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FENOMENOLOGIA E EXISTENCIALISMO (ANÁLISE FILME CORINGA)

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CURSO BACHARELADO EM PSICOLOGIA
ANÁLISE FENOMENOLOGICO-EXISTENCIAL DO FILME “CORINGA”
Campina Grande, Paraíba
2020
INTRODUÇÃO
	Durante muito tempo nas histórias ficcionais, heróis e vilões vivenciaram o dualismo que sempre dividiu a humanidade: a luta do bem x mal. Nessa luta constante, o herói era aquele que era atacado repetidamente por seu vilão. Esse último, era visto como um monstro, como um opositor a ser combatido a todo custo e, inclusive, odiado pela sociedade. Entretanto, a visão do vilão como um alvo a ser combatido tem mudado com o passar dos anos, em especial, no final do século XX. 
	Nos dias atuais, o vilão passou a ser visto de uma maneira muito diferente daquela. Hoje ele é visto como um sujeito no mundo, que sofre, que se angustia, que sente solidão e que traz consigo sua história de vida. 	
	Nessa perspectiva de ressignificação do vilão, o filme “Coringa”, lançado em outubro de 2019, pela Warner Bros, do diretor Todd Phillips, interpretado por Joaquim Phoenix, o qual ganhou o Oscar 2020 por sua atuação, com arrecadação no mundo de, aproximadamente, 1 bilhão de dólares, tem como protagonista um dos vilões mais conhecidos da saga do herói Batman.
	Assim, à luz dos conceitos e teóricos da Fenomenologia e do Existencialismo, será feita uma análise do filme supracitado. 
	
	
	
	
Análise Fenomenológico-Existencial do personagem “Coringa” 
Arthur Fleck era um homem adulto, que morava apenas com a mãe num condomínio de classe baixa, na periferia da cidade de Gotham. Ele trabalhava como palhaço numa pequena empresa que prestava serviços de propaganda no centro da cidade. 
Durante a semana, tinha acompanhamento assistencialista, no qual recebia o receituário para pegar, gratuitamente, seus remédios. Sua rotina era, basicamente, trabalho, consulta com a assistente social e casa, onde, todas as noites, preparava o jantar para a mãe e assistiam a um programa de “Talk Show”. 
Teve uma infância conturbada, marcada pela ausência do pai, recheada de violência psicológica e física oriundas da própria genitora e de seus companheiros. Além disso, apresentava a síndrome pseudobulbar que causava-lhe episódios de risos em situações de estresse e ansiedade. 
A descrição realizada do referido personagem é imprescindível para que se realize uma análise fenomenológica-existencial. Isso porque, segundo Binswanger (2013) a fenomenologia é uma doutrina puramente descritiva. Desse modo, ao descrevê-lo é colocado de lado todo e qualquer pressuposto (Epoqué). 
Num primeiro plano, a partir do conceito de liberdade, entendida como algo que não se é “livre de”, mas “livre para”, o personagem, mesmo envolvido numa situação de vulnerabilidade social, tinha liberdade de escolha. De acordo com Sartre (1970), o homem é livre, sendo responsável por tudo quanto fizer. 
Outrossim, Merleau-Ponty (1986) afirma que o mundo não é o que se pensa, mas o que se sente. Isso é plenamente percebido pelo modo como o personagem enxergava o mundo. Ele afirmava que o mesmo era mal, que a sociedade fazia com que ele sempre se sentisse mal, que ela não o ouvia, nem o percebia, a tal ponto de afirmar “Só espero que minha morte valha mais centavos que minha vida”. 
Em contrapartida, a partir do primeiro crime cometido por ele, houve uma satisfação plena e um encontro do seu eu com o mundo. Ele passou a senti-lo e não apenas a ser julgado ou visto como um “ninguém”. Nesse momento, ele conseguiu atribuir um sentido, unificando a consciência e objeto, sujeito e o mundo. É o que afirma Forghieri (1993, p.15): “na intencionalidade há o reconhecimento de que o mundo não é pura exterioridade e o sujeito não é pura interioridade, mas a saída de si para o mundo que tem uma significação para ele”. 
Além disso, a vida do personagem foi marcada por sofrimento, perdas, frustrações, abandono e decepções. Tudo isso ratifica o pensamento de Friedrich Nietzsche que viver é sofrer. Sabe-se que a vida é, de fato, um emaranhado de sofrimentos e agruras existenciais, contudo isso não isenta o ser humano, enquanto ser livre e responsável, pela construção dos seus próprios ideais de vida. 
Não obstante, vê-se, claramente, que ele vivia de forma intensa o vazio existencial, ao ponto de afirmar que “Durante toda a minha vida eu nem sabia que eu realmente existia”. Essa atitude é ratificada pelo conceito existencialista de que a vida enquanto existência em si mesma não tem sentido, ou seja, o homem só existe a partir de suas realizações, não existindo pela sua própria vida isolado do contexto delas.
De um modo não convencional, ele encontrou sentido a partir das atitudes que se seguiram, como o fato de gozar diante da prática de atos extremados ou, até mesmo, criminosos. Encontrando, assim, satisfação e sentido para a sua existência. O ápice disso é visto no momento em que ele desce a escadaria da sua rua, dançando e demonstrando, através dela, a vontade de poder. Sentiu-se, então, feliz, livre, motivado, extasiado e realizado. 
É imprescindível, nesse ponto, mencionar a sociedade na qual ele estava inserido. Uma cidade marcada pela desigualdade social, violência, anarquia, preconceito e luta de classes. Mas, apesar dessa situação, à luz da fenomenologia, faz-se necessário ressaltar o fato de que o ser humano não é livre de condicionantes biopsicossociais, entretanto ele não está condicionado diretamente por eles, pois, segundo Frankl (2005), ele, ainda assim, é livre para se posicionar diante. Ou seja, é livre para decidir como reagir diante do destino. 
 
