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PROBLEMAS NO ESTADO CONTEMPORÂNEO 1 INTRODUÇÃO Tendo como base o livro de Dalmo de Abreu Dallari, “Elementos de Teoria Geral do Estado”, tem-se como objetivo aprofundar-se nos problemas contemporâneos do Estado, seguindo o curso de pensamento do autor, mas buscando também mais informações para contribuir com o conhecimento, e para um melhor entendimento da sociedade atual. O capítulo abordado nesta produção trata acerca dos Problemas do Estado Contemporâneo, sendo eles divididos em: O Estado na Ordem Internacional, O Estado Liberal, Estado Socialista e Capitalismo de Estado e Ideia Atual de Estado Democrático. Sendo assim, ao longo do texto, os temas serão esmiuçados, visando a sua compreensão. Primeiramente, é necessário definir o conceito de Estado Contemporâneo, entretanto, essa não é uma questão simples, visto que abrange inúmeros problemas a serem analisados nesse trabalho. Uma abordagem que se revela particularmente útil na investigação referente aos problemas subjacentes ao desenvolvimento do estado contemporâneo é a da análise da difícil coexistência das formas do estado de direito com os conteúdos do estado social. Os direitos fundamentais são identificados como: liberdade pessoal, política e econômica, ou seja, os bens tutelados na sociedade burguesa. Dessa forma, eles constituem um obstáculo contra a intervenção do estado. Os direitos sociais, ao contrário, representam direitos de participação no poder político e na distribuição da riqueza social produzida. Se os direitos fundamentais são a garantia de uma sociedade burguesa separada do estado, os direitos sociais, em vez disso, representam a via por onde a sociedade entra no estado, modificando-lhe a estrutura formal. A mudança fundamental consistiu, a partir da segunda metade do século XIX, na gradual integração do estado político com a sociedade civil, que acabou por alterar a forma jurídica do estado, os processos de legitimação e a estrutura da administração. Atualmente, Estado e sociedade podem ser entendidos como dois sistemas fortemente inter-relacionados entre si através de relações complexas, fazendo parte de um macro-sistema que embora não limite a respectiva autonomia, os submete a fins específicos, sendo que ambos operam para a coexistência pacífica e sobrevivência de ambas as instituições. Uma forma de conceituar O estado contemporâneo é ditando a sua função eminente, sendo essa social, podendo também ser chamado de Estado das Prestações. O estado tem como função precípua zelar pelo bem estar social e destina parte do produto nacional bruto para tal. Na função social do estado, inclui- se também a prestação de serviços que o cidadão como indivíduo pode não considerar como sendo prioritários, como a defesa nacional. Porém, ao zelar pelo bem estar social, cabe ao estado zelar pela segurança nacional do território. 2 O ESTADO NA ORDEM INTERNACIONAL Para o jurista, o Estado é uma pessoa jurídica de direito público internacional a qual precisa comprovar sua soberania. O exigido é que a sociedade política possa assegurar o máximo de eficácia para seu ordenamento jurídico, e que tal fator ocorra de maneira permanente. O que distingue o Estado de outras pessoas jurídicas de direito internacional é a circunstância de que somente ele possui soberania. Do ponto de vista interno, o Estado é uma afirmação de poder superior, já de uma ótica externa, é uma afirmação de independência, significando a inexistência de uma ordem jurídica dotada de maior grau de eficácia. A regulação jurídica é conduzida de forma imperfeita, visto que se exige a comprovação de um dado jurídico, no caso, a soberania do ordenamento jurídico, o qual fica sujeito a circunstâncias vagas, já que não se tem questionamento dos motivos sobre o ordenamento jurídico ser soberano ou não. De acordo com a obra de Dallari, os Estados vivem em situação de anarquia, posto que apesar de existir uma ordem jurídica onde todos se integram, não há um órgão superior ao qual todos se submetem. No século XVI, por meio de argumentos políticos-teológicos, as grandes potências nacionais justificaram suas ações expansionistas, explicando a dominação de territórios e selvagens. Com o passar do tempo, os fundamentos se modificaram, contudo, os métodos