausência se fez presente, e a presença se fez ausente, e tudo isso apareceu, de alguma forma, aqui, neste trabalho. 17 “A morte não é nada Eu somente passei Para o outro lado do caminho. Eu sou eu, vocês são vocês. O que eu era para vocês, Eu continuarei sendo. Me deem o nome Que vocês sempre me deram, Falem comigo, Como vcs sempre fizeram Vocês continuam vivendo No mundo das criaturas, Eu estou vivendo No mundo do Criador. Não utilizem um tom solene Ou triste, continuem a rir Daquilo que nos fazia rir juntos. Rezem, sorriam, pensem em mim. Rezem por mim. Que meu nome seja pronunciado Como sempre foi, Sem ênfase de nenhum tipo. Sem nenhum traço de sombra ou tristeza. A vida significa tudo O que ela sempre significou, O fio não foi cortado. Por que eu estaria fora De seus pensamentos, Agora que estou apenas fora De suas vistas? Eu não estou longe, Apenas estou Do outro lado do caminho... Você que aí ficou, siga em frente, A vida continua, linda e bela Como sempre foi.” (Texto no Orkut da Lembrança da Missa de 1 ano de falecimento do “Cravo”) 18 RESUMO A correria do mundo moderno e as novas regras sociais impostas pela sociedade impossibilitam às pessoas a vivência do luto nas expressões existentes no passado, como a reclusão e a utilização de roupas pretas por um longo período de tempo. Assim, muitas pessoas têm se utilizado da exposição nas redes sociais virtuais como forma de demonstrar o luto por seus entes queridos e, também, obter reforço social e feedback verbal no mesmo meio. Este trabalho direciona-se para a verificação da existência deste paralelo através da análise dos textos representativos da condição de luto conforme dispostos em uma rede social virtual no mural de recados de um sujeito recentemente falecido. Desta forma, busca-se observar, no comportamento verbal ali encontrado, as fases do luto como descritas na literatura, bem como a existência ou não de uma curva de extinção e, assim, verificar a relação entre estes dois conceitos. Palavras-chave: Luto no virtual, redes sociais virtuais, análise de contingências. 19 ABSTRACT The rush of the modern world and the new social rules imposed by society make it impossible for people to experience the existing expressions of grief in the past, such as the use of seclusion and black clothes for a long period of time. So many people have used exposure in virtual social networks as a way to show mourning for their loved ones and also get social reinforcement and verbal feedback in the same way. This work is directed to verify the existence of this parallel through the analysis of texts representative of the condition of mourning as arranged in a virtual social network in the message board of a recently deceased subject. Thus, we seek to observe the verbal behavior found there, the stages of grief as described in the literature as well as the existence or not of an extinction curve, and thus verify the relationship between these two concepts. Keywords: Mourning in virtual world, virtual social networks, contingency analysis. 20 LISTA DE FIGURAS FIGURA 1 – Gráfico com a disposição dos dados de maio/07 a abril/08 ..................... 52 FIGURA 2 – Gráfico com a disposição dos dados de maio/08 a maio/09 ..................... 53 FIGURA 3 – Comparação entre frequência de negação e de aceitação ....................... 54 21 LISTA DE TABELAS TABELA 1 – Paralelo entre as fases da curva de extinção com as fases do luto descritas por Kübler-Ross ............................................................................................. 18 TABELA 2 – Contabilização das demonstrações das fases do luto a partir do comportamento verbal de Rosa .................................................................................... 51 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 11 2 REFERENCIAL TEÓRICO...................................................................................... 13 2.1 Análise do Comportamento .............................................................................................. 13 2.1.1 Comportamento e Condicionamento Operante ......................................................... 14 2.1.2 Extinção Operante ..................................................................................................... 15 2.2 Luto ................................................................................................................................... 18 2.2.1 Negação e isolamento ................................................................................................ 19 2.2.2 Raiva .......................................................................................................................... 20 2.2.3 Barganha .................................................................................................................... 21 2.2.4 Depressão .................................................................................................................. 21 2.2.5 Aceitação ................................................................................................................... 22 2.3 Redes Sociais Virtuais ...................................................................................................... 23 2.4 O Luto no Virtual ............................................................................................................. 25 3 METODOLOGIA ...................................................................................................... 27 4 RESULTADOS E DISCUSSÕES ............................................................................ 29 4.1 Transcrição das respostas verbais ..................................................................................... 29 4.2 Separação dos segmentos de comportamentos verbais de interesse ................................. 29 4.3 Inferências ........................................................................................................................ 49 4.4 Análise dos dados ............................................................................................................. 50 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................... 56 REFERÊNCIAS ........................................................................................................... 58 11 1 INTRODUÇÃO A popularização das redes sociais virtuais, como o Orkut e o Facebook, e sua utilização pelos seus usuários como forma de expressar suas emoções, sentimentos, preocupações, ideologias entre outras características, levanta a possibilidade de um psicólogo valer-se destas expressões para acompanhar como se dá o comportamento verbal do paciente neste meio e hipotetizar intervenções. Uma destas expressões, que se encaixa em uma visão de algo obsoleto, antigo, desnecessário, é a expressão do luto, em suas diferentes formas, que aparenta não ter lugar em um mundo em que não se pode perder tempo, em que a roda da vida parece girar cada vez mais rápido, em que modas e modismos ditam a necessidade de se estar coerente, em seu exterior, com o momento e local nos quais a pessoa está presente, e não com o momento particular da vida de quem perdeu alguém muito próximo. A velocidade dos acontecimentos no mundo atual, a necessidade premente de se estar a par de tudo e acompanhar este ritmo veloz e, por vezes, aparentemente inalcançável, o aumento do conjunto de responsabilidades e o fato de muitas delas passarem a ser compartilhadas por todos os membros da família, enfim, aquilo que se costuma chamar de “a loucura do dia a dia”, impossibilitam que muitas expressões de sentimento sejam plenamente vivenciadas. Muitas destas são deixadas de lado, ou em segundo plano, às vezes por serem vistas como fora de moda, obsoletas e até mesmo desnecessárias de serem expostas no momento social atual. Apesar deste ritmo frenético, ou por causa dele, percebe-se que muitas pessoas passam a utilizar recursos outros que não os tradicionais para expressar sua dor e seu pesar quando vivenciando situações de luto. Um destes recursos, alvo de estudo deste projeto, é a divulgação e compartilhamento de emoções nas redes sociais virtuais. A composição do texto e a frequência com que se dá a exposição dos sentimentos pelos usuários desta rede, no que tange à vivência do luto, podem denotar um modelo de comportamento que busca um reforço permanente. Na inexistência ou diminuição de reforçadores, pode haver a diminuição também desta exposição, em um possível processo de extinção do comportamento operante. 