Prévia do material em texto
Disciplina Didática Geral Coordenador da Disciplina Prof.ª Carmensita Matos Braga Passos 4ª Edição Copyright © 2015. Todos os direitos reservados desta edição ao Instituto UFC Virtual. Nenhuma parte deste material poderá ser reproduzida, transmitida e gravada por qualquer meio eletrônico, por fotocópia e outros, sem a prévia autorização, por escrito, dos autores. Créditos desta disciplina Realização Autor Prof. Paulo Meireles Barguil, Dr. Sumário Aula 01: Escola, Sociedade, Trabalho docente e Didática .................................................................... 01 Tópico 01: Breve introdução .................................................................................................................. 01 Tópico 02: Função Social da Escola: Manutenção ou Transformação da Realidade? ........................... 04 Tópico 03: Trabalho Docente: Características, Especificidades e Exigências contemporâneas ........... 08 Tópico 04: Didática: aspectos históricos, perspectivas atuais e contribuição para o trabalho docente . 14 Tópico 05: Contextualizando os desafios educacionais contemporâneos .............................................. 19 Aula 02: Educação: novos paradigmas ................................................................................................... 32 Tópico 01: Mudança de paradigmas ...................................................................................................... 32 Tópico 02: Teorias de Aprendizagem e suas Implicações para o Ensino .............................................. 48 Tópico 03: Relação Professor-Estudante: Reprodução ou Produção do Conhecimento? ..................... 58 Tópico 04: (Des)Encontros na Escola e Na Sala de Aula: Ética, Diálogo e Violência - I ..................... 73 Tópico 05: (Des)Encontros na Escola e na Sala de Aula: Ética, Diálogo e Violência - II .................... 84 Aula 03: Organização do Trabalho Docente.........................................................................................100 Tópico 01: Transdisciplinaridade e Transposição Didática..................................................................100 Tópico 02: Inovações Pedagógicas.......................................................................................................110 Tópico 03: Planejamento Educacional..................................................................................................116 Tópico 04: Plano de Ensino (Tipos e elementos)..................................................................................120 TÓPICO 01: BREVE INTRODUÇÃO Fonte [1] Quantas vezes já ouvimos (e falamos) que “professor(a) Fulano(a) não tem Didática!” para expressar o fato de que o ensino ministrado pelo(a) docente pouco (ou não) colabora com a aprendizagem dos estudantes? Afinal, o que é a Didática? É possível aprender a ter Didática? Se sim, o que é necessário? Nesta disciplina, estudaremos sobre a Didática e suas contribuições para o trabalho docente, entendido na relação escola–sociedade. Para compreender a Didática de forma crítica, convém que o professor, constantemente, se indague: • Qual é a função social da escola na atualidade? • Que saberes e competências eu preciso para ser um bom profissional na sociedade contemporânea, caracterizada pela crescente complexificação das relações? • O que é Didática? • Quais são as concepções de ensino e de aprendizagem em que acredito? • Que papeis o professor e o estudante desempenham na relação pedagógica? • Qual é a importância do planejamento e da avaliação na minha atividade profissional? • Quais são e como se articulam os elementos de um plano de atuação docente? As respostas para tais questionamentos são variadas e expressam, dentre outros, valores éticos, cognitivos e políticos. O exercício da docência pressupõe coragem tanto para formular tais perguntas (e outras!) quanto para procurar respostas, as quais são sempre parciais, tendo em vista o caráter dinâmico da vida. Durante estas aulas, as temáticas acima serão discutidas, permitindo que vocês, num processo individual e coletivo, (re)construam os saberes docentes que orientarão a sua prática profisssional. Didática, conforme o Dicionário Aurélio, é: “[Fem. substantivado de didático.] S. f. 1. A técnica de dirigir e orientar a aprendizagem; técnica de ensino. 