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Normalmente as pessoas têm um domínio pequeno e superficial do conhecimento acumulado pela psicologia científica, o que lhes permite explicar ou compreender seus problemas cotidianos de um ponto de vista psicológico. A vida cotidiana, como nossa rotina de acordar, ir para a escola e voltar para casa, permite-nos a sensação de estarmos vivos. Já a ciência é uma atividade eminentemente reflexiva, a qual procura compreender e alterar esse cotidiano, tudo isso a partir de seu estudo sistemático. Desse modo, a base da ciência é a realidade cotidiana (nesse ponto, ciência e realidade aproximam-se). Entretanto, além de aproximar, é necessário o afastamento entre conhecimento científico e o cotidiano para que a ciência consiga abstraí-lo, a fim de que o compreenda melhor. Ou seja, a ciência transforma o cotidiano/a realidade em objeto de investigação. Durante nossa rotina percebemos e aprendemos coisas sem a necessidade de um estudo aprofundado. Um exemplo disso são as nossas avós que – muito provavelmente – não sabem o princípio ativo das plantas medicinais, mas têm o conhecimento de que elas podem ser usadas para alívio de dores. Esse tipo de conhecimento acumulado é chamado de senso comum, o qual percorre um caminho que vai do hábito à tradição e costuma facilitar a nossa vida. O senso comum integra – de modo precário – o conhecimento humano. Porém, demora um tempo para que os conhecimentos mais sofisticados sejam absorvidos pelo senso comum. Muitas vezes ele se apropria da ciência. Um exemplo é usar “garota histérica”, que é um termo definido pela psicologia científica, mas que muitas vezes usamos sem nem termos noção do real significado da palavra. Desde os primórdios o homem foi ocupando cada vez mais espaço na Terra, e apenas o conhecimento do senso comum tornou-se insuficiente para que ele dominasse a natureza para seu próprio proveito. Desse modo, novas áreas do conhecimento surgiram, sendo um exemplo, a matemática usada pelos gregos, que é importantíssima até os dias atuais. Com o passar do tempo, esse tipo de conhecimento foi-se especializando cada vez mais, até chegarmos na ciência. Entretanto, o senso comum e a ciência não são as únicas formas de conhecimento que o homem possui para a interpretação da realidade. Desde a Grécia Antiga que as pessoas se preocupam com as suas origens e com o significado da existência humana. Essas especulações formaram a filosofia. Além disso, diversas teorias relacionadas à origem do homem foram criadas, criando a religião. Além do senso comum, da religião e da filosofia, outra forma de conhecimento humano surgiu: a arte, com seu primeiro marco na pré-história por meio das pinturas rupestres. A tarefa de definir a Psicologia Científica é muito mais difícil que definir o senso comum. A ciência diz respeito a um conjunto de conhecimentos sobre fatos ou aspectos da realidade. Esses conhecimentos são obtidos de forma programada, sistemática e controlada, para que se permita a verificação de sua validade. Essa característica da produção científica possibilita sua continuidade: um nome conhecimento é produzido sempre a partir de algo anteriormente desenvolvido. As conclusões científicas devem ser passíveis de verificação e isentas de emoção, pois almejam à objetividade. Dessa forma, são válidas para todos, em todo o planeta. Um conhecimento, para ser considerado científico, necessita de um objeto específico de estudo. Entretanto, esse objeto varia dentro da psicologia. Se perguntarmos a um psicólogo comportamentalista, ele dirá que tal objeto é o comportamento humano, diferentemente de um psicólogo psicanalista que dirá ser o inconsciente. A psicologia tem objetos de estudo diversos, pois tornou-se área de conhecimento científico recentemente, no final do século 19. E, quando uma ciência é muito nova, ela ainda não teve tempo de apresentar teorias acabadas e definitivas que permitam determinar com maior precisão o seu objeto de estudo específico. Um outro motivo que contribui para dificultar uma clara definição de objeto da