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Direito Administrativo-José Simões

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JUSTIÇA ADMINISTRATIVA EM TIMOR-LESTE: ACESSO À JUSTIÇA SEGUNDO O DECRETO LEI N.º 32/2008 DE 27 DE AGOSTO SOBRE O PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO
1. Introdução
O princípio do acesso à justiça está consagrado no artigo 9.º do Decreto-Lei N.º 32/2008 de 27 de Agosto sobre o Procedimento Administrativo (DLPA) e, actualmente, é enunciado com a seguinte formulação: 
Aos particulares é garantido o acesso aos tribunais com jurisdição administrativa, a fim de obterem a fiscalização contenciosa dos actos da Administração, bem como para tutela dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos, nos termos previstos na legislação reguladora do contencioso administrativo.[footnoteRef:1] [1: O Decreto Lei N.º 32/2008 de 27 de Agosto sobre o Procedimento Administrativo, artigo 9.º.] 
Assim, esta obra tem por objectivo dar algum esclarecimento acerca do princípio do acesso à justiça segundo o respectivo DLPA.
2. Elementos Conceptuais do Princípio do Acesso à Justiça
O artigo 9.º do DLPA possui seguintes notas ou elementos: a) Particulares; b) Garantia; c) Acesso ao Tribunal; d) Jurisdição Administrativa; e) Fiscalização Contenciosa; f) Actos de Administração; g) direitos legalmente protegidos e Interesses legalmente protegidos; h) legislação reguladora do contencioso administrativo.
Ao analisar bem o princípio do Acesso à Justiça, é necessário compreender os conceitos, proposições e raciocíno lógico-jurídico do artigo 9.º do DLPA.
2.1. Os particulares
	Para entender bem este conceito, é importante compreender bem as posições jurídicas dos particulares perante administração. Estas podem ser as posições jurídicas administrativas de vantagem (favoráveis) ou de desvantagem (desfavoráveis).[footnoteRef:2] [2: ANDRADE José Carlos Viera. Lições de Direito Administrativo. Coimbra Jurídica: Coimbra, 2020. Pág. 71-80.] 
	As posições jurídicas favoráveis podem ser posições jurídicas substantivas que implicam sempre uma intenção normativa de protecção efectiva de um bem jurídico próprio de determinado particular, seja em primeira linha (estamos, então, perante direitos subjectivos), seja em segunda linha, em complemento de um interesse público primacial (é o caso dos interesses legalmente protegidos). 
As posições jurídicas favoráveis podem ser ainda os interesses simples ou de facto representam vantagens genéricas para os administrados, ou então específicas de pessoas determinadas, mas que, encaradas do ponto de vista da norma reguladora, são vantagens ocasionais ou puramente reflexas relativamente ao interesse público — mesmo que se trate de interesses diferenciados cujos titulares gozem, face à lei processual, de legitimidade impugnatória, por se encontrarem numa situação que lhes confira interesse directo e pessoal na anulação de um acto administrativo.
	Enquanto as posições jurídicas desfavoráveis são: 
O primeiro é as sujeições ou «estados de sujeição» constituem posições jurídicas passivas dos particulares, que surgem nas relações jurídicas administrativas em correspondência com direitos potestativos da Administração (por exemplo, em casos de reserva de modo, ou de determinados poderes contratuais), mas que são sobretudo características enquanto posições correspectivas de poderes jurídico-públicos gerais ou especiais, como, por exemplo, o poder de expropriar, o poder policial, o poder tributário, o poder regulamentar ou o poder de direcção sobre funcionários e trabalhadores, utentes ou membros de organizações públicas; 
O segundo é os deveres, em sentido amplo, incluem as obrigações (concretas) dos particulares, decorrentes da lei, de regulamento, de acto (desfavorável ou favorável com encargos modais) ou de contrato administrativo — a que correspondem, em regra, direitos da Administração de exigir a prestação —, mas também os meros deveres (genéricos e, por vezes, inespecíficos), decorrentes das normas jurídicas administrativas.
O terceiro é os ónus jurídicos, em sentido estrito, existem sempre que o titular de um poder ou faculdade tem a necessidade prática de adoptar um certo comportamento, caso pretenda assegurar a produção de um efeito jurídico favorável ou não perder um certo efeito útil já produzido.
