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ENTRE A ABOLIÇÃO E O ABOLICIONISMO PENAL: INSURGÊNCIA 
MARGINAL CRÍTICA POR UMA SOCIOLOGIA DO SISTEMA DE CONTROLE 
RACIAL BRASILEIRO 
 
 
Luciano Góes
1
 
 
―Não estou aqui como Representante do Brasil, mas como sobrevivente da 
República de Palmares! É Nessa qualidade que me reconheço e me afirmo.‖ 
(Abdias Nascimento). 
 
 
1 – INTRODUÇÃO 
 
Ser descendente direto de escravizados (e não se trata de ―licença poética‖!) é ter 
clareza que a promessa de liberdade empenhada em ação ―benevolente‖ da sinhazinha jamais 
objetivou ultrapassar sua essência, ou seja, ser mais do que mero ato restrito ao âmbito 
jurídico, manifestado por letras mortas, pois a herança deixada por um radical sistema de 
violências e violações que consolidam a política genocida simbiótica de um país racista, 
vivenciada todos os dias e transmitida geracionalmente, demonstra mais que apenas a 
hostilidade do ―país das maravilhas raciais‖. 
Os obstáculos raciais são tantos quantos a defesa do mundo branco quase perfeito 
necessite, eis que a liberdade negra esta condicionada à redução da hegemonia branca, que 
somente se mantém na exata medida em que nos aprisiona, como restou explícita, e exitosa, a 
estratégia política que substituiu as senzalas de um império escravagista por prisões de uma 
república racista, de modo conciliatório e mantenedor de toda estrutura excludente. 
Através da teorização de abolição do Direito Penal e da prisão por aparente perda de 
fundamentação e legitimação, resultantes do acúmulo crítico construído pela Criminologia de 
base materialista, propõem-se demonstrar a capilarização do racismo e sua natureza 
ontológica desumanizante que demanda um sistema de controle racial que recebe, 
constantemente, nova legitimação para manter intacta a arquitetônica racista, na qual a ―crise‖ 
do cárcere não é, de modo algum, esporádica ou superável, mas reflexo do alcance de seus 
objetivos enquanto instrumento de dominação e extirpação da força física capaz de tensionar a 
opressão racial e transpor o limite insuperável do diálogo apaziguador neutralizante. 
Defender a liberdade nos exatos termos de abolicionismo penal, restrita à extinção das 
prisões enquanto crítica ao controle social, ignorando a estrutura racista brasileira, é manter a 
 
1
 Trabalho publicado em: GÓES, Luciano (Org.). 130 ANOS DE (DES)ILUSÃO: A farsa abolicionista em 
perspectiva desde olhares marginalizados. 1ª. ed. Belo Horizonte: Editora D'Plácido, 2018. p. 313-340. 
Lattes: http://lattes.cnpq.br/6620359831455900 
http://lattes.cnpq.br/6620359831455900
 
 
fantasia de ―redentor(a)‖, silenciando toda luta e resistência negra, vinda desde África, que 
objetiva a demolição da sociedade erguida sob pilares raciais, lição fundamental para 
manutenção dos grilhões e máscaras que desarmam a população negra politicamente ao não 
mencionar o racismo e incutir a passividade negra como condição de sua assimilação 
declarada em termos igualitários. 
É nesses termos que o criticismo branco elitizado se apresenta como ―salvador da 
pátria‖ no cenário criminológico/abolicionista, que, ao não conseguir ultrapassar os limites 
raciais que estruturam seus lugares de falas repletos de privilégios, reforçam o racismo na 
exata medida em que o ignora enquanto fonte de violência, replicando a ilusão de Thomas 
Mathiesen (2003) que, ao conceber o abolicionismo escravocrata como verídico, toma-o como 
exemplo perfeito para alcance do ―sonho abolicionista‖, não conseguindo entender que seu 
sonho é pesadelo real para a raça negra, mantida ainda acorrentada em inúmeros cativeiros. 
Pensar na permanência do cárcere é colocar o sistema punitivo brasileiro no centro da 
arena anti-racista, eis que é inserido em uma sociedade racista que o punitivismo estatal se 
encontra com sua real finalidade. Uma conjuntura que nos remete ao modelo de sociedade que 
a população negra, desde sua ancestralidade, procura construir, mas que encontra como 
obstáculo o próprio modelo eurocêntrico erguido por parâmetros coloniais e mantido pelo 
enraizamento da colonialidade que interiozou sua naturalização no passado e no presente que 
projeta o ―futuro que espelha a grandeza‖ de um país racista. 
Assim, desde uma Criminologia
2
 nascida no morro, ou melhor, uma Sociologia do 
Controle Racial que aflora da estratégia malandreada em disfarçar a marginalidade nata sob 
terno e gravata, eternizada por aquele que nos protege e jamais dorme, despontando na 
encruzilhada onde se encontram a decolonialidade e a afrocentricidade, aponta um caminho 
para pensar criticamente o sistema de controle racial brasileiro em sua dualidade, que, muito 
antes que um brado teórico, é uma insurgência pela (sobre)vivência da população negra, alvo 
de uma política histórica de neutralização que tem na falsidade da ―guerra às drogas‖ sua 
 
2
 Na margem latina, com a derrocada do paradigma etiológico pelo labelling approach, o horizonte 
criminológico passou de micro à macrossociológico, marcadamente interdisciplinar, diversificando objetos e 
misturando os objetivos científicos com luta social, dissolvendo, assim, as fronteiras científicas demarcadas pelo 
modelo central. O objetivo principal, caracterizado pela convergência de inúmeros estudos, assim, é o sistema de 
controle em sua integralidade. Lola Aniyar de Castro, em seu artigo ―El jardin de al lado”, o repondiendo a 
Novoa sobre la criminologia critica, rebatendo críticas em uma discussão sobre a ―síndrome de identidade‖ que 
envolveu diversos, e importantes, nomes periféricos, estabeleceu que Criminologia se refere, tão somente, a um 
movimento pelo qual o Estado legitimou seu controle e dominação, e assim, a ciência produzida aqui se afasta, 
em muito, dela. Entretanto, a manutenção da etiqueta é fundamental para consolidar o território crítico 
conquistado e aumentá-lo, não abandonando o campo que o inimigo construiu, não deixando-o sozinho, e em 
paz, na mesma tarefa de eternizar e manipular seus mitos e funções. Pelo seu injusto impacto social, o espaço 
construído existe e deve ser ocupado pelo estudo sociológico do controle social, e para isso, adotar o nome de 
Criminologia é uma estratégia política, mas imprescindível para a produção de epistemologias marginais. 
 
 
última legitimação, que possibilita, a partir de suas ―frentes de batalha‖, a continuidade do 
genocídio, em sentido amplo, e o encarceramento de quem mais tem motivos para destruir a 
Casa Grande chamada Brasil. 
 
2 – ABOLICIONISMO PENAL: CONVERSA PRA “CARA PÁLIDA” DORMIR! 
 
―Assumimos uma luta que nos vincula aos abolicionistas que se opuseram à 
escravidão. As instituições da prisão e da pena de morte são os exemplos mais 
óbvios de como a escravidão continua a assombrar nossa sociedade.‖ 
(Angela Davis). 
 
O aporte instrumental construído pela Criminologia de base materialista (Crítica e 
Radical) desmascarou (quase) toda a legitimação do sistema de justiça criminal desde sua 
concepção que, sob os auspícios iluminados filosóficos, professava a contenção do poder 
punitivo lastreada por direitos e garantias (materiais e processuais) fundamentais, conferindo, 
ao menos na aparência, a vitória da ―civilidade‖ sobre a ―barbárie‖, a ponto da discursividade 
jurídico-dogmática, hoje, não se sustentar por seus próprios fundamentos. 
Deste panorama, surge o Abolicionismo Penal propondo contração e extinção do 
ordenamento jurídico penal e seu aparato punitivo, pautados pelo Direito Penal (declarado) 
que tem na prisão a resposta exclusiva face à criminalização, resultado do encadeamento 
sistêmico de sua programação seletiva (que expõe sua falácia e falência a partir de uma crise 
genética que o torna um embuste penal
3
), dentro do universo criminalizante (legislação 
penal), não por outro Direito Penal, mas qualquer coisa melhor, dada sua excelência em agir 
desigualmente,mantendo as desigualdades nas sociedades pela exclusão (BARATTA, 2011). 
A legitimação teórica do cárcere (ainda) é extraída das teorias tipo ―res‖ (BATISTA, 
V., 2011), ilusórias promessas explicitadas por sua inversão funcional, característica inata de 
não fazer (por impossível) o que declara e fazer (por ontologia) o que não declara 
(ANDRADE, 2012), que sustenta sua manutenção com imprescindível apoio de sua (falsa) 
função simbólica, da qual emerge o amparo público ao incutir no imaginário coletivo a 
segurança (de quem? pra quem? e, por fim, contra quem?). 
Assim, o abolicionismo penal, delineado aqui genericamente, sugestiona alternativas 
político-criminais para a resolução dos conflitos de modo inclusivo, tendo em vista que o 
 
3
 Utilizamos ―crise‖ no sentido que leciona Eugenio Raúl Zaffaroni, para quem o termo não indica, ou mesmo 
possa indicar, o momento profético que a teorização penalista se reflita em sua operalização, um horizonte 
utópico no sentido mais negativo que se possa conceber, mas sim ―o momento em que a falsidade do discurso 
jurídico-penal alcança tal magnitude de evidência, que esta desaba, desconcertando o penalismo da região‖. 
(ZAFFARONI, 1991, p. 15-16). 
 
