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6 - Direitos humanos e sua correlação com a bioética

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6 - Direitos humanos e sua correlação com a bioética
6.1 Conceitos elementares: biotecnologia, bioética e biodireito
AS INOVAÇÕES DAS CIÊNCIAS BIOMÉDICAS
 mapeamento genético, terapia gênica, clonagem humana, modernas técnicas de procriação artificial, possibilidade de utilização de células embrionárias na cura de doenças graves (mal de Parkinson)
 Direitos Humanos de 4ª Geração: visam à proteção do ser humano diante dessas inovações decorrentes das ciências biomédicas. Preocupam-se com os limites do uso dessas “novidades” em prol do ser humano, evitando assim a violação de seus direitos.
Exemplo de violação:
 Acesso e manipulação das informações genéticas
 Técnicas de reprodução humana assistida
	Outro exemplo de violação de direitos humanos vinculados às inovações das ciências biomédicas pode ser indicado pela restrição ao direito à reprodução humana assistida, com a negativa do Estado de promover e garantir às pessoas de baixa renda o acesso às novas técnicas de reprodução humana assistida.
DIREITOS HUMANOS DE 4ª GERAÇÃO
	Essa geração visa à proteção de direitos individuais, mas, acima de tudo, a proteção da coletividade, dos interesses e valores da humanidade, tendo por base o reconhecimento de que o homem é membro de uma espécie (OLIVEIRA, 2010, p.22).	
BIOTECNOLOGIA
"conjunto de técnicas e processos biológicos que possibilitam a utilização da matéria viva para degradar, sintetizar e produzir outros materiais. Engloba a elaboração das próprias técnicas, processos e ferramentas as espécies, via seleção natural. "
(PESSINI; BARCHIFONTAINE, 1997. p. 251)
NOVIDADES FRUTO DA BIOTECNOLOGIA
a) alimentos transgênicos; 
b) tratamentos médicos decorrentes do uso dessas tecnologias, como a questão das células-tronco; 
c) conhecimentos e possíveis tratamentos relacionados ao genoma humano e à terapia genética; 
d) desenvolvimento de organismos vivos e geneticamente modificados para tratamento da água; 
e) desenvolvimento de novos medicamentos e novas vacinas; 
f) demais avanços na área de biomedicina, como o aperfeiçoamento das técnicas tradicionais da reprodução humana, entre outros.
POSSÍVEIS VIOLAÇÕES DECORRENTES DESSAS NOVIDADES
a) uso indiscriminado de informações genéticas; 
b) alterações no patrimônio genético que afetem de forma imprevisível as gerações futuras; 
c) violações decorrentes de técnicas como clonagem humana, inovações no campo da reprodução humana assistida, entre outras.
BIOÉTICA
 É o ramo da ética filosófica que se ocupa do “estudo das condições de possibilidade dos valores, normas e princípios, que procuram ordenar o avanço científico e tecnológico” (BARRETO, 1998).
 Pode ser definida como “o estudo sistemático das dimensões morais – incluindo visão, decisão, conduta e normas morais – das ciências da vida e do cuidado da saúde, utilizando uma variedade de metodologias éticas num contexto interdisciplinar” (PESSINI; BARCHIFONTAINE, 2000, p. 17).
	É por meio da Bioética que se pretende estabelecer uma discussão ética em torno das inovações decorrentes das ciências biotecnológicas, impondo limites éticos e morais ao uso desses conhecimentos, visando proteger direitos como a vida, integridade física, intimidade, privacidade, igualdade, entre outros.
	É a ciência do dever moral, é desprovida de medidas coercitivas que se fazem necessárias em algumas circunstâncias nas quais apenas valores morais não são suficientes, sendo indispensável a intervenção de mecanismos estatais para que sejam cumpridos esses valores.
BIODIREITO
 Aqui surge a função do Biodireito que visa estabelecer limites fundados não somente em valores éticos e morais, mas sobretudo baseados em normas jurídicas, com poder coercitivo e punitivo.