2.2. Garantias
Atribuiu-se aos particulares determinados poderes jurídicos que funcionem como protecção contra os abusos e ilegalidades da Administração Pública, é a Garantia dos Particulares.[footnoteRef:3] [3: FREITAS DO AMARAL, Diogo. Curso de Direito Administrativo, Vol. II. Almedina: Coimbra, 2006. Pág. 413-421.] 
As garantias, são os meios criados pela ordem jurídica com a finalidade de evitar ou de sancionar quer a violações do Direito Objectivo, quer as ofensas dos direitos subjectivos e dos interesses legítimos dos particulares, pela Administração Pública.
As garantias são preventivas ou repressivas, conforme se destinem a evitar violações por parte da Administração Pública ou a sancioná-las, isto é, a aplicar sanções em consequência de violações cometidas.
Por sua vez, as garantias são garantias da legalidade ou dos particulares, consoante tenham por objectivo primacial defender a legalidade objectiva contra actos ilegais da Administração, ou defender os direitos legítimos dos particulares contra as actuações da Administração Pública que as violem.
A lei organiza a garantia dos particulares através duma garantia da legalidade – o recurso contencioso contra os actos ilegais da Administração –, que funciona na prática como a mais importante garantia dos direitos e interesses legítimos dos particulares.
As garantias dos particulares, por sua vez, desdobram-se em garantias políticas, garantias graciosas e garantias contenciosas.
2.3. Acesso ao Tribunal
	O acesso ao Tribunal é um dos princípios fundamentais consagrados na Constituição da República Democrática de Timor-Leste (CRDTL). O n.º 1 do artigo 26.º da CRDTL consagra: “A todos é assegurado o acesso aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos”. A norma que acolhe o direito de acesso aos tribunais tem um âmbito rico, devendo aceitar-se que ele inclui diversos direitos fundamentais, tais como, por exemplo, o direito de acesso ao próprio Direito, o direito de acesso a verdadeiros tribunais, o direito à justiça efetiva e o direito ao processo equitativo. Importa, pois, conhecer cada uma destas dimensões garantísticas que este normativo encerra. É certo que, para alcançar certos objetivos, é possível aceitar que o legislador ordinário limite, pontual e criteriosamente, algumas das garantias ínsitas no direito de acesso aos tribunais. De qualquer modo, o direito de acesso aos tribunais há de sempre incluir o direito ao patrocínio judiciário, devendo promover a igualdade dos cidadãos no acesso ao direito e aos tribunais em caso de carência de meios económicos.[footnoteRef:4] [4: VASCONCELOS, Pedro Carlos de Bacelar (Coordenador). Constituição Anotada. Empresa Diário do Minho, Lda: Braga, 2011. Pág. 105.] 
O direito de acesso aos tribunais, a que se refere o n.° 1 do art. 26.° da Lei Fundamental, inclui imediatamente o direito de ação e de acesso a tribunais, impondo-se que estes sejam órgãos independentes e imparciais, o direito a um processo, o direito a decisão que verse sobre o mérito da causa e o direito à execução da decisão, sendo certo que tal direito pressupõe a efetividade do resultado final do processo, postulando a consagração de um sistema adequado de providências cautelares que acautele o efeito útil da ação. De resto, o direito de acesso aos tribunais deve realizar-se em processo temporalmente justo e equitativo. No que respeita especialmente ao processo equitativo, ele deve integrar o direito à igualdade de armas ou direito à igualdade de posições no processo, com proibição de tratamento discriminatório ou arbitrário. Ele corresponde igualmente ao direito de plena defesa e ao direito ao pleno contraditório, no sentido de existir efetiva possibilidade de cada uma das partes invocar as razões de facto e de direito, oferecer provas, controlar as provas da outra parte e pronunciar-se sobre o valor
e resultado dessas provas. O direito ao processo equitativo pressupõe ainda o direito a prazos razoáveis de ação e recurso, no sentido de que a prolação de sentença deve acontecer em prazo razoável, atendendo a determinados parâmetros de medição, como sejam, a complexidade/simplicidade do processo, o comportamento tido pelas partes e pelas autoridades ao longo do desenrolar do processo e à situação jurídica sobre que o mesmo versa.
