Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Olhares em Josenia Antunes Vieira • Regina Célia Pagliuchi da Silveira • Célia Maria Magalhães • André Lúcio Bento • Francisca Cordélia Oliveira da Silva • Georgina Amazonas Mandarino • Harrison da Rocha • Janaína de Aquino Ferraz • Joana da Silva Ormundo • Walkyria Wetter Bernardes Análise de Discurso Crítica Ficha Catalográfica © 2009, by Josenia Antunes Vieira Regina Célia Pagliuchi da Silveira Célia Maria Magalhães André Lúcio Bento Francisca Cordélia Oliveira da Silva Georgina Amazonas Mandarino Harrison da Rocha Janaína de Aquino Ferraz Joana da Silva Ormundo Walkyria Wetter Bernardes Reservam-se os direitos desta edição aos autores Revisão: Harrison da Rocha, André Lúcio Bento, Josenia Antunes Vieira e Cláudia Gomes Paiva Supervisão de Editoração e de Revisão: Harrison da Rocha E-mail: josenia@josenia.com Projeto gráfico e capa: Iracema F. da Silva Imagem da capa: Márcia Filippi Olhares em análise de discurso crítica. Editora: Josenia An- tunes Vieira. Vieira, Josenia Antunes; Pagliuchi, Regina Célia da Silveira; Magalhães, Célia Maria; Bento, André Lúcio; Silva, Francisca Cordélia Oliveira da; Mandarino, Georgina Amazo- nas; Rocha, Harrison da; Ferraz, Janaína de Aquino; Ormundo, Joana da Silva; Bernardes, Walkyria Wetter – Brasília: www. cepadic.com, 2009. 236 p. ISBN 978-85-909318-0-5 Inclui bibliografia. 1. Análise de discurso crítica. 2. Multimodalidade. Brasília, 2009 Olhares em Josenia Antunes Vieira • Regina Célia Pagliuchi da Silveira • Célia Maria Magalhães • André Lúcio Bento • Francisca Cordélia Oliveira da Silva • Georgina Amazonas Mandarino • Harrison da Rocha • Janaína de Aquino Ferraz • Joana da Silva Ormundo • Walkyria Wetter Bernardes Análise de Discurso Crítica apresentação ..............................................................................7 parte I – camInhos teórIcos PERCuRSOS dAS ABORdAGENS dISCuRSIVAS ASSOCIAdAS à LINGüíStICA SIStêMICA FuNCIONAL Célia Maria Magalhães (UFMG) .....................................................17 parte II – dIscurso e IdentIdade O uSO dE MEtÁFORAS E A CONStRuÇÃO dE IdENtIdAdES ÉtNICAS Francisca Cordélia Oliveira da Silva (UnB) ......................................39 A SuPERMOdERNIdAdE: CuLtuRA dO POdER E dO CONSuMISMO Georgina Amazonas Mandarino (CEPADIC).....................................59 PÓS-MOdERNIdAdE, MídIA E PERFIL IdENtItÁRIO FEMININO Walkyria Wetter Bernardes (UnB) ...................................................75 parte III – dIscurso e educação GRAMÁtICA tRAdICIONAL E LíNGuA ESCRItA: duAS FACES dE uM MESMO POdER Harrison da Rocha (UnB) .............................................................. 91 O dISCuRSO MERCANtILIStA dO ENSINO BRASILEIRO Josenia Antunes Vieira (UnB) ...................................................... 117 Sumário parte IV – dIscurso e língua portuguesa A MuLtIMOdALIdAdE E A FORMAÇÃO dOS SENtIdOS EM PORtuGuêS COMO SEGuNdA LíNGuA Janaína de Aquino Ferraz (UnB) .................................................. 153 FORMAS dE SOLICItAÇÃO, AFIRMAÇÕES E RESPOStAS dIALÓGICAS dO PORtuGuêS BRASILEIRO Regina Célia Pagliuchi da Silveira (PUC/SP) .................................. 177 parte V – dIscurso e multImodalIdade “E AGORA, LuLA?”: A IMAGEM INtERtExtuAL EM MAtÉRIA dO CORREIO BRAzIlIEnSE André lúcio Bento (UnB) ............................................................ 191 parte VI – dIscurso e contextos on-line A dINâMICA dO uSO SOCIAL dOS dIÁRIOS On-lInE Joana da Silva Ormundo (UnIP/CEPADIC) .................................... 203 apreSentação Esta obra é composta por uma série de artigos situados na Análise de discurso Crítica (AdC), que interpreta o discurso – o uso da linguagem na fala, na escrita e na imagem – como uma forma de “prática social”. O fato de analisar o discurso como prática social sugere uma dialética entre o social e o particular. Nesse sentido, o social pode ser definido tanto como discursos públicos institucionais quanto como eventos discursivos particulares. A dialética entre o social e o particular é entendida à medida que o social guia o particular e este modifica aquele. de forma geral, a AdC está associada à Escola de Filosofia de Frankfurt e surge devido à crescente importância, atribuída, contemporaneamente, à linguagem na vida social e tem por ponto de partida que, geralmente, os indivíduos não têm consciência de como o discurso intervém para controlar e moldar as cognições sociais. Sendo assim, analisar o discurso de forma crítica é revelar o que não é consciente para as pessoas em suas práticas sociais e denunciar quais estratégias são utilizadas para o controle de suas mentes. Por essa razão, a AdC está envol- vida com problemas sociais de forma a considerar que as expressões lingüísticas são materializações da ideologia e que todo uso da linguagem é ideológico; dessa forma, as expressões lingüísticas são “terreno de conflitos sociais”. Fairclough e W. Wodak (no artigo “Análises Crítico del discurso”, publicado por teun A. van dijk, em março de 2000, trad. espanhola de Helena Amarengue, Barcelona: Ed. Gedisa) comentam que os filósofos dessa escola sustentam que não é possível tratar os produtos culturais como meros “epifenômenos” da economia, tal qual o fizeram os filósofos marxistas, pois os conhecimentos são expressões relativamente autônomas de contradições dentro do todo social, à medida que as cognições sociais, de grupo para grupo, são conflitantes. Segundo os autores, o pensamento de Bakhtin destaca as propriedades dialógicas dos textos, sua intertex- 8 • Olhares em Análise de discurso Crítica Apresentação • ISBN 978-85-909318-0-5 tualidade, no sentido atribuído por Kristeva (1986), em sua obra World dialogue and novel, que é a idéia de que qualquer texto está intertextualizado em uma cadeia de texto, isto é, mantém relações de reação, de incorporação e de transformação com outros textos. tal concepção contribui para uma visão social do discurso, pela dialética do social com o individual. Segundo Fairclough e Wodak (2000), denomina-se Análise de discurso Crítica a análise crítica aplicada à linguagem que se desenvolveu no “marxismo Ocidental”. de forma geral, o marxismo Ocidental deu ênfase maior do que as outras formas do marxismo à dimensão cultural e deu relevância ao fato de que as relações sociais capitalistas se estabelecem e se mantêm (reproduzem-se) em boa parte no seio da cultura (por enfraquecimento da ideologia) e não somente, nem primordialmente, na “base” econômica. Embora os analistas críticos do discurso nem sempre se integrem explicitamente dentro dessa herança, principalmente no que se refere à cultura e ideologia, ela, ainda assim, constitui o marco de seu trabalho. O termo “crítico” está associado à Escola de Filosofia de Frankfurt. Os filósofos dessa escola consideram que os produtos sociais são expressões relativamente autô- nomas de contradições dentro do todo social e propõem que as formas lingüísticas de expressão (re)produzem, dinamicamente, o social no individual, embora este altere aquele. dessa forma, a AdC busca analisar o discurso com um interesse crítico pela linguagem na sociedade contemporânea. Para tanto, busca uma consciência crítica para tratar das práticas lingüísticas cotidianas que são responsáveis pelas mudanças fundamentais nas funções que a linguagem cumpre na vida social. Há diferentes vertentes para analisar o discurso sob a visão crítica, pois há diferença na maneira pela qual essas vertentes interpretam a mediação entre o texto e o social. Por um lado, considera-se que os processos sociocognitivos controlam as relações discursivas; por outro, supõe-se que os mediadores entre o social e as práticas discursivas são gêneros discursivos específicos. A AdC, devido a suas di- ferentes vertentes, privilegia tanto textos exclusivamente lingüísticos quanto textos multimodais e, tendo por pressuposto, conforme Halliday, que os textos cumprem e realizamvárias funções ao mesmo tempo, analisar com visão crítica o discurso é considerar as várias funções presentes ao mesmo tempo nos textos, tais como: função ideativa, intertextual e textual. Segundo as diferentes vertentes, a AdC privilegia: 1. A Lingüística Crítica Sistêmica – Esta vertente se desenvolveu na Grã-Bre- tanha, na década de 1980, e seus principais representantes são Fowler; Kress e Hodge que estão intimamente ligados à teoria Lingüística “Sistêmica” de Halliday. Segundo essa vertente, as características gramaticais de um texto são Olhares em Análise de Discurso Crítica • 9 ISBN 978-85-909318-0-5 • Apresentação escolhas significativas dentro de um conjunto de possibilidades disponíveis nos sistemas gramaticais; assim, a gramática tem função ideológica, pois as escolhas gramaticais significativas contribuem para a reprodução ideológica de relações de dominação. Ainda, segundo essa vertente, é importante tratar da significação ideológica da função sistêmica, de forma a examinar como ela se encontra em textos que se transformam em outros textos no correr do tempo. Os lingüistas críticos, também, chamam a atenção sobre o potencial ideológico do sistema de categorização dos implícitos em vocábulos, ou seja, as maneiras particulares de “lexicalizar”, social e institucionalmente, a experiência nos dicionários. 2. A Semiótica Social – Esta vertente se preocupa com o caráter multissemiótico da maior parte dos textos na sociedade contemporânea e explora métodos de análise aplicáveis às imagens visuais assim como à relação existente entre a linguagem verbal e as imagens visuais, tal como procedem Kress e van Leeuwen, dentre outros. Os resultados obtidos da análise crítica das imagens visuais têm propiciado repensar as teorias de base apenas lingüística. A ver- tente com base na Semiótica Social dá maior atenção do que a Lingüística Crítica Sistêmica às práticas de produção e de interpretação relacionadas a distintos tipos de textos com múltiplas modalidades semióticas. 