CONSIDERAÇÕES FINAIS
	Em virtude dos fatos mencionados, é notório o sofrimento psíquico vivenciado pelo personagem, como também, a necessidade urgente de uma intervenção capaz de dar suporte a essa situação. De forma análoga à ficção, a realidade hodierna não é tão diferente do que foi visto no filme. 
	O século XXI tem vivenciado o aumento crescente de indivíduos que apresentam história clínica marcada por um intenso e diversificado sofrimento psíquico. Tem-se uma sociedade adoecida por diversos condicionantes, sejam de ordem educacional, social, familiar, o que acaba por originar indivíduos tal como o personagem analisado. 
	É latente, no decorrer da história, a ausência de profissionais capacitados para lidar com tais patologias e não apenas isso, mas também, o descaso dos governantes para com o ser humano. Mais uma vez, essa realidade não difere da atual, pois tem-se, assim como no filme, a ausência de profissionais capacitados, de medicação e de suporte familiar, o que acaba por gerar uma sociedade doente. 
	Outrossim, é visível, ao longo do enredo, a própria sociedade validando seu comportamento, por vezes reafirmando-o. Isso também foi visto em muitas salas de cinema quando da exibição do filme. Os espectadores vibraram e até mesmo aplaudiram-no ao término da sessão, não pela atuação do ator que representava o Coringa na ficção, mas por concordar e partilhar com as ações do personagem em si. Atitudes assim ratificam o quanto a sociedade está adoecida e necessitada de profissionais capazes de intervir em situações como essa.
Por fim, ressalta-se a contribuição significativa dos conceitos e teóricos da Fenomenologia e do Existencialismo, os quais possibilitaram uma análise criteriosa e minuciosa do personagem do filme “Coringa”, como também, contribuíram para a formação acadêmica dos futuros psicólogos. 
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REFERÊNCIAS
BARRETO DOS SANTOS, David Moises Logoterapia: compreendendo a teoria através de mapa de conceitos. Arquivos Brasileiros de Psicologia [en linea]. 2016, 68(2), 128-142[fecha de Consulta 11 de Marzo de 2020]. ISSN: 0100-8692. Disponible en: https://www.redalyc.org/articulo.oa?id=229048487011
BINSWANGER, L. Grundformen und Erkenntnis menschilchen Daseins. Munchen, Reinhar. 5ª ed.,1973.
FORGHIERI, Y.C. Psicologia fenomenológica: fundamentos, método e pesquisas. São Paulo: Pioneira. 1993. 
FRANKL, V. E. Um sentido para a vida: psicoterapia e humanismo. Aparecida: Ideias e Letras, 2005. 
Giovanetti, J.P. (1994). O impacto das ideias humanistas, fenomenológicas
e existenciais na Psicoterapia. Em Anais dos Encontros Mineiros de Psicologia Humanista (pp. 90-93). Belo Horizonte: Grupo Mineiro de Psicologia Humanista.
MERLEAU-PONTY, M. Fenomenologia da Percepção. São Paulo, Editora Marins Fontes, 1986. 
SANTOS, David Moises Barreto dos. Logoterapia: compreendendo a teoria através de mapa de conceitos. Arquivos brasileiros de psicologia. Rio de Janeiro
SARTRE, Jean-Paul. O existencialismo é um humanismo. 3ª ed. São Paulo: Abril Cultural, 1970.

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