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Prática Pedagógica em Filosofia I

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PRÁTICA PEDAGÓGICA EM 
FILOSOFIA I 
Bárbara Lucchesi Ramacciotti 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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2 
 
 
SUMÁRIO 
 
1 ENSINO DE FILOSOFIA COMO PROBLEMA FILOSÓFICO ........................... 3 
2 POLÍTICA EDUCACIONAL E O ENSINO DE FILOSOFIA .............................. 17 
3 VERTENTES PEDAGÓGICAS, DIDÁTICAS E O ENSINO DE FILOSOFIA ....... 28 
4 ESPECIFICIDADE DO ENSINO DE FILOSOFIA: CONTEÚDOS, OBJETIVOS E 
RECURSOS ................................................................................................ 43 
5 HISTÓRIA DAS IDEIAS PEDAGÓGICAS: MODERNAS E ILUMINISTAS ....... 54 
6 CONTRIBUIÇÕES DO POSITIVISMO PARA A EDUCAÇÃO ......................... 68 
 
 
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3 
 
 
1 ENSINO DE FILOSOFIA COMO PROBLEMA FILOSÓFICO 
 
Olá! Boas-vindas à disciplina Prática Pedagógica em Filosofia. 
Ao longo deste bloco, vamos refletir sobre o ensino de Filosofia como um problema 
filosófico, pondo em foco a prática pedagógica em Filosofia, a formação específica do 
professor de Filosofia, a relação ensino-aprendizagem, a questão dos conteúdos dos 
currículos e a abordagem didática da “repetição criativa”. Esperamos que, depois deste 
percurso, você possa identificar alguns argumentos importantes do debate sobre o 
ensino de Filosofia postos por especialistas no tema. O reconhecimento dessas 
concepções didáticas e práticas sobre o ensino de Filosofia poderá servir como alicerce 
para a elaboração de atividades em sala de aula que possibilitem uma aproximação 
significativa entre o aprender e o ensinar filosoficamente. 
Vamos começar! 
Refletir filosoficamente a prática do ensino de Filosofia não é um atributo específico 
do professor dessa disciplina, no entanto a reflexão é por si uma prática do filósofo. Se 
esse professor ensina Filosofia, torna-se inevitável não pensar sua prática de ensino de 
maneira filosófica. Em outras palavras, torna-se inevitável adotar uma atitude 
filosófica diante de sua prática, é preciso refletir tanto sobre o próprio ato reflexivo 
quanto sobre a sua metodologia de ensino. Dividimos essa reflexão sobre o ensino de 
Filosofia em três tópicos: 
1. Reflexão sobre a prática pedagógica como atitude filosófica; 
2. A formação do professor e a relação ensino-aprendizagem ativa; 
3. A repetição criativa e o currículo de Filosofia. 
 
 
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4 
 
1.1 Reflexão sobre a prática pedagógica como atitude filosófica 
O que é uma prática pedagógica pensada por meio da reflexão filosófica ou da atitude 
filosófica? É preciso intervenção filosófica sempre que se ensina Filosofia? Como 
garantir o ensino de Filosofia em contextos diversos? O que é o ensino de Filosofia 
pensado na prática? 
O primeiro problema que o professor de Filosofia encontra é do distanciamento entre 
a prática pedagógica comumente adotada do ensino de conteúdos e a prática 
específica da reflexão filosófica. Em geral, a prática filosófica perde espaço diante do 
conteúdo a ser ensinado. Sendo assim, o texto, o filósofo e a história da Filosofia 
parecem ter mais importância do que a prática da reflexão ou a atitude filosófica. Mas 
o que significa a reflexão filosófica aqui enquanto sinônimo de atitude filosófica? 
Uma das maiores filósofas e professoras de Filosofia do Brasil, Marilena Chaui (2000, p. 
12), afirma que: a atitude filosófica pode ser entendida, em um primeiro momento, 
como toda atitude questionadora diante da vida, que surge a partir de um 
distanciamento crítico da vida cotidiana, quando passamos “a indagar sobre o que são 
as crenças e os sentimentos que alimentam, silenciosamente, nossa existência”. Chauí 
(2000) ainda observa que a atitude filosófica ou questionadora pode ser entendida 
como uma primeira resposta à pergunta “O que é Filosofia?”. Para entender o que é a 
atitude filosófica, precisamos identificar quais são as características desse 
comportamento, completa a professora-filósofa: 
A primeira característica da atitude filosófica é negativa, isto é, um dizer não 
ao senso comum, aos pré-conceitos, aos pré-juízos, aos fatos e às ideias da 
experiência cotidiana, ao que “todo mundo diz e pensa”, ao estabelecido. 
A segunda característica da atitude filosófica é positiva, isto é, uma 
interrogação sobre o que são as coisas, as ideias, os fatos, as situações, os 
comportamentos, os valores, nós mesmos. [...] O que é? Por que é? Como 
é? 
Essas são as indagações fundamentais da atitude filosófica. A face negativa e 
a face positiva da atitude filosófica constituem o que chamamos de atitude 
crítica e pensamento crítico (CHAUÍ, 2000, p. 12). 
 
 
 
, 
 
 
5 
 
A formação do professor, especificamente, as disciplinas sobre a Prática Pedagógica 
em Filosofia são um lugar privilegiado para refletir de modo crítico e filosófico sobre os 
temas centrais para a prática do ensino de Filosofia. Nesse espaço podemos refletir 
criticamente sobre o processo de formação de professores de Filosofia, refletindo 
sobre as metodologias, as didáticas e as práticas pedagógicas mais adequadas ao 
ensino de Filosofia. 
O primeiro ponto para refletir diz respeito ao papel do professor como aquele que tem 
a tarefa de “ensinar Filosofia” tendo por conteúdo o pensamento dos filósofos, ou 
seja, o próprio ato de filosofar na prática. É preciso considerar também que muitos 
filósofos foram os primeiros e mais renomados professores de Filosofia de seu tempo, 
seja esse ensino ligado a uma instituição de ensino ou não. 
A sala de aula do patrono da Filosofia, Sócrates, eram as ruas de Atenas, onde ensinou 
muitos cidadãos atenienses a pensar, pondo em prática seu método dialético, que por 
meio de perguntas e respostas, demonstrava a incoerência e a fragilidade das opiniões 
do senso comum. Pondo em prática essa atitude filosófica questionadora, Sócrates 
fazia com que seus interlocutores reconhecessem que não sabiam o que pensavam 
saber. Apesar disso, Sócrates nunca se colocou como o detentor da verdade, ao 
contrário, seu lema era: “Sei que nada sei”. 
O ensinar Filosofia nos coloca diante desses desafios, sobretudo diante da tarefa de 
pensar a Filosofia ou os temas e problemas da História da Filosofia de modo filosófico. 
Nesse sentido, todo professor de Filosofia assume também o papel do professor-
filósofo, não no sentido de ser ele o autor de uma obra filosófica, pois nem sempre 
isso é possível, mas no sentido de precisar adotar a atitude filosófica diante dos 
conteúdos que ensina. 
A docência em filosofia convoca os professores e as professoras como 
pensadores e pensadoras, mais do que como transmissores acríticos de um 
saber que supostamente dominam, ou como técnicos que aplicam 
estratégias didáticas ideadas por especialistas para ser empregadas por 
qualquer um, em qualquer lugar (CERLETTI, 2009, p. 9). 
 
, 
 
 
6 
 
Pensar nesse caminho demanda rediscutir a relação ensino-aprendizagem a partir de 
práticas pedagógicas e didáticas que coloquem o professor e o aluno em um papel 
ativo, ou seja, de protagonista diante dos conteúdos ensinados-aprendidos. Adotar 
uma abordagem didática ativa implica em recusar a didática tradicional, na qual 
apenas o professor é ativo-protagonista, enquanto transmissor de conteúdos, e os 
alunos meros receptores passivos. 
A filosofia [...] depende de uma atitude tão vivencial e ativa do sujeito que 
aquele que se situa como suposto transmissor da filosofia se coloca num 
não lugar filosófico. Mesmo – ou melhor, sobretudo – quando o assunto é a 
história da filosofia ou a filosofia de outro filósofo, a transmissão é um não 
lugar da filosofia, porque ela não pode ser enfrentada externamente, como 
aquilo que um outro faz: ou ela se exerce, se pratica, ou se faz outra coisa. 
Todos os filósofos da história fazem isto, por isto são os ao mesmo tempo 
filósofos e educadores, os melhores ensinantes de filosofia! (GALLO; 
KOHAN, 2000, p. 182). 
A formação e a prática pedagógica dos professores de Filosofia deveriam sempre 
privilegiar asmetodologias e didáticas ativas, que possibilitem a reflexão crítica ou a 
atitude filosófica como base da relação ensino-aprendizagem ativa. Para isto é 
necessário que o docente pense a sua prática de ensino como o próprio ato de 
filosofar. Isso permite que o ensinar não seja meramente uma repetição pela 
transmissão de conteúdos prefixados, dando espaço para refletir sobre o próprio ato 
de ensinar, sobre as escolhas dos conteúdos e das metodologias ativas, aquelas que 
melhor favoreçam o despertar da atitude filosófica reflexiva no aluno. Em outras 
palavras, trata-se de pensar a prática pedagógica sob a ótica da atitude filosófica 
reflexiva. 
A prática educativa tem sido inerente à Filosofia ao longo da história; em 
nome de que a desprezamos quando se trata de formar professores de 
Filosofia? Será essa uma tarefa menor? O professor de filosofia não deve 
ser, de alguma maneira, filósofo? (isto é, alguém que pratica a filosofia)? 
Faz sentido, no caso da filosofia e de seu ensino, essa separação entre a 
teoria e prática? Nos últimos anos os filósofos professores de Filosofia 
brasileiros vêm se preocupando com questões como essas. Trata-se, quer 
me parece, de um movimento de pensar filosoficamente o ensino de 
Filosofia. Um movimento em que os filósofos têm tomado para si a 
responsabilidade de pensar a prática docente, em seus vários níveis (GALLO; 
DANELON; CORNELLI, 2004, p. 10). 
 