 Objetivo: “fundamentação e pertinência das normas jurídicas, de maneira a adequá-las aos princípios e valores relativos à vida e à dignidade humanas trazidos pela ética.” Isso equivaleria a afirmar a “existência do Biodireito como novo ramo do conhecimento e sua adequação com a Bioética” (MEIRELLES, 2001, p. 96).
 Busca um equilíbrio entre as necessidades humanas advindas do progresso científico e os direitos humanos correlatos. (BARROS,2011,p. 12).
 Portanto, está no campo do biodireito a obrigatoriedade de respeito aos direitos humanos quando do estudo e da aplicação dos avanços das ciências biomédicas ou biotecnológicas.
PRINCIPIO COMUM À BIOÉTICA E AO BIODIREITO
Princípio da Dignidade da Pessoa Humana
	É o fundamento axiológico dos direitos humanos, sendo que, seja doutrinariamente, seja normativamente, são extraídos, em essência, da noção de dignidade da pessoa humana, das exigências consideradas imprescindíveis e inescusáveis a uma vida digna e da proteção do ser humano.
PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA
	É o limite ético-jurídico essencial dos avanços advindos das ciências biotecnológicas.
	“Quaisquer análises dos diversos aspectos jurídicos dos avanços biotecnológicos deve ser efetivada com embasamento ético-jurídico no princípio da dignidade da pessoa humana” (ECHTERHOFF, 2007, p. 114).
6.2 Reprodução artificial e alguns aspectos polêmicos 
TECNICAS DE REPORODUÇÃO HUMANA ASSISTIDA
ALGUMAS QUESTÕES RELACIONADAS:
 Reconhecimento do direito à reprodução como direito humano;
 Direito à identidade genética e à filiação;
 Direito de herança no caso de uso das técnicas após a morte do genitor;
 Discussões relacionadas ao uso da gestação por substituição.
	O surgimento das técnicas de reprodução humana assistida decorreu da necessidade de dar um alento a casais ou pessoas com problemas reprodutivos. Entre as técnicas atualmente existentes, as mais utilizadas são:
• Inseminação artificial (I.A.): expressão proposta pelos franceses Donay, Devraigne e Seguy que designa a técnica que consiste em ser inseminada a mulher com esperma injetado pelo médico, na cavidade uterina ou no canal cervical, no período em que óvulo se encontra suficientemente maduro para ser fecundado (MEIRELLES, 2004). 
• Fertilização in vitro (F.I.V.): consiste na obtenção de óvulos que são fertilizados em laboratório, sendo os embriões posteriormente transferidos diretamente para a cavidade uterina. Poder ser heteróloga ou lomóloga.
 Heterólogas: quando se utiliza o esperma de um doador fértil (geralmente provindo de bancos de sêmen).
 Homólogas: quando a técnica é a realizada com sêmen do companheiro.
	Essas técnicas têm um custo financeiro altíssimo, o que impede que pessoas de baixa renda tenham acesso a elas, visto que não são asseguradas pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
QUESTIONA -SE:
 Será que devemos negar o direito de esses homens e essas mulheres alcançarem a realização do sonho de se tornarem pais? 
 Será que é possível reconhecer a existência de um direito à reprodução humana, visando assim assegurar a essas pessoas o atendimento de suas necessidades de saúde reprodutiva por parte do Estado?
DIREITOS À REPRODUÇÃO HUMANA ASSISTIDA 
	A Declaração Universal dos Direitos Humanos reconhece a liberdade de reprodução como um direito humano, protegendo a família como elemento natural e fundamental da sociedade (art. 16) e, em seguida, dispõe: 
Art. 25.
1. [...]. 
2. A maternidade e a infância têm direito a cuidados e assistência especiais. Todas as crianças, nascidas dentro ou fora do matrimônio gozarão da mesma proteção social.
Conferência do Cairo sobre População e Desenvolvimento, de 1994: estabeleceu relevantes princípios éticos concernentes aos direitos reprodutivos, reconhecendo-os como direitos humanos.
