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Resumo do Primeiro Capítulo do livro “O Capital” A análise de Karl Marx na obra “O Capital: crítica da economia política” inicia o primeiro capítulo caracterizando o papel da mercadoria como expressão síntese do modo de produção capitalista. Compreendida como forma elementar da riqueza na sociedade, o autor vai trabalhar a mercadoria, em um primeiro momento, a partir de dois fatores principais: o valor de uso e o valor. Tendo a mercadoria como um objeto externo que satisfaz as necessidades humanas, o conceito de valor de uso é apresentado como categoria representativa da utilidade de uma determinada mercadoria condicionada pelas propriedades do seu corpo. Partindo de uma compreensão de subjetividade, o próprio corpo da mercadoria é um valor de uso, independente da sua apropriação custar muito ou pouco trabalho. Além do valor de uso, Marx traz a conceituação do valor de troca enquanto uma relação mais quantitativa da mercadoria em termos de comércio, definindo como a “proporção na qual valores de uso de um tipo são trocados por valores de uso de outro tipo” (p.158). Nesse sentido, o valor de troca, em termos de comparação, confere a uma mercadoria múltiplos valores de troca que se traduzem a partir da permutabilidade entre si e a igualdade de grandeza no processo de troca, de modo que, uma x quantidade de ferro seria equivalente a y de trigo, z de ferro e etc. A partir dessa relação no processo de troca, o autor revela que há algo em comum de mesma grandeza que existe em duas coisas diferentes. Isso é esclarecido diante da abstração do valor de uso das mercadorias e da especificidade técnica (“carpinteiro, pedreiro ou fiandeiro”) do trabalho empreendido na sua transformação. Guardados esses dois elementos, resta como substância residual uma concepção indiferenciada de trabalho humano, que caracteriza o que será chamado de valor – ou valor da mercadoria. Portanto, o elemento em comum que se apresenta no processo de troca de duas mercadorias diferentes é o valor. Como esse valor é medido? De acordo com Marx, essa grandeza será medida a partir da quantidade de trabalho socialmente necessário contido na mercadoria. Logo, a medida desse trabalho seria estimada através da constituição do tempo, em média, necessário para a produção, ou seja, o tempo para “produzir um valor de uso qualquer sob as condições normais para uma dada sociedade e com o grau social médio de destreza e intensidade do trabalho” (p.162). Sendo assim, para o autor, as mercadorias nas quais estão contidas massas iguais de trabalho - ou que podem ser produzidas em um mesmo período de tempo – possuem a mesma grandeza de valor. No entanto, o tempo de trabalho para se produzir algo é suscetível a mudanças conforme as alterações na força produtiva, de forma que alguns fatores determinantes devem ser considerados: grau médio de destreza do trabalhador, condições naturais, volume e eficácia dos meios de produção, organização social do processo produtivo e grau do progresso técnico-científico. Através de tais relações, Marx estabelece as razões existentes entre força produtiva, tempo de trabalho e valor. À título de regra geral, quanto maior for a força produtiva do trabalho, menor será o tempo empreendido para produzir, menor será a quantidade de trabalho contida e menor será o valor. Assim como, quanto menor a força produtiva, maior será o tempo gasto e maior será o valor da mercadoria. Finalizando a primeira seção sobre os dois fatores da mercadoria, o autor traz considerações gerais a serem destacadas, são elas: - Elementos que não possuem a sua utilidade mediada pelo trabalho são passíveis de valor de uso, mas não possuem valor (Ex: ar, madeira bruta, campos naturais); - A mercadoria é constituída com finalidade na troca, portanto, algumas coisas produzidas para subsistência, por exemplo, possuem valor de uso, mas não são consideradas mercadorias; - O valor tem relação direta com o objeto de uso, sendo assim, não há valor naquilo que é inútil. Na segunda seção do capítulo, Marx se dedica a elucidação do duplo caráter do trabalho representado nas mercadorias. A partir da categoria da mercadoria enquanto valor de uso e valor, o autor apresenta aspectos do trabalho relativos a esses dois desdobramentos. O aspecto qualitativo surge enquanto trabalho útil, ou seja, a utilidade do trabalho representada através do valor de uso do produto. Nesse sentido, o entendimento do trabalho enquanto valor de uso, revela a compreensão subjetiva da diferenciação das suas finalidades (alfaiataria, tecelagem). Sendo assim, da mesma maneira que há uma diferenciação qualitativa dos valores de uso de duas mercadorias distintas (linho e casaco, por exemplo), também há uma distinção entre o tipo de trabalho que as produzem (alfaiataria e tecelagem, por exemplo). A esfera da diferenciação entre os trabalhos úteis suscita a possibilidade de comparação entre mercadorias durante o processo de troca, tendo em vista que “um valor de uso não se troca pelo mesmo valor de uso” (p.166). A