12 Bravin (2010, online) descreve um paralelo entre as fases da curva de extinção e as fases do luto descritas por Kübler-Ross (2008) conforme apresentado por Paul Andronis (2006) em uma palestra da Associação Brasileira de Psicologia e Medicina comportamental (ABPMC) em 2006. Este trabalho direciona-se para a verificação da existência deste paralelo através da análise dos textos representativos da condição de luto conforme dispostos em uma rede social virtual no mural de recados da pessoa recentemente falecida. Desta forma, buscou-se observar no comportamento verbal ali encontrado as fases do luto, como descritas na literatura, bem como a existência ou não de uma curva de extinção e, assim, verificar a relação entre estes dois conceitos. Este trabalho parte da premissa de que é possível utilizar a auto exposição realizada por um cliente nas redes sociais virtuais como forma de acompanhar seu comportamento verbal em relação à vivência das etapas do processo do luto considerando o estabelecimento de uma curva de extinção. A partir desta observação, foi possível identificar uma forma de utilizar o comportamento verbal expresso nos comentários em uma rede social como instrumento de apoio ao psicólogo em sua atuação junto a um paciente que tenha o hábito de utilizar tais recursos. Assim, busca-se, ao analisar a vivência do luto por um sujeito em uma rede social virtual, através do seu discurso, se é possível definir a viabilidade de utilizá-la como instrumento de apoio à terapia comportamental, de forma que facilite ao psicólogo organizar e planejar suas intervenções. Para isso, este trabalho objetiva verificar a viabilidade de o psicólogo utilizar a auto exposição realizada por um cliente nas redes sociais virtuais como forma de acompanhar seu comportamento verbal e os reforçadores obtidos para assim auxiliá-lo na organização e planejamento de suas intervenções. Isso se dá a partir do estudo e organização das fases/etapas do luto e estágios de tristeza pela perda de um ente querido, conforme apresentados na literatura e o estabelecimento da relação desta organização às fases da curva de extinção. Na sequência, acompanha-se o discurso de um usuário de rede social virtual exposto no scrapbook (mural de recados) de um ente falecido verificando se segue a relação luto-curva de extinção estabelecida. Para isso, são verificados também os reforçadores obtidos a partir do discurso do usuário da rede e como se dá a extinção frente a estes reforçadores, bem como os meios e as formas de intervenção possíveis de serem realizadas em um processo terapêutico a partir deste acompanhamento. 13 2 REFERENCIAL TEÓRICO 2.1 Análise do Comportamento O Behaviorismo consiste em um conjunto de teorias psicológicas que estudam, a princípio, o comportamento dos organismos. “Assim como o ambiente pode ser analisado em diferentes níveis, o comportamento pode ser entendido em diferentes graus de complexidade” (TODOROV, 2007, p. 59). O termo Behaviorismo foi apresentado por J. B. Watson, em um manifesto publicado em 1913. Desde então, essa teoria foisendo modificada por vários cientistas, onde se inclui Burrhus Frederic Skinner que, em 1945, utilizou o termo Behaviorismo Radical para diferenciar sua linha de pensamento da teoria de Watson, a qual chamou de Behaviorismo Metodológico para diferenciação (CARRARA, 2005). Teixeira Jr. e Souza (2006, p. 22) descrevem o Behaviorismo Radical como “a filosofia da ciência que tem como objetivo o estudo de todos os comportamentos, negando radicalmente a existência de quaisquer eventos metafísicos no controle dos mesmos”. Segundo Moreira e Medeiros (2007, p. 217), “para Skinner os eventos compreendem estímulos antecedentes, respostas e consequências que, quando são observáveis por mais de uma pessoa ao mesmo tempo, são chamados de públicos”. A Análise do Comportamento é uma abordagem psicológica que busca compreender o ser humano a partir da sua relação com o ambiente e vai buscar na filosofia Behaviorista Radical seu objeto de estudo, os conceitos que dão embasamento para o estudo do comportamento humano a partir da sua interação com o ambiente. Em relação ao papel do ambiente no estudo dos comportamentos, Skinner (1982, p. 17) coloca que é tão fácil observar sentimentos e estados mentais, num momento e num lugar, que fazem parecer sejam elas as causas, que não nos sentimos inclinados a prosseguir na investigação. Uma vez porém, que se começa a estudar o ambiente, sua importância não pode mais ser negada. Moreira e Medeiros (2007, p. 213) destacam que o conceito de ambiente, na Análise do Comportamento, refere-se ao mundo físico, ao mundo social, à nossa história de vida e à nossa interação com nós mesmos, ou seja, tudo que nos afeta de algum modo. Assim, a Análise do Comportamento busca identificar como os indivíduos reagem com o ambiente, em uma estrutura condicional que permite definir que as 14 consequências que um determinado comportamento produziu no passado influenciam na sua ocorrência hoje. De igual forma, considerando o condicional, se for provocada uma alteração nas consequências do comportamento, este terá uma grande probabilidade de ser modificado. Skinner (1990) apresenta que o comportamento humano é produto de três tipos de variação e seleção: seleção natural, “responsável pela evolução da espécie, prepara a espécie somente para um futuro que se assemelhe com o passado que a selecionou”, ou seja, a filogênese; condicionamento operante, em que “o comportamento é reforçado, no sentido de ser fortalecido ou tornado mais provável de ocorrer, por certos tipos de consequências”, ou seja, a ontogênese; evolução de processos, onde “os indivíduos tiram proveito de comportamentos já adquiridos por outras pessoas”, aquilo que podemos chamar de cultura. 2.1.1 Comportamento e Condicionamento Operante O comportamento operante é descrito por Moreira e Medeiros (2007) como aquele comportamento que produz consequências (modificações no ambiente) e é afetado por elas. O condicionamento operante representa um tipo de aprendizagem que faz referência a comportamentos que são aprendidos em função de suas consequências, em um claro entendimento de que as consequências de nossos comportamentos vão influenciar suas ocorrências futuras. Assim, tem-se o condicionamento operante baseado em três termos: a) uma situação (estímulo antecedente); b) uma resposta (comportamento) e c) uma consequência (estímulo consequente). Quando algumas consequências aumentam a probabilidade de o comportamento acontecer novamente, tem-se o reforço. “Reforço é um tipo de consequência do comportamento que aumenta a probabilidade de um determinado comportamento voltar a ocorrer” (MOREIRA e MEDEIROS, 2007, p. 51), ou seja, a “frequência da resposta que precedeu esta consequência foi aumentada” (DAVIDOFF, 1983, p. 179). Skinner (1953/1998) apresenta o reforço positivo como aquele que ocorre quando são apresentados estímulos que fazem com que a situação se repita, os estímulos reforçadores. Davidoff (1983) descreve que o reforço pode ser positivo sempre que a apresentação de um evento que se segue a um operante aumenta a probabilidade de o operante ocorrer em situações semelhantes. Às vezes um evento 15 considerado desagradável pode funcionar como reforçador positivo, pois como é definido em termos por seus efeitos não há como saber o que poderá funcionar como reforçador positivo (BAUM, 1999). O reforço pode ser negativo sempre que a supressão de um dado evento consequente a um operante aumenta a probabilidade de um operante ocorrer em situação semelhante, ou seja, é o que ocorre quando é removido algo da situação que possibilita que o comportamento se repita, ou seja, ocorrem os estímulos aversivos (SKINNER, 1953/1998, DAVIDOFF, 1983). O reforçador negativo aparece sempre que ocorre a supressão de um evento que aumente a probabilidade de um comportamento se repetir em situações semelhantes, este reforço reforça aqueles operantes que livram os organismos de experiência considerada desagradável e/ou irritante (BAUM, 1999). Tanto no reforço positivo quanto no negativo, o resultado é o aumento da probabilidade de uma resposta acontecer, ou seja, o aumento da frequência de um determinado comportamento. A punição ocorre, segundo Skinner (1953/1998), quando os eventos consequentes ao comportamento tendem a suprimir o comportamento que os produz. A punição, ao contrário do reforço, é o evento que reduzirá a frequência de um comportamento, sendo dividido em punição positiva e negativa. A punição positiva ocorre quando um evento é apresentado e este reduz a frequência do operante em outras situações parecidas. A punição negativa ocorre com a supressão ou adiantamento que reduz a frequência do comportamento em situações semelhantes (BAUM, 1999). Existe também a punição positiva, decorrente da apresentação de uma consequência desagradável após a realização de um comportamento não desejado; e a punição negativa, oriunda da remoção de um evento agradável após a realização de um comportamento não desejado. 2.1.2 Extinção Operante Tem-se a extinção quando, ao ser retirado o reforço para uma dada resposta, o comportamento declina gradualmente em frequência até que passa a ocorrer não mais frequente do que ocorria antes do condicionamento (Davidoff, 1983). Após um comportamento ter sido inserido no repertório do sujeito pode ser retirado através da extinção, que consiste na retirada do reforço para a dada resposta. 