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Livro - Formação sócio-histórica do brasil

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Formação Socio-
Histórica do Brasil
Formação Socio-
Histórica do Brasil
Rodrigo Simões
Obra organizada pela Universidade Luterana do Brasil. Informamos que 
é de inteira responsabilidade dos autores a emissão de conceitos.
Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida por qualquer 
meio ou forma sem a prévia autorização da Editora da ULBRA.
A violação dos direitos autorais é crime estabelecido na Lei nº .610/98 
e punido pelo Artigo 184 do Código Penal.
Rodrigo Simões possui graduação em História pela Pontifícia Universidade 
Católica do Rio Grande do Sul (1995), mestrado em História pela Pontifícia 
Universidade Católica do Rio Grande do Sul (2000), especialização em Teoria 
e Prática Pós-Construtivista das Aprendizagens Escolares pelo Grupo de 
Estudos Sobre Educação, Metodologia de Pesquisa e Ação (2000), e Suficiencia 
en Investigación pela Universidad de León (1998). Atualmente, é professor/
coordenador de curso de História do Centro Universitário La Salle e professor 
adjunto da Universidade Luterana do Brasil. Tem experiência na área de História 
e educação, com ênfase em história da Europa e do Brasil, teoria, pesquisa e 
ensino de história, atuando principalmente nos seguintes temas: formação de 
professores, controle social, relações de poder e modernização das cidades.
Conselho Editorial EAD
Dóris Cristina Gedrat (coordenadora) 
Mara Lúcia Machado 
José Édil de Lima Alves 
Astomiro Romais 
Andrea Eick
ISBN 978-85-7528-?????????????????
Dados técnicos do livro 
Fontes: Minion Pro, Officina Sans 
Papel: offset 90g (miolo) e supremo 240g (capa) 
Medidas: 15x22cm
Projeto Gráfico: Humberto G. Schwert 
Editoração: Isabel Kubaski 
Impressão: Gráfica da ULBRA 
Junho/2010
Setor de Processamento Técnico da Biblioteca Martinho Lutero - ULBRA/Canoas
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
R696e Rodrigues, Maria Cláudia
Educação empresarial. / Maria Cláudia Rodrigues. – Canoas: Ed. ULBRA, 
2010. 
144 p. 
1. Administração – recursos humanos – educação. I. Título.
 CDU 658.3:37.035
Sumário
 Apresentação .............................................................. 7
 1 | Imaginário, história e verdade ....................................... 9
 2 | Os (des)encontros entre as culturas ................................ 27
 3 | A posse da terra, poderes e exclusões ........................... 41
 4 | O Estado, a Nação e a Política ..................................... 63
 5 | O desenvolvimento econômico e a dominação capitalista .....81
 6 | O que é ser cidadão? E no Brasil? ................................101
 7 | Conflitos, dominações e resistências ...........................121
 8 | Um Brasil, várias culturas ..........................................139
 9 | Globalização e sociedade de consumo ..........................155
 10 | 500 anos depois, um Brasil de contrastes .....................173
Apresentação
FALTA TEXTO FALTA TEXTO FALTA TEXTO FALTA TEXTO FALTA 
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8 Apresentação
1
Imaginário, história e verdade
Introdução
Este capítulo está dividido em cinco subtítulos nos quais faremos uma breve 
discussão sobre o papel da história e como esse papel foi se modificando no 
decorrer do tempo. Abordaremos as discussões em torno da relação existente 
entre a história e a verdade. Baseado nessa discussão historiográfica, faremos a 
análise do conceito de imaginário e, por meio dele, mostraremos a ideia que o 
europeu tinha sobre o Brasil e, em contrapartida, a visão de mundo dos indígenas, 
sua religiosidade e suas crenças. O texto conta ainda com a contextualização da 
Europa dos séculos XIV e XV, para que possamos compreender as mudanças 
ocorridas nesse período e as formas como isso é vivido em outras partes do 
mundo. Finalmente, faremos uma breve análise de como hoje nós brasileiros 
nos vemos e o que nos distingue dos outros povos.
1.1 A relação história e verdade e o conceito de 
imaginário
Os historiadores há pouco tempo acreditavam que o passado era bem 
organizado e ficava no seu lugar, esperando ser revelado em seu interior e 
totalidade, podendo ser interpretado de forma objetiva e neutra. Segundo 
Leopold Von Ranke, historiador alemão do século XIX, a função do historiador é 
mostrar os fatos “como eles realmente aconteceram” (RANK apud BURKE, 1992, 
10 Imaginário, história e verdade
p. 15). Hoje, os historiadores, ou a grande maioria deles, sabem que esse ideal 
de história é irrealista e que o conhecimento histórico não é tão simples assim; 
ele é complexo e envolve variadas discussões, questionamentos e contestações 
(RAGO apud JENKINS, 2001, p. 9).
A história nos permite interpretações distintas de um mesmo fenômeno, os 
discursos estão sempre sendo refeitos e desfeitos. Nenhum historiador consegue 
abarcar o passado em sua totalidade, o que se recupera são fragmentos, uma 
fração do que já aconteceu.
[...] a história é basicamente um discurso em litígio, um campo de 
batalha onde pessoas, classes e grupos elaboram autobiograficamente 
suas interpretações do passado para agradarem a si mesmos. Fora dessas 
pressões, não existe história definitiva. (JENKINS, 2001, p. 43)
A verdade está vinculada aos interesses materiais, diretamente relacionados 
a sistemas de poder que a produzem e sustentam.
A história não está fora do âmbito de poder [...] é produzida apenas 
em virtude de múltiplas formas de repressão. Cada sociedade [...] 
tem sua “política geral” de verdade, isto é, os tipos de discursos 
que ela escolhe e faz funcionar como verdadeiros, os mecanismos 
e as instâncias que permitem distinguir os enunciados verdadeiros 
dos falsos, a maneira como se sancionam uns e outros, as técnicas 
e procedimentos que são utilizados para obtenção da verdade, o 
estatuto daqueles que têm o encargo de dizer o que funciona como 
verdadeiro [...] (JAMESON apud JENKINS, 2001, p. 59)
Na atualidade, a historiografia propõe uma nova forma de fazer história, 
escrita como uma reação aos modelos tradicionais (factual e superficial), que 
diz respeito essencialmente à história política, centrada nos grandes feitos dos 
homens de renome, marginalizando e relegando ao esquecimento inúmeras 
histórias como a dos vencidos e a das minorias. A história tradicional é baseada 
nas fontes escritas, registros oficiais, que geralmente expressam apenas o ponto 
11Imaginário, história e verdade
de vista oficial – com esse “fetichismo” pelo documento escrito, outras fontes 
foram postas de lado.
Já a nova história, social e cultural, estabelece outros olhares sobre o passado, 
trazendo à tona aspectos considerados por muito tempo como periféricos pelo 
paradigma tradicional. Os historiadores que fazem parte dessa nova forma 
de olhar a história se preocupam com uma variedade de atividades humanas, 
afinal, para eles, “tudo tem uma história”. As fontes utilizadas são variadas, 
orais, visuais, não se prendendo ao documento oficial, tão valorizado pela 
historiografia tradicional.
A nova história, que revelou por estudos eruditos e precisos a 
presença do poder onde a história tradicional sequer pensava em 
procurá-lo (no simbólico e noimaginário, por exemplo), vê-se quase 
condenada, eu diria, por sua problemática a ser transparente nesse 
domínio. (LE GOFF, 2005, p. 5)
A nova história utiliza vários domínios ou conceitos-chave, um deles é o 
imaginário. O imaginário é o conjunto de ideias e imagens que fazem parte de uma 
determinada cultura, grupo ou sociedade. Segundo Jacques Le Goff, em seu livro O 
Imaginário Medieval, o imaginário pertence ao campo das representações, “quaisquer 
traduções mentais de uma realidade exterior percebida” (1994, p. 11).
O domínio do imaginário é constituído pelo conjunto das 
representações que exorbitam do limite colocado pelas constatações 
da experiência e pelos encadeamentos dedutivos que estas autorizam. 
Isto é, cada cultura, portanto cada sociedade, e até mesmo cada 
nível de uma sociedade complexa, tem seu imaginário. Em outras 
palavras, o limite entre o real e o imaginário revela-se variável [...] 
(PATLAGEAN apud LE GOFF, 2005, p. 391)
O imaginário possui um importante papel na construção histórica. 
Diferente do que se pensou, a compreensão da história requer muito mais do 
que a análise pura e simples do documento, são necessários outros domínios 
12 Imaginário, história e verdade
como o imaginário, que nos permite uma análise das representações contidas 
no cotidiano de um determinado grupo social. O estudo do imaginário e do 
cotidiano é tido pela atual historiografia como uma das possibilidades de se 
compreender as diversas formações socioculturais.
1.2 O imaginário europeu sobre o Brasil
Os europeus dos séculos XV e XVI, período em que ocorreram as grandes 
navegações, ainda estavam marcados pela religiosidade e impregnados pelo 
imaginário medieval. Para alguns, o oceano era habitado por monstros marinhos 
que devoravam as tripulações e onde reinava o imprevisível. Antes das viagens 
de descobrimento, circulavam pela Europa histórias de criaturas maravilhosas 
que habitavam o mundo, a exemplo de monstros, antípodas (criaturas com os 
pés virados para trás), cinocéfalos (criaturas que comiam carne humana e que 
tinham corpo de homem e cabeça de cachorro).
Fonte: http://4portasnamesa.blogspot.com
O imaginário sobre a América, o “novo continente”, era ambíguo. Por vezes, 
os europeus viam os indígenas como criaturas doces, inocentes, e o Novo Mundo 
como o paraíso edênico, noutros casos, tratavam-se de criaturas demoníacas, 
habitantes de um local inóspito e abandonado por Deus. Avançando um pouco 
no tempo, veremos que a visão paradisíaca está contida em vários trechos da 
carta de Pero Vaz de Caminha.
13Imaginário, história e verdade
Mas, a terra em si, é de muitos bons ares, frios e temperados como 
os de Entre-Doiro e Ninho, porque neste tempo de agora, assim os 
achávamos, como os de lá. Águas são muitas, infindas. E em tal 
maneira é graciosa, em querendo a aproveitar, dar-se-á nela tudo 
por bem das águas que tem.