de conquista, não. Isso é notado principalmente durante o final do séc. XIX e inicio do séc. XX, acarretando na corrida imperialista, a qual levou ao início da I Guerra Mundial em 1914. Após a I Guerra Mundial, houve a primeira tentativa de constituição de uma organização mundial de Estados, a qual falasse por todos, e transpusesse as barreiras entre eles. Essa organização foi chamada de Sociedade das Nações (2.1). Tal medida fracassou, e logo depois, então, deu-se inicio à II Guerra Mundial. Após as tensões do período de guerras e do período pós-guerra, se iniciaram inúmeras organizações internacionais de Estados, sendo essas, classificadas em três espécies características, que são: Organizações para fins específicos: podem agrupar Estados de uma e/ou varias regiões tendo como característica um objetivo limitado a um assunto. Organizações regionais de fins amplos: agrupamento de Estados de determinada região do mundo. Suas competências não se limitam a assuntos econômicos, militares ou políticos, e sim de assuntos os quais sejam de interesse do Estado, de uma maneira geral. Organizações de vocação universal: visa reunir todos os Estados do mundo e tratar de todos os assuntos que possam interessa-los. São um fenômeno recente, sendo que seus exemplos mais conhecidos são a Sociedade das Nações e a Organização das Nações Unidas (ONU). 2.1 A SOCIEDADE DAS NAÇÕES Também conhecida como Liga das Nações, surgiu após o termino da I Guerra Mundial com o então presidente dos EUA, Woodrow Wilson, tendo como proposta a criação de uma organização de Estados, havendo, dessa forma, uma cooperação mútua que visasse a manutenção da paz mundial. Entretanto, devido ao imenso desinteresse das potências mundiais, a importância da entidade foi diminuída, e ao inicio da II Guerra Mundial sua existência era apenas nominal, tendo sua extinção oficializada em 1946 em Genebra. 2.2 A ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS A Organização das Nações Unidas foi a segunda organização de vocação universal a ser criada. Ela teve como pilares a crença de que uma entidade desse porte poderia garantir a paz, e evitar os erros que culminaram no fracasso da Sociedade das Nações, sendo que, para isso, não manteve nenhuma relação com essa. Sua criação aconteceu em fevereiro de 1945 logo após o termino da II Guerra Mundial, liderada pelos representantes políticos dos países vencedores da guerra. Logo de início tratou de questões mundiais relacionadas ao pós-guerra, e declarou que, em 25 de Abril de 1945 haveria uma conferência da organização, a ser realizada nos EUA. Eram consideradas Nações Unidas àqueles países que fossem reconhecidos como tais, e que houvessem declarado guerra ao inimigo comum, este último "requisito" sendo "válido" somente até 1 de Março de 1945. Neste mesmo encontro, ainda, ficou decidido que a organização teria um Conselho de Segurança, o qual seria composto por membros permanentes e rotativos. Sua aceitação entre os Estados foi tanta que, logo deinício 10 nações declararam guerra aos países do Eixo, visando assegurar seus lugares na organização. Em 26 de Junho de 1945 foi redigida em cinco idiomas, considerados oficiais, a Carta das Nações, a qual foi ratificada pelo Senado norte-americano dois meses mais tarde. 2.2.1 Sobre a ONU A ONU é uma pessoa jurídica de direito internacional público, a qual tem seus alicerces e objetivos previstos no seu instrumento de constituição, a Carta das Nações. É reconhecida por ser uma confederação de Estados, sendo sua Carta o tratado que celebrou sua criação. Entretanto, cada membro manteve sua soberania, decidindo quando sair da entidade, sendo que essa está aberta para a entrada de novos membros. Tem como propósitos: Manter a paz e a segurança internacional. Desenvolver relações amistosas entre os Estados, respeitando os princípios de igualdade de direitos e autodeterminação dos povos. Obter a cooperação internacional para resolver os problemas internacionais, e promover o respeito aos direitos humanos e às liberdades fundamentais do individuo. Ser um centro destinado a harmonizar a ação dos Estados para a consecução dos objetivos comuns. Ela possui uma Assembleia Geral, constituída pelos membros da organização, na qual cada um tem direito a um voto, tendo atuação em