, 
 
 
7 
 
Mesmo o ensino de Filosofia sendo institucionalizado e correspondendo às 
experiências de aprendizagem do docente, abre-se como um campo de maiores 
possibilidades, a partir do momento que se compreende o ato de ensinar Filosofia 
como uma prática pedagógica pensada filosoficamente. Ensina-se a filosofar enquanto 
se aprende-ensina a refletir de modo filosófico sobre todos os temas selecionados, 
incluindo a própria “prática pedagógica” do ato de ensinar. Nesse caso, há contextos 
reflexivos e práticas pedagógicas específicas no ato de ensinar Filosofia. Conforme 
observa Gallo e Kohan (2000, p. 25): 
Há diversas razões que nos levam a pensar que o ensino de Filosofia faz 
parte da própria Filosofia. Uma delas é a importância que, para o ensino de 
Filosofia, tem algumas perguntas filosóficas como: “o que é a Filosofia?”, “o 
que significa pensar?” e “para que ensinar a aprender”? Pelo menos parece 
claro que não é possível ensinar Filosofia sem ensinar alguma Filosofia [...]; 
também não é possível fazê-lo habitar certo espaço para o pensamento e 
sem configurar determinados sentidos para seu ensino e sua aprendizagem. 
 
A reflexão sobre a prática do ensino de Filosofia deve levar em conta tanto a 
pluralidade de temas e de Filosofias que podem ser selecionadas para o currículo, pois 
não há um conteúdo predefinido, quanto a possibilidade de ter ou não muitos recursos 
pedagógicos. A qualidade do ensino de Filosofia nunca dependeu da existência de 
muitos recursos materiais, mas o texto dos filósofos, o texto de comentadores dos 
filósofos e a atitude filosófica – esses são os principais recursos que devem ser levados 
em conta no planejamento didático. 
A prática pedagógica pode depender dos recursos disponíveis, mas depende, 
sobretudo, da própria mediação do professor como aquele que coloca o aluno em 
contato com o universo de ideias, conceitos e questões postas pelos filósofos em uma 
história de mais de 2.500 anos. Portanto, nesse sentido, a disciplina Filosofia é muito 
rica em recursos, talvez uma das mais privilegiadas. E a mediação do professor deve 
sempre visar colocar o aluno em contato com esse universo de Filosofias enquanto um 
caminho de construção de sentidos e significados para a vida, trazendo essa reflexão 
para a própria experiência de vida dos alunos. 
 
 
, 
 
 
8 
 
A mediação filosófica é construtora de sentidos num mundo sem 
significado. É uma proposição de compreensão para construir um horizonte 
significativo para a vida. Por conseguinte, meditar sobre as respostas que a 
história construiu constitui um caminho interpretativo do presente que 
pode “iluminar” nossa compreensão (GHEDIN, 2009, p. 39). 
 
 
1.2 A formação do professor e a relação ensino-aprendizagem ativa 
A formação do professor por meio da especificidade filosófica pode produzir 
competências a serem adotadas na prática cotidiana do ensino-aprendizagem, pois 
trata-se de privilegiar a atitude filosófica e reflexiva como base do ato de ensinar e do 
ato de aprender. Nesse caso, podemos falar de uma perspectiva filosófica da prática 
que não pode ser pensada como um caminho distinto e separado do próprio ato de 
reflexão teórica enquanto momentos da atitude filosófica reflexiva e crítica. Há na 
ação pedagógica e nas estratégias metodológicas o pressuposto reflexivo da atitude 
filosófica como uma atitude ativa no sentido de questionadora da existência e da 
própria realidade vivida. 
A metodologia da Filosofia pode ser caracterizada como ato questionador 
da existência, da realidade de si mesmo. A metodologia do ensino de 
Filosofia é o próprio filosofar enquanto ato reflexivo, crítico e dialógico. 
Partir das problemáticas, dos desafios, das dúvidas ou até das certezas é o 
movimento natural da metodologia filosófica (FERREIRA et al., 2016, p. 22). 
 
A formação teórica com base nos conteúdos da História da Filosofia é a primeira parte 
da formação do professor de Filosofia, mas não pode ser a única, posto que a atitude 
filosófica e questionadora precisa ser posta em prática para que se perceba o potencial 
dessa metodologia ativa como didática de ensino-aprendizagem. A atitude reflexiva 
não é, portanto, apenas uma habilidade de analisar tecnicamente os conteúdos e 
temas filosóficos, mas uma atitude questionadora diante da vida, de modo que os 
saberes práticos e as experiências vividas também precisam fazer parte do processo 
ensino-aprendizagem. Isso dá ao ensino de Filosofia uma identidade de abertura para 
a reflexão criativa e criadora de sentidos para a vida, pois os próprios temas postos 
pelos filósofos são temas que dizem respeito a todos nós, nos mais variados campos 
do conhecimento. 
 
, 
 
 
9 
 
Mensurar aquilo que se espera da formação do professor de Filosofia não está 
relacionado apenas à especificidade do conhecimento de conteúdos teórico-
filosóficos. Refere-se também, sobretudo quando se trata da formação em 
licenciatura, à perspectiva de uma prática didática ativa do ensino de Filosofia. O mais 
importante nesse processo de formação é fazer com que o licenciando coloque em sua 
prática pedagógica a reflexão filosófica ou a atitude filosófica como a melhor 
metodologia didática de acesso ao estudante à experiência do aprender a pensar e 
refletir a partir de uma atitude ativa, crítica e responsável diante da vida, diante de 
suas escolhas, dos valores adotados em sua visão de mundo, dos sentidos que 
orientam suas ações, afetos e pensamentos. 
É preciso que o professor entenda que ele mesmo e o aluno são constituídos de 
história e que as experiências vividas devem fazer parte de um processo ativo de 
ensino-aprendizagem. Muitas vezes para manter coerência com certa 
“impessoalidade” em seu processo de ensino, o professor acredita que sua reflexão 
crítica paradoxalmente deve ser acrítica e descontextualizada da história e da 
realidade vivida. 
Contudo, não se pode esquecer que todo filósofo é filho do seu tempo, reflete sobre 
os problemas postos pelo seu contexto histórico e social. Assim, toda Filosofia tem 
como pano de fundo a biografia do filósofo que a sustenta. O professor deve 
considerar que há, simultaneamente, muito de pessoal e de universal no ato da 
reflexão filosófica. Essa ponderação permite que a prática pedagógica durante o 
ensino de Filosofia corresponda a situações compartilhadas, abrindo margem para 
metodologias libertadoras e ativas. Isso nos permite dizer que o professor, o aluno e os 
conteúdos fazem parte de um mesmo processo dinâmico. O professorpode mediar o 
processo de ensino-aprendizagem, fazendo com que as experiências individuais sejam 
refletivas e ressignificadas à luz dos conceitos e métodos filosóficos. A fala de Silva 
ajuda nessa reflexão: 
 
 
, 
 
 
10 
 
O aluno traz para escola parte da sua cultura, logo, a unidade escolar não 
deve impor o currículo como única alternativa. É necessária uma relação 
conjunta entre o trabalho do professor, os conteúdos curriculares e a 
compreensão do sentido que o componente curricular terá para esse aluno 
(SILVA, 2018, p. 66). 
 
Em outras palavras, falamos da atitude filosófica e reflexiva como o caminho, ou 
melhor, como método que integra aluno, conteúdo e professor em uma relação ativa 
de ensino-aprendizagem. Essas observações indicam que não se forma um professor 
apenas pelo contato com os conteúdos, os recursos e com as metodologias e didáticas 
de ensino. O professor de Filosofia se torna professor na medida em que adota a práxis 
filosófica como guia, ou seja, quando busca reunir a teoria e a prática, os conteúdos e 
as experiências vividas, os conceitos filosóficos e a atitude filosófica em um mesmo 
processo. 
O professor quando adota didáticas ativas, ou seja, quando coloca um tema filosófico a 
partir de uma pergunta, de uma dúvida, de um problema para ser debatido abre para 
os alunos a possibilidade de participar de modo ativo da atitude filosófica ou da 
reflexão filosófica como um processo de busca ativa de conhecimentos vivos e 
contextualizados e não como um processo passivo de transmissão de conhecimentos 
dados e ultrapassados. Essa atitude de busca ativa pelo conhecimento é fundamental, 
pois é o que quer dizer a própria palavra philo-sophia: amor e respeito pela sabedoria. 
Historicamente, o filósofo não é aquele que tem o conhecimento e a posse das 
verdades, mas aquele que busca o conhecimento e a verdade, porque é o amigo ou o 
amante (philo) da sabedoria (sophia). 
Mas como ensinar um professor de Filosofia o ensinar de maneira filosófica? Em outras 
palavras, como se ensina a ser professor de Filosofia? A primeira questão sobre a 
formação desse profissional já apontamos: “como ensinar Filosofia”. Chegamos à 
resposta da atitude filosófica como um bom método, que em grego quer dizer 
caminho guiado por uma meta. 
 
