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Large Labia Project: Resistência e (Auto)Representação Feminina na Internet

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XVII Congresso Brasileiro de Sociologia 
20 a 23 de Julho de 2015, Porto Alegre (RS) 
 
Grupo de Trabalho 26: Sexualidades, corporalidades e transgressões 
 
Título do Trabalho: Large Labia Project por uma abordagem não-sexual da 
vulva: um estudo sobre estratégias de resistência e (auto)representação de 
corpos femininos na Internet 
 
Autores: Marcelle Jacinto da Silva (UFC) 
 Antonio Cristian Saraiva Paiva (UFC) 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Resumo 
Com o interesse em discutir e compreender práticas de resistência 
engendradas por ativismos na Internet que destacam a difícil relação entre 
corpo ideal e corpo real, propomos refletir sobre um projeto chamado Large 
Labia Project, criado por Emma P., cujo objetivo é divulgar vaginas reais, como 
referência para mulheres reais. De acordo com sua idealizadora/autora, as 
mulheres não têm muitas oportunidades de conhecer a aparência da região 
íntima de outras mulheres nem de falar abertamente sobre o assunto, então o 
projeto ajudaria a dissipar os modelos e mitos que cercam esse assunto. A 
iniciativa visa ser um protesto contra a indústria pornô que comercializa 
determinado modelo de vulva, lançando, assim, olhar sobre o poder da 
(auto)representação de corpos e estimulando a interatividade com pessoas que 
vivenciam/vivenciaram “situações de opressão de gênero”, investindo na 
abertura de espaços de discussão e contribuição através de depoimentos e 
imagens pessoais/íntimas de mulheres que se sentem oprimidas pelo “modelo 
vigente” de beleza e normalidade. São propostas estratégias de desconstrução 
de padrões estéticos normalizadores sobre o corpo feminino para, dentre 
outros motivos, que haja uma diminuição na procura de cirurgias de 
labioplastia. Propomos, portanto, pensar o poder que é potencialmente 
acionado por esses movimentos e as estratégias de resistência contra a 
objetificação do corpo da “mulher”. 
Palavras-chave: Resistência. Vulva. Corpo Feminino. Interatividade. 
 
Introdução 
 
 O corpo feminino ainda hoje é definido através de normas que fazem 
parte de um dispositivo de sexualidade; peças desse dispositivo, saberes 
médicos, de higiene corporal e o discurso pornográfico que têm como objetivo 
enquadrar e normatizar o corpo feminino segundo determinados modelos, um 
tipo de “culto da beleza feminina” (LIPOVETSKY, 2000, p. 113-127) que é bem 
específica voltada para uma ideia de corpo “belo”, simétrico, branco e sem 
3 
 
pelos. Revistas voltadas para a “beleza” apostam em conselhos para lançar 
atenção a “necessidade de ser bela da cabeça aos pés, em todas as horas e 
em todas as idades (SANT’ANNA, 2001, p. 67); também “expressam 
imperativos, conselhos e dicas de o que é e o que se deve fazer para que a 
leitora se torne um verdadeiro exemplar de mulher moderna...” (BRUGGE, 
VASCONCELOS, 2012, p. 408). 
 Large Labia Project1 visibiliza o corpo feminino desnudo e insubmisso a 
normas que ditam como o corpo feminino deve ser e o que pode mostrar. 
Emma P., idealizadora/autora do blog estrangeiro Large Labia Project aposta 
na estratégia da exibição de vulvas, as “vulva selfies”, como estratégia de 
empoderamento e criação de autoconfiança. O projeto de Emma tem como um 
dos objetivos servir como uma forma de divulgar “vaginas reais”, como 
referência para “mulheres reais”. Emma argumenta que as mulheres não têm 
muitas oportunidades de conhecer a aparência da região íntima de outras 
mulheres nem de falar abertamente sobre o assunto, então o projeto2 ajudaria 
a dissipar os ideais e mitos que cercam esse assunto3, elaborado com o intuito 
de protestar contra a indústria pornô que comercializa um determinado modelo 
de vulva4. A pornografia seria como um insulto, “de degradar sua imagem, de 
incitar aos estupros e às violências”, veiculadora de estereótipos, uma 
inferiorização da mulher, reforçando “uma política do macho destinado a 
consagrar a dominação masculina” (LIPOVETSKY, 2000, p. 41). É um 
espetáculo no qual a mulher não se reconhece e não há nenhuma identificação 
(LIPOVETSKY, 2000, p. 42). 
Os discursos que subalternizam a mulher são insistentemente reiterados 
nos discursos midiáticos, combatidos pela crítica feminista e por mulheres que 
não se sentem representadas ou adaptadas, as “mulheres reais”, que não 
conseguem aderir a “febre da beleza e o mercado do corpo” (LIPOVETSKY, 
2000, p. 130-135) que implica “práticas de embelezamento” (LIPOVETSKY, 
 
