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COMPLEXO DE ENSINO SUPERIOR DE SANTA CATARINA - CESUSC FACULDADE CESUSC CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO GUILHERME HENRIQUE PEREIRA CANUTO RESPONSABILIDADE PENAL DA PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PRIVADO NOS CRIMES CONTRA O MEIO AMBIENTE FLORIANÓPOLIS JUNHO, 2020. Guilherme Henrique Pereira Canuto Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica de Direito Privado nos Crimes Contra o Meio Ambiente Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Graduação em Direito da Faculdade Cesusc, exigido como requisito à obtenção do título de Bacharel em Direito. Orientador: Prof. Msc. Sandro Sell Florianópolis Junho, 2020. Guilherme Henrique Pereira Canuto Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica de Direito Privado nos Crimes Contra o Meio Ambiente Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Graduação em Direito da Faculdade CESUSC como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito, sendo submetido à Banca Examinadora e considerado aprovado em __/__/____. _______________________________________________ Prof. Msc. Sandro Sell Professor Orientador _______________________________________________ Professor Membro da Banca Examinadora _______________________________________________ Professor Membro da Banca Examinadora RESUMO Esta pesquisa busca elucidar o conceito de pessoa jurídica de direito privado e seus fundamentos, analisar conforme a doutrina a visão em face do Direito Penal como mecanismo de tutela contra os crimes ambientais cometido pela pessoa jurídica de direito privado, os tipos de penalidade possíveis que se aplicam ao ente coletivo de acordo com os dispositivos que tratam da matéria, verificando a divergência existente na doutrina penal brasileira quanto a possibilidade de se adotar no ordenamento jurídico brasileiro a modalidade de responsabilidade penal da pessoa jurídica de direito privado em decorrência de crimes ambientais, bem como o posicionamento dos tribunais e cortes superiores em relação a temática que engloba esta pesquisa, elucidando por fim uma modalidade alternativa de mecanismo de tutela em face da problemática em que consiste a presente pesquisa, para então chegar as devidas conclusão sobre a possibilidade de responsabilizar penalmente a pessoa jurídica de direito privado pelo cometimento de crime ambiental no ordenamento jurídico brasileiro como também a exposição das hipóteses de solução para o problema. A metodologia utilizada para a realização desta pesquisa terá como base a aplicação de um método de abordagem teórico de caráter descritivo, tendo como procedimento a utilização do método monográfico com raciocínio dedutivo e dogmático-comparativo, consistindo em técnicas de pesquisa por meio da análise bibliográfica e documental de fontes primárias e secundárias, utilizando leis, doutrinas e decisões reiteradas dos tribunais e cortes superiores do ordenamento jurídico brasileiro. Palavras-chave: Responsabilidade Penal. Pessoa Jurídica. Dano Ambiental. ABSTRACT This research research seeks to elucidate the concept of legal entity under private law, analyze Criminal Law as a protection mechanism against environmental crimes committed by the legal entity under private law, the types of possible penalties that apply to the collective entity according to the provisions dealing with the matter, verifying the divergence existing in the Brazilian criminal doctrine as to the possibility of adopting in the Brazilian legal system the modality of criminal liability of the legal entity under private law as a result of environmental crimes, as well as the positioning of the courts and higher courts in relation to the theme that encompasses this research, finally elucidating an alternative modality of guardianship mechanism in the face of the problem that the present research consists of, to then arrive at the due conclusion on the possibility of criminally holding the legal entity of private law responsible for the commission of environmental crime does not order Brazilian legal framework as well as exposing the hypotheses for solving the problem. The methodology used to carry out this research will be based on the application of a method of theoretical approach of descriptive character, having as procedure the use of the monographic method with deductive and dogmatic-comparative reasoning, consisting of research techniques through the bibliographic analysis and documentary from primary and secondary sources, using laws, doctrines and repeated decisions of the courts and higher courts of the Brazilian legal system. Keywords: Criminal Responsibility. Legal Personal. Environmental Damage. SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 6 2 RESPONSABILIDADE PENAL DA PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PRIVADO . 7 2.1 CONCEITO DE PESSOA JURÍDICA E SUA DISTINÇÃO DA PESSOA NATURAL FÍSICA ....................................................................................................... 7 2.1.1 Conceito de responsabilidade ........................................................................ 8 2.2 CONSIDERAÇÕES INICIAIS E FUNDAMENTOS ................................................ 9 2.3 A (IM)POSSIBILIDADE DE CRIMINALIZAR A PESSOA JURÍDICA NO DIREITO PENAL BRASILEIRO CONFORME A DOUTRINA PENAL ...................................... 12 2.3.1 Teoria da Ficção Legal ................................................................................... 15 2.3.2 Teoria da Realidade (organicista) ................................................................. 18 3 ANÁLISE A PARTIR DA CONSTITUIÇÃO E DA LEI INFRACONSTITUCIONAL BRASILEIRA ............................................................................................................ 24 3.1 O INSTITUTO À LUZ DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 ........................ 24 3.2 CONSIDERAÇÕES A RESPEITO DA LEI 9.605 DE 1998 (LEI DE CRIMES AMBIENTAIS) ........................................................................................................... 27 3.3 ANÁLISE QUANTO A INSTITUCIONALIZAÇÃO DA CRIMINALIDADE EMPRESARIAL NA LEGISLAÇÃO CONSTITUINTE SOB A ÓTICA DA DOUTRINA30 3.3.1 Ideias contrárias e favoráveis ....................................................................... 30 4 APLICAÇÃO CONFORME A JURISPRUDÊNCIA BRASILEIRA E A PROPOSTA MODERNIZADORA DO DIREITO DE INTERVENÇÃO ........................................... 39 4.1 A DISCUSSÃO SOBRE O TEMA NA JURISPRUDÊNCIA BRASILEIRA ........... 39 4.2 O DIREITO DE INTERVENÇÃO COMO MECANISMO DE TUTELA ................. 50 5 CONCLUSÃO ........................................................................................................ 53 REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 57 6 1 INTRODUÇÃO A pesquisa em face do tema que trata da responsabilidade penal da pessoa jurídica em decorrência de crime ambiental, demonstra a importância bem como a necessidade na realização de uma análise em relação ao problema que envolve o tema até os dias atuais, pois, possibilita-nos um entendimento mais exacerbado acerca do que tem levado outros países como até mesmo os de sistema jurídico romano-germânico que não reconhece como legítima a aplicação da responsabilidade penal da pessoa jurídica, a fazerem a adoção da referida modalidade, como apresenta-se neste caso o Brasil. A responsabilidade penal da pessoa jurídica tem se tornado nas últimas décadas um assunto frequentemente discutido em meio ao ordenamento jurídico, em razão do crescimentoacelerado da sociedade, que de certa forma acaba influenciando direta e indiretamente no crescente avanço da indústria e tecnologia. Neste sentido, é necessário que o desenvolvimento e a proteção aos bens jurídicos estejam em conformidade, servindo ao disposto constitucional da responsabilização penal juntamente da cível e administrativa, como sistema de controle. Entretanto, mesmo com o dispositivo constitucional que trata especificamente deste instituto, apenas com a criação da Lei Federal 9.605 de 1998 que se obteve um aprofundamento maior quanto a discussão da imputabilidade penal da pessoa jurídica de direito privado. A referida lei regulamentadora, dispõe sobre as sanções penais e administrativas decorrentes de condutas e práticas que resultem lesão ao bem jurídico tutelado, advindas do ente coletivo. Dessa forma, importa-nos realizar um aprofundamento no estudo desse tema, afim de verificar se é possível aplicar a modalidade de responsabilização penal da pessoa jurídica no sistema jurídico brasileiro, em razão de crimes cometidos contra o meio ambiente. 