Buscar

Aulas Síncronas_11

Prévia do material em texto

1 
 
FILOSOFIA DA RELIGIÃO 
 
A filosofia da religião examina criticamente: 
 Conceitos religiosos fundamentais, como: o conceito de Deus, o conceito de fé, a noção de 
milagre e a ideia de omnipotência. 
 As crenças religiosas fundamentais: a crença de que Deus existe, de que há vida depois 
da morte, de que Deus sabe, mesmo antes de nascermos, o que iremos fazer, de que a 
existência do mal é de algum modo consistente com o amor de Deus pelas suas criaturas. 
 
 
POSIÇÕES/CONCEITOS RELATIVOS Á PROBLEMÁTICA DA EXISTÊNCIA DE DEUS 
Teísmo (de theo (“deus”)): crença na existência de Deus (omnipotente, omnisciente, 
bondoso, criador e pessoa). 
Ateísmo (de theos (“deus”) e o prefixo de negação a): crença na não existência de Deus. 
O ser humano inventou um ser absoluto e transcendente no qual deposita, de uma forma 
cega, a sua confiança, conseguindo evitar o desânimo, a angústia e o sentimento de 
abandono. A religião é fonte de engano e ilusão. (Freud) 
Agnosticismo (de gnosis (“saber”) e o prefixo de negação a): ausência de crença acerca 
da existência de deuses; posição de acordo com a qual o absoluto é inacessível ao ser 
humano, pelo que não é possível resolver o problema de Deus. (Russel) 
Tanto o teísmo como o ateísmo carecem de provas que validem ou não a existência de 
Deus, pelo que a posição mais correta seria a de assumir que questões como a existência 
de Deus ou da alma escapam à capacidade de compreensão humana. Não há indiferença 
nem alheamento, sim incompreensão de uma realidade que nos ultrapassa. Assim, a atitude 
correta é suspender o nosso juízo sobre a questão. 
Deísmo: Deus é criador, mas não intervém nem se importa com a criação. 
Panteísmo (de pan (“todo”) e theos): Deus não é distinto do mundo. Deus é tudo e tudo 
é Deus. 
Fideísmo (do latim fides (“fé”)): doutrina que sustenta a incapacidade da razão humana 
para atingir determinadas verdades, considerando que elas só são acessíveis através da fé. 
O fideísmo é, geralmente, uma tese não racionalista acerca da crença religiosa. Blaise 
Pascal e Soren Kierkegaard defenderam o fideísmo cristão. 
 
 
Conceito teísta de Deus 
Quando as principais religiões (como o judaísmo, o cristianismo, o islamismo) falam de 
"Deus", a que se estão a referir? 
Quando as principais religiões falam de "Deus" estão a referir-se ao Deus teísta. 
o E por "Deus teísta" entende-se o Deus com os seguintes predicados: 
 Omnipotente (que pode fazer tudo); 
 Omnisciente (que sabe tudo); 
 Sumamente bom (moralmente perfeito ou só faz e quer o bem; uma divindade 
sumamente boa não promove ou faz coisas más; porém, talvez algumas coisas más 
sejam consequências inevitáveis das boas que a divindade promove); 
 Criador (autor de toda a realidade espácio-temporal; criou o universo, com tudo o 
que contém, e não apenas algumas partes do universo); 
 Pessoa (as divindades que são pessoas têm estados mentais e agem de acordo com 
esses estados, mas não são meras forças da natureza). 
 Transcendente (é distinto do universo, ou seja, estão para lá dele; não são 
imanentes, ou seja, não são o próprio universo, nem sequer quaisquer partes do universo 
(como o Sol ou trovoada) 
o Tanto o cristianismo, como o judaísmo ou o islamismo, defendem a existência deste 
Deus teísta com esses predicados, ainda que lhe deem diferentes nomes. 
 
2 
 
 Esta conceção teísta de Deus distingue-se de outras conceções de Deus, tal como o 
deísmo (em que se defende que Deus é criador mas que não intervém nem se importa com 
a criação) ou o panteísmo (em que Deus não é distinto do mundo). 
 