absoluta igualdade. Tal assembleia tem como função discutir qualquer assunto contido nas finalidades enunciadas na Carta. Suas reuniões acontecem uma vez ao ano, com duração de dois a três meses, iniciando-se sempre na terceira terça-feira do mês de Setembro. Também existe um Conselho de Segurança, formado por quinze membros, dos quais cinco são permanentes (Estados Unidos da América, Rússia, Inglaterra, França e China) e membros temporários que são eleitos pela Assembleia Geral para um período de dois anos, impossibilitando a reeleição para um período imediato. Suas atribuições se focam na manutenção da paz e segurança internacional. Além disso, apresenta como órgãos complementares o Conselho Econômico e Social, O Conselho de Tutela, A Corte Internacional de Justiça e O Secretariado. 3 O ESTADO LIBERAL O termo liberalismo começou a ser empregado no século XIX. Em resumo, ele designa uma filosofia política que tem como fundamento a defesa da liberdade individual nos campos econômico, político, religioso e intelectual, do direito de propriedade privada e da supremacia do indivíduo contra as ingerências e atitudes coercitivas do poder estatal. Retornando-se ao início do Estado moderno, sabe-se que a sua forma era a absolutista, na qual o monarca comandava o Estado, sem restrições, podendo ser considerado “O Estado”. Desse modo, a vida das pessoas sofria forte intervenção estatal, não somente no âmbito econômico, mas também no religioso, familiar e social. Ao longo do tempo, a classe burguesa conseguiu superar a nobreza. Essa nova classe que progrediu tem como pilar o jusnaturalismo, ou seja, acredita nos direitos naturais e esforça-se para defendê-los. O principal direito natural salvaguardado pela burguesia é o direito à propriedade. Isso posto, observa-se que quando a burguesia alcança o poder, ela se caracteriza como o Estado-polícia, tendo como função a fiscalização da ordem na sociedade, deixando de intervir, como no modelo absolutista. Sendo assim, pode-se caracterizar esse estado como Estado mínimo. Porém, a crítica argumenta que a ascensão da burguesia ao poder político não significou estado mínimo, mas sim o aparelhamento do estado e o início de uma plutocracia. Alegando que era um estado bem menos intervencionista para os padrões de hoje, mas mesmo assim não era o ideal do verdadeiro "Estado Mínimo". Visto que, foi uma época marcada por arbitrariedades em relação à demarcação de propriedades - as terras já eram demarcadas antes mesmo de haver ocupação, em contrário às ideias de Locke -, a escravidão ainda era legal, protecionismo comercial, e até a declaração de monopólios estatais em alguns setores - como o dos correios nos EUA. Portanto, nota-se que o estado ainda garantia privilégios de uma classe dominante, atendia aos interesses de uma burguesia que não queria agradar ao consumidor para obter lucro, mas sim usar o aparato coercitivo do estado para alcançar seus objetivos. Decorrido o tempo, no século XVIII, Adam Smith, conhecido como o pai do liberalismo, concebe a sua teoria. Nela, ele reprova qualquer intervenção do Estado, acreditando em uma ordem natural, também chamada de mão invisível, tendo essa, a competência de manter a harmonia espontânea de interesses. Seguindo um viés político, o liberalismo como doutrina, é garantido por Stuart Mill, no século XIX. Adepto do pensamento jusnaturalista, ele crê que os homens têm virtudes naturais, e dessa forma, respeitam-se mutuamente, devendo haver, então, um livre exercício de espontaneidade individual. Analisando as propostas de Mill, tem-se três principais defesas do liberalismo, e claramente, críticas ao intervencionismo. Primeiramente, ele alega que o negócio a ser realizado cabe à capacidade dos envolvidos de resolver as questões de seu interesse, não havendo, portanto, a necessidade do Estado participar. Em seguida, Mill menciona que mesmo que os indivíduos não cumpram a incumbência com tanto esmero como o governo seria capaz, é necessário que o façam, para poder aprender com os erros. E, especialmente, que quanto mais controle o Estado acumula, mais influência ele exerce, tornando-se um órgão ambicioso e sedento pelo poder. Com o intuito de esclarecer e classificar a liberdade, Isaiah Berlin - estimado professor da Universidade de Oxford - fez