7 2 RESPONSABILIDADE PENAL DA PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PRIVADO 2.1 CONCEITO DE PESSOA JURÍDICA E SUA DISTINÇÃO DA PESSOA NATURAL FÍSICA Inicialmente, importa-nos conceituar para melhor entendimento no decorrer deste trabalho, o que é a pessoa jurídica, especificamente as de direito privado. Dito isto, nada mais esclarecedor do que elucidarmos o conceito de pessoa jurídica de direito privado conforme Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho (2009, p. 182): [...] podemos conceituar a pessoa jurídica como sendo o grupo humano, criado na forma da lei, e dotado de personalidade jurídica própria, para a realização de fins comuns. Enquanto sujeito de direito, poderá a pessoa jurídica por seus órgãos e representantes legais, atuar no comércio e sociedade, praticando atos e negócios jurídicos em geral. De acordo com o aludido conceito, constata-se que a pessoa jurídica se funde através de uma sociedade, se for para fins econômicos ou associação se for para fins ideais, formada por uma ou um determinado grupo de pessoas físicas, sendo estas denominadas seus representantes legais, constituindo, assim, um ente coletivo que é dotado de personalidade jurídica, podendo ser responsabilizado pelos atos a que der causa. Consideram-se pessoas jurídicas, entidades com uma personalidade emprestada pela lei, tornando-as habilitadas para serem sujeitos de direitos e obrigações. Caracterizam-se por atuarem na vida jurídica com personalidade distinta dos demais indivíduos que as integram. O Código Civil de 2002 trata sobre as entidades coletivas em seu Livro I, Título II, do art. 40 ao 69. No mesmo contexto, conforme conceitua o autor Requião (2003, p. 365) “a sociedade se forma pela manifestação da vontade de duas ou mais pessoas, que se propõem unir os seus esforços e cabedais para a consecução de um fim comum”. Enfatiza-se que o atual Código Civil brasileiro, de forma resumida, relaciona em seu artigo 44 as pessoas jurídicas de direito privado como sendo: as associações, sociedades e fundações, as organizações religiosas, os partidos políticos e as empresas individuais de responsabilidade limitada. 8 Ainda de acordo com o Código Civil, o seu artigo 45 explica que como pressuposto para a existência legal da pessoa jurídica de direito privado, tal fato ocorre quando da sua averbação do contrato social no correspondente registro, antecedendo quando for preciso, de anuência ou concessão do Poder Executivo, fazendo constar ainda todas as alterações que ocorrerem no contrato social da empresa durante a sua existência. Conclui-se assim, que a pessoa jurídica de direito privado se funde através de um fato social definido em legislação específica, dependendo da vontade humana criadora, observando a licitude dos seus objetivos . Distintamente, temos a pessoa natural física, que para o Direito Civil é um ser dotado de personalidade jurídica, com direitos e obrigações. Como dispõe o Código Civil brasileiro, em seu artigo 1º, “Toda pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil”, bem como seu artigo 2º elucida que “A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro”. O Código Civil também dispõe quando a mesma começa a exercer os atos da vida civil de forma relativa ou absoluta, na parte geral, que trata da pessoa natural, da personalidade e sua capacidade, elencados no artigo 3º e seguintes. Conforme o entendimento de Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho (2012, p. 142), para o Direito Civil, essa personalidade jurídica “[...] é a aptidão genérica para titularizar direitos e contrair obrigação, ou, em outras palavras, é o atributo necessário para ser sujeito de direito”. Por fim, ainda segundo Gagliano e Pamplona Filho (2012, p. 143), “A pessoa natural, para o direito, é, portanto, o ser humano, enquanto sujeito/destinatário de direitos e obrigações”. 2.1.1 Conceito de responsabilidade Antes de adentrar na temática em análise, de forma breve, demonstra-se essencial tecermos também o conceito de responsabilidade. Responsabilidade, conforme o dicionário, trata-se de um vocábulo concernente ao resultado de uma conduta praticada. 9 Sob a ótica jurídico-penal, significa um dever de arcar com os efeitos jurídicos advindos de um ato praticado, considerado crime. Por meio da responsabilidade, busca-se tornar determinada pessoa obrigada a reparar um dano ou atribuir-lhe uma penalidade, em razão daquele resultado a que deu causa. De acordo com Damásio de Jesus (2013, p. 514), a responsabilidade “[...]corresponde às consequências jurídicas oriundas da prática de uma infração”. Para concluir, na concepção de Magalhães Noronha (1980, p. 172): [...]é a obrigação que alguém tem de arcar com as consequências jurídicas do crime. É o dever que tem a pessoa de prestar contas de seu ato. Ele depende da imputabilidade do indivíduo, pois não pode sofrer as consequências do fato criminoso (ser responsabilizado) senão o que tem a consciência de sua antijuridicidade e quer executá-lo. 2.2 CONSIDERAÇÕES INICIAIS E FUNDAMENTOS Com o passar dos anos em decorrência ao desenvolvimento econômico, tecnológico e social desordenado, aperfeiçoaram-se também as formas de praticar delitos, surgindo assim modalidades de crimes que agora incorporam também estruturas empresariais. Sabe-se que a problemática em torno de se adotar ou não tal responsabilidade no ordenamento jurídico pátrio é um assunto antigo, e um dos mais polêmicos no Direito Penal, sendo o motivo pelo qual até hoje existem juristas e constitucionalistas que divergem quanto a aplicação dessa modalidade de responsabilidade, mas que necessita de uma solução mais viável e de certa forma benéfica, levando em conta o crescente aumento da criminalidade empresarial (crimes financeiros, ambientais e industriais). Importante ressaltar que o tema em questão tem sido cada vez mais presente em discussões no âmbito jurídico, principalmente em se tratando de matéria ambiental, levando em conta o grande aumento de ocorrências que vem afetando o meio ambiente nas últimas décadas de maneira frequente. De acordo com Luiz Regis Prado (2007), essa temática está sendo bastante discutida sobretudo por conta da função significativa e influenciadora que nos dias atuais a pessoa jurídica vem desenvolvendo na sociedade moderna, vinculando-se aos chamados crimes econômicos de maneira abrangente. O momento histórico em que se vive, marcado pela passagem do Estado individual de Direito para o Estado social de Direito, pelo surgimento de 10 novos riscos e incremento dos já existentes – característicos de uma sociedade de alta tecnologia, complexa e volátil -, e a indiscutível relevância desses bens jurídicosde natureza transindividual – indispensáveis para a existência e o desenvolvimento do homem e da sociedade -, justificam plenamente a necessidade de interferência do Direito Penal – de forma seletiva, tecnicamente correta e limitada-, como verdadeira ultima ratio do ordenamento jurídico (PRADO, 2005, p. 7). Na medida que vem surgindo essa nova modalidade de crimes que alguns juristas tem denominado como fenômeno da criminalidade lato sensu (ordem econômica, relações de consumo, ambiente), identificou-se a necessidade de aperfeiçoamento nos mecanismos de tutela. No que se refere ao meio ambiente, por exemplo, a autora Márcia Elayne Berbich de Moraes (2004, p. 34) expõe que: A visão catastrófica da “realidade” ambiental levou às novas exigências que os grupos ecológicos fizeram para proteção do meio ambiente, as quais foram respondidas pelo Estado social, mas de uma forma que não abarca a complexidade do problema. Uma das maneiras de solução do problema, por parte do Estado, foi a modificação do direito na área penal para atender questões com relação à área do meio ambiente. A autora ainda descreve que essas imposições feitas pelos movimentos ecológicos trouxeram resultados dentro do direito, por meio da inserção de regimes no que diz respeito ao meio ambiente, entre os quais, o surgimento de novos delitos ambientais abrangendo as pessoas jurídicas (MORAES, 2004). No parecer de Viviani (2008), as pessoas jurídicas passaram a ter maior destaque em meio a coletividade, sobretudo as sociedades empresárias, em razão da importância dos empreendimentos que vem emitido em suas relações negociais. Essa delinquência econômica é corolário de uma nova espécie de Direito Penal, que Hassemer veio a chamar de Direito penal moderno, cujas características são diversas do Direito Penal tradicional (v.g., furto, homicídio, estupro etc), ultrapassando os direitos individuais universais [...] (VIVIANI, 2008, p. 38). Segundo essa nova espécie de mecanismo de tutela penal, levando em conta as modificações no âmbito da criminalidade, ou seja, crimes que vão além do domínio normal da pessoa física (estupro, homicídio) e que afetam a sociedade de forma ampla e coletiva, o legislador viu-se forçado a fazer uma alteração no sistema jurídico, “deixando de lado”, podemos assim dizer, os dogmas do direito penal e a aplicação de penalidades, descendentes de um direito penal tradicional, onde baseava-se, até o momento, que apenas a pessoa humana poderia integrar o polo ativo de um crime. 11 Um dos motivos foi pelo fato de que: [...] essas entidades, ao mesmo tempo em que beneficiam a coletividade, podem, em determinadas situações, causar-lhe danos de consideráveis proporções, como por exemplo, nas situações em que seus membros a utilizam para prejudicar o meio ambiente, classificado pelo constituinte brasileiro como “bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida” (art. 225, caput, da Constituição) (VIVIANI, 2008, p. 38-39). A forma encontrada pelo legislador, em um primeiro momento, foi através da sua aplicação na lei constituinte, justamente por se tratar da proteção de bens transindividuais e danos de caráter difuso, reconhecendo a imputabilidade penal, cível e administrativa da pessoa jurídica. A instigação à responsabilização criminal do ente coletivo se deve, também, em razão das dificuldades dogmáticas encontradas no Direito Penal tradicional para combater essa nova espécie de criminalidade, cujas pessoas físicas causadoras do dano são dificilmente identificadas e punidas (VIVIANI, 2008, p. 39) Porém, como se vê até o momento, o problema demonstra-se mais complexo do que o imaginado, e longe de ser resolvido, levando em conta a reprovabilidade por parte de alguns juristas, em relação a essa aplicação no âmbito da norma penal e com uma discussão até hoje existente, quanto ao fato de ser considerado passível de aceitação a aplicação do instituto da responsabilidade penal da pessoa jurídica no Brasil. Vale ressaltar que os mecanismos de proteção ambiental e da ordem econômica, necessitam de um equilíbrio e compatibilidade das necessidades do desenvolvimento social, tecnológico e econômico com as de proteção e conservação dos direitos difusos. É fundamental ressaltar a importância da atividade empresarial no desenvolvimento sócio-econômico de um país. A tutela do meio ambiente, em sede de responsabilidade penal, deve conciliar a proteção desse direito difuso com o processo econômico, a partir da empresa como atividade organizada de produção e circulação de bens e serviços. Trata-se de buscar a efetivação do desenvolvimento sustentável (OSINSKI JÚNIOR, 2008, p. 11). Isto posto, trataremos em momento oportuno desta pesquisa, de forma mais aprofundada, as teorias que englobam o tema, o preceito constitucional e as legislações específicas que englobam a responsabilização penal da pessoa jurídica de direito privado. 