16 Com a extinção a frequência do comportamento vai se declinando gradualmente. Desta forma, quando, com a suspensão do reforço há o retorno da frequência do comportamento ao nível operante, tem-se a Extinção Operante, assim explicada por Moreira e Medeiros (2007, p. 51): Quando suspendemos (encerramos) o reforço de um comportamento, verificamos que a probabilidade de esse comportamento ocorrer diminui (retorna ao seu nível operante, isto é, a frequência do comportamento retoma aos níveis de antes de o comportamento ter sido reforçado) (...) Portanto, a suspensão do reforço tem como resultado a gradual diminuição da frequência de ocorrência do comportamento. Tanto a extinção e a punição tendem a diminuir a frequência dos comportamentos, porém, na extinção, o comportamento tende a diminuir de frequência em função da retirada de reforços contingentes à resposta, ou seja, aqueles que são responsáveis pela sua manutenção. Bravin (2008, p. 1, grifos do autor) descreve que o conceito de extinção operante pode ter duas acepções: “para um comportamento reforçado positivamente, enquanto operação, extinção refere-se à suspensão do reforço do responder. Enquanto processo, refere-se à redução no responder que tal operação produz”. Sobre as curvas de extinção, Skinner (1953/1998, p. 69-70) esclarece que “em condições apropriadas curvas regulares podem ser obtidas, nas quais a taxa de resposta declina lentamente” eque “o comportamento durante a extinção é resultado do condicionamento que a precedeu e, nesse sentido, a curva da extinção fornece uma medida adicional do efeito do reforçamento”. Andery e Sério (2007) apresentam três aspectos que devem compor a definição de extinção: uma relação entre resposta e reforço já estabelecida, a quebra desta relação e as alterações no responder produzidas por esta ruptura. Uma extinção estará completa quando a frequência de resposta voltar ao nível operante (MATOS; TOMANARI, 2002). Millenson (1970, p. 104) apresenta o que chama de uma definição completa de extinção: DADA: uma resposta operante previamente fortalecida. PROCEDIMENTO: retirar o reforço do operante. (...) PROCESSO: 1. um declínio gradual um tanto irregular da taxa marcado por aumentos progressivos na freqüência de períodos relativamente longos de não responder. 2. um aumento na variabilidade da forma (topografia) e da magnitude da resposta. 17 3. uma ruptura gradual dos elos ordenados que constituem o comportamento fortalecido. RESULTADO: os processos comportamentais aproximam-se de estados de nível operante como valores limites. Catania (1999) descreve dois critérios que estão sendo adotados para medir a resistência à extinção: o número de respostas emitidas durante a extinção; ou o período de tempo em que respostas são emitidas, sendo necessário estabelecer um critério para definir o que pode ser considerado como extinção. Skinner (1953/1998, p. 70) explica que O comportamento durante a extinção é resultado do condicionamento que a precedeu e, nesse sentido, a curva da extinção fornece uma medida adicional do efeito do reforçamento. (...) A resistência à extinção não pode ser predita a partir da probabilidade da resposta observada em um dado momento. Devemos conhecer a história de reforçamento. Assim, a curva de extinção deve ser observada pois tem relação direta com o condicionamento que a precedeu. Keller e Schoenfeld (1968, p. 71) descrevem que a curva de extinção para uma resposta até então regularmente reforçada (isto é, com um reforçamento para cada emissão) é geralmente, senão sempre, bastante desigual. Começa com uma inclinação maior (frequência de resposta mais alta) do que a inclinação durante o reforçamento regular, em parte porque as respostas não são mais separadas pelo tempo gasto no comer e em parte porque o animal tende a atacar vigorosamente a barra (...). Depois, a curva é marcada por mudanças de frequência que se assemelham a ondas, as quais a distorcem localizadamente, embora ainda permitam traçar uma ‘curva padrão’ que descreve a tendência geral. Esses jorros e depressões da resposta poderiam ser caracterizados em termos emocionais, o paralelo das mais complexas frustrações e agressões vistas no homem. Wood (s.d., online) descreve assim os efeitos de retirar a consequência (reforçadora) do comportamento: a) A frequência da resposta aumenta abruptamente no início da extinção; b) A variabilidade da forma (topografia) da resposta aumenta; c) A ordem de ocorrência das respostas se altera; d) Sensações (respostas) emocionais como as “expectativas frustradas”, raiva, irritação, ansiedade, são produzidas. e) Com o passar do tempo a frequência da resposta começa a declinar de modo irregular até o comportamento ser extinto. Bravin (2010, online) relata que Paul Andronis (2006) apresentou em sua palestra na Reunião da Associação Brasileira de Psicoterapia e Medicina Comportamental (ABPMC) o seguinte paralelo entre as fases da curva de extinção com as fases do luto descritas por Kübler-Ross: 18 Tabela 1: Paralelo entre as fases da curva de extinção com as fases do luto descritas por Kübler-Ross Kübler-Ross Extinção Negação Burst1 Raiva Agressividade Adjuntiva2 Barganha Variabilidade Comportamental Depressão Diminuição da taxa de resposta acompanhada de respondentes Aceitação Retorno ao nível operante No seu comentário, Bravin (2010, online) apresenta, a partir da explanação de Andronis, que: Todas estas cinco etapas acontecem durante a fase de extinção operante. O paralelo é feito pois a Kubler Ross, como psiquiatra psicanalista (salvo engano) pensa o luto como algo subjetivo, o luto quando se recebe um diagnóstico terminal, por exemplo. Neste caso a leitura seria do luto como a retirada de um reforçador crítico para a pessoa (tratando-se de doenças crônicas, coisas relacionadas ao seu estilo de vida, por exemplo) e daí a aproximação com a extinção operante. Estas relações são objeto de estudo deste trabalho a partir da análise do discurso, em uma rede social virtual, de uma mãe enlutada pela perda recente de seu filho. A importância das redes sociais e do luto vivenciado nas mesmas será abordada em seções futuras. 2.2 Luto O luto consiste na tristeza decorrente de uma perda, de uma ausência, de algo ou alguém. O luto advindo da ausência permanente de alguém geralmente causa dor, pesar, sofrimento, raiva, entre outras emoções. Sua elaboração pode acontecer de várias formas, dependendo da idade do enlutado, da cultura, das crenças, da vida social e financeira, de quão repentina foi a perda etc., mas 1 Burst é o “jorro constante de respostas mesmo na ausência da apresentação do reforço” (BRAVIN, 2008, p. 8). 2 Os comportamentos adjuntivos não foram explorados neste trabalho, porém tal termo foi mantido como consta na citação de Bravin sobre a fala de Andronis. 19 frequentemente perpassa pelas etapas de negação e isolamento, raiva, barganha, depressão e aceitação, descritas por Kübler-Ross (2008) em suas observações sobre as reações de pacientes desenganados ou em estado grave perante a morte e o morrer. Markham (2000), tratando sobre a perda em si, após a morte, traça a seguinte progressão: incredulidade ou negação, tristeza, raiva, culpa, medo, aceitação, paz. Lidando com o enfrentamento da morte, ou com a perda de alguém próximo e querido, tem-se uma série de reações que não necessariamente ocorrem em uma determinada ordem lógica, ainda que se possa prever uma certa predisposição para algumas ocorrerem no início e outras predominarem mais ao fim do processo de enlutamento. Neste trabalho, optou-se por utilizar as etapas propostas por Kübler- Ross, com adendos obtidos a partir das referências dos demais autores. 2.2.1 Negação e isolamento Kübler-Ross (2008, p. 43) descreve que “ao tomar conhecimento da fase terminal de sua doença, a maioria (...) reagiu com esta frase: ‘Não, eu não, não pode ser’ ”, em uma clara recusa em aceitar algo que se apresenta como inevitável. No processo de negação estes pacientes elaboravam situações imponderáveis, mas que se mostravam, para eles, extremamente possíveis de ocorrer, como uma eventual troca de exames, erros nos nomes, falha nos procedimentos. De certa forma, apresenta-se como uma necessidade do paciente para que ele não tenha que encarar a morte de forma tão abrupta e prematura. “Há quem diga: ‘Não podemos olhar para o sol o tempo todo, não podemos encarar a morte o tempo todo’ ” (KÜBLER-ROSS, 2008, p. 44). É importante observar que, “comumente, a negação é uma defesa temporária, sendo logo substituída por uma aceitação parcial. A negação assumida nem sempre aumenta a tristeza (...)”(KÜBLER-ROSS, 2008, p. 44). Desta forma, não se deve trabalhar a negação como uma forma de reduzir a tristeza, pois a existência de uma não está diretamente ligada ao incremento da outra. 20 2.2.2 Raiva “Quando não é mais possível manter firme o primeiro estágio de negação, ele é substituído por sentimentos de raiva, de inveja e de ressentimento. Surge, lógica, uma pergunta: ‘Por que eu?’ ” (KÜBLER-ROSS, 2008, p. 55). A raiva se propaga em todas as direções e projeta-se no ambiente, muitas vezes sem razão plausível. Kübler-Ross (2008, p. 56) justificaa raiva que surge nos pacientes: Talvez ficássemos também com raiva se fossem interrompidas tão prematuramente as atividades de nossa vida; se todas as construções que começamos tivessem de ficar inacabadas, esperando que outros a terminassem; se tivéssemos economizado um dinheiro suado para desfrutar mais tarde de alguns anos de descanso e prazer, viajando ou nos dedicando a passatempos prediletos, e, ao final, nos deparássemos com o fato de que “isso não é para mim” O mesmo pode ser entendido, de forma análoga, para quem perdeu um parente, um amigo muito próximo. Como ficam, na cabeça “de quem fica”, as promessas de quem partiu? Como serão os próximos feriados sem aquela pessoa? As datas festivas que virão pela frente? E aquele bem que ele pretendia adquirir? O que fazer com tantos sonhos que se foram junto com ele? De maneira semelhante, vislumbra-se, com raiva, a vida que segue: é alguém que não vai conhecer o neto (que ainda nem planejado está); é a formatura do filho que ele não poderá presenciar; é a viagem de segunda lua-de-mel que nunca se realizará. Independentemente de existir vida em questão, como o neto que poderá nascer, o filho que ainda está vivo e prestes a concluir um curso, a esposa que segue viva; a raiva existe porque ele, que morreu, não estará lá. A raiva pode ser direcionada a muitos elementos. A quem morreu, afinal, “que ousadia ir embora e deixá-lo para enfrentar tudo sozinho!” (MARKHAM, 2000, p. 57). Ou ainda a quem não sofreu como a pessoa enlutada, afinal, por que todos os casais ainda estão juntos, se ela perdeu a pessoa amada? Kübler-Ross (2008, p. 59) ressalta, perante a situação enfrentada, a importância de tolerarmos a raiva, racional ou não, do paciente. (...) Temos de aprender a ouvir os nossos pacientes e até, às vezes, a suportar alguma raiva irracional, sabendo que o alívio proveniente de tê-la externado contribuirá para melhor aceitar as horas finais. 21 Encarar a raiva como algo inevitável, que faz parte do processo, permite que se entenda não o motivo dela acontecer, pois muitas vezes ela ocorre de maneira totalmente ilógica, mas sim a necessidade do paciente ter um momento para extravasar ali suas dores, medos e frustrações. 2.2.3 Barganha A etapa de barganha não é das mais conhecidas justamente por ter, normalmente, uma curta duração. Diz respeito àquela etapa em que o paciente tenta obter, tradicionalmente de uma entidade superior, uma recompensa por seu bom comportamento. “Graças a experiências anteriores, ele sabe que existe uma leve possibilidade de ser recompensado por um bom comportamento e receber um prêmio por serviços especiais” (KÜBLER-ROSS, 2008, p. 88). Quando é o caso de um paciente em estágio terminal, a recompensa se traduziria em um prolongamento da vida, ou a diminuição das dores e demais sofrimentos físicos pelos quais está passando. Quando está relacionada à perda de alguém, a recompensa está mais ligada ao aspecto sobrenatural, onde se deseja (ou até mesmo se afirma) que a pessoa esteja melhor agora do que enquanto estava viva, que esteja “em um lugar melhor”, ou que não esteja sofrendo mais. Kübler-Ross (2008, p. 89) ressalta que, “psicologicamente, as promessas podem estar associadas a uma culpa recôndita” e que, por isso, é importante o ouvir e o acolher nesta etapa, para que se possa entender e buscar, nesta culpa, a forma de melhor amparar o paciente. 2.2.4 Depressão Uma etapa de grande impacto na vida dos sujeitos enlutados é a depressão. É quando “seu alheamento ou estoicismo, sua revolta e raiva cederão lugar a um sentimento de grande perda” (KÜBLER-ROSS, 2008, p. 91). Obviamente, cada pessoa demonstra de sua forma a tristeza perante as perdas ocorridas, especialmente ao se considerar os estímulos recebidos em situações anteriores que tenham alguma semelhança com a que se está vivendo. Entretanto, há de se considerar que, independentemente da forma de expressar seus sentimentos, há ali uma perda, e esta perda provocará alguma reação. 22 Deve-se abrir um espaço, no turbilhão de sentimentos que envolvem uma pessoa enlutada, para verdadeiramente sentir a dor da perda. “A tristeza e o pesar que não são admitidos e vividos de forma plena podem ser perniciosos, física e emocionalmente” (MARKHAM, 2000, p. 14). Markham (2000, p. 14) comenta sobre as pessoas que, envolvidas no luto, lhe perguntam quanto tempo esse período de tristeza dura e quando vai “desaparecer”, ao que ela responde: “Essa pergunta não tem uma resposta única. Na verdade, não tenho certeza de que desapareça realmente algum dia. Mas pode mudar e tornar-se suportável”. 2.2.5 Aceitação A pessoa enlutada, ao atingir aquele estado em que não há depressão nem raiva, em que não há a inveja dos que estão vivos, em que não há a barganha com Deus, passa a viver em um estado de aceitação. Kübler-Ross (2008, p. 118) coloca que não se deve confundir aceitação com felicidade: “É quase uma fuga de sentimentos. É como se a dor tivesse esvanecido, a luta tivesse cessado”. Em seu acompanhamento de pessoas em estado terminal Kübler-Ross (2008, p. 123) verificou que “os pacientes que melhor reagem são aqueles que foram encorajados a extravasar suas raivas, a chorar durante o pesar preparatório, a comunicar seus temores e fantasias a quem puder sentar-se e ouvi-los em silêncio”. Por vezes são criadas estratégias, pelos enlutados, para melhor aceitação da perda de alguém querido. “Por estar sempre alerta, inquieto, preocupado e pronto para encontrar a pessoa perdida, o enlutado dirige sua atenção para as partes do ambiente que estão associadas mais proximamente a essa pessoa” (PARKES, 1998, p. 74). Dada a correria da vida moderna, a distância física e temporal entre as pessoas, entre outros fatores, podem levar as pessoas a vivenciarem seus lutos no mundo virtual, através de participação do seu estado nas redes sociais, o que aqui chamamos de luto no virtual. 23 2.3 Redes Sociais Virtuais A Internet é uma rede de comunicação de dados que interliga computadores em todo o mundo, carregando consigo informações as mais variadas, dos mais diversos interesses. Como uma de suas ferramentas há a World Wide Web (WWW) que apresenta, através de navegadores (os browsers), informações estruturadas através de hipertextos. No ambiente da WWW surgiram inúmeros sistemas que extrapolaram a simples apresentação dos sites de empresas, instituições, lojas etc. Dentre estes sistemas, ressaltem-se as Redes Sociais Virtuais, como o Orkut, o Facebook, entre outros. Estas redes permitem que usuários cadastrem-se (em alguns formatos, como o do Orkut em seu início, por exemplo, o pretendente a novo usuário precisava ser convidado por outro usuário, que já faz parte da rede), convidem para sua “rede de amigos” outros usuários que já estão no sistema ou que ainda estão fora, montem comunidades de discussões sobre os mais variados assuntos, divulguem suas fotos, entre outras dezenas de funcionalidades existentes. As Redes Sociais Virtuais surgiram através da necessidade de possibilitar e facilitar uma comunicação a distância, levando em consideração que as pessoas estão em espaços diferentes, mas já se conhecem, permitindo cultivar ainda mais as amizades no dia-a-dia, além de poder agregar pessoas que são de âmbitos diferentes, oportunizando ao usuário aumentar a sua rede de amigos conhecendo pessoas novas com interesses semelhantes (SILVA et al, 2006). Assim, as Redes Sociais Virtuais oferecem condições para que laços anteriores de amizades se estreitem e que novas amizades surjam. Nestas redes são estabelecidas regras oficiais, do próprio sistema, de convívio, em que determinadas atitudes são proibidas ou não incentivadas, inclusive com possibilidades de punições. Porém, muitas outras regras, não oficiais, acabam sendo criadas pelos usuários atravésdo convívio na rede. Com isso, membros são banidos de comunidades, outros são ignorados, entre outras formas de ação possibilitadas aos usuários. Vale lembrar que um dos pré-requisitos para que um grupo tenha uma escala de valores comum é a existência de uma linguagem que seja perfeitamente compreendida por todos. Para que a cooperação aconteça, parte-se, portanto, da certeza de que os sujeitos se estão fazendo entender com facilidade, e se expressando com clareza e sem ambiguidades (XAVIER et al, 2002, p. 4). 