2.4. Jurisdicção Administrativa
	A jurisdicção administrativa, começou com a separação do poder administrativo e poder judiciário (séparation des autorités administratifs et judiciaires). Na história francesa, foi conhecida como a proibição dos tribunais conhecerem os litígios decorrentes da actividade administrativa, que as leis da Assembleia Constituinte e da Convenção traduziriam em letra de forma.[footnoteRef:5] Pensando na “raison d’être de la juridiction administrative” nos dias de hoje, mas sumariando ao mesmo tempo a essência de todo um trajecto histórico, reconhece René Chapus que a jurisdição administrativa “concrétise une conception de la justice administrative (...) qui procede de la considéraction qu’un juge administratif (...) doit être ce qu’on pourrait appeller un juge-administrateur” , ou seja, “il doit être tel que le jugement de l’administration se situe dans la ligne de l’action administratif et en soit comme un prolonguement ou un complément”. E é esta concepção que, segundo o autor, explica os “liens” existentes entre a jurisdição administrativa e a Administração activa.[footnoteRef:6] [5: ] [6: RANGEL, Paulo Castro. Repensar o Poder Judicial, Fundamentos e Fragmentos. Porto Editória: Porto, 2001, Páginas 201 - 202.] 
Quer dizer, se a separação entre o julgador dos litígios administrativos e o julgador das restantes controvérsias jurídicas fosse vista, pelo legislador da revisão constitucional, como um mero problema de (des)respeito por uma tradição cuja ratio essendi – a ideia de que os litígios entre a Administração e os Particulares devem ser julgados num ambiente administrativo – não mais pudesse valer, dificilmente se justificaria a ultrapassagem do status quo ante de indiferença constitucional quanto ao desenho institucional da justiça Administrativa. Dito de outro modo: o voluntarismo do legislador da revisão constitucional em tema de organização da justiça administrativa constitui um poderoso indício de que à existência de uma jurisdição administrativa subjaz uma ratio essendi actual: a uma tão clara e definitiva tomada de posição do legislador da revisão constitucional a favor da obrigatoriedade da jurisdição administrativa, há-de ter, por certo, subjazido a convicção de que poderosas razões válidas nos dias de hoje tornam aconselhável que os litígios entre a Administração e os particulares sejam confiados a uma organização judiciária autónoma e independente. Deve, pois, existir um qualquer quid responsável pela vontade expressa do legislador da revisão constitucional de 89 no sentido de tornar imperativa a existência de uma jurisdição administrativa, que até essa data o legislador ordinário podia licitamente suprimir.
2.5. Fiscalização Contenciosa
	Esta ideia está ligada as garantias contenciosas no Direito Administrativo. 
As garantias jurisdicionais ou contenciosas, são as garantias que se efectivam através da intervenção dos Tribunais Administrativos.
O conjunto destas garantias corresponde a um dos sentidos possíveis das expressões jurisdição administrativa ou contencioso administrativo.
As garantias contenciosas, representam a forma mais elevada e mais eficaz de defesa dos direitos subjectivos e dos interesses legítimos dos particulares. São as garantias que se efectivam através dos Tribunais.
A nossa lei usa muitas vezes, a expressão “contencioso administrativo”. E usa-a em sentidos muito diferentes: Primeiro, num sentido orgânico, em que o contencioso administrativo aparece como sinónimo de conjunto de Tribunais Administrativos. Os Tribunais são órgãos a quem está confiado o contencioso administrativo; não são eles próprios, o contencioso administrativo. Num sentido funcional, como sinónimo de actividade desenvolvida pelos Tribunais Administrativos. A actividade desenvolvida pelos Tribunais Administrativos não é o contencioso administrativo: essa actividade é uma actividade jurisdicional, é a função jurisdicional. Num sentido instrumental, em que contencioso administrativo aparece como sinónimo de meios processuais que os particulares podem utilizar contra a Administração Pública através dos Tribunais Administrativos. Os meios processuais utilizáveis pelos particulares não são o contencioso administrativo, são aquilo a que se chama os meios contenciosos. E finalmente, a expressão aparece ainda utilizada num sentido normativo, como sinónimo de conjunto de normas jurídicas reguladoras da intervenção dos Tribunais Administrativos ao serviço da garantia dos particulares. O contencioso de normas que regulam esta matéria também não merece o nome de contencioso administrativo: no fundo trata-se apenas de um capítulo do Direito Administrativo, mas não contencioso administrativo. Num sentido material, como sinónimo de matéria da competência dos Tribunais Administrativos. O contencioso administrativo significa, em bom rigor a matéria da competência dos Tribunais Administrativos, ou seja, o conjunto dos litígios entre a Administração Pública e os particulares, que hajam de ser solucionados pelos Tribunais Administrativos e por aplicação do Direito Administrativo.