 
Direito Penal não resolve nenhum problema, apenas exponencializa os problemas, mantendo 
os radicais e potencializando os derivados. É dizer que o Direito Penal é o problema para 
maioria dominada, eis que para a minoria dominante ele é a solução, mantendo e assegurando 
seus direitos e privilégios, por tratar-se de instrumento estatal de controle, através do qual 
manifesta o monopólio da violência legalizada, que não significa, de modo algum, legítima. 
Alteração umbilicalmente ligada à transformação da própria sociedade, visando 
romper com o punitivismo capilarizado que demanda e confere expansão ao Direito Penal, 
transformado em instrumento de vingança por seu populismo, restando como função das 
penas, única e exclusivamente, a produção, consciente e insistente, de dor. 
Como norte abolicionista, a frase de Louk Hulsman (2003), referência mundial sobre o 
tema, é dogmática e, até certo ponto, acalentadora: 
Se afasto do meu jardim os obstáculos que impedem o sol e a água de fertilizar a 
terra, logo surgirão plantas de cuja existência eu sequer suspeitava. Da mesma 
forma, o desaparecimento do sistema punitivo estatal abrirá, num convívio mais 
sadio e mais dinâmico, os caminhos de uma nova justiça. 
 
Mas, se nosso jardim estiver assentado em um solo tão sólido que ele próprio se 
transforma no obstáculo para o nascimento dessas novas plantas, o que fazer? Além disso, 
nem tudo que dá no jardim é flor, e nesse jardim central, ou espelhado nele, muitas plantas 
que brotam, por mais viçosas e exóticas que possam aparentar, se revelam como plantas 
carnívoras, ervas daninhas ou espécies predatórias. 
Derivado da Criminologia de base materialista (Crítica e Radical), o abolicionismo 
penal no Brasil (que se distancia de um abolicionismo penal para o Brasil) padece da mesma 
síndrome, a de não conseguir ultrapassar, por diversas razões, a fronteira racial que constitui 
seus/suas atores(as), que mantém a velha tradição oitocentista de ―traduzir‖ as (contra)teorias 
centrais se empossando de lugares estratégicos como experts
 
(SOZZO, 2014), demarcando o 
lugar de fala (i)legítimo de intérpretes dos subalternizados que são silenciados, obrigados 
apenas a ouvir (SPIVAK, 2010) enquanto seguem sufocados por vozes que se apropriam do 
sentimento de dor sem jamais conseguir se aproximar dela. 
Não obstante, de tal postura ―solidária e comovida‖ emerge a opressão pelo 
comprometimento com a manutenção da estrutura (e dependência) colonial enquanto 
guardiões e porta-vozes da ―colonialidade do saber‖: a herança epistemológica central que 
impede a compreensão e construção do(s) mundo(s) marginal(is) a partir de suas próprias 
raízes e epistemes (LANDER, 2005), renegando a radicalidade da questão racial e 
fortalecendo nosso racismo na meticulosa proporção em que o (des)oculta. 
 
 
Do enraizamento profundo nessa terra fertilizada por sangue negro, brotam 
incomensuráveis manifestações racistas, naturalizadas e violentas, mesmo que repletas de 
―boa vontade‖ (das quais, o inferno, para quem acredita, está superlotado!), sendo que as 
contribuições críticas que não conseguem ultrapassar tais barreiras reforçam e mantêm a 
ordem racial que pré-estabelece lugares, saberes e poderes, extraindo novos instrumentos a 
serviço do controle, domínio e opressão racial, perpetuando a hegemonia, tal qual a farsa da 
abolição escravocrata que abriu caminho para a construção do conto infantil do ―país das 
maravilhas raciais‖ ao ignorar a importância fundamental da resistência vinda desde África, 
(re)fortalecida com cada quilombola que ainda se levanta e desafia a Casa Grande. 
 
3 – DELINEANDO O SISTEMA DE CONTROLE RACIAL BRASILEIRO 
 
―O escravo libertou-se; ficou ao sol por um breve momento; e então retornou à 
escravidão.‖ 
(W.E.B. Du Bois). 
 
Há muito sabemos que a pena privativa de liberdade, cumprida em prisões, foi 
concebida como instrumento disciplinador vinculado às fábricas no centro (Europa e EUA), 
pelo trabalho obrigatório, resultando em mão de obra dócil pronta para ser explorada 
(MELOSSI; PAVARINI, 2010; FOUCAULT, 2009), cuja idéia basilar se originou com a 
―correção‖ dos jovens prisioneiros, forçados a rasparem Pau-Brasil para tintura de tecidos na 
Rasp-huis de Amsterdã, final do século XVI da Holanda manufatureira (MELOSSI; 
PAVARINI, 2010, p. 43). 
No Brasil, a prisão com a função de docilizar/domesticar foi adotada na pós-abolição 
da escravatura
4
, mas, ao contrário do sistema penal central, a idéia básica aqui não era 
modelar mão de obra para a indústria, ainda incipiente, mas de manutenção da exclusão do 
corpo negro perante o mundo construído branco, no qual ingressou não como parte do povo 
(elemento básico do conceito jurídico de Estado), mas como coisa que não tinha condições de 
competir com a mão de obra ―qualificada‖ dos imigrantes europeus, ―importados‖ com a 
missão que continuar com o genocídio negro ao branqueá-lo (NASCIMENTO, A., 1978), 
colocando o país nos trilhos do ―progresso civilizatório‖. 
 
4
 Código Penal de 1890, art. 45: ―A pena de prisão cellular será cumprida em estabelecimento especial com 
isolamento cellular e trabalho obrigatorio, observadas as seguintes regras: a) si não exceder de um anno, com 
isolamento cellular pela quinta parte de sua duração; b) si exceder desse prazo, por um periodo igual a 4ª parte da 
duração da pena e que não poderá exceder de dous annos; e nos periodos sucessivos, com trabalho em commum, 
segregação nocturna e silencio durante o dia.‖ [sic]. 
 
 
A disciplina periférica sempre decorreu da manutenção da ordem racial, alcançada por 
meio de violentas agressões físicas e mortes, meios indispensáveis no controle racial que tem 
como objeto a domesticação do corpo e da alma, instalando a desumanização no centro 
gravitacional de um sistema punitivista de viés doméstico (BATISTA, N., 2002) resultante do 
paradigma objetificante fundado no sonho senhorial, incutido em cada colonizado de obter o 
poder ―absoluto‖ sobre o corpo negro coisificado, tornando-se a ―quintessência do mal‖ 
(FANON, 1968, p. 39). Transmutado em sinhô, toda e qualquer manipulação sobre (e a partir 
do) objeto negro é autorizada, sua vida, morte ou morte em vida, é um ato que prescinde de 
qualquer justificativa, uma espécie de ato sacrificial cuja obrigação de dar uma resposta é 
inexistente (MBEMBE, 2014, p. 70). 
A inumanização, lógica basilar do racismo, ratificada pela Igreja Católica, legitimou a 
invasão e escravidão com a qual inaugurou a diáspora africana coisificante, base do 
colonialismo que transformou a ideologia racial em política genocida imprescindívelà 
inauguração e perpetuação da ordem mundial ocidental: a necro-política, pacto mortífero que 
sustenta a soberania inquestionável como poder, direito e gestão paradoxal sobre a vida e a 
morte dos indesejáveis na sociedade branca, pois, ao mesmo tempo em que demanda(va) a 
morte, impunha a extensão da vida dos escravizados para exploração de sua força vital. Um 
poder que não é unicamente estatal, se (re)legitimando e se reforçando no discurso de 
urgências (potencializadas pela manipulação do medo e necessidade sempre crescente de 
segurança), construção de Outros como inimigos, e criação de exceções (MBEMBE, 2011). 
Assim, as margens (latina e africana) se consolidaram não apenas como ―gigantescas 
instituições de sequestro‖ (ZAFFARONI, 1991, p. 75), mas onde o genocídio negro foi 
condição primária de edificação e continua sendo para manutenção do mundo branco, no qual 
as estruturas centrais, racialmente hierarquizadas, foram transplantadas através de técnicas 
jurídico-administrativas. 
Desta feita, a falsidade discursiva da prisão no Brasil resta evidenciada desde sua 
concepção, eis que é impossível ressocializar quem nem ao menos foi socializado, re-educar 
que nunca foi educado, reintegrar quem jamais foi integrado em uma sociedade na qual 
somente foi parte enquanto objeto a ser explorado, mesmo que sem vida, quando seu corpo 
era/é utilizado como símbolo do poder e supremacia transmitida, como recado bem claro, à 
coletividade, desestimulando o confronto e desobediência a partir do medo e terror 
(estimulando, portanto, a resignação). 
O (re)aparelhamento cautelar, consubstanciado no recrudescimento punitivo, do 
sistema de controle brasileiro refletiu os objetivos reais e ideais de um país racista que tinha 
 
