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SAÚDE DO ADULTO – EPILEPSIA 1 mfebar@gmail.com Marcus Felipe O. B. Alencar Medicina - Unifaminas PRODUTOR Conceitos iniciais e históricos • Medicina Ayurvédica (Índia, 4.500-1.500 a.C.) – “apasmara” (perda de consciência, perda de memória ou intelecto). Foi um dos primeiros conceitos clínicos de epilepsia. • Papiro de Ebers (Egito, 1.550 a.C.) – feito por especialistas da época, afirmava que todo paciente com epilepsia tinha um obstáculo do lado direito do organismo (tratamento: mistura de plantas deixadas ao ar livre por uma noite) • Código de Hamurabi (Mesopotâmia) – legislações referentes ao comércio de escravos defeituosos (incluindo epilepsia) • Grécia Antiga – possessão espiritual versus divindade (doença sagrada) ▪ Exceção: Hipócrates (500 a.C.): a origem não é sagrada, mas cerebral, determinada no período intrauterino se a mãe fosse “fleumática” ▪ Doença sagrada → grande doença (origem para “grand mal”). Crise tônico- clônica generalizada. • Igreja católica: julgava os epiléticos como possuídos/bruxaria. ▪ Guia da Inquisição “Malleus Malleficarum” ➔ Epilepsia = Bruxaria • Renascentismo e Iluminismo: causas da epilepsia são naturais (traumas, uremia, sífilis) • Período Moderno: Fritsch e Hitzig "Uber die elektrische Erregbarkeit des Grosshirns" (Sobre a Excitabilidade Elétrica do Cérebro) - crises convulsivas com estímulos elétricos no cérebro de cães. Crise x Epilepsia • Crise epiléptica: ocorrência transitória de sinais e/ou sintomas decorrentes da atividade anormal excessiva ou síncrona no cérebro. • Epilepsia: distúrbio cerebral caracterizado pela predisposição persistente em gerar crises epilépticas e pelas consequências neurobiológicas, cognitivas e psicossociais desta condição. • Período Ictal: período em que o paciente faz uma crise epiléptica. • Período Interictal: período entre dois períodos ictais. SAÚDE DO ADULTO – EPILEPSIA 2 mfebar@gmail.com Marcus Felipe O. B. Alencar Medicina - Unifaminas PRODUTOR • Período pré-ictal: aparecem sinais que precedem a crise (pródromos, auras) • Pródromos: nervosismo, sudorese, taquicardia, dor de barriga. • Aura: Ex: cacosmia é uma aura típica do lobo temporal. Definições • Epilepsia deve ser considerada uma doença do cérebro caracterizada por qualquer uma das seguintes condições: o pelo menos duas crises epilépticas não provocadas ocorrendo em um intervalo superior a 24h. o uma crise epiléptica não provocada e alta probabilidade de ocorrência de crises epilépticas. o diagnóstico de uma síndrome epiléptica (Ex: neurofibromatose, esclerose tuberosa, síndrome de sturge weber, síndrome de doose, síndrome de lennox- gastaut, síndrome de west). Problemas enfrentados pelo paciente epiléptico: • Pacientes com epilepsia tem maiores riscos de acidentes, traumas, crises prolongadas, SUDEP (Morte em Paciente com Epilepsia Súbita e Inesperada). • Epilepsia deve ser tratada de forma agressiva para se evitar os riscos que tendem a aumentar. • Existe um risco aumentado de comorbidades psiquiátricas (depressão, ansiedade). • Problemas psicossociais decorrentes da epilepsia: perda da CNH, desemprego, isolamento social, efeitos adversos dos fármacos (ex: disfunção sexual), estigma social. Epidemiologia • Prevalência mundial: 0,5 a 1% da população • Desenvolvidos: prevalência aumenta com idade • Em desenvolvimento: prevalência atinge pico na adolescência e idade adulta • Brasil: o Marino e col. – 11,9/1.000 habitantes na Grande SP (1,19%) o Fernandes e col. – 16,5/1.000 habitantes em Porto Alegre (1,65%) SAÚDE DO ADULTO – EPILEPSIA 3 mfebar@gmail.com Marcus Felipe O. B. Alencar Medicina - Unifaminas PRODUTOR Crises epilépticas • Após uma única crise epiléptica não provocada, o risco para que outra ocorra é de 40 a 52%. • Com duas crises não febris não provocadas, a chance de ter outra crise em 4 anos é de 73%. • O termo "crise epiléptica provocada" pode ser considerado como sinônimo de "crise epiléptica reativa" ou "crise sintomática aguda”. É definido como algo pontual, agudo e que está provocando aquela irritação no tecido cerebral. o Ex: Pcte teve um TCE, hemorragia subdural, fez uma crise epiléptica provocada. o Ex: Pcte com má-formação do córtex cerebral, fez uma crise epiléptica não provocada. (ausência de fator temporário ou reversível). Investigação • Hemograma • Eletrólitos • Glicose (Obrigatório na investigação