	Essa conferência também reconheceu que o Estado deve proporcionar a todo indivíduo a oportunidade de procriar, a partir da informação quanto à saúde reprodutiva, aos meios de decisão e métodos disponibilizados pela ciência para que se possa satisfazer essa necessidade humana (CRUZ, 2008).
DIREITO À REPRODUÇÃO HUMANA ASSISTIDA 
A Quarta Conferência Mundial sobre a Mulher, que deu ensejo à Declaração de Beijing, reitera os conceitos de saúde reprodutiva e direitos reprodutivos da Conferência de Cairo, afirmando que “os direitos sexuais e reprodutivos constituem em parteinalienação dos direitos humanos universais e indivisíveis” (PIOVESAN, 2015, p. 416). 
Direitos Sexuais e Reprodutivos 
a) o direito a decidir livre e responsavelmente sobre sua sexualidade; 
b) o direito a ter controle sobre seu próprio corpo; 
c) o direito a viver livremente sua orientação sexual, sem sofrer discriminação, coação ou violência; 
d) o direito a receber educação sexual; 
e) o direito à privacidade;
 f) o direito de acesso às informações aos meios para desfrutar do mais alto padrão de saúde sexual; 
g) o direito a fruir do progresso cientifico e a consentir livremente à experimentação, com os devidos cuidados éticos recomendados pelos instrumentos internacionais. 
Constituição Federal:
 Princípio da dignidade da pessoa humana (Art. 1º, III);
 Direito à vida digna(art. 5º ,caput);
 Direito à integridade física e psicológica (art. 5º, II e III);
 Direito à proteção da maternidade (art. 6º)
 Direito à saúde com acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação (art. 196).
 Direito ao planejamento familiar (art. 226, §6º).
Lei n. 9.263/96: regulamenta o disposto no artigo 226, §7º da CF em relação ao planejamento familiar e estabelece as ações estatais a serem praticadas para a efetividade do direito à saúde reprodutiva.
	Não há como negar o reconhecimento de um direito à reprodução humana assistida , que deve ser assegurado pelo Estado.
	Deve ser assegurado às pessoas o direito ao planejamento familiar, incluindo-se o recurso a toda descoberta científica que possa vir a garantir o tratamento de patologias vinculadas à função reprodutiva (Maria Claudia Crespo Brauner).
6.3 O código genético humano
	Ao estudar os avanços das ciências biomédicas ou biotecnológicas, deparamo-nos com frequência com a questão do código genético humano, dos respectivos dados genéticos e da sua aplicação para fins de diagnóstico e tratamento de doenças tidas como de origem genética. 
	E nesse caso não se pode deixar de lado uma abordagem, mesmo que breve, do chamado Projeto Genoma Humano, que tinha como objetivo identificar todos os genes humanos, bem como as suas funções.
	O Projeto Genoma Humano foi criado nos EUA, em um consórcio público formado pelo Departamento de Energia (United States Department of Energy – DOE) e pelos Institutos Nacionais de Saúde (National Institutes of Health – NIH). Foi formalmente iniciado em meados de 1990 e finalizado em 26 de junho de 2000, com a publicação dos dados obtidos.
O PROJETO GENOMA HUMANO
	O alcance do mapeamento do genoma humano traz vários benefícios para a sociedade, como:
 conhecimento direto dos mecanismos de certas doenças e desenvolvimento dos meios necessários para seu tratamento, com a criação de novas tecnologias farmacêuticas e novas vacinas gênias;
 desenvolvimento de estudos que visem a produção de plantas ou animais transgênicos que melhor se adaptem ao meio ambiente, buscando o aumento de produção agrícola e pecuária;
 desenvolvimento da chamada medicina preditiva, que, "através de testes de diagnósticos genéticos, verifica a possibilidade de o paciente desenvolver uma doença de origem, eminentemente, genética";
 desenvolvimento dos diagnósticos pré-natais e pré-implantatórios.
	É evidente que essas novidades decorrentes do conhecimento do genoma humano podem gerar diversos dilemas éticos e jurídicos.
