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SISTEMA DE ENSINO PRESENCIAL CONECTADO BACHARELADO EM SERVIÇO SOCIAL CAMILA GONÇALVES DOS SANTOS O ASSISTENTE SOCIAL FRENTE A VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FEMINICÍDIO Campina Grande 2020 CAMILA GONÇALVES DOS SANTOS O ASSISTENTE SOCIAL FRENTE A VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FEMINICÍDIO Trabalho apresentado ao Curso de Serviço Social da UNOPAR – Universidade Norte do Paraná, para a disciplina de Trabalho de Conclusão de Curso II Orientadora Acadêmica: Nelma dos Santos Assunção Galli CAMPINA GRANDE 2020 CAMILA GONÇALVES DOS SANTOS O ASSISTENTE SOCIAL FRENTE A VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FEMINICÍDIO Aprovada em ___ de ____________ de 2020. BANCA EXAMINADORA _______________________________________________________________Pro f.ª Simone Ferreira Nascimento Ramos Presidente - Orientador _______________________________________________________________ Prof.(a) Membro Externo _______________________________________________________________ Prof. (a) Membro Externo AGRADECIMENTOS “Agradeço a Deus todo poderoso, a quem devo a vida, sem ele nada sou”! DEDICÁTORIA Dedico ao meu esposo Fagner, pelo companheirismo, compreensão e força para comigo durante toda essa trajetória. Ao meu pai João e minha mãe Inaldete, meus exemplos de honestidade, amor e humanidade. Aos meus filhos Raiff, Enzo e Helena, pelas ausências, eles são a razão pela qual busco a mudança de vida. Aos amigos que sempre me apoiariam, por todo carinho e força ofertados. As amigas Claudenice e Izabel por compartilhar comigo vivencias e aprendizado. Aos professores e tutores que me guiaram e ensinaram nesta longa e dificil caminhada. Enfim, a todos aqueles que passaram pela minha jornada e sonharam comigo meu muito obrigada!! SANTOS. Camila Gonçalves dos. O Assistente Social Frente A Violência Doméstica E Feminicídio. Trabalho de Conclusão de Curso em Serviço Social. UNOPAR – Universidade Norte do Paraná. Campina Grande, 2020. RESUMO A presente pesquisa foi desenvolvida a partir do tema “O Assistente Social Frente A Violência Doméstica E Feminicídio”. Logo, a metodologia foi a revisão bibliográfica, onde buscou-se subsídios teóricos para a problemática: Descrever os principais motivos para a violência doméstica e o femicídio; Trazer visibilidade para conhecer melhor a dimensão e o contexto da violência mais extrema contra as mulheres; Explicitar os dados da violência doméstica e do feminicídio através de pesquisas já realizadas e da literatura vigente. Nesse contexto, o objetivo geral foi analisar as intervenções profissionais dos Assistentes sociais junto às mulheres em situação de violência doméstica e o feminicídio. Entre os resultados discutidos, apresentou-se que as intervenções, embora tenham caráter individual, possuem um norteamento coletivo, conforme as dimensões teórico-metodológicas, técnico- operativas e ético-políticas nos encaminhamentos de enfrentamento à violência visando que a vítima tenha seus direitos garantidos. Percebeu-se também, a importância das equipes multi e interdisciplinares no atendimento das mulheres em situação de violência doméstica e familiar, além da articulação dos diferentes setores que compõem as chamadas redes de apoio à mulher, disponibilizados para o enfrentamento da violência. Palavras-chave: Violência doméstica. Assistente Social. Feminicídio SANTOS. Camila Gonçalves dos. The Social Worker Facing Domestic Violence And Feminicide. Graduation Work in Social Work. UNOPAR - North University of Paraná. Campina Grande, 2020. ABSTRACT This research was developed based on the theme “The Social Worker Facing Domestic Violence And Feminicide”. Therefore, the methodology was a bibliographic review, which sought theoretical support for the problem: Describe the main reasons for domestic violence and femicide; Bring visibility to better understand the dimension and context of the most extreme violence against women; Explain the data on domestic violence and feminicide through research already carried out and the current literature. In this context, the general objective was to analyze the social workers' professional interventions with women in situations of domestic violence and feminicide. Among the results discussed, it was shown that the interventions, although individual, have a collective orientation, according to the theoretical-methodological, technical- operative and ethical-political dimensions in referrals to confront violence aiming at ensuring that the victim has her rights guaranteed . It was also noticed the importance of multi and interdisciplinary teams in the care of women in situations of domestic and family violence, in addition to the articulation of the different sectors that make up the so-called support networks for women, available to face violence. Keywords: Domestic violence. Social Assistent. Femicide SUMÁRIO 1. 9 2. 11 2.1A violência doméstica no Brasil 12 3. 15 3.1 Tipificação da violência segundo a Lei Maria da Penha 18 3.2 Atuação do Profissional Assistente Social frente a temática da violência doméstica e o fenômeno do feminicídio 20 4. 24 5. CONSIDERAÇOES FINAIS 26 5. 