 
como problema maior a questão negra, calcada em termos genocidas como condição de 
sobrevivência da branquitude (BENTO, 2002) e manutenção da branquidade, programando a 
seletividade congênita do Direito Penal para o aprisionamento negro, resultando em 
seletividade racial. 
O projeto abolicionista foi estrategicamente traçado como um ―presente‖ embalado em 
papel jurídico no qual houve mera alteração institucional, anunciando o branco como 
protagonista da luta pela liberdade negra, manipulando-a de modo a menosprezar as tensões 
raciais, controlando, assim, a população negra com o silenciamento e ocultação de toda forma 
de resistência, expressa em rebeldias, suicídios, homicídios, abortos, envenenamentos, fugas, 
quilombos, raptos, resgates, saques, guerrilha, insurreições, revoltas, etc., que foram 
essenciais para a extinção do sistema escravagista brasileiro, por seu desgaste (LIMA, 1981). 
Considerado como um dos principais nomes abolicionistas, Joaquim Nabuco, fiel 
representante da elite branca (advogado, fazendeiro, político e diplomata), defendeu um 
―abolicionismo institucional‖ que estava em plena sintonia com o branqueamento do Brasil 
(DOMINGUES, 2004, p. 41) onde a liberdade não seria conquistada pelo negro, mas um ato 
de ―bondade, compaixão e humanidade‖ do branco, fundamentando a abolição em termos de 
anistia, conciliação e colaboração entre as raças, ou seja, opressão, violência e resignação (ou 
morte!) à população negra, garantindo a manutenção da sociedade racialmente estruturada. 
Do alto de sua brancura, Nabuco tinha consciência que a africanização do Brasil, 
condição de sua construção, foi um altíssimo preço que teve que ser pago e que a solução para 
resguardar a hegemonia branca passava, obrigatoriamente, pela política de branqueamento em 
sua complexidade (extermínio físico, assimilação e obstaculização da negritude, significando 
desarmamento político). Era, portanto, um abolicionismo branqueador, pois advogava: 
[...] o ideal de pátria que nós, abolicionistas, sustentamos; um país onde todos sejam 
livres; onde, atraída pela franqueza das nossas instituições e pela liberdade do nosso 
regime, a imigração européia traga, sem cessar, para os trópicos uma corrente de 
sangue caucásio vivaz, enérgico e sadio, que possamos absorver sem perigo [...]. 
(NABUCO, 2000, p. 170). 
 
O abolicionismo escravagista foi assim, em verdade, um instrumento de controle racial 
sob a falsa promessa de liberdade, limitando sua extensão ao mínimo possível, armando a 
sociedade branca de leis protencionistas e reduzindo ao máximo os riscos da transição do 
império escravagista para uma jovem república racista, na qual a extinção da escravidão 
brasileira fez-se representada por um artigo, uma frase ―declamada‖ na Fala do trono da 
idolatrada ―redentora‖. Empunhando a bandeira da ―cordialidade branca‖ (fincada na abolição 
negociada delimitada pelo liberalismo cristão, em plena consonância com os conselhos de 
 
 
Nabuco), que estampava a necessidade da continuidade da dominação branca sobre a 
população negra, condição da continuidade de seus privilégios e bem estar, diz Dona Izabel: 
A extinção do elemento servil pelo influxo do sentimento nacional e das 
liberalidades dos particulares, em honra do Brasil, adiantou-se pacificamente de tal 
modo que é hoje aspiração aclamada por todas as classes, com admiráveis exemplos 
de abnegação por parte dos proprietários. Quando o próprio interesse privado vem 
espontaneamente colaborar para que o Brasil se desfaça da infeliz herança, que as 
necessidades da lavoura haviam mantido, confio que não hesitareis em apagar do 
direito pátrio a única exceção que nele figura, em antagonismo com o espírito cristão 
e liberal das nossas instituições. (MOURA, 1995, p. 21). 
 
Para a reorganização da arquitetura racista sob a face da legalidade, perdida com a Lei 
Áurea, se fazia imperiosa a remontagem do sistema escravagista sob novos fundamentos, o 
que deu início à favelização e ao encarceramento da massa negra, remontando as senzalas, em 
termos distintos, mas de sucesso absoluto. 
O saber que estribou a nova face do poder racista foi extraído da Criminologia 
Positivista de Cesare Lombroso, inaugurada a partir do paradigma racista/etiológico 
insculpido no primeiro livro do médico italiano L’uomo bianco e l’uomo do colore: letture 
sull’origine e la varietà delle razze umane, de 1871, e, consolidado mundialmente em seu 
L'Uomo Delinquente, onde o racismo é encontrado de forma disperso (o que não significa 
ausente, muito pelo contrário). 
A partir de conceitos como periculosidade, impulsividade e analgesia, Lombroso, 
orientado pelo viés racista, com o qual traçou a evolução humana a partir dos primatas, na 
qual o negro (verdadeiros ―ornitorrincos humanos‖) seria a ligação entre aqueles e o ápice 
evolutivo humano (o branco europeu), uniu, de modo indissociável, a raça negra ao elemento 
perigoso: o criminoso, pois suas características ontológicas, herdadas de sua ascendência mais 
remota, eram transmitidas pelo atavismo ou pela hereditariedade. 
Assim foi gestado um modelo punitivo de viés acautelatório com orientação 
prognóstico (confrontando o Classicismo ao renegar princípios jurídicos de natureza filosófica 
iluminista que não conseguiram resolver (e nem poderiam) a ―criminalidade‖, como igualdade 
e livre arbítrio), que se moderniza pela lógica atuarial (risco e probabilidade), fomentando 
discursos sobre ―impunidade‖ e insegurança, objetivando a prevenção de um (im)possível 
crime: o Direito Penal do Autor, que prescrevia prisões anteriores ao delito (aliás, o quanto 
antes melhor, de preferência do ―criminoso em pele de criança‖), e penas indeterminadas. 
 
 
No Brasil, que vivia intensamente o medo entre a ―africanização‖ e a mestiçagem
5
, a 
figura do também médico, Raimundo Nina Rodrigues, desponta como expert da ―nova ciência 
criminal‖, endossado pelo título de ―Apóstolo da Antropologia Criminal no Novo-Mundo‖, 
conferido, segundo seu discípulo Afrânio Peixoto, pelo próprio Lombroso, na dedicatória de 
seu livro “L’Anthropologie Criminelle et sés récents progrèss” de 1896. 
Filho de dono de escravos, suafala não poderia ser em outro sentido que não a defesa 
e manutenção da ordem racial/social, sendo, portanto, o representante legítimo do mundo 
branco ameaçado em seu poder hegemônico e exclusividade. Em junho de 1888, Nina 
Rodrigues publica, em um artigo na Gazeta Médica da Bahia: ―a igualdade é falsa, a 
igualdade só existe na mão dos juristas, porque sem ela não existiria lei‖ (SCHWARCZ, 
1996, p. 171). Mesmo não sendo seu objetivo principal (a ideia era ratificar a inferioridade 
negra), Nina Rodrigues expõe a função do Direito: a preservação das desigualdades materiais 
a partir da igualdade formal, sob a forma legal, mera manifestação de vontade e objetivos do 
grupo que possui/detém o poder. 
Apontando os erros da adoção de pressupostos metafísicos do Classicismo em ―As 
raças humanas e a responsabilidade penal no Brasil‖, o médico propõe a formalização do 
apartheid brasileiro ao defender que deveríamos ter, no mínimo, quatro Códigos Penais, 
pautados por estudos racistas/criminológicos que comprovaram que a inferioridade do negro 
fulminava o livre arbítrio, podendo significar inimputabilidade, tese jurídica adotada durante a 
escravidão, principalmente após 1850, quando a questão custo-benefício orientava os 
senhores a contratarem serviços advocatícios para a defesa dos escravos envolvidos em 
crimes (tendo em vista que era mais barato libertá-los do que comprar novos escravos).
6
 
Nesse sentido, se não conseguiu influenciar as políticas públicas para a 
desafricanização nacional, Nina Rodrigues nos mostra como o racismo atravess(a)ou ileso 
toda a história do Brasil, tangenciando todas as transições políticas, sociais e ordens 
constitucionais, pois é exatamente na prática que a ordem racial é mantida, 
independentemente dos discursos teóricos adotados, todos simples fachada. 
O parâmetro de controle racial para o médico era o ordenamento criminal 
estadunidense, não apenas pela estrutura do Judiciário, mas em relação à autonomia dos 
 
5
 Vivenciada de forma ambígua, pois na idéia da ―boa miscigenação‖ encerrava-se a política eugênica do 
branqueamento, resultado incontestável apontado por muitos cientistas, arraigado na teoria darwinista (evolução 
e sobrevivência do mais forte), vista como a saída controlada (SCHWARCZ, 2012, p. 161). 
6
 Em um processo criminal de 1872, sustenta um advogado: ―Milita em seu favor mais de uma circunstância, e 
especialmente o embrutecimento de seus espíritos e falta absoluta de educação; – males que são provenientes de 
sua forçada condição de escravos, e que, embotando-lhes a consciência do mérito e do demérito, lhes diminui 
consideravelmente a responsabilidade moral e a imputabilidade.‖ (CHALHOUB, 2011, p. 38). 
 