3. A mudança sociocultural e mudança no discurso – um dos principais representantes desta vertente é Fairclough, que se dedica ao estudo das re- lações entre a mudança sociocultural e a mudança no discurso. A mudança no discurso é analisada, com visão crítica, em termos da combinação de discursos e de gêneros dentro de um texto, tendo como ponto de partida que o tempo reestrutura as relações entre: a) distintas práticas discursivas no seio das instituições; b) distintas instituições com suas práticas discur- sivas correspondentes a determinados domínios sociais. Fairclough e seus colaboradores também trataram das implicações da AdC para a educação, postulando uma “consciência crítica da linguagem” como componente-chave do ensino da língua nas escolas e em outras instituições. 4. O exame sociocognitivo – um dos principais representantes desta vertente é van dijk, que se dedica ao estudo da reprodução do preconceito étnico no discurso e na comunicação. O autor descobriu que os temas mais freqüentes na imprensa correspondem a preconceitos étnicos predominantes nas con- versações cotidianas. Em seus trabalhos mais recentes, van dijk voltou-se ao estudo de questões mais gerais relativas ao abuso de poder e à reprodução da desigualdade por meio da ideologia. Segundo ele, a cognição é uma das categorias analíticas do discurso, com visão crítica, e postula uma inter- 10 • Olhares em Análise de discurso Crítica Apresentação • ISBN 978-85-909318-0-5 relação entre as categorias sociedade, cognição e discurso, de forma a tratar das representações sociais em suas funções discursivas nos diferentes grupos sociais; dessa forma, tem se preocupado, mais recentemente, com as relações entre cultura e ideologia para caracterizar os conhecimentos sociais. 5. O método histórico-discursivo – uma das principais representantes desta vertente é Ruth Wodak. Ela e seus colaboradores propõem um procedimento que denominaram “método histórico-discursivo”. Este método é originado na Sociolingüística, com base em Bernstein e recebe influência da Escola de Frankfurt, principalmente, de Jürgeen Habermas, além de van dijk, no que se refere à existência de diferentes tipos de esquemas mentais que têm importância para a produção e para a compreensão do texto. um dos prin- cipais objetivos desse tipo de investigação crítica é a possibilidade de sua aplicação. um traço característico dessa vertente crítica consiste em integrar sistematicamente toda informação disponível no contexto para a análise e para a interpretação de textos falados ou escritos. A metodologia histórico- discursiva foi idealizada para tornar possível a análise de emissões verbais que contêm valores preconceituosos implícitos e também para identificar e para denunciar códigos e alusões contidas em discursos preconceituosos. 6. As análises da leitura – um dos principais representantes desta vertente é utz Maas, que remete às principais idéias do pensamento de Michel Foucault e combina-as com a metodologia hermenêutica que designa a análise da leitura. dessa forma, analisa, com visão crítica, o discurso, por formas lingü- ísticas em correlação com práticas sociais, investigadas de modo sociológico e histórico, no contexto em que se manifestam. A análise do texto torna-se análise do discurso, à medida que correlaciona o texto ao discurso, isto é, por uma prática social formada historicamente. Nesse sentido, um discurso não é um conjunto arbitrário de textos, definido pelo tempo e pelo espaço, mas um discurso define-se, intencionalmente, pelo seu conteúdo, como, por exemplo, discurso machista, discurso fascista. Cada texto remete-se a outros textos tanto sincrônica quanto diacronicamente. Para o autor, analisar o discurso com visão crítica é colocar, de forma explícita, as especificidades dos discursos institucionalizados e públicos. 7. Escola Duisburg – um dos maiores representantes desta vertente é Siegfried Jäger, que, com a influência de Michel Foucault, trata das características lin- güísticas icônicas do discurso e dos “símbolos coletivos” que desempenham importantes funções no texto. Para Jäger, os discursos são modalidades de fala institucionalizadas e convencionadas que têm relação com o comportamento e com a dominação. O autor propõe uma metodologia explícita para analisar sistematicamente fragmentos de discurso levando em conta a intertextuali- Olhares em Análise de Discurso Crítica • 11 ISBN 978-85-909318-0-5 • Apresentação dade. O autor concentrou a micro-análise do texto no símbolo coletivo, nas metáforas e nas estruturas agentivas e mostrou que, em diferentes jornais e revistas publicadas, havia grande similitude entre os signos coletivos. de forma geral, com suas diferentes vertentes, a AdC ocupa-se dos problemas sociais e analisa, com visão crítica, os aspectos lingüísticos e semióticos dos pro- cessos e dos problemas sociais, de forma a propor que as mudanças sociais e polí- ticas, na sociedade contemporânea, incluem, geralmente, um elemento discursivo substancial de mudança cultural e ideológica. Para os problemas sociais tratados, há privilégio da análise da ideologia. A AdC sublinha o caráter fundamentalmente lingüístico e discursivo das relações sociais de poder na sociedade contemporânea, o que resulta, em parte, de como se exerce e negocia a relação de poder no interior do discurso. Privilegia, também, o tratamento do poder dentro do discurso e o poder sobre o discurso, como uma capacidade de controlar e de modificar as regras do jogo das práticas discursivas e da ordem do discurso. A AdC trata, também, de como o discurso constitui a sociedade e a cultura, da mesma forma que é constituído por ela. Isto implica que toda instância de uso da linguagem dá sua própria contribuição à reprodução e/ou à transformação da sociedade e da cultura, incluídas na relação de poder. A presente obra dá importância às diferentes vertentes da AdC. Ela reúne um conjunto de autores que apresentamos seguintes trabalhos: 1. Célia Maria Magalhães (uFMG) apresenta “Percursos das abordagens discur- sivas associadas à Lingüística Sistemática Funcional”, de forma a tratar das diferentes abordagens da análise lingüística que têm por foco o discurso. Seu artigo apresenta vertentes discursivas com base na Lingüística Sistêmica e Funcional e objetiva o mapeamento das escolas inglesas conhecidas como Análise de discurso Crítica, além de divulgar um projeto de mapeamento de trabalho de pesquisadores brasileiros e portugueses em AdC, a partir da última década do século xx. 2. Francisca Cordélia Oliveira da Silva (unB), em seu artigo “O uso de metáforas em construção de identidades étnicas”, trata do uso de metáforas presentes em textos que têm por tema cotas para negros nas universidades brasileiras. Seus resultados obtidos indicam que as metáforas são usadas para consti- tuir as identidades dos negros nos textos. A autora considera que o modo como o negro é visto e representado pelo “outro” influencia o modo como ele vê e representa a si mesmo, pois o “eu” do negro forma-se, em parte, pelas representações que são feitas dele pela sociedade. Assim, para fugir da auto-identificação, os informantes da pesquisa recorrem a metáforas para representar a sua cor negra. 12 • Olhares em Análise de discurso Crítica Apresentação • ISBN 978-85-909318-0-5 3. Georgina Amazonas Madarino (CEPAdIC), com o texto intitulado “A super- modernidade: cultura do poder e do consumismo”, objetiva examinar como a mass media contribui para a construção identitária do sujeito. A autora trata do símbolo da modernidade divulgado pela publicidade em geral, de forma a comprovar a identidade e como os referidos símbolos autorizam deslocamentos interpessoais. Seus resultados indicam que certos símbolos da supermodernidade propiciam a identificação de territórios em constante transformação e indicam, também, o resgate de multiplicidades sociais e culturais. 4. Walkyria Weetter Bernandes (unB) apresenta o artigo intitulado “Pós-moder- nidade, mídia e perfil identitário feminino”. O trabalho trata da investigação do papel identitário da mulher e seu papel social no momento histórico da Pós-Modernidade, segundo as relações existentes entre discurso, mídia e poder por meio do texto midiático, em suas características intertextual e multissemiótica. O resultado obtido indica que a construção da identidade da mulher pela mídia impressa revela que ao mesmo tempo em que a mu- lher é construtora de seu espaço familiar e social, a ideologia dominante é veiculada por um discurso ortodoxo e antilibertário do feminino. 5. Harrison da Rocha (unB), em seu artigo intitulado “Gramática tradicional e língua escrita: duas faces de um mesmo poder”, procura explicar algumas causas do fracasso do ensino de Língua Portuguesa na escola brasileira. dessa forma, foca sua crítica no ensino apenas baseado na modalidade escrita, visto que em sociedade as pessoas se comunicam por diferentes modos semióticos. Para tanto, faz uma revisão do ensino de língua desde a antiguidade clássica, berço do surgimento da gramática tradicional, que, sendo representativa das elites, passa a ser norma imposta, ideologicamente, a todos. Percorre essa mesma prática desde a Península Ibérica, passando pelo Brasil Colônia, até nossos dias. Conclui que isso tem de ser repensado tendo em vista que a escrita e a fala são importantes para o ensino, mas os docentes de língua portuguesa precisam cortejar seus currículos com uma estrutura ampla que dê conta de uma enorme variedade de práticas comunicativas – a escrita, a fala e o visual. 