28 9 1. INTRODUÇÃO No Brasil, o cenário que mais preocupa é o do feminicídio cometido por parceiro íntimo, em contexto de violência doméstica e familiar, e que geralmente é precedido por outras formas de violência e, portanto, poderia ser evitado. Trata-se de um problema global, que se apresenta com poucas variações em diferentes sociedades e culturas e se caracteriza como crime de gênero ao carregar traços como ódio, que exige a destruição da vítima, e também pode ser combinado com as práticas da violência sexual, tortura e/ou mutilação da vítima antes ou depois do assassinato. Violência, em seu significado mais frequente, quer dizer uso da força física, psicológica ou intelectual para obrigar outra pessoa a fazer algo que não está com vontade; é constranger, é tolher a liberdade, é incomodar, é impedir a outra pessoa de manifestar seu desejo e sua vontade, sob pena de viver gravemente ameaçada ou até mesmo ser espancada, lesionada ou morta. É um meio de coagir, de submeter outrem ao seu domínio, é uma violação dos direitos essenciais do ser humano. Assim, a violência pode ser compreendia como uma forma de restringir a liberdade de uma pessoa ou de um grupo de pessoas, reprimindo e ofendendo física ou moralmente (TELES, 2003, p. 15). Feminicídio é o homicídio doloso praticado contra a mulher por “razões da condição de sexo feminino”, ou seja, desprezando, menosprezando, desconsiderando a dignidade da vítima enquanto mulher, como se as pessoas do sexo feminino tivessem menos direitos do que as do sexo masculino. Diversos casos de feminicídio enchem as telas dos jornais diários e das redes sociais, estão em toda parte como uma epidemia que não tem fim, um dos casos envolvendo violência doméstica ganharam repercussão mundial e deu origem a lei mais importante de combate a violência doméstica e ao feminicídio, foi o caso da farmacêutica Maria da Penha Fernandes, que ficou paraplégica após sofrer duas tentativas de homicídio cometidas pelo marido, que, além de impune, estava prestes a conseguir a prescrição do crime, levando para o debate público questões que antes eram tratadas apenas em âmbito particular. A violência contra amulher não é um fato recente, desde os primórdios da humanidade as mulheres vêm sendo vítimas de agressões, muitas vezes 10 chegando a óbito. Por outro lado, o que é novo, é a responsabilidade de vencer tal violência, como condição para a construção da humanidade, visto que o Feminicídio define-se como a expressão máxima da violência contra a mulher. (FONSECA et all, 2018, P.50) Isso demonstra claramente um marco divisório, pois é a partir do reconhecimento da violência contra a mulher como uma questão de caráter público e universal que o Estado toma para si esse fenômeno tão antigo e aceito pela sociedade e cria medidas que visam coibir e punir esse tipo de violência. Ao enfocar a emergência da questão social, percebemos que o objeto de nossa profissão, a classe trabalhadora não se resignou, mas, ao contrário, protestou por melhores condições de vida e trabalho. Esse percurso foi traçado para conseguirmos compreender a importância da profissão denominada como Serviço Social e qual era sua função social, seus atuais desafios para a concretização dos objetivos dessa profissão comprometida com a emancipação da classe trabalhadora, através da total garantia de direitos e a atuação dos assistentes sociais com a problemática da violência contra a mulher e o feminicídio. A Lei nº 11.340/2006, conhecida como Lei Maria da Penha, representa um marco na proteção aos direitos das mulheres, pois tem como premissa coibir e prevenir todas as formas de violência doméstica e familiar. Do mesmo modo, em março de 2015, no Brasil, o feminicídio foi tipificado como conduta criminosa, através da Lei n. 13.104/2015. (FONSECA et all, 2018, p. 50) O objetivo geral desse trabalho foi analisar as intervenções profissionais dos Assistentes sociais junto às mulheres em situação de violência doméstica e o feminicidio a luz da literatura, e os objetivos específicos; Descrever os principais motivos para a violência doméstica e o femicídio; Trazer visibilidade para conhecer melhor a dimensão e o contexto da violência mais extrema contra as mulheres; Explicitar os dados da violência doméstica e do feminicídio através de pesquisas já realizadas e da literatura vigente. Partindo desse pressuposto muitas questões nos inquietaram e uma delas é diante de uma Lei tão bem elaborada e abrangente como a Maria da Penha, porque os números da violência doméstica e o feminicídio só crescem? Quais os entraves na aplicação e efetivação da lei para que estes crimes sejam evitados? Essas e outras questões farão parte do debate desse trabalho. Rigorosamente, a relação violenta se constitui em verdadeira prisão. Neste sentido, o próprio gênero acaba por se revelar uma camisa de força: o homem deve agredir, porque macho deve dominar a qualquer custo; e mulher 11 deve suportar agressões de toda ordem, porque seu "destino" assim determina. (SAFFIOTI, 1999). Assim sendo, entender as causas da violência de gênero, que são ao mesmo tempo tão escandalosas e tão escamoteadas em nossa sociedade, uma questão de alta complexidade e relevância social e profissional, visto que há uma persistência de situações de violência contra a mulher ao longo do tempo. Dessa forma, acreditamos que estudos, como é o caso dessa pesquisa, podem contribuir para qualificar a intervenção do assistente social e melhorar a formulação de políticas públicas dirigidas a esse segmento significativo da população brasileira. As pesquisas nesse sentido podem contribuir para qualificar a intervenção do assistente social e melhorar a formulação de políticas públicas dirigidas a esse segmento significativo da população brasileira. 2. REVISÃO BIBLIOGRAFICA 2.1A violência doméstica no Brasil Entende-se por violência o rompimento de qualquer integridade da pessoa vitimada, seja integridade física, moral, psíquica e sexual (SAFFIOTI, 2001, p.17). uma pesquisa encomendada pelo Fórum Brasileiro de Segurança, realizada pela Datafolha mostrou que 22% das brasileiras sofrem 12 agressões verbais no ano de 2016, resultando 12 milhões de mulheres. Um dado que chama a atenção é o silêncio das vítimas, 52% das mulheres ficaram caladas diante da violência sofrida, 11% procuraram a delegacia da mulher e 13% preferiram o apoio de familiares. Vale ressaltar que 63% das agressões ocorreram dentro de casa, onde seria um lugar de refúgio e paz, acaba sendo lugar de dor e desespero. Os 39% restante receberam agressões na rua, conforme pesquisa realizada pela Datafolha no ano de 2016 (SEBASTIAO, 2018, P 14) A violência contra a mulher ampliou-se no Brasil a partir da década de 1970 com a Convenção para a Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra a Mulher sendo adotada pela Assembleia Geral. Nesse período, muitos movimentos sociais existentes se ampliaram nessa temática, na busca por diminuir os números dessa violência que havia tomando grandes avançando