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INSTITUTO FEDERAL DE SANTA CATARINA CÂMPUS SÃO MIGUEL DO OESTE CURSO TÉCNICO EM ALIMENTOS ALINE BARBIERI GRAZIELA FRANCO ASSUMPÇÃO OS DELÍRIOS DE BENTINHO SÃO MIGUEL DO OESTE JANEIRO DE 2021 ALINE BARBIERI GRAZIELA FRANCO ASSUMPÇÃO OS DELÍRIOS DE BENTINHO Trabalho entregue ao Curso Técnico em Alimentos Integrado ao Ensino Médio do câmpus São Miguel do Oeste do Instituto Federal de Santa Catarina para obtenção de nota parcial da Disciplina de Língua Portuguesa II. Orientador: Ademir Juvêncio da Silva. SÃO MIGUEL DO OESTE JANEIRO DE 2021 1. OS DELÍRIOS DE BENTINHO A obra literária do escritor brasileiro Machado de Assis “Dom Casmurro”, caracteriza-se por um caráter mais pessimista, provindo do movimento realista que começava a ganhar espaço entre os escritores brasileiros. Neste romance, o leitor é convidado a adentrar a mente do protagonista Bentinho, questionando, em conjunto com o mesmo, a veracidade dos fatos apresentados a respeito do possível adultério de Maria Capitolina Santiago, sendo que, ao término da história, cabe ao leitor inocentar ou não a jovem, provocando uma ambiguidade no enredo. Nesse sentido, no decorrer da história, é perceptível a maneira com a qual o comportamento de Bentinho muda em relação a Capitu (Maria Capitolina), partindo de um romance intenso e verdadeiro para a completa indiferença, segundo o princípio de que a mesma o havia traído com seu melhor amigo, Escobar. No entanto, apesar das descrições convincentes do protagonista, que tem o intuito de incriminar a jovem, seu comportamento descontrolado e obsessivo gera o entendimento de que Capitu não apenas é inocente, como também acaba tendo sua liberdade e individualidade apagadas. Em uma primeira análise, tem-se o feito que a narrativa de todos os fatos é obtida através de Bentinho, o que gera um monopólio na visão da história, que, por consequência, ocasiona uma verdade parcial dos fatos. Tal acontecimento faz com que toda a declaração obtida seja duvidosa, somado ao fato de o narrador ser advogado, com grande poder de persuasão em suas mãos, induzindo o rumo da situação a aquilo que o mesmo quer que o leitor acredite, ou seja, sua própria versão. Dessa maneira, segundo o consultor jurídico Ari Lima, a capacidade de influenciar pessoas sempre fez parte do sucesso na advocacia, onde que, no próprio ambiente de aprendizado, os estudantes procuram formas de aperfeiçoamento de técnicas de persuasão, intensificando, mais uma vez, a capacidade de Bento de induzir o leitor a acreditar em coisas que não aconteceram de fato. Com isso, pode- se perceber esse fenômeno na grande riqueza de detalhes que ele aponta, até mesmo em situações que ocorreram a muito tempo atrás, que seriam quase impossíveis de se lembrar. Assim, o fato de Bentinho tratar de seus sentimentos, de apresentar minúcias sobre sua vida com Capitu, é um meio de persuasão, na ilusão de que pequenos detalhes transparecem a verdade absoluta. Em uma segunda análise, de acordo com o dicionário online de português, pode-se definir ciúmes como sendo: “Sentimento complexo e de difícil compreensão, provocado pelo medo de perder a pessoa amada”. Dessa forma, Bentinho, desde sua adolescência, sentia um ciúme doentio por Capitu, devido a coisas que ele mesmo reconhecia serem insignificantes depois de um tempo. Assim, pode-se citar uma das vistas de Bento para Capitu, na qual um rapaz passa por eles olhando para a jovem e, com esse simples ato, Bentinho cria teorias de como Capitu poderia o estar trocando por um novo amor, sendo que, após um esclarecimento, notou-se que o jovem era comprometido e não havia motivos concretos para tamanha preocupação. Ainda, após o episódio com o cavaleiro, Bento demonstra um demasiado descontrole em seus pensamentos, característico de relacionamentos abusivos, ao afirmar que “[...] a vontade que me dava era cravar-lhe as unhas no pescoço, enterrá- las bem, até ver-lhe sair a vida com o sangue…” (ASSIS, 2017, p. 150). Nesse contexto, somado a momentos em que Bentinho restringia Capitu de usar determinadas roupas que mostravam demais seus ombros ou a deixavam muito aparente, nota-se a repressão destinada a mesma, transformando uma mulher livre e independente, em alguém mais calada e comedida, ao mesmo passo que Bento também se tornava assim, destinado ao palpável apelido Dom Casmurro. Além disso, um dos argumentos utilizados por Bento, é o fato de Ezequiel, seu único filho, ser muito parecido fisicamente com Escobar, o que lhe dava a certeza da traição. Em contrapartida, em dado momento da história, é