imediata!) • Função hepática • Função renal • Punção lombar • E.A.S Tipos de Crise • Crises generalizadas: tem origem em algum ponto da rede neural que é capaz de recrutar rapidamente outras redes neurais bilaterais. • Crises focais: iniciam de forma localizada em área específica, com manifestações dependendo do local de início e propagação de descarga para outras áreas. • Dois aspectos são considerados na subdivisão das crises de início focal: o Alteração ou não da consciência durante a crise. o Tipo de manifestação da crise (motora ou não motora). Eletroencefalograma (EEG) • Eletroencefalograma não é obrigatório nem essencial para diagnosticar epilepsia. • O diagnóstico é feito com base na descrição da crise epiléptica. o Muitas vezes o paciente pode estar no período inter-ictal e o EEG não vai captar anormalidades. • O EEG ajuda a diagnosticar outras síndromes através de padrões patognomônicos. o Ex: síndrome de West – hipsarritmia (espasmos infantis). o Ex: crise de ausência típica da infância – descargas bilaterais ponta-onda de 3Hz. SAÚDE DO ADULTO – EPILEPSIA 4 mfebar@gmail.com Marcus Felipe O. B. Alencar Medicina - Unifaminas PRODUTOR Epilepsia considerada resolvida: • Indivíduos que tenham uma síndrome epiléptica dependente da idade, mas já ultrapassaram a idade limite da mesma. • Aqueles que tenham permanecido livres de crises por pelo menos 10 anos e sem fármacos antiepilépticos durante pelo menos os últimos 5 anos. • Não se utiliza o termo “curado da epilepsia” e sim “Epilepsia resolvida”. Risco relativo à epilepsia: ponta onda SAÚDE DO ADULTO – EPILEPSIA 5 mfebar@gmail.com Marcus Felipe O. B. Alencar Medicina - Unifaminas PRODUTOR Conceitos Neurofisiológicos POTENCIAL DE AÇÃO Três características básicas: • Tamanho e forma estereotipados – cada potencial de ação normal para uma determinada célula é idêntico, despolariza a um mesmo potencial e repolariza de volta ao mesmo potencial de repouso. • Propagação – potencial de ação em determinado local despolariza locais adjacentes (não decremental: a amplitude não reduz ao longo da célula). • Resposta tipo “tudo ou nada” – se uma célula excitável é despolarizada ao seu limiar, a ocorrência de potencial de ação é inevitável. • O potencial de ação (PRA) é dado através do influxo de Na+. • A fase de repolarização (PRR) é dada por aumento de condutância de K+. o K+ dificulta a despolarização. • Se, na epilepsia, há uma despolarização de forma anômala, devo bloquear o Na+ e aumentar a eficácia do transporte de K+ pois é ele que vai dificultar a despolarização. NEUROTRANSMISSORES (NT) • Liberação do neurotransmissor a partir da membrana da célula pré-sináptica. • Difusão através da fenda sináptica. • Ligação ao receptor específico na membrana da célula pós-sináptica. • Alteração no potencial de membrana. • O Ca2+ facilita a neurotransmissão. SAÚDE DO ADULTO – EPILEPSIA 6 mfebar@gmail.com Marcus Felipe O. B. Alencar Medicina - Unifaminas PRODUTOR • O GABA é o principal neurotransmissor inibitório do SN. • O Glutamato é o principal neurotransmissor excitatório do SN. Classificação das crises: • INÍCIO FOCAL o Perceptivas (o paciente percebe) ▪ Início motor ▪ Início não-motor o Disperceptivas (o paciente não percebe) ▪ Início motor ▪ Início não-motor o Focal evoluindopara tônico-clônica bilateral • INÍCIO GENERALIZADO o Motoras ▪ Tônico-clônicas (convulsões) ▪ Outras motoras o Não motoras (crises de ausências): ▪ O paciente perde a consciência do que está fazendo, depois volta. • INÍCIO DESCONHECIDO o Motoras ▪ Tônico-clônicas ▪ Outras motoras o Não motoras (parada comportamental) ▪ Muito comum em crianças – o paciente interrompe um comportamento e continua em outro (congela e volta) o Não classificadas. Para se produzir o principal NT inibitório (GABA), o cérebro tem que produzir antes o principal NT excitatório (Glutamato): O Glutamato é descarboxilado a GABA. Principal empecilho no tratamento da epilepsia: produzir bastante GABA sem aumentar a quantidade de Glutamato. SAÚDE DO ADULTO – EPILEPSIA 7 mfebar@gmail.com Marcus Felipe O. B. Alencar Medicina - Unifaminas PRODUTOR Grito Gutural: muito comum em pacientes durante crise epiléptica. Ocorre pela passagem forçada do ar durante uma contração tônico-clônica. Diagnóstico • Clínico: história + exame físico. • Testemunha. • EEG: quando alterado, identifica tipo e localização da atividade epileptiforme (auxilia diagnóstico