 Talvez seja muito comum acreditar em Deus porque essa crença é reconfortante nos 
piores momentos da vida ou simplesmente porque fomos educados para ter medo de duvidar 
da existência de Deus. 
Porém, quem tem curiosidade intelectual quer saber duas coisas: 
1. Há boas razões para acreditar que Deus existe? 
2. Se não há, é razoável, apesar disso, acreditar que Deus existe? 
 
 
Argumentos Ideia principal 
Tipo de 
argumento 
Cosmológicos 
Deus existe porque de outro modo não se consegue 
explicar a existência do Universo 
Como é possível a existência seja do que for sem uma 
causa? 
Empírico 
Teleológicos 
Deus existe porque de outro modo não se consegue 
explicar a ordem do Universo. 
Como é que é possível a ordem e finalidade das coisas 
sem um artífice? 
Empírico 
Ontológicos 
Deus existe porque é incoerente pensar que não existe. 
Como é possível pensar algo sem que se atribua o 
mínimo de existência? 
Concetual 
 
 
 
3 
 
ARGUMENTOS A FAVOR DO DEUS TEÍSTA 
 
 
ARGUMENTO COSMOLÓGICO 
 
Se todas as coisas têm uma causa, então há uma causa para todas as coisas. 
 
Argumento da causa primeira (São Tomás de Aquino) 
 
(1) Se existem coisas no mundo, então tais coisas foram causadas por outras coisas. 
(2) Se as coisas foram causadas por outras coisas, então ou há uma cadeia causal 
que regride infinitamente ou há apenas uma primeira causa que é a origem da cadeia 
causal. 
(3) Mas não há uma cadeia causal que regride infinitamente. 
(4) Logo, há apenas uma primeira causa (Deus) que é a origem da cadeia causal. 
 
Explicação da premissa 3: a regressão ao infinito na cadeia das causas não é plausível. 
Se a regressão das causas fosse infinita, então não haveria nada no seu início que desse 
origem à própria cadeia causal que deu origem a tudo o que temos hoje. 
Se não houver uma primeira causa (Deus), deixaria de haver a própria cadeia causal e nada 
existiria. Mas como existem coisas e cadeias causais, segue-se que terá de haver uma 
primeira causa. 
 
Objeção à premissa 2: falácia do falso dilema 
Apresenta apenas duas opções para explicar as coisas que existem no mundo (cadeia 
regressão infinita ou apenas uma primeira causa), quando se poderia apresentar 
outra alternativa: haver várias primeiras causas diferentes. 
 
Objeção à premissa 3: pode haver uma cadeia causal infinita 
Se não existisse uma primeira causa também não existiria cadeia causal e nada 
existiria. Ora, a definição de regressão infinita da cadeia causal é exatamente isso, 
não se admitindo uma primeira causa. Logo, não é verdade que se esta não existir, 
a cadeia causal e tudo o que existe no mundo deixa de existir. 
 
Objeção à conclusão (4): não implica o Deus teísta 
Mesmo admitindo uma primeira causa, nada garante que essa causa seja Deus teísta 
(omnipotência, omnisciência ou suma bondade). Mesmo que fosse Deus, quem criou 
Deus. Se se gerou a si próprio teria de existir para se gerar. Mas se teria de existir, 
não precisaria de se gerar. 
 
Versão da causa primeira (simplificada) 
 
Tudo o que existe tem uma causa. 
Se tudo o que existe tem uma causa, então o universo, no seu conjunto, também 
tem uma causa. 
Logo, o universo tem uma causa. 
… 
A cadeia de causa não pode recuar infinitamente. 
Se a cadeia de causas não pode recuar na direção do passado, então existe uma 
primeira causa. 
logo, há uma primeira causa do universo (e essa causa é Deus). 
 
 
4 
 
ARGUMENTO TELEOLÓGICO 
 
A ordem que observamos no universo é uma boa razão para pensar que Deus existe. 
Seja o que for que produziu o universo tem de ser um ser inteligente. 
 
A VERSÃO DA SEMELHANÇA (William Paley) 
 
O universo é como um relógio (tem partes interligadas entre si que permitem várias funções e nada é 
deixado ao acaso). 
O relógio precisou de um ser inteligente para ser criado. (o relojoeiro) 
Logo, o universo também precisou de um ser inteligente para ser criado. (Deus) 
 
Objeção à versão da semelhança 
 Analogia fraca: não se pode comparar artefactos ao universo, pois as semelhanças entre o relógio e a 
natureza não são assim tão próximas. 
 Mesmo constatando em ambos ordem e complexidade, não há nada que nos garanta que a ordem da 
natureza se assemelhe à de um relógio, isto é, que da ordem se infira a finalidade (o universo não é 
necessariamente um sistema teleológico). 
 Portanto, relativamenteao universo, não temos comparação, pois é único. Logo, não podemos dizer 
que foi ou não feito por um ser inteligente. 
 