6. Josenia Antunes Vieira (unB), em seu artigo intitulado “O discurso mer- cantilista do ensino brasileiro” tem por objetivo discutir as mudanças no discurso, relativas à educação brasileira, focalizada na sedução da clientela aluno, que propiciaram profundas alterações nas práticas discursivas. A autora considera que as mudanças no mundo e na atualidade brasileira contribuíram para essas profundas alterações e conclui que, enquanto as universidades federais pouco atuam para coibir as mudanças na educação superior, as Olhares em Análise de Discurso Crítica • 13 ISBN 978-85-909318-0-5 • Apresentação universidades privadas multiplicam propagandas altamente agressivas para o recrutamento de novos alunos e, para tanto, gastam expressivas somas de seus orçamentos para construir anúncios que atraiam cada vez mais alunos para seus cursos. O artigo apresenta resultados de análises de textos em linguagem multimodal. 7. Janaína de Aquino Ferraz (unB), em seu artigo “A multimodalidade textual em materiais didáticos de português língua estrangeira” trata das mudan- ças ocorridas na configuração dos materiais didáticos nos últimos tempos, tendo em vista a abertura para os diversos usos da linguagem. Neste artigo, analisam-se, especialmente, sob à luz da Análise de discurso Crítica e da Semiótica Social, as mudanças nas construções de sentido nos livros didáticos de português para estrangeiros. 8. Regina Célia Pagliuchi da Silveira (PuC/SP), em seu artigo intitulado “Formas de solicitações, afirmações e respostas dialógicas do português brasileiro”, trata dos implícitos culturais contidos no uso cotidiano de expressões lingüís- ticas do brasileiro, em turnos dialógicos, com o objetivo de focalizar aspectos da cultura brasileira que participam da memória social, a fim de contribuir com o ensino do português brasileiro para falantes de outras línguas. Os resultados obtidos indicam que os implícitos culturais estão situados em dimensão sociocognitiva, diferente da dimensão da língua, e que eles pre- cisam ser considerados para a produção de sentidos por locutores de outras línguas. A autora está fundamentada na AdC, com vertente sociocognitiva, e situa os implícitos culturais nas cognições sociais de grupos específicos de brasileiros. 9. André Lúcio Bento (unB), em seu artigo “E agora, Lula?”: a imagem inter- textual em matéria do Correio Braziliense, analisa o papel desenvolvido pela imagem na condição de elemento central de intertextualidade, notadamente em referência ao poema “José”, de Carlos drummond. O exame levado a efeito neste trabalho tem como base teórica a Análise de discurso Crítica, especialmente Fairclough (2001 e 2003), bem como alguns pressupostos da denominada gramática ou sintaxe visual, na contribuição de Kress e van Leeuwen (1996). 10. Joana da Silva Ormundo (uNIP/CEPAdIC), em seu artigo “A dinâmica do uso social dos diários: on-line” analisa o uso de linguagem nos blogs, como uma prática social e discursiva. O texto tem por base teórica Fairclough. A autora trata dos processos interativos e a constituição de uma comunidade discursiva blog conforme a análise de gênero de Bakhtin e o conceito de comunidade discursiva proposto por Swalles. dentre os resultados obtidos pela autora, estão: a prevalência inicial de usuários adolescentes foi cedendo 14 • Olhares em Análise de discurso Crítica Apresentação • ISBN 978-85-909318-0-5 espaço para usuários mais adultos; a relevância da mudança das temáticas publicadas indica também mudança no perfil do produtor e do leitor do gênero blog; e a dinamicidade do uso das linguagens que aparece nos blogs é caracterizada por uma escrita multimodal. Espero que os leitores recebam excelentes contribuições para seus estudos e investigações. Regina Célia Pagliuchi da Silveira Olhares em Análise de Discurso Crítica • 15 ISBN 978-85-909318-0-5 • Apresentação parte i caminhoS teóricoS Célia Maria Magalhães 16 • Olhares em Análise de discurso Crítica Apresentação • ISBN 978-85-909318-0-5 percurSoS daS aBordagenS diScurSivaS aSSociadaS à LingüíStica SiStêmica FuncionaL Célia Maria Magalhães* (UFMG) Resumo: São diversas as abordagens consolidadas de análise lingüística cujo foco de interesse é o discurso. Este trabalho se propõe a fazer uma revisão das abordagens discursivas que têm como teoria de base a LingüísticaSistêmica Funcional (LSF). trata-se de revisão sucinta cujo objetivo é mapear as publicações recentes e mais representativas de teóricos destas abordagens de modo a orientar novos interesses de pesquisa nesta área. A revisão parte de textos fundacionais, focalizando sucintamente alguns dos conceitos básicos neles abordados, para fazer um mapeamento das escolas inglesas conhecidas como discourse Analysis (dA) e Critical discourse Analysis (CdA) e, finalmente, divulgar um projeto de mapeamento de trabalhos realizados por pesquisadores brasileiros e portugueses em Análise Crítica do discurso desde a última década do século passado. Palavras-chave: Abordagens discursivas; Análise textual de Base Sistêmica; Análise Crítica do discurso (ACd). Abstract: there is a variety of linguistic approaches whose research object is discourse. this paper reviews some of the discourse approaches which stem from Systemic Functional Linguistics (SFL). It is a concise review which aims at mapping the most recent and representative theoretical work in the field. It also intends to guide new research interest in the area in Brazil. the review sets out from foundational texts, focusing on some of their basic concepts to include the English Schools of discourse Analysis (dA) and Critical discourse Analysis (CdA). the review also briefly presents a project which CdA research groups have been carrying out in Brazil and Portugal. this project aims at mapping out research work carried out by Brazilian and Portuguese scholars in the field of CdA from the nineties on. Keywords: discourse Approaches; textual (Systemic-Functional) Analysis; Critical discourse Analysis (CdA). * Célia Maria Magalhães é professora-adjunta de tradução e de Análise Crítica de discurso na Faculdade de Letras da universidade Federal de Minas Gerais (uFMG). Mestre em Lingüística e doutora em Literatura Comparada pela uFMG, com estágios de pesquisa em university of Nottingham, uK; York university e na university of British Columbia, Canadá. tem pós-doutorado em Lancaster university, uK. Em conjunto com Adriana Pagano e Fabio Alves, é autora de Traduzir com autonomia: estratégias para o tradutor em formação (Contexto, 2000); é organizadora de Competência em tradução: cognição e discurso (Editora uFMG, 2005). E-mail: celia.magalhaes@pq.cnpq.br. 18 • Olhares em Análise de discurso Crítica Parte I – Caminhos Teóricos • Percursos das Abordagens Discursivas Associadas à lingüística Sistêmica Funcional introdução Os rótulos “abordagens discursivas” e, em especial, “análise do discurso” (Ad) compreendem escolas teóricas e campos de estudo da linguagem os mais diver- sos, abrangendo diferentes grupos de pesquisadores franceses, americanos, ingleses e australianos, para listar apenas aqueles cuja base é o pensamento ocidental. Proponho-me, neste artigo, fazer uma revisão teórica das abordagens discursivas que têm como teoria de base a Lingüística Sistêmica Funcional (LSF), referindo-me a quatro décadas de publicações – desde a década de 1960, no Século xx, até os primeiros anos do Século xxI. Embora a tentativa seja a de abranger um período maior, a revisão a que me proponho é sucinta de modo a constituir um mapeamento das referidas abordagens visando à orientação de pesquisadores interessados no referido campo de estudo específico. Vale ressaltar que não levarei em conta as abordagens de estudos da linguagem que são reconhecidas no âmbito acadêmico anglo-americano, como Análise da Conversação (AC), Análise da Narrativa, Análise de Gênero e Pragmática, Etnografia da Fala, dentre outras. Meu trabalho divide-se em seis seções. Na primeira, abordo o que intitulo de “textos fundacionais” das abordagens discursivas que têm como base a LSF; na se- gunda, abordo brevemente conceitos básicos usados nessas abordagens; na terceira, pretendo constituir um mapa dessas abordagens de Ad no âmbito internacional, por meio de coletâneas de trabalhos editadas e/ou organizadas por autores de renome e que levam o termo “discurso” no título; na quarta, o propósito é fazer uma breve revisão de trabalhos que focalizam a Análise Crítica do discurso (ACd) como perspectiva relevante dentro da Ad; na quinta, tento configurar um mapa das abordagens contemporâneas de Ad que têm como fundamento a LSF, como a Análise Positiva do discurso (APd), a ACd, a Análise Multimodal do discurso (AMd) e a Semiótica Social Crítica (SSC) e, finalmente, na sexta, termino o artigo descrevendo um projeto interinstitucional que coordeno e cujo objetivo é mapear os trabalhos que pesquisadores brasileiros e portugueses têm desenvolvido com base na perspectiva de ACd desde a década de 1980 até os anos atuais. textos Fundacionais Já há trabalhos no âmbito nacional (Pagano, no prelo, dentre outros) que fazem uma revisão do trabalho do lingüista Michael Halliday, das décadas de 1960 e 1970, com o propósito de verificar sua contribuição para os Estudos da tradução. tais trabalhos do autor, juntamente com vários outros, culminaram em sua Introduction to functional grammar, cuja primeira versão é publicada em 1985, reeditada em 1994 e revista e aumentada pelo próprio autor e Christie Matthiessen em 2004. dentre essas publicações, me referirei a duas apenas: o estudo dos recursos coesivos da Olhares em Análise de Discurso Crítica • 19 ISBN 978-85-909318-0-5 • Célia Maria Magalhães língua inglesa (HALLIdAY; HASAN, 1976) e a proposta de linguagem como semi- ótica social (HALLIdAY, 1978). A primeira desenvolve e legitima a noção de texto como “unidade semântica” e faz um estudo abrangente dos recursos coesivos da língua inglesa, apresentando categorias úteis para nomear tais recursos e usando exemplos variados de linguagem em uso para esse fim; a segunda apresenta a proposta de Halliday de linguagem como semiótica social, meta funcional, usada pelos seres humanos na sociedade para atingir três funções principais: falar de suas experiências externas e internas do mundo ao seu