1 Link: www.largelabiaproject.org. 
2 O termo “projeto” é êmico. 
3Autoestima vaginal; como anda a sua? In: Revista Glamour. Disponível em: 
<http://revistaglamour.globo.com/Amor-Sexo/noticia/2013/07/autoestima-vaginal-como-anda-
sua.html>. Acesso em: 9 de dezembro de 2013. 
4 Mulheres protestam contra indústria de filmes pornôs mostrando a vulga. In: Revista Glamour. 
Disponível em: <revistaglamour.globo.com/Amor-Sexo/noticia/2013/03/mulheres-protestam-
contra-industria-de-filmes-porno-mostrando-vulva.html>. Acesso em: 9 de dezembro de 2013. 
4 
 
2000, p. 130), a “estética da magreza” (LIPOVETSKY, 2000, p. 131), e a 
“superexposição midiática” (LIPOVETSKY, 2000, p. 144). 
 Vigarello (2006) afirma que a “história da beleza” “carrega o que agrada 
ou desagrada a respeito do corpo numa cultura e num tempo: aparências 
valorizadas, contornos sublinhados ou depreciados” (p. 10), com profunda 
influencia de “modelos” de gênero (p. 11). Essa é uma história que “explora 
tanto as palavras como as imagens. Em particular as palavras, porque elas 
traduzem as tomadas de consciência, os interesses distintos, as sensibilidades 
reconhecidas e experimentadas” (p. 10). 
 
A beleza vai estar presente com uma difusão imensa no imaginário 
das massas, através da cultura e das artes populares, do sonho 
hollywoodiano, da arte dos ilustradores produtores de pin-up, das 
fotografias de estrelas, através do aporte multiforme e multiplicador 
da publicidade para os produtos de beleza, da maquiagem e da moda 
e, de modo geral, de tudo aquilo em que se espelha um mudo de 
sonho (CORBIN, COURTINE, VIGARELLO, 2008, p. 554). 
 
 
É no contexto da critica desse tipo de enquadramento do corpo feminino 
que situo minha pesquisa de doutorado em Sociologia no Programa de Pós-
Graduação em Sociologia da Universidade Federal do Ceará, iniciada em 
fevereiro de 2015. Os apontamentos que compõem este artigo são, portanto, 
fruto de observações preliminares de meu objeto de pesquisa, “autoestima 
vaginal”. 
A ideia de pesquisar o Large Labia Project surgiu após ler uma 
reportagem sobre sites estrangeiros que disponibilizam material contra o 
modelo estético vaginal propagado pela “indústria pornô” que acaba por 
estimular a procura por cirurgias plásticas das partes íntimas femininas5. Na 
contramão desse modelo, o qual remete a cor, formato e tamanhos “ideais” da 
vulva, Large Labia Project apresenta propostas de reunir imagens e 
depoimentos de “mulheres reais” para, dentre outro motivos, que haja uma 
diminuição na procura de cirurgias de labioplastia. Diante disso, me ocorreu 
pensar sobre essa modalidade de ativismo na Internet: que tipo de ativismo é 
 
5Autoestima vaginal; como anda a sua? In: Revista Glamour. Disponível no link: 
<http://revistaglamour.globo.com/Amor-Sexo/noticia/2013/07/autoestima-vaginal-como-anda-
sua.html>. Acesso em: 9 de setembro de 2014. 
5 
 
esse? Do que falam e para quem falam? Como podemos entender e quais os 
aspectos focalizados pelos discursos? 
 
Vaginas: várias biografias 
 
 Quando utilizamos aqui o termo “vagina” assumimos a postura proposta 
por Naomi Wolf (2013, p. 36) quando opta por suplantar o temo médico/técnico 
por uma forma mais “inclusiva”, por ser este um significado relacionado apenas 
à abertura vaginal: ou seja, “o órgão sexual feminino como um todo, dos lábios 
ao clitóris,do introito ao colo do útero”. Wolf (2013, p. 13) afirma que se a 
vagina é tratada com respeito ou agressividade, esse é um reflexo de como as 
mulheres são culturalmente tratadas em determinado momento. Ela afirma que: 
Uma fonte de desconforto a respeito de ser mulher nesta cultura é o 
fato de que a linguagem que usamos para falar sobre nosso corpo, e 
sobre a vagina em particular, é tão horrorosa. O mal- entendido 
comum sobre a vagina como sendo feita de ‘mera carne’ é a principal 
razão para este desconforto (WOLF, 2013, p. 16). 
 