na compreensão das políticas públicas para que o assunto seja inserido nas pautas de discussão acerca da segurança no país. Anteriormente nos anos de 1930 a questão social se aprofunda no Brasil, onde se intensificaram diversas transformações culturais, políticas e sociais. Trata-se do respeito ao conjunto das expressões das desigualdades sociais geradas pelo sistema capitalista e suas resistências aos enfrentamentos de determinadas expressões. Em face disso, pode-se perceber que a profissão de Assistente Social no Brasil sempre foi rodeada por traços burgueses que não permitiam a visualização do cidadão portadores de direitos, mas sim como receptores de favores e benefícios. O assistente social presencia muitas formas de desigualdades sociais, particularmente contra as mulheres, e cabe a ele tornar público as situações para que sejam enfrentadas visando diminuir ou exterminar o problema, sendo de fundamental importância sua presença nas delegacias da mulher e participação nas tomadas de decisões em torno das políticas públicas e projetos lançados pelo governo. (SEBASTIÃO, 2018, P.14) São diversas as questões que envolvem essa violência, inclui-se as questões de gênero, a sociedade sempre foi marcada pela hegemonidade masculina, o pai e marido como provedor e a mulher como a dona de casa e mãe submissa que sempre deveu obediência ao macho desde os primórdios. De acordo Bandeira (1997) em meados do século XX, a categoria gênero surge com o objetivo de evidenciar a opressão feminina e o caráter de construção histórica e social sobre a desigualdade entre homens e mulheres. O conceito de gênero está relacionado às relações culturais e sociais que estruturam 13 a sociedade, respondendo às características de pertencimento dos seres humanos a um ou outro sexo. A categoria gênero movimenta toda a gama de estruturas, identidades sociais e subjetividades individuais (ALMEIDA, 2011). O gênero surgiu para descontruir o conceito de que ser mulher é uma condição dada pela natureza. De acordo com Suarez (2000) a diferença entre a natureza e a cultura não pode ser considerada universal, pois ainda que em forma cultural, a masculinidade é revelada pelo essencialismo presente na dicotomia com um todo. Diante deste fenômeno, presente no espaço social, encontra-se a violência contra a mulher. O primeiro documento internacional de direitos humanos que aborda esta violência foi aprovado em 1993, na Assembléia Geral das Nações Unidas. Esse documento define violência contra a mulher como qualquer ato de violência baseado no gênero que resulta, ou tenha probabilidade de resultar, dano ou sofrimento físico, sexual e psicológico, incluindo ameaça, coação ou privação arbitrária de liberdade, na vida pública ou privada (SANTI, 2010, p. 418). A violência de gênero surge de relações desestruturadas entre homens e mulheres, que adquiriu variadas formas ao longoda história, fixando papeis, status, lugares e poderes desiguais na família, no trabalho, na política, etc. Gênero é uma categoria que tem sido normalmente usada para descrever as relações homem e mulher, onde são naturalizadas as atribuições sociais, convertendo diferenças em fontes de desigualdade e dominação, que podemos denominar de “patriarcal”. O poder patriarcal se mantém, assim, na desigualdade entre os gêneros masculino e feminino, que além de se manifestar em diversas esferas sociais, incide sobre o corpo e a sexualidade da mulher. Historicamente quando as mulheres ultrapassam os papeis sociais que as são determinados, o poder patriarcal é, direta ou indiretamente, contestado ou ameaçado. Como resposta é comum surgirem situações de violência física e/ou psicológica. A violência tem como principal característica pelo uso da força psicológica ou intelectual para obrigar uma pessoa a praticar algo que não deseja, constrangendo, incomodando e impedindo a outra pessoa de manifestar sua própria vontade. São muitos motivos que podem desenvolver a agressão entre as pessoas, como a pobreza, desigualdade, desemprego, discriminação. Importante ressaltar que a violência não está somente associada à classe de menor poder aquisitivo, mas também está presente em todas as camadas sociais, não importando idade, raça, religião, sexo. (TELES E MELO,2003) 14 Na maioria dos casos os atos de violência acontecem de forma oculta e silenciosa, onde o agressor domina emocionalmente a vítima, fazendo com que esteja sempre em estado de atenção com medo do que virá a acontecer caso suas vontades não sejam atendidas. O agressor passa a violar os direitos primordiais do ser humano. Não é identidade entre homens e mulheres que queremos reclamar, mas uma diversidade historicamente variável mais complexa do que aquela que é permitida pela oposição macho/fêmea, uma diversidade que é também diferentemente expressada para diferentes propósitos em diferentes contextos. Na verdade, a dualidade criada por essa oposição traça uma linha de diferença, investe-a com explanações biológicas, e então trata cada lado da oposição como fenômeno unitário (...). Em contraste, nossa meta é ver não somente diferenças entre os sexos, mas também o modo como essas trabalham para represar as diferenças dentro dos grupos de gênero. A identidade construída em cada lado da oposição binária esconde o múltiplo jogo de diferenças e mantém sua irrelevância e invisibilidade (SCOTT, p. 46, 1986, apud LOURO, p. 116, 1995). A violência de gênero está relacionada às agressões realizadas de um sexo sobre o sexo oposto, normalmente ocorrem no seio familiar e que raramente são denunciadas por vergonha ou preconceito. Pode-se atribuir à violência de gênero também as agressões físicas e psíquicas. Esse conceito coloca claramente o ser mulher e o ser homem como conceito singular, a partir do que é estabelecido como feminino e masculino, assim como os papeis os papeis destinados a cada um na sociedade. Já o conceito de divisão sexual do trabalho, que expressa diretamente uma divisão social do trabalho entre os gêneros masculino e feminino, decorrente do modo capitalista de produção, em que as mulheres ocupam posições secundárias e de nível inferior. Onde a diferença entre o trabalho feminino e masculino é gritante mesmo quando ocupam as mesmas profissões. Esse conceito surgiu na França no início dos anos 1970, impulsionado pelo movimento feminista que reivindicava o reconhecimento das atividades do lar como trabalho, pois este, não tinha visibilidade, mesmo sendo executado por muitas mulheres em todo o país. Foi com a tomada de consciência de uma “opressão” específica que teve início o movimento das mulheres: torna-se então coletivamente “evidente” que uma enorme massa de trabalho é efetuada gratuitamente pelas mulheres, que esse trabalho é invisível, que é realizado não para elas mesmas, mas para outros, e sempre em nome da natureza, do amor e do dever materno (HIRATA; KERGOAT, 2007. p. 597). 