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TRABALHO Sociedade, ação e estrutura para Parsons, Goffman, Becker e Garfinkel

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A NOÇÃO DE SOCIEDADE, DE AÇÃO E DE ESTRUTURA EM TALCOTT 
PARSONS, ERIVING GOFFMAN, HOWARD BECKER E HAROLD 
GARFINKEL 
 
Ana Paula BortolanzaRuppenthal 
 
Ainda que não tenha se estruturado em torno de uma forma de 
pensamento ou base intelectual homogênea, a Escola de Chicago foi um 
centro de pesquisas da Universidade de Chicago, cujos principais trabalhos se 
desenvolveram principalmente na primeira metade do século XX, e que teve 
grande repercussão no pensamento sociológico contemporâneo. 
O estrutural funcionalismo surgiu como uma das tendênciasda escola de 
Chicago, dentro de um contexto de expansão das ciências humanas e como 
reação à escola ou tendênciapositivista, cujo método consistia na análise 
estritamente objetiva da sociedade, e também ao funcionalismo antropológico, 
que apresentava uma concepção estritamente evolucionista do 
desenvolvimento social. Tem como seu principal expoente TalcottParsons, que 
concebia a sociedade como um sistema de relações interdependentes e 
interligadas. 
TalcottParsonsfoi um sociólogo estadunidense muito aclamado pela sua 
teoria da ação social, que buscou sintetizar ou reunir partes dos pensamentos 
de grandes sociólogos que o precederam como Émile Durkheim, Max Weber e 
Vilfredo Pareto, cuja influência repercute amplamente na moderna sociologia. A 
sua teoria da ação social buscava explicar ou interpretar a sociedade como um 
todo orgânico (à semelhança de Durkheim), como uma ampla gama de 
interações interdependentes e interligadas entre si que compõem o corpo 
social. Sua teoria, com evidente influência da ciência da psicologia, busca 
compreender a atuação do sujeito e da coletividade nas suas relações 
sociais.Ademais, em sua visão da sociologia enquanto ciência, TalcottParsons 
defendia que ela deveria alcançar um nível generalizante de conhecimento a 
partir de uma pluralidade de casos particulares, abandonando a perspectiva 
eminentemente normativa que tinha até então. 
 
 
Outra linha ou tendência de pesquisa surgida no contexto da escola de 
Chicago foi o interacionismo simbólico. O interacionismo simbólico foi uma 
linha de pesquisa em sociologia e em psicologia que tinha como principal 
expoente, na sua origem, George Mead, que foi um importante pensador da 
psicologia social. Essa linha buscava compreender a interação social a partir 
dos significados vivenciados por cada um dos atores que participavam de um 
contexto social particular. Assemelhando-se à noção de estrutura elaborada 
por TalcottParsons, parte da ideia da orientação do comportamento do 
indivíduo (mas numa perspectiva mais subjetiva) a partir de uma concepção 
social do significado/símbolo, o que pode variar de acordo com a situação. A 
interação social é, por conseguinte, um processo contínuo que precisa da 
constante reafirmação dos membros da comunidade. 
Dos autores estudados, destacam-se, nessa linha do interacionismo 
simbólico, Howard Becker, sociólogo estadunidense conhecido por seu estudo 
da sociologia do desvio, e ErvingGoffman, sociólogo e antropólogo canadense 
com sua análise da representação dos fenômenos sociais. 
Howard Becker especifica, em sua obra "Outsiders", que todos os 
grupos sociais criam regras sociais (que podem ser regras jurídicas, a ser 
impostas pelo Estado, ou meras regras morais), e que definem algum padrão 
de comportamento, e buscam impô-las; assim, haveria uma expectativa de que 
se siga, no grupo social, uma conduta tida como correta, e de que se puna ou 
proíba uma conduta tida como errada. Quando um indivíduo infringe uma das 
regras impostas pelo grupo ela passa a ser vista de uma maneira especial - 
passa a ser vista como um "outsider" ou desviante. 
ErivingGoffman, a seu turno, em sua obra "A representação do eu na 
vida cotidiana", encara os fenômenos sociais, a atuação individual e 
comunitária, à semelhança da encenação teatral, onde cada um representa um 
papel, ainda que a representação desse papel não condiga, em dado momento 
ou situação, com as convicções subjetivas da pessoa. A representação, para o 
autor, é a atuação do indivíduo perante os outros dentro do contexto 
social.Também à semelhança de Parsons e Becker, entende a sociedade como 
um sistema de interações – onde cada um representa um papel para o outro – 
 
