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einstein: Educ Contin Saúde. 2009;7(4 Pt 2): 175-6 Por dentro da estatística Ângela Tavares Paes Editora da seção O uso de métodos estatísticos vem crescendo vigorosamente em pesquisas da área médica. Com frequência, médicos e profissionais da Saúde são expostos a informações provenientes de análises de dados, nem sempre claras e de fácil interpretação. Esta seção visa familiarizar pesquisadores com conceitos e termos estatísticos comumente presentes em artigos científicos. Com ênfase na discussão conceitual em detrimento a fórmulas matemáticas, o objetivo é esclarecer algumas dúvidas frequentes e contribuir com o desenvolvimento do senso crítico na hora de analisar, descrever e interpretar dados. Probabilidade, risco ou chance? Luciana Neves Nunes1, Suzi Alves Camey2 1 Estatística, Doutora em Epidemiologia, Departamento de Estatística da Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS, Porto Alegre (RS), Brasil. 2 Estatística, Doutora em Estatística, Departamento de Estatística da Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS, Porto Alegre (RS), Brasil. Facilmente encontramos na literatura médica resul- tados de pesquisas expressos por meio de medidas de efeito, tais como risco relativo (relative risk) ou razão de chances (Odds Ratio). O uso dessas medidas ajudam a identificar fatores associados a doenças, condições ou comportamentos em saúde e, dessa maneira, a colabo- rar para o estudo da etiologia desses eventos. O apa- recimento e/ou desenvolvimento de uma determinada doença pode ocorrer com maior frequência na presença de alguns fatores, os quais são usualmente chamados de fatores de risco. Entretanto, ainda existe certa confusão quanto à decisão de qual medida de efeito deve ser usa- da e como se faz a interpretação de tal medida. A razão de chances, por exemplo, é comumente utilizada, mas mesmo quando usada adequadamente, envolve dificul- dade na sua interpretação(1). A medida de efeito que se deve calcular depende da escolha do delineamento do estudo. Na tabela 1 são mostradas as medidas de efeito de acordo com cada um dos delineamentos observacionais epidemiológicos clássicos. Probabilidade, risco relativo, chance e razão de chances A partir do entendimento de alguns conceitos e defini- ções matemáticas, torna-se mais fácil interpretar cor- retamente cada uma das possíveis medidas de efeito. Probabilidade (ou risco) é a proporção de vezes que um desfecho deve ocorrer se um experimento ou observa- ção for repetido um número grande de vezes. Risco re- lativo (RR) é a razão de duas probabilidades (ou razão de riscos). A chance (tradução de odds, que ainda gera controvérsias) é a probabilidade de um evento ocor- rer, dividida pela probabilidade do evento não ocorrer. Uma razão de chances é a razão entre duas chances. Para ilustrar, veja a tabela 2 a seguir, que mostra a dis- tribuição de um grupo observado de acordo com desfe- cho e um fator exposição(1-2). tipo de estudo Medida de efeito Transversal Razão de prevalências (RP) Caso-controle Razão de chances (RC) Coorte Razão de incidências (RI) tabela 1. Medidas de efeito de acordo com o delineamento do estudo Fator de exposição desfecho total risco chance Presente ausente Exposto a b a+b a/(a+b) a/b Não exposto c d c+d c/c+d c/d Total a+c b+d a+b+c+d tabela 2. Distribuição de acordo com desfecho e fator de exposição A partir da tabela 2, podemos ver que a probabili- dade (ou risco) dos indivíduos expostos terem o desfe- cho pode ser estimada por: Probexpostos= a a + b( ) , enquanto a probabilidade dos não-expostos terem o desfecho é estimada por: einstein: Educ Contin Saúde. 2009;7(4 Pt 2): 175-6 176 Probnão-expostos= c c + d( ) . Baseado nessas probabilidades, o risco relativo (RR) poderia ser calculado da seguinte maneira: RR = Probexpostos Probnão-expostos = a (a+b) c (c+d) , que é a divisão das duas estimativas das probabilidades. Ainda com base na tabela 2, a chance de doença no grupo exposto pode ser calculada por: Chance expostos a (a+b) b (a+b) a b , ou seja, a chance dos expostos é simplesmente a b . A razão de chances pode ser calculada pela di- visão da chance dos expostos terem o desfecho pela chance dos expostos não terem o desfecho. Portanto, RC= a b c d = ad bc ,que também é conhecida como a razão dos produtos cruzados. Vale a pena observar que a tabela 2 é construída in- dependente do tipo de delineamento do estudo. Por- tanto, podemos concluir que apesar da literatura tratar bPn Morte perinatal total sim não Sim (<2.500 g) 150 570 720 Não (≥2.500 g) 65 5.450 5.515 Total 215 6.020 6.235 tabela 3. Distribuição da amostra de acordo com desfecho e fator de exposição apenas a RI como RR, a RP também é um RR por se tratar de uma razão de probabilidades. Como exemplo, considere a tabela 3 que apresenta os resultados de um estudo para avaliar associação en- tre baixo peso ao nascer (BPN) e morte perinatal (da- dos fictícios). A exposição é o BPN e o desfecho é a morte perinatal. Com os dados da tabela 3, podemos calcular o RR, onde RR 150 720 65 5.515 17,7, e dizer que o risco de morte perinatal de um recém-nascido de baixo peso é 17,7 vezes o risco de morte perinatal de um recém-nascido com peso ≥2.500 g. Quando calculada a razão de chances, temos RC 150 5.450 570 65 22,1, portanto calcula-se que a chance de morte perinatal de um recém-nascido de bai- xo peso é 22,1 vezes a chance de um recém-nascido com peso ≥2.500 g. É importante que o pesquisador tenha claro qual foi o delineamento utilizado, pois as medidas de efeito têm interpretações diferentes. Ainda em relação à interpretação do RR (ou RC), ressaltamos que, por se tratar da razão entre duas quantidades, sabemos que essa razão será igual a 1 quando o risco (ou chance) for igual entre expostos e não-expostos. Por outro lado, quando uma razão for maior que 1, temos um indicativo que o fator de exposição é um fator de risco; caso contrário, quando uma razão for menor do que 1, temos um fator de proteção. reFerÊncias 1. Katz KA. The (relative) risks of using odds ratios. Arch Dermatol. 2006:142(6):761-4. 2. Jekel JF, Katz D L, Elmore JG. Epidemiologia, bioestatística e medicina preventiva. Porto Alegre: Artmed; 2005.
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