 
Estados na questão. Tal desalinho não permitiu que Nina Rodrigues observasse que, mesmo 
tendo apenas um Código Penal, tínhamos um Jim Crow à brasileira, estabelecido dentro do 
nosso Código que continha leis penais especificamente para os negros. 
O medo, esboçado antes na questão dogmática-jurídica que se expressava na 
(im)possibilidade da irresponsabilidade penal, e sempre presente de uma nova revolta negra, é 
explicitado por Nina Rodrigues ao justificar sua defesa de um Direito penal específico à 
população negra, por óbvio, muito mais rigoroso, dada sua periculosidade nata. Em sua obra 
―Os africanos no Brasil‖, o Quilombo de Palmares é identificado como ―Tróia Negra‖, 
enquanto que, ao falar sobre o problema do Brasil, ou seja, o negro, é esclarecedor como este 
é representado. Incorporando uma esfinge (refletindo o aterrorizado cenário nacional), lança 
seu enigma: ―decifra-me ou devoro-te!‖. 
Desamparado da instituição legal, o secular sistema de controle racial brasileiro 
ultrapassou os limites fazendários seguindo os passos dos ex-escravos (tática dos capitães do 
mato), com fins de manter a ordem em meio à desordem racial provocada pelo colapso do 
sistema de controle escravagista, quando a questão social, estabelecida em conflitos de classe, 
enfim, encontra o problema racial. A reformulação do sistema punitivo transformou o 
branqueamento em política de Estado, logo integrado ao texto constitucional.
7
 
Outrossim, as características desumanizantes de caráter privado, foram escamoteadas 
pelas políticas públicas, mantendo intacto nosso modelo de disciplinamento: a inscrição da 
violência sobre o corpo coisificado de uma ―quase gente‖, cujo único ―direito‖ é (ainda) ser 
violentada. 
Contexto que impôs uma cisão em nosso Direito penal: ao lado do Direito penal 
declarado para os cidadãos, alicerçado no Direito Penal do fato construído sob as luzes 
filosóficas do Classicismo, o Direito penal paralelo para os ―sub-cidadãos‖, legitimado no 
Direito Penal do autor consolidado pela tradução marginal do paradigma racial-etiológico, 
que por sua vez, situa seu fundamento na periculosidade que exala dos corpos negros, um 
sistema outrora identificado por Lola Aniyar de Castro (2005, p. 96) como ―subterrâneo‖ que 
aqui jamais se ocultou, sendo operacionado sob os olhos de quem quiser enxergar. 
 
4 – O ATUAL SISTEMA DE CONTROLE RACIAL/SOCIAL BRASILEIRO 
 
 
7
 A Constituição da República Federativa do Brasil, de 1934, em seu artigo 138, estabelecia: ―Incumbe à União, 
aos Estados e aos Municípios, nos termos das leis respectivas: [...] b) estimular a educação eugênica.‖ 
 
 
―Não se tem uma revolução quando se ama o inimigo; não se tem uma revolução 
quando se está implorando ao sistema de exploração para que ele te integre. 
Revoluções derrubam sistemas, revoluções destroem sistemas.‖ 
(Malcolm X) 
 
Países estruturados no racismo demandam um sistema de controle racial como 
condição da sua manutenção e existência, programando racialmente seus instrumentos de 
domínio, opressão e violência. Um complexo relacional simbiótico que delimitou a 
democracia no interior da escravidão transvestida de abolição, na qual seus ―detritos‖ foram 
destinados à destruição (MBEMBE, 2014, p. 149). 
No Brasil, enquanto a ordem racial brasileira se vê ruir no pós-abolição, e com ela a 
hegemonia e exclusividades da raça branca, a ―tradução‖ do paradigma racista-etiológico foi a 
legitimação que mantive o status quo intacto durante a transição, senão em termos de políticas 
públicas para a formalização do sistema segregacionista, em concretização prática de um 
apartheid à brasileira, no qual a ―democracia‖ não só permitiu como exigiu a 
ininterruptabilidade do contínuo do genocídio negro, modernizando velhos instrumentos de 
controle racial, mantendo, além da segurança pública para os brancos, sua ―supremacia‖ e 
domínio absoluto (GÓES, 2016). 
Atualmente, a programação racista de nosso sistema de controle racial é demonstrada, 
no Direito penal declarado, pelos dados oficiais do que expõem a ―clientela‖ da 3ª maior 
população em situação de cárcere do mundo: pretos e pardos representam 64% da população 
encarcerada
8
, o que significa que dois em cada três presos são negros, porcentagem que se 
mantém no encarceramento feminino, no qual o Brasil ocupa a 4ª colocação mundial, com 
imprescindível ―auxílio‖ de uma esquerda que fez do encarceramento negro massivo a 
compensação pela instituição mínima de ações afirmativas. 
O aprisionamento massivo de corpos desvalidos é resultado positivo da política 
histórica nacional da exclusão negra que modernizou as senzalas e transformou o cárcere no 
segundo lugar do negro. Essa massificação antecipa a privatização do sistema carcerário 
brasileiro
9
 (já explorado por empresas que constroem e administram prisões como forma de 
―retribuição‖ ao financiamento de campanhas eleitorais de inúmeros parlamentares), 
projetando um aumento exponencial, em breve período, da população em situação de cárcere, 
 
8
 Considerando a política histórica brasileira de manipulardados para montar um quadro ―mais claro‖ do país, ou 
seja, mais branco, aliada ao problema do não preenchimento completo/correto dos dados cadastrais, ou da não 
identificação do negro pelos agentes responsáveis pelo cadastro dos presos, os dados reais são bem maiores. 
9
 Nesse sentido, citamos o Projeto de Lei do Senado, nº 580, de autoria do senador Waldemir Moka (MDB, 
antigo PMDB), que pretende alterar a Lei nº 7.210/84 (Lei de Execução Penal), para estabelecer a obrigação de o 
preso ressarcir o Estado das despesas com a sua manutenção, mediante recursos próprios ou por meio de 
trabalho. 
 
 
com imprescindível auxílio do populismo penal que fundamenta projetos que visam reduzir, 
sistematicamente, a maioridade penal, recrudescer penas, ampliar o rol dos crimes hediondos, 
etc., alterações que maximizam o punitivismo sob a batuta da política de ―tolerância zero‖, e 
destinadas à ―clientela‖ racial. 
Em nosso Direito penal paralelo, limitado apenas em termos territoriais favelizados, 
construídos com o primeiro lugar do negro (SANTOS, 2010), as práticas desumanizantes 
recortam todo e qualquer quadro teórico, com estribo constitucional, tornando-o um dos mais 
mortíferos do mundo. Assim ―legitimado‖, o Estado brasileiro extermina os jovens negros 
antes que estes representem qualquer risco à estrutura estatal, manipulando o genocídio com 
viés neutralizante/acautelatório de quem mais tem motivos para desconstruí-lo, culminando 
com o assassinato de um jovem negro a cada 23 minutos
10
, muitos alvejados pelas balas 
(nunca) perdidas que sempre acertam seu alvo (quase) exclusivo. 
Engendrando nesse ―Direito Penal‖, e escamoteado nos discursos de um ―Ornitorrinco 
punitivo‖ (ANDRADE, 2012, p. 111), a continuidade da política pública de desnegrecimento 
do país foi assegurada pela declaração de ―guerra às drogas‖, pré-anunciada no Brasil em 
1830, ―o primeiro país do mundo a editar uma lei contra a maconha‖, quando a prisão se 
destinava aos escravos e usuários do ―pito de pango‖, enquanto o vendedor, o boticário, era 
multado, demonstrando a seletividade racial (BARROS; PERES, 2011).
11
 
A declaração de guerra veio após a abolição (ao contrário do que induz a ideia de 
―coligação‖ à política de guerra estadunidense), com o combate ao ―comércio‖ e uso do ―fumo 
de negro‖ (maconha) na década de 1930, que reprogramou o sistema de controle racial sob o 
discurso de ―saúde pública‖ unindo, novamente, nossos Direitos penais para manter o controle 
da população negra, atualizando o genocídio negro, intra ou extramuros, pelo qual o Brasil 
continua aumentar sua cifra negra. Uma estratégia política que ganha cores vivas do nosso 
racismo ao colocarmos luz na construção dos ―campos de batalha‖, dos inimigos de sempre e 
no fundamento real explicitado pela guerra racial chancelada pelo Estado. 
 