A VERSÃO DA ORDEM 
 
As maravilhas da natureza devem-se ou a uma conceção de Deus ou devem-se ao acaso. 
Mas tais maravilhas não se devem ao acaso1. 
Logo, tais maravilhas devem-se a uma conceção de Deus 
 
Objeção à versão da ordem 
 A premissa 1, é um falso dilema porque além de Deus e o acaso há uma terceira hipótese: a ordem que vemos na natureza 
resulta de um processo de evolução por seleção natural. 
Processos puramente naturais e do acaso dão, ao longo de um lento processo de adaptação e ajustes sucessivos, origem à ordem. 
Darwin, em A Origem das Espécies, mostrou que a variedade e a complexidade dos seres vivos resultam da seleção natural e da 
sobrevivência dos mais aptos, os quais, por sua vez, irão transmitir os seus genes às gerações seguintes. Sem negar a existência 
de Deus, a teoria da evolução acaba, no entanto, por pôr em causa as explicações do argumento teleológico, apresentando uma 
explicação alternativa. Ou seja, pode fazer-se ciência sem pressupor tal coisa (inteligência divina). 
 Este argumento, ainda que possa demonstrar a existência e a necessidade de um criador, não prova: 
1. que ele seja único – pode tratar-se de uma equipa de deuses, tal como só uma equipa de seres humanos é 
capaz de construir uma nave espacial 
2. que se trata de um arquiteto omnipotente – poderá argumentar-se que o Universo apresenta “defeitos de 
fabrico”, visíveis por exemplo em organismos imperfeitos ou doentes 
3. que o criador seja omnisciente e infinitamente bom – contraria essa ideia a existência do mal no mundo 
(as catástrofes, o sofrimento, a doença, a morte, a crueldade), sendo que, aparentemente, Deus nada faz 
para o impedir. 
 
Versão de São Tomas de Aquino 
As coisas que carecem de cognição agem sistematicamente para fins de produzir melhor. 
Mas, se não há um ser inteligente que dirige o mundo natural, então as coisas que carecem de cognição não agem 
sistematicamente para fins de produzir o melhor. 
Logo, há um ser inteligente que dirige o mundo natural, ou seja, Deus 
 
 
1 O acaso não pode ser responsável por tal ordem, tal como um bebé não podem escrever por acaso um romance. 
Logo, Deus existe. 
 
5 
 
ARGUMENTO ONTOLÓGICO DE SANTO ANSELMO 
 
 O argumento ontológico parte do conceito de Deus e de premissas a priori 
(premissas que podem ser conhecidas independentemente da experiência do mundo) 
para concluir que Deus existe na realidade. 
 Na versão clássica, do século XI, de Santo Anselmo (cf. Proslogion, 2) parte-se da 
definição de Deus como “ser maior do que o qual nada maior pode ser pensado”. 
 E a partir desta definição conclui-se que Deus existe na realidade, pois se Deus 
não existisse na realidade ou se apenas existisse no pensamento, mas não na 
realidade, não seria aquele ser maior do que o qual nada maior pode ser pensado. 
 
Formulação do argumento ontológico de Anselmo: 
(1) Deus existe. 
(2) Se Deus existe no pensamento e não na realidade, então um ser mais perfeito 
que Deus seria concebível. 
(3) Mas não é concebível um ser mais perfeito do que Deus. 
(4) Logo, Deus existe na realidade. 
 
Justificação de (1) 
A premissa (1) afirma que um ser maximamente perfeito existe, nalgum sentido, 
na mente daqueles que entendem o conceito de Deus; pois: 
 para se afirmar ou negar a existência de um ser maximamente perfeito, deve-se 
compreender o que está a ser afirmado ou negado. 
 Assim, um ser maximamente perfeito existe pelo menos como entidade mental, 
ou conceito, se é afirmado ou negado. 
 