 Enquanto chamamos atenção para a problemática da autoestima vaginal 
(não necessariamente sexual) e a sua relação com a diversidade estética, Wolf 
(2013, p. 36-37) aponta para outro fato curioso que nos faz pensar ainda mais 
a complexividade do tema: “A vulva, o clitóris e a vagina são, na realidade, 
mais bem compreendidos como a superfície de um oceano que é atravessado 
por redes vibrantes de raios submarinos”. A autora recorre à estratégia 
metafórica para identificar estas redes como sendo a “rede neural pélvica 
feminina”, a qual é “completamente única para cada mulher, individual – não há 
duas mulheres iguais”. Esta afirmação é desenvolvida no sentido de que a 
autora atesta, segundo experiência pessoal, que há uma profunda conexão 
entre vagina e cérebro, e a rede neural pélvica seria um elemento fundamental 
nesta conexão. 
 No entanto, Wolf (2013, p. 15-16) centra sua análise sobre o 
“relacionamento com a vagina” e os “sentimentos por esta parte da mulher” 
mais voltados ao prazer sexual, explorando, através da apresentação de 
6 
 
pesquisas em laboratório, que há conexão entre a vagina e “a criatividade e 
confiança femininas e um sentido de ligação às coisas e às pessoas”. 
[O prazer sexual] Serve também como uma mídia para o 
autoconhecimento e a positividade femininos; para a criatividade e a 
coragem femininas; para o foco e a iniciativa femininos; para o êxtase 
e a transcendência femininos; e como uma mídia para uma 
sensibilidade que se parece muito com a liberdade. Entender a 
vagina apropriadamente é perceber que não se trata apenas de uma 
extensão do cérebro feminino, mas que ela faz parte, essencialmente, 
da alma das mulheres (WOLF, 2013, p. 16). 
 
 Através do contato com pesquisas realizadas em laboratório (a maioria 
com animais de pequeno porte, como ratos), mas também de sua experiência 
pessoal e de entrevistas realizadas pra seu livro, Wolf (2013, p. 17) afirma que 
“experiências da vagina podem – no nível da biologia – aumentar a 
autoconfiança feminina, ou, da mesma forma, levar à falta de autoconfiança”, 
além disso, “podem ajudar a desenvolver a criatividade feminina ou apresentar 
bloqueios a ela”. Por esses e outro motivos a autora se pergunta: “a vagina 
possui uma consciência?”. Como falar sobre desenvolver uma autoconsciência 
da vagina? 
 No caminho dessa reflexão, Livoti e Topp (2006, p. 14) atestam: 
A maioria das mulheres jamais verá sua vagina. Além de não estar 
em um local exatamente conveniente para exame, muitas mulheres 
pensam que uma vez equipadas com um espelho na mão, garantida 
certa privacidade e criada aquela coragem para enfrentar alguma 
surpresa inesperada, porque se dar ao trabalho? Essas mulheres são 
as mesmas que inspecionam cada poro dilatado do rosto, cada 
defeito no esmalte e cada fio de cabelo fora do lugar, contudo sua 
vagina e seu ambiente permanecem com um bem não reclamado 
pela proprietária, examinado por outros, mas deixado de lado durante 
boa parte do tempo. 
 
 Essa afirmação se dá pelo fato de as mulheres não serem incentivadas 
a pensar suas vaginas, ou enxerga-las como uma parte de seu corpo que 
merece tanta atenção como seios, unhas e sobrancelhas, e desde meninas, 
são “desencorajadas de se tocarem ‘lá em baixo’”. Muitas mulheres sentem 
algum desconforto e caso procurem por alguma referência, há apenas a opção 
“de se compararem com fotos, imagens na televisão e nos filmes, nas quais, 
quase sempre, não há chance de ver qualquer vagina (e, caso elas fossem 
7 
 
vistas, estariam, certamente, depiladas)” (LIVOLI e TOPP, 2006, p. 15). Além 
disso, há o constrangimento de falar sobre a vagina: “Raramente discutimos a 
quantidade de pelos, o odor, a cor ou o tamanho relativo de nossa genitália, 
porque não temos muitos parâmetros de comparação” (LIVOLI e TOPP, 2006, 
p. 21). Diante desse fato “É alguma surpresa que as mulheres se sintam de 
algum modo insatisfeitas não só com seu corpo, mas especialmente com sua 
vagina?” (LIVOLI e TOPP, 2006, p. 16). 
O desconforto em relação ao próprio corpo não se limita à busca de 
nossas partes inferiores em um espelho. Embora muitos padrões não 
sejam tão rígidos, na realidade, para as mulheres, a nudez fora do 
quarto ou do banheiro não é comum ou incentivada. A mulher 
ocidental provavelmente olhará para o Oriente e recriminará outras 
culturas por levarem o recato feminino ao extremo, mas nem 
precisamos ir tão longe. As mulheres não têm tantas oportunidades 
de ver outras mulheres nuas, mesmo em nossa moderna, mas ainda 
assim recatada, cultura ocidental (LIVOLI e TOPP, 2006, p. 14-
15). 
 Le Breton (2012) assegura que lançar um olhar para o corpo é enxergar 
e considerar o corpo como “um objeto de análise de grande alcance para uma 
melhor compreensão do presente”. As representações modernas de corpo 
apontam para o corpo hoje ser entendido como “informação”, “um banco de 
dados”, “conjunto de informações programáveis” (SIBILIA, 2001, p. 8), o que já 
acontecia há tempos, mas com influência das tecnologias, essas 
representações adquirem novas proporções. O corpo moderno torna-se cada 
vez mais ambíguo e se criam mais espaços para falar sobre o corpo e o que 
interessa ao corpo. 
 É pensando na relação entre corpo e desconforto, falta de espaço para 
discussão sobre vaginas e a necessidade de criação desses espaços, que não 
estejam voltados para reprodução de padrões de “beleza” tão massivamente 
partilhados pelas mídias supracitadas, que surge a emergência de 
compartilhamento de “vaginas reais para mulheres reais”, o investimento na 
abertura de espaços de discussão e contribuição para dissipar mitos ou auxiliar 
as mulheres a aceitarem, conviverem e/ou construírem um momento de 
partilha, através de depoimentos e imagens pessoais/íntimas de suas vaginas. 
Eis um dos principais objetivos do projeto “Large Labia Project”. 
8 
 