Psicologia é o fato de o cientista — o pesquisador — confundir-se com o objeto a ser pesquisado. No sentido mais amplo, o objeto de estudo da Psicologia é o homem, e neste caso o pesquisador está inserido na categoria a ser estudada. Assim, a concepção de homem que o pesquisador traz consigo “contamina” inevitavelmente a sua pesquisa em Psicologia. Isso ocorre porque há diferentes concepções de homem entre os cientistas (na medida em que estudos filosóficos e teológicos e mesmo doutrinas políticas acabam definindo o homem à sua maneira, e o cientista acaba necessariamente se vinculando a uma destas crenças). Os fenômenos psicológicos são tão diversos que não podem ser acessíveis ao mesmo nível de observação e, portanto, não podem ser sujeitos aos mesmos padrões de descrição, medida, controle e interpretação. A identidade da psicologia é o que a diferencia dos demais ramos das ciências humanas, e pode ser obtida considerando-se que cada um desses ramos enfoca o homem de maneira particular. A psicologia colabora com o estudo da subjetividade. Nosso diferencial é o homem em todas as suas expressões, as visíveis (o comportamento) e as invisíveis (os sentimentos), as singulares (porque somos o que somos) e as genéricas (porque somos todos assim). A subjetividade é singular e individual, e cada ser a constrói de acordo com seu desenvolvimento e experiências de vida social e cultural. A subjetividade é a maneira de sentir, pensar, fantasiar, sonhar, amar e fazer de cada um. Uma pessoa pode ser uma brasileira que sonha em viajar o mundo, que ama desenhar e ler livros de fantasia, que faz aula de dança, que seus melhores amigos são pessoas da sua pequena cidade e que pensa bastante em como será o seu futuro de uma forma diferente dos outros. Ou seja, essa pessoa é singular – cada qual é o que é. Essa subjetividade não é inata ao indivíduo, mas é construída aos poucos, apropriando- se do material do mundo social e cultural, ao mesmo tempo em que atua sobre este mundo. Criando e transformando o mundo (externo), o homem constrói e transforma a si próprio. Além disso, a subjetividade é auto moldável, pois o ser humano pode formular outros modos de ser. O movimento e a transformação são os elementos básicos de tudo. As pessoas nunca são terminadas, pois estarão sempre se modificando, pois, a subjetividade não cessará de se modificar, porque as experiências sempre trarão novos elementos para renová-la. “O importante e bonito do mundo é isso: que as pessoas não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas, mas que elas vão sempre mudando. Afinam e desafinam” – Guimarães Rosa. A psicologia, como área da ciência, vem se desenvolvendo desde 1875, quando Wilhelm Wundt criou o primeiro Laboratório de Experimentos em Psicofisiologia, na Alemanha. Esse marco histórico significou o desligamento das ideias psicológicas de ideias abstratas e espiritualistas, que defendiam a existência de uma alma nos homens, a qual seria a sede da vida psíquica. Assim, a psicologia vai se fortalecendo no âmbito científico, além da ideia de um homem autônomo, capaz de se responsabilizar pelo seu próprio desenvolvimento. Como existe muita coisa desconhecida pela psicologia, alguns psicólogos se associam ao misticismo, como o tarô, a astrologia etc. Entretanto, essas práticas não devem ser confundidas com a psicologia, pois: • Não são construídas no campo da ciência, a partir do método científico. • Estão em oposição aos princípios da psicologia, que vê o homem como autônomo e sem um destino pronto, que constrói seu futuro ao agir no mundo. Enquanto em práticas místicas há a forte presença da concepção de destino e de forças imateriais. É importante que os psicólogos enfrentem as demais práticas sem preconceitos, mas que saibam demarcar aquilo que se encaixa na psicologia.Não se pode usar expedientes sem critérios científicos comprovados – isso está presente no Código de Ética. REFERÊNCIA: BOCK, Ana Mercês Bahia; FORTADO, Odair; TEXEIRA, Maria de Lourdes Trassi. Psicologias. 1999. (CAP. 1)
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