 
, 
 
 
11 
 
O passo seguinte reside em desmistificar o ato de filosofar ou de pensar 
filosoficamente como se fosse algo possível apenas para os filósofos do Panteão da 
História da Filosofia. A partir de então, é possível traçar propostas levando em 
consideração a complexidade da questão, uma vez que a autonomia do professor 
“filósofo” é colocada à tona. Isso coloca o professor a todo momento em um processo 
de reavaliação de sua atuação formativa, tanto pela didática que ele adota em sua 
prática de ensino, quanto pela especificidade da sua própria formação filosófica. 
Dar essa autonomia ao professor de autoavaliar-se durante sua formação permitirá 
que o próprio professor de Filosofia possa mensurar qual o melhor caminho para 
aprender aquilo que se pretende ensinar. Ao adotar a postura crítica e reflexiva como 
guia para a sua prática pedagógica, o professor de Filosofia constrói uma didática 
marcada pela abertura e pela autonomia sem abrir mão do papel de direcionamento e 
de mediador do processo ensino-aprendizagem. 
1.3 A repetição criativa e o currículo de Filosofia 
Existe alguma relação entre o conteúdo básico do currículo de Filosofia que se 
pretende ensinar e o despertar da atitude filosófica no aluno do ensino básico? Como 
vincular o conteúdo do currículo com a experiência da reflexão filosófica em sala de 
aula? 
Estas questões convergem para o que entendemos como aprendizagem ativa em 
Filosofia. É importante analisar o que se pode ensinar criticamente a partir do 
currículo, seja ele proposto pelas políticas educacionais que estabelecem diretrizes 
para o currículo básico para a disciplina de Filosofia seja o currículo proposto pela 
direção da escola ou o adotado na prática de ensino em sala de aula pelo professor. 
Como fazer com que a prática de ensino seja ativa de modo que o currículo a ser 
ensinado não seja apenas uma mera repetição de conteúdos, mas uma experiência de 
repetição criativa? Para que isso ocorra, é preciso levar em conta os dois elementos 
analisados anteriormente, a saber: 
i) adotar a atitude filosófica questionadora como principal metodologia didática; 
, 
 
 
12 
 
ii) possibilitar o protagonismo, ou seja, a participação ativa dos alunos de Filosofia na 
educação básica para que coloquem em prática o pensamento crítico. 
Mas o que se entende aqui por “repetição criativa”? Essa metodologia de ensino foi 
proposta por Cerletti (2009), significa fazer com que os alunos reflitam sobre os 
problemas e temas postos pelos filósofos de modo filosófico, ou seja, aprender a 
pensar de modo filosófico com o próprio estudo crítico e reflexivo das ideias dos 
filósofos. 
De acordo com o que viemos sustentando, ensinaríamos filosofia no ato de 
filosofar e aprender-se-ia filosofia começando a filosofar. Portanto, em 
função da caracterização que fizemos da filosofia, a “repetição criativa” 
deveria ter lugar no ensino e na aprendizagem. Isto é, se os alunos começam 
a filosofar, eles começam também a levar adiante algum tipo de repetição 
criativa (CERLETTI, 2009, p. 36, aspas do autor). 
 
Se entendermos que Filosofia é também aquilo que a História de Filosofia traz como o 
lugar da reflexão ao longo do tempo, passaremos a pensar que a Filosofia é aquilo que 
os filósofos fazem a seu tempo. O professor, ao selecionar os temas e problemas a 
serem abordados na sala de aula, deve selecionar também textos dos filósofos que 
reflitam sobre eles. Entender a partir da leitura crítica dos textos como os filósofos 
formulam suas ideias e sustentam seus argumentos por meio de conceitos, de teorias 
e de métodos é um bom caminho para pôr em prática a repetição criativa. O aluno, 
entendendo o processo e as ferramentas para a construção de ideias, conceitos e 
teorias por meio de uma argumentação lógica, aprende a técnica e os métodos de 
como pensar filosoficamente de modo autônomo. 
Nesse sentido, o currículo, ao estabelecer determinados conteúdos e disciplinas como 
básicos, tendo a História da Filosofia Antiga, Medieval, Moderna e Contemporânea 
como fio condutor, possibilita uma enorme gama de filosofias, temas e problemas 
filosóficos para serem analisados à luz da repetição criativa. 
A própria flexibilidade dos conteúdos do currículo de Filosofia abre espaço para que o 
ensino dessa disciplina se mostre como lugar de formação reflexiva e crítica para o 
aluno. 
, 
 
 
13 
 
Afinal, em Filosofia sempre há um ponto de partida na reflexão filosófica, sempre há 
um problema ou uma tese. Quando falamos em educação básica, é necessário, para 
além do ponto de partida, uma direção. “A crítica é um meio que faculta ler a realidade 
como um crivo de julgamentos e juízos valorativos” (GHEDIN, 2009, p. 58). É esse 
caminho direcionador posto pelo currículo básico que permitirá uma compreensão 
organizada e crítica do que se espera ensinar e aprender em Filosofia. É na própria 
História da Filosofia que se encontram os conceitos fundamentais a serem 
desenvolvidos de forma organizada para que se desenvolva a competência da atitude 
filosófica reflexiva e crítica. 
No que diz respeito à Filosofia podemos argumentar que ela é uma área 
singular de reflexão que se ocupa de temas fundamentais na experiência 
humana e que sua ausência no currículo escolar priva o estudante de um 
espaço de formação a que ele tem direito, sem o qual surge uma lacuna em 
sua vida (ROCHA, 2008, p. 34). 
 
A lacuna a ser preenchida pelo ensino de Filosofia na formação integral do aluno deve 
ser debatida em vários aspectos de sua contribuição, considerando que, a partir do 
conhecimento organizado que dá espaço para reflexão,o estudante possa por si 
mesmo (como uma autorreflexão direcionada) aprender a pensar de modo autônomo, 
ou seja, aprender como formular e sustentar de modo consistente uma ideia, um 
conceito, um tema, um problema, uma interpretação da realidade. 
Uma vez que isso passa a ser compreendido durante o processo de ensino-
aprendizagem, daremos aos protagonistas desse processo a liberdade de escolher a 
“Filosofia que se quer aprender” sem abrir mão daquilo que deve ser ensinado. Essa 
prática, quando efetivada, fará surgir a desconstituição do ensino enquanto “sistema 
fechado”, como bem nos alertou Paulo Freire, pois a proposta da repetição criativa 
abre espaço para autonomia do professor e do aluno por meio de um compartilhar 
reflexivo. 
 
 
, 
 
 
14 
 
Ser professor é ter o domínio sobre determinados conteúdos específicos e 
metodológicos. Tais competências e habilidades precisam ser postas em prática por 
uma didática ativa na relação ensino-aprendizagem que adote a própria reflexão 
filosófica e crítica como guia. No ensino de Filosofia vemos que refletir sobre o tipo de 
didática e metodologia a adotar são de grande relevância, o que mostra a importância 
das disciplinas da pedagogia e da reflexão filosófica sobre esses conteúdos para um 
bom exercício profissional. 
A Filosofia, no espaço da educação escolar, não pode negligenciar ou deixar 
de considerar as conquistas e proposições oriundas do campo pedagógico. 
Há uma relação muito próxima entre a Filosofia como conteúdo de ensino e 
a Didática como reflexão sobre os modos pelos quais o ensino se efetiva 
(GHEDIN, 2009, p. 114). 
 
O ensino de Filosofia na educação básica deve ter como planejamento mais do que o 
recorte dos conteúdos filosóficos a partir dos temas específicos, pois o professor 
encontra nas disciplinas de formação pedagógica e didática as respostas do que e 
como “encaminhar” o processo ensino-aprendizagem de modo satisfatório. 
Conclusão 
Nesta reflexão, examinamos alguns elementos norteadores da prática de ensino em 
Filosofia, a saber: 
i) a reflexão ou a atitude filosófica como característica central do próprio pensar 
filosófico ou do que se entende como filosofar ao longo da História da Filosofia; 
ii) a atitude filosófica reflexiva e crítica como um método ou caminho para uma 
abordagem didática ativa, que possibilite uma relação ensino-aprendizado na qual 
professor e alunos assumem o papel de protagonistas; 
iii) a repetição criativa como uma metodologia de ensino, que seleciona conteúdos 
postos pelo currículo básico de Filosofia, para que, por meio da análise de como os 
filósofos pensam determinados temas-problemas, ou seja, por meio dessa “repetição”, 
o aluno aprenda a pensar e a refletir filosoficamente com autonomia, fazendo com 
que, portanto, essa repetição seja criativa e criadora de sentido para a vida do próprio 
aluno. 
, 
 
 
15 
 
Agora que você já conhece alguns dos elementos-chave para pôr em prática 
metodologias ativas no ensino de Filosofia, a partir dessas considerações, vamos 
refletir filosoficamente sobre a seguinte situação-problema que pode surgir na prática 
docente. Quando um estudante diz que não é capaz de pensar filosoficamente, essa 
atitude reativa pode ser o ponto de partida para efetivar a atitude filosófica e reflexiva. 
O que fazer e como fazer? Em vez de confirmar o mito ou o senso comum segundo o 
qual pensar filosoficamente é uma habilidade apenas dos grandes filósofos, o docente 
pode aproveitar essa experiência vivida em sala para praticar a atitude filosófica 
reflexiva e crítica. Usando o método dialético de Sócrates por meio de perguntas e 
respostas, e o lema de sua filosofia “sei que nada sei”, seria possível estimular esse 
aluno a pensar em respostas e sair dessa posição de passividade para uma posição 
ativa, compreendendo na prática que só se aprende a filosofar, filosofando. 
Contudo, esse processo precisa ser orientado, pois nem todo diálogo, ou nem todo 
processo de pergunta-resposta, significa uma reflexão filosófica e crítica. É preciso ter 
claro nesse processo que os preconceitos, as opiniões sem fundamento, as ideias 
contraditórias precisam ser postas à prova e afastadas. É preciso demonstrar que nem 
toda ideia pode ter o estatuto de opinião fundamentada ou de ideia ou conceito 
filosófico. Para que atinja esse nível, precisa ser demonstrada como uma ideia clara, 
coerente, precisa e rigorosa. 
Poderíamos começar acolhendo o educando, dizendo que refletir filosoficamente é 
algo que se aprende fazendo, que não há apenas um tipo de pensar correto, mas 
regras lógicas e argumentativas que podem ser aplicadas para dar coerência e 
correção àquilo que pensamos. Daí a importância de analisar um tema em 
profundidade a partir da reflexão filosófica. Para compreender como fazer isso, o 
professor pode propor verificar como um filósofo pensou sobre um tema/problema 
para aprender como se constroem ideias e argumentos adotando um método, com 
coerência e lógica. 
 
, 
 
 
16 
 
Nesse momento, é possível ver com esse aluno e com toda a turma quais são os 
temas/problemas de interesse, colocar em votação e chegar a uma lista com os temas 
de interesse para a maioria. Dividir os temas por grupos, conforme o interesse, e 
propor que os alunos pesquisem sobre eles a partir de certo filósofo/escola filosófica. 
Adotando essa didática ativa, o professor envolve os alunos no processo de escolha 
dos temas a serem estudados, desperta neles o interesse de estudar/pesquisar e trazer 
os resultados desse processo para o debate em sala. 
O professor tem a tarefa de conduzir e de mediar todo o processo, portanto, esse tipo 
de aula dialogada não significa colocar os alunos para dar aula. As aulas na forma de 
debates conduzidos pelo professor podem ser alternadas com aulas expositivas, nas 
quais o professor pode analisar com mais profundidade um tema/conceitos filosóficos. 
Antes de adotar esse tipo de prática pedagógica ativa, reflita: o que você pensa sobre a 
autonomia da reflexão filosófica feita pelos alunos da educação básica? 
 