O Large Labia Project: “um lugar para ser vulneráve l, mas não ser 
julgada” 6 
 O Large Labia Project é um blog que se define como “corpo-positivo”, no 
sentido de mostrar que grandes lábios vaginais são normais e que têm sua 
beleza, principalmente quando são assimétricos e têm coloração, comprimento 
e textura diferentes. Emma P., sua idealizadora/autora, na 
descrição/apresentação do blog menciona o quanto é importante que o blog 
sirva de “suporte para aquelas pessoas que se sentem inseguras, 
autoconscientes, vitimadas ou vilipendiadas sobre seus grandes lábios”. O blog 
é recheado de depoimentos de mulheres que sofrem com diversas 
experiências negativas sobre suas vaginas, vida sexual e baixa autoestima, 
muitos depoimentos sendo acompanhados de “vulva selfies”, de fotos das 
vaginas das contribuintes anônimas. A própria Emma P, ainda na descrição do 
blog fala sobre como é a aparência de sua vulva (e também compartilha fotos 
suas), afirma que ama seus lábios e que compartilhar esse tipo de imagem de 
si pode ser um desafio e uma forma de empoderamento, com a finalidade de 
encorajar outras pessoas a mandarem as suas, e parece uma estratégia eficaz, 
pois existem dezenas de imagens de outras vulvas no decorrer do blog. Emma 
estimula o envio de fotos das leitoras, não importa a quantidade de fotos. 
 
Eu fui corajosa e decidida a mostrar os meus lábios, então eu sei 
como esse desafio que é também empoderador, catártico e libertador 
pode ser. Se você gostaria de enviar as suas fotografias, histórias,experiências e seus sentimentos sobre seus lábios também, então 
você pode se orgulhar, sabendo que sua contribuição está ajudando 
outras pessoas com lábios a se sentirem aceitas e normais7. 
 
 Nota-se uma preocupação em situar que a proposta do blog é abordar a 
nudez genital em contexto não-sexual, apesar de o blog mostrar fotos e conter 
conteúdo escrito (histórias, problemas e experiências) com temas adultos. 
Além disso, reforça que é importante a interatividade e compartilhamento das 
imagens, desde que as pessoas sejam maiores de 18 anos. É, portanto, um 
 
6 Trecho de uma postagem do dia 6 de maio de 2015 na qual uma anônima submeteu um 
depoimento no qual ela falava da aparência de sua vagina e de como estava tentando gostar 
do que via. Tradução minha. 
7 “About”, disponível no link: http://largelabiaproject.org/About. Acesso em: 22 de maio de 2015. 
9 
 
projeto “inclusivo e todas as pessoas com lábios são bem-vindas, 
independentemente de raça, idade, orientação sexual ou de gênero” 8. 
 Nesta ocasião, trazemos algumas postagens do mês de maio de 2015 
que tratam em sua maioria, de depoimentos que mencionam principalmente o 
impacto do blog na vida das mulheres, as quais mencionam problemas 
diversos relacionados à aparência de suas vulvas e como o blog aparece como 
uma importante estratégia na construção de uma autoconsciência do corpo e 
da vagina, mas também evidencia uma falta de espaço para discutir com 
pessoas mais próximas (familiares, amigos/as e companheiros/as) esse tipo de 
assunto e uma carência de referências “reais”. 
 
Tenho 23 anos agora e eu amo meu corpo e tudo sobre mim, mas 
esta pequena parte de mim sempre me incomodou mais. Um par de 
dias atrás eu pesquisei 'grande lábios' e aqui estou eu. Eu não posso 
expressar o quanto me senti aliviada quando vi inscrições de outras 
meninas e ouvi o que elas têm a dizer. Eu me senti um grande peso 
sendo tirando de meus ombros. Eu não sou estranha. Eu sou como 
qualquer outra pessoa. Obrigada, Emma. Você tem feito muitas 
meninas sentirem o mesmo que eu! Eu sinto que eu poderia olhar 
para os meus lábios por horas agora. Eu os acho bonitos e eles me 
lembram uma flor que eu nunca tinha visto antes!”.9 
 
 O trecho supracitado contém um teor positivo, mas nem sempre os 
depoimentos apresentam um conteúdo semelhante, de aceitação. A sensação 
de estranheza diante do próprio corpo é uma constante, assim como 
autoconfiança e autoestima abaladas: 
 
Emma, eu quero a sua confiança. Eu quero ser como você. Você é 
incrível e este blog tem me ajudado muito. Eu não sei o que teria 
acontecido, se não tivesse já encontrado este blog. A única coisa que 
eu lamento é que eu não tenha encontrado anteriormente. Eu não 
posso amar minha vulva ainda, mas pelo menos eu não estou 
chorando. Obrigado por sua existência!” 10. 
 