15 O sistema capitalista se desenvolveu com bases no patriarcalismo, beneficiando a diferenciação entre os sexos no mundo do trabalho, ou seja, essa histórica desigualdade imposta ao gênero feminino penetrou a estrutura produtiva e favoreceu a naturalização de atividades subalternas destinadas a responsabilidade feminina. Notou-se um crescimento da participação das mulheres no mercado de trabalho, tanto nas áreas formais quanto nas informais da vida econômica, assim como no setor de serviços. Contudo, essa participação se traduz principalmente em empregos precários e vulneráveis, como tem sido o caso na Ásia, Europa e América Latina. (HIRATA, 2001. P.143) Ou seja, no atual modelo de societário, a desigualdade social e a precarização do trabalho continuam muito presentes, grande parte dos lares brasileiros tem a mulher como provedora tornando o subemprego uma alternativa para sustentar a família, sair do desemprego e tentar propiciar melhores condições de vida para os filhos. Pode-se dizer que as desigualdades de salários, de condições de trabalho e de saúde não diminuíram, e que a divisão do trabalho doméstico não se modificou substancialmente, a despeito de um maior envolvimento nas responsabilidades profissionais por parte das mulheres. (HIRATA, 2001. p.144) se faz necessário o crescimento de estudos e pesquisas que possam possibilitar o mapeamento da violência doméstica no Brasil. Esta é um fenômeno complexo, suas causas são múltiplas e de difícil definição. 3. A LEI MARIA DA PENHA A cada ano, milhares de mulheres são mortas pela violência no mundo. Esse fenômeno se traduz em abusos físicos, sexuais, patrimoniais, psicológicos e morais. A violência doméstica era entendida como um tipo de abuso na qual marido e mulher deveriam resolver sozinhos, conforme o conhecido ditado: “em briga de marido e mulher ninguém mete a colher”. No entanto, com a Lei Maria da Penha, o Estado toma para si a responsabilidade de proteger as mulheres desses abusos, deixando então de ser uma questão meramente de âmbito privado. Esta Lei, portanto, constitui-se em um grande avanço na luta das mulheres pela erradicação, prevenção e punição da violência. 16 Em virtude da preocupação com esse tipo de realidade que é vivenciada por mulheres em todo o mundo, instrumentos internacionais foram criados. São eles: a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW), adotada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, em 18 de dezembro de 1979, que entrou em vigor em 3 de setembro de 1981; o Plano de Ação da IV Conferência Mundial sobre a Mulher (1995); a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher (Convenção de Belém do Pará, 1994); o Protocolo Facultativo à Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher, além de outros instrumentos de Direitos Humanos. (VELOSO, 2013, P. 24) A Lei Maria da Penha – Lei nº 11.340/06 – representa um marco na proteção aos direitos das mulheres, pois, de maneira geral teve como premissa essencial coibir e prevenir todas as formas de violência doméstica e familiar, nos termos do artigo 226 da Constituição Federal de 1988, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Contra as Mulheres e da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência Contra a Mulher, ratificado pelo Brasil. As mortes de mulheres por questões de gênero, chamadas de feminicídio, encontram-se presentes em todos os níveis da sociedade e, conforme anteriormente apresentado, são decorrentes de uma cultura de dominação e desigualdade nas relações de poder existente entre homens e mulheres, produzindo a inferiorização da condição feminina, resultando na forma mais extrema da violência contra as mulheres,que é o óbito (OLIVEIRA, 2015). O crime de feminicídio íntimo está previsto na legislação desde a entrada em vigor da Lei nº 13.104/2015, que alterou o art. 121 do Código Penal (Decreto-Lei nº 2.848/1940), para prever o feminicídio como circunstância qualificadora do crime de homicídio. Assim, o assassinato de uma mulher cometido por razões da condição de sexo feminino, isto é, quando o crime envolve: “violência doméstica e familiar e/ou menosprezo ou discriminação à condição de mulher”. (BRASIL, 1988) Quando falamos e nos preocupamos com a violência, a primeira imagem, a face mais imediata e sensível, é a que se exprime pela agressão. Contudo, a violência é um produto histórico, e não é uma é múltipla (MYNAIO, 2003, p.25). Os parâmetros que definem a violência doméstica contra a mulher, por sua vez, estão estabelecidos pela Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340) desde 2006: qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13104.