REFERÊNCIAS 
CERLETTI, A. O ensino de Filosofia como problema filosófico. Tradução: Ingrid 
Müller Xavier. Belo Horizonte: Autêntica, 2009. 
CHAUÍ, M. Convite à Filosofia. São Paulo: Ática, 2000. 
FERREIRA, A. et al. Filosofia. São Paulo: Blucher, 2016. (Coleção A reflexão e a prática 
no ensino médio, v. 13 / Márcio Rogério de Oliveira Cano, coord.) 
GHEDIN, E. Ensino de Filosofia no Ensino Médio. São Paulo: Cortez, 2009. 
GALLO, S.; KOHAN, W. O. Filosofia no Ensino Médio. Petrópolis: Vozes, 2000. 
______.; DANELON, M.; CORNELLI, G. (orgs.). Ensino de Filosofia: teoria e prática. Ijuí, 
RS: UNIJUÍ, 2004. 
ROCHA, R. D. Ensino de Filosofia e currículo. Petrópolis, RJ: Vozes, 2008. 
 
, 
 
 
17 
 
 
2 POLÍTICA EDUCACIONAL E O ENSINO DE FILOSOFIA 
 
Neste bloco, vamos analisar as políticas educacionais que regulamentam e traçam as 
diretrizes curriculares para o ensino de Filosofia, entre elas destacam-se: A Lei de 
Diretrizes e Bases da Educação (LDB/1996), as Diretrizes Curriculares Nacionais para o 
Ensino Médio, as Diretrizes Curriculares dos Cursos de Filosofia e o Plano Nacional de 
Educação em Direitos Humanos. 
O objetivo reside em fazer uma breve revisão desses marcos legais para que o 
professor de Filosofia, sobretudo os alunos dos cursos de Licenciatura, tenham claro 
quais são os objetivos postos pelos documentos que regulam o ensino dessa disciplina. 
Esses documentos não devem ser compreendidos como os únicos caminhos que 
devem ser seguidos para a escolha de conteúdos, objetos e abordagens didáticas. 
Existem outros aspectos e elementos importantes e específicos para o ensino de 
Filosofia. 
Contudo, o conhecimento e a reflexão sobre tais políticas educacionais são de grande 
relevância para que o professor de Filosofia se sinta seguro, amparado e consciente 
das escolhas e caminhos adotadosem sua prática pedagógica. 
2.1 Políticas Educacionais e a regulamentação da disciplina de Filosofia 
A Lei nº 9.394 de 1996 que estabelece Diretrizes e Bases educacionais é considerada a 
lei maior da educação no Brasil, sendo chamada de “carta magna da educação”, por 
situar-se logo abaixo da constituição. Conforme Saviani (2007), a LDB define as linhas 
mestras do ordenamento geral da educação brasileira e, por ser uma lei geral, muitos 
de seus dispositivos necessitam de regulamentação específica. Portanto, é esta 
legislação que delineia a política educacional em um determinado governo e para uma 
determinada área do conhecimento. 
, 
 
 
18 
 
A partir da nova LDB de 1996, regulamentada no Governo FHC, o ensino de Filosofia 
vai pouco a pouco ganhando uma maior importância na política educacional até 
tornar-se disciplina obrigatória no Ensino Médio a partir de 2009, quase no final do 
segundo mandato do governo Lula. 
É preciso considerar que o retorno da Filosofia como disciplina obrigatória, depois de 
mais de 20 anos exilada dos currículos escolares durante o Regime Militar, resultou de 
uma ampla luta política da sociedade civil organizada pela redemocratização da 
educação. A LDB de 1996 representou uma primeira conquista dos movimentos sociais 
por maior espaço para o ensino de Filosofia na política educacional, pois o artigo 36 
destaca que “o domínio dos conhecimentos de Filosofia e Sociologia” é “necessário ao 
exercício da cidadania”. 
A fim de regulamentar essa política educacional aliada com o espírito da 
redemocratização, o Parecer CNE/CEB nº 3/1998 afirma no §2º que “as propostas 
pedagógicas das escolas deverão assegurar tratamento interdisciplinar e 
contextualizado para: b) Conhecimentos de Filosofia e Sociologia necessários ao 
exercício da cidadania”. Se, de um lado, a LDB de 1996 foi um marco ao recomendar a 
importância do ensino de Filosofia; de outro, o Parecer de 1998 não garantiu 
mecanismos eficazes para que esses profissionais retomassem o espaço perdido no 
sistema educacional, já que os conteúdos necessários à formação da cidadania 
poderiam ser abordados por outras disciplinas de modo transversal. 
A Filosofia conquistou um pequeno espaço na política educacional, pois na prática não 
houve nenhuma alteração na composição curricular, o que se evidencia com o Parecer 
CNE/CEB nº 22/2003 que, ao tratar dos “currículos da Educação Básica, das escolas 
públicas e particulares”, reafirma que “não há, dentro da legislação pertinente, 
obrigatoriedade de oferecer Filosofia e Sociologia como disciplinas”. 
 
 
, 
 
 
19 
 
Essa situação foi alterada radicalmente com o Parecer CNE/CEB nº 38/2006 que, ao 
tratar da “alteração das Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio” 
determinou a “inclusão de componentes curriculares obrigatórios de Filosofia e 
Sociologia”. Esse documento reconhece textualmente que, então, não havia como 
garantir que tais “conhecimentos necessários ao exercício da cidadania” fossem 
“tratados efetivamente pelas demais disciplinas escolares” ao recomendar apenas a 
abordagem interdisciplinar (MEC, CNE/CEB nº 38/2006). O Parecer de 2006 foi decisivo 
para que a Filosofia finalmente se tornasse disciplina obrigatória no ensino médio no 
Brasil, sobretudo, a partir de 2009, com a Lei nº 11.684/2008 que altera o art. 36 da 
LDB de 1996. 
Podemos verificar com esse breve histórico que a Lei nº 11.684/2008 e a 
Resolução/CNE de 2009, ao tornar a Filosofia uma disciplina obrigatória no currículo do 
Ensino Médio, instituíram dois grandes campos de atividade para o ensino de Filosofia. 
De um lado, o ensino de Filosofia como disciplina escolar, presente na formação de 
todos os jovens brasileiros; de outro, o ensino de Filosofia nos cursos universitários, 
sobretudo, a Licenciatura em Filosofia, que tem como principal missão formar os 
futuros professores para atuar no Ensino Médio. 
Com o objetivo de subsidiar a discussão e estabelecer Diretrizes Curriculares aos 
Cursos de Filosofia, o MEC publicou o Parecer CES nº 492 de 2001 e sua retificação, o 
Parecer nº 1.363 de 2002. Em dezembro de 2007, surge outro marco importante para 
o ensino de Filosofia, o Plano nacional de Educação em Direitos Humanos (PNEDH), 
que foi elaborado com ampla participação popular. Examinaremos algumas 
possibilidades e desafios postos para o ensino de Filosofia nos cursos de Bacharelado e 
Licenciatura, tendo por referência a análise desses dois documentos derivados da 
recente política educacional no Brasil. 
 
 
 
, 
 
 
20 
 
2.2 Diretrizes Curriculares dos Cursos de Filosofia (Parecer CES nº 492/2001) 
As Diretrizes Curriculares Nacionais dos Cursos de Filosofia (CNE/CES nº 492 de 2001) 
apresentam os principais objetivos esperados com a formação em Filosofia no item 
“perfil dos formandos”: “sólida formação em história da filosofia, que capacite para a 
compreensão e a transmissão dos principais temas, problemas, sistemas filosóficos, 
assim como para a análise e reflexão crítica da realidade social em que se insere” 
(2001, p. 3). Podemos verificar que a base de sustentação da formação reside na 
“sólida formação em história da filosofia”. 
Espera-se que esta base capacite para o desdobramento de duas atividades também 
nucleares: 
a) “a compreensão e a transmissão” dos temas/problemas e dos sistemas filosóficos 
acumulados pela história da Filosofia; 
b) contextualização/inserção do aprendido em termos de “análise e reflexão crítica da 
realidade social” da qual o sujeito faz parte. 
Carbonari (2010, p. 156) observa que “a formação em Filosofia investe, portanto, num 
sujeito cuja atitude é fundamentalmente de compreensão, de análise e de reflexão 
informadas historicamente e contextualizadas à realidade”. 
O termo “transmissão” é o mais polêmico nesse tópico, na medida em que é foco da 
crítica das abordagens pedagógicas sociocríticas e construtivistas, que identificam a 
“transmissão de conteúdos” como característica central das vertentes pedagógicas 
tradicionais, pois adotam métodos didáticos que não estimulam as capacidades críticas 
e reflexivas do aluno, ao contrário, estimulam a passividade, limitando a aprendizagem 
à mera reprodução. Contudo, o uso desse termo “transmissão”, apesar de 
problemático, aqui está descontextualizado, pois não aponta uma contradição entre as 
duas principais tarefas da formação: compreensão do legado da tradição e análise e 
reflexão crítica. 
 