12 2.3 A (IM)POSSIBILIDADE DE CRIMINALIZAR A PESSOA JURÍDICA NO DIREITO PENAL BRASILEIRO CONFORME A DOUTRINA PENAL Até recentemente, em relação a responsabilização penal da pessoa jurídica, predominava na doutrina penal brasileira o princípio societas delinquere non potest (as sociedades não podem delinquir), advindo de um sistema de direito romano-germânico, onde não se reconhece esse tipo de responsabilidade, partindo do pressuposto de que essas entidades não constituem personalidade jurídica para serem imputáveis penalmente, sendo passíveis apenas de mera punição na esfera cível e administrativa. De acordo com o autor Luiz Regis Prado (2011, p. 131): 2. Em termos científicos, tem-se como amplamente dominante, desde há muito, no Direito Penal brasileiro, como nos demais Direitos de filiação romano-germânica, a irresponsabilidade penal da pessoa jurídica, expressa no conhecido apotegma societas delinquere non potest, verdadeira reafirmação dos postulados da culpabilidade e da personalidade das penas. Isso quer dizer que os crimes praticados no âmbito da pessoa jurídica só podem ser imputados criminalmente às pessoas naturais na qualidade de autores ou partícipes. Para Rodrigo Sánchez Rios (2011, p. 204): A importância do ente coletivo empresarial é evidente no âmbito dos delitos econômicos, onde se propugna a aplicação de sanções diretamente ao mesmo. Sem fazer muito esforço redimensiona a discussão em torno do dogma societas delinquere non potest. A ideia desse princípio que se relaciona com a teoria da ficção criada por Savigny, decorre do tipo de sistema jurídico implantado no Brasil, o Civil Law. Conforme explicam Eugênio Pacelli e André Callegari (2017, p. 224): A problemática da definição da responsabilidade penal da pessoa jurídica se apresenta no cenário jurídico-penal atual, como um divisor de doutrinas. Ou seja, apresenta-se inalcançado um ponto comum em relação à possibilidade ou não de se proceder a essa responsabilização, justamente por não ser tarefa fácil a adequação da pessoa jurídica à teoria historicamente desenvolvida do Direito Penal. Ainda quanto ao princípio societas delinquere non potest, criado para estabelecer que as pessoas jurídicas não possuem capacidade no cometimento de crimes, o autor Cezar Roberto Bitencourt (2018, p. 273) expõe os argumentos em que se funda a sua criação e aplicação: A inadmissibilidade da responsabilidade penal das pessoas jurídicas – societas delinquere non potest – remonta a Feuerbach e Savigny. Os dois principais fundamentos para não se reconhecer a capacidade penal desses 13 entes abstratos são: a falta de capacidade “natural” de ação e a carência de capacidade de culpabilidade. Na mesma ideia, de acordo com Pierangeli (1999), visto que o mecanismo de tutela penal só dispõe sobre as ações praticadas pela pessoa humana, compreende-se que o ente coletivo não possui capacidade de agir por si só. Por outro lado,contrariando o apotegma societas delinquere non potest encontramos autores afirmando que “a pessoa jurídica não é um ser artificial, criado pelo Estado, mas sim um ente real, independente dos indivíduos que a compõe” (CAPEZ, 2008, p. 52). Corroborando com o mesmo raciocínio, Gomes (2015, p. 199) diz que, “[...] o Direito Penal, neste entendimento, trata a pessoa jurídica como ente autônomo, provido de vontade própria e capacidade de deliberação, estando portando suscetível a aplicação da norma penal”. A corrente contrária a responsabilidade penal das pessoas jurídicas também elenca alguns princípios que estariam sendo violados, sendo estes, o princípio da responsabilidade pessoal, que coíbe a penalização de um indivíduo pelas ações de terceiros, pois o mesmo só deveria ser responsabilizado penalmente pelos atos a que der causa. Outro princípio apresentado para fundamentar essa contrariedade é o princípio da intranscedência da pena e da culpa, formulado na ideia de que “a mesma não possa ser transmitida para terceiros, deixando claro que a pena não pode passar da pessoa do criminoso” (GOMES, 2015, p. 33). Dessa forma, vislumbra-se que os doutrinadores contrários à essa modalidade de responsabilidade, apresentam indagações em relação ao cumprimento da pena de prestação de serviços, sobre quem cumpriria a mesma (o representante legal ou a pessoa jurídica?), como também se essa pena não estaria ultrapassando o autor do fato criminoso. Essa parcela da doutrina que condena a criminalização da pessoa jurídica diz que os representantes legais é que seriam penalizados, caracterizando uma violação ao princípio constitucional (elencado no art. 5º, inciso XLV, da CF) da responsabilidade pessoal ou da personalidade da pena, visto que ficaria caracterizada essa violação caso fosse aplicada a pena de liquidação forçada da 14 sociedade, sob o argumento de estar atingindo terceiros, sendo estes, como exemplo, os funcionários e acionistas que integram o corpo da sociedade empresária. A responsabilização penal, contrária da civil e tributária por exemplo, só poderia incidir sobre quem praticou ou fez parte do fato juridicamente condenável (BIANCHINI; MOLINA; GOMES, 2009). Assim, faz-se mister dizer que o Código Penal, em seu artigo 13, que trata da relação de causalidade do crime, dispõe que somente é possível imputar um crime contra autor do fato, como também só é possível punir quem praticou materialmente esse mesmo fato juridicamente condenável. Os autores Alice Bianchini, Antonio García-Pablos de Molina e Luiz Flávio Gomes (2009, p. 363) ainda fazem uma análise mais aprofundada quanto ao princípio da responsabilidade pessoal: O princípio da responsabilidade pessoal significa a exigência de um autêntico injusto típico, de realização pessoal – direta ou mediata – ou de participação pessoal em um tipo de injusto (com seus aspectos objetivos e subjetivos). No mesmo sentido, encontramos autores que afirmam estar-se tentando, a partir da criminalização de pessoas jurídicas, o desconhecimento do princípio nullum crimen sine conducta do Direito Penal, princípio esse baseado na ideia de que sem uma conduta (ação humana) não há que se falar em crime consumado, do contrário, o delito poderia ser considerado qualquer coisa, “abarcando a possibilidade de penalizar o pensamento, a forma de ser, as características pessoais etc” (ZAFFARONI; PIERANGELI, 2013, p. 370). Entretanto, de acordo com Gomes (2015) o legislador, na verdade, teve a intenção de comprovar que as pessoas jurídicas cometem delitos, e por isso, deverão ser imputáveis e penalizadas. Como já dito anteriormente, outro fundamento aplicado a tese da irresponsabilidade penal das pessoas jurídicas baseia-se no princípio da personalidade das penas, entretanto, de acordo com Fausto Martin de Sanctis (1999, p. 41-42): [...] ao contrário do que se possa imaginar, esse princípio serve de argumento para justificar a reprimenda dos entes coletivos. Seria uma enorme injustiça punir os dirigentes por decisões que são, em verdade, fruto do grupamento. Assim, sancionar apenas os dirigentes por atos que socorrem todo o grupamento, deve ser caracterizado como um atentado ao princípio da personalidade das penas, já que é a pessoa jurídica que 15 deveria, inclusive, ser punida. O princípio da personalidade da responsabilidade deve ser entendido, apenas, como dever de responsabilização do autor de um ato ilícito, ou seja, deve obrigar a persecução criminal contra o verdadeiro culpado, seja a pessoa física que se esconde atrás de uma pessoa jurídica, seja esta que se oculta naquela. A doutrina brasileira trabalha com algumas teorias de pensamentos que divergem no que diz respeito ao reconhecimento da personalidade das pessoas jurídicas para que se possa aplicar-lhes sanções de natureza penal. As principais teorias são as negativistas, que partem de uma ideia que não reconhece a personalidade da pessoa jurídica e as teorias afirmativistas, que contrariando a teoria negativista, reconhece a personalidade do ente coletivo tornando-o capaz de ser imputável penalmente. Trataremos aqui, as de maior importância para a presente pesquisa, quais sejam, a teoria da ficção legal e a teoria da realidade (organicista), sendo estas, as principais que se contrapõem em seu pensamento quanto a responsabilidade penal da pessoa jurídica de direito privado, podendo-se dizer, as que se encontram na raiz do problema. 