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11340.htm 17 lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial, no âmbito da unidade doméstica, da família ou em qualquer relação íntima de afeto, independentemente de orientação sexual. A Lei de Feminicídio foi criada a partir de uma recomendação da CPMI que investigou a violência contra as mulheres nos Estados brasileiros, de março de 2012 a julho de 2013. Em virtude dessa realidade, em março de 2015, no Brasil, o feminicídio foi tipificado como conduta criminosa através da Lei nº 13.104/2015, na qual o Estado reconhece quão grave e danoso é, para a sociedade, o homicídio de mulheres, no sentido de promover a justiça de gênero com o propósito de diminuir as práticas discriminatórias ainda presentes no Direito e no Poder Judiciário. Entretanto, o debate referente ao feminicídio ainda suscita controvérsias e tensões, pela compreensão de que a simples judicialização, ou seja, a tipificação da conduta violenta como crime não seria o caminho mais eficaz para a mitigação ou o banimento deste fenômeno da realidade social (GOMES, 2015). É importante lembrar que, ao incluir no Código Penal o feminicídio como circunstância qualificadora do crime de homicídio, o feminicídio foi adicionado ao rol dos crimes hediondos (Lei nº 8.072/1990), tal qual o estupro, genocídio e latrocínio, entre outros. A pena prevista para o homicídio qualificado é de reclusão de 12 a 30 anos. Em análise à Lei 11.340/06, observamos que a mesma detém consideráveis repercussões no âmbito jurídico, criando trâmite inovador de garantia, decorrentes dos acréscimos efetivados no campo do Direito Penal, do Processo Penal, da Execução Penal, do Direito Civil, do Processo Civil, do Direito Administrativo, do Direito Trabalhista e do Previdenciário, tudo isso para maximizar a ordem jurídica no que se refere à integração sistêmica de benefícios assistenciais e de proteção, buscando, sempre a devida concreção dos direitos e garantias fundamentais, na máxima constitucional do princípio da inafastabilidade (CAMPOS, 2012, p. 145). O principal ganho com a Lei do Feminicídio (Lei nº 13.104/2015) é justamente tirar o problema da invisibilidade. Além da punição mais grave para os que cometerem o crime contra a vida, a tipificação é vista por especialistas como uma oportunidade para dimensionar a violência contra as mulheres no País, quando ela chega ao desfecho extremo do assassinato, permitindo, assim, o aprimoramento das políticas públicas para coibi-la e preveni-la. http://www.compromissoeatitude.org.br/mapa-da-cpmi/ http://www.compromissoeatitude.org.br/mapa-da-cpmi/ http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8072.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13104.htm 18 O dia 25 de novembro de 1981 foi instituído como o Dia Internacional da Não – Violência contra mulher. Desde então, o movimento organizado de mulheres realiza campanhas neste dia, buscando combater a violência que infringe a mulher sob as mais diversas formas. Um dos mais importantes projetos em vigor á a Lei Maria da Penha. Este projeto, fruto do movimento organizado de mulheres, teve respaldo total no Governo Lula, que envio ao Congresso em 2004 (DIREITOS DAS MULHERES, 2012, p.40) Um levantamento realizado no Distrito Federal em 2013 (Pesquisa Impacto dos Laudos Periciais no Julgamento de Homicídios de Mulheres em Contexto de Violência Doméstica ou Familiar no Distrito Federal (Anis/Senasp, 2013) revelou que nos Tribunais do Júri, onde são julgados os crimes contra a vida, os operadores de Justiça ainda aplicam pouco a Lei Maria da Penha nos casos de homicídio de mulheres: a menção expressa à Lei nº 11.340/2006 apareceu em apenas 33% das peças do processo de homicídio de mulheres, entre os anos de 2006 e 2011. (Brasil, 2012) Esse resultado sugere que o contexto da violência sistêmica contra as mulheres, que está nas raízes de grande parte dos assassinatos, ainda é pouco reconhecido pelos operadores do Direito, o que acaba por interferir na aplicação da Justiça, pois a Lei Maria da Penha introduziu no Código Penal a violência contra a mulher como circunstância agravante de pena. 3.1 Tipificação da violência segundo a Lei Maria da Penha A Lei Maria da Penha estabelece cinco tipos de violência doméstica contra a mulher relacionadas no Art. 7º da Lei 11.340/2006: Violência física – ação do agressor contra a integridade ou saúde corporal da vítima como: empurrar, sacudir, esbofetear, chutar, queimar, etc. Violência psicológica – ação do agressor contra a mulher que causa danos de ordem emocional. Exemplos: insulto, chantagem, ridicularização, humilhação, constrangimento, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição, limitação do direito de ir e vir. Esse tipo de violência normalmente acompanha a violência física, até mesmo como forma de coibir a vítima a não denunciar a agressão sofrida. Pode ser confundida como excesso de cuidado por parte do agressor e não ser assim identificada como violência pela vítima. Violência sexual - ação do agressor que constranja a mulher a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, diante de ameaças, coações ou do uso direto da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, http://www.compromissoeatitude.org.br/wp-content/uploads/2013/03/ANIS_-_LAUDOS_PERICIAIS.pdf http://www.compromissoeatitude.org.br/wp-content/uploads/2013/03/ANIS_-_LAUDOS_PERICIAIS.pdf http://www.compromissoeatitude.org.br/wp-content/uploads/2013/03/ANIS_-_LAUDOS_PERICIAIS.pdf http://www.compromissoeatitude.org.br/wp-content/uploads/2013/03/ANIS_-_LAUDOS_PERICIAIS.pdf 19 de qualquer modo, a sua sexualidade. Está incluído neste tipo de violência o impedimento da mulher usar método contraceptivo e a obrigação da mulher abortar mediante força ou ameaça. É um tipo de violência que gera medo, culpa e vergonha, o que dificulta muitas mulheres de denunciá-la. Na maior parte das vezes essa agressão só é denunciada quando praticada por um estranho, fator que contribui para o escamoteamento da violência gerida no interior da família. Violência patrimonial - qualquer ação que possa causar dano aos bens da mulher como documentos pessoais e instrumentos de trabalho. Esse tipo de violência é utilizada, muitas vezes, para que a mulher passe a não ter controle dos próprios bens, ficando cada vez mais dependente do parceiro. Alguns companheiros podem se apossar dos bens materiais de suas companheiras, além de atrapalhar seu trabalho ou impedi-las de trabalhar. Esse tipo de conduta evidencia a possessividade e o controle que o homem pretende exercer sobre a mulher. Violência moral – conduta por parte do agressor que possa caluniar ou difamar a mulher. As mulheres são comumente vítimas da violência moral dentro do ambientede trabalho, em muitos casos isso ocorre em virtude do assédio sexual a que são submetidas. Sua capacidade profissional e atuação são postas em xeque, podem ser também desmerecidas publicamente, gerando maus resultados na avaliação do desempenho do trabalho, assim como a perda da vontade de trabalhar. 