Justificação de (2): 
Se afirmamos que Deus existe na mente, mas não na realidade, então estamos a 
alegar que podemos conceber algo mais perfeito do que Deus. 
 
 
Justificação de (3): 
Não podemos conceber um ser mais perfeito do que Deus porque Deus é o ser 
maximamente perfeito, o ser com todas as qualidades (como a omnipotência, a 
omnisciência e a suma bondade, entre outras). 
 
Será um bom argumento? 
Críticas de Gaunilo 
Seguindo a mesma estrutura argumentativa, pode-se provar coisas que não existem 
(como p.e. “ilhas perfeitas”). 
 
(1) A ilha perfeita existe no pensamento. 
(2) Se a ilha Perfeita existe no pensamento e não na realidade, então uma ilha mais 
perfeita do que a ilha Perfeita é concebível. 
(3) Mas não é concebível uma ilha mais perfeita do que a ilha Perfeita. 
(4) Logo, a ilha Perfeita existe. 
 
Crítica de Kant: 
 Kant critica o argumento ao defender que a existência não é um verdadeiro 
predicado. 
6 
 
 A existência não é um predicado tal como o é uma propriedade que pode 
caracterizar uma coisa (ou seja, “existe” não é uma propriedade como “verde”, 
“inteligente” ou “alto”). 
 Isto porque a existência não acrescenta nada ao conceito de uma coisa. Pelo 
contrário, a existência é apenas a instanciação de uma coisa. 
 Por exemplo, quando dizemos que um cão "existe" não estamos a acrescentar 
nada ao conceito de cão; simplesmente estamos a afirmar que o conceito de cão é 
exemplificado ou instanciado. 
 No argumento ontológico, Anselmo parece sustentar que a existência é um 
predicado que se acrescenta ao conceito de ser maximamente perfeito. 
 Contudo, se a existência não é uma propriedade ou um predicado, então um ser 
maximamente perfeito não é maior se existir do que se não existir. 
 
 
 
 
7 
 
FIDEÍSMO: FÉ SEM PROVAS 
 
 Os métodos comuns de justificação, por meio de provas e argumentos, são inadequados 
apara justificar a fé na existência de Deus. 
 Apesar disso consideram legítimo ter fé em Deus: a falta de boas razões para pensar que 
Deus existe não é uma boa razão para deixar de ter fé. 
 Deus é uma entidade sobrenatural e só a fé nos pode pôr em contacto com Deus 
 
O argumento da fé 
 Kierkegaard defendeu que é inadequado exigir provas e argumentos a favor da existência 
de Deus porque, ao fazê-lo, estamos a eliminar o que há de especial na vida religiosa, que se 
funda na fé; a fé é incompatível com provas e argumentos. 
 Quando há boas razões para acreditar na existência de Deus, não só não é preciso ter fé, 
como não é sequer possível tê-la. 
 
 
A RESPOSTA DE BLAISE PASCAL 
 
Os vários argumentos a favor de Deus não são bons, mas também não temos 
bons argumentos a favor da inexistência de Deus; logo, há um empate da razão 
quanto à existência de Deus. O quer fazer? 
 
Nesta circunstância, o melhor é acreditar em Deus. Se considerarmos todas as 
alternativas: 
1. se não acreditarmos e Deus não existir, nada ganhamos de importante; 
2. se não acreditarmos e Deus existir, temos tudo a perder 
logo, o mais razoável a fazer é acreditar em Deus. 
 
Conclusão: 
 temos a ganhar se Deus existir e formos crentes 
 nada perdemos de importante se formos crentes e Deus não existir 
 
APOSTA DE PASCAL 
 Deus existe Deus não existe 
Acreditar em Deus Valor infinito positivo (Paraíso) Valor finito 
Não acreditar em Deus Valor infinito negativo (inferno) Valor finito 
Negócio Mafioso 
 Há vida em Marte Não há vida em Marte 
Aposto 2€ Ganho 200 mil € Perco 2€ 
Não aposto 2€ Perco 200 mil € Poupo 2€ 
 
 
De acordo com Blaise Pascal, mesmo sem argumentos a favor da existência de 
Deus, o mais racional, do ponto de vista prudencial, é acreditar que Deus existe, 
dado que essa é a melhor «aposta», a que traz mais benefícios práticos para nós. 
Por outras palavras, ainda que a crença em Deus não tenha racionalidade 
epistémica (por exemplo, porque os argumentos a favor da existência de Deus não 
são bons), a crença em Deus tem racionalidade prudencial na medida em que nos 
proporciona benefícios práticos. Esta posição, de que se pode acreditar legitimamente 
em Deus sem qualquer racionalidade epistémica, é conhecida como «fideísmo». 
 