, 
 
 
21 
 
Os cursos de licenciatura visam qualificar para o ensino: 
O licenciado deverá estar habilitado para enfrentar com sucesso os desafios 
e as dificuldades inerentes à tarefa de despertar os jovens para a reflexão 
filosófica, bem como transmitir aos alunos do Ensino Médio o legado da 
tradição e o gosto pelo pensamento inovador, crítico e independente 
(BRASIL, 2001, p. 3). 
A dimensão pedagógica do aprender Filosofia, comenta Carbonari (2010), “se expressa 
como compromisso voltado para a formação de sujeitos concretos (jovens)”, pois o 
professor deverá ajudar no “despertar [...] para a reflexão filosófica”. Em termos 
didáticos, cabe-lhe “transmitir o legado da tradição e o gosto pelo pensamento 
inovador, crítico e independente”. Novamente o termo “transmitir” levanta polêmicas, 
mas a sequência do documento relativiza quando relaciona o transmitir ao “gosto pelo 
pensamento inovador, crítico e independente”. 
A palavra “transmitir” aqui não aponta para um sentido de uma prática pedagógico-
didática do ensino de Filosofia, mas para o aspecto da Filosofia como um tipo de 
conhecimento, que acumulou ao longo da história da civilização ocidental por mais de 
2.500 anos: conceitos, teorias, temas, problemas, sistemas. Tais conteúdos constituem 
o legado da História da Filosofia como produção cultural. 
Portanto, as Diretrizes põem em relevo o duplo aspecto indissociável da formação em 
Filosofia a partir do duplo registro do conhecimento:o cognitivo e o crítico. Enquanto, 
a formação teórico-cognitiva capacita para a compreensão da História da Filosofia, a 
formação crítica-axiológica possibilita a contextualização do aprendido à realidade 
vivida. Podemos observar o nexo entre essas duas tarefas formadoras nas 
competências e habilidades esperadas. 
No bacharelado, a formação tem como núcleo a pesquisa acadêmica: “o bacharel 
deverá estar credenciado para a pesquisa acadêmica e eventualmente para a reflexão 
transdisciplinar” (BRASIL, 2001, p. 3). A qualificação como pesquisador implica na 
síntese entre as duas tarefas da formação, ou seja, a pesquisa filosófica não deve se 
limitar à reprodução da História da Filosofia, como observa Carbonari (2010), mas 
efetivar-se como exercício crítico e reflexivo contextualizado à realidade social. O 
, 
 
 
22 
 
bacharel também deve ser qualificado para a “reflexão transdisciplinar” (BRASIL, 
2001). 
O caráter transdisciplinar remete para a própria natureza da Filosofia, enquanto 
conhecimento que não se circunscreve a um único objeto. Portanto, capacitar para 
uma reflexão transdisciplinar significa que o formando em Filosofia pode cooperar 
significativamente no trabalho de articulação dos diversos sistemas teóricos e áreas do 
conhecimento que constituem as malhas curriculares. 
São elencadas nas Diretrizes Curriculares dos Cursos de Filosofia (BRASIL, 2001) oito 
competências e habilidades, que devem traduzir em termos de aprendizagem os 
objetivos trabalhados na formação em Filosofia (bacharéis e licenciados): 
1. Capacitação para um modo especificamente filosófico de formular e 
propor soluções a problemas, nos diversos campos do conhecimento; 
2. Capacidade de desenvolver uma consciência crítica sobre 
conhecimento, razão e realidade sócio-histórico-política; 
3. Capacidade para análise, interpretação e comentário de textos 
teóricos, segundo os mais rigorosos procedimentos de técnica 
hermenêutica; 
4. Compreensão da importância das questões acerca do sentido e da 
significação da própria existência e das produções culturais; 
5. Percepção da integração necessária entre a filosofia e a produção 
científica, artística, bem como com o agir pessoal e político; 
6. Capacidade de relacionar o exercício da crítica filosófica com a 
promoção integral da cidadania e com o respeito à pessoa, dentro da 
tradição de defesa dos direitos humanos; 
7. Capacidade de leitura e compreensão de textos filosóficos em língua 
estrangeira; 
8. Competência na utilização da informática (BRASIL, 2001, p. 3). 
 
 
 
 
 
, 
 
 
23 
 
A lista das competências e das habilidades é ampla, colocando uma série de desafios 
concretos para a graduação em Filosofia. Alcançar os objetivos de formação e de 
capacitação esperados implica em estruturar o curso em um Projeto Político-
Pedagógico consistente. O elemento estruturador de todo o curso são as disciplinas 
básicas, que compõem o currículo. As Diretrizes destacam cinco disciplinas básicas 
presentes nos currículos dos melhores cursos de Filosofia do país: “História da 
Filosofia, Teoria do Conhecimento, Ética, Lógica, Filosofia Geral/Problemas 
Metafísicos” (BRASIL, 2001, p. 4). Além destas, outras disciplinas despontam na última 
década: “Filosofia Política, Filosofia da Ciência (ou Epistemologia), Estética, Filosofia da 
Linguagem e Filosofia da Mente”. No curso de licenciatura, deverão ser incluídas 
disciplinas que trabalhem os conteúdos definidos para a educação básica, as didáticas 
próprias de cada conteúdo e as pesquisas que as embasam. 
O que se pretende com as Diretrizes Curriculares para os Cursos de Graduação em 
Filosofia (BRASIL, 2001) é propor um modelo de formação e de ensino de Filosofia que 
observe os seguintes pontos: 
 1. Permitir o diálogo interdisciplinar entre os diversos campos do saber, abandonando 
a estrutura disciplinar fechada das disciplinas e dos cursos por área específica; 
2. Proporcionar uma formação mais humanista e crítica aos novos cientistas, 
pesquisadores, professores e alunos que recebem, no modelo tradicional, uma 
formação muito especializada em sua área e pouca capacitação para a reflexão crítica 
e contextualizada aos problemas de ordem ética, política e social, implicados em uma 
realidade em constante mudança com as novas tecnologias. 
 A política educacional do Ministério da Educação, ao reconhecer a relevância do 
ensino e da pesquisa em Filosofia, abre para essa disciplina a possibilidade de retomar 
a tarefa pedagógica de formação (paidéia) que teve em sua origem como filha da polis 
grega, ou seja, coloca para a prática do ensino de Filosofia a tarefa de formação de 
cidadãos conscientes de seus direitos e deveres para a busca do bem comum na cidade 
(polis), sobretudo quando as novas Diretrizes Curriculares se somam ao Plano Nacional 
de Educação em Direitos Humanos – PNEDH. 
, 
 
 
24 
 
2.3 Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos (PNEDH/2007) 
O Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos (PNEDH) foi elaborado com ampla 
participação da sociedade civil organizada. A versão revisada foi publicada em 2007, 
tornando-se uma referência para o planejamento da educação em direitos humanos, 
tanto no Ensino Médio quanto no Ensino Superior. 
O PNEDH contribui para ampliar a compreensão da educação em direitos humanos, 
que é uma das competências e habilidades vinculadas ao ensino de Filosofia pelas 
Diretrizes Curriculares, especificamente no item 6 citado acima: “capacidade de 
relacionar o exercício da crítica filosófica com a promoção integral da cidadania e com 
o respeito à pessoa, dentro da tradição de defesa dos direitos humanos” (BRASIL, 
2007). 
Como transformar esse desafio proposto ao ensino de Filosofia em uma atividade 
consistente de formação? Como elaborar os planos de ensino? Como selecionar 
temas/problemas, materiais, metodologias etc.? O PNEDH torna-se, por isso, uma 
referência importante quando estabelece algumas diretrizes básicas. Examinaremos 
algumas: 
A educação em direitos humanos é compreendida como um processo 
sistemático e multidimensional que orienta a formação do sujeito de 
direitos, articulando as seguintes dimensões: 
a) apreensão de conhecimentos historicamente constituídos sobre direitos 
humanos e a sua relação com os contextos internacional, nacional e local; 
b) afirmação de valores, atitudes e práticas sociais que expressem a cultura 
dos direitos humanos em todos os espaços da sociedade; 
c) formação de uma consciência cidadã capaz de se fazer presente em níveis 
cognitivos social, ético e político; 
d) desenvolvimento de processos metodológicos participativos e de 
construção coletiva, utilizando linguagens, materiais didáticos 
contextualizados; 
e) fortalecimento de práticas individuais e sociais que gerem ações e 
instrumentos em favor da promoção, da proteção e da defesa dos direitos 
humanos, bem como da reparação das violações. 
[…] 
, 
 
 
25 
 
Desse modo, a educação é compreendida como um direito em si mesmo e 
um meio indispensável para o acesso a outros direitos (BRASIL, 2007, p. 25, 
grifos nossos). 
Os termos grifados no texto acima são chaves para compreender o conceito de 
“educação em direitos humanos”. Carbonari (2010) observa que a educação em 
direitos humanos é compreendida como um “processo”, isto significa que tem duração 
no tempo e se posiciona no espaço, ou seja, deve ser contextualizada historicamente e 
localmente, levando em conta as diferenças dos valores, das práticas, dos 
comportamentos dos sujeitos envolvidos. Não se limita a um evento, mas à realização 
de um processo sistemático e multidimensional, ou seja, trata-se de um processo que 
deve articular vários momentos, várias estratégias e várias dimensões para obter êxito. 
As várias dimensões implicadas são detalhadas nas cinco capacitações que devem 
ajudar na formação de “sujeitos de direitos”, pois sujeitos de direitos devem ser 
formados, nãoestão prontos na sociedade, resultando dessa historicidade constitutiva 
do ser homem a necessidade de uma educação voltada para a construção da dignidade 
humana na relação com outros sujeitos. 
Os princípios orientadores estabelecidos no PNEDH colaboram para o planejamento 
consistente do ensino de Filosofia seja no Ensino Médio ou na Graduação em Filosofia, 
pois privilegia no processo de educação a promoção da compreensão da tradição e a 
reflexão crítica ante a realidade social, ou seja, os dois eixos constitutivos da atividade 
e da atitude filosóficas. 
Conclusão 
Findada a luta política para que a Filosofia retornasse aos currículos das escolas 
brasileiras, depois de 20 anos de ostracismo, inicia-se o grande desafio para definir 
parâmetros para o ensino de Filosofia na dupla frente de trabalho: no ensino médio e 
nos cursos de graduação em Filosofia. Houve uma significativa mudança na política 
educacional do MEC em relação ao ensino de Filosofia, posto que a importância 
atribuída à Filosofia pela LDB/1996 traduziu-se com a alteração do art. 36 em 2006/09 
na criação de dispositivos legais (Leis, Resoluções, Pareceres, Parâmetros Curriculares), 
, 
 