3.2 Atuação do Profissional Assistente Social frente a temática da violência doméstica e o fenômeno do feminicídio No início do século XIX, nos primórdios da industrialização com a massa de trabalhadores rurais excluídos do campo surgem as primeiras impressões da “Questão Social, a indústria não absorveu esses trabalhadores transformando em uma grande massa de miseráveis. Segundo Castel (2000), essa população, que se encontrava a margem da sociedade industrial, era denominada como uma ameaça à ordem social vigente, pois poderiam se revoltar e “contaminar” todo o corpo social. São essas populações flutuantes, miseráveis, não socializadas, cortadas de seus vínculos rurais e que ameaçam a ordem social, seja pela violência revolucionaria, seja como uma gangrena. Aliás, essa é uma palavra utilizada no vocabulário da época, uma espécie de contaminação da miséria, da desgraça que infectaria progressivamente todo o corpo social. (CASTEL, p.239. 2000). 20 A história mostra que o Serviço Social, enquanto profissão, caminhou paralelo às conquistas do movimento feminista e integrou na sua agenda a discussão relativa à problemática da violência contra a mulher. Enquanto o movimento feminista lutava pelos direitos da mulher, publicizando e dando visibilidade para a questão da violência contra ela, o Serviço Social, como profissão, tentava avançar na superação de um patamar conservador, conforme Netto (1991), deixando para trás suas raízes vinculadas à doutrina social da Igreja para assumir uma postura mais crítica frente à sociedade e por esta questão passou a interagir diretamente na temática da violência contra a mulher tardiamente. Assim, a condição de trabalhador assalariado, regulada por um contrato de trabalho impregna o trabalho profissional de dilemas da alienação e de determinações sociais que afetam a coletividade dos trabalhadores, ainda que se expressem de modo particular no âmbito desse trabalho qualificado e complexo (IAMAMOTO, 2008 p. 215). A profissão vai se afirmar em nosso país como integrante do setor público, consolidando-se como parte do aparato estatal e de empresas privadas, sendo o assistente social um assalariado a serviço delas, e por este motivo, não sendo possível pensar a profissão no processo de reprodução das relações sociais separado das instituições que o empregam (IAMAMOTO E CARVALHO, 2004). O Serviço Social é uma profissão historicamente determinada, tem sua gênese intrinsecamente ligada às relações sociais construídas com o surgimento do sistema capitalista, essas relações sociais desde a industrialização - marco do sistema capitalista - se constituem de forma antagônica e contraditória. A proposta para o Serviço Social em seu surgimento é determinada pelas classes dominantes e influência da Igreja Católica. Tem como proposição a intervenção e atuação ante a “questão social”, implementando uma ação doutrinária e corretiva que buscava um consenso entre as classes dominantes e trabalhadoras, objetivando a construção de uma legitimação política para as classes dominantes, e uma legitimação ideológica para a Igreja Católica. (Czapski, 2016, p.314) O Código de Ética da profissão também tem sido um marco orientador para a intervenção dos assistentes sociais, na medida em que explicita a dimensão ético-política que os profissionais devem assumir perante os usuários, através de seus onze princípios fundamentais. Igualmente o projeto ético-político da profissão tem orientado as bases teórico-metodológicas, na medida em que pretende despertar o profissional de Serviço Social para o seu compromisso com a população excluída, na perspectiva de tornar-se um intelectual orgânico que atua na viabilização e no fortalecimento do saber e do poder popular no cotidiano. 21 De acordo com o Código de Ética o assistente social tem o compromisso de respeitar o usuário diante dos seus valores conforme rege as leis determinada pela Ética do profissional. O Assistente Social tem como compromisso auxiliar na defesa dos direitos dos usuários, vivenciando novos conceitos, tomando novas iniciativas e desvinculando do passado, e adotando nova estratégia metodológica da atualidade como forma de assistência à sociedade. Em relação à temática da violência contra a mulher, o projeto ético- político convida os profissionais de Serviço Social a desempenhar seu papel, orientando, discutindo estratégias e encaminhando as mulheres para onde possam receber atendimento eficiente e ter os seus direitos garantidos. Chama-os, ainda, para lutar por políticas que venham ao encontro das necessidades básicas dessas mulheres, instigando-as a participarem de movimentos que visem ao fim da violência e à conquista dos seus direitos. Para tanto, é essencial que sejam aprofundados os conhecimentos teóricos sobre o objeto de intervenção da prática, para uma atuação competente e compromissada com este projeto ético-político. O Serviço Social é uma profissão interventiva, socialmente construída, inserida na divisão sociotécnica do trabalho. O assistente social tem a tarefa de responder com competência às demandas sociais apresentadas no seu cotidiano profissional, pois a natureza interventiva da profissão exige dos profissionais a utilização de instrumentos e técnicas articulados com as dimensões teórica, ética e política. O cotidiano é o espaço que oferece as oportunidades, os desafios e os limites para a ação profissional. Conhecer os contornos, as potencialidades, as demandas e as respostas possíveis é condição primeira para um exercício profissional competente e comprometido com os usuários. (LISBOA, 2005, P. 205) Nessa conjuntura, Iamamoto (1999) lembra que o momento presente desafia os assistentes sociais a se qualificarem para acompanhar, atualizar e explicar as mudanças da realidade social. O grande desafio na atualidade é, pois, transitar