mencionado o quanto Capitu é semelhante com a mãe de Sancha, o que, por uma lógica falha de Bentinho, também deveria ser sinônimo de desconfiança. Segundo a British Broadcasting Corporation (BBC), existem 74 mil pessoas no mundo em potencial para serem sósias umas das outras, mesmo sem nenhum tipo de parentesco envolvido. Com isso, tendo- se que Bentinho e Escobar eram brancos e homens de cabelo escuro, sequer existia discrepância absurda em suas imagens para a aparência ser motivo de confidência na traição. Ademais, outra questão que refuta isso, encontra-se nas imitações de Ezequiel, o qual tinha esse costume desde muito novo, fazendo-o com todos à sua volta. Consequentemente, acabava reproduzindo com mais frequência as ações daqueles que fossem mais próximos de seu convívio, e Escobar, sendo o melhor amigo de Bentinho, estava nesse meio. Assim, ainda com a ideia de infidelidade impregnada em sua cabeça, o fato de ver seu filho imitando alguns dos hábitos de Escobar, deu mais um motivo banal para acreditar no adultério de Capitu e seu amigo, mesmo que sem fundamento lógico por trás disso. Outrossim, em determinando momento da trama, Escobar menciona um possível casamento entre sua filha e Ezequiel, o que nunca seria feito se o mesmo acreditasse que o menino pudesse ser seu filho - uma vez que, se ao menos a traição tivesse ocorrido, uma desconfiança existiria em sua mente -, considerando seu apreço por religião, a qual, em hipótese alguma, incentivaria o incesto. Situações como estas eram ignoradas por Bento, em uma tentativa de perscrutar circunstâncias que lhe davam a certeza ilusória de traição. Logo, pode-se perceber que, ao longo da narrativa, Bento Santiago deseja acreditar na culpa de Capitu, na sua aura perversa e manipuladora, remetendo a situações da adolescência, que outrora viu com inocência, como traições nítidas. Nesse sentido, a teoria da dissonância cognitiva, a qual busca analisar e explicar a maneira com que os indivíduos atribuem coerência para crenças e comportamentos incoerentes, mesmo que sem nenhuma evidência na realidade - como as recentes teorias da Terra plana -, representa a postura de Bentinho em relação a sua esposa, que constantemente confere argumentos para a sua verdade absoluta, cegando-se para outra qualquer outra veracidade que não a sua. Assim, ainda em relação a teoria da dissonância cognitiva, ao assistir à peça “Otelo, O Mouro de Veneza”, do escritor inglês William Shakespeare, Bentinho seleciona aquilo em que quer acreditar, ao julgar que Capitu carecia morrer da mesma forma que Desdêmona, apesar da mesma não ter cometido o ato de traição. Sendo assim, Bento não apenas utiliza informações que sustentam a sua crença, a fim de potencializar seu pensamento e induzir os leitores a pensarem o mesmo, mas também tem sua visão assegurada pelo sistema de crenças inquestionáveis que regia o período em que a história se desenvolve, provinda da Igreja Católica, na qual o adultério era entendido como um pecado irreparável. Portanto, tendo em vista os argumentos supracitados, entende-se que Capitu não cometeu o ato de adultério, tendo sido vítima dos delírios de umhomem que, com o passar dos anos, tornou-se indiferente e solitário, além de seus pensamentos serem cruéis e impiedosos, nos quais o assassinato de uma criança e do suposto amor da sua vida, são quase tangíveis. Sendo assim, Bentinho, por sua própria convicção e insânia, conseguiu afastar sua esposa e seu filho, que sempre demonstrou amor e adoração incondicional. REFERÊNCIAS ASSIS, Machado de. Dom Casmurro. Brasília: Editora Câmara, 2017. CIÚME: Significado de ciúme. 20--. Disponível em: <https://www.dicio.com.br/ciume/.> Acesso em: 29 jan. 2021. LIMA, Ari; Caminho do sucesso - Desenvolver retórica deve ser objetivo do advogado. 6 de março de 2010. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2010- mar-06/desenvolver-retorica-principais-objetivos-advogado> Acesso em: 29 jan. 2021. MARINHO, Fernando. Machado de Assis. 20--. Disponível em: <https://mundoeducacao.uol.com.br/literatura/machado-assis.htm.> Acesso em: 29 jan. 2021. PILATI, Ronaldo. Ciência e Pseudociência: por que acreditamos apenas naquilo em que queremos acreditar. São Paulo: Editora Contexto, 2018. 115 p. SIQUEIRA, Felipe; Cientistas confirmam: existem chances de alguém exatamente igual a você estar vivendo por aí. Disponível em: <>https://noticias.r7.com/hora-7/cientistas-confirmam-existem-chances-de-alguem- exatamente-igual-a-voce-estar-vivendo-por-ai-16062018>. Acesso em: 31 jan. 2021.
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