10
 Relatório final da Comissão Parlamentar de Inquérito sobre o Assassinato de Jovens do Senado Federal 
(2016). 
11
 Merece destaque que nas fazendas, o uso da maconha não era só permitido como motivado, por alguns 
senhores, que se beneficiavam dos efeitos estimulantes da droga, aumentando, assim, a produção de seus/suas 
escravo(a)s, amenizando o langor da exploração. Nesse sentido, a passagem de Gilberto Freyre (2013, p. 36) ao 
mencionar culturas ancilares à da cana-de-açúcar, dentre elas: ―[...] as que se podem chamar de entorpecentes, de 
gozo, quase de evasão, favoráveis àquele ócio e àquela volutuosidade: o tabaco, para os senhores; a maconha – 
plantada, nem sempre clandestinamente perto dos canaviais – para os trabalhadores, para os negros, para a gente 
de cor [...]. Não parece simples coincidência que se surpreendam tantas manchas escuras de tabaco ou de 
maconha entre o verde-claro dos canaviais. Houve evidente tolerância – quando não mais que tolerância – para a 
cultura dessas plantas volutuosas [...]‖. Não se pode esquecer, também, seu uso ―anestésico‖ sobre o sofrimento 
provocado pelas chibatas, que dilaceravam a carne, como ato de ―benevolência‖ quase santa. 
 
 
Se o projeto de embranquecimento (pelo extermínio direto, ou indireto pela 
mestiçagem ou assimilação), possibilitou a redenção de Cam, o Estado brasileiro substituiu 
aquela maldição pela do Conde Drácula, sob a qual a ―saúde pública‖ necessita, diariamente, 
de sangue negro, não importando de ―qual lado‖ do conflito ele jorre! A lógica 
(in)constitucional exterminante de nossa ―guerra contra às drogas‖ é endossada pelo 
Judiciário, que autoriza, desde a priori, a ignorância do bem jurídico mais valioso (?), 
legitimada pelo discurso do ―inimigo‖ construído racialmente, demonstrando que nossa 
―justiça‖ não possui qualquer obstáculo em seu olhar apurado, deslocando o fiel da sua 
balança, bem como sua espada, de acordo com a melaninocracia.
12
 
Essa guerra resta, irrefutavelmente, perdida, se, e apenas se, correlacionarmos seu 
fundamento declarado à estratégia adotada, porém, em seu objetivo latente (?) o sucesso é 
absoluto: o extermínio do ―traficante‖, demônio incorporado por corpos facilmente 
encontrados em toda e qualquer esquina marginal(izada). De outra face, o Judiciário é o 
responsável pela seletividade racial secundária através da manipulação que define a figura do 
usuário de drogas como privilégio do branco, para quem a dúvida é garantia fundamental. 
Nosso sistema de controle racial se embasa na periculosidade que fundamenta o 
encarceramento massivo
13
, a partir da presunção que exala pelos poros dos corpos negros, e a 
pena de morte paralela, avalizada constitucionalmente. Regras de um Estado de exceção 
permanente nas margens da margem, fantasiado pelo conto infantil ―Brasil: o país das 
maravilhas raciais‖ que seduz grande parte de nossa ―elite crítica‖. Uma posição que 
fortalece nosso racismo pelo não enfrentamento, a estratégia política que se reflete em nossos 
―Direitos Penais‖, expondo os efeitos sem causa ―aparente‖ ao escamotear sua programação 
racista, enquanto possibilita o fácil reconhecimento de sua ―clientela‖, profecia marcada a 
ferro em uma população condenada, quase totalmente, à subsistência e à miserabilidade. 
Toda a construção teórica abolicionista que não considere o racismo como fonte 
(inesgotável) de violências e opressões, não é apenas irrealizável em nossa margem, mas 
mantém o ―mascaramento‖ (MBEMBE, 2014, p. 95) que oculta, nega e dissimula sua real 
 
12
 O Colorismo nos fornece uma chave importante de entendimento da questão, ao problematizar os efeitos da 
mestiçagem relacionada ao branco, situado como ponto de referência. Nesse sentido, quanto mais melanina, mais 
distante de direitos e acessos aos mesmos, características da branquitude. Ou seja, quanto mais afastado do 
branco, do que se acha branco, ou dos que podem se passar por branco (afroconveniência), menos direitos, 
acessos ou possibilidades, isso inclui a total ausência de melanina (albinismo), se a descendência negra for 
manifestada no fenótipo. 
13
 A periculosidade é extraída do permissivo legal de nosso Direito penal do autor, estabelecido em critérios 
subjetivos elencados no art. 59, do Código Penal, como ―antecedentes‖, ―conduta social‖, e, ―personalidade do 
agente‖, pelos quais, juíza(e)s estabelecem os parâmetros da pena em caso de condenação. 
 
 
face: a própria natureza racista, eis que, raça, no Brasil, é fator criminógeno e exterminante, 
mantenedores da nossa (sempre viva) gênese escravocrata. 
Através de conjecturas que enredam sistemas de controle, central (EUA) e marginal, 
nos remetendo à velha política mimética dependente, com Angela Davis fica demonstrado 
como ocorreu a alteração automática da prisão da escravidão em escravidão da prisão no sul 
estadunidense, que desfez a ilusão da liberdade democrática para os negros ―[...] no mesmo 
momento em que fora prometida: na abolição da escravidão.Com a abolição da escravidão, 
os negros deixaram de ser escravos, mas imediatamente se tornaram criminosos – e, como 
criminosos, tornaram-se escravos do Estado‖ (DAVIS, 2009, p. 13). 
Ao citar W. E. B. Du Bois (―Black Reconstruction‖, 1935), fica exposta a 
programação conservadora da opressão branca através da vinculação visceral entre o sistema 
penal e racismo, com imprescindível ―tradução‖ do paradigma racista/etiológico que 
estabeleceu o marco fundacional para o Jim Crow e, com ele, o encarceramento negro em 
massa, iniciado em 1876 com a criminalização por sentenças desproporcionais, sem o 
cometimento de crimes violentos, contendo a animalidade negra presa ao trabalho forçado ou 
locada aos seus ex-senhores para pagamento das multas. 
Michelle Alexander destaca como a ―guerra contra as drogas‖, com um discurso 
racialmente ―neutro‖, manteve o sistema segregacionista estadunidense intacto após o colapso 
do antigo Jim Crow, alteração padronizada nos sistemas racistas como aconteceu com a 
escravidão e os linchamentos, devendo ser considerado o principal alvo do movimento negro, 
enfraquecido pela capilarização do rompimento nas redes de apoio através do etiquetamento 
criminal, salientando que: ―o encarceramento em massa – e não os ataques às ações 
afirmativas ou os problemas na aplicação dos direitos civis – é a manifestação reacionária 
mais prejudicial contra o Movimento dos Direitos Civis‖ (ALEXANDER, 2017, p. 55). 
As prisões cumprem, com louvor, suas funções enquanto fábricas de desumanização, 
perfeitamente integradas às sociedades estratificadas nas quais, o sempre sedutor, mercado de 
segurança recebe olhares atentos do capitalismo (simbiótico ao racismo) que menosprezou o 
viés (in)correcional para dar origem à ―complexos industriais prisionais‖ sob o qual brotam 
vozes acaloradas em sua defesa, que atrelam a questão criminal à responsabilidade individual, 
não correlacionando-a com a construção de lugares pré-determinados de existência, como a 
racialização naturalizada do crime e do cárcere que, para a população negra, se transformou 
em ―fato inevitável da vida, como nascimento e morte‖ (DAVIS, 2018, p. 174). 
É no interior de políticas racistas que a ―crise do sistema carcerário‖ (violações dos 
direitos humanos, encarceramento em massa, superlotação, etc.), sentenças (i)legais, 
 
 
execuções (extra)judiciais
14
, chacinas e massacres (intra e extramuros) que expõem a morte 
anunciada dos indesejados, que a desumanização, manipulada por todas as agências que 
compõem o sistema de controle racial/social, deve ser alocada. 
Um ideário que não pode ser compelido pelos Direitos Humanos que resta repelido 
pela animalidade tornada signo negro, imiscuída em sua construção e sinônimo de risco à 
humanidade, eis que: ―o direito é [...] uma maneira de fundar juridicamente uma certa ideia de 
Humanidade enquanto estiver dividida entre uma raça de conquistadores e uma raça de 
servos. Só a raça de conquistadores é legítima para ter a qualidade humana‖ (MBEMBE, 
2014, p. 111). 
A racionalidade objetificante do sistema punitivo ―democrático‖ brasileiro é 
legitimada e legalizada com objetivos de (re)afirmação da humanidade branca. Assim, a 
desumanização não é apenas característica inafastável, mas sua própria razão de existir! 
Uma proposta abolicionista desde, e para, o realismo marginal racial brasileiro, antes 
de suscitar alternativas para o cárcere, revela-se como luta por sobrevivência em solo, 
historicamente, hostil, que concebeu a questão racial como política de guerra, fazendo da 
morte negra sua essência. A resistência e re-existência negra, portanto, ao preconizar o fim de 
um sistema racista, invoca a desconstrução de estruturas, instituições e conceitos concebidos 
centralmente, a emancipação somente é possível, e viável, pela decolonialidade, a começar 
pelos saberes. 
 
