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Análise de Voto-Vista: Barroso e o Aborto

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SOCIEDADE EDUCACIONAL DE SANTA CATARINA 
 
 
 
ALUNAS: AGATHA MORGANA Direito 1BN					 EMANUELLA CHAVES
Análise de Voto-Vista: Barroso e o Aborto
1. Descrição dos Contornos do Conflito
Inicialmente no presente trabalho vinculado ao voto do ministro, Luís Roberto Barroso, sobre a prisão preventiva de um casal, progenitores de uma vida potencial e da clínica onde os mesmos cometeram o ato, são encontradas três inadequações: a primeira trata-se da via processual tomada; a segunda está relacionada ao artigo 312 CPP, onde aborda os requisitos que legitimam a prisão cautelar e a terceira, está sujeita à interpretação segundo a Constituição acerca dos artigos 124 e 126 do Código Penal que tipificam crime o aborto.
Da tipificação do aborto, ao que tange a progenitora, cabe o artigo 124: “Provocar aborto em si mesma ou consentir que outrem lho provoque. Pena - detenção, de um a três anos. ”. Quanto ao progenitor e membros da clínica, cabe a redação do artigo 126, que diz que: “ Provocar aborto com o consentimento da gestante: Pena - reclusão, de um a quatro anos”.
O presente exposto trata-se de um Habeas Corpus, com pedido de concessão de medida cautelar, impetrado em face de acórdão da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, que não conheceu do HC 290.341/RJ, de relatoria da Ministra Maria Thereza de Assis Moura. Extrai-se dos autos que os pacientes (que mantinham clínica de aborto) foram presos em flagrante, em 14.03.2013, devido à suposta prática dos crimes descritos nos arts. 126 (aborto) e 288 (formação de quadrilha) do Código Penal, em concurso material por quatro vezes, por terem provocado “aborto na gestante/denunciada (...) com o consentimento desta”. 
Inicialmente o juízo de primeiro grau deferiu a liberdade provisória aos acusados, considerando que as infrações seriam de médio potencial ofensivo e com penas relativamente brandas. O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ), porém, acolheu recurso do MPRJ e decretou a prisão preventiva, mantida pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). O Ministro Marco Aurélio, relator da ação, deferiu a medida cautelar pleiteada, em benefício dos acusados Edilson dos Santos e Rosemere Aparecida Ferreira. Em 27.06.2015, estendeu os efeitos da decisão aos demais corréus, Débora Dias Ferreira, Jadir Messias da Silva e Carlos Eduardo de Souza e Pinto. 
Um dos contornos desse conflito se deu pelo fato de que há inadequação da via processual, onde Barroso “se trata de habeas corpus, substitutivo do recurso ordinário constitucional, impetrado contra acórdão unânime da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça que não conheceu do HC 290.341/RJ”. Por esta via, o ministro alega a possibilidade de extinção do processo sem resolução de mérito.
Em seguida, foi analisada a medida cautelar. No exame da questão, o ministro Barroso afirmou que, conforme já havia assinalado o relator, Ministro Marco Aurélio, o decreto de prisão preventiva não apontou elementos individualizados que demonstrem a necessidade da custódia cautelar ou de risco de reiteração delitiva pelos pacientes e corréus, limitando-se a invocar genericamente a gravidade abstrata do delito de “provocar aborto com o consentimento da gestante”. 
Ainda segundo Barroso: “Não se encontram preenchidos, no caso concreto, os requisitos do art. 312 do Código de Processo Penal, que exigem, para decretação da prisão preventiva, que estejam presentes riscos para a ordem pública ou para a ordem econômica, conveniência para a instrução criminal ou necessidade de assegurar a aplicação da lei”. Sendo assim, é incabível prisão preventiva, exposto que os pacientes são primários e com bons antecedentes; têm trabalho e residência fixa, além de terem comparecido aos atos de instrução do processo; sendo a previsão de pena, no máximo um regime aberto, na hipótese de condenação.