 
26 
 
que instituíram um amplo campo profissional e educacional para o desdobramento do 
ensino e da docência em Filosofia. 
As Diretrizes Curriculares Nacionais de 2001/02 e o PNEDH de 2007 são documentos 
que expressam a importância do papel do ensino de Filosofia nas novas políticas 
educacionais do Brasil. Cabe aos profissionais da Filosofia assumir esse enorme desafio 
e abraçar com responsabilidade a grande tarefa de desenvolver projetos políticos 
pedagógicos que respondam a necessidade de assegurar a formação de uma atitude 
crítica, reflexiva, de uma consciência cidadã aos jovens brasileiros. 
REFERÊNCIAS 
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Média e Tecnológica. 
Parâmetros Curriculares Nacionais: ensino médio; Ciências Humanas e suas 
tecnologias, v. 4. Brasília: MEC/SEMTEC, 2000. Disponível em: 
<https://bit.ly/2ycFWAK>. Acesso em: 11 set. 2019. 
______. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Parecer CNE/CES nº 
492 de 3 de abril de 2001. Diretrizes Curriculares Nacionais dos cursos de Filosofia, 
História, Geografia, Serviço Social, Comunicação Social, Ciências Sociais, Letras, 
Biblioteconomia, Arquivologia e Museologia. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 
seção 1e, p. 50. 9 jul. 2001. Disponível em: 
http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/CES0492.pdf. Acesso em: 1 jun. 2019. 
______. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Parecer CNE/CEB nº 
22 de 2 de junho de 2003. Questionamento sobre currículos da educação básica, das 
escolas públicas e particulares. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 21 jul. 2003. 
Disponível em: <https://bit.ly/2kshhGx>. Acesso em: 11 set. 2019. 
______. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Parecer CNE/CEB nº 
38 de 7 de julho de 2006. Inclusão obrigatória das disciplinas de Filosofia e Sociologia 
no currículo do Ensino Médio. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 14 ago. 2006. 
Disponível em: <https://bit.ly/2lR3yZV>. Acesso em: 11 set. 2019. 
, 
 
 
27 
 
______. Comitê Nacional de Educação em Direitos Humanos. Plano Nacional de 
Educação em Direitos Humanos. Brasília: Secretaria Especial dos Direitos Humanos, 
Ministério da Educação, Ministério da Justiça, UNESCO, 2007. Disponível em: 
<https://bit.ly/2RUzNUg>. Acesso em: 4 jun. 2019. 
______. Senado Federal. LDB: Lei de diretrizes e bases da educação nacional. Brasília: 
Senado Federal, Coordenação de Edições Técnicas, 2017. Disponível em: 
<https://bit.ly/2lDG0HP>. Acesso em: 1 jun. 2019. 
CARBONARI, P. C. Filosofia e direitos humanos: desafios à graduação em filosofia. In: 
NOVAES, J. L. C.; 
AZEVEDO, M. A. O. de (orgs.). A filosofia e seu ensino: desafios emergentes. Porto 
Alegre: Sulinas, 2010. v. 1, p. 153-166. 
SAVIANI, D. Da nova LDB ao Fundeb: por uma outra política educacional. Campinas: 
Autores Associados, 2007. 
 
, 
 
 
28 
 
 
3 VERTENTES PEDAGÓGICAS, DIDÁTICAS E O ENSINO DE FILOSOFIA 
 
Este bloco tem por objetivo analisar algumas das principais abordagens teóricas da 
pedagogia e da didática com foco na relação ensino-aprendizagem. Esperamos que, 
depois deste percurso, você possa identificar quais são as principais concepções sobre 
a pedagogia e a didática que norteiam as metodologias que são mais adequadas ao 
ensino de Filosofia e que possam contribuir para que sua prática pedagógica como 
professor de Filosofia atinja os objetivos e metas desejados. 
A reflexão sobre o ensino de Filosofia coloca-nos inevitavelmente o problema da 
relação entre Filosofia e Educação, observa Silva (1993), posto que a inserção da 
Filosofia como disciplina básica no currículo das escolas de Ensino Médio implica a 
definição dos conteúdos a serem lecionados e a escolha da metodologia mais 
adequada para atingir os objetivos pedagógicos visados. 
Assim como não há uma Filosofia no singular, pois só podemos falar de filosofias no 
plural, também não podemos pensar em teorias consensuais da pedagogia e da 
didática, pois cada vez mais os estudiosos da área reconhecem a necessidade de 
pensar a didática em termos da interdisciplinaridade (FAZENDA, 1998), dado o próprio 
caráter multidimensional e ambíguo do fenômeno da educação, o seu objeto. 
A educação como um fenômeno multidimensional e ambíguo significa que, de um 
lado, implica o ensino de conteúdos e a consideração dos aspectos epistemológicos do 
conhecimento, a busca de critérios de validade e de métodos adequados; de outro 
lado, implica também a formação de uma consciência crítica, reflexiva e questionadora 
dos conteúdos aprendidos, dos valores herdados e das ideologias dominantes, dos 
discursos hegemônicos, da experiência e contextos vividos. 
 
, 
 
 
29 
 
Nesse sentido, a análise preliminar das teorias ou vertentes da pedagogia brasileira é 
importante para compreender quais abordagens didáticas mais contribuem para que o 
ensino da Filosofia atinja seus objetivos centrais. Alguns objetivos são destacados por 
diversos filósofos-professores, especialistas no tema e nos documentos que 
regulamentam o ensino de Filosofia, como as Diretrizes Curriculares Nacionais dos 
Cursos de Filosofia (CNE/CES nº 492/2001) e nos Parâmetros Curriculares Nacionais do 
Ensino Médio (2001). 
Entre esses objetivos destacam-se: 
a) ensinar a pensar de modo crítico e autônomo; 
b) ensinar o conteúdo das obras filosóficas no contexto da história da Filosofia; 
c) ensinar a importância da contextualização dos temas e dos problemas filosóficos nos 
processos históricos e sociais; 
d) ensinar a importância da consciência de cidadania, ou seja, da responsabilidade 
social e do agir ético visando ao bem comum e à defesa dos direitos humanos 
fundamentais. 
Portanto, o ensino de Filosofia, assim como de qualquer disciplina, implica adotar 
como referência uma certa concepção de pedagogia e de didática. Quais teorias, 
vertentes ou abordagens da pedagogia e da didática têm contribuído mais para que o 
ensino de Filosofia atinja seus objetivos? 
Para responder a essa pergunta, faremos neste bloco uma breve revisão do 
pensamento pedagógico brasileiro a partir do esquema proposto por Libâneo (2011), 
que aponta duas grandes vertentes pedagógicas: a Liberal e a Progressista. Cada uma 
delas é composta por diferentes abordagens pedagógico-didáticas. Em seguida, 
aprofundaremos um pouco mais o conhecimento sobre as vertentes pedagógicas a 
partir das teorias didáticas que tratam da relação ensino-aprendizagem, tendo por 
referência a tipologia proposta por Mizukami (1986). Por fim, verificaremos quais 
abordagens pedagógico-didáticas contribuem mais para o ensino de Filosofia no Brasil. 
, 
 
 
30 
 
Este bloco está dividido nos seguintes tópicos: 
1. Vertentes pedagógicas; 
2. Abordagensdidáticas e a relação ensino-aprendizagem; 
3. As contribuições das abordagens crítico-sociais para o ensino de Filosofia. 
3.1 Vertentes pedagógicas 
A definição do conteúdo programático das disciplinas, assim como a escolha da 
metodologia a ser aplicada ao ensino, é tema tratado pelas teorias da didática, que por 
sua vez derivam de diferentes teorias ou vertentes pedagógicas. Entretanto, para 
examinar as diferentes teorias pedagógicas e didáticas, encontramos uma primeira 
dificuldade: não há entre os estudiosos do tema no Brasil uma nomenclatura comum 
para as diversas vertentes que formam o pensamento pedagógico brasileiro. 
Apesar de não haver uma nomenclatura única, vários estudiosos concordam que o 
pensamento pedagógico brasileiro entre o final do século XIX e ao longo do século XX 
pode ser dividido em dois grandes grupos: Pedagogias Liberal e Progressista, 
subdivididos em várias vertentes. Para Libâneo (2011), a Pedagogia Liberal é composta 
pelas vertentes: Liberal-Tradicional; Liberal-Renovada (pragmática e não diretiva); 
Liberal-Tecnicista. A Pedagogia Progressista abarca as vertentes: Libertadora; 
Libertária; Crítico-Social dos Conteúdos. A classificação de Libâneo tem por critério-
chave o papel social da escola e dos conteúdos. 
3.1.1 Vertentes da Pedagogia Liberal 
Liberal Tradicional: para Libâneo (2011), a tendência da Pedagogia Liberal Tradicional 
acentua o ensino de conteúdos de cultura geral e das ciências considerados 
importantes para o desenvolvimento do ser humano, com ênfase à perspectiva do 
liberalismo econômico, político e social. Os conteúdos ensinados não têm muita 
relação com o cotidiano do aluno e “muito menos com as realidades sociais”; são 
passados como se houvesse uma única realidade dada, ou seja, não se promove o 
senso crítico e questionador, mas a repetição dos conteúdos de modo mecânico. Na 
, 
 
 
31 
 
relação professor-aluno predomina a palavra do professor, as regras impostas visam 
ao cultivo exclusivamente intelectual. 
Liberal renovada (pragmática e não diretiva): a tendência liberal renovada enfatiza o 
sentido da cultura como desenvolvimento das aptidões individuais, pois parte das 
necessidades e interesses individuais necessários para a adaptação ao meio. Essa 
tendência está na base da chamada Escola Nova ou Escola Renovada, a qual valoriza 
um modelo de ensino que considere o aluno como sujeito do conhecimento, 
valorizando também a experiência sobre o meio através de atividades dirigidas. 
Segundo Libâneo (2011), a tendência liberal renovada desenvolve-se no Brasil em duas 
versões distintas: a renovada pragmática, difundida pelos pioneiros da Escola Nova, 
com destaque para Anísio Teixeira, cujos teóricos de referência são: Montessori e 
Piaget; a renovada não diretiva orientada para os objetivos de desenvolvimento 
pessoal e para as relações interpessoais, sendo a principal referência teórica o 
psicólogo norte-americano Carl Rogers. 
Liberal Tecnicista: esta vertente, conforme Libâneo (2011), subordina a educação à 
sociedade, cuja função é a preparação de “recursos humanos”, ou seja, de “mão de 
obra para a indústria” e demais profissões. Esta tendência pedagógica valoriza a 
sociedade industrial e tecnológica como modelo de progresso, devendo a ciência e a 
tecnologia estar a serviço do seu desenvolvimento. Portanto, não visa formar um aluno 
com senso crítico que questione esse modelo dominante de sociedade. O ensino é 
condicionado pelas metas econômicas, sociais e políticas do modelo de sociedade 
industrial e de mercado, pois esta realidade é considerada como a única possível, 
contendo em si suas próprias leis, bastando aos homens e aos alunos descobri-las e 
aplicá-las. 
 