a seguinte divisão: a positiva e a negativa. Basicamente, a liberdade positiva é aquela de poder fazer o que quiser; ou seja, tanto a capacidade (ou possibilidade) de fazer algo, quanto ao realizar qualquer idiossincrasia. Essa liberdade tem de ser limitada, pois sua prática leva ao caos e a supressão de toda liberdade. A negativa, por sua vez, significa a liberdade de não ser oprimido, e é expressada pela máxima "Eu não lhe obrigo a fazer o que não queres, e você não me obriga a fazer o que eu não quero". Essa é a única liberdade possível e aceitável na vida em sociedade. Essa leva à paz e à ordem, a outra ao caos e à escravidão. A princípio o Estado liberal concedeu diversos benefícios à sociedade, como o avanço econômico, a valorização do individuo e o despertar da consciência para a relevância da liberdade humana. Entretanto, com a sua implantação efetiva, houve a percepção dos seus defeitos. Um deles é o extrema reconhecimento do indivíduo, o que alcançou o ultra-individualismo, negando a coletividade e adotando um comportamento egoísta. Sob a justificativa de garantir a liberdade, o que ocorreu foi a regalia assentada aos mais fortes economicamente. Consequente a isso, Dallari afirma que, naquela sociedade, homens medíocres e sem formação humanística, apenas interessados em aumentar suas riquezas, eram os que detinham o controle da sociedade. Além disso, afirma que essa situação perpassa daquela em que os interesses econômicos são colocadas em destaque. Outro efeito subsequente ao Estado liberal, é o surgimento da classe proletária. Com isso e com a Revolução Industrial a eclosão de aglomerados humanos. Todavia,a anteriormente liberal burguesia, fez-se, então, conservadora. As condições de vida dos trabalhadores das indústrias, as injustiças sociais e a desigualdade levaram aos movimentos socialistas em meados do século XX. É possível identificar o declínio no liberalismo em um acontecimento. A quebra da bolsa de Nova Iorque, em 1929, representa a ruína do sistema anterior, declarando que esse não funcionava perfeitamente. Após o Crash, houve uma ação, desenvolvida por Keynes, onde faziam com que a população trabalhasse em construções de praças e outros bens públicos, ganhasse um salário, mesmo que pouco, e assim compravam os produtos. Fazendo a economia girar novamente. Provou-se, assim, que há a necessidade de que o Estado seja um regulador econômico, analise de forma macroeconômica e identifique onde precisa de ajustes. Um exemplo claro seria na Inflação, que é gerado quando há um consumo maior que a oferta, gerando aumento nos preços. Logo, o Governo intervém buscando, através de aumento de impostos, a diminuição do consumo. Em 1932, o presidente dos Estados Unidos, Franklin Roosevelt, instaura o chamado New Deal, uma política intervencionista que visava concertar a situação econômica. Nessa mesma época, Walter Lippmann – adversário do New Deal – admite que a política aplicada por Roosevelt surtiu o efeito desejado. Contudo, ele crê que o que é realmente necessário é uma nova definição de liberalismo, onde haja um equilíbrio entre o governo anterior e o desenvolvido no período de suas ideias. Sendo assim, ele recria o conceito: “o Estado liberal há de ser concebido como protetor de direitos iguais, dispensando a justiça entre os indivíduos. Procura proteger os homens contra a arbitrariedade, e não dirigi-los arbitrariamente.” Destarte, vê-se que o liberalismo mais atual não é simplesmente uma “mão invisível” e não intervencionista. Nos períodos das Guerras Mundiais as políticas intervencionistas atuavam em todas as áreas, haja vista as situações de emergências que ocorrem devido a conflitos desse porte. Não obstante, no pós-guerra as intervenções obtiveram maior controle sobre os indivíduos, visto que havia a necessidade de restauração e reconstrução. Atualmente, é concebível a criação de pensamentos em que colocam o Estado como ativo – mas não como limitador da liberdade -, o qual age lado a lado com grandes empresas, sendo o financiador de muitas delas. Portanto, considerando a evolução histórica e social da intervenção do estado na sociedade, é possível notar a moderação e o comedimento em que ele é tratado no presente. 