redor; estabelecer relações interpessoais na sociedade e organizar a mensagem de modo a poder, com ela, agir e criar sentidos que serão entendidos por seus pares nas diversas instituições sociais das quais participam. Outros autores que, com base no trabalho de Halliday, constituem referência no âmbito da Ad inglesa são John Sinclair e Malcolm Coulthard. Estes autores, juntos (SINCLAIR; COuLtHARd, 1975), publicam um estudo da interação em sala de aula, descrevendo a interação oral entre professores e alunos, como unidade de sentido composta por estágios previsíveis e prováveis; descrição, à época, consi- derada valiosa, ainda que hoje a perspectiva seja a de que representa apenas um tipo de interação de um determinado contexto histórico-cultural da instituição educacional. Coulthard (1977) também é uma referência importante para o gru- po de estudiosos que se denominou escola de Ad no contexto inglês. Essa breve revisão já aponta para uma tendência das abordagens de estudos da linguagem, cuja unidade mínima de análise deixa de ser a frase e passa a uma unidade maior, de trabalhar, de um lado, com o texto escrito e, de outro, com o discurso oral. O que, de certa maneira, pode ser entendido como uma associação dos conceitos de “texto” e “discurso” com os modos escrito e oral da linguagem (ver o capítulo 1 de van dIJK, 1997, sobre o sentido dicionarizado da palavra “discurso”). tratarei, na próxima seção, do uso de conceitos básicos, como texto e discurso, além de outros, no âmbito dessas abordagens. alguns conceitos Básicos Como exposto acima, de um lado, os teóricos da Ad inglesa usavam o conceito “discurso” e, conseqüentemente, a colocação “análise do discurso”, para significar uma unidade maior da linguagem oral em uso e a proposta de abordagem para análise desta unidade, respectivamente; de outro, usavam o conceito “texto” e a colocação “análise de texto” ou “análise textual” para significar uma unidade maior da linguagem escrita em uso e a propostade abordagem para análise desta unidade, respectivamente. Era o período em que os estudiosos, embora já hou- vesse abordagens dedicadas à análise de outros signos semióticos diferentes da linguagem oral e escrita, concentravam-se na dicotomia oral/escrito, o que resul- 20 • Olhares em Análise de discurso Crítica Parte I – Caminhos Teóricos • Percursos das Abordagens Discursivas Associadas à lingüística Sistêmica Funcional tou em vasta produção de trabalhos com descrição dos dois modos da linguagem. duas publicações que devem ser mencionadas para fazer jus a estes trabalhos são aquelas editadas por Coulthard, Advances in spoken discourse analysis e Advances in written text analysis, em 1992 e 1994, respectivamente. Estas duas obras são coleções de artigos que replicam, com sucesso, os procedimentos e técnicas de Ad e de análise textual criados por teóricos, em sua maioria, com base na lingüística sistêmico-funcional hallidayana. também devem ser registrados aqui os quatro volumes editados por van dijk na década de 1980 e intitulados The handbook of discourse analysis, sobre os quais não me estenderei tendo em vista o objetivo da minha proposta de revisão, de focalizar a atenção em abordagens de discurso que dialoguem com a lingüística sistêmica. Os conceitos “texto” e “discurso” foram sendo usados ao longo destes trinta ou quarenta anos de modo a criar significados diferentes, além de serem associados a uma gama de outras noções que se fizeram necessárias quando a unidade de interesse dos pesquisadores deixou de ser o texto oral ou escrito, conforme exposto acima. Esta unidade é denominada de “texto”, agora entendido como unidade de significado em que se faz uso de recursos semióticos verbais, orais ou escritos, e não-verbais, como imagens, sons, gestos, dentre outros; analisado como um evento num dado contexto sociocultural e histórico de produção, de distribuição e de con- sumo. É importante mencionar que Halliday (1978), em seu modelo de linguagem como semiótica social, propõe um modelo de descrição da linguagem em uso, abrangendo estratos de níveis diferentes, fonológico, léxico-gramatical e semântico (este último compreendendo as três funções que o uso da linguagem pelos seres sociais preenche, as funções “ideacional, a interpessoal e a textual”). Seu modelo também contemplou o contexto social, em dois níveis diferentes, tendo como base o trabalho do antropólogo Malinowski. O primeiro, o contexto específico de uso da linguagem, denominado “contexto de situação” e relacionado por Halliday ao con- ceito abstrato de “registro” que abrange as variáveis de “campo, relações e modo”, as quais, por sua vez, inter-relacionam-se com as funções do extrato semântico da linguagem. O segundo, o contexto mais amplo das instituições sociais em que a linguagem é usada, denominado “contexto da cultura”. O poder e a ideologia são noções das quais o pesquisador não pode prescindir se pretende descrever o texto de modo a abranger seu contexto de cultura e, para tanto, a noção de “gênero” (para alguns do texto, para outros do discurso) se faz necessária (ver descrições abrangentes de HALLIdAY; HASAN, 1985, sobre registro e gênero). Entender gêneros como “gêneros de texto” é focalizar as convenções mais ou menos estáveis historicamente, atribuídas aos textos como eventos comunicativos das práticas das instituições sociais de uma dada cultura. Já entender gêneros como “gêneros de discurso” é privilegiar os discursos que são reproduzidos ou que se Olhares em Análise de Discurso Crítica • 21 ISBN 978-85-909318-0-5 • Célia Maria Magalhães constroem nos textos. Para desfazer a circularidade desta definição, é preciso voltar ao conceito de “discurso” que, por algum tempo, esteve sempre associado à “lin- guagem oral” nas abordagens de Ad inglesas. A partir do final dos anos 1970, um grupo de lingüistas da universidade de East Anglia (ver FOWLER; HOdGE; KRESS; tREW, 1979; KRESS; HOdGE, 1979), afiliados a lingüística sistêmico-funcional, e que se denominou “lingüistas críticos”, iniciou um diálogo com teóricos de outras áreas de estudo, como o filósofo Habermas e, mais tarde, o filósofo Michel Foucault. O contato com esses teóricos teve vários desdobramentos para as abordagens dis- cursivas inglesas, dentre os quais destaco, nesta seção, a revisitação do conceito de “discurso” que levou a uma distinção entre o uso do termo no singular e no plural. “discurso”, no singular, passa a significar a linguagem em uso (qualquer modo e com qualquer recurso semiótico) em seu contexto de situação e de cultura. O termo “discursos”, no plural, resgata e se apropria do conceito de “formações discursivas” de Foucault, significando representações de mundo com base nas perspectivas socioculturais particulares (ver, ainda, sobre gênero, FAIRCLOuGH, 1989, 1992; KRESS, 1985; HOdGE; KRESS, 1988). tais desdobramentos propiciam a criação de grupos ou escolas de pesquisadores em torno de abordagens de estu- dos da linguagem um pouco diferenciadas, variando o seu objeto de estudo entre “discurso” e “discursos”. Cumpre, ainda, destacar o conceito de estrato da linguagem, intitulado “se- mântica do discurso”, de Martin (1992), que, pode-se dizer, renomeia o estrato semântico de Halliday, expandindo-o para além dos seus componentes, as funções da linguagem, com as categorias de “relações lexicais”, “estrutura conversacio- nal”, “referência e conjunção”, cada uma dessas categorias associadas às funções ideacional, interpessoal e textual, respectivamente (sobre semântica do discurso, ver também EGGINS, 1994). Segundo Martin, em lugar de organizar um modelo de análise da linguagem baseado em significados da oração (unidade mínima de análise do modelo hallidayano) e que contrapõe gramática e coesão, seu modelo contrapõe gramática e semântica e focaliza os significados no nível do texto, por isso a necessidade de um estrato denominado “semântica do discurso”. O autor faz, assim, uma conjunção de dois conceitos – semântica e discurso – associando- os ao significado do texto como unidade de análise. de qualquer forma, o termo “discurso”, conforme usado pelo autor, parece ter uma configuração diferente daquelas que o conceito têm ao ser apropriado pelas escolas de lingüistas críticos e analistas críticos do discurso e coincide com uma noção de texto como unidade semântica, mas já apontando para a sua vinculação a gêneros. Finalmente, vale a pena ressaltar que, ao longo do desenvolvimento das aborda- gens discursivas contemporâneas, os analistas têm se voltado para a descrição de gêneros e de discursos. Entretanto, há também um movimento recente de resgate do 22 • Olhares em Análise de discurso Crítica Parte I – Caminhos Teóricos • Percursos das Abordagens Discursivas Associadas à lingüística Sistêmica Funcional conceito de “estilo”, antes reservado apenas para os gêneros literários e associado a autores, épocas ou escolas literárias. Fowler (1966) já problematiza o conceito conforme utilizado apenas para textos literários e Leech e Short (1981) instituem a noção de “estilo do texto”. Mais recentemente, Fairclough (2000, 2003) associa o estilo a traços pessoais de identificação dos usuários de textos. do conceito, conforme usado por Fairclough, van Leeuwen (2005) o expande, fazendo um per- curso interessante pelas noções de “estilo individual”, “estilo social” e “estilos de vida”. de qualquer modo, o movimento é interessante à medida que dois conceitos, o de gênero e estilo, antes associados apenas aos textos literários, dessa forma, tornando-os uma classe de textos especiais em relação aos outros, na contempo- raneidade, mostram-se produtivos para a análise de qualquer outro texto/evento de qualquer outra instituição social, o que parece reforçar a proposta de Fowler (1981), da literatura como discurso social como qualquer outro. talvez hoje, na era dos conceitos de discurso(s) e poder, seja o momento de repensarmos a literatura não mais como