Em um outro trecho ele descreve o indígena como um ser puro, inocente 
chegando a compará-lo com Adão.
...a que deram um pano com que se cobrissem e puseram-lho ao 
redor de si. Mas ao sentar não fazia memória de o muito entender 
para se cobrir. Assim, senhor, que a inocência desta gente é tal que 
a de Adão não seria mais quanto vergonha.
As pessoas que escreviam sobre os indígenas estavam inseridas na cultura 
e religião europeia, e o modo de viver dos índios foi pensado em oposição ao 
modelo de sociedade europeia, daí a identificação dos indígenas como “selvagens” 
ou “primitivos”. Michel de Montaigne possuía a ideia de que o “Novo Mundo” 
era o paraíso, como um modelo da idade do ouro, criticando a atribuição de 
selvagens ou bárbaros aos índios. Montaigne dizia que um homem não pode ser 
chamado de selvagem só por não ter sido modificado pela interferência de outro 
ser humano, “...não vejo nada de bárbaro ou selvagem no que dizem daqueles 
povos e, na verdade, cada qual considera bárbaro o que não se pratica em sua 
terra..” (MONTAIGNE, 1980, p. 101).
No início do período de colonização, a visão do “paraíso maravilhoso” 
começou a mudar. Os relatos de viajantes contribuíram para isso e foram de 
extrema importância para se conhecer a fauna, a flora e os costumes indígenas. 
O alemão Hans Staden, que em viagem para o Brasil em meados do século XVI 
caiu prisioneiro dos tupinambás, quando voltou para Alemanha descreveu em 
detalhes a sua experiência.
Os relatos de Staden serviram para se conhecer um pouco melhor o novo 
continente. Ele descreveu os rituais de antropofagia que os antigos tupis 
praticavam, causando pavor nos europeus. Para eles, esses rituais antropofágicos 
14 Imaginário, história e verdade
eram a própria imagem do primitivismo anárquico e caótico, e a visão do 
maravilhoso foi sendo deixada de lado.
Fonte: http://www.gauche-virtual.blogspot.com
A mudança da visão do indígena de bom selvagem para criatura demoníaca 
também está associada à inserção da agricultura no Brasil pelos portugueses. 
A partir de 1533, os índios começaram a ser vistos como um obstáculo para 
a posse da terra, portanto, o índio precisou passar de criatura inocente para 
bestial, justificando a expropriação das terras, a dominação e o extermínio 
(GIUCCI, 1992).
Em 1570, Pero Vaz de Magalhães Gandavo publicou uma História da 
província de Santa Cruz que demonstra essa forma etnocêntrica de pensar as 
demais culturas.
A língua desse gentio todo pela costa é uma: carece de três letras – não 
se acha nela F, nem L, nem R, coisa digna de espanto, porque assim 
não tem Fé, nem Lei, nem, Rei: e desta maneira vivem sem justiça e 
desordenadamente. (GANDAVO apud WEHLING, 2005, p. 87)
15Imaginário, história e verdade
A descoberta de um “novo mundo” repercutiu no campo teórico, tendo as 
antigas verdades como a das terras antípodas ou a impossibilidade de habitar 
as zonas tórridas tendo sido gradualmente refutadas. Cronistas espanhóis se 
encarregaram de salvaguardar a mensagem bíblica reformulando o campo do 
saber empírico e registrando as falhas dos sábios antigos.
A América provou que os antigos tinham aperfeiçoado uma imagem 
equivocada do mundo, que a tese da terra inhabitabilis era errônea, 
que o tenebroso oceano atlântico poderia ser navegado além dos 
pilares de Hércules, que milhões de pessoas nasciam e morriam 
ignorantes do evangelho redentor em terras remotas. (GIUCCI, 
1992, p. 196)
No entanto, em vez do rompimento, em muitos casos, o que podemos 
perceber foi o desenvolvimento de um discurso cujo objetivo era o de ligar o 
novo ao antigo, relacionando o descobrimento às passagens bíblicas. Os cronistas 
hispânicos colocaram em seus textos mitos e profecias que ligavam a América 
recém-descoberta ao passado, e a palavra sagrada e suas verdades continuaram 
relativamente intocadas.
1.3 A cosmovisão indígena
Cosmovisão é a forma como uma determinada sociedade ou cultura vê o 
mundo. Essa forma varia de um povo para outro e depende, fundamentalmente, 
dos elementos da cultura reconhecidos pelo grupo em questão. A cosmovisão 
indígena era diferente da forma como o europeu interpretava o mundo à sua 
volta. O cotidiano das populações indígenas contava com a constante presença 
de mitos e lendas, sendo povoado por forças naturais. Na maioria das lendas 
guaranis Tupã, o deus sol, com a ajuda da deusa lua Araci, realizou a criação. 
Segundo a lenda, ele desceu à Terra e criou tudo que há nela, incluído o homem 
e a mulher, deixando-os com o espírito do bem e do mal.
Os indígenas recorriam aos deuses para pedir explicação de vários fenômenos 
da natureza, como, por exemplo, o porquê da forma de andar do caranguejo. Em 
uma das versões dessa história, o primeiro casal de humanos criados por Tupã 
16 Imaginário, história e verdade
teve várias filhas e três filhos, sendo que o primeiro filho, Tumé Arandu, foi o 
mais sábio, o grande profeta. Marangatu, o segundo filho, era dotado de uma 
grande benevolência, o líder generoso do seu povo. Já o terceiro filho, Japeusá, 
foi considerado o mentiroso, que confundia as pessoas para obtervantagens. Ao 
cometer suicídio, Japeusá foi ressuscitado sob a forma de um caranguejo. A partir 
de então, todos os caranguejos foram amaldiçoados para andar para trás.
Outra questão bastante controversa foi a prática da antropofagia, relatada 
por alguns europeus na época da conquista como “fúria diabólica”, quando, na 
realidade, não era um canibalismo puro e simples. Cometido contra os inimigos, 
a antropofagia era um ritual.
O sacrifício ritual desempenhava, então, função purificadora, pois 
permitia expulsão do desejo de vingança, ao mesmo tempo em que 
bloqueava a realização de vendetas endogâmicas, se o prisioneiro 
adquiria poder como augure ou profeta, era só para perdê-lo quando 
o canibalismo ritual reintegrasse esse poder à comunidade. (GIUCCI, 
1992, p. 222)
Em relação ao período da conquista, podemos perceber que os europeus 
utilizaram-se das crenças e dos mitos indígenas em proveito próprio, fosse para 
salvar suas vidas ou para submeter os índios ao domínio europeu. Guilhermo 
Giucci, em seu livro Viajantes do Maravilhoso, chamou esses usos de a 
“manipulação do sagrado”. Ao contrário dos indígenas, os europeus conheciam 
a ciência, o que possibilitava o entendimento de alguns fenômenos naturais. 
Isso fez com que eles fossem vistos pelas populações locais como poderosos 
detentores das manifestações da natureza. Ao longo do período da conquista, 
essa manipulação adotou inúmeras formas.
O conhecimento abre caminho para o poder quando uma das 
partes sabe o que a outra desconhece. E se torna poder quando a 
possibilidade de predizer eventos incomuns é formulada pela primeira 
como expressão de domínio sobre o considerado inescrutável pela 
segunda. (GIUCCI, 1992, p. 226)
17Imaginário, história e verdade
Os relatos desses usos são diversos, sendo geralmente utilizados para 
aterrorizar os indígenas e, assim, conseguir assegurar o poder sobre os mesmos. 
Ainda na primeira etapa da conquista, as crenças e os mitos indígenas, como a 
da imortalidade da alma, fizeram com que muitos fossem levados à escravidão. 
Em um relato sobre a conquista na América Espanhola descobrimos que:
...persuadidos pelos espanhóis de que seriam enviados à terra 
prometida, onde, segundo as crenças dos nativos, iriam encontrar 
a alma de seus familiares mortos, embarcavam felizes nos navios 
castelhanos. Iam, na realidade, às minas de ouro (...)/ e quando 
compreenderam o engano optaram pelo suicídio em massa. (AGLERÍA 
apud GIUCCI, 1992, p. 207)
1.4 A Europa nos séculos XIV e XV
Na Europa, o período entre o século XIV e início do XV foi marcado por uma 
crise conjuntural. A expansão econômica experimentada ao longo do século XIII 
e início do século XIV deu lugar à estagnação tecnológica, alterações climáticas, 
doenças, períodos de fome e excesso demográfico. Essa crise generalizada foi 
resultado da economia extensa e predatória da fase de desenvolvimento, que era 
baseada nos recursos naturais disponíveis e na força de trabalho. “... enquanto 
havia terras cultiváveis e mão de obra em quantidade para trabalhar nelas o 
sistema funcionou bem”. (FRANCO JÚNIOR, 1986, p. 59)
No século XIV, com a escassez de terras disponíveis, uma grande parcela da 
população foi dizimada pela peste negra, e o resultado foi a crise generalizada 
estendida por toda a Europa Ocidental. O desflorestamento excessivo e a 
produção agrária prejudicada pela transformação das áreas de pasto em zonas 
de cultivo resultaram na escassez de alimentos de subsistência, ocasionando 
períodos de fome generalizada. Houve uma redução da margem de lucro em 
todas as atividades, fossem elas comerciais ou financeiras. Essa redução, somada 
à desordem no setor financeiro, foi agravada pelos pesados impostos e o confisco 
de mercadorias.
18 Imaginário, história e verdade
Uma das maiores dessas fragilidades e fonte de graves problemas 
econômicos eram as constantes mutações monetárias empreendidas 
pelos soberanos. Sempre necessitados de dinheiro, os monarcas 
diminuíam a proporção de metal precioso das moedas e mantinham 
seu valor nominal; assim conseguiam cunhar o maior número de 
peças com a mesma quantidade de metal nobre. Contudo, recebiam 
os impostos nessa moeda desvalorizada. O que levava a realizar 
nova desvalorização, e assim sucessivamente. (FRANCO JÚNIOR, 
1986, p. 61)
Mas com a diminuição da população, abandono de terras improdutivas e a 
expansão ultramarina, constatou-se uma lenta recuperação. E no século XV as 
coisas começaram a melhorar, variando conforme o lugar, a produção agrícola, 
o artesanato e o comércio que começavam a revigorar. No período entre os 
séculos X e XV, a ascensão da burguesia merece destaque, pois essa nova classe 
propiciou profundas modificações no modo de vida da sociedade.