4. ESTADO SOCIALISTA E O CAPITALISMO DE ESTADO Os pensadores progressistas começaram a ver que as teorias que pregavam a substituição do sistema de produção feudal por uma nova ordem estabelecendo o poder da burguesia, não estavam condizendo com o desenvolvimento progressista da sociedade, e este, ia se tornando cada vez mais forte e opressor. A mudança de mentalidade trazida com a ascensão da burguesia fez com que o Estado se tornasse mínimo, cuja única função seria garantir, tão somente, a segurança e ordem, e nada além disso. O grande problema era que a liberdade, tão defendida pelos burgueses, não atingiu a totalidade da sociedade, já que o proletariado não tinha outra escolha a não ser vender a sua força de trabalho a qualquer preço e sofrer com péssimas condições de vida que eram submetidos. A figura do Estado se tornou cada vez mais prejudicial para a classe proletária, pois o Estado era mantenedor dessa ordem. O proletário via no Estado controlado pela burguesia um grande inimigo a ser combatido e/ou destruído, o que motivou os movimentos da classe, que pleiteavam a redistribuição de riquezas e instauração de uma ordem social “justa”, onde os indivíduos recebessem por aquilo que trabalhassem. Foi nesse sentido que A Liga dos Comunistas, em um Congresso secreto em Londres durante novembro de 1846, reuniu Marx e Engels e determinou que eles seriam os responsáveis pela elaboração do Manifesto Comunista. Ali estariam teorizados uma espécie de organização que orientassem o movimento, tais como a explicitação de que os trabalhadores se unissem contra a burguesia. Engels afirmou, posteriormente, que jamais sustentaram a ideia de um Estado destruído de um momento para outro, mas que ele deveria se extinguir aos poucos, tornando-se desnecessário até que fosse completamente desprovido de função política. Marx e Engels, então, passaram a liderar uma corrente socialista científica, diferente da utópica proposta até então. O primeiro Estado socialista surgiu em 1918, e a partir de 1924 passou a ser nominado União das Repúblicas Socialistas Soviéticas. Sua criação só foi possível devido a um longo processo, iniciado com a Comuna de Paris e finalizado com os ideais de Lenin, que publicou “O Estado e a Revolução” logo após a tomada fulminante do poder pelos socialistas, em 1917. Os ideais socialistas se contrapunham com os da economia presente no poderio burguês, e prezava pelos que possuíam poder de trabalho e por isso criava uma organização que impedisse a acumulação de riqueza em mãos de particulares e a exploração de trabalho assalariado. Isso – o poder ditatorial do proletariado – não significava, entretanto, que fosse uma organização antidemocrática. Aliás, acreditava-se então que só poderia ser democrático quando o proletário, que era a classe mais numerosa em qualquer Estado, tivesse poder político e que esse poder deveria ser exercido contra seus exploradores. Em 1961 o Estado soviético se transformou em Estado de todo o povo (anteriormente ditadura do proletariado), visto que àquela altura todo o povo era trabalhador e ninguém mais vivia da exploração do trabalho alheio – já que ninguém poderia usar de empregados para auferir renda. O controle de liberdade desta época era considerado justo e democrático, também, porque é exercida pela maioria, e desta forma utiliza o Estado a seu serviço. A distribuição dos meios de produção é também mais conveniente, sendo que abrange os interesses da maioria e não de um pequeno número de proprietários. Após a Segunda Guerra Mundial surgiram na Europa oriental as democracias populares, que nada mais eram do que derivações do sistema soviético. De acordo com a obra de Dallari, os principais motivos desse surgimento foram: a) A atitude das elites políticas tradicionais, quando a Alemanha invadiu os Estados da Europa oriental. Verificando-se o comportamento das antigas lideranças partidárias em face da presença dos exércitos nazistas, encontramos três espécies de reação: um primeiro grupo, valendo-se de suas condições gerais mais favoráveis, conseguiu fugir para outras partes do mundo; outro grupo, levado por uma série de circunstâncias, permaneceu mas omitiu-se, passando a cuidar, pura e simplesmente, de seus interesses particulares, não tomando qualquer atitude contra os invasores; um terceiro grupo, ou por motivos egoístas ou, em raros