divisão social do trabalho aparece a partir desse conjunto de valores de uso diversificados e, portanto, do conjunto de trabalhos úteis distintos, constituindo a “condição de existência da produção de mercadoria”. O aspecto quantitativo do trabalho, segundo o autor, vai dialogar diretamente com a ideia de valor. Partindo do pressuposto que o trabalho que produz valor tem um caráter abstrato, Marx apresenta a ideia de que a substância do valor das mercadorias está apenas na abstração dos seus aspectos qualitativos específicos e redução das mesmas a uma única qualidade: trabalho humano. Portanto, ao medir a grandeza de valor das mercadorias através da quantidade de trabalho contida no produto, a mensuração é realizada a partir de parâmetros objetivos que abstraem as especificidades do trabalho na medida do tempo necessário para a sua execução. Em certo sentido, o que se retém da análise é que, em termos de valor de uso, questiona-se como o trabalho é feito, o que é esse trabalho; por outro lado, em termos de valor, a questão gira em torno da quantidade de trabalho necessária para a produção da mercadoria. Com o objetivo de compreender a gênese da forma-dinheiro, Marx constrói a terceira seção como pavimentação do caminho a partir do entendimento da forma de valor. Nesse sentido, o autor apresenta a objetividade do valor como a expressão abstrata do trabalho humano, tendo a sua manifestação apenas diante da relação social entre as mercadorias. Forma de valor simples, individual ou ocasional A relação social de valor entre duas mercadorias distintas será chamada pelo autor de expressão mais simples da relação de valor. Ou seja, a forma de valor simples, individual ou ocasional, a título de exemplo, consiste na seguinte relação de troca: x braças de linho = y casaco. Ao considerar essa relação, Marx apresenta que o valor do linho é expresso no valor de uso do casaco; de forma que o linho possui um papel ativo, sob forma de valor relativa, e o casaco um papel passivo, sob a forma de valor equivalente. Embora sejam repartidas entre mercadorias diferentes, essas formas se relacionam entre si através da expressão de valor, assim como também são momentos inseparáveis, mutuamente excludentes, inter-relacionados e que se determinam entre si. A forma de valor relativa Ao tratar sobre relação social entre duas mercadorias, embora possuam qualidades distintas, Marx afirma que só é possível comparar as suas grandezas na medida em que estiverem sob uma mesma unidade. Portanto, na equação x linho = y casaco, as grandezas podem ser comparadas quantitativamente porque compartilham de uma primeira unidade, o valor. Tendo em vista que o valor da mercadoria consiste em uma cristalização de trabalho humano, na relação de equiparação do valor entre duas mercadorias distintas, há,igualmente, uma comparação do trabalho humano contido em cada uma delas. A comparação entre os trabalhos contidos só é possível devido a sua redução a uma segunda unidade, o caráter comum de trabalho humano socialmente necessário aplicado. Ou seja, se falamos na relação entre linho e casaco, os trabalhos de alfaiataria e tecelagem são reduzidos a categoria única de trabalho humano abstrato. Porém, o autor afirma que, ao dizer que, enquanto valor, a mercadoria é trabalho humano cristalizado, a reduzimos a uma ideia, mas não damos uma forma a esse valor que seja diferente da sua forma física. A força de trabalho, apesar de criar valor, não o é per si. Logo, o valor só passa a ser, de fato, quando é incorporado na forma de um objeto, e só é possível expressá-lo como algo com essência material diversa da sua, mas sendo comum a ele e a todas as outras mercadorias. Nesse sentido, a forma objetiva de existência do valor ganha corpo a partir da relação entre duas mercadorias diferentes, ou seja, passa a ser revelada na própria relação que estabelece com outra mercadoria. Sendo assim, a título de exemplo, na relação x de linho = y de casaco, o casaco é considerado como corpo a ser assumido pelo valor do linho, de modo que o valor de uma mercadoria assume a sua forma relativa ao ser expresso pelo valor de uso de outra. Na forma de valor simples, não apenas o aspecto qualitativo é equiparado, como visto anteriormente, mas também uma determinada quantidade de mercadoria e, consequentemente, uma determinada quantidade de trabalho humano. O autor mostra que, mantendo constantes as forças produtivas, a expressão 20 braças de linho valem 1 casaco expõe o fato de que um casaco contém tanta substância de valor quanto 20 braças de linho e que as duas quantidades de mercadoria equivalem a mesma quantidade de tempo de trabalho gasto. No entanto, as forças produtivas não se mantêm sempre constantes, o que influencia diretamente na mudança de tempo de trabalho necessário para a produção. Nesse sentido, a análise de Marx destaca dois cenários principais: - Variação do valor do linho, mantendo o valor do casaco constante: a partir da dobra do tempo de trabalho para produção do linho, o seu valor dobra simultaneamente. Em termos de