A aliança entre o rei e a burguesia consistia em ações do monarca para reduzir 
a força dos senhores feudais. O poder do soberano dependia do comércio e 
da indústria, se esses prosperassem o dinheiro fluía. Então os reis começaram 
a diminuir privilégios e monopólios das poderosas cidades em benefício da 
Nação como um todo. Em locais onde as cidades eram realmente fortes, o 
reconhecimento de uma autoridade central levou séculos. Em consequência 
disso, elas foram as últimas a aderir à unificação necessária para se adaptarem 
à nova realidade econômica. Apesar de algumas cidades tentarem manter seus 
privilégios, o Estado nacional predominou. Em sua maioria os localismos foram 
suplantados, cedendo lugar a reinos unidos, governados por um monarca com 
poderes absolutos.
As monarquias absolutistas tinham seu poder ameaçado apenas pelo poder 
do papa. A burguesia, por sua vez, achava que seu desenvolvimento estava 
sendo freado com as ideias difundidas pela Igreja Católica, como, por exemplo, 
a relação feita entre o lucro e o pecado. Com a Reforma Protestante, acontece a 
principal investida de caráter religioso contra a Igreja Católica, que viu, a partir 
de então, partida a cristandade europeia.
19Imaginário, história e verdade
Para estimular o crescimento econômico nacional, o Estado absolutista criou 
as normas mercantilistas, uma série de leis e regras para controlar a economia. 
Um dos principais objetivos mercantilistas era o acúmulo de metais preciosos 
a fim de manter a balança comercial favorável, ou seja, exportar mais do que 
importar.
Fonte: http://www.portalsaofrancisco.com.br/alfa/mercantilismo/mercantilismo-e-absolutismo.php
A expansão marítima surgiu da necessidade do comércio com o Oriente. Os 
europeus eram conhecedores de produtos como especiarias, sedas, perfumes e 
tapetes desde as Cruzadas, porém o comércio desses produtos era monopolizado 
pelos italianos. Na tentativa de quebrar essa exclusividade, países como Espanha 
e Portugal tentaram descobrir um caminho de navegação para contornar a 
África e atingir as Índias pelo oceano, uma vez que o mar Mediterrâneo era 
dominado pelos italianos. Inaugurava-se ali o período das grandes navegações, 
sendo Portugal o primeiro país europeu a consolidar o Estado centralizado, e o 
pioneiro a lançar-se nas grandes navegações.
20 Imaginário, história e verdade
1.5 E hoje, o que pensamos de nós mesmos?
Como é construída uma identidade social? Como nós nos tornamos 
brasileiros? A construção de uma identidade social ou de uma sociedade é 
realizada por meio de negativas ou afirmativas diante de certas questões, leis, 
festas, política, família etc. Ao descobrirmos como as pessoas se posicionam 
diante dessas questões, passamos a compreender o modo de ser de cada sociedade 
(DAMATTA, 1993).
Para o antropólogo Roberto DaMatta, a percepção sobre o processo de 
construção “identitária”, que caracterizaria a sociedade brasileira, pode ser 
construído de várias maneiras, mas basicamente a partir de dados quantitativos 
e qualitativos. No primeiro caso, temos sempre a impressão de que estamos 
aquém das nossas possibilidades de realização e dos nossos objetivos. Na segunda 
possibilidade, parece que perdemos a vergonha de nossos problemas e passamosa nos enxergar com o otimismo, aliás, essa é uma das características sempre 
lembradas quando falamos de nós mesmos. Trata-se de algo que nos caracteriza 
como brasileiros, o fato de sermos otimistas diante das maiores adversidades.
Mas, quando falamos em leis, como os brasileiros reagem? Como é a nossa 
relação com leis universais que valem para todos? Como nos comportamos 
diante de um “não pode” ou um “pode”? Pois bem, segundo DaMatta (1993), 
o brasileiro pegou o “pode” e o “não pode” e fez uma junção dos dois, criando 
vários tipos de “jeitinhos” e de “malandragens”. Esses arranjos foram criados 
para transitarmos em um sistema de leis que, na maioria das vezes, não tem 
nada a ver com a realidade social. Os jeitinhos e malandragens são a formas 
de burlarmos nossas leis, sujeitando-as à interferência das relações pessoais, 
inviabilizando a aplicabilidade da lei universal.
E se mudarmos o rumo da nossa conversa, e perguntarmos para as pessoas 
como se deu a formação da nossa sociedade? Com certeza, a grande maioria 
responderá que ela foi formada por três raças: brancos, negros e índios, um 
“triângulo racial” que muitas vezes nos impede de termos uma visão crítica 
do que foi o processo histórico da constituição da nossa sociedade. Quando 
acreditamos que nosso país foi feito por todos os indivíduos desse triângulo, 
fechamos os olhos para o fato de que grande parte desses contingentes humanos 
veio para esse país à força, e que os que aqui já estavam antes da chegada dos 
portugueses também foram submetidos e escravizados quando se iniciou a 
21Imaginário, história e verdade
colonização. É importante ressaltarmos, então, que a nossa história se constituiu 
desde os primeiros tempos sobre uma base social hierarquizada, excludente e 
discriminatória.
Até 1890, o Catolicismo era a religião oficial do Brasil, porém isso não 
impediu a existência de uma imensa variedade de experiências religiosas no 
país. Essas experiências são amplas, o Catolicismo com toda sua variante 
protestante, as religiões afro-brasileiras, o Espiritismo, e as religiões orientais, 
porém todas têm um ponto em comum entre elas: a comunicação entre o 
homem e o sobrenatural, o homem e sua ancestralidade. O povo brasileiro é 
muito religioso e, ao mesmo tempo, muito expansivo, muito alegre, ou pelo 
menos é isso que dizem sobre nós, ou o que nós mesmos dizemos a nosso 
respeito. Aqui tudo se une e torna-se sincrético, são as inúmeras simpatias que 
usamos independente da religião, o Natal que se passa na missa, e a virada do 
ano na praia, agradecendo e renovando pedidos aos Orixás (DAMATTA, 1993, 
p. 117), ou ainda, o carnaval, que integra, une e inverte condições tidas como 
tão desiguais durante o restante do ano.
Carnaval, pois, é inversão por que é competição numa sociedade 
marcada pela hierarquia. É movimento numa sociedade que tem horror 
à mobilidade, que permite trocar efetivamente de posição social. 
É exibição numa ordem social marcada pelo falso recato de “quem 
conhece o seu lugar”, algo sempre usado para o mais forte controlar 
o mais fraco em todas as situações. (DAMATTA, 1993, p. 78)
O carnaval em nosso país é algo extraordinário e um belo exemplo em que 
podemos observar a inversão de papéis sociais, ao menos por alguns momentos. 
A fantasia do carnaval nos liberta, ou seja, podemos ser aquilo que somos 
privados de ser no dia a dia. O carnaval é ilusão e fantasia, momento em que 
podemos sonhar em ser tudo o que quisermos, pois se trata de um espaço/
tempo em que são refutadas as fronteiras sociais. Para DaMatta (1993), se o 
carnaval promove a igualdade, algumas outras festas promovem a manutenção 
da ordem, e são exatamente esses ritos que definem, na nossa sociedade, quem 
é o autor e quem é o espectador.
22 Imaginário, história e verdade
Atividades
•	 Debata	com	seus	colegas	sobre	o	estudo	da	história	e	qual	o	seu	significado	
para o homem contemporâneo.
•	 Faça	uma	análise	a	 respeito	da	participação	da	Igreja	no	processo	de	
colonização do território brasileiro e o papel desempenhado pelas várias 
igrejas hoje no Brasil.
•	 Analise	o	quadro	a	respeito	do	Estado	Absolutista	e	Mercantilismo	e	reflita	
sobre o papel do Estado no Brasil atual.
•	 Qual	a	sua	opinião	a	respeito	da	visão	do	antropólogo	Roberta	DaMatta	
sobre a sociedade brasileira?
Referências comentadas
DAMATTA, Roberto. O que faz o Brasil, Brasil? 12. ed. Rio de Janeiro: Rocco, 
2001.
Em seu livro O que faz o Brasil, Brasil? Roberto Damatta mostra um Brasil 
diferente do restante do mundo. O autor associa essa diferença à mistura, seja ela 
religiosa ou racial. O antropólogo faz uma comparação entre o comportamento 
dos norte-americanos e brasileiros em relação às leis, deixando claro nosso 
costume de violar e assistir à violação das leis. A questão da identidade 
brasileira, festas, comidas, cultura e discriminação também são abordadas 
pelo autor. A partir das temáticas abordadas no livro, podemos refletir sobre 
a nossa constituição mestiça, sobre o fato de sermos conservadores em alguns 
momentos e liberais em outros. Enfim, podemos refletir de forma variada sobre 
a formação do Brasil.
FRANCO JÚNIOR, Hilário. A Idade Média: o nascimento do Ocidente. São 
Paulo: Brasiliense, 1986.
Obra fundamental para os iniciantes no assunto, o livro A Idade Média: o 
nascimento do Ocidente, do historiador Hilário Franco Júnior, tem por objetivo 
analisar o período medieval levando em conta suas estruturas sociais, políticas, 
econômicas, eclesiásticas e mentais. O texto foi organizado de forma que cada 
23Imaginário, história e verdade
capítulo do livro descreva uma dessas estruturas dentro da ordem cronológica 
dos fatos.
Referências
BURKE, Peter (Org.). A escrita da história: novas perspectivas. São Paulo: 
Universidade Estadual Paulista, 1992.
DAMATTA, Roberto. O que faz o Brasil, Brasil? 12. ed. Rio de Janeiro: Rocco, 
2001.
FRANCO JÚNIOR, Hilário. A Idade Média: o nascimento do Ocidente. São 
Paulo: Brasiliense, 1986.
GIUCCI, Guilhermo. Viajantes do maravilhoso – o novo mundo. Companhia 
das Letras, 1992.
HUBERMAN, Leo. História da riqueza do homem. 21. ed., rev. Rio de Janeiro: 
LTC, 1986.
JENKINS, Keith. A história repensada. 2. ed. São Paulo: Contexto, 2004.
LE GOFF, Jacques. A história nova. 5. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2001.