8 
 
É importante sublinhar que Pascal, sendo fideísta, não está a procurar provar que 
Deus existe ou que a existência de Deus é maisprovável do que a não existência (tal 
como acontece nos argumentos tradicionais). Pelo contrário, está simplesmente a 
sustentar que, tendo em conta os custos e benefícios para a nossa vida, apostar e 
acreditar na existência de Deus é uma boa coisa para nós; por isso, a racionalidade 
prudencial leva-nos a acreditar em Deus. Mas porquê? 
O raciocínio de Pascal pode ser dividido em duas partes. Na primeira parte, Pascal começa 
por dizer, trivialmente, que ou Deus existe ou não existe; contudo, perante isso, não 
podemos ficar indiferentes — temos de escolher ou «apostar. Por isso, temos de olhar 
para os custos e benefícios de cada opção, apostando naquela em que há uma maior 
hipótese de sermos recompensados. Assim, segundo Pascal, perante a proposição de que 
ou Deus existe ou Deus não existe, temos duas opções: ou acreditamos que Deus existe ou 
não acreditamos que Deus existe. Mas qual é a melhor opção? 
 
Para se ver qual é a opção mais racional, do ponto de vista prudencial, Pascal começa por 
explicar que, se Deus existe e acreditamos nele, a recompensa é uma felicidade eterna, ou 
seja, um resultado positivo com valor infinito — o paraíso. Contudo, se Deus existe e não 
acreditamos nele, a punição será eterna, isto é, receberemos um resultado negativo com 
valor infinito — o inferno. Além disso, no caso de Deus não existir, pouco ou nada 
ganharemos ao acreditar em Deus (talvez possamos ganhar por exemplo, alguma paz interior 
e subjetiva que as celebrações religiosas possam proporcionar) e pouco ou nada ganharemos 
ao não acreditar em Deus (talvez possamos ganhar, por exemplo, algum tempo extra que 
não gastamos em orações ou missas). De qualquer forma, se Deus não existe, o resultado de 
acreditar em Deus será praticamente igual ao resultado de não acreditar — ou seja, será 
algum valor finito (como ganhar alguma paz interior — no caso da crença — ou ganhar 
algum tempo extra — no caso da descrença). 
 
Objeção à aposta de Pascal 
A matriz não está bem construída 
 Será que temos tudo a perder, se não formos crentes e Deus existir? 
 Como se pode saber que a recompensa tem um valor infinito positivo quando Deus 
existe e nós acreditamos nele? 
 Deus beneficia de igual forma com valor infinito positivo o crente interesseiro e o 
crente desinteressado e honesto? 
 
Talvez Deus castigue as pessoas crédulas, que acreditam nele sem provas, e 
recompense as pessoas cuidadosas, que, na ausência de provas, não acreditam. 
Deus é bondoso e não vingativo; por isso, não irá castigar quem não acreditar em 
Deus, desde que sejam boas pessoas. 
Talvez Deus tenha uma razão para recompensar todos com valor infinito positivo 
(isto é, com paraíso), mesmo aqueles que não acreditam em Deus. 
 
A fé religiosa não se pode basear num cálculo 
Uma devoção religiosa baseada num mero cálculo de custos e benefícios parece 
meramente interesseira e egoísta e, como tal, seria moralmente repugnante para a 
relação com Deus (se ele existir). 
 
A crença em Deus é voluntária 
O argumento de Pascal pressupõe que a crença em Deus está sob o controlo 
voluntário e livre da pessoa. Todavia, tal tese é bastante implausível dado que não 
temos esse controlo voluntário sobre a maioria das coisas em que acreditamos. 
Portanto, se não há controlo voluntário sobre as nossas crenças, então não se pode 
simplesmente decidir acreditar ou desacreditar em Deus tal como proposto por 
Pascal.

Continue navegando