discurso, mas comoinstituição social, como a religião, o Estado, a ciência, a mídia e o mercado, para falar apenas das cinco mais proeminentes nas culturas, que teve muito poder com a invenção da imprensa e sua introdução na instituição educacional ocidental e hoje tem seu poder dividido com outras mídias produtoras de outros recursos semióticos. A questão merece mais espaço para discussão do que aquele que tenho aqui, neste artigo de revisão teórica, por isso, deixo-a, por enquanto, em suspenso. No breve resumo acima sobre as concepções diferenciadas dos termos-chave em uso nas abordagens discursivas sobre as quais o foco deste trabalho recai, algumas vezes fiz referência a escolas e/ou grupos de pesquisadores que foram se constituindo em torno do mesmo objeto de estudo, que varia do texto, passando pelo texto em contexto e chegando ao discurso. Na próxima seção, volto-me para uma breve revisão de coletâneas que trazem o rótulo de “discurso” e que foram publicadas nos últimos dez anos. mapa da pesquisa em ad publicada em Língua inglesa por pesquisadores de Background inglês Meu propósito nesta seção de revisão é bem focalizado. Não pretendo me referir às inúmeras publicações de autores que se propõem a introduzir a proposta de Ad, geralmente intituladas An introduction to discourse analysis. também não pretendo fazer referência a obras como a de Schriffin (1994) ou de Mills (1997) ou, ainda, o de Blommaert (2005), cada qual com sua especificidade de abordagem ao tema. Volto-me para as coletâneas, como a de van dijk (1997a, 1997b), Jaworski e Cou- pland (1999) e Schriffin, tannen e Hamilton (2001) que, acredito, constituem por si sós, um mapeamento de trabalhos cujo interesse de pesquisa pode ser considerado Olhares em Análise de Discurso Crítica • 23 ISBN 978-85-909318-0-5 • Célia Maria Magalhães como sendo o discurso, embora parta de diversas perspectivas interdisciplinares da lingüística e, simultaneamente, são um marco, ou a legitimação, do campo de estudos no universo do mundo acadêmico, pelo menos, aquele que se expressa em língua inglesa. Volto a frisar que não me proponho, contudo, a focalizar as escolas ou grupo de pesquisadores americanos, embora todas as três coletâneas incluam trabalhos os mais diversos de pesquisadores de língua inglesa ou não. Ao analisar as coletâneas editadas por van dijk em 1997, o que primeiro chama a atenção é a distribuição dos trabalhos cujo interesse de pesquisa é o discurso em dois volumes, cujos títulos são Discourse as structure and process e Discourse as social interaction. Van dijk parece organizar as diversas contribuições, tomando como base as perspectivas por meio das quais o discurso está sendo abordado, como “estrutura e processo” e como “interação social”, incluindo as múltiplas possibilidades de diálogo entre a Ad e outros campos disciplinares da Lingüística. tomando como base as definições dos conceitos contemporâneos de discurso(s), acima expostas, pode-se dizer que esses dois aspectos são inerentes ao(s) discurso(s) e que haveria, na organização dos trabalhos, uma tentativa de reunir os trabalhos de acordo com seu foco de análise em apenas um dos aspectos, o que é perfeita- mente admissível de acordo com as convenções acadêmicas. O primeiro volume cobre trabalhos dentre os quais estudo e história do discurso, semântica do dis- curso, discurso e gramática, estilos de discurso, retórica, narrativa, argumentação, gêneros e registros do discurso, semiótica do discurso, cognição, cognição social e discurso. O segundo cobre pesquisas intituladas como discurso e interação na sociedade; pragmática discursiva; AC e ação social como práticas de significação; diálogo institucional; gênero social no discurso; discurso, etnia, cultura e racismo; discurso organizacional; discurso e política; discurso e cultura; análise crítica do discurso; análise do discurso aplicada. Os dois volumes constituem referência obri- gatória para os interessados no campo da Ad e os artigos ali reunidos constituem ponto de partida para qualquer tipo de abordagem do discurso com as diferentes possibilidades de entrecruzamento de teorias lingüísticas. O volume Jaworski e Coupland (1999) intitula-se como reader e inclui teóricos os quais, por assim dizer, podem ser tomados como precursores dos estudos de discurso, como o filósofo da linguagem Austin, J. L., o lingüista Jakobson, R., e o teórico e crítico dos estudos literários, Bakhtin, M. M. O volume tem uma in- trodução em que os autores descrevem as diversas perspectivas da Ad, a partir dos múltiplos significados do conceito discurso. Apesar dessa multiplicidade de conceitos, pode-se dizer que afinal as perspectivas de Ad se reúnem em torno de três abordagens: a primeira que toma discurso como qualquer unidade maior que a frase, a segunda como qualquer instância de linguagem em uso e a terceira como qualquer instância de linguagem como prática social. Os autores também desta- 24 • Olhares em Análise de discurso Crítica Parte I – Caminhos Teóricos • Percursos das Abordagens Discursivas Associadas à lingüística Sistêmica Funcional cam a Ad como interdisciplinar, abrangem as noções de discursos multimodais e multivozeados e chamam a atenção para as camadas de sentido social no discurso, descrevendo brevemente, por fim, as seguintes tradições de Ad: teoria de atos de fala e pragmática, análise da conversação, psicologia discursiva, etnografia da co- municação, sociolingüística interacional, análise da narrativa e análise crítica do discurso. O volume divide-se em seções temáticas voltadas para o foco de interesse dos analistas que contribuem para a coletânea, com introdução explicativa dos editores. A Parte I, intitulada Discurso: significado e contexto, a Parte II, Métodos e recursos para análise de discurso, a Parte III, Seqüência e estrutura, a Parte IV, A negociação de relações sociais, a Parte V, Identidade e subjetividade e, finalmente, a Parte VI, Poder, ideologia e controle. Vale a pena observar dois pontos. Primeiro, os autores incluem no volume textos de sociólogos como Giddens e Bourdieu e do filósofo Foucault, cujos trabalhos se voltam ou se voltaram para o discurso e têm sido usados como pontes interdiscipli- nares valiosas por analistas do discurso. Segundo, embora muitas das abordagens de Ad partam da LSF, Jaworski e Coupland (1999) não incluem a Semiótica Social de Halliday neste reader nem as diversas abordagens de Ad que têm como base a teoria hallidayana. Entretanto, é reconhecido na comunidade acadêmica internacional e nacional que Halliday elabora sua teoria de linguagem como Semiótica Social, integrando noções de trabalhos sociológicos, como os de Bernstein, de estudos antropológicos, como os de Malinowski, e da escola de lingüistas de Praga, para citar apenas alguns. Essa perspectiva teórica de linguagem e sociedade, por si só, já apontaria para a necessidade de incluir o trabalho de Halliday no reader dos autores. Coupland e Jaworski (1997), entretanto, incluem as propostas de Halliday (1978) e de Hodge e Kress (1988), uma expansão da noção de linguagem como Semiótica Social para incluir outros recursos semióticos para além dos verbais, em um reader de Sociolingüística em que, curiosamente, na contribuição de Halliday, de saída, o autor já procure mostrar como seu trabalho se distingue do trabalho dos Sociolingüístas. Na introdução de Schriffin, tannen, e Hamilton (2001), as autoras também partem das três categorias conceituais que o termo “discurso” abrange e, con- seqüentemente, organizam a publicação com uma gama de perspectivas de Ad. tais perspectivas têm como escopo a gama de questões que a Ad tem procurado descrever, variando de fenômenos lingüísticos, passando por fenômenos interdis- ciplinares e chegando até questões sociais, como gênero social e discriminação. As autoras dividem as contribuições do volume em quatro partes. A primeira dá uma visão geral das questões especificamente lingüísticas para as quais a Ad podecontribuir para resolver, como coesão e textura, relevância, estrutura da informa- ção, análise de registro, dentre outras. A segunda parte concentra-se nas práticas Olhares em Análise de Discurso Crítica • 25 ISBN 978-85-909318-0-5 • Célia Maria Magalhães de análise, na relação dessas práticas ou metodologias com teorias. A terceira focaliza os contextos de interação em que a linguagem é usada e subdivide-se em duas seções: a primeira ressaltando os domínios políticos, sociais e institucionais do uso da linguagem e os papéis dos interlocutores nesses domínios; a segunda, embora não deixe de lado tais domínios, concentra-se em descrever o discurso de determinados grupos de pessoas em relação a gêneros de discurso, a comunidades e a culturas, em contextos de situação específicos. Finalmente, a quarta e última parte, tenta dar conta das relações de interdisciplinaridade na Ad, de como esta pode se expandir com o contato com outras disciplinas bem como da função que a Ad pode ter na resolução de questões de outras disciplinas. A preocupação, nesta seção, foi estabelecer uma revisão mínima de trabalhos que se constituem na consolidação e na legitimação do campo de estudos da Ad no âmbito acadêmico de língua inglesa. Na próxima seção, volto-me para uma breve revisão de obras que focalizam a ACd como escola de relevo dentro da Ad. a acd: teoria, método, escola de ad ou campo de estudos independente? Não há, ainda, um reader reunindo trabalhos de ACd, o que pode ser uma indicação de que não se trata, ainda, de um campo de estudos independente, mas de escola ou abordagem consolidada dentro da Ad e em destaque na contempo- raneidade. A primeira obra que listo na minha revisão é Caldas-Coulthard e Coul- thard (1996). Nesta obra, os editores reúnem, numa primeira parte, cinco textos de teóricos proeminentes das escolas de Lingüística Crítica e de Análise Crítica do discurso, quatro dos quais têm como base ou fazem largo uso da teoria