LE GOFF, Jacques. O imaginário medieval. 2. ed. [Lisboa]: Estampa, 1994.
MONTAIGNE, Michel de. Ensaios. São Paulo: Abril Cultural, 1980. 500 p. 
(Os pensadores).
SCHMIDT, Mario Furley. Nova história crítica. 2. ed. São Paulo: Nova Geração, 
1997.
Autoavaliação
1. A partir do que vimos no caderno de estudos, é correto afirmar que a 
forma tradicional de fazer história,
I – É relativista e interpretativa, e nos permitindo visões distintas de 
um mesmo fenômeno.
II – Apresenta discursos que estão sempre sendo refeitos e 
desfeitos.
III – Valoriza essencialmente a história política e se baseia nas fontes 
escritas e registros oficiais.
24 Imaginário, história e verdade
 Estão corretas as alternativas
a) I
b) II
c) III
d) Todas as alternativas estão corretas
2. “A verdade está vinculada aos interesses materiais, estando ligada a 
sistemas de poder”. A frase acima pode ser aplicada na História?
a) Não, pois a função do historiador é mostrar os fatos como eles 
realmente aconteceram.
b) Não, a história é feita de forma neutra e imparcial pelo historiador.
c) Sim, pois a história não está fora do âmbito de poder, cada sociedade, 
cada época constrói discursos que faz funcionar como verdadeiros.
d) Não, o papel do historiador é fazer emergir a verdade, independente 
de suas crenças e valores. Atualmente, os historiadores conseguem 
escrever uma história neutra, imparcial.
3. Assinale uma das características dos índios do Novo Mundo.
a) Eram monoteístas.
b) Explicavam os fenômenos naturais por meio de elementos 
sobrenaturais.
c) Os índios condenavam as relações endogâmicas.
d) O dualismo sagrado-profano está presente no cotidiano do 
indígena.
4. Sobre a criseeuropeia do século XIV é correto afirmar:
a) Ocorreu em partes isoladas da Europa, basicamente em áreas pouco 
férteis.
b) A expansão ultramarina agravou ainda mais a crise devido ao desvio 
de recursos para as grandes viagens.
c) A crise foi generalizada, atingindo todos os setores da economia.
d) As instituições bancárias não foram afetadas pela crise devido à ação 
dos monarcas que socorreram os bancos, evitando um agravamento 
ainda maior da crise.
5. Sobre a reforma protestante é correto afirmar:
I – Foi uma Reforma apenas de caráter religioso, os reformistas não 
aceitavam a corrupção que havia dentro da Igreja Católica.
II – Teve caráter, político, religioso e econômico.
25Imaginário, história e verdade
III – Foi a primeira batalha da nova classe média (burguesia) contra o 
feudalismo
 Estão corretas:
a) I, II
b) II, III
c) I, III
d) Todas as alternativas estão corretas.
Gabarito: 1(C); 2(C); 3(B); 4(C); 5(B).
2
Os (des)encontros entre as culturas
Introdução
A palavra cultura possui diversas acepções. Para a agricultura, cultura é 
sinônimo de cultivo, já para a Sociologia a cultura simboliza o que é aprendido 
e dividido pelos indivíduos de um determinando grupo, conferindo a eles 
identidade. A cultura não é única, nem imutável, sendo que dentro de uma 
determinada sociedade ou grupo pode haver diversos tipos de manifestações 
culturais, como é o caso da “cultura popular”, da “cultura erudita”, da cultura 
jovem etc.
Neste capítulo iremos trabalhar com o que convencionamos chamar de (des)
encontro entre culturas, a cultura europeia e indígena no contexto da chegada e 
a descoberta do Novo Mundo, e como essas duas culturas foram percebendo-se 
no contato, na troca, ou ainda, na imposição de valores diversos. A sobreposição 
cultural imposta pelos europeus e em seguida o genocídio indígena são pontos 
importantes a serem por nós discutidos, e ainda pretendemos demonstrar como 
foram possíveis as diversas ressignificações do conceito de cultura e identidade. 
Analisaremos, também, como está a situação atual do índio no Brasil, suas 
apropriações e reapropriações culturais e os impactos causados pelas mudanças 
territoriais.
28 Os (des)encontros entre as culturas
2.1 Organização social? Qual?
“(...) Parece-me gente de tal inocência que, se nós entendêssemos 
a sua fala e eles a nossa, seriam logo cristãos, visto que não têm 
nem entendem crença alguma (...)”. trecho da carta escrita por Pero 
Vaz Caminha.
Os sentimentos e visões produzidos pelos europeus a respeito do Brasil e dos 
“brasis” foram diversos e ambíguos. Em carta escrita em 1550, pelo padre Manoel 
de Nóbrega, fica patente a abominação por alguns costumes indígenas, com a 
antropofagia e a poligamia. O padre escreve ainda que talvez “a melhor forma 
de converter os indígenas fosse pelo medo”. Em ambas as cartas demonstra-se 
que o primeiro contato entre a cultura europeia e indígena foi calcado por um 
etnocentrismo, um “eurocentrismo” que avaliava o comportamento, a cultura 
e a organização social indígena por meio de valores e modelos da sociedade 
europeia (ROCHA, 1984).
Noutros relatos, os europeus viam os indígenas de formas diferentes e 
conflitantes, descrevendo-os como “seres inocentes”, mas também “bestiais”. 
Algumas das narrativas dos primeiros viajantes estão eivadas de uma visão 
idílica da realidade dos trópicos. Caracterizam o Novo Mundo como sendo de 
clima ameno, local onde habitam “seres inocentes e pacíficos”, havendo entre 
eles grande liberdade social e moral. Seus habitantes desconheceriam governos, 
moeda e a propriedade. Os europeus não entendiam a falta de interesse do índio 
pelo acúmulo de bens ou metais preciosos, fato impensável em um contexto 
mercantilista típico das grandes navegações. A falta de contratos em geral e o 
fato de não castigarem seus filhos também causaram estranheza no colonizador 
(WEHLING, 1999, p. 87).
A visão hedônica do Novo Mundo, criada pelo grupo dominante e 
amplamente divulgada na Europa por meio de relatos dos viajantes, fez nascer 
a esperança de uma vida nova e de ascensão social súbita na população que, no 
caso de Portugal, foi excluída das riquezas e prosperidade que o comércio com 
o Oriente proporcionava (FAORO, 1997, p. 103). O sonho de uma nova vida 
para essa população durou pouco. Ao colonizar e dividir o território brasileiro, 
o Estado português concedeu essas terras demarcadas aos colonizadores 
29Os (des)encontros entre as culturas
descendentes da nobreza, possuidores de recursos para investir no Novo Mundo. 
Ao colonizar o Brasil, os portugueses rejeitaram totalmente a estrutura e a 
organização social dos povos indígenas.
O Brasil, na época da conquista, era habitado por grupos etnicamente 
distintos. Os Tupis, melhor descritos pelas fontes quinhentistas e seiscentistas, 
viviam de caça, pesca, coleta e praticavam a horticultura. Possuíam uma grande 
mobilidade espacial, ficavam em uma determinada área até esgotar seus recursos, 
depois migravam para outras mais férteis. A “tribo” é uma entidade da qual pouco 
se sabe, mas os registros que temos dizem que ela abrigava grupos menores, 
“aldeias”. Ocupando uma porção estratégica no território, as “aldeias” ficavam 
sempre próximas dos recursos naturais e posicionadas de forma a defender os 
grupos locais. Esses grupos locais eram compostos de quatro a sete habitações 
coletivas, distribuídas no solo deixando sempre um espaço livre para a realização 
de reuniões dos chefes, cerimônias religiosas, massacre e ingestão das vítimas 
(FERNANDES, 1989).
As tarefas eram divididas de acordo com o gênero e a idade. Às mulheres cabia 
o trabalho agrícola, a manutenção da casa e a criação de animais domésticos. 
A preparação do corpo dos prisioneiros para a cerimônia de execução também 
ficava a cargo da mulher. Essas vítimas até o dia de sua morte eram tratadas 
como iguais, os Tupis não exploravam economicamente seus prisioneiros. Aos 
homens cabia a derrubada das árvores, preparação do solo para a horticultura, 
a pesca e a caça.
A poligamia existente entre os indígenas, rechaçada pelos padres das 
missões civilizadoras, era de extrema importância para extensão da parentela. 
Geralmente, uma família possuía entre três a quatro esposas. As parentelas e 
relações de interdependência eram repensáveis pela união dos grupos locais, a 
distinção entre os grupos emanava no parentesco ou aliança.
(...) em cada casa destas vivem todos muito conformes, sem haver 
nunca entre eles nenhumas diferenças: antes são tão amigos uns dos 
outros que o que é de um é de todos, e sempre de qualquer coisa 
que um coma, por pequena que seja, todos os circunstantes hão de 
participar dela. (GANDAVO apud FERNANDES, 1989, p. 74)
30 Os (des)encontros entre as culturas
Relatos como esse demonstram que a estrutura social das “tribos” era baseada 
em laços de solidariedade e de cooperação em áreas de interesse. O funcionamento 
do sistema tribal, assim como as relações sociais – tanto no plano da organização 
local quanto na parentela – era baseado nas situações já vividas. As normas baseadas 
no passado eram aplicadas de forma enérgica e inalterável nos acontecimentos do 
presente. Os imprevistos ou situações novas que surgiam eram examinadas pelos 
velhos, líderes da parentela. As mudanças só poderiam ser enfrentadas com sucesso 
após um longo processo de escolha da solução a ser tomada diante da situação 
imposta, e entre tentativas baseadas na experiência vivida.
2.2 Identidade e cultura
Hoje em dia, o conceito de identidade não é tido como imutável, pois se 
entende que ele tenha passado por uma série de transformações no decorrer 
da história. Portanto, a concepção de identidade está sujeita a transformações. 
Recuando na história até o Iluminismo, percebemos que se pensava a identidade 
de outra forma, “O sujeito do Iluminismo estava baseado numa concepção de 
pessoa humana com um indivíduo totalmente centrado, unificado...” (HALL, 
2005, p. 10). A identidade nessa concepção era o centro dapessoa, que surge 
no seu nascimento, permanecendo imutável durante o seu desenvolvimento. 
Portanto, além de imutável, a identidade na concepção iluminista é individualista, 
uma vez que está centrada no “eu”, no interior, sem fazer relação ou sofrer 
alteração pelo sistema cultural que nos cerca.