2. O estudo desta técnica.” (FERREIRA, 1993, p. 587). DIDÁTICA GERAL AULA 01: ESCOLA, SOCIEDADE, TRABALHO DOCENTE E DIDÁTICA 1 De acordo com a definição supra, a Didática é uma técnica que pode ser estudada. Não é de estranhar, portanto, que, muitas vezes, os estudantes, quando iniciam o estudo da Didática, tenham a expectativa de apreender tal técnica, que equivaleria a receitas que, se seguidas fielmente, nos proporcionariam quitutes deliciosos. Desde o século passado, a Educação escolar tem enfrentando grandes desafios, que demandam do professor uma compreensão quanto à natureza deles, de modo que a sua atitude seja satisfatória. Postulo que um dos fatores que contribui para este quadro educacional é de natureza epistemológica, em virtude de o ensino, numa perspectiva tradicional, ter primazia sobre a aprendizagem. Acredito que, de modo geral, a preocupação do professor é muito mais com o ensino do que com a aprendizagem. As descobertas da neurociência, particularmente nas duas últimas décadas, ratificaram, de forma incisiva, as teorias de aprendizagem que enfatizam a importância da atividade do sujeito, da valorização das suas experiências e conhecimentos, os quais são ponto de partida na elaboração discente dos conceitos socializados pelo docente. Tendo em vista que, conforme a definição supra, Didática é um substantivo originado de Didático, convém conhecer, também, a definição deste. Didático, conforme o Dicionário Aurélio, é: “[Do gr. Didaktikós.] Adj. 1. Relativo ao ensino ou à instrução, ou próprio deles: problemas didáticos. 2. Próprio para instruir; destinado a instruir: livro didático. 3. Que torna o ensino eficiente: Bom professor, recorre em suas aulas a todos os expedientes didáticos. 4. Típico de quem ensina, de professor, de didata: Tem um modo didático de se exprimir.” (FERREIRA, 1993, p. 587). Os nomeados problemas de aprendizagem se constituem, muitas vezes, em problemas de ensino, em virtude de o professor acreditar que o domínio do conteúdo e o conhecimento de técnicas que propiciem uma boa transmissão são suficientes para garantir a aprendizagem – chamada de absorção – dos estudantes. A VOLTA DE UM PERSONAGEM DO SÉCULO XVI AO BRASIL (CLIQUE AQUI PARA ABRIR) A VOLTA DE UM PERSONAGEM DO SÉCULO XVI AO BRASIL (autor desconhecido) No início do século XXI, o Sr. Teixeira, um grande professor brasileiro do século XVI, voltou ao Brasil e, chegando a sua cidade, ficou abismado com o que viu: as casas eram altíssimas e cheias de janelas; as ruas eram 2 pretas e passavam uma sobre as outras com uma infinidade de máquinas andando em velocidade; o povo falava muitas palavras que o Professor Teixeira não conhecia (poluição, telefone, rádio, avião, barato, metrô, cinema, televisão...); e as roupas deixavam o professor ruborizado. Tudo havia mudado. Muito surpreso e preocupado, o professor visitou a cidade inteira e, cada vez menos, compreendia o que estava acontecendo. Resolveu, então, visitar uma igreja, mas que susto levou! O Padre rezava a missa, não em Latim, mas em Português e de costas para o altar; o órgão estava parado e um grupo de cabeludos tocava, nas guitarras, uma música estranha, ao invés do canto Gregoriano. O desespero do professor aumentava... Resolveu, ainda, viajar e visitar algumas famílias. Mas... o que significava aquilo? Depois do jantar todos se reuniram, durante muitas horas para ADORAR um aparelho que mostrava imagens e emitia sons. O Professor Teixeiraficou impressionado com tanta capacidade de concentração e de adoração!!! Ninguém falava uma palavra diante do aparelho. Tudo havia mudado completamente e o Professor Teixeira desanimava cada vez mais... Até que resolveu visitar uma escola e percebeu que tudo continuava da mesma forma que ele havia deixado: as carteiras umas atrás das outras; o professor falando, falando... e