sistêmi- ca hallidayana em sua abordagem discursiva (FOWLER, Roger; KRESS, Gunther; VAN LEEuWEN, theo; FAIRCLOuGH, Norman). Na segunda parte, os editores reúnem trabalhos cuja prática é a abordagem crítica de textos, dentre eles artigos dos próprios editores e de outros teóricos que usam a lingüística sistêmica como ferramenta de análise (con)textual. A segunda obra é de Wodak e Meyer (2001) que reúne trabalhos de autores proeminentes cujos princípios teóricos de abordagem de discurso possibilitam con- figurá-los como parte de um terreno comum, ainda que seus métodos de descrição do mesmo objeto de estudo sejam os mais diversos, variando de ferramenta dos estudos cognitivos até as ferramentas de análise sistêmico-funcional. Vale a pena iniciar a leitura deste volume pelos dois artigos iniciais, dos editores. O primeiro deles, de Ruth Wodak, traça o desenvolvimento histórico da LC até tornar-se mais conhecida como ACd, aborda os principais conceitos e faz considerações sobre os desenvolvimentos desta abordagem. É curioso ressaltar as escolhas de itens lexicais, 26 • Olhares em Análise de discurso Crítica Parte I – Caminhos Teóricos • Percursos das Abordagens Discursivas Associadas à lingüística Sistêmica Funcional usadas pela autora ao longo do artigo, para definir ou se referir à ACd: estas variam de teoria, abordagem, escola, paradigma de Ad, pesquisa, grupo, dentre outras. Para além da instabilidade na representação da ACd, o que o artigo desenvolve muito bem é a noção de que o interesse dos pesquisadores de ACd estabelece-se em torno de questões sociais em que está envolvida a naturalização de ideologias e abuso de poder e em torno de uma agenda de intervenção e mudança social por meio do estudo das instâncias de discurso. O segundo, de Michael Meyer, parece reconhecer a dificuldade de nomear a ACd como teoria, método ou política devido à diversidade de teorias às quais os analistas se afiliam e de métodos que usam para atingir o seu propósito de análise. O autor introduz os conceitos de posicionamento ou posição que parecem contemplar a diversidade inerente da ACd sem, contudo, deixar de ressaltar os princípios básicos e comuns que permitem o mapeamento de um terreno comum para as diferentes abordagens. Finalmente, a terceira obra, de Weiss e Wodak (2003), traz uma introdução dos editores com reflexões sobre a formação de teorias em um nível mais geral e sobre a formação da ACd como teoria multifacetada. Os autores também ressaltam a multiplicidade de métodos usados pelos analistas para abordar suas três questões de interesse principais: o discurso, a ideologia e o poder. O movimento interdisciplinar da ACd para dar conta destas questões, terminando por propor uma abordagem baseada num conceito de “contexto” com quatro níveis: o primeiro, de descrição imediata da linguagem; o segundo, de relação intertextual e interdiscursiva entre os textos, gêneros e discursos; o terceiro, das variáveis extralingüísticas sociais relativas aos contextos de situação específicos das instituições onde a linguagem é usada e, o quarto, os contextos sociopolíticos e históricos em que as práticas discursivas institucionais se encaixam. As coletâneas de teun van dijk e de debora Schriffin, debora tannen e Heidi Hamilton; o reader de Adam Jaworski e de Nicholas Coupland se preocupam em reunir trabalhos visando à configuração e à legitimação do campo de Ad, como exposto acima, os quais têm como objeto de interesse quaisquer unidades maiores que a frase e perspectivas as mais variadas em relação a estas unidades. As cole- tâneas que focalizam a ACd, dentro, ou talvez já constituindo um espaço que se configura para além da Ad, reúnem trabalhos de pesquisadores que se interessam pelo discurso como prática social, que têm um posicionamento comum frente à questão do discurso, mas que o abordam a partir das mais diversas combinações teóricas interdisciplanares e usando os mais diversos métodos de análise textual. Na próxima seção, volto-me para a revisão de publicações que se preocupam em reunir trabalhos de Ad que têm afiliação teórica explícita com a LSF e que a utilizam, em graus variados, como teoria/método base para atingir seu objetivo acadêmico. Olhares em Análise de Discurso Crítica • 27 ISBN 978-85-909318-0-5 • Célia Maria Magalhães abordagens discursivas e a SFL Nesta seção, pretendo citar, ainda que brevemente, seis obras. Apenas uma delas é uma coletânea de trabalhos de ACd com base sistêmica. As demais são descrições de abordagens de Ad que partem da sistêmica como teoria/método de análise textual para expandir seus horizontes de análise, cada uma definindo muito bem as especificidades do seu terreno dentro do mapa de Ad. Inicio com Kress e van Leeuwen (1996) que constroem, a partir da gramática funcional, uma gramática do design visual, com foco na análise de imagens. Em Kress e van Leeuwen (2001) os autores tratam de expandir o que antes denominaram de gramática para o que chamam de discurso multimodal, focalizando os vários modos e mídias da comunicação contemporânea. As duas obras e várias outras, que não serão listadas aqui tendo em vista o escopo do artigo, concentram-se, pois, nos mais variados “recursos semióticos” que reproduzem e simultaneamente ajudam a construir significados no mundo contemporâneo das multimídias e são reconhecidas no mundo acadêmico como Análise Multimodal do discurso (AMd) ou teoria da Multimodalidade. No ano de 2003, há, pelo menos, três publicações de relevo a listar. A primeira é de Fairclough (2003), que descreve sua abordagem de linguagem como pesquisa de cunho social, transdisciplinar, com teoria e métodos próprios, cujo interesse principal é o discurso, e que, por isso, tem como base a análise textual fundamentada na LSF. A segunda é de Kress (2003), a qual, com objetivos educacionais, volta-se para questões do letramento, produção e compreensão de textos na escola numa época em que os textos são cada vez mais multimodais. A proposta do autor incluium quadro teórico para o letramento na escola na era da multimodalidade e da multimídia, com foco numa teoria social de gênero. A terceira é Working with discourse: meaning beyond the clause, de Martin e Rose (2003), cuja preocupação é a interpretação do discurso social por meio da análise de textos em contextos sociais. Os autores consideram, de saída, tanto a oração, quanto o texto e a cultura como processos sociais que se desenvolvem em diferentes momentos históricos. Sua proposta é, pode-se dizer, uma expansão do modelo de Martin (1992) em direção a uma abordagem hoje já conhecida como Análise Positiva do discurso (APd), fortemente baseada na análise de registro, gênero e contexto social. Os autores fecham o livro apresentando as diferenças de posicionamentos de sua abordagem, da AMd e da ACd; entretanto, chamando muito mais atenção para a possibilidade de conexões entre as abordagens. Finalmente, antes de fechar esta seção, listo a edição de Young e Harrison (2004) de uma coletânea de artigos cujo interesse de estudo é a mudança social. Para abordar suas questões de pesquisa as quais envolvem o(s) discurso(s), os autores ali reunidos fazem uso da escola de ACd que tem como base a teoria da 28 • Olhares em Análise de discurso Crítica Parte I – Caminhos Teóricos • Percursos das Abordagens Discursivas Associadas à lingüística Sistêmica Funcional LSF para análise de textos em contextos sociais. O livro divide-se em três seções, a primeira dedicada à teoria, incluindo variação discursiva, sistemas de avaliação de sentido, representação de poder e base sociológica para a análise (con)textual fundamentada na Sistêmica; a segunda e a terceira reunindo trabalhos que focali- zam questões de identidade nacional e institucional, respectivamente. Por fim, van Leeuwen (2005) é uma obra de introdução à Semiótica Social crítica que define os princípios semióticos os quais norteiam a abordagem tais como os recursos, a mudança, as regras e as funções (associadas às funções hallidayanas); as dimen- sões da análise semiótica, incluindo discurso, gênero, estilo e modalidade, além de preocupar-se com recursos de coesão multimodal, como o ritmo, a composição, a ligação de informação e o diálogo. Até aqui, meu propósito foi traçar brevemente um mapa para o campo de análise do discurso, destacando a LSF como teoria precursora e alimentadora de novas abordagens dentro desse campo, incluindo as abordagens iniciadas ou criadas por pesquisadores, ou de “background” inglês, ou cuja língua habitual de publicação seja o inglês, ou ainda outros pesquisadores que não se encaixem nas duas pri- meiras categorias, mas que já têm seus trabalhos aceitos no circuito acadêmico internacional. Na próxima e última seção, tento explicar brevemente um projeto de mapeamento e referenciação, iniciado por um grupo de pesquisadores brasileiros e portugueses, de trabalhos de pesquisa cujo interesse seja o discurso como prática social, publicados em Língua Portuguesa ou Inglesa. mapeamento e referenciação de trabalhos de Brasileiros e portugueses Foi realizado, na unB, em outubro de 2004, o VII Encontro Nacional de Inte- ração em Linguagem Verbal e Não-Verbal e I Simpósio Internacional em Análise de discurso Crítica (sendo este o título usado pelo grupo de pesquisadore(a)s da unB que têm promovido o evento há sete anos), com a participação representati- va de pesquisadore(a)s brasileiro(a)s, e de pesquisadores de Portugal, Espanha, Inglaterra e Estados unidos. Neste encontro, ficou evidenciado que, desde a publi- cação, no Brasil, dos primeiros trabalhos de pesquisadoras pioneiras da unB e da uFSC (MAGALHÃES, I., 1986; CALdAS-COuLtHARd, 1993), usando abordagens de Ad e/ou afiliadas à LSF, o número de trabalhos de brasileiros e portugueses, orientados e publicados dentro do campo de estudos, em universidades diversas, aumentou consideravelmente. Há diversos grupos de pesquisadores brasileiros no contexto nacional, como