24 A interação entre os membros é o ponto chave destas redes e por isso ela é incentivada através da disposição aos usuários de funcionalidades como: escrever em murais, enviar recados, construir comunidades, criar e participar de listas de discussões, apresentar fotos, comentar as fotos dos amigos, entre outras tarefas. Os grupos participantes de discussões na internet criam maneiras de manifestar-se, chegando, inclusive e de forma intensamente dinâmica, a constituírem uma linguagem que foi construída pelo próprio grupo de conversação conforme suas necessidades de expressão (XAVIER et al, 2002, p. 5). Com o tempo, observa-se que são construídas formas de comunicação próprias, com símbolos, códigos, que são compreendidos por um determinado grupo que possui uma interação maior e que, muitas vezes, dado a característica inerente aos grupos de não serem exclusivos (um membro de um grupo pode participar ativamente de outro), acabam se espalhando por toda a rede. Os avatares, que representam a personificação do usuário na rede, são um exemplo disso. Ao mesmo tempo que podem representar fielmente o usuário, com elementos que o identificam, como uma foto por exemplo, podem também ser uma idealização deste usuário, na criação de um personagem, os chamados fakes. O fato de o grupo dominar uma mesma linguagem lhes permite negociar um acordo sobre a mesma proposição, concordando sobre sua validade ou falsidade, ou pelo menos justificando a diferença de seus pontos de vista (RAMOS, 1996, p. 177). Em um primeiro momento, dada a característica de ser um sistema informatizado, e muitas vezes totalmente novo em sua interface para os olhos do novo membro, há uma demora na adaptação e inclusive na utilização de todo o potencial que a rede oferece. Com o tempo, na medida em que os contatos se estabelecem e as trocas se fazem, pela própria curiosidade do usuário, e em especial pelo compartilhamento de informações entre os membros da rede, as possibilidades que a mesma oferece acabam sendo apreendidas e utilizadas em sua totalidade, num processo permanente de aprendizado. Aqui ainda se pode lembrar que, com o intuito de manterem-se atrativas, estas redes têm constantemente agregadas novas opções de ações, o que leva seus usuários a permanecerem num processo contínuo de assimilação e troca de conhecimentos, sentimentos e emoções. 25 2.4 O Luto no Virtual O luto vivenciado no mundo real e no mundo virtual possuem suas singularidades que merecem ser verificadas, dado que ocorrem em ambientes diferentes. “O comportamento não pode ser entendido isolado do contexto em que ocorre. Não há sentido em uma descrição de comportamento sem referência ao ambiente” (TODOROV, 2007, p. 59). Gurgel et al (2011, p. 10) descrevem que o termo “luto virtual” provavelmente aparece pela primeira vez em um artigo de agosto de 1999 da Newsweek, The Trouble With Virtual Grief: The pain that so many people feel for JFK Jr. should not be confused with the actual suffering of family and friends em que seu autor, Cose Ellis, apresenta a internet como um espaço privilegiado em que todos podem compartilhar e vivenciar em conjunto um processo de luto. O luto virtual pode ser visto de diferentes formas, e por isso faz-se necessário o esclarecimento de como ele será utilizado no contexto deste trabalho. Há o luto virtual observado como a utilização da internet como um local privilegiado em que todos podem se unir em torno de um sentimento generalizado de perda, tradicionalmente alguma personalidade pública cujo falecimento tenha causado uma grande comoção popular. Pode-se considerar também o luto virtual na “morte” de um avatar em uma rede social, quando um perfil desaparece e para de compartilhar seus comentários, sua “vida virtual” (GURGEL et al., 2011, p. 10). Por fim, há o luto virtual que é a demonstração, na internet, do conjunto de sentimentos que envolvem a pessoa naquele momento, seja através de comentários em redes sociais, seja pela utilização de tarjas pretas ou com a palavra luto em seus avatares (imagens ou fotos que utilizam para ilustrar seus perfis nestas redes). Por uma questão semântica, pois consideramos que este luto é real, ainda que vivenciado no mundo virtual, preferimos chamá-lo de luto no virtual e é este o objeto de estudo neste trabalho. Em relação ao luto no virtual, Filipakis et al (2006, p. 17) consideram que “as fases de elaboração são as mesmas, porém, sua forma e intensidade diferem pela utilização do potencial de comunicação destas ferramentas para sua expressão” e levantaram duas hipóteses em relação à influência do luto no virtual na elaboração do próprio luto: 26 “a) esta forma de enfrentamento auxilia no processo de elaboração de cada etapa da perda, por configurar uma forma de socialização e extravasamento dos sentimentos dos enlutados; b) pode haver um prolongamento desnecessário e martirizador de algumas etapas do processo de enlutamento”. Pela primeira hipótese, haveria, pela vivência do luto através das redes sociais e através das respostas obtidas pela socialização na comunidade virtual, a possibilidade de obter os reforços necessários que permitam elaborar cada uma de suas etapas de forma completa. Desta forma, o luto no virtual permitiria uma vivência salutar do luto com resultados positivos para os sujeitos envolvidos. Na segunda hipótese, há a possibilidade de, nas redes sociais, justamente haver um reforço que leve a pessoa a se manter em luto, sem haver um esforço para modificar este estado. 27 3 METODOLOGIA No desenvolvimento deste trabalho foi realizada uma pesquisa bibliográfica- documental que explorou diferentes definições encontradas na literatura dos estágios de luto e tristeza pela perda de entes queridos, permitindo que se optasse por um formato padrão a ser seguido na execução do trabalho. Esta organização será relacionada com a curva de extinção, buscando verificar a relação entre os estágios do luto com o momento em que uma classe de respostas operantes deixa de produzir os reforços que vinha produzindo. Foi definido um sujeito na rede social Orkut em que se observa a vivência de uma relação e luto pela perda de um familiar, no caso o seu filho, com a consequente busca e armazenamento dos comentários expostos no mural de recados. Estes dados são utilizados na análise de frequência dos termos e expressões utilizados, relacionando-os a uma curva de tempo que permite observar se há estabelecimento de uma curva de extinção. A análise de um sujeito na rede social segue o delineamento experimental do Sujeito Único, que busca analisar o sujeito individualmente. “Os delineamentos de Sujeito Único desenvolveram-se da necessidade de determinar se uma manipulação experimental teve efeito num participante individual de uma pesquisa” (COZBY, 2003, p. 245). “Os delineamentos de sujeito único têm como característica principal tratar os sujeitos individualmente, tanto no que se refere às decisões relativas ao próprio delineamento, quanto ao processamento dos dados” (SAMPAIO et al., 2008, p. 154). Assim, foram estudadas as demonstrações deste sujeito na rede social, mais especificamente no mural de recados de seu filho, bem como eventuais respostas de outros sujeitos no mesmo mural, analisando e contabilizando os estímulose respostas verificados. Para isso, foram registradas as interações do sujeito com o mural de recados, bem como as subsequentes participações de outros participantes da rede, especialmente a namorada de seu filho, pois foi a mais presente em sua rede, verificando suas relações com estas interações e o efeito que provocam no sujeito como, por exemplo, aumento do número de interações ou modificação no conteúdo do texto publicado. Os usuários da rede social foram identificados por nomes fictícios para manter o sigilo dos mesmos, tendo sido escolhidos Rosa para a mãe, Dália para a namorada e Cravo para o filho. Os demais usuários, que 28 aparecem ocasionalmente, serão identificados como amigo1, amigo2 e assim sucessivamente. Os textos foram transcritos da forma como foram redigidos pelos seus autores, porém com grifos em negrito de nossa autoria. O período de análise é de maio de 2007 a maio de 2009. Gaetta (s.d., online) descreve a análise de contingências como “um procedimento que envolve a organização e sistematização de dados coletados por observação direta ou através de relato verbal, de modo a compreendê-los em termos de relações entre variáveis interdependentes”. Realizar a análise de contingências através do relato verbal implica reconhecer que o comportamento verbal é modelado e mantido por um meio verbal – por pessoas que respondem de certa maneira ao comportamento por causa das práticas do grupo do qual são membros. Essas práticas e a interação resultante entre o falante e o ouvinte produzem os fenômenos considerados sob a rubrica de comportamento verbal (SKINNER, 1957, p. 226 apud BORLOTI et al., 2008, p. 104). Ainda que não seja objeto alvo deste trabalho realizar uma Análise Comportamental do Discurso (ACD), em sua plenitude, seguiu-se o que Borloti et al. (2008) indicam como o início de um procedimento de ACD para poder relacionar aspectos dos textos registrados no mural de recados com as etapas do luto: • transcrição das respostas verbais: estas vêm dos textos conforme constam no mural de recados; • separação dos segmentos de comportamentos verbais de interesse: foram buscadas palavras e expressões que denotam as fases do luto (Negação e isolamento, Raiva, Barganha, Depressão, Aceitação) • inferir seus operantes essenciais e elos temáticos intraverbais surgidos do encadeamento desses operantes essenciais: relacionamento dos segmentos com os devidos encadeamentos. De posse destes dados, estes foram devidamente contabilizados para permitir a comparação com a curva de extinção conforme proposto. Esta análise foi comparada com a relação luto – curva de extinção, buscando oferecer elementos que permitam a realização da análise de contingências a partir de um comportamento contextualizado. Contingência é uma relação de dependência entre um estímulo, ou uma classe de estímulos, e uma resposta, ou uma classe de respostas. O trabalho realizado será exposto na próxima seção. 