5 - A DECOLONIALIDADE COMO BASE FUNDANTE DE UM ABOLICIONISMO 
PENAL MARGINAL 
 
―Quando não souberes para onde ir, olha para trás e saiba pelo menos de onde vens.‖ 
(Provérbio africano) 
 
 
A ordem em sociedades racistas pressupõe a paz racial conseguida somente com o 
controle e domínio completo do mundo negro. A passividade dos corpos negros, sua 
resiliência face às violências vivenciadas todos os dias (sobre o passado, presente e futuro), 
suporta, estrutura e mantém a branquitude em seu mundo monocromático (quase) perfeito. 
A liberdade negra pressupõe, assim, a constrição da liberdade branca, ruptura dos seus 
meios de controle e, por fim, demolição do seu mundo que apenas se mantém pela 
 
14
 No Brasil, entre 2014 a 2017, houve mais de quatro mortes por dia dentro do sistema carcerário. Disponível 
em: https://oglobo.globo.com/brasil/mais-de-quatro-detentos-morrem-por-dia-em-prisoes-do-pais-
22815782#ixzz5JSSnnTzX. 
https://oglobo.globo.com/brasil/mais-de-quatro-detentos-morrem-por-dia-em-prisoes-do-pais-22815782#ixzz5JSSnnTzX
https://oglobo.globo.com/brasil/mais-de-quatro-detentos-morrem-por-dia-em-prisoes-do-pais-22815782#ixzz5JSSnnTzX
 
 
subjugação, resignação e o embranquecimento, em sentido lato, como instrumento de 
docilização/domestificação. Arquitetura mantida ao longo dos séculos pela colonialidade, 
através da qual a colonização mantém o controle, influência e dependência das margens 
mesmo sem o pacto fundacional imposto pelas metrópoles. 
Relação assegurada pela subordinação, submissão e comprometimento do grupo 
minoritário/dominante de colonos em relação aos colonizadores, e controle, opressão e 
violência de ambos em relação ao grupo majoritário/dominado, uma sistemática assegurada 
pela ―colonialidade do saber‖ (cuja ―crise‖ é idêntica ao do direito penal), legado central que 
impede o conhecimento, compreensão e (re)construção do(s) mundo(s) a partir de suas 
próprias raízes e epistemes. 
Instalada assim, em seio marginal, a derrubada das muralhas e artimanhas da 
colonialidade depende da instrumentalização de aportes decoloniais capazes de superar a 
―colonialidade do poder‖ que, com seus reflexos globalizados, limitou a descolonização à 
independência jurídica-política, obstruindo fortemente a decolonialidade, a qual ―[...] tendrá 
que dirigirse a la heterarquía de las múltiples relaciones raciales, étnicas, sexuales, 
epistémicas, económicas y de gênero que la primera descolonialización dejó intacta” 
(GROSFOGUEL, 2010, p. 17). 
Tendo a decolonialidade como fim, a descolonização é meio e Frantz Fanon sublinha a 
violência do processo, dada a violência estrutural colonial, manipulada de inúmeras formas, 
iniciando pela desconstrução do próprio ser colonizado que introjetou, além do uso da 
violência como meio de resolução de conflitos, o sonho de obter o poder absoluto do 
colonizador sobre tudo apropriável, a lógica objetificante como condição de reconhecimento 
nas margens desfiguradas. 
Esse processo pressupõe a desordem mundial para reconstruí-lo a partir da 
transformação dos coadjuvantes em protagonistas de sua própria história, uma substituição da 
categoria de homem que modifica sua natureza, e assim: 
A descolonização jamais passa despercebida porque atinge o ser, modifica 
fundamentalmente o ser, transforma espectadores sobrecarregados de 
inessencialidade em atores privilegiados, colhidos de modo quase grandioso pela 
roda viva da história. Introduz no ser um ritmo próprio, transmitidos por homens 
novos, uma nova linguagem, uma nova humanidade. A descolonização é, em 
verdade, criação de homens novos. Mas esta criação não recebe sua legitimidade de 
nenhum poder sobrenatural; a ―coisa‖ colonizada se faz no processo mesmo pelo 
qual se liberta (FANON, 1968, p. 26-27). 
 
Conforme leciona Catherine Walsh (2009, p. 14-15), pensar decolonialmente não se 
trata apenas de um joguete silábico, mas, pensar para muito além da impossível regressão 
rumo à desconstrução e reversão da colonização, pois ―la intención,más bien, es señalar y 
 
 
provocar un posicionamiento — una postura y actitud continua — de transgredir, intervenir, 
in-surgir e incidir. Lo decolonial denota, entonces, un camino de lucha continuo en el cual 
podemos identificar, visibilizar y alentar “lugares” de exterioridad y construcciones 
alternativas.” 
A luta por resistência, insurgência, re-existência e subversão da ordem colonial(ista) 
pelos povos marginais escravizados, se mantêm pela ―memória coletiva‖, transmitida pela 
ancestralidade através de tudo que restou de suas identidades, uma estratégia de 
(sobre)vivência existencial, chamada por Catherine Walsh de ―pedagogia decolonial‖, pela 
qual se une, e se complementa, os mundos e os seres, de modo não excludente, uma vez que: 
Es a partir de este horizonte histórico de larga duración, que lo pedagógico y lo 
decolonial adquieren su razón y sentido político, social, cultural y existencial, como 
apuestas accionales fuertemente arraigadas a la vida misma y, por ende, a las 
memorias colectivas que los pueblos indígenas y afrodescendientes han venido 
manteniendo como parte de su existencia y ser ( WALSH, 2013, p. 25). 
 
O processo decolonial, assim, não é nenhuma novidade (e jamais será!), uma vez que é 
o continuum da luta pelo resgate da humanidade anulada pela abstrativação consolidada pelos 
saberes/poderes centrais e coloniais, modelados por uma ―racionalidade‖ exclusiva extraída 
de uma sub-humanidade encarcerada em sua própria existência. 
Nestas condições, a decolonialidade da margem brasileira precisa destruir, antes, as 
barreiras raciais fortificadas pela política de não enfrentamento do racismo, é dizer que 
precisamos de uma perspectiva marginal afrocentrada como postura de confronto, tendo em 
vista que a Afrocentricidade procura retomar o protagonismo negro roubado pelo racismo, 
para recuperar o controle do pensamento histórico e social de matriz africana, instrumento de 
dominação monopolizado durante séculos, por pesquisadores brancos, sabedores que ―a 
melhor forma de controlar um povo é controlar o que ele pensa sobre si mesmo‖ 
(NASCIMENTO, E., 2009, p. 60). 
Para Molefi Kete Asante (2016, p. 06), a Afrocentricidade é um posicionamento 
crítico em relação à violência colonial da África e seus descendentes, além de corretiva da(s) 
sua(s) história(s), no sentido de ideologia contra-hegemônica, deslocando o lugar de 
enunciação e chegada da fala, representando, ―[...] uma possibilidade de maturidade 
intelectual, uma forma de ver a realidade que abre novas e mais excitantes portas para a 
comunicação humana. É uma forma de consciência histórica, porém mais do que isso, é uma 
atitude, uma localização e orientação. Portanto, estar centrado é ficar em algum lugar e vir de 
algum lugar.‖ 
 