é o exemplo da PuC/SP, da uFSC, da uNISuL, da uFRJ e da uFMG. O grupo de pesquisa da unB edita, há vários anos, a Revista linguagem e sociedade, com amplo espaço para publicações do campo de estudos em questão, Olhares em Análise de Discurso Crítica • 29 ISBN 978-85-909318-0-5 • Célia Maria Magalhães e lança agora o livro Olhares em análise de discurso crítica, em que ora publico este trabalho. Para citar apenas as coletâneas cujo título inclui o rótulo “ACd” em Língua Portuguesa, há a coletânea Pedro (1997), dividida em duas partes, a primeira com tradução de textos fundacionais de ACd e a segunda com trabalhos de aplicação da abordagem por pesquisadores portugueses; há, ainda, a coletânea Magalhães (2001), com a tradução de um texto de Norman Fairclough e com aplicações de abordagens de ACd por professores, doutorandos e mestrandos. Mais recentemente, foram publicados dois volumes especiais de periódicos tematizados como ACd, Caldas-Coulthard e Figueiredo (2004) e Magalhães, I. e Rajagopalan (2005), reu- nindo trabalhos de pesquisadores nacionais, além de traduções de outros textos escritos originalmente em Língua Inglesa; e o volume do periódico organizado por Heberle e Meurer (2004), reunindo trabalhos, a maioria de brasileiros, de afiliação teórica com a LSF. Na reunião de encerramento do Encontro, citado anteriormente, foi lançada a idéia de integrarem-se o(a)s pesquisadore(a)s brasileiro(a)s e portuguese(a)s em uma lista de discussão dos termos da área, com base em textos fundacionais traduzidos no Brasil e em Portugal. tal idéia se inspirou no trabalho da equipe da PuC/SP e da universidade de Lisboa, que fez o caminho inverso, criando uma lista de discussão de termos na área da Lingüística Sistêmica, com o fim de padronizar a terminologia e de traduzir a gramática funcional de Halliday (1985). Em 2005, elaborei uma proposta de projeto de mapeamento e de referencia- ção cujo objetivo geral é o mapeamento do campo de estudos Análise Crítica do Discurso, dentro do escopo do grupo de pesquisa Corpus discursivo para Análises Lingüísticas e Literárias (CORdIALL), da uFMG. tal projeto focaliza trabalhos de pesquisadores brasileiros e portugueses cujo interesse de pesquisa é o discurso como prática social, que foi acolhido pelos demais grupos de pesquisadores. As abordagens discursivas que o projeto tem em mente são aquelas afiliadas à LSF, além de outras, cujo propósito de análise possa ser contemplado por sistemas tridimensionais de discurso, representados nas Figuras 1 e 2, abaixo, idealizadas com base em Hodge e Kress (1988) e Fairclough (1992): Figura 1 Figura 2 30 • Olhares em Análise de discurso Crítica Parte I – Caminhos Teóricos • Percursos das Abordagens Discursivas Associadas à lingüística Sistêmica Funcional Em ambas as representações, baseadas nos autores citados, é possível distinguir a abordagem de análise em três dimensões, as dimensões do texto, gênero e discurso. Na Fig. 1, todo evento em que a linguagem é usada como semiótica social há uma mensagem que é produzida como texto, no plano da mímese, e interpretada como discurso, no plano da semiose; o gênero representa uma dimensão de ligação entre texto e discurso para permitir a interpretação desta última dimensão. Para o desenho da Fig. 2, revisitei o quadro tridimensional de Fairclough (1992). Nesta representa- ção, o interesse é muito mais sociológico do que semiótico, embora não se deixem de lado os recursos semióticos usados para se construir o discurso. Por isso, temos a dimensão do texto; a dimensão da prática discursiva, o reino das instituições e de seus eventos discursivos que podem ser associados a gêneros, e a dimensão da prá- tica social, o reino dos discursos, crenças, ideologias e poder. As representações de Hodge e Kress e de Fairclough, ao fim e ao cabo, são apropriações e transformações do modelo tripartite de Semiótica Social de Halliday em que a “linguagem” (texto) é produzida em “contextos de situação” específicos em “contextos de cultura”mais abrangentes, para criar “representações” e “relações interpessoais” por meio de “mensagens”. O projeto de mapeamento do campo de estudos no Brasil e em Portugal tem como metas específicas: 1. A consolidação de uma lista consensual de termos, elaborada com base em discussões de pesquisadore(a)s da unB, PuC/SP, uFRJ, uNISuL, e uFSC no âmbito nacional; do pesquisador Carlos Gouveia, da universidade de Lisboa, e da pesquisadora Carmen Rosa Caldas-Coulthard, da university of Birmingham, no âmbito internacional, com base nos subsídios de traduções já existentes para a Língua Portuguesa. Alguns exemplos da lista de termos traduzidos até então levantados e que estarão disponíveis na lista de dis- cussão no início do semestre letivo de 2006 são apresentados no Quadro 1, abaixo: tradução original “Aparelhos Ideológicos de Estado” (AIEs) “Ideological State Apparatuses” (ISAs) Agência Agency Agente Agent Agregação Aggregation Anacronismo Anachronism Análise da Conversação (AC) Conversation Analysis (CA) Análise de discurso ”Abrangente” “Comprehensive” discourse Analysis Apagamento deletion Aspectos de polidez Politeness features Olhares em Análise de Discurso Crítica • 31 ISBN 978-85-909318-0-5 • Célia Maria Magalhães Assimilação Assimilation Associação Association Ator social Social actor Autonomização de enunciado uterrance autonomisation Beneficiários Beneficiaries Categorização Categorisation Circunstância de acompanhamento Circumstances of accompaniment Circunstancialização Circunstancialization Classificação Classification Código elaborado Elaborated code Código restrito Restricted code Quadro 1. Lista bilíngüe de termos em ACd. 2. A compilação de resumos de dissertações, teses e artigos acadêmicos de pesquisadore(a)s do Brasil e de Portugal no campo da ACd, com base nas quais será gerada uma lista de termos que serão associados aos temas de interesse dos referidos pesquisadores. 3. A criação de um banco de dados, a ser sediado pela FALE/uFMG, com um diretório constituído pelos resumos e abstracts compilados, a lista de pa- lavras-chave norteadora dos trabalhos de pesquisadore(a)s brasileiro(a)s e portuguese(a)s e um diretório de textos que venham a ser publicados com base no trabalho de mapeamento realizado e autorizados para divulgação na página do projeto http://net.letras.ufmg.br/acd/. Conforme exposto acima, já contamos com os periódicos e coletâneas citadas, dentre outras publicações cujos resumos e termos serão referenciados. considerações Finais Retomando a introdução deste trabalho, creio que os propósitos ali descritos foram atingidos, pelo menos, dentro do escopo pretendido. Concentrei-me, em primeiro lugar, nos textos fundacionais de Halliday e de outros seguidores de sua teoria que contribuíram para difundir e criar escolas de análise do discurso baseadas na LSF; fiz uma rápida descrição dos conceitos principais norteadores dessas escolas; fiz uma breve revisão de coletâneas publicadas com trabalhos em Ad no âmbito acadêmico de Língua Inglesa; parti dessa revisão para apresentar, de forma sucinta, algumas coletâneas que têm se concentrado na ACd como tema e, ainda, abordagens de discurso de pesquisadores contemporâneos que têm como teoria e método de análise textual a LSF. Por fim, relatei o esforço conjunto de pesquisadores brasileiros e portugueses para iniciar o projeto de mapeamento e referenciação dos trabalhos produzidos por seus grupos de pesquisadores, o qual 32 • Olhares em Análise de discurso Crítica Parte I – Caminhos Teóricos • Percursos das Abordagens Discursivas Associadas à lingüística Sistêmica Funcional está em andamento e tem previsão para terminar ao final do ano de 2006. Como todo trabalho de revisão teórica, o propósito é contribuir com os demais pesquisa- dores que se interessam pelo discurso com base nas perspectivas citadas, fazendo referência a trabalhos e a termos-chave dessas perspectivas. Além disso, gostaria de atingir o objetivo subsidiário de incentivar tais pesquisadores a participar do projeto de mapeamento dos trabalhos brasileiros, incluindo no banco de dados os seus resumos e abstracts e participando da lista de discussão dos termos traduzidos para o português. referências Bibliográficas BLOMMAERt, J. Discourse. Cambridge, uK: Cambridge university Press, 2005. CALdAS-COuLtHARd, C. R. From discourse analysis to critical discourse analysis: theoretical developments. In: Trabalhos em lingüística aplicada, v. 21, jan./jun. 1993, p. 49-62. CALdAS-COuLtHARd, C. R.; COuLtHARd, R. M. (Eds.). Texts and practices: readings in critical discourse analysis. London, New York: Routledge, 1996. CALdAS-COuLtHARd, C. R.; FIGuEIREdO, d. C. (Orgs.). Análise crítica do discurso. linguagem em (dis)curso, v. 4, Número Especial, 2004. COuLtHARd, R. M. An introduction to discourse analysis. London: Longman, 1977. COuLtHARd, R. M. (Ed.). Advances in spoken discourse analysis. London, New York: Routledge, 1992. ________________. (Ed.). Advances in written text analysis. London, New York: Routledge, 1994. COuPLANd, N.; JAWORSKI, A. Sociolinguistics: a reader and coursebook. St. Martin’s Press, 1997. EGGINS, S. An introduction to systemic functional linguistics. London, New York: Continuum, 1994. FAIRCLOuGH, N. language and power. London, New York: Longman, 1989. _______________. Discourse and social change. Oxford, uK; Cambridge, MA: Polity Press and Blackwell, 1992. _______________. new labour, new language? London: Routledge, 2000. Olhares em Análise de Discurso Crítica • 33 ISBN 978-85-909318-0-5 • Célia Maria Magalhães _______________. Analysing discourse: textual analysis for social research. Lon- don, New York: Routledge, 2003. FOWLER, R. et al. language and control. London, Boston, Henley: Routledge & Kegan Paul, 1979. FOWLER, R. Essays on style and language: linguistic and critical approaches to literary style. London: Routledge & K. Paul, 1966. _________. literature as social discourse: the practice of linguistic criticism. Bloomington: Indiana university Press, 1981. HALLIdAY, M. A. K.; HASAN, R. Cohesion in english. London: Longman, 1976. ___________________. language, text and context: aspects of language in a social semiotic perspective. Australia: deakin university Press, 1985. HALLIdAY, M. A. K. language as social semiotic: the social interpretation of language and meaning. London, New York, Melbourne, Auckland: Edward Ar- nold, 1978. _________________. An introduction to functional grammar. London: Edward Arnold, 1985/1994. HALLIdAY, M. A. K.; MAttHIESSEN, C. An introduction to functional grammar. London: Edward Arnold, 2004. HEBERLE, V.; MEuRER, J. L. (Orgs.). Systemic Functional Linguistics in Action. Revista Ilha do Desterro, Florianópolis, n. 46, jan./jun. 2004. HOdGE, R.; KRESS, G. Social semiotics. Ithaca, NY: Cornell university Press, 1988. JAWORSKI, A.; COuPLANd, N. The discourse reader. London, New York: Rou- tledge, 1999. KRESS, G. linguistic processes in sociocultural practice. Oxford, uK: OuP, 1985. _________. literacy in the new media age. London, New York: Routledge, 2003. KRESS, G.; HOdGE, R. language as ideology. London, Boston, Henley: Rout- ledge & Kegan Paul, 1979. KRESS, G.; VAN LEEuWEN, t. Reading images: the grammar of visual design. London, New York: Routledge, 1996. ___________. Multimodal discourse: the modes and media of contemporary communication. London, New York: Arnold, 2001. 