 
 
 
8 Idem. 
 
9 Trecho de depoimento em postagem do dia 9 de maio de 2015, disponível no link: 
http://largelabiaproject.org/post/118480033078/submission-my-labia-story-i-started-
masturbating. Acesso em: 22 de maio de 2015. Tradução minha. 
 
10 Depoimento em postagem do dia 6 de maio de 2015, disponível no link: 
http://largelabiaproject.org/post/118279365518/emma-i-want-your-confidence-i-want-to-be-like. 
Acesso em: 22 de maio de 2015. Tradução minha. 
 
10 
 
 
 Em algumas postagens, Emma reproduz o depoimento da pessoa 
anônima e sua resposta para o depoimento, geralmente, como no trecho 
seguinte, Emma, mesmo quando apenas conhece a descrição do problema, faz 
questão de elogiar sua interlocutora: 
 
Sua vulva parece bonita. Não se preocupe, não há nenhum problema 
em ter pigmentação mais escura em seus lábios. Cerca de 30% têm 
pequenos lábios que são ou tons de marrom, roxo, cinza, azul ou 
preto, ou uma combinação de tudo isso. Rosa no interior e uma cor 
mais escura do lado de fora é muito comum. E cerca de metade de 
todos com os lábios são mais escuras. Você não tem nenhuma 
necessidade de se preocupar. E o que disse soa lindo. É tão bonito 
que tenha uma sarda lá! Como uma mancha de beleza para a sua já 
bonita vagina. É apenas a pigmentação da pele novamente e nada 
para se preocupar. Se você estiver com mais de 18, então eu 
adoraria que você compartilhe a sua vulva aqui - isso soa tão bonito! 
11 
 
 Nem todas as postagens têm fotos, como essa postagem interessante 
que fala sobre a importância do material do blog como forma de 
empoderamento e auxilio na “reconquista” da autoestima: 
Oi Emma, eu sou tão grata que eu tropecei em seu blog. Eu tenho 17 
anos e por muitos anos tenho sido autoconsciente que meus 
pequenos lábios são maiores do que o "normal", acho que alguns 
meses eu posso aceitar como pareço, no entanto, logo que meninos 
ou meninas ou mesmo sites de mídia social mencionam "cortinas de 
carne bovina" eu me sinto deprimida e insegura sobre isso por algum 
tempo depois, eles dizem como é nojento, é honestamente a coisa 
mais dolorosa, mas o pior é encobrir a dor. 12 
 
 
11 No original: “Your vulva sounds beautiful. Don’t worry, there’s no problem in having darker 
pigmentation in your labia. About 30% have labia minora that are either shades of brown, 
purple, grey, blue or black, or some combination of all of those. Pink on the inside and a darker 
colour on the outside is very common. And about half of everyone with labia have darker tips. 
You have no need to worry. And they sound gorgeous. That’s so cute having a freckle there! 
Like a beauty spot for your already beautiful vagina :) It’s just skin pigmentation again and 
nothing to worry about. If you’re over 18 then I’d love for you to share your vulvas here – it 
sounds so pretty!”. Postagem de 11 de maio de 2015. 
 
12 No original: “Hi Emma, I am so grateful I stumbled across your blog. I am 17 years old and for 
many years have been self conscious of my Labia Minora being larger than "normal", I find that 
some months I can accept how I look, however as soon as boys or girls or even social media 
sites mention "beef curtains" I find myself being depressed and insecure about it for sometime 
after, they say how disgusting they are, it is honestly the most hurtful thing but the worse is 
covering up the pain”. Depoimento publicado em 11 de maio de 2015. 
11 
 
 O trecho anterior faz referência à autoconsciência da diversidade e do 
próprio corpo, além de citar o impacto de mídias na construção negativa da 
diversidade, no caso, o “excesso” de carne nos pequenos lábios. Muitas 
mulheres procuram intervenções médicas, as cirurgias íntimas, para “concertar” 
o que para elas parece ser um defeito. Aline Lage, fisioterapeuta especializada 
em Saúde da Mulher, em seu blog, informa que: 
As alterações na genitália podem ser congênitas (de nascença), 
adquiridas (por partos e cirurgias) ou simplesmente causadas pelo 
tempo (envelhecimento) e podem gerar ansiedade, depressão, perda 
da autoestima, insatisfação sexual nas mulheres que valorizam a 
aparência pessoal, bem como a sexualidade13. 
 