2.6. Actos Administrativos
Acto Administravo é o acto jurídico unilateral praticado, no exercício do poder administrativo, por um órgão da Administração ou por outra entidade pública ou privada para tal habilitada por lei, e que traduz uma decisão tendente a produzir efeitos jurídicos sobre uma situação individual e concreta. Esta definição doutrinária corresponde, no essencial, á noção legal de "acto administrativo" que actualmente temos no artigo 39.º do Decreto-Lei N.º 32/2008 De 27 de Agosto sobre Procedimento Administrativo (DL-PAT). Diz-se aí que, "Para os efeitos da presente lei, consideram-se actos administrativos as decisões dos órgãos da Administração que ao abrigo de normas de direito público visem produzir efeitos jurídicos numa situação individual e concreta.”
Analisando o conceito doutrinal e legal acima ditos, pode ser identificados os seguintes elementos conceituais: 
O primeiro é o acto administrativo como acto jurídico, ou seja, uma conduta voluntária produtora de efeitos jurídicos.[footnoteRef:7] Este consiste numa declaração de vontade, de desejo, de conhecimento ou de juízo. Por outro lado, e uma vez que o acto administrativo é um acto jurídico em sentido próprio, isso significa que ficam fora do conceito, sob este aspecto: 1) os factos jurídicos involuntários ; 2) as operações materiais, posto que apenas traduzem em factos os efeitos jurídicos determinados por um acto administrativo; 3) as actividades jurídicamente irrelevantes. [7: Opcit., FREITAS AMARAL, Diogo. Pág. 203-249.] 
O Segundo é o acto administrativo como um acto unilateral.[footnoteRef:8] Reporta-se esta característica a uma classificação conhecida dos actos jurídicos em actos unilaterais. Ao dizer que o acto administrativo é unilateral, pretende referir-se que ele é um acto jurídico que provém de um autor cuja declaração é perfeita independentemente do concurso de vontades de outros sujeitos. Nele se manifesta uma vontade da Administração Pública, a qual não necessita da vontade de mais ninguém, e nomeadamente não necessita da vontade de qualquer partivular, para ser feita. Por vezes, a eficácia do acto administrativo depende da aceitação de um partivular interessado, mas essa aceitação funciona apenas como condição de eficácia do acto - não integra o conteúdo do próprio acto, nem é condição da sua existência ou perfeição. [8: Ibid.,] 
O terceiro é o acto administrativo como um exercício do Poder Administrativo Público.[footnoteRef:9] O acto administrativo deve ser praticado no exercício
do poder administrativo (puissance publique). Só são actos praticados no exercício de um poder público, para o desempenho de uma actividade administrativa de gestão pública- só esses é que sãi actos administrativos. Daí resulta, em consequência que: 1) Não são actos administrativos os actos jurídicos praticados pela Administração Pública no desempenho de gestão privada (artigo 2.º n.º 1 do DL-PAT); 2) Também não são actos administrativos, por não traduzirem o exercício do poder administrativo, os actos políticos, os actos legislativos e os actos jurisdicionais, ainda que praticados por órgãos da Administração. [9: Ibid.,] 
O quarto é acto administrativo como um acto praticado por um órgão de Administração Pública.[footnoteRef:10] Este significa que se trata de um acto praticado ou por um órgão da Administração Pública em sentido orgânico ou, por outro lado, por um órgão de uma pessoa colectiva privada, ou por um órgão do Estado de uma pessoa colectiva privada, ou por um órgão do Estado não integrado no poder executivo, por lei habilitados a praticar actos administrativos. Depois, são também administrativos, por força da lei, certos outros actos jurídicos unilaterais que decidem situações individuais e concretas. Daqui resulta, como consequência, que não cabem no conceito de acto administrativo: [10: Ibid.,] 
O quinto é o acto administrativo como acto decisório.[footnoteRef:11] Acto adminitrativo, diz esse preceito legal, é uma decisão proveniente de um órgão administrativo. Há duas interpretações possíveis, à primeira vista, para inclusão da expressão decisão na definição legal de acto administrativo: 1) uma decisão ni sentido de que resolve um caso individual e concreto, em vez de adoptar uma norma geral e abstrata; 2) os que corresponderem a um conceito estrito de decisão, quer dizer a uma estatuição ou determinação sobre uma certa situação jurídica-administrativa [11: Ibid.,] 