Na modernidade esse conceito de identidade foi sendo contestado, na medida 
em que se percebeu que o núcleo interior não era autossuficiente. “A noção de sujeito 
sociológico refletia a crescente complexidade do mundo moderno...” (HALL, 2005). 
Esse sujeito sociológico contrapõe o iluminista no seu individualismo, alegando que 
o sujeito tem um núcleo interior. Entretanto, esse núcleo é formado e modificado 
e está em constante diálogo com as “culturas exteriores”. “A identidade, nessa 
concepção sociológica, preenche o espaço entre (...) o mundo pessoal e o mundo 
público” (HALL, 2005). O sujeito está preso à estrutura por meio da identidade, e 
essa identidade o estabiliza junto com os mundos culturais que ele habita.
Essa visão unificada do sujeito sociológico está sendo fragmentada na pós-
modernidade. O sujeito pós-moderno não tem uma identidade permanente, 
ele possui várias identidades que se transformam continuamente. Os sistemas 
31Os (des)encontros entre as culturas
culturais que cercam o sujeito são responsáveis por essa formação e transformação 
de identidades. O indivíduo assume essa ou aquela identidade de acordo com 
o momento. “A identidade plenamente unificada, completa e coerente é uma 
fantasia” (HALL, 2005, p. 13).
Assistimos ao surgimento de novas identidades que fragmentam o indivíduo, 
enquanto que as velhas, que durante muito tempo estabilizaram o mundo social, 
estão em constante queda. A “crise de identidade” é fruto desse processo que faz 
emergir novas identidades, abalando os quadros de referência que ancoravam e 
davam estabilidade ao indivíduo no mundo social em que estava inserido (HALL, 
2005). No entanto, Denys Cuche (1997) diz que, apesar do caráter mutável e dinâmico 
da identidade, não se pode pensar que os atores sociais estão completamente livres 
para definir sua identidade de acordo com os interesses do momento. “Não é possível 
aos grupos e aos indivíduos fazer o que quer que desejem em matéria de identidade: 
a identidade é sempre resultante da identificação imposta pelos outros e da que o 
grupo ou indivíduo afirma por si mesmo” (p. 197).
As noções de identidade e cultura possuem uma grande ligação. Entretanto, 
não podem ser confundidas. A utilização da palavra cultura só vai começar a 
modificar o seu significado inicial, que é cuidar da terra, em meados do século 
XVI, passando a designar uma ação. No decorrer do referido século, a palavra 
passa a ser utilizada também no sentido figurado. Contudo, esse sentido 
figurado de cultura vai se impor somente no século XVIII. É no século das 
luzes que a cultura passa a designar “educação” da mente e do espírito, ou seja, 
por intermédio da instrução o indivíduo adquire um estado mental. A cultura, 
para os pensadores desse século, acontece por meio da educação. Os iluministas 
definem a cultura como “...a soma dos saberes acumulados e transmitidos pela 
humanidade...” (CUCHE, 1999, p. 20).
A noção de cultura varia de acordo com a área de conhecimento. Sociologicamente, 
podemos dizer que a cultura simboliza o que é aprendido e dividido pelos indivíduos 
de um grupo, determinando, conferindo a eles identidade. Quando o conjunto 
de valores de uma sociedade se encontra com o conjunto de outra, ocorre o que 
chamamos de “choque entre culturas”. A estranheza e a intolerância com que os 
portugueses viram a cultura indígena na época do descobrimento transparecem 
esse choque. Todavia, a estranheza não foi sentida só pelo europeu. O indígena 
não entendia a cultura europeia e o seu incessante interesse material, bem como 
a necessidade de acumulação de bens. Vários índios foram levados para a Europa 
32 Os (des)encontros entre as culturas
onde puderam vivenciar essa diferenciação cultural. Michel de Montaigne relata a 
conversa que teve na Europa com um grupo de indígenas enviados à Suíça. Quando 
perguntado sobre o que achou da cidade, um índio revelou espanto com as diferenças 
sociais e ficou surpreso com o fato de os excluídos não se revoltarem.
(...) há entre nós gente muito bem alimentada, gozando as comodidades 
da vida, enquanto metades de homens emagrecidos, esfaimados, 
miseráveis mendigam às portas dos outros (...), e acham extraordinário 
que essas metades de homens suportem tanta injustiça sem se revoltarem 
e incendiarem as casas dos demais. (MONTAIGNE, 1980, p. 105)
2.3 Eurocentrismo e genocídio
Eurocentrismo é a tendência a colocar a Europa como protagonista da 
história do homem. Sua cultura, costumes, povos, funcionam como principal 
elemento na constituição da sociedade moderna. A visão eurocêntrica tende a 
menosprezar as culturas que não se enquadram no “modelo europeu”, olhando-
as como algo exótico ou descabido.
Fonte: http://www.bahia.com.br/site/global/imgs/viver_bahia/historia/Pe-Vieira-convertendo-
indios.jpg
33Os (des)encontros entre as culturas
Essa visão eurocêntrica e etnocêntrica, aliada aos interesses econômicos, 
fez com que os colonizadores portugueses desprezassem a cultura indígena e, 
posteriormente impusessem sua cultura e os seus costumes. Essa imposição se 
dava geralmente pelo uso da força e do medo – como aparece na carta escrita pelo 
padre Nóbrega de 1550: “Talvez por medo [os índios] se convertam mais depressa 
do que fazem por amor” (RODRIGUES Apud CORRÊA, 2006, p. 23).
A ideia que se tem ainda hoje de que os índios nessa aréa da América se 
limitaram a assistir a ocupação portuguesa e que aceitaram passivamente as 
consequências da colonização não se sustenta, principalmente quando lemos 
relatos dos padres e colonizadores Nóbrega e Anchieta a respeito de batalhas 
como a “confederação dos Tamoios”. Se foram vencedores ou vencidos, não 
importa. O que vale lembrar é que, levando em consideração suas limitações, 
os índios lutaram e foram duros inimigos na luta pela sua soberania e a posse 
de seus territórios (FERNANDES apud HOLANDA, 1989).
Nos primeiros anos do descobrimento, enquanto o interesse de Portugal 
se limitava à retirada do pau-brasil e escambo, as relações conflitantes eram 
encobertas. Enquanto estavam em pequenos números, os brancos eram 
incorporados à cultura local, e essa incorporação em nada alterou o sistema 
tribal. Entretanto, ao substituir o escambo pela agricultura, os portugueses 
alteraram completamente sua relação com os indígenas, passando de tensões 
ocultas para um período de conflitos abertos com os nativos. “O anseio de 
‘submeter’ o indígena passou a ser o elemento central da ideologia dominante 
no mundo colonial luzitano” (FERNANDES apud HOLANDA 1989, p. 83). O 
pensamento cristão adaptou-se muito bem à politica expansionista da época.
o cristianismo medieval deu base às doutrinas legitimadoras 
sobre a conduta para com os infiéis, o direito de escravizá-los, a 
responsabilidade religiosa assumida diante deles pelos cristãos, mesmo 
tendo opositores, essa doutrina legitimou na prática uma conduta que 
arrasou com os povos pré-colombianos. (POMER, 1983, p. 68)
Esse pensamento cristão também estava presente na conduta dos portugueses, 
então sob a alegação de catequizar os pagãos. Aconteceu a tomada do território 
indígena, assim como a sua redução à escravidão, tendo como consequência a 
34 Os (des)encontros entre as culturas
morte impiedosa de milhares de índios. Os que não morreram pela arma do 
colonizador padeceram em decorrência das doenças trazidas por eles.
Os indígenas não ficaram passivos à ocupação, eles reagiram a ela usando 
três formas básicas: a primeira delas foi o uso da violência, a tentativa de 
expulsão do branco, garantindo assim a soberania tribal. A “confederação dos 
Tamoios” exemplifica esse tipo de reação. A segunda, a submissão na condição 
de “aliados”, onde várias tribos se juntaramaos portugueses contra os seus 
inimigos. Contudo, essa aliança era efêmera, podendo ser quebrada a qualquer 
momento pelos portugueses. A terceira forma de reação foi por meios passivos, 
por meio das migrações. No entanto, essa estratégia se mostrou pouco eficiente, 
devido à abertura das estradas.
Os efeitos da destribalização (que iam da seleção letal nas populações 
aborígenes à perda da vida), as doenças contraídas nos contatos com os 
brancos e a escassez frequente de víveres, somados aos inconvenientes 
do trabalho forçado de toda espécie, inclusive na guerra, faziam com 
que o regime imposto de vida operasse como um sorvedouro de seres 
humanos. (FERNANDES apud HOLANDA 1989, p. 85)
2.4 Questões atuais sobre as populações indígenas 
no Brasil
De acordo com dados da Fundação Nacional do Índio (FUNAI), órgão 
do governo que estabelece e executa a Política Indigenista no Brasil, existem 
atualmente no país cerca de 460 mil índios distribuídos entre 225 aldeias 
indígenas. Há ainda entre 100 e 190 mil índios vivendo fora das sociedades 
indígenas, incluindo aqueles que vivem em áreas urbanas. Apesar de imprecisas, 
as estimativas sobre o número de sociedades indígenas que existiam no Brasil 
na época da chegada dos europeus apontam para cerca de 1 a 10 milhões índios. 
Esses números nos dão a dimensão acerca da quantidade de sociedades indígenas 
que foram exterminadas, resultante de um processo de colonização baseado, 
principalmente, pelo uso da força. E como vivem hoje esses índios após 500 
anos da chegada dos europeus?
35Os (des)encontros entre as culturas
Quando se pensa em índios, logo imaginamos a vida nas aldeias. No entanto, 
hoje boa parte dos índios vive nos centros urbanos. Índios de boné e camiseta 
geralmente são vistos como alguém que abandonou sua cultura. Esquecemos que 
as culturas são dinâmicas e que se modificam no decorrer da história. Nós não 
somos os mesmos da época do Brasil colônia, sendo assim, por que queremos 
que a cultura indígena seja imutável, que os índios sejam os mesmos de mais de 
500 anos atrás? A cultura indígena, assim como as demais culturas ao longo do 
tempo, passou por processos de apropriações, perdas e reorganizações, portanto 
não são imutáveis. A presença cada vez maior dos índios na cidade é explicada 
pela migração à procura de trabalho, ou ainda devido ao crescimento dos centros 
urbanos, que se expandiram e quase se juntaram às aldeias.