comparação, 20 braças de linho = 2 casacos. Caso o valor do linho caia pela metade, 20 braças de linho = ½ casaco. - Variação do valor do casaco, mantendo o valor do linho constante: a partir da dobra do tempo de trabalho para a produção do casaco, o seu valor dobra simultaneamente. Em termos de comparação, 20 braças de linho = ½ casaco. Caso o valor do casaco caia pela metade, 20 braças de linho = 2 casacos. A partir da elucidação desses dois cenários principais, Marx deixa explícito a dinâmica de determinação do valor relativo de uma mercadoria x a partir da expressão no valor da mercadoria y. Além disso, fica claro que a mesma variação de grandeza do valor relativo de uma mercadoria pode ter motivações distintas. A forma de valor equivalente A estruturação da forma equivalente é definida por Marx a partir da compreensão de que, quando o valor de uma mercadoria x é expresso no valor de uso de uma mercadoria y, esta última recebe a sua forma de valor equivalente. Permanecendo com o exemplo de z de linho = w de casaco, o autor afirma que a expressão da qualidade de ter valor característica ao linho se dá na medida em que o casaco é diretamente permutável com ele. Sendo assim, “a forma de equivalente de uma mercadoria é a forma de sua permutabilidade direta com outra mercadoria” (p.183). Entretanto, a consideração do casaco como equivalente o linho não informa por si só a proporção em que os dois são permutáveis. Para tal determinação, é necessário que a grandeza de valor dos casacos seja exposta, tendo em vista que a grandeza de valor do linho já é dada. A grandeza de valor das mercadorias não depende diretamente da sua forma de valor, ou seja, sendo o linho expresso como forma equivalente e o casaco como forma relativa e vice-versa, a grandeza de valor permanece porque é determinada pelo tempo de trabalho necessário à produção, não pela forma. Todavia, ao assumir a posição de forma equivalente na relação de valor, a grandeza de valor da mercadoria não obtém mais a sua expressão como grandeza de valor – tendo em vista que constitui uma característica da posição da forma relativa -, mas figura como quantidade determinada de uma coisa. Na expressão 40 braças de linho valem 2 casacos, o papel do objeto de forma equivalente (casaco) é informar a grandeza de valor do linho, nunca a sua própria grandeza. Para o autor, a forma equivalente possui três características fundamentais. A primeira delas diz respeito ao caso do valor de uso se tornar a forma de manifestação do seu contrário, o valor. Nesse sentido, quando a mercadoria assume a forma de equivalente (casaco), o seu valor expressa um caráter quantitativo, ou seja, o corpo da mercadoria assume a forma de valor. Assim, ao expressar o valor do linho, o casaco representa um elemento de valor comum aos dois. A transformação da forma natural da mercadoria x (equivalente) em forma de valor só ocorre no interior do confronto entre duas mercadorias, alerta Marx. A segunda das características diz respeito ao caso do trabalho concreto se tornar a forma de manifestação do seu contrário, o trabalho humano abstrato. A constituição corpórea da mercadoria que funciona como forma equivalente na equação é produto do trabalho humano concreto e incorporação do trabalho humano abstrato. Ao confrontar a tecelagem com a alfaiataria, no objetivo de expressar a criação de valor do linho, é necessário que os trabalhos concretos específicos sejam reduzidos a uma unidade comum de comparação, o trabalho humano abstrato. A última das características diz respeito ao caso do trabalho privado se tornar a forma de manifestação do seu contrário, o trabalho em forma social imediata. A partir do momento em que o trabalho concreto, ao constituir na relação de valor uma expressão de trabalho humano indiferenciado, ele assume a forma de igualdade com outro trabalho e, assim, “se apresenta num produto que pode ser diretamente trocado por outra mercadoria” (p.188). O conjunto da forma de valor simples Em termos de análise conjunta, Marx resume que a qualidade de uma mercadoria x é expressa por meio da permutabilidade da mercadoria y com ela, já o seu teor quantitativo é expresso por meio da permutabilidade de uma determinada quantidade da mercadoria y por uma determinada quantidade da mercadoria x. A demarcação mais precisa dessa análise é delimitada pelo autor a partir da distinção da mercadoria enquanto valor de uso e valor, de forma que o valor de troca apenas surge como manifestação do valor durante as relações de troca entre mercadorias distintas, nunca de forma isolada. Na relação entre duas mercadorias, aquela cujo valor deseja ser expresso (x) é considerada exclusivamente valor de uso, enquanto aquela onde o valor é expresso (y), de fato, é considerada exclusivamente valor de troca. Como foi visto, a expressão simples das relações de troca demonstra quantificações individuais, onde a forma de equivalente de uma determinada mercadoria corresponde à forma relativa de outra, na medida em que a equivalência não traduz a igualdade qualitativa e a proporção