 
 
 
, 
 
 
32 
 
3.1.2 Vertentes da Pedagogia Progressista 
Para Libâneo (2011), a Pedagogia Progressista manifesta-se em três vertentes: a 
libertadora, mais conhecida como pedagogia de Paulo Freire; a libertária, que reúne 
os defensores da autogestão pedagógica; a crítico-social dos conteúdos, que é a 
proposta pelo próprio Libâneo, sendo diferente das anteriores, porque parte da 
primazia dos conteúdos no seu confronto e contextualização com as realidades sociais. 
Progressista Libertadora: a pedagogia libertadora tem como marca a educação “não 
formal”, ou seja, aquela que ultrapassa os limites da educação formal, tendo em vista 
que Paulo Freire, seu principal teórico, desenvolveu essa concepção pedagógica para 
ser aplicada, sobretudo, ao ensino de grande parte dos adultos analfabetos, sem 
acesso à educação formal. Essa pedagogia questiona a realidade concreta das relações 
do homem com a natureza e com os outros homens, visando a uma transformação – 
daí ser uma educação crítica. Nesse viés, recusa tanto a educação tradicional, 
denominada “bancária”, por Freire, “que visa apenas depositar informações sobre o 
aluno –, quanto à educação renovada – que pretenderia uma libertação psicológica 
individual” (2011, p. 34). Ambas, a tradicional e a renovada, são consideradas 
pedagogias domesticadoras, pois não contribuem para revelar as contradições e 
opressão da realidade social. 
Progressista Libertária: a pedagogia libertária defende a escola como um espaço de 
participação e aprendizado político no sentido da autogestão e da formação de 
cidadãos ativos e conscientes de seu papel de agentes das transformações sociais. A 
escola valoriza os mecanismos de gestão participativa e democrática, como: 
assembleias, conselhos, eleições, reuniões, associações etc., de tal forma que o aluno 
aprenda na prática o que significa a cidadania plena. 
Há, portanto, um sentido expressamente político, à medida que se afirma o 
indivíduo como produto do social e que o desenvolvimento individual 
somente se realiza no coletivo. A autogestão é, assim, o conteúdo e o 
método; resume tanto o objetivo pedagógico quanto o político. A pedagogia 
libertária, na sua modalidade mais conhecida entre nós, a "pedagogia ins-
titucional", pretende ser uma forma de resistência contra a burocracia como 
instrumento da ação dominadora do Estado, que tudo controla (professores, 
programas, provas etc.), retirando a autonomia (LIBÂNEO, 2011, p. 37-8). 
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33 
 
Progressista Crítico-Social dos Conteúdos: a tendência da Pedagogia Crítico-Social dos 
conteúdos foi proposta por Libâneo no livro Democratização da escola pública: 
pedagogia crítico-social dos conteúdos (2011). 
Para o autor, essa vertente busca operar 
uma síntese superadora das pedagogias tradicional e renovada, valorizando 
a ação pedagógica enquanto inserida na prática social concreta. Entende a 
escola como mediação entre o individual e o social, exercendo aí a articu-
lação entre a transmissão dos conteúdos e a assimilação ativa por parte de 
um aluno concreto (inserido num contexto de relações sociais); dessa 
articulação resulta o saber criticamente reelaborado (LIBÂNEO, 2011, p. 34). 
Em outro texto, Libâneo define nas seguintes palavras a Pedagogia Crítico-Social: 
No Brasil a pedagogia crítico-social é uma das correntes da pedagogia crítica 
que propõe uma educação vinculada à realidade econômica e sociocultural 
dos educandos, ligando ensino e ação transformadora da realidade, ação e 
reflexão, prática e teoria. Sustenta a ideia de que o conhecimento está 
comprometido com a emancipação das pessoas, com a liberdade intelectual 
e política. Por isso, associa as tarefas do ensino a uma análise crítica sócio-
histórico-cultural do contexto em que as pessoas vivem. 
A pedagogia crítico-social defende, com muita determinação, que o papel da 
escola é o de formação cultural, de difusão do conhecimento científico. 
Formula princípios e orientações para a conversão do saber científico em 
saber escolar. Entende que a ação pedagógica está carregada de 
intencionalidade e que o ensino da ciência pressupõe interesses que são 
sociais, políticos, daí a ideia de aprender uma cultura crítica (LIBÂNEO, 
2009). 
3.2Abordagens didáticas e a relação ensino-aprendizagem 
As atividades de ensino e aprendizagem constituem o núcleo do processo de 
educação. Na literatura sobre o tema, duas grandes abordagens didáticas são 
apontadas: a abordagem tradicional e as progressistas. A referência ao ensino e a 
aprendizagem como atividades separadas e distintas reunidas pelo conectivo “e” 
remete à abordagem da didática tradicional. Em contrapartida, as abordagens 
contemporâneas, em geral, empregam o par-conceitual ensino-aprendizagem para 
enfatizar a relação dinâmica e dialética entre essas duas atividades-agentes do 
processo da educação. Isso porque as abordagens contemporâneas adotam como 
ponto de partida a crítica à pedagogia tradicional, ou seja, destacam a importância da 
participação ativa do aluno no processo de construção do conhecimento, criticam o 
modelo tradicional de ensino como transmissão de conteúdos pelo professor, pois 
, 
 
 
34 
 
concebem a dinâmica ensino-aprendizagem como uma via de mão dupla entre o 
educador e o educando. 
Portanto, as teorias pedagógicas e didáticas consideradas progressistas enfatizam a 
mútua implicação entre ensino-aprendizagem, atribuindo um papel ativo aos dois 
agentes do processo (LIBÂNEO, 2002). Para examinar o processo ensino-aprendizagem 
e suas implicações na docência da Filosofia, vamos primeiramente apresentar um 
breve resumo das principais vertentes pedagógicas, segundo a tipologia proposta por 
Mizukami (1986), que adota como critério para sua classificação a posição dos 
elementos da relação ensino-aprendizagem, tais como: o primado do objeto, o 
primado do sujeito e a interação sujeito-objeto. A partir desse critério, distingue a 
abordagem tradicional das abordagens progressistas, divididas em: 
comportamentalista, humanista, cognitivista e sociocultural. 
Abordagem tradicional: de acordo com Mizukami (1986), na visão tradicional o ensino 
e a aprendizagem estão dissociados, pois parte-se do primado do objeto, do 
conhecimento, ou melhor, da transmissão do conhecimento pelo professor. Evidencia-
se o caráter cumulativo do conhecimento, as informações que devem ser armazenadas 
pelo aluno, que deve adotar uma posição receptiva/passiva. A relação professor-aluno 
é vertical, o professor assume o papel de autoridade, tem pleno controle da 
metodologia, dos conteúdos, das avaliações etc. Não há nenhuma relação entre o que 
é ensinado e o cotidiano do aluno ou as questões sociais. O aluno ou o sujeito da 
aprendizagem tem um papel insignificante no processo de aquisição e elaboração do 
conhecimento ensinado, cabendo-lhe apenas a reprodução em forma de memorização 
das sínteses oferecidas pelo professor. A didática é entendida como um conjunto de 
regras e preceitos que privilegiam a matéria a ser ensinada. Adota, em geral, a aula 
expositiva e oral para ensino dos conteúdos, e o aluno deve submeter-se aos métodos 
e à autoridade do professor. 
 
 
, 
 
 
35 
 
Abordagem comportamentalista: essa abordagem também privilegia o objeto, o 
conhecimento, só que a experiência ou a experimentação planejada torna-se a base do 
conhecimento. O objetivo do ensino não é apenas a transmissão dos conhecimentos 
acumulados pela cultura, mas o desenvolvimento da ciência. As teorias 
comportamentalistas transformam o comportamento humano em objeto científico por 
meio da experimentação controlada de estímulo-resposta, incluindo as ações de 
ensino e aprendizagem para o desenvolvimento de tecnologias da educação. Para 
Skinner, um dos fundadores do Behaviorismo, a realidade é objetiva, o homem é um 
produto do meio e um produto do processo evolutivo; logo, seu comportamento pode 
ser controlado e manipulado para fins de “desenvolvimento” social. O professor tem o 
papel de planejar e/ou aplicar as metodologias e tecnologias desenvolvidas para 
maximizar o desempenho do aprendizado dos alunos. O modelo de educação e 
controle de comportamento de Skinner tem sido considerado excessivamente 
mecanicista e determinista por abordagens mais críticas da pedagogia. 
Abordagem humanista: Mizukami (1986) observa que a abordagem didática 
humanista enfatiza o papel do sujeito como principal elaborador do conhecimento, a 
educação está centrada no desenvolvimento da personalidade do indivíduo. A obra de 
Rogers é o principal referencial teórico dessa corrente. O professor não transmite o 
conteúdo, deve apenas dar assistência sendo facilitador da aprendizagem. O conteúdo 
advém das próprias experiências do aluno e o professor não ensina, mas cria condições 
para que os alunos aprendam. Não há modelos prontos, o objetivo do ser humano e da 
educação é a autorrealização de cada indivíduo pelo uso máximo de suas capacidades 
e potencialidades. O processo ensino-aprendizagem está centrado no aluno, pois a 
educação tem por função criar as condições para a aprendizagem como via para o 
desenvolvimento intelectual e emocional do aluno, que deve atingir a 
autodeterminação e aperfeiçoamento de suas capacidades. A escola deve respeitar o 
aluno e criar condições para sua autonomia. Há uma relação de parceria entre 
professor e aluno, as metodologias de ensino são individualizadas, os alunos devem se 
responsabilizar também pelos objetivos que devem ter significado para eles. As 
avaliações são flexíveis e não diretivas, mas participativas. 
, 
 