os alunos escutando, escutando, escutando... Apesar das inúmeras transformações sociais, por que algumas práticas pedagógicas, que se revelam infrutíferas para os agentes pedagógicos, ainda acontecem na escola, opondo-se à forma como se aprende e ensina fora desse ambiente? No próximo tópico, será analisada a relação entre Escola e Sociedade. LEITURA COMPLEMENTAR O que é Educação? (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.) FONTES DAS IMAGENS 1. http://media.giphy.com/media/aBPaR9WoOkXeM/giphy.gif 2. http://www.denso-wave.com/en/ Responsável: Professora Carmensita Matos Braga Passos Universidade Federal do Ceará - Instituto UFC Virtual 3 TÓPICO 02: FUNÇÃO SOCIAL DA ESCOLA: MANUTENÇÃO OU TRANSFORMAÇÃO DA REALIDADE? REFLEXÃO A sociedade brasileira se caracteriza, dentre outras coisas, por profundas e históricas desigualdades, frutos de seculares processos de exclusão e segregação. - Será que a Educação pública tem algo a ver com isso? - Será a Educação mais uma expressão do descaso do Estado com as demandas da grande maioria da população? - Poderá a Educação contribuir de alguma forma para a transformação desta situação? Conforme Luckesi (1992), a relação entre Educação e Sociedade pode ser entendida, numa perspectiva filosófica, de 3 formas distintas: i) a Educação é capaz de salvar a Sociedade dos desvios individuais e grupais que a ameaçam (redenção); ii) a Educação reproduz a Sociedade, uma vez que os determinantes econômicos, sociais e políticos impedem que práticas pedagógicas contrárias ao sistema se desenvolvam (reprodução); e iii) a Educação, por estar inserida numa sociedade, que é histórica, viabiliza um projeto social de conservação ou de mudança (possibilidade de transformação). As tendências redentora e transformadora expressam-se, respectivamente, nas concepções pedagógicas liberal (tradicional, renovada progressivista, renovada não-diretiva e tecnicista) e progressista (libertadora, libertária e crítico-social dos conteúdos). Essas tendências se diferenciam quanto ao papel da escola, os conteúdos de ensino, os métodos, o relacionamento professor-estudante, os pressupostos de aprendizagem e as manifestações na prática escolar (LIBÂNEO, 1996). PARADA OBRIGATÓRIA As Tendências Pedagógicas e a prática escolar. (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.) Acredito que a escola pública é um espaço importante que as classes trabalhadoras têm para compreender a História do Brasil. Para tanto, elas precisam ter acesso às informações e saber interpretá-las. Paulo Freire [1] formulou nos anos 60 um método de alfabetização [2], que sintetiza seu compromisso com a transformação do mundo, a qual só é possível quando as pessoas se percebem como sujeitos e não como objetos da História (Pedagogia da Libertação). DIDÁTICA GERAL AULA 01: ESCOLA, SOCIEDADE, TRABALHO DOCENTE E DIDÁTICA 4 Neste sentido, ele diferenciou a educação bancária, onde o conhecimento é decorado, fruto da transmissão acrítica dos conteúdos, “guardado” em gavetas, da educação libertadora, problematizadora, onde o conhecimento é entendido na sua dimensão histórica, seja no que se refere à sua construção, seja na sua relevância na realidade dos discentes (que sempre nos perguntam: “Professor, para que eu vou estudar isto?”), possibilitando que esses elaborem significado, sentido aos saberes socializados. Compartilho, portanto, da opinião de Freire (2009, p. 122-123): Uma das tarefas essenciais da escola, como centro de produção sistemática de conhecimento, é trabalhar criticamente a inteligibilidade das coisas e dos fatos e a sua comunicabilidade. É imprescindível, portanto, que a escola instigue constantemente a curiosidade do educando em vez de ‘amaciá-la’ ou ‘domesticá-la’. MULTIMÍDIA Filosofia de Paulo Freire I [3]. Filosofia de Paulo Freire II [4]. O professor é um profissional cujo trabalho é ajudar estudantes (crianças, adolescentes e adultos) no seu processo de crescimento pessoal, o qual contempla múltiplas dimensões: física, afetiva, cognitiva e espiritual. Considerando que os estudantes brasileiros