 É importante atentar para o caráter negativo dessas alterações que são 
tidas como gerando situações de constrangimento e com profundas influencias 
sobre como a mulher enxerga a si e seu próprio corpo. Emma procura 
contornar esse tipo de pensamento negativo: 
Não há melhor ou pior, apenas diferente. É uma cor do arco-íris mais 
normal do que as outras? É uma rosa mais normal do que uma 
margarida? A ideia do normal apenas não se aplica quando há 
diversidade e beleza em cada variação. Se você pode entender que 
você está bem do jeito que você é, que você não é mais ou menos 
normal do que qualquer outra pessoa, e você pode apreciar que há 
tanta variação na aparência genital, talvez você pode começar a 
sentir que, no fundo, você está ok... Olhe ao redor, veja os arquivos 
deste blog e aprecie a maravilhosadiversidade, e todos as vulvas 
normais com lábios normais. Essa é a realidade...14. 
 
 
13 “Estética genital: entenda o que é”. Disponível no link: 
http://alinelagefisioterapia.blogspot.com.br/2013/06/estetica-genital-entenda-o-que-e.html). 
Acesso em 8 de março de 2015. 
 
14 “…There is no better or worse, only different. Is one colour of the rainbow more normal than 
the others? Is a rose more normal than a daisy? The idea of normal just doesn’t apply when 
there’s diversity and beauty in every variation. If you can understand that you’re fine just the 
way you are, that you’re no more or less normal than anyone else, and you can appreciate that 
there’s so much variation in genital appearance, perhaps you can start to deep down feel that 
you’re ok…Look around this blog’s archives and take in the wonderful diversity, and all the 
normal vulvas with normal labia. That’s the reality”. Trecho de Postagem de 11 de maio de 
2015. 
 
12 
 
 A professora Lola Aronovich15 afirma que é “a coisa mais normal do 
mundo” achar que nosso corpo está “cheio de defeitos”. Isso se deve ao fato de 
que: 
[...] nos ensinam a achar, pra que a gente possa consumir mais e 
mais, em busca de uma cura para problemas inexistentes. É o que o 
capitalismo faz: inventa falhas em busca do lucro. Você passa anos 
da sua vida sem saber que aquela parte do seu corpo era 
inadequada. E, de um dia pro outro, você aprende que precisa 
resolver urgentemente o maior problema da sua vida. 
 
 Heloísa, uma das autoras do blog “Eu sou uma mulher livre”16 lembra 
que falar em autoestima vaginal a procura por cirurgias íntimas para a correção 
de “defeitos” estéticos significa “Mais uma vez o tal ‘padrão de beleza’ 
interferindo na vida da mulher”. 
Já não bastasse mulheres sendo induzidas a serem magras, ter 
peitões, ser alta, ter bunda, etc, ou então ter que usar tal roupa, por 
que está na moda para atender a um padrão exigido pela sociedade, 
agora me vem com esta questão de “vagina perfeita, seguindo um 
padrão estético”. Para piorar a situação, as explicações de fazer uma 
cirurgia dessas são voltadas diretamente para a alegria dos homens. 
A psicanalista e escritora Regina Navarro Lins tem sua teoria: “Mais 
uma vez, são as mulheres querendo se ajustar ao que elas supõem 
que os homens querem. Não é diferente do que faziam as gueixas, 
que espremiam os pés em sapatos minúsculos para ficarem atraentes 
aos olhos masculinos”, compara. “Porque, ao contrário do que 
acontece com os homens, que associam o ideal masculino de força e 
poder ao tamanho do pênis, no universo feminino vagina não tem 
nada a ver com competição. A gente não fica mostrando os lábios 
vaginais umas para as outras no banheiro de uma festa. Se mulheres 
se submetem a procedimentos cirúrgicos, é na tentativa de ficarem 
lindas para eles”, critica 
 
 O Large Labia Project realiza a função de conscientização de que o 
tamanho da vagina não deve ser motivo para interferir na vida sexual, que não 
é preciso mudar seu corpo, cirurgicamente, em decorrência de uma ideia 
negativa sobre o que seu parceiro sexual pode pensar. 
 
15 “Vergonha da minha parte íntima”. Disponível no link: 
http://escrevalolaescreva.blogspot.com.br/2014/05/vergonha-da-minha-parte-intima.html. 
Acesso em: 8 de março de 2015. 
16 Faça por você. Disponível no link: 
https://eusouumamulherlivre.wordpress.com/author/eusouumamulherlivre/. Acesso em: 28 de 
maio de 2015. 
 
13 
 
Querida Emma, muito obrigada pela execução de seu blog! Isso me 
fez sentir tão bem por me certificar de que minha buceta não é a 
única e enorme. Tenho 26 anos. Eu costumava ir regularmente para a 
piscina e eu sempre senti que eu tinha que esconder a minha buceta 
por ser maior do que as outras. Eu me masturbo muito regularmente 
e eu gostaria de poder fazê-lo mais. Eu também tive um monte de 
parceiros sexuais. Algumas das histórias eu me arrependo, mas 
agora sinto-me feliz por ter um grande amor por sexo. A masturbação 
também me acalma, ajuda a adormecer. É um medicamento. Então, 
basicamente eu estou feliz com esta parte da vida, mas eu sempre 
tive uma pequena sensação de que meus lábios são muito grandes. 
Mas agora eu acho que eles são apenas talvez um símbolo de meu 
apetite sexual vibrante... Obrigado pela possibilidade de 
compartilhar”17 
 O blog e o material compartilhado parecem ajudar as mulheres a 
“conviverem” com seu próprio corpo e lutarem contra pensamentos negativos, 
e é muito importante como um elemento que auxilia a construir sua 
autoconfiança através da autoconsciência. 
 