 
A decolonialidade, assim, deve iniciar pela desconstrução do próprio colonizado, do 
negro brasileiro que não se reconhece enquanto tal, bem como desconhece (ou não identifica), 
o racismo brasileiro em suas nuances, sua política de assimilação, e que, ao não ter o direito 
mínimo de saber suas origens e raízes, se projeta no impossível espelhamento da brancura 
desfigurante (FANON, 2008). A libertação de todo o modelo central somente é alcançável por 
suas próprias mãos, pois ―tudo começa portanto por um acto de identificação: ‗Eu sou um 
negro‘‖ (MBEMBE, 2015, p. 255). 
Nessa perspectiva, a conscientização da negritude coletiva brasileira irá reclamar suas 
origens e, a partir delas, outros aspectos que não aqueles formulados pelo centro. O Estado, 
assim, perderia o viés monista e hegemonia em relação à resolução de conflito, vindo 
resguardar a autoregulação, decorrente do direito à identidade originária
15
, que não se atrela à 
questão de ser, ou não, institucionalizada, mas ―[...] na capacidade de romperem com a 
padronização opressora e de construírem nova identidade coletiva, de base participativa, apta 
a responder às necessidades humanas fundamentais‖ (WOLKMER, 2001, p. 143). 
A violência desse projeto é ínsita ao processo de liberdade negra, uma vez que os 
mundos, negro e branco, construídos e consolidados nas entranhas do colonialismo, são 
incompatíveis enquanto essa conjuntura excludente persistir. As respostas e resultados de 
todas as insurreições pretas dão conta dessa relação diametralmente oposta. 
A construção da negritude, e seu reconhecimento, deságuam em um projeto político 
coletivo que se projeta ao futuro, enunciando a ancestralidade (re)negada. Todos os objetivos 
desse constructo dependem, invariavelmente, da desconstrução da branquidade e 
branquitude, determinando redução de direitos naturalizados pelo histórico racista, e nesses 
termos, a democracia é obstáculo ao processo decolonial, pois, conforme destaca Achille 
Mbembe (2014, p. 149): 
Em democracia, a liberdade dos brancos só é viável se acompanhada pela 
segregação dos Negros e pelo isolamento dos Brancos na companhia dos seus 
semelhantes. Ou seja, se a democracia é verdadeiramente incapaz de resolver o 
problema racial, a questão é desde logo perceber como poderá a América livrar-se 
dos Negros. 
 
Deste modo, o reconhecimento e reclame do direito à identidade orienta o resgate dos 
aspectos raciais, culturais, étnicos, filosóficos e religiosos, anunciando posturas 
revolucionárias no modo como fomos caracterizados e constituídos, questionando toda 
estrutura estatal e defendendo sua desconstrução como fruto do eurocentrismo genocida. 
 
15
 O Estado Plurinacional boliviano, que consolidou o ―novo constitucionalismo‖, é exemplo a ser seguido 
pelo(s) Movimento(s) Negro brasileiro. 
 
 
A viabilidade deste programa resta indissociável de uma epistemologia pela qual 
outros olhares projetem instrumentos que rompam com os estreitos limites do próprio Estado 
Democrático de Direito racializado, onde não encontraremos nenhuma resposta que não 
aquela barbárie travestida de civilização que impõe a construção do ―Outro‖ e sua imediata 
inferiorização, mantendo a antiga tradição transplantada de colocar o Estado sempre como 
protagonista, atitude análoga daquele ―marinheiro bêbado‖ que procura sua carteira perdida 
somente sob a luz de um poste, mesmo consciente de que ali ela não esta, com o fundamento 
de que somente ali, ele consegue ―ver‖ alguma coisa (FLORES, 2009, p. 47). 
A derrubada de barreiras consolidadas por epistemes refratárias às cosmovisões 
periféricas é questão de sobrevivência para a população negra. A importância da 
decolonialidade epistêmica é estabelecida por Ramón Grosfoguel (2010, p. 457) ao apontar 
para exigência de se ―[...] levar a sério a perspectiva/cosmologias/visões de pensadores 
críticos do Sul Global, que pensam com e a partir de corpos e lugares étnico-raciais/sexuais 
subalternizados.‖ 
 Diante da radicalidade do racismo em nossa sociedade, e no sistema punitivo 
demandado e programado por ela, se faz imperioso ultrapassar a limitadíssima fronteira do 
eurocentrismo para pensarmos um abolicionismo racial, sem o qual, o controle racial será 
remontado com o título de ―abolicionismo penal‖. 
 
6 - A GUISÁ DE CONCLUSÃO 
 
―Nossa fala estilhaça a máscara do silêncio.‖ 
 (Conceição Evaristo) 
 
 
A partir do marco criminológico crítico, que deságua, aqui, em uma sociologia do 
controle racial marginal, extrai-se que o modelo punitivista centrado na prisão, desconexo de 
qualquer legitimidade discursiva, se mantém, única e exclusivamente, por sua própria razão 
de existir: sua funcionalidade, programada dentro dos limites estabelecidos por sociedades 
racistas como instrumento ―legítimo‖ de controle racial ao substituir as senzalas, mantendo a 
desumanidade negra intacta dentro de contextos ―democráticos‖, nos quais o ―exercício 
especulativo‖, proposto por Angela Davis (2018, p. 528), se mostra bem produtivo, afinal, 
imaginar um presente escravocrata fornece importantes parâmetros para traçarmosa relação, 
em muitos aspectos, da (i)modificação apresentada. 
Cenários distintos e realidades (pouco) inalteradas evidenciam que quando a barreira 
jurídica da desigualdade foi ultrapassada com a abolição da escravatura, projetando novas 
 
 
esperanças para a população negra, o Estado foi congregando novos saberes e posturas 
(i)legais, com os quais fincou, em solo firme, as bases de novos, mais sólidos e profundos 
obstáculos, que mantiveram a ordem racial intacta, demonstrando que a igualdade racial é 
impossível nos termos colonialistas. Assim, na imperatividade de conservar a arquitetônica 
racista durante a transição, a Criminologia positivista fundamentou a animalidade negra, já 
reconhecida pelo catolicismo, petrificada como dogma(ática) penal sob o viés da 
―periculosidade‖ que estrutura nossos ―Direitos penais‖, programados pelo racismo e 
orientados pela melaninocracia. 
Aquela abolição conciliatória, condicionada pelo genocídio negro, em termos de 
branqueamento, ―modernizou‖ o velho sistema legal, fundando o ―país das maravilhas 
raciais‖ com o silenciamento sobre o racismo, alocado nas entranhas da igualdade formal e da 
―cordialidade‖ que fortaleceram a hegemonia branca ao manterem incólume nosso apartheid, 
assegurando sua supremacia através da exclusão e morte dos indesejados. 
Se o abolicionismo penal certifica que a prisão desprezou toda e qualquer função 
teorética, o discurso abolicionista marginal demonstra sua real face, arrancando suas 
máscaras. A luta da população negra, portanto, não pode ser por aprisionamento ou por 
reformas no sistema prisional, sob pena de reforçar sua autossuficiência assegurada por sua 
funcionalidade mais básica, que não podem ser ignorada quando do clamor por ―justiça‖ 
diante dos crimes raciais, que, sob a lógica desvelada pelo ―labelling approach” e pelo 
―second code” racista, transforma a ―imunização‖ (BARATTA, 2011; 1995) em direito 
basilar decorrente da branquitude, enquanto mantém a velha ―dualidade perversa‖: o negro só 
é reconhecido no âmbito de nossos Direitos Penais (BATISTA, N., 2002, p. 152). 
O confronto, assim, deve ser direcionado à estrutura racista em sua integralidade, na 
qual a interrupção do genocídio negro é primordial, visceralmente ligada ao encarceramento 
em massa, eis que é a partir desses instrumentos que a edificação racista se solidifica e se 
projeta para além do nosso horizonte. Nessa mirada, sua demolição passa, necessariamente a 
primeiro plano, pela alteração profunda da nossa política criminal de drogas, pois, o percurso 
histórico de criminalização das drogas revela seus fundamentos e funções racistas, 
acompanhando, passo a passo, a evolução do sistema de controle racial brasileiro, mas não se 
finda com a mesma, tendo em vista a demanda por ordem que programa os instrumentos 
desumanizantes, substituindo, de modo sistêmico e cíclico, legitimações com fins de 
perpetuação da hierarquia e hegemonia racial. 
Os problemas ocasionados pelas drogas, rotuladas de ilícitas, jamais seriam assuntos 
para os “Direitos penais” se a questão não fosse de controle racial, uma vez que saúde 
 