O conflito destaque está no discorrimento a respeito da criminalização do aborto, fruto de um código penal de 1940, qual vai de encontro com princípios abarcados na Carta Magna de 1988, matéria a qual Barroso discorre em seu voto. O ministro alegou a necessidade de conferir interpretação conforme a Constituição aos artigos 124 a 126 do Código Penal – que tipificam o crime de aborto – para excluir do seu âmbito de incidência a interrupção voluntária da gestação efetivada no primeiro trimestre. Dada anterioridade da lei complementar e a jurisprudência do STF não admite a declaração de inconstitucionalidade de lei anterior à Constituição, o ministro Barroso aponta a hipótese é de não recepção, concluindo assim sua declaração: “Como consequência, em razão da não incidência do tipo penal imputado aos pacientes e corréus à interrupção voluntária da gestação realizada nos três primeiros meses, há dúvida fundada sobre a própria existência do crime, o que afasta a presença de pressuposto indispensável à decretação da prisão preventiva”.
A conclusão do pedido se dá com o deferimento de ordem de ofício, fundamentada na inocorrência da necessidade de medida cautelar, visto que o ministro apontou o não conhecimento de Habeas Corpus, sua decisão levou ao fim da prisão preventiva dos réus, com extensão aos corréus.
2. Exposição dos Argumentos Defendidos
Ante a sua posição favorável à descriminalização do aborto, Barroso pontua: “o aborto é uma prática que se deve procurar evitar, pelas complexidades físicas, psíquicas e morais que envolve”. Contrário às concepções teológicas da vida do nascituro, o ministro aponta a necessidade de atuação do Estado e da sociedade, como um todo, em relação a políticas públicas. Com isso, não é visado o aumento do ato, mas sim reconhecer que ele acontece por vias clandestinas e procurar combatê-lo em quantidade, para que no seu raro acontecimento, aconteça de forma segura.
A contrariedade de Barroso quanto à prisão preventiva dos pacientes, está embasada principalmente pelo caput do artigo do Código de Processo Penal: “CPP, Art. 312: A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria. (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011)”. O ministro questiona o fator crime no caso concreto, abarcando princípios como: direitos fundamentais, princípio da proporcionalidade e princípio do bem jurídico relevante.
Luís Roberto coloca os direitos fundamentais como “uma reserva mínima de justiça assegurada a todas as pessoas”, dado sua oponibilidade às maiorias eventuais que se formam, além de seu fator limitador ao legislador. Esses direitos são herança pós-guerra e movimentos ditatoriais que se desenvolveram no mundo, os quais foram legitimados por um positivismo neutro. Com o fim destes movimentos, ocorreu a ponderação da eficácia desta via jurídica, por conseguinte, a moral reaproximou-se ao Direito. Os princípios deixaram de ser acessórios, um elemento de ponderação, e passaram a fazer parte da norma. Este elemento está inserido no sistema jurídico brasileiro pela Constituição Federal.
O primeiro princípio citado por Barroso é a autonomia da mulher, enquanto elemento essencial da liberdade individual. Este princípio é abarcado pelo art. 1º, III da CF, sendo ligado diretamente à dignidade humana. Para ele, a criminalização do aborto fere o direito feminino de fazer escolhas, visto que o seu corpo torna matéria de decisão do Estado, ferindo sua capacidade de audeterminação. 
	Em seguida, elenca a violação à integridade física e psíquica feminina, protegida pelo art. 5º, caput e III. Barroso afirma a disparidade entre concepção desejada e indesejada, quanto às transformações corporais e riscos gestacionais, além das consequências psíquicas atreladas ao comprometimento com a nova vida, que são de conteúdo exclusivo da mulher.
	No tocante da violação aos direitos sexuais e reprodutivos da mulher, o ministro toca no histórico milenar de opressão à sexualidade feminina. É díspar a visão social da vida sexual ativa e prazerosa
feminina e masculina, cabendo os ônus apenas às mulheres. Este fato se dá pelo potencial reprodutivo, onde o corpo da mulher se torna um campo de batalha de ideologias, uma vez que os direitos das mulheres à sexualidade ainda são um tabu. O Relatório da Conferência Mundial do Cairo sobre a Mulher afirma:
“§ 7.3. Esses direitos se baseiam no reconhecido direito básico de todo casal e de todo indivíduo [...] de tomar decisões sobre a reprodução, livre de discriminação, coerção ou violência, conforme expresso em documentos sobre direitos humanos”.