29 4 RESULTADOS E DISCUSSÕES 4.1 Transcrição das respostas verbais Dando início a uma análise do discurso, faz-se a transcrição das respostas verbais. Como, neste caso, o discurso encontra-se já transcrito no mural de recados, pode-se passar para as etapas seguintes da análise. Para efeito de arquivamento, os textos dispostos no mural de recados utilizado como fonte de pesquisa foram copiados e armazenados em um arquivo texto. 4.2 Separação dos segmentos de comportamentos verbais de interesse Para realizar esta etapa e a subsequente, parte-se do que Borloti et al (2008, p. 105) citam de Skinner (1957, p. 452) para definir como premissa básica da ACD: “quando estudamos [discursos],estudamos os efeitos [dos discursos] sobre nós. É o nosso comportamento em relação a tais [discursos] o que nós observamos”. Assim, os textos que serão escolhidos para serem apresentados, bem como as inferências a serem realizados a posteriori, denotam os efeitos que tais textos provocam sobre o autor deste trabalho e é baseado nesta premissa que estas etapas devem ser compreendidas. Seguem, entre os textos copiados, algumas representações do entendimento que este autor obtém do que foi lido, considerando todo o contexto em que esta leitura se dá e que se mostra muito mais amplo do que qualquer transcrição seria capaz de descrever. Os textos aqui apresentados dão uma ideia do início do processo de enlutamento da mãe, conforme expressos em seus recados no mural. São apresentadas cópias dos textos dela e da namorada do filho, pois estão diretamente relacionados e, ocasionalmente, a existência de recados de uma parece influenciar a redação da outra e vice-versa. Quando necessário, são apresentados textos de amigos que aparentam representar estímulos à redação efetuada pela mãe. Por fim, quando passa a haver uma repetição, a cópia restringe-se ao que surge de relevante e tal repetição é contabilizada nos passos seguintes desta análise. No dia 1º de abril de 2007, Rosa, na época com 44 anos, perdeu seu filho, Cravo, que morreu em um acidente de moto. No dia 31 de maio de 2007, data em 30 que Cravo completaria 25 anos, sua mãe Rosa escreve pela primeira vez no mural de recados de seu filho na rede social Orkut: Hoje nao vai ter festa no AP, mais com certeza vai ter um festao no CEU,com entrada franca para todos os anjos,com som construido por um ANJO LOURO,Cravo.... Meu filho feliz aniversario,seja forte,como vc era aqui,ensine tudo que vc sabe,pq nao conheco ninguem mais inteligente que vc,eu te AMO... Rosa 31/05/2007 Assim começa a série de recados que Rosa escreve periodicamente para seu filho, como uma forma de desabafo, compartilhando seus momentos de dor, como se estivesse a se comunicar diretamente com ele. São estes recados que serviram de base para este estudo, buscando a verificar a intensidade com que eles se repetem, quais são os elementos reforçadores para que esse movimento se repita, e em que momento começa a haver o processo de extinção, quando estes recados passam a escassear até deixarem de existir. Este primeiro recado deixado reflete isso. Rosa passou a utilizar o mural de recados de Cravo apenas dois meses após a morte de seu filho. Tal situação se dá pela chegada da data de aniversário de Cravo, primeira em que “não vai ter festa no AP”. Ao acessar seu perfil no Orkut, lhe aparece a imagem de seu filho com o aviso do aniversário. Situação que serve de estímulo para que escreva e deixe transparecer sua dor. Não houve outra postagem de amigos ou conhecidos no mural após seu recado, porém os dois meses de falecimento do filho surgem como reforçador para uma segunda “conversa” com seu filho: Oi... Meu anjo louro,2 meses sem vc,ainda nao da pra parar de chorar,a vida esta preto e branco,o que me conforta um pouco eh ter certeza que estais em um lugar todo ILUMINADO,iluminado pela tua Rosa 01/06/2007 31 inteligencia,teu carater,teu carisma,tua bondade,teu espirito aventureiro,pela felicidade que senti qdo vc nasceu,eu te amo,por toda minha vida vou te amar,beijos da tua NEGA. Mais uma vez seu texto denota um desejo de que seu filho esteja “em um lugar todo ILUMINADO”. Vale ressaltar que neste segundo recado, tal qual o primeiro, ela destaca a inteligência de Cravo: “ensine tudo que vc sabe,pq nao conheco ninguem mais inteligente que vc” (31/05); “iluminado pela tua inteligência” (01/06). Também ressalta elementos de sua vida, como sua inteligência, carisma, bondade, inclusive lembrando-se da felicidade que ela sentiu quando ele nasceu. Este retorno a aspectos qualitativos do filho parece denotar um desejo de que tudo continue como era, com ele vivo e sendo, sempre, inteligente, carismático, bondoso, o que leva a visualizar a negação da morte. Mesmo sem nenhum texto de resposta de alguém no perfil, Rosa prossegue no dia seguinte com outrorecado: Hoje fui varias vezes no teu ap,mesmo com a perna dodoi,estava com saudades de la,levei varias guloseimas,vamos receber visita, a M. vai la,na terca,te amo,SAUDADES,tua NEGA. Rosa 02/06/2007 Neste texto já aparece uma conversa mais banal, do cotidiano, descrevendo uma visita ao apartamento do filho, como se pudesse encontrá-lo lá. Neste ponto ela relata que sua visita se deu devido a “saudades de la”. De igual forma, dois dias depois ela “passa” no mural de recado de seu filho para deixar um recado simples, sobre algo corriqueiro: Revelei fotos lindas.... Eu te amo.... 32 Rosa 04/06/2007 No dia seguinte aos recados da mãe, a namorada de Cravo volta a escrever no mural. Dália namorou com Cravo durante quatro meses antes de seu falecimento. Logo após o acidente, Dália deixa um recado que demonstra sua reação ao ter noção de que ele não estará mais por perto: Hoje vai ser o primeiro dia que o telefone não vai tocar, eu não vou atender e não vou ouvir tu me dizer: Oi meu amor!! Q q tu comeu hoje?? lembra? Cedo demais neh lindo, tantas coisas planejadas, tantos planos... e o nosso sítio? Ainda não consegui ver onde fica vem me mostrar!! Não acredito no que aconteceu Cravo, não pode ser... Esses quase quatro meses que q gente ta junto foram perfeitos, não pode acabar assim... não pode... Te Amo, amo amo!!!Mesmo nos problemas tu me fazia sentir segura, nada pra tí era motivo pra desanimar, e é nisso que eu to pensando, vou lembrar só dos nossos bons momentos, de tudo que a gente passou nesse pouco tempo, de tí lindo, alegre, carinhoso... Meu Deus, como é difícil Te Amo meu Amor! Dália 02/04/2007 Um mês depois ela volta ao mural de recados, demonstrando que tal espaço virtual passa a representar um espaço físico que pode ser visitado para matar a saudade: 33 oie lindo passei p matar a suadade... Dália 05/06/2007 A mãe, Rosa, prossegue com recados do cotidiano, intercalados com pequenas mensagens de saudades. Oi...Meu amor,hoje tem jogo do timeco,seca dai,que eu seco daqui,te AMO,saudades.... bjs da tua nega. Rosa 06/06/2007 Meu anjo louro,to com tanta SAUDADE..... Rosa 06/06/2007 Ao que a namorada retorna também com mensagens de saudades no mural de recados de Cravo Que saudade mocinho!!! Fica em paz! bjinho da Dália Dália 07/06/2007 No mesmo dia Rosa fala da dificuldade e do amor que sente: 34 que dia dificil sem vc..... te love. Rosa 07/06/2007 Porém, no mesmo dia Dália escreve um texto mais longo, em que demonstra estar em diferentes etapas do luto, de forma sobreposta. Chega uma hora que eu paro e penso: não o Cravo não, não pode, impossível... como que ele foi embora... aquele homem que eu achava que podia tudo, que era capaz de tudo... só não podia ter ido assim tão cedo... essa dor ta sendo horrível, cadê o meu amor,meu amigo, companheiro, cadê você?? Sei que tu tá bem, ta num outro plano e tá olhando por nós, mais a dor da tua ausência é horrível Cravo. Precisar de vc e não te ter mais não tá sendo fácil... Só quero que tú esteja em paz, que tú esteja sendo iluminado como era aqui... Um beijãooooooo pra tí. Dália 07/06/2007 Há um processo de negação: “não o Cravo não, não pode, impossível... como que ele foi embora”; fala da dor que sofre, demonstrando raiva pela ausência sentida: “essa dor ta sendo horrível, cadê o meu amor,meu amigo, companheiro, cadê você??”; e de forma sutil aparece um pouco de barganha: “Só quero que tú esteja em paz, que tú esteja sendo iluminado como era aqui...”