 
36 
 
Abordagem cognitivista: tem como principal referencial teórico os psicólogos ou 
psicopedagogos como Piaget, que estudam os “processos centrais” dos indivíduos, tais 
como a organização do conhecimento, o processamento de informações, estilos de 
pensamento, estilos de comportamento etc. O conhecimento é baseado na interação 
entre sujeito e objeto, sendo um processo contínuo produzido na interação entre o 
homem e o mundo ou o meio. A educação tem um papel central na promoção das 
condições necessárias para o aprendizado decorrente da assimilação do conhecimento 
pelo sujeito e da modificação da estrutura mental já existente. 
A relação professor-aluno é horizontal, ao professor cabe criar situações para propiciar 
o desenvolvimento da inteligência intelectual e do comportamento moral e social dos 
alunos. Piaget, um dos principais teóricos da abordagem cognitivista, conhecida como 
interacionista-construtivista, concebe o pensamento como a base da aprendizagem, 
sendo o conhecimento o resultado de um processo dinâmico e contínuo de 
mecanismos que o indivíduo emprega para se adaptar ao meio. Nesses termos, o 
ensino deve privilegiar o desenvolvimento da inteligência por meio do “construtivismo 
interacionista”. 
A teoria de Piaget forneceu um importante referencial teórico para a vertente 
pedagógica da Escola Nova, conforme destaca Libâneo (2002). A interação do aluno 
com o meio é considerada o núcleo do processo do conhecimento, por isso são 
valorizadas as metodologias de ensino que propiciam tais experiências e observações, 
como os estudos do meio natural e social, o método da solução de problemas. Toda 
metodologia de ensino deve ser adequada às etapas de desenvolvimento cognitivo do 
aluno. As avaliações devem verificar se o aluno desenvolveu as capacidades e 
habilidades esperadas para cada etapa: sensório-motora (0-2 anos); intuitiva ou pré-
operatória (2-7 anos); operatório-concreta (7-11 anos); operatório-formal (11-14 
anos), na qual o pensamento abstrato desenvolve-se plenamente. O importante dessa 
teoria pedagógica não é aprender, mas aprender a aprender. 
 
 
, 
 
 
37 
 
Abordagem crítico-social, histórico-social ou sociocultural: Mizukami (1986) define a 
abordagem sociocultural como aquela que tem na obra de Paulo Freire sua principal 
referência teórica, como uma abordagem interacionista entre sujeito e objeto, com 
ênfase no papel crítico e criador do sujeito do conhecimento. A educação não é 
considerada um fenômeno restrito à escola ou à educação formal, mas a um processo 
amplo de ensino e aprendizagemdifundido por toda a sociedade. A educação é 
definida como um ato político que deve criar condições para a formação de uma 
atitude reflexiva e de uma consciência crítica no aluno/indivíduo, que deve atuar como 
agente transformador de sua realidade social. A relação professor-aluno deve ser 
horizontal, ambos como sujeitos históricos e produtores do conhecimento. O processo 
ensino-aprendizagem é dinâmico, devendo pautar-se na transmissão/assimilação 
crítica dos conhecimentos, que devem ser inseridos no movimento da prática social e 
histórica concreta dos homens. A educação possui tanto o papel de emancipação e 
libertação quanto o da formação pelo ensino de conteúdos. Outros autores podem ser 
incluídos na abordagem sociocultural além da pedagogia libertária de Paulo Freire. 
O enfoque crítico-social defendido por José Carlos Libâneo (2011, 2002) e o enfoque 
histórico-crítico de Demerval Saviani (1984) podem ser considerados variações da 
abordagem sociocultural, na medida em que visam integrar os aspectos 
material/formal do ensino, articulando-os com os movimentos concretos tendentes à 
transformação da sociedade. 
 3.3 As contribuições das abordagens crítico-sociais para o ensino de Filosofia 
As abordagens didáticas – sociocultural, crítico-social e histórico-social – passam a ser 
identificadas aqui, para efeito de resumo, como abordagens crítico-sociais, no plural. 
As abordagens didáticas progressistas que adotam metodologias ativas, tais como as 
vertentes Humanista, Cognitivista e as Crítico-Sociais, priorizam a relação horizontal 
entre professor-aluno no sentido de uma relação ativa de ensino-aprendizagem, sendo 
mais adequadas ao ensino de Filosofia. Contudo, as abordagens crítico-sociais se 
alinham muito aos objetivos gerais do ensino de Filosofia, sobretudo, com a 
perspectiva da formação de uma atitude crítica e questionadora voltada para o 
exercício da cidadania plena, da emancipação, da transformação social e da prática da 
, 
 
 
38 
 
liberdade, objetivos apontados nas próprias Diretrizes Curriculares da disciplina 
Filosofia. 
Nas orientações educacionais aos Parâmetros Curriculares Nacionais, volume IV, que 
abordam as Ciências Humanas e suas tecnologias, a Filosofia é destacada como uma 
das disciplinas formadoras do caráter humanista da educação: “a nova legislação 
educacional brasileira parece reconhecer, afinal, o próprio sentido histórico da 
atividade filosófica e, por esse motivo, enfatiza a competência da Filosofia para 
promover, sistematicamente, condições indispensáveis para a formação de cidadania 
plena!” (BRASIL, 1998, p. 45). 
As teorias pedagógico-didáticas que partem do paradigma crítico-social têm em 
comum o fato de considerarem a Filosofia uma disciplina nuclear para a formação do 
senso crítico e questionador dos estudantes enquanto agentes históricos e sociais. 
Portanto, o ensino de Filosofia é privilegiado não em termos do fabuloso conteúdo da 
história do pensamento ocidental, mas, sobretudo, em função das características que 
fazem da Filosofia um conhecimento reflexivo, crítico, questionador, argumentativo. 
Para o enfoque crítico, o ensino deve abordar contextos sociopolíticos de interesses e 
valores em conflito. A realidade social é o ponto de partida dos fenômenos educativos, 
a pesquisa deve estar comprometida diante dos conflitos para conseguir a mudança e 
a libertação da opressão. Busca-se construir uma teoria que trate de orientar a ação 
baseada na reflexão da ação, na práxis como encontro crítico entre teoria e prática. 
O ensino de Filosofia à luz das abordagens crítico-sociais permite ao educando não 
apenas compreender ou reproduzir conteúdos, mas participar ativamente do processo 
de ensino-aprendizagem compreendendo como os conhecimentos são produzidos, 
justificados, reproduzidos, criados e recriados. Compreendendo como a realidade é 
produzida, pensada, justificada e transformada em termos das abordagens e valores 
éticos, metafísicos, teóricos, ideológicos, políticos, científicos, religiosos e estéticos. O 
ensino de Filosofia na atualidade busca situar o aluno em uma realidade 
contextualizada, pondo em debate os avanços, os limites e os problemas do mundo 
, 
 
 
39 
 
contemporâneo à luz das questões clássicas e atuais do debate do pensamento 
filosófico. 
A tese da “educação como prática da liberdade” foi defendida por Paulo Freire, sendo 
sua “Pedagogia do Oprimido” (FREIRE, 2012) uma das principais vertentes do 
pensamento pedagógico brasileiro contemporâneo. Freire parte do referencial teórico 
marxista para desdobrar sua teoria pedagógica, que pode ser resumida em três 
elementos centrais: a) a crítica da alienação sustenta o projeto pedagógico da 
educação como prática da liberdade; b) a categoria pedagógica da “conscientização”, 
criada por Freire, visa à formação da autonomia intelectual por meio da educação 
como um ato político e não neutro do educador; c) a aplicação da teoria dialética do 
conhecimento como prática pedagógica, que implica a relação dinâmica entre ensino-
aprendizagem como uma via de mão dupla entre o educador e o educando. 
No Brasil, a partir dos anos 1980, surgem outros desdobramentos desse pensamento 
pedagógico-crítico: Demerval Saviani (1983) denomina sua concepção pedagógica de 
histórico-crítica;Libâneo defende o projeto de uma pedagogia crítico-social dos 
conteúdos, enquanto versão da pedagogia histórico-crítica voltada para a didática: 
Na prática, significa uma abordagem crítica dos conteúdos, crítica no 
sentido de tratar os conteúdos escolares dentro de uma análise concreta 
das relações econômicas, sociais, culturais que envolvem a prática escolar. A 
pedagogia crítico-social quer contribuir efetivamente para a formação de 
sujeitos pensantes e críticos. Por isso, compreende que o ensino cria modos 
e condições para o desenvolvimento da capacidade do sujeito para colocar-
se ante a realidade a fim de pensá-la e nela atuar, visando à transformação. 
Ensinar a pensar criticamente é fazer a ação docente incidir sobre a 
capacidade do aluno de apropriar-se de forma crítica dos objetos de 
conhecimento, a partir de um enfoque totalizante da realidade e de sua 
problematização (LIBÂNEO, 2009, p. 3). 
Portanto, adotar para o ensino de Filosofia as abordagens pedagógico-didáticas crítico-
sociais significa buscar metodologias ativas de ensino-aprendizagem, por meio das 
quais o ensino não se limita à reprodução de conteúdos. Nessa abordagem, o aluno 
assume o papel de sujeito-ativo, pois adota a atitude filosófica crítica e reflexiva para 
compreender os conteúdos contextualizados à realidade vivida, aprendendo a exercer 
sua cidadania com liberdade, responsabilidade e plenitude. Essa perspectiva teórica e 
pedagógica está em pleno acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais que, no 
, 
 
 
40 
 
volume IV, apontam como objetivo do ensino da Filosofia “promover, 
sistematicamente, condições indispensáveis para a formação de cidadania plena”. 
Conclusão 
Vimos neste bloco as principais vertentes do pensamento pedagógico brasileiro, 
segundo a tipologia proposta por Libâneo (2011), que destaca duas vertentes centrais: 
Liberal e Progressista. A primeira é subdividida em outras: Liberal-Tradicional; Liberal-
Renovada (progressivista e não diretiva); Liberal-Tecnicista. Já a Pedagogia Progressista 
abarca as vertentes: Libertadora; Libertária; Crítico-Social dos conteúdos. Podemos 
observar que a principal diferença entre as vertentes Liberais e Progressistas reside nas 
diferentes concepções do papel ou da função da educação e da escola na sociedade; as 
primeiras visam apenas ao ensino formal e à transmissão de conteúdos, e à 
reprodução da estrutura social, enquanto as segundas vêm na educação um processo 
de formação do senso crítico ativo e transformador da sociedade. 
Vimos que as vertentes pedagógicas implicam determinadas abordagens didáticas que 
são divididas segundo

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