da bagagem teórica acumulada ao enraizamento da profissão na realidade, atribuindo, ao mesmo tempo, uma maior atenção às estratégias e técnicas do trabalho profissional, em função das particularidades dos temas que são objetos de estudo e ação do assistente social. (IAMAMOTO, 1999, P.52 Atualmente a intervenção profissional do Serviço Social se exerce dentro de um contexto institucional, com particularidades e interesses que exigem uma correlação de forças e mediações para que seja possível a sua realização. A questão social não pode ser tomada como objeto profissional do Serviço Social 22 brasileiro a partir de uma única concepção, pois entram em jogo novas configurações das relações sociais. Na atual conjuntura, os enfrentamentos de interesses, grupos e projetos, estão sendo vistos num processo complexo de relações de classe, gênero, raça, etnia, cultura, religiões, parentescos, trazendo à discussão as mediações da subjetividade e que não se resumem tout court na noção de questão social (FALEIROS, 1999, p.40). É necessário trazer para a discussão e colocar na pauta da ação profissional dos assistentes sociais essas outras dimensões da realidade, sobretudo a relação de gênero, que repercute diretamente na questão do poder e da violência. Trabalhar com os novos dilemas familiares, incluindo a questão da violência, da dependência química e das doenças crônicas, de um lado, e a agudização da pobreza, a ampliação e o fortalecimento da filantropia com os parcos recursos e deficiências das políticas sociais, de outro, tem-se apresentado como desafio para os profissionais de Serviço Social. O Serviço Social tem na questão social a base de sua fundaçãoenquanto especialização do trabalho. Os Assistentes sociais, por meio da prestação de serviço sócio-assistenciais – indissociáveis de uma dimensão educativa (ou político-ideológico) – realizada nas instituições públicas e organizações privadas, interferem nas relações sociais cotidianas, no atendimento às variadas expressões da questão social, tais como experimentadas pelos indivíduos sociais no trabalho, família, na luta pela moradia e pela terra, na saúde, na assistência social pública, entre outras dimensões.” (IAMAMOTO, 2008, p.163). São muitos os desafios que o profissional de Serviço Social enfrenta no combate à violência doméstica. Os serviços disponíveis onde se inserem estes profissionais, tanto nas áreas da saúde, da segurança pública e da assistência social não conseguem atender às mulheres de forma integral e articulada. [...] a problemática da violência contra a mulher, especialmente, nas últimas décadas, ganhou espaço nas discussões acadêmicas e, mais gerais, adentrou o campo da intervenção do Serviço Social, mediante o planejamento, a formulação e a execução de políticas públicas de prevenção e combate à violência contra mulher nos diversos espaços sócio ocupacionais em que se insere (INÁCIO, 2010,p.4). O Serviço Social atua no combate à violência doméstica inserido nas instituições que prestam atendimento à mulher vítima de violência, após a reconceituação da profissão e a defesa de um projeto ético-político em favor da construção de uma sociedade mais justa, a profissão tem sido reconhecida, 23 valorizada e requisitada, configurando um espaço na divisão sócio técnica do trabalho, merecendo a confiança das outras profissões e entidades diversas, conquistando espaço e demarcando a identidade da assistência social. Para entender a atuação desta categoria na violência doméstica, é preciso apreender que a profissão atua embasada em três dimensões: a dimensão ético política, a dimensão teórico metodológica e a dimensão técnico operativa. A dimensão ético-política tem orientado a profissão a exercer um papel no sentido de orientar as mulheres discutindo com estas seus direitos, e se posicionando a favor da luta por políticas que venham a suprir as necessidades reais das vítimas desse mal. Deve-se ressaltar a importância da proposição e implementação de ações afirmativas para mulheres submetidas à violência de gênero. São medidas que, se executadas por profissionais com qualificação para o tema, em uma perspectiva feminista (isto é, que questione radicalmente a matriz hegemônica de gênero), representam importantes estratégias de acolhida, reflexão, orientação e fortalecimento da cidadania das mulheres, dão visibilidade ao fenômeno, provocam debates sobre suas dimensões e implicações e significam o reconhecimento por parte do poder público da existência das desigualdades que, por intermédio dessas ações, busca-se reparar. (ALMEIDA 2005, p.7) O assistente social precisa criar estratégias capazes de driblar as correlações de forças desfavoráveis e superar as dificuldades encontradas no cotidiano profissional, visto que é o técnico chamado para implementar e viabilizar direitos sociais. É sem dúvida um grande desafio, uma vez que o mesmo se vê tolhido, já que necessita de recursos, condições e meios de trabalho que vão se tornando cada vez mais escassos nessa conjuntura, tornando a concretização de políticas públicas uma ação muito difícil. Nesse sentido, o projeto profissional do assistente social faz total diferença na luta pelos direitos sociais das mulheres e seus familiares que são vítimas da violência doméstica. É necessário agir de forma a difundir uma cultura democrática, que preferencie a participação ativa dos sujeitos sociais. 24 4. METODOLOGIA Para se alcançar os objetivos propostos neste trabalho, utiliza-se como metodologia a revisão bibliográfica, a fim de trazer os principais conceitos e posicionamentos acerca da temática em questão. Lakatos e Marconi (2012 p.43,44), “trata-se de levantamento de toda a bibliografia já publicada, em forma de livros, revistas, publicações avulsas e imprensa escrita, sua finalidade é colocar o pesquisador em contato direto com tudo o que foi escrito sobre determinado assunto”. A metodologia inclui as concepções teóricas de abordagem, o conjunto de técnicas que possibilitam a apreensão da realidade e também o potencial criativo do pesquisador (MINAYO, 2003 p.22). Nessa pesquisa bibliográfica utilizou-se livros, periódicos e artigos científicos, com os seguintes descritores de forma isolada e associada: Violência doméstica e Feminicídio. O método de análise utilizado foi o qualitativo, o qual proporcionou a formulação das discussões sobre os principais resultados e conclusões do estudo estabelecimento dos critérios para a seleção da amostra; representação das características da pesquisa original; análise dos dados; interpretação dos resultados; apresentação da revisão. 