 
pública só pode ser tutelada com políticas públicas de saúde, e os brancos, através de ―pactos 
narcísicos‖ (BENTO, 2002, p. 43) que os garante como ―usuários‖, sabem muito bem disso! 
Carl Hart (2014) já demonstrou, e comprovou cientificamente, que existem muitos meios 
eficazes para o tratamento dos efeitos nocivos das drogas em dependentes químicos, passando 
pela política de redução de danos, jamais pela criminalização do uso de drogas (i)lícitas que, 
ao serem meios de alcance de um bem-estar, individual e subjetivo, decorrem de direito 
fundamental que demarca o limite intransponível da reserva legal ao Estado. 
A discussão sobre drogas, então, precisa ser séria, responsável e capilarizada, de modo 
que alcance, em mesma intensidade, o senso comum que garante o apoio fundamental para o 
populismo penal e sucesso da política exterminante, a partir da mobilização e modulação 
massiva por programas midiáticos policialescos, rechaçando, obrigatoriamente, o falso 
moralismo que o sustenta, tendo em vista que o maior problema em relação às drogas é seu 
proibicionismo, pautado na sua construção, e manipulação, social. 
Da farsa abolicionista oitocentista ao abolicionismo penal ―utópico‖, notamos, além da 
resistência e permanência da luta negra por liberdade, a insistência branca (nada ingênua) em 
ignorar o racismo enquanto fonte de violências que (pré)estabelece lugares em nossa 
sociedade. Nem todo abolicionismo é, de fato, abolicionista, e todo discurso ―racialmente 
neutro‖ é racista na medida em que o mantém intacto e ainda o (re)fortalece! 
Uma proposta abolicionista brasileira somente pode ser esboçada a partir de outras 
epistemes que combatam e objetivem a extinção do racismo enquanto estrutura vital, cuja 
efetivação se dirige a uma mudança substancial na concepção da própria sociedade, concebida 
em termos coloniais que sistematiza políticas racistas. O próprio modelo social eurocêntrico, 
assim, é obstáculo ao abolicionismo penal próprio, somente alcançável com uma postura 
verdadeiramente democrática, que, lastreada pelo viés racial, retome e irrompa o caráter 
puramente negativo da abolição escravagista e solucione os problemas decorrentes e inerentes 
à complexidade de questões raciais radicais. 
Se a retomada do processo abolicionista oitocentista é premissa básica para um 
abolicionismo penal brasileiro, faz-se imprescindível que o trajeto seja pautado pelo 
rompimento com a colonialidade em sua magnitude, a partir da política de resistência 
decolonial e afirmação de raízes diaspóricas, elo que vincula as gerações passadas, presentes e 
futuras, para resgatar e firmar o protagonismo negro, evitando que a ―síndrome da redentora‖ 
contamine e monopolize a pauta, diminuindo o poder mobilizador do processo de libertação 
que invoca a ancestralidade na busca por saberes que sustentam modelos que não se insiram 
na perspectiva Outrificante. 
 
 
Em nossa margem, constituída de mundos inconciliáveis, característica do racismo, 
enquanto a violência e violação cotidianas sobre a população negra é explícita, os privilégios, 
artimanhas, hegemonia e dominação, resultantes da branquitude e branquidade, se 
apresentam de modo óbvio e inegável, na mesma proporção. A luta anti-racista impõe a 
população branca, como condição basilar, o reconhecimento desses presentes, conscientes de 
que muitos privilégios não podem (por mais que se queira), ser renunciados, como a vida, o 
maior deles, já que seus corpos ―alvos e belos‖ jamais serão confundidos com o do 
―perigoso‖, incorporado e manifestado pelo fenótipo negro inferiorizado. 
Somente uma decolonialidade afrocentrada é capaz de pensar em um modelo social, e, 
por consequência, métodos de resoluções de conflitos, pautado na coletividade integral nos 
termos determinados pela filosofia ancestral Ubuntu, uma das heranças mais preciosas 
deixadas pela mãe - África, mas que também teve parte em sua maldição, eis que, ao não 
outrificar o branco, em determinados momentos, decretou sua colonização e escravização. 
Entretanto, Ubuntu não pode (continuar a) ser utilizado como mera ―palavra de 
efeito‖, para dotar de beleza discursos falsos, esvaziando o conceito em seu comprometimento 
com a existência coletiva, incluindo sua belicosidade, muito distinta da passividade e 
domesticação cristã-ocidental. A essência filosófica africana é indispensável para substituir 
conceitos como solidariedade e tolerância que, ao manter a hierarquização das relações, são 
falsos instrumentos de combate ao individualismo central. 
Como matriz civilizatória que marca a imperatividade da coletividade, o modo 
relacional se baseia no sentimento de pertencimento social a um todo (que exclui a 
estigmatização e criação do ―outro‖, a individualidade e a meritocracia), e de 
responsabilidadeda sociedade perante seus integrantes, fator indispensável para entender o 
erro individual como falha coletiva
16
, propagando o ―sou apenas por que somos, e somos 
somente enquanto coletividade‖, característica básica do Quilombismo que se apresenta, 
inclusive, como alternativa política à (falsa) escolha partidária polarizada entre direita versus 
esquerda, que se sustentam sobre a questão racial e não objetivando, de fato, o fim do 
racismo, da branquidade e branquitude. 
 
16
 Em Babemba, tribo da África do Sul, acredita-se que cada indivíduo vem ao mundo como um ser bom, 
desejando segurança, amor, paz e felicidade para si e para seu grupo. Mas às vezes, na busca por essas coisas, 
cometem erros que são vistos pela tribo como um grito de socorro. Assim, quando um de seus integrantes 
comete um erro ou faz algo prejudicial a outrem, este é cercado por toda a tribo que, durante dois dias, vai dizer 
àquele integrante todas as coisas boas que ele já fez, se unindo para erguê-lo e reconectá-lo à sua verdadeira 
natureza, para (re)lembrá-lo de quem ele realmente é, de sua essência, até que ele se lembre da verdade da qual 
tinha se desconectado temporariamente. 
 
 
 
Práxis afro-brasileira que fundou nossa única tentativa de construção de uma 
sociedade verdadeiramente democrática, livre e de comunhão existencial (Palmares), cujo 
reconhecimento e legalização estatal é irrelevante, eis que, um de seus pressupostos, é o 
associativismo que mobiliza a coletividade em prol da consolidação da unidade social e bem-
viver de todos, em todos os níveis e âmbitos. 
Abdias do Nascimento (2002, p. 271), apontando o protagonismo negro para a 
reconstrução do Brasil, refere-se às inúmeras lições que servem como norte para outro tipo de 
sociedade, processo projetado por sua própria experiência histórico-social: 
Os negros têm como projeto coletivo a ereção de uma sociedade fundada na justiça, 
na igualdade e no respeito a todos os seres humanos, na liberdade; uma sociedade 
cuja natureza intrínseca torne impossível a exploração econômica e o racismo. Uma 
democracia autêntica, fundada pelos destituídos e os deserdados deste país, aos quais 
não interessa a simples restauração de tipos e formas calcadas de instituições 
políticas, sociais e econômicas as quais serviam unicamente para procrastinar (adiar) 
o advento de nossa emancipação total e definitiva que somente pode vir com a 
transformação radical das estruturas vigentes. Cabe mais uma vez insistir: não nos 
interessa uma proposta de adaptação aos moldes de sociedades capitalistas e de 
classes. Esta não é a solução que devemos aceitar como se fora mandamento 
inelutável. Reinvenção de um caminho afro-brasileiro de vida fundado em sua 
experiência histórica na utilização do conhecimento crítico e inventivo de suas 
instituições golpeados pelo colonialismo e o racismo. 
 
É preciso, então, confrontar o Estado, modelado em pilares centrais, com vistas à sua 
extinção, conferindo resistência compatível com o sistema de controle racial que oprime e 
neutraliza, a ponto de menosprezo, uma das maiores populações negras do mundo, que não 
representa qualquer ameaça à pátria exterminadora que continua a perseguir o sonho 
encantado de seu branqueamento, invejando a ―hermana‖ Argentina. 
A diferença racial como pequeno detalhe conferido por inúmeros fatores, e não como 
ethos hierarquizante, é condição ontológica para o abolicionismo pleno e para uma sociedade 
que se projete, e se comprometa, com a coletividade, redefinindo a utopia, tomada aqui como 
resgate de práticas reais que se afastam, em muito, de um sonho inocente. Para tanto, é 
preciso reafirmar as identidades racializadas para explicitar as desigualdades criadas e 
consolidadas por essa política desumanizante, visando suas extinções, só assim será possível 
restaurar aquele olhar aracial curioso, perante o qual o pertencimento é a lei natural que une 
mundos. 
 
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LUCIANO GÓES 
Mestre em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC (2015) e graduado em 
Direito pela Universidade do Sul de Santa Catarina - UNISUL (2012). Professor do Centro 
Universitário Estácio de Santa Catarina e Coordenador Geral dos Projetos de Extensão 
―Flores da Clô‖ e ―Vicente do Espírito Santo - S.O.S Racismo‖. Professor de Direitos 
Humanos e Direito Penal do curso Pós-Graduação Lato Sensu em Direito Penal e Processual 
Penal, do Centro Universitário Católica de Santa Catarina. Vice-presidente da Comissão de 
Igualdade Racial, Subseção de São José/SC, da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional 
Santa Catarina (OAB/SC) e secretário da Comissão da Verdade sobre a Escravidão Negra no 
Brasil da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional Santa Catarina (OAB/SC). 
Pesquisador/membro do projeto de Pesquisa e Extensão ―Universidade Sem Muros‖ (UFSC), 
do Grupo de Pesquisa Brasilidade Criminológica (UFSC/CNPq), e do Núcleo de Estudos 
Afro-Brasileiros do Centro Universitário Estácio de Santa Catarina (NEAB - Estácio). 
Advogado Criminal. 2º lugar, na categoria ―Direito‖, do 59º Prêmio Jabuti (2017). 
E-mail: lucianogoesadvs@gmail.com 
mailto:lucianogoesadvs@gmail.com

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