	Sendo assim, coloca que o Código Penal está em desacordo, afetar a capacidade de autodeterminação reprodutiva da mulher, pois retira a sua possibilidade de decisão, ao que se refere à não coerção, sobre a maternidade, o que pode obriga-la a manter sua gestão. No entanto, a questão vai além, pois prejudica a saúde reprodutiva, uma vez que falta acesso adequado e aumentam os níveis de mortalidade materna.
	Quanto à igualdade de gênero, Luís Roberto Barroso coloca que o princípio de igualdade “impõe a neutralização de injustiças históricas, econômicas e sociais, bem como o respeito à diferença”, e se valeu da observação do Ministro Carlos Ayres Britto, “se os homens engravidassem, não tenho dúvida em dizer que seguramente o aborto seria descriminalizado de ponta a ponta”, utilizando do percurso histórico de desigualdade entre os gêneros para afirmar que o ônus da gravidez cabe à mulher, sendo o seu direito de decidir acerca de manter ou não a gestação.
	Dando fim a esta rodada de violação aos direitos femininos, Barroso ainda pontuou o impacto desproporcional sobre mulheres pobres, que não têm acesso a saúde e são as maiores afetadas pelas idas a clínicas clandestinas. Desta forma, mulheres de baixa renda estão mais sujeitas a lesões, mutilações e óbito causados por este procedimento
Quanto ao princípio de proporcionalidade, o ministro elenca os subprincípios para que ocorra a criminalização: “se (i) for adequada à tutela do direito à vida do feto (adequação); (ii) não houver outro meio que proteja igualmente esse bem jurídico e que seja menos restritivo dos direitos das mulheres (necessidade); e (iii) a tipificação se justificar a partir da análise de seus custos e benefícios (proporcionalidade em sentido estrito)”. 
Coloca ainda a desatualização do Código Penal de 1940 em relação aos valores contemporâneos, e sua inadequação à Constituição Federal de 1988, que é superior (critério para solução de antinomia hierárquica) e posterior (critério para solução de antinomia cronológica). E invocou de recurso de heterointegração (solução de antinomia abordada por Bobbio), quando citou visões e legislações internacionais para argumentar a favor do fim da criminalização do aborto.
Quanto ao bem jurídico, e à conclusão da matéria exposta, cabe a declaração de Barroso: “o bem jurídico protegido (a vida potencial do feto) é “evidentemente relevante”, mas a criminalização do aborto antes de concluído o primeiro trimestre de gestação viola diversos direitos fundamentais da mulher, além de não observar suficientemente o princípio da proporcionalidade. Entre os bens jurídicos violados, a autonomia da mulher, o direito à integridade física e psíquica, os direitos sexuais e reprodutivos da mulher, a igualdade de gênero – além da discriminação social e o impacto desproporcional da criminalização sobre as mulheres pobres”.
3. Voto-Contrário
Tratar sobre aborto ainda é um Tabu na sociedade e até mesmo no âmbito jurídico. A descriminalização do Aborto está sendo discutida no meio Jurídico desde os anos 60. Barroso defende que o código penal, é desatualizado. Todavia pesquisas de 2018 da data folha sobre aborto dispõe que 57% da população é contraria a descriminalização. Concordamos com a opinião a descriminalização do aborto em si, porém do meio tomado por ele.
O voto se demostra sedutor, no entanto, não podemos nos influenciar, pela visão do mérito em questão. Mas analisar que não cabe ao judiciário e sim ao legislativo promulgar.
A posição dos demais ministros, inclusive do Gilmar Mendes, é que o mesmo criticou Barroso por ter entrado no mérito da descriminalização do aborto no julgamento do habeas corpus do grupo que operava a clínica clandestina. Para Mendes, o tema só poderia ter sido discutido em plenário numa Ação Por Descumprimento de Prefeito Fundamental (ADPF), e não na análise de um pedido específico de liberdade.
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