 
mas não se atém à ideia de estrutura social e busca análises temporais dos 
seus objetos de estudo. 
Em seguida, outra linha de pensamento que se destaca dentro da escola 
de Chicago foi a intitulada etnometodologia. 
A etnometodologia surgiu na década de 1960 tendo como seu principal 
expoente Harold Garfinkel. Foi basicamente uma linha de pesquisa ou 
abordagem sociológica que tinha uma base social empírica, buscando estudar 
os fenômenos humanos, que seriam as atividades do cotidiano que constroem 
a sociedade. O autor parte inicialmente da teoria social de TalcottParsons, mas 
busca abordar as atividades e circunstâncias práticas do cotidiano, 
considerando justamente que a realidade social é construída cotidianamente, 
com os atores sociais em ação. Retoma o senso comum para buscar nele os 
verdadeiros sentidos da ação humana, buscando, assim, desvendar a lógica 
das ações sociais. Desta forma, o método não parte de hipóteses ou leis 
pressupostas ou dadas, mas sim busca observar primeiramente os fenômenos 
sociais para depois explicar as suas razões. 
Dessa forma, percebe-se que os autores da escola de Chicago aqui 
estudados, apesar de suas peculiaridades teóricas e enfáticas, temalguns 
pontos em comum. 
O primeiro deles que eu noto é a ênfase na ação social a partir do 
prisma dos indivíduos; ao contrário da corrente positivista que pretendia 
observar a sociedade com um método de afastamento subjetivo, como se a 
sociedade ou qualquer que fosse o objeto de estudo fosse uma “coisa” 
apartada, os pensadores da escola de Chicago reconheciam a importância da 
subjetividade na formação social, percebendo que justamente a subjetividade 
em interação – constituindo as relações sociais – seria a essência da 
sociedade. 
De modo geral, assim, os autores reconhecem as relações e interações 
humanas como base de análise e fundamental para constituir o corpo social – 
sendo que as relações e interações sociais constituiriam as “estruturas” da 
sociedade. 
 
 
Noto também que os autores partem do legado de TalcottParsons que, 
por sua vez, buscou reformular pensadores sociais anteriores e até mesmo 
inovar no que eles falharam. Mas apesar de partir da teoria de Parsons, cada 
um desenvolve um pensamento originário: Howard Becker enfatiza mais a 
análise do rompimento de regras sociais e as suas reações e possíveis 
sanções; ErvingGoffman, numa análise que me parece muito próxima da de 
Parsons, analisa o comportamento individual perante a sociedade, o como ele 
agiria e se “representaria” nas suas relações sociais, bem como observando a 
maneira que as situações sociais condicionariam a sua atuação; e por fim 
Harold Garfinkel, também apresentando certa semelhança com a teoria de 
Parsons no que tange à sua concepção de relação social como essencial para 
a formação e compreensão da sociedade, inova mais precisamente no seu 
método de análise, que busca primeiramente observar os fenômenos sociais 
para depois buscar extrair deles a lógica de seu andamento. 
Por fim, me parece importante ressaltar a aproximação que todos os 
autores apresentam com a ciência da psicologia. Até certo ponto, me parece 
válida, uma vez que a psicologia poderia auxiliar na compreensão da atuação 
subjetiva do indivíduo em direção ao uma situação social; mas numa 
perspectiva mais ampla a análise sociológica deveria se afastar da psicologia, 
assim como fez Harold Garfinkel, buscando um método mais propriamente 
sociológico e analítico. Especialmente na teoria de TalcottParsons é notável 
que ele buscou se socorrer de teorias não tão próprias da psicologia quanto 
psicanalíticas; existe uma grande discussãoacerca da cientificidade da 
psicanálise, e pode ser que o autor tenha buscado a psicanálise justamente 
para justificar a análise da subjetividade e romper com o positivismo; mas de 
qualquer forma, me parece que a psicanálise ainda é uma forma de saber 
ainda não totalmente creditada nos moldes das modernas ciências humanas 
(considerando isso mesmo na época de Parsons), se aproximando mais de um 
método interpretativo do que uma ciência propriamente dita, o que me faz 
pensar que a tentativa de aproximar a psicanálise da sociologia colocaria em 
descrédito a ciência social que, por sua vez, tem uma infinidade de métodos 
muito mais paupáveis, tanto qualitativa quanto quantitativamente. 
 
 
No caso de ErvingGoffman, me parece que o autor poderia ter buscado 
auxílio numa interpretação filosófica de Artur Schopenhauer acerca da vontade 
e representação – percebo certa semelhança nas análises ainda que o filósofo 
tenha buscado uma abordagem mais estritamente individual e subjetiva da 
percepção humana enquanto interpretação do mundo exterior, na medida em 
que Goffman buscou analisar as condicionantes sociais da representação 
considerando-a como atuação social. Aliás, o interacionismo simbólico em si 
poderia ter ganho um acréscimo substancial caso tivesse se valido de uma 
perspectiva schopenhauriana. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
REFERÊNCIAS 
 
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Janeiro: Zahar, 2008. 231 p. (Antropologia social) ISBN: 9788537801086. 
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GOFFMAN, Erving. A representação do eu na vida cotidiana. 14. ed. 
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