. Também demonstra um pouco de depressão: “mais a dor da tua ausência é horrível Cravo. Precisar de vc e não te ter mais não tá sendo fácil...” ao mesmo tempo em que apresenta uma tentativa de aceitação: “Sei que tu tá bem, ta num outro plano e tá olhando por nós”” 35 A esta mensagem mais longa da namorada seguiu-se um recado também longo da mãe, o que pode indicar que as ações da namorada no mural podem servir de estímulos para que a mãe redija seus textos. Uma despedida doi no peito e faz chorar o coracao. Atinge are a alma e aguca os espinhos da saudade.Mas ha uma certeza que me serve de balsamo:nunca mais estarei so! Por isso,abraco aquele que me acalenta e que,mesmo partindo,PERMANECERA comigo.Ele eh o amor da minha vida ele eh parte minha.Por causa deste amor eu bendigo a saudade.Ela o traz pra bem perto de mim. E, por causa da saudade,aprendi a bendizer meu anjo louro.Te amo,beijos da tua nega... Rosa 08/06/2007 Nesta mensagem Rosa deixa entrever um misto de depressão (“Uma despedida doi no peito e faz chorar o coracao. Atinge are a alma e aguca os espinhos da saudade”) com aceitação (“Mas ha uma certeza que me serve de balsamo:nunca mais estarei so! [...] Ele eh o amor da minha vida ele eh parte minha.Por causa deste amor eu bendigo a saudade.Ela o traz pra bem perto de mim”) Esta saudade, entretanto, é presença constante nos recados subsequentes, que se sucedem diariamente. Saudade..... Muita saudade... Rosa 09/06/2007 36 Hoje eh domingo dia que vc vinha almocar as 4 da tarde,todo acabado da balada...Ah meu anjo louro.... quanta saudade...beijos da tua nega. Rosa 10/06/2007 Um amigo deixa uma mensagem que demonstra seu estágio de negação, relacionando com comentários extra-rede ou do próprio mural de recados do Cravo. AMIGO1 EH nehh como disse a l.. apesar de agente não se ver quase nunca, de saber tão pouca coisa um do outro deixaste uma saudade imensa aki anJo ♥ no domingo foi dificil acordar com akela noticia.. fikei tao triste.. Mas sei que aih estas bem... e sabes que aqui todo mundo te amava muito neh primoo.. e como disse a Dália... ainda não caiu a ficha.. parece ser mais um pesadelo sem fim.. tu tão jovem com tanta coisa ainda pra viveer... não da pra entender porque fosses tão cedoo.. Saudades de você pessoa perfeitá... te amarei eternamente ♥ 11/06/2007 Ao que seguem mensagens periódicas, praticamente diárias, com uma outra ausência, da namorada e da mãe, todas girando em torno da saudade que sentem do Cravo, relatando e lembrando de momentos que viveram com ele. A mãe tenta ver, em momentos passados, uma despedida que ela não pode vivenciar. Passa a buscar na recordação de um momento uma despedida que lhe alivie a dor que está 37 vivenciando: “mas so agora entendo que era um olhar de despedida...AH!!! que saudade!!!!” Lembro da nossa despedida.... na segunda dia 25 dormi la no ap com vc,na terca dia 26,limpei tudo,lembra qdo vc chegou e me olhou,olhou diferente,ficou olhando com um olhar longo,com um olhar que no dia nao entendi,senti que era diferente,mas so agora entendo que era um olhar de despedida...AH!!! que saudade!!!! Rosa 19/06/2007 Ainda vivenciando seu luto, a mãe volta a visitar o apartamento do filho, e pede que o filho seja forte, pois é o que ela está tentando fazer. Oi,filho amado!Tenho certeza que vc esta bem feliz,estivemos no teu ap,sei que deves ter dado muitas risadas,lembramos de vc,falamos da nossa saudade...Ha,meu anjo louro so vc sabe o tamanho da minha SAUDADE... Eu te amo...Seja forte ai,estou tentando ser forta aqui,beijos e muitos sorrisos de quem te adora,tua nega. Rosa 21/06/2007 Em um momento de tristeza, aparece um lampejo de raiva ao perceber que não tem projetos próprios, que eles estavam ligados à vida do seu filho e também de barganha, ao se oferecer para ir no seu lugar: “vc tinha tantos progetos... eu nao tenho nenhun,por que nao posso mudar e ir no teu lugar”. 38 Droga!!!! estou com muita saudade,vc tinha tantos progetos... eu nao tenho nenhun,porque nao posso mudar e ir no teu lugar....Meu coracao chora a falta de voce....Tem momentos que fico perturbada de tanta saudade... Rosa 22/06/2007 A namorada passa a escrever menos e com menor intensidade, reduzindo a sua participação no mural de recados de Cravo Saudadeeeeee... bjinho da Dália. Dália 24/06/2007 Enquanto isso a mãe altera a imagem de seu perfil para uma em que aparecem os filhos. Note-se que hoje, na rede social Facebook, ela utiliza esta mesma imagem, porém tendo somente o filho falecido ao seu lado. Como capa de seu perfil há uma foto com o outro filho. Eu te amo.... Rosa 24/06/2007 (Alterou a foto do perfil para uma que contém os filhos) A mãe relata que deixou seus prazeres, seus hobbies, de lado, após a morte do filho e que, mesmo cobrada, não consegue mais produzir: “Como vou pintar meu anjo??! Se minha vida sem vc esta preto e branco”. De novo, nota-se uma 39 demonstração de raiva pelo ocorrido, que fez com que ela inclusive abandonasse suas atividades de lazer. Oi...Meu anjo louro,a minha vida nao tem mais cor,todos os amigos me perguntam,qdo vou voltar a pintar?? Como vou pintar meu anjo??! Se minha vida sem vc esta preto e branco.Saudade...Beijos da tua nega. Rosa 25/06/2007 A namorada volta a escrever, de forma sucinta, mas se mostrando sempre presente. Tu ta pertinho de mim né meu lindo... cuida de mim... Saudade.... Dália 25/06/2007 Mais uma vez a mãe volta a falar da inteligência do filho, objeto de atenção das primeiras mensagens por ela colocadas no mural de recado. Nestes recados ela conversa com o filho com a ideia de que ele estará ocupado, “trabalhando”, como se por isso ele não pudesse ou não tivesse o tempo para poder responder às suas mensagens. Meu coraçao chora a falta de voce!!!!Te amo... Rosa 26/06/2007 Anjo louro...E dai???? muito trabalho??? com toda essa inteligencia deves estar bem agitado,seja forte,coragem,siga em 40 Rosa 26/06/2007 frente...Eh assim que quero,obedeçe tua nega,saudades... A namorada volta a demonstrar negação pelo ocorrido. Vale ressaltar que ainda são somente três meses após o falecimento de Cravo O Cravo, pq não consigo acreditar!! pq não consigo aceitar isso??? Bjinho, cuida da Dália meu amor... Dália 26/06/2007 A mãe volta a escrever indicando ao filho que ele deve ser corajoso, que ele deve seguir em frente sem medo, com a certeza de que é muito amado. Ao mesmo tempo em que ela entrega sua dificuldade perante a situação: “por que eu estou tentando seguir em frente por vc,quero que vc siga com toda coragem que sempre teve”. Eu te amo calada como se fosse uma sinfonia.... Receba muitos SORRISOS...,por que eu estou tentando seguir em frente por vc,quero que vc siga com toda coragem que sempre teve,nao quero um filho com medo,siga seu caminho tendo certeza que sempre seras muito AMADO,eu te AMO. Rosa 29/06/2007 A mãe se lamenta dos três meses do falecimento do filho: Ah!!!! meu AMOR... Tres meses sem vc,SAUDADE... Rosa 41 01/07/2007 Enquanto a mãe se ausenta do mural de recados, a namorada repete uma série de mensagens curtas, diárias, que fecham com um texto mais extenso. Neste período a mãe não escreveu no mural. Cravo ... q falta... q saudade... Dália 03/07/2007 Cravo ... nas horas difíceis lembro que tu ta do meu lado... bjaummmmmm. Dália 04/07/2007 bjs, bjs, bjs, bjs, bjssssssssssssssssssss... Dália 05/07/2007 Ai Cravo ... tava aqui pensando na gente, pensando em como tudo valeu a pena, tudo... de verdade!! Como tu dizia... A saudade ta muito grande, a tristeza ainda não passou não meu lindo, mais lembro do teu sorriso tão lindo, aquele olhar Dália 05/07/2007 42 verdadeiro... não tem como não sorrir, assim... sozinha... lembrando de tudo, cada minuto do teu lado foi único e não tem como esquecer... fica bem meu lindo... saudade... sei que teu espírito ta aqui comigo me protegendo... bj bj Neste último texto, a namorada parece entrar em um processo mais duradouro de aceitação. Situação que parece começar a ocorrer com a mãe a partir do relato de um sonho que teve com o filho, situação que serviu de estímulo e trouxe-a de volta ao mural de recados para comunicar-se com o filho. Amado meu,pela primeira vez sonhei contigo,andamos de moto o tempo todo,foi bom!!! estou com muita saudade...Meu anjo louro....E no céu vai ter mais um farol que eh a luz do teu olhar...Mil sorrisos e outros milhoes de beijos da tua nega. Rosa 06/07/2007 A mãe mantém-se menos frequente em sua participação no mural do filho, mas certos elementos servem de estímulo ao seu retorno, como o sonho descrito acima, ou postagens de amigos, como os que foram colocados abaixo. AMIGO2 http://br.youtube.com/watch?v=agcJHeshlg8 cara assiste esse video ai de cima e lindo ...... 09/07/2007 AMIGO3 Dai rapaz como andam as coisas por ai aonde voce esta? Po precisava de Vc o pior é que nao tem como a gente se falar! Qdoi será que vao inventar um e- mail pro CEU ?????? Po tu que sabe tudo ve se 43 inventa assim a gente pode trocar aquelas longas ideias e posso matar a saudade da nossa amizade!!!!!! Gde Abraço e fica com DEUS AMIGO!!!!!!!!! 