vivem num país de seculares injustiças, é fundamental que o cotidiano escolar (conteúdos, práticas...) favoreça a compreensão discente quanto aos fatores que perpetuam tal dinâmica, bem como na instauração de renovadas relações, pautadas em valores éticos. Fonte [5] A escola pública brasileira, que atende 85% das nossas crianças e adolescentes, pode ajudar a formar que tipo de profissional, de cidadão? Entender a sociedade como resultado da ação humana e não de fenômenos 5 naturais pode aumentar a intensidade do compromisso na transformação daquela? É possível aprender a ser cidadão na escola? Edgar Morin (1921-) Fonte [6] Edgar Morin acredita que a Educação, em todos os níveis, precisa contemplar sete aspectos para atender às demandas do futuro, o que implica na redefinição de objetivos e práticas dos cotidianos escolares. A seguir, um breve resumo dos “Sete saberes necessários à Educação do futuro”, na concepção de Morin: • Conhecer é interpretar, construir significado, a partir das nossas experiências. O Homem, portanto, para conhecer precisa enfrentar o erro e a ilusão, uma vez que a realidade se modifica a todo momento: objetivamente (os acontecimentos) e subjetivamente (as nossas leituras). • Conhecer é integrar dimensões variadas (partes) para entender a (complexidade da) realidade (todo). • Resgatar a identidade humana, compreendendo-a como uma espécie organizada em sociedade que habita a Terra, a qual participa de um cosmos repleto de mistérios (indivíduo-espécie-sociedade). Ao mesmo tempo, somos homo sapiens, ludens, economicus, mitologicus ... • Compreender o outro e a si mesmo como indivíduos complexos. O individualismo é uma ameaça à espécie humana, pois afasta a pessoa dos seus semelhantes e de si, gerando sérios problemas de natureza emocional, que se revelam na qualidade dos relacionamentos. • A incerteza e o inesperado fazem parte da vida, da Ciência. A história da Humanidade é uma possibilidade e não uma determinação da natureza. • A Terra precisa ser cuidada para que possamos nela continuar. A ecologia, os conflitos religiosos e políticos, as demandas (crises) econômicas e a escassez de alimento e de água revelam que precisamos zelar pela perpetuação da nossa espécie. • A antropo-ética enfatiza que o Homem tem três aspectos: individual, social e genético. Ela só pode se manifestar na democracia, ao permitir que os indivíduos assumam, na medida do possível, a sua responsabilidade social. As ONG, que funcionam sem se prender à religião e à política, permitem que a Humanidade desenvolva uma ética atenta aos imensos desafios contemporâneos. MULTIMÍDIA Os sete saberes – Edgar Morin. [7] Defendo, com vigor, que a Escola tem um importante papel na difusão e na vivência de novos valores humanos. Ela é, portanto, um espaço de formação, entendida não como um local que adapta, modela as pessoas, de acordo com interesses estranhos a elas, mas que possibilita que cada artesão- sujeito descubra a configuração, a composição que deseja e assuma a responsabilidade pela sua materialização. Finalizo este tópico, com mais uma contribuição do maior educador brasileiro: 6 "[...] se a educação não pode tudo, alguma coisa fundamental a educação pode. Se a educação não é a chave das transformações sociais, não é também simplesmente reprodutora da ideologia dominante. O que quero dizer é que a educação nemé uma força imbatível a serviço da transformação da sociedade, porque assim eu queira, nem tampouco é a perpetuação do status quo porque o dominante o decrete.". (FREIRE, 2009, p. 112) O compromisso político demanda uma satisfatória formação técnica, o que nos remete à seguinte indagação: “Quais são as competências que o professor precisa ter?”