ALGUNS DILEMAS ÉTICOS E JURÍDICOS:
 " genetização da vida": redução do "ser humano à sua dimensão exclusivamente biológica, ou , até mesmo à sua expressão genética" (SIQUEIRA; DINIZ, 2003, p.226);
 reafirmação da pretensão de determinismo genético e da eugenia;
 uso discriminatório das informações genéticas por terceiros (práticas discriminatórias nas relações de trabalho, nas relações privadas de convênios privados de saúde e de aposentadoria e de apólices de seguro de vida);
PROTEÇÃO DO CÓDIGO GENÉTICO HUMANO
• Em 1992, foi celebrado o Convênio das Nações Unidas sobre a Diversidade Biológica, que tratou da diversidade genética da humanidade. Já ano seguinte em 1993, surgiu a Declaração de Bilbao, que ressaltava a importância dos novos conhecimentos advindos das pesquisas genéticas e advertia sobre alguns problemas surgidos desse conhecimento.
• Em 1993, surgiu a Declaração de Bilbao, essa declaração é fruto da Reunião Internacional sobre “O Direito ante o Projeto Genoma Humano”, “promovida e organizada pela Fundación Banco Bilbao Vizcaya, com a colaboração da Diputación Foral de Bizkaia e da Universidad de Deusto”.
• Em 1994, foi elaborada, por membros da Unesco, a Declaração Universal dos Direitos Humanos das Gerações Futuras. 
• Em 1995, foi redigido o Projeto de Convênio de Bioética do Conselho da Europa, que foi considerado pioneiro no Direito Internacional, pois tinha como objeto a investigação não terapêutica do embrião in vitro.
• Em 1996, surgiu a Declaração Ibero-Latino-Americana sobre Ética e Genética, revisada em 1998 em Buenos Aires. 
• Em 11 de novembro de 1997, foi aprovada pela XXIX Conferência da Unesco a Declaração Universal sobre o Genoma Humano e os Direitos Humanos, elaborada pelo Comitê Internacional de Bioética da Unesco.
Declaração universal sobre o genoma humano e os direitos humanos
 materializou o trânsito da bioética para o biodireito, com a consagração dos princípios da bioética;
 é "mais uma etapa no processo de inserção de valores morais na construção de uma ordem jurídica";
 a partir desse declaração se criou uma categoria nova de direitos humanos: “o direito ao patrimônio genético e a todos os aspectos de sua manifestação” (BARRETO, 1998).
	Declaração Universal sobre o Genoma Humano e os Direitos Humanos
	 Proclama o genoma humano e a informação nele contida como patrimônio comum da humanidade ao afirmar que o genoma humano é a "unidade fundamental de todos os membros da família humana" (Art. 1º).
	Declaração Internacional sobre os dados Genéticos Humano aprovada por unanimidade e a aclamação em 16 de outubro de 2004, na 32ª sessão da Conferência Geral da Unesco.
	Reafirma os princípios anteriormente consagrados pela Declaração Universal sobre o Genoma Humano e os Direitos Humanos.
	Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos, elaborada pela UNESCO em 2005.
	Reconhece o acesso Universal às conquistas biotecnológicas.
	A par do reconhecimento de acesso universal às conquistas biotecnológicas, a Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos tutela: 
• a dignidade humana e direitos humanos (arts. 2º e 3º); 
• a beneficência e a não maleficência (art. 4º); 
• a autonomia e responsabilidade individual (art. 5º); 
• o consentimento livre e esclarecido (art. 6º); 
• o respeito pela vulnerabilidade humana e pela integridade individual (art. 8º); 
• a privacidade e confidencialidade (art. 9º); 
• a igualdade formal e material, a justiça e a equidade (art. 10); 
• a não discriminação e a não estigmatização (art. 11); 
• o respeito pela diversidade cultural e pelo pluralismo (art. 12); 
• a solidariedade e a cooperação (art. 13); 
• a responsabilidade social e a saúde (art. 14); 
• o compartilhamento de benefícios (art. 15); 
• a proteção das gerações futuras (art. 16); 
• a proteção do meio ambiente, da biosfera e da biodiversidade (art. 17).

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