O sexto é o acto administrativo como acto produtor dos efeitos jurídicos numa situação individual e concreta.[footnoteRef:12] Este último elemento do conceito de acto administrativo tem em vista estabelecer a distinção entre os actos administrativos, que têm conteúdo individual e concreto, e as normas jurídicas emanadas da Administração Pública, nomeadamente os regulamentos, que têm conteúdo geral e abstracto.O que interessa não é o facto de o acto, em certa altura, estar ou não a produzir efeitos: o que interessa é que ele visa produzir efeitos, ainda que de momento não os esteja a produzir por estar sujeito a uma condição suspensiva, a um termo inicial, etc. Parece pois, mais correcto dizer que o acto administrativo é aquele que visa produzir dados efeitos jurídicos. Se a norma jurídica se define como regra geral e abstracta, o acto administrativo deve definir-se como decisão individual e concreta. As características geral ou individual têm a ver, com os destinatários dos comandos jurídicos; pelo seu lado, as características abstracto ou concreto têm a ver com as situações da vida que os comandos jurídicos visam regular. O Direito é uma ordem normativa que se dirige aos homens e que se destina a ter aplicação prática: por isso, entendemos que a referência, na definição de acto administrativo, à produção de efeitos jurídicos sobre uma situação individual é ainda mais importante e significativa do que a referência ao caso concreto. Ficam, fora do conceito de acto administrativo, quer os actos legislativos emanados dos órgãos de soberania, quer os regulamentos, que são actos normativos praticados pela própria Administração. [12: Ibid.,] 
2.7. Direitos (Subjectivos) e Interesses Legalmente Protegidos
Existem interesses próprios dos particulares, porque esses interesses são protegidos directamente pela lei como interesses individuais, e porque, consequentemente, a lei dá aos respectivos titulares o poder de exigir da Administração o comportamento que lhes é devido, e impõe à Administração a obrigação jurídica de efectuar esse comportamento a favor dos particulares em causa, o que significa que se esses comportamentos não forem efectuados, os particulares dispõem dos meios jurídicos, designadamente dos meios jurisdicionais, necessários à efectiva realização dos seu direitos.
E, o que é um interesse legítimo? Para que exista interesse legítimo é necessário: a) Que exista um interesse próprio de um sujeito de Direito; b) Que a lei proteja directamente um interesse público; c) Que o titular do interesse privado não possa exigir-lhe que não prejudique esse interesse ilegalmente; d) Que a lei, não impondo à Administração que satisfaça o interesse particular, a proíba de realizar o interesse público com ele conexo por forma ilegal; e) E que, em consequência disto, a lei dê ao particular o poder de obter a anulação dos actos pelos quais a Administração tenha prejudicado ilegalmente o interesse privado.
Que vantagens há em que a lei reconheça interesses legítimos, se após o recurso contencioso tudo pode ficar na mesma? As vantagens são duas: quem sofreu ilegalmente um prejuízo tem possibilidade de afastar esse prejuízo ilegal; afastado o prejuízo ilegal, o titular do interesse tem uma nova oportunidade de ver satisfeito o seu interesse.
Trata-se, portanto, de uma situação de vantagem em que os particulares se encontram perante a Administração, mas obviamente inferior, em termos de vantagem, àquela que ocorre no caso do Direito Subjectivo.
Há interesse legítimo, porque a obrigação de respeitar a legalidade que recai sobre a Administração pode ser invocada pelos particulares a seu favor, para remover as ilegalidades que os prejudiquem e para tentar em nova oportunidade a satisfação do seu interesse, na certeza de que, ao tentá-lo, na pior das hipóteses, se esse interesse acabar por ser insatisfeito ou prejudicado, essa insatisfação ou esse prejuízo terão sido impostos legalmente, e não já ilegalmente, como da primeira vez.