34 • Olhares em Análise de discurso Crítica Parte I – Caminhos Teóricos • Percursos das Abordagens Discursivas Associadas à lingüística Sistêmica Funcional LEECH, G.; SHORt, M. Style in fiction: a linguistic introduction to english fic- tional prose. London; New York: Longman, 1981. MAGALHÃES, Célia. Reflexões sobre a análise crítica do discurso. Belo Horizonte: FALE-uFMG, 2001. MAGALHÃES, I. Por uma abordagem crítica e explanatória do discurso. Revista DElTA, v. 2, n. 2, 1986, p. 181-205. MAGALHÃES, I.; RAJAGOPALAN, K. (Orgs.).Análise Crítica do discurso. Revista DElTA, v. 21, Especial, 2005. MARtIN, J. R. English text: system and structure. Philadelphia, Amsterdam: John Benjamins, 1992. MARtIN, J. R.; ROSE, d. Working with discourse: meaning beyond the clause. London, New York: Continuum, 2003. MILLS, Sara. Discourse. London, New York: Routledge, 1997. PAGANO, A. S. Abordagens sistêmicas da tradução. São Paulo: Contexto, no prelo. PEdRO, E. R. (Ed.). Análise crítica do discurso. Lisboa: Editorial Caminho, 1998. SCHRIFFIN, d.; tANNEN, d.; HAMILtON, H. E. (Eds.) The handbook of discourse analysis. uSA, uK e Australia: Blackwell Publishing, 2001. SCHRIFFIN, d. Approaches to discourse. London: Blackwell, 1994. SINCLAIR, J. McH.; COuLtHARd, R. M. Towards an analysis of discourse: the english used by teachers and pupils. Oxford, uK: OuP, 1975. VAN dIJK, t. A. (Ed.). Handbook of discourse analysis: disciplines of discourse. Academic Press, 1985. _______________. (Ed.). Handbook of discourse analysis: dimensions of dis- course. Academic Press, 1985. _______________. (Ed.). Handbook of discourse analysis: discourse analysis in society. Academic Press, 1985. _______________. (Ed.). Handbook of discourse analysis: discourse and dialogue. Academic Press, 1985. _______________. (Ed.). Discourse as social interaction. London, thousand Oaks, New delhi: Sage Publications, 1997a. _______________. (Ed.). Discourse as structure and process. London, thousand Oaks, New delhi: Sage Publications, 1997b. Olhares em Análise de Discurso Crítica • 35 ISBN 978-85-909318-0-5 • Célia Maria Magalhães VAN LEEuWEN, t. Introducing social semiotics. London, New York: Routledge, 2005. WEISS, G.; WOdAK, R. (Eds.). Critical discourse analysis: theory and interdis- ciplinarity. London, New York: Palgrave MacMillan, 2003. WOdAK, R.; MEYER, M. (Eds.). Methods of critical discourse analysis. London, thousand Oaks, New delhi: Sage, 2002. YOuNG, L.; HARRISON, C. Systemic functional linguistics and critical discourse analysis: studies in social change. London, New York: Continuum, 2004. parte ii diScurSo e identidade Francisca Cordélia Oliveira da Silva Georgina Amazonas Mandarino Walkyria Wetter Bernardes o uSo de metáForaS e a conStrução de identidadeS ÉtnicaS Francisca Cordélia Oliveira da Silva* (UnB) Resumo: O artigo trata de metáforas usadas em textos sobre cotas para negros nas universidades brasileiras e do modo como essas metáforas são usadas para constituir as identidades dos negros. As expressões metafóricas, em sua maioria, traduzem idéias de inferioridade da etnia negra e expressam ideologias naturalizadas em nossa sociedade. Palavras-chave: Negros; Metáforas; Identidades; Análise de discurso Crítica (AdC). Abstract: the text deals with used metaphors in texts on quotas for blacks in the Brazilian universities and the way as these metaphors are used to constitute the identities of the blacks. In its majority, the metaphorical expressions translate ideas of inferiority of the black etnia and express ideologies naturalized in our society. Keywords: Blacks; Metaphors; Identities; Critical discourse Analysis (CdA). apresentação de idéias As sociedades estruturam-se partindo de “idéias” que parecem naturais e que parecem surgir do nada (ou de tudo) e que, por isso, geralmente, não são questionadas. A ideologia é uma dessas “idéias” e sua manifestação ocorre por meio de várias estratégias, como as metáforas. Constituir-se como sujeito, ter e assumir identidades não é tarefa fácil, já que implica aceitação e, algumas vezes, rejeição. Quando o sujeito pertence ao grupo social majoritário, pode enfrentar barreiras e ter uma de suas identidades questiona- da. Entretanto, ao pertencer a um grupo minoritário, poderá encontrar barreiras em vários momentos de sua constituição como sujeito. Surge dessa construção social * Graduada em Letras, Mestre em Lingüística e doutoranda em Lingüística pela universidade de Brasília. Atualmente ministra cursos de Graduação e de Pós-Graduação na área de Língua Portuguesa. E-mail: fcordelias@bol.com.br. 40 • Olhares em Análise de discurso Crítica Parte II – Discurso e Identidade • O Uso de Metáforas e a Construção de Identidades Étnicas desigual a necessidade de pesquisar a construção da identidade de grupos minori- tários, como negros e seus descendentes, objetivo desse artigo. Essas identidades serão investigadas por meio das metáforas expressas em textos sobre o projeto de cotas para negros nas universidades brasileiras. O corpus analisado circulou na Internet nos momentos iniciais de debate sobre as cotas. A análise empreendida responderá aos seguintes questionamentos: • que metáforas são usadas em relação aos negros nos textos analisados? • que identidades sociais essas metáforas constroem para os negros? • que ideologias são reificadas com essas metáforas? Como resultados, serão verificadas identidades socialmente enfraquecidas, estigmatizadas, discriminadas, e o negro sendo representado como ser inferior, submisso, subalterno e dominado. O trabalho trata de uma perspectiva que se abre sobre a questão étnica no Brasil e das relações identitárias e étnicas motivadas por questões históricas, por isso provoca reflexões, ideologias naturalizadas. dos caminhos teórico-metodológicos Para empreender a análise e responder às questões propostas, alguns marcos teóricos precisam ser balizados: o conceito de identidades, de ideologias, de me- táforas e de Análise de discurso Crítica (AdC). a análise de discurso crítica (adc): um caminho a percorrer A AdC apresenta vertentes críticas e não-críticas. Vieira (2002, p. 148) salienta que os analistas do discurso, críticos ou não, têm em comum o fato de defenderem “a inserção da linguagem em contextos sociais”. Na perspectiva crítica, Fairclough (2001) propõe o uso da linguagem como prática social. Para tanto, devemos con- siderar que: • o discurso é um modo de ação e um modo de representação; • o discurso e a estrutura social têm relação dialética; • o discurso é moldado pela estrutura social; • os eventos discursivos variam segundo o domínio social em que são gera- dos; • o discurso contribui para a constituição das dimensões da estrutura social; • o discurso é uma prática de representação e de significação do mundo. Olhares em Análise de Discurso Crítica • 41 ISBN 978-85-909318-0-5 • Francisca Cordélia Oliveira da Silva Para van dijk (1997, p. 15-17), a AdC é um planejamento especial destinado a estudar os textos orais e escritos. É uma área que apresenta princípios, práticas, teorias e métodos de difícil delimitação. O autor apresenta alguns critérios que caracterizam a AdC: • trabalha mais com problemas socias relevantes que com paradigmas; • é um posicionamento ou postura explicitamente críticos para estudar texto escrito e falando; • trabalha inter e multidisciplinarmente com a relação entre discurso e socie- dade; • é parte de amplo aspecto de estudos críticos sobre a humanidade e as ciências sociais; • não se limita ao estudo de discursos verbais; • centra-se nas relações de poder, de dominação e de desigualdade e em suas formas de reprodução ou de resistência; • trabalha as estruturas e as estratégias discursivas de dominação e de resis- tência; • estuda a ideologia e como ela reproduz a resistência, a dominação e a desi- gualdade; • busca descobrir e divulgar as relações de dominação e as estratégias de ma- nipulação, de legitimação e de criação de consenso; • é uma postura de oposição ao poder e às elites; • mantém postura solidária com relação aos grupos dominados. Pedro (1998, p. 23) corrobora o pensamento de van dijk (1997) ao apontar que a AdC trabalha com a intelecção de textos social e culturalmente situados e também com a “atenção a aspectos sociais, co-textuais e culturais que permitem a garantia de categorias de explicação para a descrição de textos”. Para Pedro (1998, p. 27-28), a AdC caracteriza-se pelos seguintes critérios: • entender
Compartilhar