09/07/2007 Estas mensagens servem de estímulo para que ela se sinta mais alegre e também para deixar um recado para o filho: O meu filho como fico feliz qdo leio estes recados dos teus amigos,como meu coraçao se acalma...Que bom ter amigos que lembram de vc,oh!!!!,meu anjo louro segue teu caminho tendo certeza que tem muita gente,gente com G maisculo que nunca vai te esquecer,te amo loucamente,receba meu abraço e meus sorrisos,meus beijos,siga teu caminho com coragem,da tuA NEGA. Rosa 09/07/2007 A namorada volta a deixar seus recados no mural e, com a mesma constância, a mãe deixa os seus, intercalando-se as mensagens de namorada e mãe. Oi meu lindooo... a cada dia tenho mais certeza que vc tá aqui comigo... tua presença é muito forte em tudo que eu faço... fica bem viu!!Muitas saudades de tiiiiiiiiiiiiiiiii. Beijooo Dália 10/07/2007 Oi meu anjo louro... Nunca esqueça que te amo muito!!!Olhei pro céu ontem a noite,vi uma luz diferente, especial, 44 Rosa 11/07/2007 pensei...O céu quanhou mais um farol,que é a luz do teu OLHAR...Beijos da tua nega. Oi Mocinho... só passei pra dizer que to com muuuuuita saudade!! Mais a gente vai se encontrar ainda...bjinho meu lindo... fica bem... Dália 12/07/2007 É interessante observar que mãe e namorada, que vêm escrevendo suas mensagens de forma periódica, passam a aceitar mais o acontecido. Quem escreve pela primeira vez, como a amiga que deixou o recado abaixo, demonstra estar em um processo de negação, estágio este que ambas, mãe e namorada, foram abandonando aos poucos. AMIGA2 Ainda não consigo acreditar no que aonteceu, pra mim é muito díficil acitar...as vezes me sinto super culpada por isto que aconteceu, espero que eu não tenha te amgoado...sinto muito sua falta. Gostaria tanto de falar com algum dos seus amigos que eu conheci, mas acho que nenhum deles quer falar comigo....Hoje já consigo encarar melhor a situação, mas está sendo muito dificil...Quando alguem vem pedir alguma coisa sobre vc, ou saber o que aconteceu, me sinto como se isto tivesse acontecido naquele exato momento, como se eu estivesse recebendo naquele momento a noticia de que vc se foi. Na nossa primeira troca de olhar, senti que vc era especial...se lembra como vc brincou com os meus apis, dizendo que não acreditava que eles fossem meus pais, pois eram muito jovens.... 45 Minha mãe adorouvc, seu geito cativante, brincalhão...Vc é especial, e nunca, nunca vou te esquecer. o dia que passamos juntos, vou levar eternamente comigo, será inesquecível...Te adoro muito, saudades de vc......Bjs, bjs ,bjs 17/07/2007 O texto abaixo, deixado pela namorada, demonstra que ela está mais próxima de vivenciar outros estágios do luto do que o da negação, que parece ir ficando para trás. Algum dia vamos nos encontrar num lugar melhor para se viver, um lugar onde as pessoas possam morar e não precisem mais sofrer!! Algum dia o mundo vai mostrar a verdade que nos fez parar por aqui!! " É difícil começar a pensar em viver, pra sempre, sem você. . Tantas paisagens perderam a graça, as poesias eram meras palavras. .para mim " -- MuitaSs saudades Dália 18/07/2007 As mensagens da mãe e da namorada mantém esta alternância com um ou outro momento em que seus textos são alterados, de acordo com estímulos oferecidos por datas ou situações especiais, como será demonstrado com os próximos exemplos obtidos do mural de recados de Cravo. Ao montar um quadro com fotos do filho, quando completava quatro meses do falecimento. Oi!!!4 meses sem vc!!!Pareçe uma eternidade!!!Fiz um quadro lindo!!!fotos suas e minhas,coloquei no meu quarto,estou sempre com vc,tenha força,coragem...Eu te AMO. Rosa 46 01/08/2007 Ao encontrar objetos perdidos do filho: Oi meu anjo louro!!!!Ja estou de volta,tudo correu bem,tbem nao podia ser diferente,com vc cuidando de mim,esta semana tive uma surpresa que so pode ser arte sua,seu amigo Guilherme achou seu relogio e as chaves do seu ap,estavam na roupa de couro,vc sabe o qto procurei seu relogio,fiquei muito feliz em poder ficar com ele,hoje ele vai pro seu ap,junto com suas coisas que cuido com o mair carinho,eu te amo demais,a saudade eh enorme,mais vc sabe que estou aqui por vc,força ai,tenha coragem...Mil beijos da tua nega. Rosa 24/08/2007 Quando uma amiga escreve: AMIGA3 oi tempo que não entrava no orkut, meu msn não treme mais...minha cam não é mais usada.. é estou virando mulher das cavernas..., 10/09/2007 A mãe se comove: Oi...Meu filho amado,veja só como vc tem amigos especiais...Adoro qdo vc recebe esses carinhosos recados,vc jamais sera esquecido,sabe pq??? Pq te AMAMOS...Beijos da tua nega. Rosa 11/09/2007 47 E eventos que se aproximam, como o Natal, trazem novamente textos sobre saudade e sobre a dificuldade de conviver com a ausência. Oi meu anjo louro!!!!Lindo!!!!Ja estou lembrando do natal....Como vou aguentar?????Estou com tanta saudade....Sinto tanta tua falta....Fico esperando a noite chegar,só pra ter vc em meus sonhos....Deus te abençoe....Que Nossa Senhora te cubra,te de colinho.... Rosa 19/10/2007 Outra data marcante é a proximidade do aniversário de Rosa. Oi meu lindo anjo louro!!!!Esta dificil.....Vai ser meu primeiro niver sem vc,que triste!!!!Que saudade imensa,que dor que nao passa,quero que vc sigha seu caminho,que seja um espirito de luz,vc tao especial,tao inteligente,ajuda todos,receba muitos beijos,me perdoe tantas lagrimas... Rosa 19/02/2008 Recado carregado de dores quando completa um ano de falecimento. meu anjo lindo louro!!!!!!!A missa mas parecia uma festa de aniversario,nao deixa de ser,faz um ano q estas vivendo no mundo do criador,tenho tanta certeza que entendes mnhas lagrimas,tenho certeza tbem q minha lagrimas nao vao te impedir de caminhar,pq hoje entendo q foi chegada a hora de vc estar com DEUS,prossiga teu caminho,eu te amo cada dia mas... Rosa 02/04/2008 E a partir desta data os recados começam a rarear, fato que a própria Rosa nota e comenta em um de seus textos. 48 Faz tempo q nao passo por aqui,nao penses q esqueci,eu te amo,a saudade eh muito grande,fica bem meu anjo lindo louro....Beijos da tua nega. Rosa 12/05/2008 Mas eis que retornam as mensagens que alternam depressão, raiva, negação, barganha e aceitação. Chama a atenção o surgimento de recados como estes, denotando um retorno forte ao sentimento de negação. Verificando as datas, percebe-se que se aproxima da data de aniversário do filho. Quero q vc seja forte... Rosa 27/05/2008 Preste atençao....sou sua mae,quero q vc seja forte.... Rosa 27/05/2008 CORAGEM... Rosa 27/05/2008 49 4.3 Inferências A partir da ideia de que “o sentido do discurso advém das contingências que controlam as relações entre o comportamento verbal e objetos ou acontecimentos (ou propriedades objetos ou acontecimentos) que podem ou não ter sido tateados pelo falante” (BORLOTI et al, 2008, p. 105) tem-se que o processo de inferência dos operantes essenciais deve considerar especialmente estas contingências. Tal situação é corroborada pela afirmação de Borloti et al. (2008, p. 104) de que “o ouvinte infere o significado do discurso (ou seja, as suas variáveis controladoras), observando (ficando sob controle discriminativo) as circunstâncias sob as quais o discurso ocorre; toma em consideração o que ele sabe sobre o falante e sobre tais circunstâncias”. Neste trabalho não se buscou classificar funcionalmente os operantes verbais do discurso conforme colocado por Skinner (1957), e sim se objetivou relacionar tais operantes com as fases do luto, para possibilitar a avaliação do encadeamento do discurso como se dá no mural de recados analisado. Tal avaliação se dá a partir do pressuposto de que “a negociação de argumentos parece levar o ouvinte a ver algo à maneira do falante e, ao fazer isso, o falante combina operantes essenciais, formando grupos temáticos em falas continuadas [...] como se estivessem sob controle das coisas ou acontecimentos” (BORLOTI et al, 2008, p. 105). Assim, foram percebidas as seguintes relações: • Ao falar sobre as qualidades do filho, a mãe se coloca em um processo de negação, como se o fato do filho possuir certas características ou habilidades mantivessem-no vivo e presente. A negação se mostra óbvia nos textos em que a mãe recusa-se a aceitar a ideia da perda do filho, da sua ausência, de não ser possível repetir atividades que antes eram feitas pelos dois, mãe e filho. O próprio ato da mãe escrever para o filho apresenta-se como negação; • A raiva é denotada por expressões de indagação, como de alguém lhe devesse uma explicação pelo que ocorreu. Também tem relação com o processo de raiva as vezes em que a mãe expressa dor, sofrimento, pela ausência do filho; • Nos momentos em que a mãe propõe que seria melhor ela ter morrido no lugar do filho tem-se a barganha, também denotada, de forma um pouco 50 mais sutil, quando ela deseja que o filho esteja em paz, em um lugar tranquilo, feliz; • Os textos em que a mãe adjetiva a dor da ausência como insuportável, impossível de suportar, apresenta um processo de depressão, que se verifica também nos textos em que ela demonstra não ter mais prazeres, nem vontade de fazer as tarefas que fazia antes do falecimento do filho; • Quando o desejo de que o filho esteja em um lugar tranquilo é substituído por frases que demonstram certeza disso, tem-se a apresentação do processo de aceitação, que também é observado quando a mãe demonstra estar disposta a seguir sua vida, a tentar manter as atitudes anteriores a perda de seu filho. É importante observar que, apesar da mãe não escrever diariamente, isto não indica que ela não esteja presente na rede social. Estes momentos em que ela frequenta a rede social mas não escreve no mural do filho podem ser entendidos como “silêncio” e como tal podem ser alvo de futuras análises. A partir destas definições, foi possível avaliar os textos deixados pela mãe no mural de recados de seu filho e contabilizar em que medida se dá
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