casos, acreditando poder atenuar os males, aderiu aos invasores, passando a colaborar com os alemães. Enquanto as elites tradicionais adotavam esses comportamentos, outros militantes políticos, geralmente integrantes dos "partidos populares", e queantes da guerra não participavam do governo, passaram a lutar contra os invasores, integrados nos movimentos subterrâneos de resistência. b) A segunda causa foi o aparecimento dos soviéticos nesses Estados como libertadores. Foi com as tropas soviéticas que os movimentos de resistência se coordenaram para expulsar os invasores alemães, e foi graças a elas, efetivamente, que se conseguiu a expulsão, o que contribuiu fortemente para criar um ambiente favorável aos soviéticos, independente de tendências políticas. c) Como terceira causa podem-se indicar os acordos de Yalta e Potsdam, celebrados entre as grandes potências aliadas, Estados Unidos, União Soviética e Grã-Bretanha, estabelecendo que à medida que os alemães fossem sendo expulsos de cada território, a potência que tivesse efetuado a libertação passaria a ter controle total sobre a área libertada. A partir de 1949 outros Estados socialistas foram sendo criados e até mesmo a África sofreu o impacto do socialismo, apesar de ser de forma diferente da existente no continente Europeu. Há também uma grande variedade entre os próprios Estados africanos, tornando assim as diferenças ainda mais acentuadas. Uma crise se gerou com a imposição de um controle rígido sobre o povo, dentro da União Soviética, além das despesas militares necessárias para combater com os Estados Unidos da América e gastos exigidos para manter os Estado da Europa Oriental submissos. Mikhail Gosbachev, então presidente da União Soviética, implantou uma política interna de reestruturação (a chamada “perestroika”) que fez com que cessassem as restrições sobre os meios de comunicação e fossem admitidos os movimentos políticos de contestação e denúncia. Além disso, a União Soviética reduziu o apoio econômico aos Estados dependentes e deixou de ameaçar militarmente os mais próximos. Os Estados então abandonaram o modelo soviético e criaram novas Constituições, apesar de manterem-se fiéis ao socialismo em teoria. 5 IDEIA ATUAL DE ESTADO DEMOCRÁTICO Um dos principais motivos de crise do Estado contemporâneo é que o homem do século XX está preso a concepções do século XVIII, quanto à organização e aos objetivos de um Estado Democrático. A necessidade de eliminar o absolutismo dos monarcas, que sufocava a liberdade dos indivíduos, mantinha em situação de privilégio uma nobreza ociosa e negava segurança e estímulo às atividades econômicas, levou a uma concepção individualista da sociedade e do Estado. Procurou-se, então, impor ao Estado, um mecanismo de contenção do poder, destinado a assegurar um mínimo de ação estatal, deixando aos próprios homens a tarefa de promoção de seus interesses. Durante o século XIX a aspiração ao Estado Democrático vai se definindo, até se transformar, já no século XX, num ideal político de toda a humanidade, fazendo com os regimes mais variados e até contraditórios entre si afirmem ser melhores do que os demais por corresponderem mais adequadamente às exigências do Estado Democrático. Ao se analisar as construções doutrinárias as manifestações práticas das características fundamentais do Estado Democrático, vamos encontrar os seguintes pontos de conflito: O problema de supremacia da vontade do povo surge simultaneamente à República do século XVIII em decorrência do problema da representação popular. De início quando os partidos eram dominados por indivíduos pertencentes ao mesmo nível social, não se via tanto problema, mas a partir do momento que os movimentos operários ganham força e começam a ocupar cargos legislativos, há um grande conflito de interesses, onde ocorrem brigas e discussões, o que tornou o processo legislativo lento e tecnicamente imperfeito. E à vista disso tudo, vários autores e muitos líderes concluíram que a falha está no povo, que é incapaz de compreender os problemas do Estado e de escolher bons governantes. Diante disso, um dos impasses do Estado Democrático é que a participação do povo é tida como inconveniente, e a exclusão do povo é obviamente antidemocrática. 