de síndromes e escolha de tratamento). Estado de Mal Epiléptico • Falha dos mecanismos responsáveis pelo término das crises epilépticas ou pelo desencadeamento de mecanismos que levam ao prolongamento anormal das crises (5 minutos). • Consequências a longo prazo: o Morte neuronal – a partir de um tempo de duração de crises – 30 minutos. Exames adicionais • EEG: registro mínimo 30 minutos. • Exames de imagem devem ser solicitados na suspeita de causas estruturais: o 75% dos pacientes avaliados em centros terciários, especializados em epilepsia refratária, apresentam anormalidades à RM de encéfalo. o 50% dos pacientes com epilepsia apresenta anormalidades estruturais por imagem. • Quando existe lesão subjacente: o Chance maior de refratariedade ao tratamento. o Embasa indicação de tratamento cirúrgico para epilepsia. Tratamento Preditores de difícil controle: SAÚDE DO ADULTO – EPILEPSIA 8 mfebar@gmail.com Marcus Felipe O. B. Alencar Medicina - Unifaminas PRODUTOR TIPO DE CRISE 1ª LINHA 2ª LINHA (ADJUVANTES) EVITAR Tônico-clônico generalizada Carbamazepina (OXC) Lamotrigina Valproato Levetiracetam Topiramato Tônica ou atônica Valproato Lamotrigina Topiramato Carbamazepina (OXC) Gabapentina Pregabalina Vigabatrina Ausência Etossuximida Lamotrigina Valproato Clobazam Levetiracetam Topiramato Carbamazepina (OXC) Fenitoína Mioclônica Levetiracetam Valproato Topiramato Levetiracetam Valproato Topiramato Clobazam Carbamazepina (OXC) Fenitoína Focais Carbamazepina (OXC) Lamotrigina Levetiracetam Valproato Clobazam Topiramato Fenitoína Fenobarbital • O Valproato serve para qualquer crise epiléptica. • Na crise de ausência típica da infância a primeira opção é a Etossuximida. • O Levetiracetam + Valproato é uma boa associação medicamentosa. • Em idosos: a Lamotrigina é 1ª linha, quando possível. • Há também tratamento com derivados do canabidiol e THC. Dose usual para a maioria dos fármacos usados no dia a dia do tratamento da epilepsia: *A Fenitoína tem meia-vida de 22h (eficaz: ~14h), ou seja, não tem sentido prescrever Fenitoína de 8/8h e sim 12/12h. SAÚDE DO ADULTO – EPILEPSIA 9 mfebar@gmail.com Marcus Felipe O. B. Alencar Medicina - Unifaminas PRODUTOR Como as medicações para epilepsia agem: • Carbamazepina, Lamotrigina: bloqueadores dos canais de sódio. • Clobazam: Agonista GABAA – aumenta frequência de abertura desses receptores. • Levetiracetam: liga-se à proteína SV2A, interferindo com exocitose e liberação de NT na fenda sináptica. • Etossuximida: bloqueio dos canais de Ca, com inibição do circuito tálamo-cortical. • Fenobarbital: prolongamento da abertura dos canais de Cl, dos receptores GABAA. • Gabapentina: liga-se à proteína alfa2‐gama, uma subunidade dos canais de Ca voltagem-dependente. • Topiramato: bloqueio dos canais de Na+ voltagem-dependentes, modulação negativa dos canais de Ca tipo-L, ativação da condutância ao K, potencialização da ação inibitória GABAérgica, antagonismo a receptores glutamatérgicos. • Vigabatrina: análogo estrutural do GABA que inibe irreversivelmente a GABA‐ transaminase, aumentando os níveis sinápticos de GABA no cérebro. • Carbamazepina e Valproato: moduladores de humor para tratamento de TAB (Oxcarbazepina eficácia ~ Carbamazepina). • Lamotrigina: modulador de humor com boa resposta em fase de depressão de pacientes com transtorno bipolar tipo I. • Topiramato: efeito depressor do humor (às vezes, usado como modulador). • Gabapentina: melhora o humor (?), de forma independente do controle das crises, com alguma melhora mensurável em cerca de metade dos pacientes com distimia no início do tratamento. Efeitos colaterais dos fármacos para epilepsia: SAÚDE DO ADULTO – EPILEPSIA 10 mfebar@gmail.com Marcus Felipe O. B. Alencar Medicina - Unifaminas PRODUTOR Complicações: • Estado de mal epiléptico • Acidentes • Morte súbita inexplicada (SUDEP) – 1:200 • Transtornos psiquiátricos (44-71%) o Nunca utiliza Bupropiona para pacientes epilépticos, pois ela baixa o limiar convulsivo. • Paralisia de Todd: quando pcte no período pós-ictal desenvolve alguma paralisia/fraqueza por um período de silêncio neuronal no pós irritação da crise. • CUIDADO: deve-se evitar Valproato em mulheres grávidas pelo risco de teratogenia. Use Lamotrigina! Se for pelo SUS: use carbamazepina! • CUIDADO: nunca troque fármacos antiepilépticos durante a gestação!
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