2.3.1 Teoria da Ficção Legal Com relação a tese da irresponsabilidade penal da pessoa jurídica baseada na teoria da ficção, esta, sempre se fundou em três aspectos, sendo eles, a incapacidade de praticar uma ação, a incapacidade de adquirir culpabilidade e a incapacidade de sofrer uma pena. Conforme elucida o autor Luiz Regis Prado (2007, p. 269): A primeira, criada por Savigny, afirma que as pessoas jurídicas tem existência fictícia, irreal ou de pura abstração – devido a um privilégio lícito da autoridade soberana -, sendo, portanto, incapazes de delinquir (carecem de vontade e de ação). O Direito Penal considera o homem natural, quer dizer, um ser livre, inteligente e sensível: a pessoa jurídica, ao contrário, encontra-se despojada dessas características, sendo só um ser abstrato. Essa teoria afirma que o ente coletivo não possui motivação própria para agir, isso porque sua existência se dá através dos atos e decisões tomadas por terceiros, que no caso são os seus representantes legais, o que tornaria impossível a sua responsabilização penal. Como apontam Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho (2009, p. 185): 16 A teoria da ficção desenvolveu-se a partir da tese de WINDSCHEID sobre o direito subjetivo, e teve SAVIGNY como seu principal defensor. Não reconhecia existência real à pessoa jurídica, imaginando-a como abstração, mera criação da lei. Seriam pessoas por ficção legal, uma vez que somente os sujeitos dotados de vontade poderiam, por si mesmos, titularizar direitos subjetivos. De acordo com esse entendimento, a responsabilidade penal além de ser imputável apenas ao ser humano, trata-se de uma questão de imputabilidade subjetiva, diferentemente da responsabilidade civil onde aplica-se também de forma objetiva e independente da culpabilidade de quem pratica o ato. Na mesma ideia, a corrente contrária ainda leva em conta que caso haja uma imputação penal ao ente coletivo haveria, de certa forma, uma violação ao princípio da responsabilidade pessoal do direito penal, partindo do pressuposto de que não se pode penalizar alguém pelas ações de terceiros, pois quem executa os atos da pessoa jurídica são os seus representantes (pessoa física) que agem em seu nome. Sendo assim, nessa perspectiva, ficaria caracterizado a imputação por um crime que apenas teve como autores os representantes legais da pessoa jurídica. Em concordância com a teoriada ficção, os autores Eugênio Pacelli e André Callegari (2017, p. 223) explicam: Quanto aos fatos da natureza, não há dúvidas sobre a inexistência de conduta (ex.: avalanches, terremotos, que matam pessoas). Por isso se diz que, para fins de responsabilização penal, deve haver uma conduta humana, desinteressando, para o Direito Penal, os meros fatos da natureza. Nesse prisma, só poderia haver uma imputação penal ao indivíduo humano, que possui capacidade psíquica, de autodeterminação e vontade de ação, para que sejam responsáveis diretos pela conduta, ou seja, uma vontade objetivada. A pessoa jurídica seria no caso um mero ser abstrato, pois lhe falta consciência e vontade, não podendo atuar como autora ou partícipe de qualquer conduta punível em matéria penal. Portanto, se daria a entender que, a culpabilidade penal como juízo de reprovabilidade da conduta “[...] somente pode ter como objeto a conduta humana” (PRADO, 2007, p. 272). A realidade de sua existência se funda sobre as decisões de certo número de representantes que, em virtude de uma ficção, são consideradas como suas; e uma representação semelhante, que exclui a vontade propriamente dita, pode ter efeito em matéria civil, mas nunca em relação à ordem penal (PRADO, 2011, p. 130). 17 Assim, não seria possível fazer uma equiparação da vontade da pessoa jurídica com a vontade do ser humano, como aponta a teoria da ação do direito penal, isso porque a vontade do ente coletivo estaria vinculada com a do seu órgão ou representante. Corroborando com essa ideia, Eugênio Pacelli e André Callegari (2017, p. 216-217) afirmam que: A lei da causalidade, que rege as ciências da natureza, baseia-se numa relação de causa e efeito. Ação é o movimento corporal voluntário que causa uma modificação no mundo exterior. A manifestação de vontade é toda conduta voluntária – ação ou omissão – resultante de um movimento do corpo. Deve-se entender a manifestação de vontade como toda realização ou omissão voluntária de um movimento corpóreo que, livre de qualquer violência, está motivada pelas representações mentais do agente; em suma, é a vontade objetivada. Dessa forma, a pessoa jurídica careceria desse impulso voluntário de tomar uma decisão e de ter a capacidade para agir, não podendo se enquadrar como sujeito ativo de crime, pois a conduta implicaria necessariamente vontade, e no caso, a vontade existiria apenas por parte do seu representante. [...] para saber se existe uma ação, bastaria comprovar a existência de uma conduta voluntária – no sentido de espontânea, e não forçada – e a causação ou não evitação de uma modificação danosa, perceptível pelos sentidos, no mundo exterior. Para a existência da ação é suficiente saber que o autor “queria algo” (PACELLI; CALLEGARI, 2017, p. 217). Com isso, as ações e decisões tomadas em nome da pessoa jurídica não seriam concluídas por ela mesma, apenas vinculando-a aos atos das pessoas que atuam em seu nome. Neste sentido, responsabilizar a pessoa jurídica significaria então uma culpabilidade baseada em um fato alheio, de forma presumida, o que traria também uma violação ao princípio da culpabilidade segundo alguns doutrinadores, pois, “[...] não se trata de uma autoria da própria pessoa jurídica” (PRADO, 2007, p. 271). Não se pode falar de uma vontade em sentido psicológico no ato da pessoa jurídica, o que exclui qualquer possibilidade de admitir a existência de uma conduta humana. A pessoa jurídica não pode ser autora de delito, porque não tem capacidade de conduta humana no seu sentido ôntico-ontológico (ZAFFARONI; PIERANGELI, 2013, p. 371). Seguindo a mesma ideia, em conformidade com a teoria da ficção: Consequentemente, sendo criação do Direito objetivo, elaborada pelo Estado ou uma concessão deste, às pessoas jurídicas faltam condições psíquicas de imputabilidade. Quem por elas atuam são os seus diretores ou representantes, que penalmente respondem por elas (PIERANGELI, 1999, p. 21). 18 Na concepção de Pierangeli (1999), é inalcançável que um ente coletivo possa agir de forma dolosa ou culposa, pois, não se pode confundir a vontade da pessoa jurídica com a de uma pessoa natural, caso contrário, o autor conclui que “Teríamos, então, uma ficção de outra ficção, ou uma duplicidade de ficções, uma superposta à outra, já que nenhum ordenamento jurídico-penal concebe a pessoa jurídica fora desse plano” (PIERANGELI, 1999, p. 23). Sabendo-se que os países ligados ao direito romano-germânico contêm uma ideia individualista do direito penal, dentre os quais o Brasil, segundo o autor Rodrigo Sánchez Rios (2011, p. 205), “[...] em um mero confronto com os princípios gerais de imputação e as estruturas dogmáticas criadas para os delitos tradicionais, constata-se a inviabilização da responsabilização penal a um ente coletivo”, pelo menos no que diz respeito a sua implementação no atual sistema jurídico-penal brasileiro. Sendo assim, levando em conta tais considerações expostas por parte da doutrina, que se diz contrária a aplicação do instituto em análise, é de se concluir que só seria possível a inclusão do mesmo, depois que o atual sistema jurídico- penal brasileiro sofrer uma adaptação para que seja admitido sem que haja interferência aos princípios e teorias já criadas no nosso sistema penal, pois, como já dito anteriormente, o mesmo possui total concordância apenas em se tratando da imputabilidade penal da pessoa física. Contudo, “nas novas indagações referentes à evolução do Direito Penal Econômico, a criação de sanções a entes coletivos irá desempenhar uma função de extrema relevância” (RIOS, 2011, p. 205). 2.3.2 Teoria da Realidade (organicista) Apresentada a teoria da ficção legal, que até recentemente predominava em relação ao tema em estudo, por outro lado, vem tomando cada vez mais proporção no ordenamento jurídico penal brasileiro, a teoria da realidade, também chamada de teoria organicista, tendo Otto Gierke como seu precursor, baseando-se em pressupostos diversos à teoria da ficção. Para essa teoria, a pessoa jurídica seria um ser real que possui vontade objetivada e que não seria a soma de vontades dos seus representantes, tendo 19 personalidade jurídica própria, e capacidade de praticar atos criminosos, podendo ser imputável penalmente. [...] as teorias da realidade, cujos defensores mais conhecidos são Otto Gierke e Zitelmann, admitem as pessoas jurídicas como entidades de existência indiscutível, distintas dos indivíduos que as compõem, caracterizadas por finalidades específicas. O objetivo dessas teorias é afirmar e demonstrar a real existência de um ente coletivo, embora não signifique que seja reconhecida a um grupamento uma existência exatamente igual a uma pessoa física. Ou seja, significa estabelecer a existência da pessoa jurídica e reconhecer uma vocação de ela ser, como uma pessoa física, um sujeito de direito. Na verdade, pouco a pouco se verificou que na pessoa jurídica há uma vontade superior, expressa por seus órgãos, demonstrando possuir uma existência independente dos membros que a compõem (PERES, 2005, p. 65). Conforme expõe a autora Sheila Jorge Selim de Sales (2011, p. 219) “tem-se assistido emergente movimento penalístico, centrado sobre o abandono do tradicional princípio segundo o qual societas delinquere non potest”. Esta orientação doutrinária, imbuída de viva preocupação com o crescimento da criminalidade praticada por meio desses entes, cuja lesão recai, de modo especial, sobre bens jurídicos coletivos, causa dano mais intenso e, de consequência, deve ser reprimido de forma mais enérgica no âmbito jurídico-penal (SALES, 2011, p. 219). De acordo com José Henrique Pierangeli (1999, p. 22): Os defensores desta teoria afirmam que a impossibilidade de aplicar-se sanções penais às pessoas jurídicas, aventada pela doutrina mais antiga, está, atualmente, perfeitamentecontornada. Além de penas alternativas preconizadas em substituição às de detenção e de reclusão, formas de sanção mais tradicionais, dispõe o Direito Penal, modernamente, além da multa, da possibilidade de adoção de outras como a dissolução ou suspensão das atividades por tempo determinado. Justificando o emprego da teoria da realidade, o autor Capez (2008) afirma ser possível enquadrar a pessoa jurídica como autor de um crime, visto que não se considera incontestável o princípio societas delinquere non potest, no âmbito jurídico. O mesmo autor ainda explica que, no âmbito da criminalidade realmente existem delitos que só possibilitam enquadrar como autor do fato a pessoa física, tendo em vista não ser possível transcender o domínio normal da pessoa humana, como é o caso do estupro e homicídio (CAPEZ, 2008). Contudo, encontramos crimes que são passíveis de serem praticados pelos entes morais, característicos da criminalidade empresarial, como por exemplo os crimes ambientais e de fraudes, em que são praticados com intuito de se obter vantagem para a pessoa jurídica. 