5.1 DILEMA ENTRE A SUPREMACIA DA LIBERDADE E DA IGUALDADE Ao se colocar a liberdade como supremacia verificou-se que essa era apenas assegurada para os que detinham o poder econômico. Os que dependiam do próprio trabalho para viver foram ficando cada vez mais distanciados dos poucos que detinham o capital. Surgiu, então, uma corrente doutrinária e política manifestando a convicção de que a liberdade como valor supremo era a causa inevitável da desigualdade. Entendiam, por isso, indispensável um sistema de controle social que assegurasse a igualdade de todos os indivíduos. Chegou-se por essa via a um segundo impasse: ou se daria primazia à liberdade, sabendo de antemão que isso iria gerar desigualdades muitas vezes injustas, ou assegurar a igualdade de todos mediante uma organização rígida e coativa, sacrificando a liberdade. Todavia, ambas as posições seriam contrárias ao ideal de Estado Democrático. 5.2 PROBLEMAS DECORRENTES DA IDENTIFICAÇÃO DO ESTADO DEMOCRÁTICO IDEAL COM DETERMINADA FORMA DE ESTADO E DE GOVERNO A ideia inicial de que era necessário enfraquecer o poder do Estado e a posterior criação de mecanismos de controle contidos na própria organização do Estado levaram à conclusão de que só haveria Estado Democrático onde houvesse esse tipo de organização, mas a experiência demonstrou que a simples existência de um controle formal do poder não assegurava o caráter democrático do Estado. E o que tornou mais grave foi que essa forma, aceita como um pressuposto de que o Estado era democrático, passou a ser utilizada para ocultar o totalitarismo, que se vestia com a capa do Estado Democrático. O 3º impasse: manter o Estado Democrático preso a uma forma, sabendo que isso poderia servir como um disfarce muito conveniente para a ditadura ou eliminar a exigência de determinada forma, abolindo com isso o controle e favorecendo a concentração do poder e sua utilização arbitrária. Tudo isso gerou a crise do Estado Democrático, levando os mais pessimistas à conclusão de que a democracia é utópica, porque na prática encontra obstáculos intransponíveis, emaranhando-se em conflitos insuperáveis. O povo, julgado incapaz de uma participação consciente, deveria ser afastado das decisões, ficando estas a cargo de indivíduos mais preparados, capazes de escolher racionalmente o que mais convém ao povo. A liberdade considerada um mal, porque é fonte de abusos, devendo portanto ser restringida, não poderia ser aceita, pois os governantes, que sabem mais do que o povo e trabalham para governantes, que sabem mais do que o povo e trabalham para ele, devem gozar de todos os privilégios, como reconhecimento por seus méritos e sua dedicação. Mas, evidentemente, a aceitação desses argumentos representa a rejeição da democracia e a aceitação da ditadura; na verdade, só o excesso de pessimismo ou oportunismo político é que se satisfazem com a conclusão de que o Estado Democrático é uma impossibilidade. É inegável que há dificuldades a superar e que a experiência não tem sido muito animadora. Mas o Estado Democrático é um ideal possível de ser atingido, desde que seus valores e sua organização sejam concebidos adequadamente. Para atingi- lo, é imprescindível que sejam atendidos os seguintes pressupostos: Eliminaçãoda rigidez formal: afirma que a ideia de Estado Democrático é essencialmente contrária a exigência de uma forma preestabelecida. Tanto uma estrutura capitalista quanto uma socialista podem ser democráticas ou totalitárias. Para que um Estado seja democrático precisa atender à concepção dos valores fundamentais de certo povo numa época determinada. Como essas concepções são extremamente variáveis de povo para povo, de época para época, é evidente que o Estado deve ser flexível. Isso já demonstra que, embora a ideia de Estado Democrático seja universal quanto os elementos substanciais, não é possível a fixação de uma forma de democracia válida para todos os tempos e todos os lugares. Supremacia da vontade do povo: é um dos elementos substanciais da democracia. Quando o governo faz com que sua vontade se coloque acima de qualquer outra, não existe democracia. Democracia implica autogoverno, e exige que os próprios governados decidam sobre as diretrizes políticas fundamentais do Estado. O argumento de que o povo é incapaz de uma decisão inteligente não pode ser aceito, porque