Resistência, autoconsciência e cultura afetiva 
“Amai os vossos corpos, senhoras. 
Desenvolver a autoconfiança é a coisa mais 
importante que você pode fazer por si 
mesmo” 18. 
 
 Parece possível encaixar na discussão a expressão utilizada por 
Raymond Williams (1969, p. 325) de uma “comunidade de experiência”, a 
configuração de uma “cultura em comum” que se faz importante por remeter o 
aprendizado a partir da experiência (p. 323). Essas experiências partilhadas no 
espaço criado por Emma P., podem também significar a criação de uma 
“cultura afetiva”, aqui no sentido abordado por Le Breton (2009), que afirma 
 
17 No original: “Dear Emma, thank you very much for running your blog! It made me feel so 
good to be sure that my pussy is not the only huge one. I am 26 years old. I used to go regularly 
to the swimming pool and I always felt that I had to hide my pussy because of being larger than 
others. I masturbate very regularly and I wish I could do it more. I also had quite a lot of sex 
partners. Some of the stories I regret now but I feel happy to have a great love of sex. 
Masturbating also calms me down, help to fall asleep. It is a medicine. So basically I am happy 
with this part of life but I always had a small feeling that my labia are too big. But now I think 
they are just maybe a symbol of my vibrant sexual appetite… Thank you for the possibility to 
share”. Depoimento postado no dia 10 de maio de 2015. 
 
18 No original: “Love your bodies, ladies. Developing self confidence is the most important thing 
you could do for yourself”. Depoimento em postagem de 6 de maio de 2015. 
14 
 
que, para que “um sentimento (ou emoção) seja experimentado ou exprimido 
pelo indivíduo ele deve pertencer, de uma forma ou de outra, ao repertório 
cultural do seu grupo” (LE BRETON, 2009, p. 126); 
 Para Le Breton (2009, p. 113), a afetividade “simboliza o clima moral que 
envolve em permanência a relação do indivíduo com o mundo e a ressonância 
íntima das coisas e dos acontecimentos que a vida quotidiana oferece”. Nesse 
sentido, “As emoções são, portanto, emanações sociais ligadas a 
circunstancias morais e à sensibilidade particular do indivíduo”, mobilizando 
“um vocabulário e discursos: elas provêm da comunicação social” (LE 
BRETON, 2009, p. 120); são “modos de afiliação a uma comunidade social, 
uma maneira de se reconhecer e de poder se comunicar em conjunto sobre a 
base da proximidade sentimental” (LE BRETON, 2009, p. 126-127). 
 
Uma cultura afetiva está socialmente em construção. Cada um impõe 
sua colocação pessoal ao papel que representa, com sinceridade ou 
distância, embora sempre reste uma tela de fundo que torna as 
atitudes reconhecíveis... compreender uma atitude afetiva implica 
desenrolar inteiramente o fio da ordem moral do coletivo, 
identificando a maneira como o sujeito que vive a situação define 
essa última (LE BRETON, 2009, p. 127). 
 
 A construção de uma cultura afetiva é, assim, uma estratégia de 
resistência e referência. Le Breton (2009, p. 114) lembra que, de acordo com o 
senso comum, emoção é geralmente associada com irracionalidade, falta de 
autocontrole e vulnerabilidade, “uma imperfeição que se deve emendar, 
corrigindo-se seu rumo na direção de umaexistência razoável”. Essa afirmação 
confirma o receio expresso na noção de que o Large Labia Project seria “um 
lugar para ser vulnerável, mas não ser julgada”. No entanto, enquanto Le 
Breton afirma que a emoção é um momento provisório, o Large Labia Project 
propõe o contrário, que esse momento ultrapasse o momentâneo, seja um 
estado permanente de autoconsciência e aceitação, que se transforma em 
amor ao próprio corpo, através da expressão das emoções de suas 
interlocutoras anônimas sobre suas vaginas. 
 
 
 
 
15 
 
Considerações finais ou O elogio da vagina? 
 
 Entendendo o projeto como parte de uma rede que estimula a formação 
de um campo de ativismo a favor da autonomia feminina em/na rede, a Internet 
funciona como meio de aumentar o alcance do feminismo, ou algumas 
questões importantes de lutas femininas19 de uma forma mais visual20. Esse 
fenômeno assinala as potencialidades da Internet como ambiente de troca, de 
produção de conhecimentos, criação de comunidades (NOVELLI, 2010). 
 Acredito que se forma, assim, uma rede de cooperação e re-criação 
coletivas configuradas através da Internet, e essas mulheres reais buscariam 
alargar o campo de identificações para produzirem suas identidades femininas, 
suas subjetividades e uma “cultura comum”, formando um aprendizado em 
rede, uma 
[...] troca contínua de ideias e de sentimentos e como que uma 
assistência moral mútua, que faz com que o indivíduo, em vez de 
ficar reduzido a suas próprias forças, participe da energia coletiva e 
nela venha recompor a sua quando esta chegar ao fim [ou esteja 
abalada] (DURKHEIM, 2000, p. 259). 
 