20 Fábio Roberto Peres (2005, p. 66) explica que: [...]os defensores da teoria da realidade que afirmam que a pessoa jurídica possui vontade e atuação própria, entendem que a responsabilização penal deve ser aplicada à corporação, no caso do delito ser cometido no interesse dela. Vale dizer que a personalidade jurídica atribuída aos entes coletivos pelo direito decorre do fato de considerá-los seres reais, os quais se exprimem por meio de características especiais. Possuem patrimônio diverso de seus membros, vontade própria e manifestam-se pelos seus órgãos, de molde que a sua existência é fruto de uma realidade, não só no plano jurídico, mas também na seara social. Agem, portanto, independentemente, apresentando-se como perfeitos sujeitos de direito, já que podem contrair obrigações e possuir direitos, tanto quanto as pessoas físicas. Na perspectiva de Viviani (2008), a doutrina apoiadora da teoria organicista fundamenta a obrigação de condenar no âmbito penal o ente coletivo, não somente por conta do aumento de crimes ocorridos na esfera empresarial, como também pelo fato de que na maioria das vezes encontra-se uma grande dificuldade em identificar exatamente o culpado pelos danos causados, sobretudo porque estes crimes são constantemente praticados por pessoas naturais, que ocultam-se atrás da pessoa moral. Conforme dito acima, as pessoas jurídicas possuem vontade própria e se exprimem pelos seus órgãos. Essa vontade independe da vontade de seus membros e constitui uma decorrência da atividade orgânica da empresa. Conclui-se, portanto, que diante dessa vontade própria é possível o cometimento de infrações, de forma consciente, visando à satisfação de seus interesses (PERES, 2005, p. 83). Levando em consideração a ausência de condutas tipificadas como crimes imputáveis à pessoa jurídica na esfera penal anteriormente ao que, alguns doutrinadores afirmam, se adotou na Constituição Federal de 1988, via-se uma brecha para a ocorrência de delitos, que em caso de condenação, não acarretariam uma medida suficientemente eficaz, para desestimular e coibir a prática de crimes empresariais de ordem econômica e ambiental. Os principais argumentos favoráveis para que o ente coletivo possa figurar no pólo passivo de uma ação penal podem ser resumidos sob duas facetas: a primeira delas consiste em atribuir à pessoa jurídica vontade própria, admitindo-se que ela, por este motivo, possa praticar uma conduta criminosa e agir com culpabilidade própria (distinta da culpabilidade tradicional, inerente à pessoa jurídica). A outra forma corresponde a responsabilizar a pessoa jurídica somente nos casos em que se comprovar a conduta delituosa do representante que atuou em seu nome, vale dizer, a conduta delituosa praticada pela pessoa física (ex: sócio, membro da entidade) seria emprestada à pessoa jurídica, a fim de que a responsabilidade penal recaísse nesta (VIVIANI, 2008, p. 61). 21 Extrai-se da ideia do autor que a primeira hipótese se basearia no fato de que a pessoa jurídica poderia ser condenada penalmente, pois seria ela quem toma diretamente as decisões que decorrem de seus atos possuindo uma responsabilidade autônoma em relação a pessoa física. Já na segunda hipótese dá-se o entendimento de que a entidade seria imputável penalmente quando seu representante, mediante comprovação, cometesse um delito agindo em nome da pessoa jurídica, assim, a responsabilidade penal pelo resultado recairia sobre a pessoa jurídica. Ainda, conforme o apontamento de Viviani (2008, p. 61) para fundamentar essa possibilidade “[...] tem-se afirmado que, se uma pessoa jurídica pode realizar um contrato na esfera cível, respondendo civilmente pelos seus atos, nada obstaria que também pudesse ter capacidade para cometer crimes”. Com o advento do Direito Ambiental e o reconhecimento do meio ambiente ecologicamente equilibrado como direito difuso, a reivindicação da repressão penal tornou-se lugar comum também em matéria ambiental, por se supor que a sanção penal é mais severa e eficiente na prevenção de atividades degradantes. Colhe-se evidência inconteste disso no Direito Internacional Público (FELICIANO, 2005, p. 210). Colhe-se, a partir dessa ideia, o entendimento de que no âmbito do direito ambiental, ao contrário do que se vê na esfera do direito penal, o instituto da imputação penal da pessoa jurídica, decorrente deste tipo de crime, foi muito mais aceito pela doutrina e inclusive pelo legislador, que teria consolidado a responsabilização penal do ente coletivo com a criação da Lei 9.605/98, possibilitando a penalização da pessoa jurídica e tipificando quais os crimes e punições são aplicáveis a mesma. Os influxos de modernidade jurídica que dimanaram da criminalidade econômica foram, sem dúvida, primogênitos. Mas a criminalidade ambiental, objeto de preocupações mais prementes, adiantou-se à sua congênere e bradou pela inovação legislativa, alcançando-a entre nós, com a instituição de crimes corporativos na lei ordinária, antes mesmo que os tivéssemos na esfera da delinquência econômico-financeira (FELICIANO, 2005, p. 210). Quanto aos critérios de culpabilidade que abrangem a teoria favorável a imputação penal da pessoa jurídica para explicar tal possibilidade, o autor ainda afirma que “[...]a mensuração da culpabilidade de uma pessoa jurídica pode ser obtida pela comparação do comportamento da empresa ré com o de outras empresas de mesmo porte, sob mesmas circunstâncias” (FELICIANO, 2005, p. 216). [...] uma vez imputada a atividade da empresa a um tipo penal ambiental de perigo abstrato, pode-se cogitar de absolvição, por causa extralegal 22 exculpante (inexigibilidade de conduta diversa), se todas as empresas de mesmo porte têm, na localidade, idêntico procedimento, a que não objetam as autoridades administrativas (FELICIANO, 2005, p, 216). Um meio de solução que o autor apresenta seria o de que, as decisões com este entendimento teriam a capacidade de atribuir um aspecto objetivo em relação a essa responsabilização, reforçando através de decisões reiteradas, um modelo de sistema empresarial consciente onde essas entidades relacionariam de maneira progressiva (FELICIANO, 2005). Ainda no âmbito da tese defensora, de que é possível a responsabilidade penal da pessoa jurídica, há ainda alguns autores que admitem esta possibilidade com a adoção da teoria do ricochete, baseada na tese do reflexo, em que poderia também haver uma dupla imputação, da pessoa jurídica e seu representante legal. Para tal teoria, a pessoa jurídica só poderia ser responsabilizada criminalmente caso aferida a conduta dolosa ou culposa da pessoa física (representante da empresa) que praticou o ilícito em proveito da entidade. Na realidade, a conduta delituosa atribuída à pessoa jurídicaseria “emprestada” da conduta da pessoa física (VIVIANI, 2008, p. 64). Conforme o mesmo autor, caso fosse adotada a teoria do ricochete, a mesma não violaria princípios constitucionais, qual sejam, o da conduta humana e da culpabilidade, pois só haveria a responsabilização do ente coletivo mediante a comprovação de que o seu representante legal, agiu de forma criminosa estando em seu comando (VIVIANI, 2008). Nesta linha de pensamento, sustenta-se que as pessoas jurídicas têm, não apenas capacidade de ação, mas também, da própria culpabilidade. Assim, partindo da premissa de que a pessoa física é o cérebro da entidade coletiva, observa-se que o princípio da culpabilidade não restaria violado, porque a culpabilidade seria proveniente da manifestação da pessoa natural que a integra (VIVIANI, 2008, p. 65). De forma breve, importa-nos salientar, ainda, que além das teorias já apresentadas, encontramos também a teoria da realidade técnica que possui uma ideia intermediária entre as teorias da ficção de Savigny e a teoria da realidade (organicista) de Gierke. Também encontramos a teoria negativista, a qual não admite a existência entidades empresárias, partindo do pressuposto de que somente as pessoas físicas (naturais) possuem capacidade de direitos e obrigações, e portanto, “não se concebe uma coletividade orgânica independente dos indivíduos, seus participantes, com personalidade jurídica, pois seus bens reputam de propriedade comum para fruição de seus formadores” (PERES, 2005, p. 65). 