25 5. CONSIDERAÇOES FINAIS A violência doméstica não é exclusividade de nenhuma classe social, intelectual ou etnia. Atinge todos os países e culturas, de formas variadas. Essas agressões ocorrem dentro da residência da família, dificultando que sejam detectadas e solucionadas; pois apesar dos laços familiares envolverem relações de violência, contêm relações de carinho, amor e dependência. Esta tem caráter interpessoal, é abuso do poder disciplinador e coercitivo, podendo se prolongar por vários meses e até anos; é um processo de completa objetivação da vítima, reduzindo-a à condição de objeto de tratamento abusivo, uma forma de violação dos direitos essenciais. O profissional de Serviço Social tem que está qualificado para atuar nas diversas áreas ligadas à condução das políticas sociais públicas, seu principal objetivo é responder às demandas dos usuários dos serviços prestados dentro das instituições, afim de garantir atendimento humanizado e efetivação dos direitos. A ação e intervenção profissional dos Assistentes Sociais em demandas familiares, inclusive na questão da violência, se apresenta desafiadora, entretanto, vêm avançando com muita competência, o qual possibilita resgatar a dignidade humana. Violência doméstica contra a mulher, violência intrafamiliar e feminicídio, tem sido definida como uma relação de poder e conflito permanente, principalmente no âmbito familiar, o que demanda atendimento, encaminhamentos, orientação, informação e capacitação por parte de profissionais. No entanto, mesmo havendo avanços políticos e sociais ainda são insuficientes para minimizar o elevado índice de violência doméstica e feminicídio, presentes no Brasil e no mundo, que nos traz os questionamentos e reflexões constantes sobre a eficiência das políticas públicas e ações desenvolvidas nesse 26 segmento, diversas práticas e ações vem sendo desenvolvidas ao longo da história, no entanto ainda se mostram ineficazes diante desse fenômeno negativo. O trabalho do assistente social é de extrema importância dentro dessa perspectiva, porém vislumbramos profissionais cada vez mais desmotivados devidos aos baixos salários e desvalorização profissional, falta de incentivo para a educação permanente em serviço, é notório também, o acumulo de trabalho que é jogado para estes profissionais, realizando atribuições que não são suas, a precariedade dos vínculos de trabalho é outro fator importante que tem tornado o trabalho do assistente social mecanizado, o indivíduo é contratado para exercer funções que não são de sua competência e aceitam devido as questões de emprego e renda que estão cada vez mais complicadas no pais, e nos municípios de pequeno porte isso tende a piorar e muito, sendo um ponto extremamente negativo no combate a essa problemáticae as diversas outras existentes que demandam ação dessa classe trabalhadora. Porém, ainda existem profissionais capacitados e capazes e comprometidos que desenvolvem o trabalho com afinco, esses muito nos orgulham e representam a profissão. Mas é preciso que as nossas lutas sejam efetivadas e que sejamos valorizados com condições de trabalho, bons salários, onde possamos trabalhar em prol do direito da população tão carente e principalmente sermos portadores de boas notícias para essas mulheres tão sofridas que são as vítimas de violência doméstica e as famílias das vítimas de feminicídio, esse mal que se tornou uma verdadeira epidemia no Brasil e no mundo. Devemos explicitar também a importância das equipes multi e interdisciplinares no atendimento das mulheres em situação de violência doméstica e feminicídio, além da articulação dos diferentes setores que compõem as chamadas redes de apoio à mulher, disponibilizados para o enfrentamento da violência como um caminho a ser seguido, porém muito aquém das necessidades existentes e cada vez mais pungentes. O assistente social trabalha nas instituições que prestam atendimento às vítimas de agressão. É preciso lembrar que, após o Movimento de Reconceituação, a profissão mudou seu foco de investigação e debate, orientando suas ações na busca de uma sociedade igualitária. O profissional que atua com essa temática também necessita estar capacitado para lidar com a violência e com a complexidade desse fenômeno. É preciso ainda que haja um conhecimento da rede socioassistencial para que 27 possam ser feitos encaminhamentos que efetivamente contribuam para a mulher romper com a situação de violência em segurança, pois há de se considerar que no atendimento chegam casos de pouca e alta gravidade e, muitas vezes, a vida da mulher depende desse atendimento. Um dos maiores desafios para os assistentes sociais no combate a violência é construir uma efetiva rede de atendimento interdisciplinar, considerando essa como a articulação das ações entre as instituições e seus profissionais, que possam efetivamente amparar as vítimas da violência. E, claro, as dificuldades não ficam apenas no âmbito da assistência. Os serviços disponíveis, tanto na saúde, como na assistência e a segurança pública, atendem com déficit as mulheres vítimas de violência. 28 5. REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS ALMEIDA, Suely Souza. A violência de gênero como uma violação dos direitos humanos: a situação brasileira. UFM: II Jornada Internacional de Políticas Públicas. São Luís – MA, 23 a 26 de agosto 2005 ALMEIDA,Tânia Mara Campos de; PEREIRA, Bruna Cristina Jaquetto. Violência doméstica e familiar contra mulheres pretas e pardas no Brasil: reflexões pela ótica dos estudos feministas latino-americanos. 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