 Sendo assim, é importante estudar como “quaisquer tecnologias podem 
ter efeitos na produção de gênero”, e como o gênero “pode (e deve) ser 
pensado por meio de tecnologias que não apenas materializam instâncias 
normativas, mas são elas mesmas, parte de sua constituição” (GALINDO e 
SOUZA, 2012). 
 Esse estudo aposta na fecundidade de trabalhar essa rede visando 
analisar a tentativa de criação de convenções não hegemônicas de “beleza”, 
por abordar modos de enfrentamento das causas e consequências de traumas 
relacionados ao corpo, no entanto, considerando que “aceitar” o próprio corpo 
 
19 Dentre outras, a questão da legalização do aborto e o alto índice de estupro, são algumas 
das problemáticas que envolvem a vivência e autonomia do corpo feminino, das opressões e 
violências de gênero. 
20 Destaco os trabalhos de Ribeiro, Costa e Santiago (2012), sobre o movimento Riot Grrrl, 
movimento de cultura juvenil que abrange música, feminismo, arte, literatura, cinema e política, 
e a dissertação de Wrobleski (2013) sobre o coletivo Fierce Pussy, que aborda a relação entre 
palavra e imagem no trabalho do referido coletivo. Outras autoras que trabalham a interface 
entre feminismo e arte: Trizoli (2008), Castanheira, Faria e Alvarenga (2013), Scandolara 
(2013) e Tvardovskas (2011). 
16 
 
representa problema central na vida de muitas mulheres, independente da 
idade, etnia, nacionalidade, classe social e posicionamento político. 
 Dentro de um contexto amplo de mobilizações e repertórios de práticas 
de resistência, o espaço que Emma P. cria se encaixa no que podemos chamar 
de novos movimentos, não por trazerem novas reivindicações, mas pela 
entrada das novas tecnologias de informação/comunicação como um dos 
instrumentos de ação/divulgação, espaço e ponto de encontros de 
coletividades. De fato, podemos dizer que os meios “de comunicação de massa 
configuram o nosso cotidiano, sendo um elemento importante de disputa pela 
definição de identidades individuais e coletivas que perpassam tanto a esfera 
privada como pública” (PEREIRA, 2010, p. 14). 
 Naomi Wolf (2013, p. 54) lamenta que “ao contrário do que somos 
levados a crer, a vagina ainda está longe de ser livre no Ocidente nos dias de 
hoje – tanto pela falta de respeito como pela falta de entendimento do papel 
que ela exerce”. Zwang (2000, p. 303-304) completa: primeiro que o “sexo da 
mulher” não é sujo, já que “A boca é úmida e fendida, a axila, peluda, o pé 
cheira; ninguém mais pensou que essas são regiões repugnantes que não 
deveriam ser mencionadas, jamais desenhadas”; segundo que o “sexo da 
mulher” não é vergonhoso, se assim fosse, “os proponentes dessas teorias 
deveriam propor a abolição da necessidade alimentar, que leva a resíduos tão 
inestéticos. Não pode haver nem funções nem órgãos vergonhosos” e, por 
último, “O sexo da mulher não é feio. Em nome de quais princípios estéticos 
poder-se-ia censurar os artelhos ou as narinas?”. 
 Segundo Zwang (2000, p. 307-311), parece que o “sexo da mulher” 
carece “muito de uma salutar reabilitação, seja nos museus e em praças 
públicas, seja nos espíritos e nos corações”. 
[...] para derrubar as ultimas prevenções contra a vulva, sempre 
existe um ‘jeitinho’ simples: a introdução na vida cotidiana de objetos 
que a simbolizam. Os símbolos fálicos nos cercam e obcecam de 
maneira excessiva, do obelisco ao campanário, até chegar à obscena 
e mortífera pistola brandida pelo herói do cinema, o que o desobriga 
de ter que abrir a vista das calças de seu sedutor terno ou se seu 
‘viril’ jeans. Não se trata de erigir ídolos vulvares, embora eles 
pudessem ser oportunos substitutos desse lúgubre instrumento de 
suplício que é a cruz, que infesta nossas estradas e desagrada 
inúmeros outros lugares. Mas é muito desejável, para emparelhar 
17 
 
com os incontáveis objetos fálicos, que surjam – ou ressurjam, pois já 
os houve – objetos à imagem do sexo da mulher. 
 
 O Zwang, por sua vez, parece esperar que a introdução de elementos 
“vulvares” no cotidiano modifique a visão que a sociedade tem sobre a 
vulva/vagina. Será que seria esse um caminho? 
 
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