23 Conforme Viviani (2008), essa teoria prega que o ente coletivo seria de fato uma realidade, porém, essa realidade imputada seria apenas técnica, ficando ligada à contento de seus representantes legais e por conta disso, o motivo pelo qual foi criada teria enfoque no cumprimento de interesses do responsável pela sua criação. Diante de tais divergências que a doutrina expõe em relação a matéria em estudo, a autora Anny Ramos Viana (2013) conclui que, com base nos pressupostos e parâmetros que a doutrina considera essenciais para criminalizar a pessoa jurídica, torna-se compreensível a existência de diversos contrapontos, visto que o direito penal tradicional apresenta-se incapaz no enfrentamento dessa modalidade de crime. Feitas essas considerações, trataremos no segundo capítulo a respeito da institucionalização dessa modalidade de responsabilidade na legislação constitucional brasileira, fazendo uma análise da sua aplicação juntamente com as demais leis infraconstitucionais que compõem a matéria, também sob a ótica da doutrina. 24 3 ANÁLISE A PARTIR DA CONSTITUIÇÃO E DA LEI INFRACONSTITUCIONAL BRASILEIRA 3.1 O INSTITUTO À LUZ DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 Foi com base na necessidade de proteção aos direitos difusos e coletivos, que o legislador veio a instituir na Carta Magna a possibilidade de se responsabilizar penalmente a pessoa jurídica de direito privado, pelos atos praticados contra a ordem econômica, financeira e o meio ambiente. Conforme enfatiza Feliciano (2005), a temática que engloba a responsabilidade penal da pessoa jurídica foi debatida de forma escassa na doutrina brasileira e principalmente sob o prisma do Código Penal, popularizando-se após a promulgação da Constituição Federal de 88. De acordo com Freitas (1997, apud LECEY, 1998, p. 43), o direito comparado expõe 3 tipos de regimes quanto a responsabilização penal da pessoa jurídica, sendo estes: a) primeiro modelo: o que admite como regra a responsabilidade da pessoa jurídica (Estados Unidos da América, Reino Unido, Canadá, Austrália, Holanda e Noruega); b) segundo modelo: não aceita tal responsabilidade, pelo menos no campo estritamente penal, como Itália, Alemanha e as antigas repúblicas socialistas; c) terceiro modelo: consagra um “princípio da especialidade”, admitindo, a par do princípio geral da individualidade da responsabilidade penal, um quadro de situações, definidas expressa e casuísticamente pelo legislador, de responsabilização penal das pessoas jurídicas como Portugal, França (no Código Penal desde 1/3/1993), Luxemburgo e Dinamarca. O Brasil, agora, enquadra-se no terceiro modelo, criminalizando a pessoa coletiva em matéria de ambiente. Por muito tempo prosperou em nosso ordenamento jurídico o princípio societas delinquere non potest, mas, somente após a promulgação da Constituição Federal de 1988 é que cogitou-se na adoção, no sistema jurídico brasileiro, dessa nova modalidade de criminalização das pessoas jurídicas de direito privado, advindo do modelo de direito penal moderno que se aplica em alguns países de sistema jurídico da common law. No Brasil, até a promulgação da Constituição Federal de 1988, conquanto houvesse tímidas discussões no meio jurídico, o pensamento dominante trilhava no sentido de rejeitar a possibilidade de a pessoa jurídica ingressar no pólo passivo de ações penais (VIVIANI, 2008, p. 41). 25 O legislador constituinte teria estabelecido o princípio da responsabilidade penal dos entes coletivos, apontando de forma expressa a aplicação de sanções de cunho penal e administrativo às pessoas físicas e jurídicas que praticarem condutas ou exercerem atividades consideradas lesivas aos bens difusos e coletivos. Os dispositivos que tratam do assunto na Constituição Federal de 1988, estão situados no título VII capítulo I que trata da ordem econômica e financeira, bem como dos princípios gerais da atividade econômica e no capítulo VI que trata de matéria do meio ambiente: Artigo 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em Lei. [...]§ 5º. A Lei, sem prejuízo da responsabilidade individual dos dirigentes da pessoa jurídica, estabelecerá a responsabilidade desta, sujeitando-a às punições compatíveis com sua natureza, nos atos praticados contra a ordem econômica e financeira e contra a economia popular. Artigo 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. [...]§ 3º. As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados, aplicando-se relativamente aos crimes contra o meio ambiente, o disposto no artigo 202, § 5º (BRASIL, 1988). Estes foram os artigos introduzidos na legislação constitucional brasileira, que trouxeram em pauta a discussão acerca da possibilidade de responsabilizar também na esfera penal as pessoas jurídicas de direito privado, pelo menos no que se refere a matéria ambiental, tendo rompido com aqueles princípios que prevaleciam em posição contrária a imputabilidade penal dos entes coletivos. Entretanto, salienta-se que: [...]estas disposições não são auto-aplicáveis, necessitando de leis complementares que regulem especificamente a matéria. Assim, permite-se que a legislação infraconstitucional estipule sanções penais cabíveis. O primeiro passo já fora dado, incorporando as tendências de um Direito Penal moderno (OSINSKI JÚNIOR, 2008, p. 26). Quanto ao tema em estudo, vale ressaltar que a criação do capítulo constitucional que trata do meio ambiente, recepcionou determinados princípios já previstos em acordos e tratados internacionais em que o Brasil é signatário, sendo a legislação infraconstitucional a responsável por criar instrumentos para que fosse viável a sua aplicação. 26 São três os princípios em que se baseia a política ambiental brasileira, “o princípio da prevenção (que se diferencia de precauçãoe cautela), o princípio do desenvolvimento sustentável e o princípio do poluidor-pagador” (GOMES, 2015, p. 192). O princípio da prevenção preconiza a adoção de uma ação ou omissão antecipada ao fato danoso, com a intenção de, diante do conhecimento dos possíveis danos que uma atividade potencialmente lesiva ao meio ambiente possa acarretar, haja, a partir da identificação dos danos futuros mais prováveis, a adoção de medidas ou a abstenção de conduta, para eliminar ou pelo menos reduzir o potencial destes danos virem a se concretizar (GOMES, 2015, p. 192 – 193). Ainda no mesmo contexto: [...] destaca-se igualmente o princípio do desenvolvimento sustentável, que teve notória importância a partir da constatação de que os recursos ambientais não são inesgotáveis, tornando-se inadmissível a exploração de atividade econômica alheia a esse fato. Por isso, o princípio da sustentabilidade, como também é conhecido, identifica a necessidade de um ponto de equilíbrio entre as dimensões do desenvolvimento social, do crescimento econômico e da utilização dos recursos naturais (GOMES, 2015, p. 193). Em relação ao princípio do poluidor-pagador, o mesmo possui dois campos, o de caráter preventivo, visando impedir que ocorra danos ao meio ambiente e o de caráter repressivo, que busca instituir meios de reparações contra danos que venham a ocorrer (GOMES, 2015). Observa-se que tais princípios vieram para assegurar uma efetividade na aplicação da norma constitucional e infraconstitucional visando a proteção do meio ambiente. O autor Guilherme Guimarães Feliciano (2005, p. 205) explana: À vista do modelo constitucional de Direito Penal recepcionado pelo art. 5º da CRFB (atrelado à pessoa física e à sua culpabilidade, conforme os incisos XLV e XLVI), é imperativo concluir que a previsão de responsabilidade penal de pessoa jurídica foi insculpida à guisa de exceção. Consequentemente, reserva feita aos crimes contra a ordem econômica e financeira e aos crimes ambientais, está vedado ao legislador ordinário definir responsabilidade penal das pessoas jurídicas ou cominar-lhes sanções tipicamente penais. Mas essa vedação admite revisões por emenda constitucional, já que não traduz, “a contrário sensu”, garantia individual ou direito fundamental da pessoa humana (art. 60, par. 4º, IV, da CRFB), e sim uma garantia coletiva adstrita às pessoas jurídicas. Ademais, tampouco a pena aplicada à pessoa jurídica poderá passar da pessoa do condenado para atingir pessoas naturais (art. 5º, XLV). Dessa forma, o autor acredita que essa previsão da responsabilidade penal da pessoa jurídica, foi elencada no dispositivo constitucional como uma exceção, visando sua aplicação exclusivamente contra crimes de caráter econômico, 27 financeiro e ambiental, porém, como já exposto anteriormente, é vedado ao legislador constituinte tal aplicação como também a cominação de sanções de caráter penal, fazendo com que, posteriormente, fosse criada a Lei 9.605/98 possibilitando a sua aplicação de maneira eficaz. 3.2 CONSIDERAÇÕES A RESPEITO DA LEI 9.605 DE 1998 (LEI DE CRIMES AMBIENTAIS) Sabendo que as disposições criadas na legislação constituinte não são autoaplicáveis e careciam de leis complementares para se obter uma regulamentação aprimorada, o legislador instituiu a Lei de Crimes Ambientais 9.605/98. Acerca da função designada pela Lei de Crimes Ambientais 9.605/98, Guilherme Guimarães Feliciano (2005, p. 392), esclarece que a função primordial “[...] desse dispositivo legal na ordem jurídica brasileira foi a de implementar, no plano infraconstitucional, a responsabilidade penal da pessoa jurídica autorizada pela Constituição Federal de 1988 (art. 225, par. 3º)”. Foi através do artigo 3º, caput, da Lei de Crimes Ambientais (9.605/98), que teria ocorrido a regulamentação da referida modalidade de responsabilização no ordenamento jurídico pátrio: Art. 3º As pessoas jurídicas serão responsabilizadas administrativa, civil e penalmente conforme o disposto nesta Lei, nos casos em que a infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, no interesse ou benefício da sua entidade. Conforme explica João Osinski Júnior (2008, p. 74-75), “[...] apesar de sua denominação, é uma legislação de natureza hibrida, pois não versa exclusivamente sobre crimes contra o meio ambiente, trazendo também importantes disposições de ordem civil e administrativa”. Trata-se de uma lei moderna, que permite a aplicação da lei do juizado criminal (Lei 9.099/95) aos crimes ambientais de menor potencial ofensivo, bem como corrigiu diversas distorções entre o bem jurídico tutelado e as sanções penais aplicadas, principalmente em relação às pessoas naturais, podendo a mesma se beneficiar da transação penal e da suspensão condicional do processo, desde que comprovada a reparação do dano ambiental, permitindo inclusive a extinção da punibilidade nestes casos (OSINSKI JUNIOR, 2008, p. 75). 