quantitativa com todas as outras mercadorias. Nesse sentido, a forma de valor simples surge como configuração embrionária até alcançar o desenvolvimento de uma forma mais complexa e geral, a forma-preço. Forma de valor total ou desdobrada Além da forma simples de expressão do valor da mercadoria, a mesma pode ser representada em confronto com o mundo das mercadorias, ou seja, a relação de cada mercadoria com inúmeras outras (20 braças de linho = 1 casaco, ou = 1 quarter de trigo, ou = ½ toneladade ferro). Isso, de acordo com Marx, é chamado de forma de valor total ou desdobrada. A relação com diversas mercadorias faz com que a forma de valor total expresse verdadeiramente o trabalho humano abstrato, independente da especificidade e do valor de uso de cada uma. Se na forma simples há o lugar da forma de valor relativa na expressão, na forma total existe o valor relativo e desdobrado, que nada mais é do que a soma das expressões daquelas. A mercadoria na qual é expressa o valor do produto, segundo o autor, é chamada de forma equivalente particular. No entanto, a infinidade de formas equivalentes faz com que, ao acréscimo de cada nova mercadoria à relação de valor, a expressão de troca se mostra sempre desconexa e ilimitada, de maneira que as formas equivalentes sempre sejam mutuamente excludentes. No processo de progressão da complexidade da análise, Marx destaca que a troca de uma determinada mercadoria (x) por diversas outras faz com que o seu valor, consequentemente, seja expresso em uma série de outras mercadorias distintas. A reprodução desse comportamento de troca por uma mercadoria x determina a expressão de valor de distintas mercadorias em uma só, ou seja, a construção de um padrão universal de valor. Forma de valor universal A partir de então, a expressão do valor das mercadorias se dá de forma simples, unitária – por meio de uma única mercadoria – e comum a todas as demais, ou seja, os valores de todas as mercadorias são refletidos mediante a sua igualdade com um parâmetro específico. Em termo de relação de troca, o elemento em comum entre todas as mercadorias passa a ser o fato de que, enquanto iguais a uma mercadoria x, o valor de cada uma não é mais apenas distinto do seu valor de uso, mas de qualquer outro valor de uso. De acordo com Marx, ao utilizarem o mesmo equivalente como termo de expressão de valor, as mercadorias tornam-se qualitativamente iguais e quantitativamente comparáveis entre si. Diferente da forma de valor total ou desdobrada, aqui elas contêm, dentro do mundo das mercadorias, uma conexão firmada em um padrão universal, como, por exemplo: “10 libras de chá = 20 braças de linho, e 40 libras de café = 20 braças de linho. Portanto, 10 libras de chá = 40 libras de café” (p.198). Ainda, o autor apresenta que, na medida em que uma mercadoria y toma a forma de equivalente universal, ela é excluída da sua qualidade de equivalente particular para todas as demais. A partir dessa exclusão, ela passa a ganhar a forma de mercadoria-dinheiro, sendo a sua função social específica desempenhar o papel social de equivalente universal das relações de troca. Se nos exemplos do autor, esse papel coube ao linho, historicamente, o ouro conquistou esse lugar privilegiado de equivalente universal. A expressão do valor relativo de uma mercadoria z na mercadoria-dinheiro vai determinar a forma- preço. O caráter fetichista da mercadoria e seu segredo Contrariando o primeiro olhar de que a mercadoria aparece como uma categoria de simples análise e através da recuperação de alguns conceitos trabalhados ao longo do primeiro capítulo do Capital, Marx procura demonstrar que, para além de ser apenas valor de uso, há um caráter misterioso na forma- mercadoria. A compreensão da determinação do valor da mercadoria por meio do tempo de trabalho abstrato aplicado à sua produção reflete, no campo das relações de troca, expressões implícitas de igualdades entre os diferentes trabalhos concretos. Portanto, segundo o autor, a misticidade por trás da mercadoria tem profunda relação com o elemento do trabalho humano contido em cada uma delas. Essa análise do autor se desdobra sob a categoria chamada fetichismo das mercadorias, que nada mais é do que a dissimulação das relações sociais entre os homens em relações entre as coisas, ou seja, por meio da redução a ordem valor, a relação entre os trabalhos individuais dos produtores e o seu conjunto ficam implícitas ou a margem dos processos de trocas mercantis. Porém, Marx afirma que, por mais que exista essa abstração de trabalho útil específico à trabalho comum humano no processo de expressões dos valores de troca, isso constitui um processo que os homens realizam sem o saber. De acordo com o autor, o processo de produção domina os homens e, portanto, só a libertação desse processo de produção e do misticismo por trás dos seus produtos só é possível a partir da quebra das amarras e constituição de homens livremente socializados e com controle consciente das estruturas produtivas.
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