Tanto na figura do Direito Subjectivo como na do interesse público legítimo, existe sempre um interesse privado reconhecido e protegido pela lei. Mas a diferença está em que no Direito Subjectivo essa protecção é directa e imediata, de tal modo que o particular tem a faculdade de exigir à Administração Pública um comportamento que satisfaça plenamente o seu interesse privado. Ao passo que no interesse legítimo, porque a protecção legal é meramente indirecta ou reflexa, o particular tem apenas a faculdade de exigir à Administração um comportamento que respeita a legalidade.
No Direito Subjectivo, o que existe verdadeiramente é um direito à satisfação de um direito próprio; no interesse legítimo, o que existe é apenas um direito à legalidade das decisões que versem sobre um interesse próprio.
2.9. Legislação Reguladora do Contencioso Adminsitrativo
	A legislação reguladora do Contencioso Administrativo considera-se como um conceito relevante ao poder legislativo. Neste sentido, as leis podem ser entendidas como todas as disposições genéricas provindas dos órgãos competentes estaduais. Neste sentido, compreende-se que as Leis e os Decretos-Leis reguladores do Contencioso Administrativo. 
3. Enquadramento Legal do Princípio do Acesso à Justiça
O enquadramento legal do Princípio do Acesso à Justiça pode ser visto através de cada um dos elementos doutrinais.
No acesso à justiça os particulares consideram-se como sujeitos. Neste sentido é que o artigo 14.º do DL-PAT estabelece o direito da intervenção dos particulares no procedimento administrativo: Todos os particulares têm o direito de intervir pessoalmente no procedimento administrativo ou de nele se fazer representar ou assistir, incluindo por meio de procurador. Como já tinha sido falado na doutrina, os particulares como sujeitos nas relações jurídicas administrativas estão dependentes de duas coisas: o direito subjectivo e o interesse legalmente protegidos. Neste sentido é que o artigo 15.º do DL-PAT estabelece que “têm legitimidade para iniciar o procedimento administrativo e para intervir nele os titulares de direitos subjectivos ou interesses legalmente
protegidos lesados pela actuação administrativa, bem como as associações que tenham por fim a defesa desses interesses.” Também no início o procedimento administrativo começa por iniciativa da Administração ou a requerimento dos interessados [DL-PAT]. A ideia do requerimento dos interessados, logicamente, entende-se como a extensão dos particulares.
No quadro de garantias, o artigo 28.º da CRDTL prevê que “todos os cidadãos têm o direito de não acatar e de resistir as ordens legais ou que ofendam os seus direitos, liberdade e garantias fundamentais” como uma garantia política dos cidadãos face à Administração. Enquanto o DL-PAT prevê que os particulares têm o direito de solicitar a revogação ou a modificação dos actos administrativos, nos termos regulados no DL-PAT. As garantias disponíveis nesta ideia são reclamação [artigos 71.º até 74.º do DL-PAT], o Recurso Hierárquico [artigos 75 até 83.º do DL-PAT] e o Recurso Tutelar [artigo 84.º do DL-PAT].
No quadro das garantias contenciosas, a República Democrática de Timor-Leste ainda não possui uma Lei que regula sobre o procedimento contencioso específico para os Tribunais Administrativos. Assim o procedimento contencioso ainda utiliza o Código do Processo Civil para proceder quasquer processos contenciosos no quadro de Direito Administrativos. 
4. Conclusão
Para conhecer bem o Princípio do Acesso à Justiça, importa saber os elementos doutrinais e legais relevantes à sua formação conceitual. Assim, esta obra, como no início já foi dito, tenta a explicar os elementos doutrinais e enquadramentos legais do Princípio do Acesso à Justiça do Direito Administrativo Timorense.
	Referências Bibliográficas:
ANDRADE José Carlos Viera. Lições de Direito Administrativo. Coimbra Jurídica: Coimbra, 2020. 
FREITAS DO AMARAL, Diogo. Curso de Direito Administrativo, Vol. II. Almedina: Coimbra, 2006. 
VASCONCELOS, Pedro Carlos de Bacelar (Coordenador). Constituição Anotada. Empresa Diário do Minho, Lda.: Braga 2011.
RANGEL, Paulo Castro. Repensar o Poder Judicial, Fundamentos e Fragmentos. Porto Editória: Porto, 2001.
Legislação:
Constituição da República Democrática de Timor-Leste (CRDTL).
Decreto-Lei N.º 32/2008 de 27 de Agosto sobre o Procedimento Administrativo (DLPA).
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