28 Em relação a essa evolução legislativa, aplicada em matéria de meio ambiente, Daniela Gomes (2015, p. 188) explica que “após a constitucionalização da proteção ambiental, surgiu uma gama de legislação a fim de regulamentar o texto constitucional”. A primeira legislação que surgiu para regulamentar os dispositivos constitucionais, motivada pelo clamor popular em proteger e preservar os recursos naturais, foi a Lei que trata dos crimes ambientais. Assim, em 12 de fevereiro de 1998, foi editada a Lei 9.605/98, dando assim, cumprimento à determinação constitucional explícita de reconhecer a responsabilização criminal da pessoa jurídica (OSINSKI JÚNIOR, 2008, p. 28). A Lei de Crimes Ambientais 9.605/98, de forma mais técnica por meio dos seus dispositivos, tipificou condutas e penalidades cabíveis no que diz respeito ao dano em matéria ambiental, “destacando a independência da responsabilidade da pessoa coletiva em relação à responsabilização da pessoa natural” (PACELLI; CALLEGARI, 2017, p. 229). A lei 9.605/98, visando formar uma legislação ambiental, uniforme e coerente, conseguiu reunir todas as legislações referentes ao meio ambiente, que até então era formada por um imenso amontoado de leis esparsas e contraditórias, possibilitando uma abordagem mais eficiente quanto à tutela do meio ambiente, sem violar os princípios constitucionais. Na verdade, veio materializar os dispositivos sobre o meio ambiente estipulados na Constituição de 1988 [...] (OSINSKI JÚNIOR, 2008, p. 75). Se até o momento por parte de alguns juristas tinha-se a ideia de que a Constituição Federal de 88 havia introduzido de forma equivocada e esparsa a criminalização dos entes coletivos, teria sido a partir da promulgação da Lei 9.605/98 que se consolidou a responsabilidade penal da pessoa jurídica, tanto de direito público como de direito privado, no sistema brasileiro. Na concepção de Eugênio Pacelli e André Callegari (2017, p. 230): De nossa parte, sobretudo em atenção às características da atuação das pessoas jurídicas e das espécies de pena de direito penal a elas aplicáveis (Lei 9.605/98), pensamos que as funções atribuídas à referida incriminação terão eficácia muito mais simbólica – com reforço no estigma da sanção penal – que propriamente dos objetivos finais e gerais da política criminal (repressão e prevenção de delitos). A identidade das penas do Direito Penal das pessoas jurídicas com aquelas previstas no direito administrativo nos conduzem a ver ali a administrativização dessa intervenção penal, com o consequente alargamento de seu horizonte. Se devido ou não, o tempo dirá: mas certamente que a escolha constituinte é legítima e válida não temos o menor receio em afirmar. Partindo dessas premissas, chega-se ao entendimento de que a aplicação desse modelo de responsabilidade em nosso sistema jurídico representa uma expansão no direito penal brasileiro,tendo a sua aplicação, características 29 inerentes ao direito administrativo, deixando de lado algumas características do direito penal tradicional. No que tange os dispositivos da lei, de acordo com Carlos Gómez-Jara Díez (2015, p. 12): Certamente, o art. 3º da Lei nº 9.605/98 condiciona a responsabilidade penal da pessoa jurídica a que a infração seja cometida “por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado”.8 É dizer: o sistema brasileiro de responsabilidade penal da pessoa jurídica parte, como muitos sistemas do século passado, da teoria da representação. No entanto, tal dispositivo legal deve ser interpretado no marco de um sistema de responsabilidade autônoma da pessoa jurídica, já que o próprio art. 3º estabelece que “A responsabilidade das pessoas jurídicas não exclui a das pessoas físicas, autoras, coautoras ou partícipes do mesmo fato”. Quanto a aplicação das penas previstas em relação as pessoas jurídicas, o artigo 22 da lei 9.605/98 elenca as penas restritivas de direito, sendo elas a suspensão parcial ou total de atividades, a interdição temporária do estabelecimento, obra ou atividade e a proibição de contratar com o poder público, como por exemplo, participar de procedimentos licitatórios, bem como dele obter subsídios, subvenções ou doações. Também prevê o no artigo 23 da mesma lei a prestação de serviços à comunidade, por parte da pessoa jurídica, consistindo no financiamento de programas e projetos ambientais, execução de obras de recuperação de áreas degradadas, manutenção de espaços públicos ou contribuições a entidades ambientais ou culturais públicas. De forma suscinta, podemos mencionar também a criação da lei 6.938/81, que veio instituir a Política Nacional do Meio Ambiente (PNMA), onde a mesma foi promulgada na denominada fase holística dessa evolução legislativa, sendo caracterizada por proteger de forma integral o meio ambiente. Daniela Gomes (2015, p. 188) explica que: [...] a PNMA além de trazer princípios e definições de termos ligados a temática ambiental e estabelecer o Sistema Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA), procurou listar alguns objetivos prioritários, a exemplo da imposição ao poluidor da obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados (art. 4º, VII), sendo que o poluidor poderá ser tanto a pessoa física quanto a pessoa jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente por atividade causadora de degradação ambiental (art. 3º, IV). Também passou a prever apenação para o poluidor que expuser à perigo a incolumidade humana, animal ou vegetal, ou estiver tornando mais grave situação de perigo existente (art. 15). 30 A criação da PNMA teve como objetivo, garantir meios para o desenvolvimento social e econômico e ao mesmo tempo a proteção da vida humana. Retomando, por fim, as considerações a respeito da Lei de Crimes Ambientais, João Osinski Júnior (2008, p. 78) explica que: A Lei dos Crimes Ambientais representa um grande avanço na questão ambiental, pois consolida em um único documento todas as questões legais ligadas ao meio ambiente, apesar de ser extensa, ambiciosa e forte. É inovadora, pois tipifica como crime várias ações do homem contra a natureza, fortalecendo os instrumentos legais e administrativos, permitindo um maior controle ambiental, mas ainda enfrenta críticas face à realidade brasileira, principalmente em relação à responsabilização das pessoas jurídicas. Contudo, juristas e constitucionalistas discordam em relação a interpretação dada aos dispositivos constitucionais outorgados que tratam da matéria, apresentando questionamentos sobre se o legislador realmente introduziu essa modalidade em nosso ordenamento jurídico. 3.3 ANÁLISE QUANTO A INSTITUCIONALIZAÇÃO DA CRIMINALIDADE EMPRESARIAL NA LEGISLAÇÃO CONSTITUINTE SOB A ÓTICA DA DOUTRINA 3.3.1 Ideias contrárias e favoráveis Em relação ao que a Constituição Federal de 1988 teria disposto em relação aos crimes abrangendo as pessoas jurídicas, “há autores que negam que a Constituição Federal tenha previsto com o dispositivo a incriminação da pessoa jurídica, deduzida de uma interpretação meramente gramatical” (PERES, 2005, p. 78). Para Bitencourt (2010) o artigo 225, parágrafo 3º da nossa Carta Magna, quanto a responsabilização penal da pessoa jurídica, levou alguns doutrinadores a interpretarem de maneira equivocada essa possibilidade advinda da nossa Constituição Federal, e que o instituto estaria até hoje restrito a responsabilidade subjetiva e pessoal. Apesar dessa argumentação contrária quanto a interpretação, que deveria ser feita de forma correta ao artigo 225, parágrafo 3º, alguns juristas ainda invocam o parágrafo 5º do artigo 173 da Carta Magna, sob a alegação de que o mesmo 31 dispõe que, as sanções ao qual sujeitam-se as pessoas jurídicas, devem ser compatíveis com a sua natureza e que seriam estas somente as de natureza cível e administrativa. Para combater a tese de que a atual Constituição consagrou a responsabilidade penal da pessoa jurídica, trazemos à colocação o disposto no seu art. 173, § 5º, que, ao regular a Ordem Econômica e Financeira, dispõe: “A lei, sem prejuízo da responsabilidade individual dos dirigentes da pessoa jurídica, estabelecerá a responsabilidade desta, sujeitando-a às punições compatíveis com sua natureza, nos atos praticados contra a ordem econômica e financeira e contra a economia popular” (BITENCOURT, 2010, p. 274). O que se extrai da ideia exposta pelo autor é que, com base no referido artigo, entende-se que essa responsabilidade subjetiva dos sócios administradores da empresa não implica com a responsabilidade do ente coletivo, isso por que a sanção penal não seria apropriada a sua natureza, e que a nossa Constituição Federal não chegou a atribuir uma sanção de natureza penal as pessoas jurídicas, mas, apenas estipulou quais as punições à ela caberiam. O autor Luiz Regis Prado (2011, p. 151) também se manifesta em relação ao artigo 225, § 3º da Constituição Federal dizendo que, “o dispositivo em tela refere-se, claramente, a conduta/atividade e, em sequência, a pessoas físicas ou jurídicas”. O mesmo autor ainda explica que: [...] o próprio legislador procurou fazer a devida distinção, através da correlação significativa mencionada. Nada obstante, mesmo que – ad argumentandum – o dizer constitucional fosse em outro sentido – numa interpretação gramatical diversa –, não poderia ser aceito. Não há dúvida que a ideia deve prevalecer sobre o invólucro verbal. Em consequência, a interpretação das regras constitucionais impõe o emprego do método lógico- sistemático e se orienta por rigorosa congruência e visão de conjunto. Não se pode descuidar, em absoluto, da principiologia constitucional penal e da estrutura do ordenamento jurídico-penal brasileiro, fundado em um Direito Penal da conduta, da culpabilidade e da personalidade da pena (PRADO, 2011, p. 151-152). Corroborando com a mesma ideia, Zaffaroni e Pierangeli (2013) sustentam que houve imprudência por parte do legislador constituinte ao ter conferido responsabilidade penal à pessoa jurídica, sendo que a maior parte da doutrina não reconhece a sua aptidão para cometer delitos, isso por conta da ausência de vontade psicológica que só é encontrada no ser humano e nunca em algo que se originou de uma legislação. 