As relações, muitas vezes calcadas no preconceito entre brancos e o índio da 
cidade, faz com que o indígena abandone ou oculte elementos da sua cultura, 
identidade e origem. Um exemplo dessa intolerância ocorreu em 1997, quando 
cinco rapazes atearam fogo no índio pataxó Galdino Jesus dos Santos que 
dormia em uma parada de ônibus de Brasília, após participar de uma marcha 
indígena por reconhecimento e demarcação de áreas. O índio morreu com 95% 
do corpo queimado. “Não sabíamos que era um índio, pensávamos que era só 
um mendigo”, defendeu-se um dos acusados.
O índio pataxó Galdino dos Santos, em hospital de Brasília 
fonte: http://www1.folha.uol.com.br/fol/geral/ge21041.htm
As relações conflitantes não fazem parte apenas do cotidiano do índio urbano, 
as sociedades indígenas próximas às cidades, espremidas pelo crescimento 
36 Os (des)encontros entre as culturas
acelerado dos centros urbanos, que avançam sobre o seu território, lutam pela 
manutenção da sua dignidade e modo de vida. Nas áreas mais afastadas, reservas 
indígenas convivem com a ação de grileiros e latifundiários que exploram, 
matam ou expulsam os índios de seus territórios. O episódio recente, que 
elucida essa delicada relação, é o conflito na reserva indígena Raposa Serra do 
Sol, em Roraima. Abaixo segue um trecho da Carta das Comunidades Indígenas 
da Raposa Serra do Sol, documento dos povos originários sobre a luta pela 
homologação de suas terras, divulgado em 28 de abril de 2008 no site http://
www.jubileubrasil.org.br/informes/a-divida-com-os-povos-originarios/carta-
das-comunidades-indigenas-da-raposa-serra-do-sol.
Nós, comunidades indígenas da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, 
após três anos de homologação da nossa terra, muito embora termos 
sofrido violentas agressões ao longo de 30 anos de luta, nunca 
reagimos com violência, (...) Com o anúncio da operação “Upatakon 
3” (operação que visa a mediação dos conflitos entre índios e não 
índios na terra indígena Raposa Serra do Sol, ao norte de Roraima), 
foram feitas várias ações violentas, de terrorismos, queima de pontes, 
bloqueio de pontes, explosões de bombas artesanais, tentativas de 
homicídios contra lideranças indígenas e outros atos nocivos à nossa 
população liderados pelo invasor de nossa terra. (...) nós, povos 
indígenas, queremos dizer ao povo brasileiro e autoridades que fomos 
e estamos sendo discriminados frente à sociedade, com a visão de 
sermos	ameaça	à	soberania	nacional	(...)	Queremos	ter	oportunidade	
de cultivar e oferecer nossos produtos, pois só acreditamos em 
desenvolvimento de um estado, quando todos produzem e têm o 
mesmo tratamento por parte do poder público.
Demarcada pelo governo Lula em 2005, a reserva indígena Raposa Serra do 
Sol está sofrendo pressões por determinados grupos que pedem a diminuição 
do tamanho de sua área. A demarcação das terras tradicionais, determinada 
nos termos do Artigo 231 na Constituição de 1988, é um importante passo 
rumo ao reconhecimento da importância, preservação e também para garantir 
a sobrevivência física e cultural dos indígenas. Assegurando o direito à terra, 
37Os (des)encontros entre as culturas
garante-se também o espaço cultural necessário para promover e atualizar as 
tradições.
Nas grandes cidades também são diversos os casos de famílias indígenas que 
movem ações judiciais na perspectiva de assegurar a posse da terra tradicional 
no mundo urbano. Recentemente, no Rio Grande do Sul, um grupo de famílias 
Kaingang, até então moradores em áreas da periferia de Porto Alegre, retomou 
o Parque Natural do Morro do Osso, localizado em uma área nobre da cidade. 
As famílias argumentam que o parque foi criado sobre uma área de ocupação 
tradicional indígena. A retomada gerou polêmica e discussões entre os poderes 
públicos, moradores da região e os órgãos indigenistas. Sob a alegação de que os 
índios iriam desmatar a área que é de preservação ambiental, ocorreram várias 
tentativas, em meio a conflitos, para a retirada dos índios daquele local. Por 
sua vez, as lideranças indígenas entraram com uma ação no Ministério Público 
Federal, alegando que a dita área de preservação ambiental está sendo loteada 
para a construção de mais um condomínio de luxo. Foram feitas imagens e 
fotografias dos marcos que delimitavam as ruas e o local da construção dos 
prédios e entregues ao Ministério Público.
Atividades
•	 Construa	um	quadro	com	elementos	importantes	da	cultura	indígena	na	
época do descobrimento e a situação das populações indígenas no Brasil 
contemporâneo.
•	 Considerando	 que	 a	 concentração	 de	 poder	 político	 no	 Brasil	 está	
diretamente ligada ao poder econômico, faça uma análise critica sobre o 
parágrafo abaixo.
•	 Discuta	com	seus	colegas	quais	os	elementos	importantes	referenciados	
por Stuart Hall e Denys Cuche sobre cultura e identidade, exemplificando 
com questões relacionadas ao seu cotidiano.
Referências comentadas
WEHLING, Arno; WEHLING, Maria José C. M. Formação do Brasil Colonial. 
4. ed., rev. amp. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2005.
38 Os (des)encontros entre as culturas
O livro Formação do Brasil Colonial, publicado pelo doutor em História Arno 
Wehling, não se destina apenas ao público especializado em história. A leitura 
é de fácil entendimento, abrangendo um público diversificado. O livro faz a 
síntese de três séculos de história brasileira, abordando temas como a expansão 
europeia no século XV e a incorporação do Brasil, além de a colonização, a 
sociedade colonial, a cultura no Brasil colônia e a crise da colonização. A obra 
aborda váriosaspectos sobre a formação socio-histórica do país e encerra com 
um apanhado desses três séculos de história do Brasil.
FAORO, Raymundo. Os donos do poder: formação do patronato político 
brasileiro. 11. ed. São Paulo: Globo, 1997. 2 v.
No Livro Os Donos do Poder, Raymundo Faoro trabalha com detalhes a 
história brasileira desde as origens do Estado Português colonizador até as 
principais tendências internas da República Velha. Trata-se de uma obra de 
mapeamento da evolução política do Brasil, que gerou muitas controvérsias por 
ocasião de sua publicação, mas consolidou-se como referência para o estudo da 
formação política brasileira.
Referências
AS ALDEIAS da cidade. 3X4 Especial índios. Porto Alegre, 2007.
Carta das comunidades indígenas da Raposa Serra do Sol. Disponível em: http://
www.jubileubrasil.org.br/informes/a-divida-com-os-povos-originarios/
carta-das-comunidades-indigenas-da-raposa-serra-do-sol. Acesso em: 20 
de julho de 2008.
CORRÊA, Norton Figueiredo. O batuque do Rio Grande do Sul: antropologia 
de uma religião afro-rio-grandense. 2. ed. São Luís: Cultura & Arte, 2006.
FAORO, Raymundo. Os donos do poder: formação do patronato político 
brasileiro. 11. ed. São Paulo: Globo, 1997. 2 v.
FUNDAÇÃO NACIONAL DO ÍNDIO. Disponível em: http://www.funai.gov.
br/ Acesso em: 30 de julho de 2008.
GIUCCI, Guilhermo. Viajantes do maravilhoso – o novo mundo. Companhia 
das Letras, 1992.
39Os (des)encontros entre as culturas
HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. 10. ed. Rio de 
Janeiro: DP&A, 2005.
HOLANDA, Sergio Buarque de (Org.). História geral da civilização brasileira. 
8. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1989.
MONTAIGNE, Michel de. Ensaios. São Paulo: Abril Cultural, 1980. 500 p. 
(Os pensadores).
MORRE índio atacado por adolescentes. Disponível em: wwwl.folha.uol.com.
br. Acesso em: 30 de julho de 2008.
PEREIRA, Patrícia. Seiva de Pedra. In: Revista Sociologia: Ciência & Vida, 
ano 1, n. 3, p. 41-49.
POMER, Leon. História da América hispano-indígena. São Paulo: Global, 
1983.
ROCHA, Everardo P. Guimarães. O que é etnocentrismo. 7. ed. São Paulo: 
Brasiliense, 1984. 95 p. (Primeiros passos).
WEHLING, Arno; WEHLING, Maria José C. M. Formação do Brasil colonial. 
4. ed., rev. amp. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2005.
Autoavaliação
1. Indique sobre qual grupo o texto abaixo trata:
 (...) As narrativas dos primeiros viajantes caracterizam o Novo Mundo 
como sendo de clima ameno, onde habitam seres inocentes e pacíficos, 
relatam ainda que havia grande liberdade social e moral. Seus habitantes 
desconheciam governos, moeda e a propriedade.
a) Europeus
b) Negros
c) Lusitanos
d) Índios
2. O Brasil na época da conquista era habitado por grupos etnicamente 
distintos. Os Tupis, melhor descritos pelas fontes quinhentistas e 
seiscentistas, viviam de caça, pesca, coleta, praticavam a horticultura e 
ficavam em uma determinada área até esgotar seus recursos, portanto é 
correto afirmar que:
40 Os (des)encontros entre as culturas
a) Possuíam mobilidade espacial.
b) Possuíam mobilidade social.
c) Eram sedentários.
d) Possuíam mobilidade global.
3. “É a tendência a colocar a Europa como protagonista da história do 
homem. Suas culturas e povos funcionam como o principal elemento na 
constituição da sociedade moderna.” A frase acima se refere ao:
a) Americanismo
b) Antropocentrismo
c) Teocentrismo
d) Eurocentrismo
4. A visão eurocêntrica tem tendência a menosprezar quais culturas?
a) Todas as culturas de “costumes bárbaros”.
b) Povos de cultura antropofágica.
b) As culturas que não se enquadram no “modelo europeu” olhando-as 
de maneira exótica.
c) As culturas que são tidas como populares ou “de massa”.