contém o pressuposto de que alguém está decidindo se a orientação preferida pelo povo é boa ou não. Caso não havendo possibilidade de um acordo total quanto às diretrizes políticas não há razão para que prevaleça a opinião de um ou de outro grupo, devendo ponderar a vontade do povo. Para se obter esta vontade autêntica é necessário atender a certos requisitos: em primeiro lugar essa vontade deve ser livremente formada, assegurando-se a mais ampla divulgação de todas as ideias e o debate sem qualquer restrição, para que os membros do povo escolham entre múltiplas opções. Em 2º lugar a vontade do povo pode ser livremente externada, a salvo de coação ou vício de qualquer espécie. É indispensável que o Estado assegure a livre expressão e que os mecanismo de aferição da vontade popular não deem margem à influência de fatores criados artificialmente. Como todo homem é considerado um ser racional, dotado de inteligência e de vontade, sendo todos igualmente capazes de proferir, verificar-se que é inerente à convivência humana o direito de divergir, e que a todos os indivíduos dever assegurado esse direito. A preservação da liberdade: se todos os homens se reconhecem como ser social, é evidente que se deve conceber sua liberdade tendo em vista o homem social, o homem situado, que não existe isolado da sociedade. A liberdade humana, portanto, é uma liberdade social, liberdade situada, que deve ser concebida tendo em conta o relacionamento de cada indivíduo com os demais, o que implica deveres e responsabilidades. A preservação da igualdade: a concepção da igualdade como igualdade de possibilidades corrige distorções, pois admite a existência de relativas desigualdades, decorrentes da diferença de mérito individual, aferindo-se este através da contribuição de cada um a sociedade. O que não se admite é a desigualdade no ponto de partida, que assegura tudo a alguns, desde a melhor condição econômica até o melhor preparo intelectual, negando tudo a outros, mantendo os primeiros em situação de privilégio mesmo que sejam socialmente inúteis ou negativos. A igualdade possibilidade não se baseia, portanto, num critério artificial, admitindo realisticamente que há desigualdades entre os homens, mas exigindo que também as desigualdades não decorram de fatores artificiais. O autor conclui que esses são os pressupostos fundamentais do Estado Democrático. Dotando-se o Estado de uma organização flexível, que assegure a permanente supremacia da vontade popular, buscando-se a preservação da igualdade de possibilidades, com liberdade, a democracia deixa de ser um ideal utópico para se converter na expressão concreta de uma ordem social justa. 6 CONSIDERACOES FINAIS A análise de Dalmo de Abreu Dallari sobre o crescimento do Estado até a sua contemporaneidade abrange os mais diversos aspectos da sociedade, bem como explicita os problemas não só atuais, mas que rompem desde o surgimento do Estado social e as dificuldades encontradas para seu estabelecimento, até o ponto de sua derrota na década de 1990. Temas como a liberdade e a democracia são debatidos dessas épocas até agora, nunca encontrando um consenso geral, no entanto. O mais próximo que se chega a esta aceitação aconteceu durante a existência do Estado de todo o povo, gerado a partir do Estado socialista, onde o poder se situava na mão da maioria proletária. Como todo o povo era responsável por seu próprio lucro e sem a exploração para obtenção do lucro, a democracia era mais consistente no que se diz respeito ao fato de que o Estado coordenava a segurança e necessidades do povo, e sendo o povo o Estado, nada mais justo que assim fosse. É pertinente que faça-se essa conexão com a antiguidade, porque apesar dos problemas exclusivos da contemporaneidade, muitos deles existem há muito tempo, como por exemplo a intervenção do soberano, monarca ou do presidente na sociedade – assunto, esse, muito abordado no presente trabalho. Portanto, confere-se que a referida produção acadêmica cumpriu com os seus objetivos, buscando, sempre, adquirir e compartilhar as informações e o entendimento. 7 REFERÊNCIAS DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos da Teoria Geral do Estado. 32 ed. São Paulo, SP: Editora Saraiva, 2013.
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