32 A respeito do assunto, José Henrique Pierangeli (1999, p. 186-187) elucida: A ordem jurídico-penal não regula a totalidade dos fatos, e sim apenas e tão-somente algumas espécies dessas manifestações. No estágio atual do desenvolvimento cultural do mundo atual, é inconcebível uma ordem jurídica que regule ou pretenda regular todos os fatos ocorridos no universo físico, que não sejam condutas humanas. É lógico que também estas ocorrem no mundo físico. Do exposto resulta que os animais e ascoisas inanimadas só podem constituir-se em objeto de condutas, nunca em sujeitos do delito. Em caso de lesões de coisas e de animais, o sujeito passivo só pode ser o seu proprietário, ou, eventualmente, o seu possuidor. Entende-se a partir da ideia exposta pelo autor, que estaria fora do alcance do ordenamento jurídico penal regular fatos ocorridos que não tenham como sujeito ativo dessa conduta a pessoa humana, como também estaríamos contrariando a ordem do modelo clássico penalista aplicar uma sanção penal a pessoa jurídica, pois, considera-se que toda a conduta só poderia implicar da vontade do agente e não do objeto através de quem se deu a execução do fato. Encontramos, ainda, autores afirmando que a adoção desse modelo de criminalização das pessoas jurídicas acarretaria na abolição e ofensa aos princípios e garantias constitucionais existentes, como é o caso do princípio da isonomia (art. 5º, caput, da Constituição Federal de 88), visto que: [...] no momento que o inquérito policial, civil ou administrativo, se satisfizesse com a identificação da pessoa jurídica como “responsável” pela infração penal, os partícipes, poderiam ser beneficiados com o relaxamento dos trabalhos de investigação (PERES, 2005, p. 80). O autor René Ariel Dotti (2011, p. 168-169), por meio de uma análise crítica, elucida: A pretensão de atribuir a imputabilidade penal às pessoas jurídicas não está em harmonia com a letra e o espírito da Constituição. Realmente, no capítulo relativo ao meio ambiente a Carta Política de 1988 declara que “as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independente da obrigação de reparar o dano” (art. 225, § 3º). Tal disposição, em sua interpretação literal, poderia ensejar o entendimento de que é admissível a responsabilidade penal dos entes coletivos. Porém, a melhor compreensão da norma nos leva à conclusão de que tanto a pessoa física como a pessoa jurídica podem responder nas ordens civil, administrativa e tributária pelos seus atos; mas a responsabilidade penal continua sendo de natureza e caráter estritamente humanos. A constituição adota (entre outras) as seguintes espécies de pena: a) privação ou restrição da liberdade; b) perda de bens; c) multa; d) prestação social alternativa; e e) suspensão ou interdição de direitos (art. 5.º, XLVI). O autor ainda explica em relação a quais sanções a pessoa jurídica poderia ser objeto de aplicação, desde que não sejam elas de natureza física, como 33 por exemplo, penas patrimoniais, prestação pecuniária, prestação de serviços em favor da comunidade, restrição de atividades da empresa, como por exemplo, suspensão parcial ou total dos direitos do ente coletivo. Essa conclusão decorreria de uma regra elencada na Constituição quanto a responsabilidade, estando prevista no dispositivo que trata da ordem econômica e financeira, como também no capítulo que estabelece os princípios gerais da atividade econômica, no art. 173, § 5º, CF (DOTTI, 2011). Mesmo colocando-se em posição contrária aos que acreditam ter a Constituição Federal de 88 albergado essa modalidade de criminalização dos entes coletivos, fundamentando sua crítica com base no art. 5º, inciso XLV da Constituinte, o autor Cezar Roberto Bitencourt (2010, p. 275) enfatiza que: [...]isso não quer dizer que o ordenamento jurídico, no seu conjunto, deva permanecer impassível diante dos abusos que se cometam, mesmo através de pessoa jurídica. Assim, além de sanção efetiva aos autores físicos das condutas tipificadas (que podem facilmente ser substituídos), deve-se punir severamente também e, particularmente, as pessoas jurídicas, com sanções próprias a esse gênero de entes morais. No ponto de vista de Rodrigo Sánchez Rios (2011), a CF 88 não enfatizou devidamente a responsabilidade penal da pessoa jurídica, deixando o seu texto, de certa forma, obscuro e abrindo margem para a permanência da discussão quanto a sua interpretação, expondo apenas a clara intenção do legislador em admitir essa modalidade de responsabilidade. De acordo com Juarez Cirino dos Santos (2011), o legislador constituinte não concedeu a criminalização impessoal da pessoa jurídica, concluindo que a admissão desta modalidade de responsabilidade aparenta manifestar, através de uma leitura grosseira dos dispositivos constitucionais relacionados ao tema, um simples interesse arbitrário do interprete. Luiz Vicente Cernicchiaro e Paulo José da Costa Júnior (1990, p. 144), elucidam que a pena: [...] está vinculada à responsabilidade pessoal (art. 5º, XLV). Hoje, dela é inseparável. A Constituição brasileira, portanto, não afirmou a responsabilidade penal da pessoa jurídica, na esteira das congêneres contemporâneas. Neste contexto, por outro lado, temos autores que compreendem a necessidade de um direito penal que seja comprometido com a realidade que vivenciamos, e que os dispositivos constitucionais que tratam da matéria em análise 34 reconheceram a possibilidade de criminalização do ente coletivo, sendo encargo da lei infraconstitucional executá-los. Conforme expõem os autores Eugênio Pacelli e André Callegari (2017, p. 229): Boa parte da nossa doutrina insiste na impossibilidade de criminalização da pessoa jurídica, quase sempre com fundamentação atrelada a conceitos e categorias da dogmática penal anterior ao funcionalismo. Para o modelo finalista de ação, por exemplo, seria mesmo incompatível a ideia de definição de vontade do ente jurídico, com aquela da pessoa humana. No entanto, há que se objetar que tais conceitos e tais categorias são construções teóricas e que podem ou não ser incorporadas por determinadas legislações, ou seja, pelo direito positivo de cada país. No Brasil, como vimos, a Constituição da República é bastante enfática ao consagrar semelhante modelo de responsabilização penal, a despeito das críticas que podem ser feitas a esta opção constituinte. Na concepção do autor Rodrigo Andrade Viviani (2008), a discussão em torno da responsabilização penal da pessoa jurídica, cresceu ainda mais por que de acordo com o manifesto de considerável quantia de juristas, a nossa Carta Magna de 1988 introduziu a imputação penal do ente coletivo, vindo a ser regulamentada posteriormente pela Lei 9.605/98. Ademais disso, cresce a cada dia mais referida modalidade de responsabilização penal no direito comparado, o que, se, de um lado, não parece ser suficiente para nos convencer do seu acerto, de outro, porém, é indicativo da viabilidade de sua aplicação no direito positivo (PACELLI; CALLEGARI, 2017, p. 230). Nesta concepção, entende-se que, se através da aplicação do direito comparado não vislumbra-se êxito, por se tratar de um sistema que vai na contramão de seus princípios e dogmas ao aplicar essa modalidade de responsabilidade, por outro lado, existiria maior aceitação e considera-se mais viável sustentar essa aplicação em nosso ordenamento jurídico, por meio das normas que regem a lei ordinária e complementar. O autor Walter Claudius Rothenburg (1997, p. 20), também em sentido favorável a essa ideia de que a Constituição Federal de 1988 albergou em seus dispositivos a responsabilidade penal do ente coletivo, fazendo uma análise, afirma: Fora de dúvida, entretanto, que a responsabilidade penal da pessoa jurídica está prevista constitucionalmente e necessita ser instituída, como forma, inclusive, de fazer ver, ao empresariado, a que a empresa privada também é responsável pelo saneamento da economia, pela proteção da economia popular e do meio ambiente, pelo objetivo social do bem comum, que deve estar acima do objetivo individual, do lucro a qualquer preço. Necessita ser imposta, ainda, como forma de aperfeiçoar-se a perquirida justiça, naqueles casos em que a legislação mostra-se insuficiente para localizar,
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