5. Conforme estudamos neste capítulo, o etnólogo francês Denys Cuche 
adverte que, apesar do caráter mutável e dinâmico da identidade, não se 
pode pensar que os atores sociais estão completamente livres para definir 
sua identidade de acordo com os interesses do momento. Segundo esse 
autor,
a) Não é possível aos grupos e aos indivíduos fazer o que quer que 
desejem em matéria de identidade: a identidade é sempre resultante 
da identificação imposta pelos outros e da que o grupo ou indivíduo 
afirma por si mesmo.
b) A representação que fazemos de nós mesmos é livre e não depende 
em hipótese alguma da identificação imposta por outras pessoas ou 
grupos.
c) Tudo depende do status social de cada indivíduo, pois é sabido 
que nem todos têm condições de impor sua identidade conforme 
gostariam.
d) Nenhuma das opções está correta.
Gabarito: 1(A); 2(A); 3(D); 4(C); 5(A).
3
A posse da terra, poderes 
e exclusões
Introdução
A terra no Brasil sempre foi sinônimo de poder político, econômico e status 
social. Ocorreram várias mudanças na história política do nosso país, ele foi 
colônia, império e república. Entretanto, a importância de possuir a terra nunca 
foi alterada, pois o poder econômico e político emanariam dessa posse. Desde 
o início da colonização a terra, o poder e a política estão ligados. Os senhores 
rurais do Brasil colônia, cafeicultores do Império e os coronéis da República, 
todos sem exceção, por meio da posse da terra conquistaram o poder econômico 
e político no país. Mas e aqueles que não possuíam terra, 
os “excluídos” exerceram algum tipo de influência? Mesmo na atualidade, 
com as variadas formas de exercer a dominação econômica e política, a posse 
da terra continua sendo um instrumento importante.
Neste capítulo iremos estudar as formas que se deram no contexto colonial 
a primeira doação de terras e quem foram os beneficiados, como se organizou 
a sociedade colonial, calcada na diferenciação social, a escravidão e as questões 
relacionadas ao cotidiano do escravo, bem como as formas utilizadas por eles 
para alterar ou amenizar sua condição social.
42 A posse da terra, poderes e exclusões
3.1 A ocupação do território
Com o expansionismo marítimo e a descoberta da América, chamada de 
Novo Mundo, Portugal, pioneiro nas grandes navegações, e Castela (parte 
da atual Espanha), lançam mão de vários tratados para tentar solucionar os 
conflitos que se seguiram com a descoberta do Novo Mundo. As duas Coroas 
assinaram o Tratado de Tordesilhas em 1494, várias regiões que hoje pertencem 
ao território brasileiro, na época da assinatura desse tratado, ficaram sob o 
domínio espanhol. O Tratado de Madrid, de 1750, que suplantou o Tratado 
de Tordesilhas, foi a tentativa entre as duas Coroas de pôr fim aos conflitos 
territoriais e fronteiriços, mas ainda não temos o que na geografia moderna 
chamaríamos de um território.
(...) o território é um espaço social que não pode existir sem uma 
sociedade que o crie e qualifique, logo inexiste como realidade puramente 
natural, sendo construído com base na apropriação e transformação dos 
meios criados pela natureza. O território é um produto socialmente 
produzido, um resultado histórico da relação de um grupo humano com 
o espaço que o abriga. (MORAES, 2000, p. 18)
Após o Tratado de Madrid, vieram outros que evidenciaram a importância 
da posse dessas terras no cenário internacional, momento em que o poder 
estava ligado à posse de colônias. A partilha do mundo, apenas entre as duas 
Coroas, foi questionada por outras potências europeias, que logo se lançaram 
na costa brasileira e promoveram o comércio clandestino por meio do contato 
com os indígenas.
No primeiro quartel do século XVI, notava-se pouco povoamento no Brasil. 
A Coroa portuguesa estava envolta com as rotas orientais e com os lucros 
imediatos que as mesmas ofereciam. A ação lusitana se limitava mais a objetivos 
geopolíticos e servindo de escala para os navios que iam para as Índias. No litoral 
brasileiro foram instaladas pequenas bases militares, cujo objetivo era auxiliar 
os navegantes, além de guardar alimentos, munições e ferramentas. Apesar de o 
Brasil possuir, inicialmente, poucos atrativos econômicos aos olhos de Portugal, 
ocorreram diversos tipos de escambo. Os comerciantes portugueses recolhiam43A posse da terra, poderes e exclusões
produtos da costa brasileira, dentre eles o pau-brasil, retirado da mata pelos 
índios em troca de objetos até então desconhecidos por essas populações.
Com a crise do comércio oriental, Portugal se viu endividado, e grande 
parte do seu comércio foi dominado pelo capital estrangeiro. Neste contexto 
de aparente decadência da Coroa lusitana, aguçou-se a cobiça das potências 
estrangeiras pelas novas terras. Esse fator, aliado à crise econômica, fez Portugal 
mudar sua política em relação ao Brasil, e a necessidade de defesa reforçou a 
iniciativa colonizatória (MORAES, 2000). Sem ter recursos para financiar a 
colonização a Coroa portuguesa, entregou o Brasil ao investimento privado. 
O território brasileiro foi dividido em extensas áreas, chamadas de capitanias 
hereditárias, que foram entregues à nobreza. Essas terras foram divididas em áreas 
menores chamadas de sesmarias. Criada em Portugal no século XIV, a sesmaria 
é um instituto jurídico que foi transposto para o Brasil com algumas adaptações. 
Uma de suas funções era a de estimular a produção. Eram estabelecidos prazos 
para o início da produção e, quando o titular não os cumpria, corria-se o risco de 
ter o direito à posse da terra cassado. O veto à transmissão hereditária das terras 
doadas a particulares foi suplantado devido a sua inviabilidade, e introduziu-se 
o direito à transmissão hereditária das mesmas (GORENDER, 1980).
Em 1850, foi criada a primeira lei agrária nacional, a Lei de Terras, que 
colocou em prática e legitimou a obtenção de extensas aréas pertencentes a uma 
minoria privilegiada. Em contrapartida, a referida lei dificultou e excluiu os 
pequenos posseiros ao acesso à terra. A Lei de Terras contribuiu para generalizar 
o tratamento da terra como mercadoria.
A partir da Lei de Terras (...) todas as terras tidas como devolutas 
tornaram-se objeto de venda pelo governo. A ocupação de terras 
não mais poderia ser “mansa e pacifica”, na expressão usada na 
época, mas sim através da compra. Dessa forma, o acesso à terra, 
do ponto de vista legal, ficou difícil para as camadas pobres da 
população camponesa, mas nem tanto para as elites locais, que além 
de regularizar suas propriedades procuravam avançar ou incorporar 
novas áreas onde viviam muitos posseiros pobres sem poder para 
reagir. (ZARTH,1997: 60)
44 A posse da terra, poderes e exclusões
A Lei de Terras reconheceu as antigas sesmarias e legitimou de modo formal 
o regime das posses, estabelecendo a compra como a única forma de adquirir 
terras. Com o advento da República, o registro Torrens ou Lei de Torrens, de 
1890, exerceu a tarefa de demarcar as terras devolutas e declarar, como tais, 
terras ocupadas sem o título formal de propriedade, além do estabelecimento de 
impostos territoriais, Com essa lei, as vendas informais de terra caíram, e esses 
impostos representaram, ao menos para os pequenos proprietários, um fardo 
pesado e, muitas vezes, impossível de carregar. Os impostos comprometeram a 
transmissão de heranças desses pequenos produtores.
Essa lei teve um impacto muito grande para a população recém-liberta. 
A mobilidade espacial, que com a abolição era uma opção, a partir da Lei de 
Torrens passou a ser, para muitas famílias negras, uma obrigação. Diversas 
famílias negras, devido à impossibilidade de se fixar, tiveram que migrar pelas 
fazendas à procura de trabalho.
O tempo viria cristalizar na região, para os libertos e seus filhos, duas 
possibilidades básicas, ou dois extremos polares (...). Por um lado, a 
estabilidade via contratos (...). E por outro, uma extrema mobilidade 
tanto para famílias como para a maioria de homens que, solteiros ou 
casados, iriam habitar os barracões das fazendas que abrigavam os 
trabalhadores sazonais. (MATOS & RIOS, 2005, p. 78)
3.2 A sociedade colonial
Com a intensificação do processo colonizador, em 1532, o Brasil foi dividido 
em capitanias hereditárias (extensos territórios doados para os membros da 
pequena nobreza luzitana). Entre 1534 e 1536, foram concedidas 14 capitanias, 
cuja principal dificuldade eram os conflitos com indígenas, desentendimentos 
entre colonos e donatários e a dificuldade de contato com a Europa. Em uma carta 
envidada à Coroa por um desses sesmeiros ficaram explícitas as dificuldades 
existentes nas capitanias, “...se com tempo e brevidade Vossa Alteza não socorre 
a estas capitanias e costa do Brasil, ainda que nós percamos as vidas e fazendas, 
Vossa Alteza perderá a terra”. (Apud WEHLING, 2005, p. 69)
45A posse da terra, poderes e exclusões
O apoio aos donatários veio em 1548 com a criação do Governo Geral, 
com sede na Bahia, e que tinha como função coordenar a colonização que 
estava em estado precário. Combateu também a ameaça exterior representada 
pelos franceses e espanhóis, cujas atividades começaram com escambo com os 
indígenas para exploração do pau-brasil e depois para a tentativa de ocupação 
efetiva do território. Os franceses ocuparam o Rio de Janeiro e os espanhóis 
tentaram ocupar toda a região sul de São Vicente.
Em 1549, havia núcleos dispersos de colonização que se limitavam à 
exploração do pau-brasil e a uma pequena produção açucareira. As atividades 
econômicas foram marcadas pelo sitema colonial movido pelo mercantilismo, 
que tinha por função atender aos interesses da metrópole, suprir o mercado 
internacional e produzir com base no latifúndio, na escravidão e na dependência 
externa.
A sociedade colonial estava dividida em segmentos e com diversos critérios 
classificadores dos estratos sociais. A cor da pele era um dos critérios que dividia 
a população em portugueses, índios e mestiços em uma região, ou brancos, 
pardos e negros em outra. A posse da terra, proprietários/não proprietários, era 
um classificador eficaz numa economia predominantemente agrária. Entretanto, 
deixava de fora do segmento superior as riquezas que não estavam ligadas à terra, 
como os enriquecidos mineradores. Um outro critério parcialmente eficaz era o 
paradoxo entre senhor e escravo, porém ignorava o trabalho livre, assalariado, 
que ocorreu, mesmo sendo a colônia um polo da escravidão. A sociedade colonial 
era um conjunto bem mais complexo do que simples dicotomias.
No elemento superior da sociedade estavam os proprietários rurais, grandes 
comerciantes, mineradores e a alta burguesia. O setor intermediário era 
composto de diversos grupos que escapavam dos dois extremos da pirâmide 
social: os pequenos comerciantes, tropeiros e os pequenos fazendeiros que 
eram os antigos vaqueiros que tinham conseguido guardar gado suficiente para 
“montar fazenda”. A base da pirâmide social era formada pelos escravos, fossem 
eles índios ou negros, e a mobilidade social na colônia, com exceção do escravo, 
era bem maior do que na metrópole.
A Igreja, exercendo seu papel de braço do Estado, esteve presente desde o 
início da colonização. A Companhia de Jesus foi a primeira ordem religiosa que 
oficialmente se estabeleceu no Brasil. Com a sua missão civilizatória, os jesuítas 
46 A posse da terra, poderes e exclusões
entraram no interior convertendo indígenas e batendo de frente muitas vezes 
com os colonizadores. Apesar do catolicismo português imposto pela Coroa, o 
sincretismo religioso esteve presente em todo o período colonial por meio das 
crenças e dos sentimentos religiosos diversos, que foram o resultado da mistura 
cultural e étnica entre portugueses, índios e negros.
Obra do artista Victor Meirelles representando a primeira missa no Brasil dos 
jesuítas.
Fonte: http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/5/5d/Meirelles-primeiramissa2.jpg
Apesar da moral social possuir bases católicas, ela variava de acordo com o 
número de mulheres brancas disponíveis. Em períodos de escassez, a tolerância 
aos costumes reprovados pela igreja, como o concubinato, aumentava. No 
século XVIII, diante do aumento do contigente feminino, as leis se tornaram 
mais rígidas (WEHLING, 2005). A sociedade colonial era hierarquizada e 
patriarcal,e a família estava dentro destes moldes. O chefe da família possuía 
inteira autoridade sobre a mulher, filhos, escravos, agregados e empregados. 
Uma grande família podia impor seus domínios até entre seus vizinhos. Esse 
47A posse da terra, poderes e exclusões
modelo patriarcal relegou a mulher a uma condição submissa ao homem, que 
só era quebrada em casos como a viuvez, situação em que a mulher tinha a 
oportunidade de sair da condição subalterna e comandar a casa.
Fonte: http://www2.uol.com.br/historiaviva/reportagens/ 
familia_na_colonia_um_conceito_elastico.html
A cultura só se delineou como “cultura brasileira” um século após o início da 
colonização. Antes disso, portugueses, negros e comunidades autóctones ainda 
guardavam seus vínculos originais (WEHLENG, 2005). No Brasil colonial, a 
cultura possuía referências na religião e na política. A literatura e o teatro eram 
influenciados pelo universo religioso, obediente a Deus e ao rei. Em Minas 
Gerais, nasceram o Barroco, movimento plástico e arquitetônico, e o movimento 
literário denominado de Arcadismo. A valorização da cultura europeia foi, 
durante todo o período colonial, uma característica marcante no Brasil. Contudo, 
a subversão do cânone pôde ser percebida nos traços do artista e no gosto do 
literato pelos elementos locais.
48 A posse da terra, poderes e exclusões
Obra de Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho.
Fonte: http://www.portalsaofrancisco.com.br/alfa/primeiro-reinado/periodo-colonial.php
3.3 A escravidão
Em vigor no país desde 2003, a Lei n. 4.151/03, que determina que as 
universidades devem reservar um percentual de vagas a população negra, 
ainda gera polêmica. Para discutir a questão das cotas raciais, precisamos olhar 
para o passado colonial do Brasil, em que o negro escravizado foi a base da 
economia. Esse período da história deixou estigmas profundos, e muitos deles 
não desapareceram com a abolição institucional.
A escravidão é um tema constante na historiografia brasileira e possui várias 
vertentes, muitas vezes conflitantes entre si. Não é nosso propósito fazer uma 
discussão historiográfica acerca da escravidão. O objetivo do texto é mostrar 
que as arbitrariedades ou a insubmissão dos escravos são importantes, mas não 
são suficientes para a compreensão da vida do negro na sociedade escravista. 
Existem o cotidiano do escravo, os laços familiares, os meios de conseguir a 
liberdade e as diversas formas encontradas por eles para tentar sobreviver dentro 
dessa dinâmica cruel a que estavam submetidos.
O início do período colonial teve como característica o uso da mão de 
obra escrava do indígena. Entretanto, com a caracterização do índio como um 
49A posse da terra, poderes e exclusões
trabalhador débil, indolente e pouco resistente às doenças (há muito refutado 
pela historiografia), somada aos interesses mercantilistas do momento, iniciou-
se no Brasil a escravização do negro. O tráfico desses escravos gerava para a 
Coroa portuguesa e traficantes lucros que a escravização dos indígenas não 
alcançava. “O estereótipo do índio incapaz foi muito útil à Coroa e aos traficantes 
que tinham no comércio de africanos fabulosa fonte de lucros” (GORENDER, 
1980, p. 132).
A base da economia e da sociedade brasileira passou a ser a escravidão, 
fazendo o Brasil dependente do tráfico atlântico de escravos. Não há consenso 
entre os historiadores acerca do número de escravos trazidos para o Brasil, os 
números são incertos, variando entre 3 e 13,5 milhões. O principal porto negreiro 
do Brasil foi o Rio de Janeiro, que, por volta de 1820, recebia cerca de 30.000 
cativos por ano (SCHWARTZ, 2001, p. 83). Devido às pressões internacionais, 
o tráfico tornou-se ilegal em 1830, entretanto ele só cessou por volta de 1850, 
com a Lei Eusébio de Queirós.
Um dos inúmeros destinos desses escravos eram as lavouras de cana-de-
açúcar e os engenhos. As condições físicas nestes engenhos eram paupérrimas, 
faltava roupa, alojamento adequado e comida. Além disso, a disciplina era rígida 
com castigos cruéis. As proibições religiosas de trabalho em dias santos e nos 
sábados representavam um alívio para os cativos, que tinham a permissão de 
usar esses dias em seu próprio benefício.
A Igreja também exigia que os escravos fossem batizados, e a responsabilidade 
de fazê-lo ficava por conta do senhor, e a punição para quem descumprisse 
a exigência era o confisco do escravo pela Coroa. As irmandades de Nossa 
Senhora do Rosário, presentes em todo o país, representavam um dos poucos 
meios de acesso à expressão por parte dos escravos, aceitos nessas irmandades 
e nos grêmios das igrejas por meio do sacramento do batismo. Uma das formas 
de laço fictício foi o compadrio, que, para a sociedade cristã, representava laços 
espirituais. No contexto do catolicismo, qualquer indivíduo livre ou escravo 
tornava-se membro da sociedade cristã com o batismo. Este sacramento criava 
laços cuja dimensão social ultrapassava o ambiente da Igreja. O compadrio 
podia ser usado para reforçar os laços de parentesco ou para consolidar relações 
de classes sociais semelhantes, como também estabelecer laços verticais entre 
indivíduos de classe sociais diferentes (SCHWARTZ, 2001, p. 243).
50 A posse da terra, poderes e exclusões
Apesar da importância dos laços de compadrio, foi a família escrava que 
fez a diferenciação dentro da sociedade escravista, “negociando nas brechas da 
política de domínio senhorial” (MATTOS & RIOS, 2005, p. 89). Desde 1707, 
a Igreja exigia que os senhores permitissem o matrimônio de seus escravos e 
que mantivessem a família unida. Em 1869, já no processo de abolição e sob 
influência das ideias liberais, foi aprovada a lei que proibia a separação de 
casais e de seus filhos de até 12 anos. Até que ponto a lei foi respeitada ainda 
não sabemos, pois o estudo da família escrava no Brasil é recente e carece de 
poucas fontes.
As sabotagens, doenças fingidas, corpo mole para o trabalho, incêndio 
nas plantações eram constantes no cotidiano do sistema escravista. A solução 
encontrada para amenizar essa situação e, assim, no caso das fazendas, melhorar 
a qualidade e a quantidade da produção foi a implantação de incentivos. Nos 
engenhos, além da distribuição de presentes, havia o sistema de quota: “[...] 
os escravos, ao menos teoricamente, ao completar a quota estavam livres para 
fazerem o que quisessem” (SCHWARTZ, 2001, p. 103). É importante lembrar 
que essas “brechas” não eliminam o caráter violento e opressor da escravidão, o 
sistema escravista continuava sendo sinônimo de açoites onde os castigos, fossem 
físicos ou morais, estavam sempre presentes. E, mesmo com a lei de 1886, que 
proibia a prática de açoites, esse castigo continuou recorrente.
Para diminuir os gastos com a dieta dos escravos ou prendê-los à fazenda pelo 
amor à propriedade (SCHWARTZ, 2001), o senhor cedia pequenas áreas para 
que eles plantassem. O cultivo era realizado aos domingos e feriados religiosos. 
A horta destinada para o cultivo do escravo, em diversas regiões do Brasil, 
significava muito mais do que complemento na alimentação; era a possibilidade 
de vender o excedente. O resultado dessa venda poderia ser usado na compra 
de mercadoria nas cidades ou guardado para a compra de sua alforria.
Para o escravo, essa “brecha camponesa” poderia significar uma abertura no 
sistema escravista vigente, uma forma de melhorar sua vida. Para os senhores, 
além de diminuição de gastos com a alimentação, a doação de pequenas áreas 
ligava o cativo à terra. “Um manual de agricultores de 1847 era favorável à 
doação de hortas aos escravos. “Isso os liga à terra pelo amor à propriedade. O 
escravo que é proprietário não foge nem provoca desordem” (WERNECK apud 
SCHWARTZ, 2001, p. 100). Apesar de o sistema funcionar com esse certo grau 
51A posse da terra, poderes e exclusões
de autonomia para os escravos e do acúmulo de pecúlio ter sido recorrente, isso 
só será legalizado a partir da Lei do Ventre Livre em 1871.
Esses incentivos

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