. É o que será abordado na próxima seção. LEITURA COMPLEMENTAR Função Social da Escola (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.). OLHANDO DE PERTO Ensinar, aprender: leitura do mundo, leitura da palavra (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.). Os sete saberes necessários à Educação do futuro (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.). FONTES DAS IMAGENS 1. http://pt.wikipedia.org/wiki/Paulo_Freire 2. http://pt.wikipedia.org/wiki/M%C3%A9todo_Paulo_Freire 3. http://www.youtube.com/watch?v=c0qEP5cIp_o 4. http://www.youtube.com/watch?v=qxnNKNPeWFM 5. http://blogorlandeli.zip.net/images/charge24x11x07.jpg 6. http://4.bp.blogspot.com/_NGfADw- 06_Q/Rx_RtOhqcTI/AAAAAAAAAHc/f7lNjvtLrVY/s400/falamestre.jpg 7. http://www.youtube.com/watch?v=k0eeUWculzk 8. http://www.denso-wave.com/en/ Responsável: Professora Carmensita Matos Braga Passos Universidade Federal do Ceará - Instituto UFC Virtual 7 TÓPICO 03: TRABALHO DOCENTE: CARACTERÍSTICAS, ESPECIFICIDADES E EXIGÊNCIAS CONTEMPORÂNEAS REFLEXÃO ◾ O que significa ser professor(a)? ◾ Quais são as características desta profissão? ◾ Considerando as novas tecnologias de informação e comunicação, que facilitam o acesso à informação, o professor ainda é necessário no processo de aprendizagem dos estudantes? ◾ Os cursos de formação docente têm atendido aos novos desafios? ◾ Os professores têm conseguido responder satisfatoriamente a tais mudanças? Não existe professor sem estudante e conhecimento. O trabalho docente, portanto, demanda a presença destes dois componentes (esta temática será abordada, sob diversos aspectos, reiteradas vezes durante estas aulas). O ensino é “[...] uma prática social concreta, dinâmica, multidimensional, interativa, sempre inédita e imprevisível. É um processo que sofre influências de aspectos econômicos, psicológicos, técnicos, culturais, éticos, políticos, institucionais, afetivos, estéticos.” (PASSOS, 2006b, p. 01). Quais são as características do trabalho docente? CARACTERÍSTICAS DO TRABALHO DOCENTE Podemos destacar como uma primeira característica do trabalho docente o fato de ser um trabalho interativo. O ensino dirige-se a seres humanos que são ao mesmo tempo seres individuais e sociais. Segundo Tardif (2002), o objeto do trabalho docente são os seres humanos que possuem características peculiares. O(A) professor(a) trabalha com sujeitos que são individuais e heterogêneos, têm diferentes histórias, ritmos, interesses necessidades e afetividades. Isso torna as situações de ensino complexas, únicas, imprevisíveis e incabíveis em generalizações ou esquemas pré-definidos de ação. Além de individual o objeto do trabalho docente é também social. Sua origem de classe e seu gênero o expõem a diferentes influências e experiências que repercutem em sala da aula provocando diferentes reações e expectativas no(a) professor(a) e alunos(as). Neste sentido, Tardif (2002, p. 130) nos alerta que “o objeto do trabalho docente escapa constantemente ao controle do trabalhador, ou seja, do professor.” Outra característica destacada pelo autor é a dimensão afetiva presente no ensino que pode funcionar como elemento facilitador ou bloqueador do processo de ensino-aprendizagem. Uma boa parte do trabalho docente é de cunho afetivo, emocional. Baseia-se em emoções, em afetos, na capacidade não somente de pensar nos alunos, mas igualmente de perceber e sentir suas emoções, seus temores, suas alegrias, seus próprios bloqueios afetivos. (TARDIF, 2002, p. 130) DIDÁTICA GERAL AULA 01: ESCOLA, SOCIEDADE, TRABALHO DOCENTE E DIDÁTICA 8 Segundo o autor citado, pelas peculiaridades do objeto de trabalho docente a prática pedagógica dos(as) professores(as) consiste em gerenciar relações sociais, envolve tensões, dilemas, negociações e estratégias de interação. Por exemplo, o professor tem que trabalhar com grupos, mas também tem de se dedicar aos indivíduos; deve dar sua matéria, mas de acordo com os alunos, que vão assimilá-la de maneira muito diferente; deve agradar aos alunos mas sem que isso se transforme em favoritismo; deve motivá-los, sem paparicá-los; deve avaliá-los, sem excluí-los, etc. Ensinar é, portanto, fazer escolhas constantemente em plena interação com os alunos. Ora, essas escolhas dependem da experiência dos professores, de seus conhecimentos, convicções e crenças, de seu compromisso com o que fazem, de suas representações a respeito dos alunos e, evidentemente, dos próprios alunos. (TARDIF, 2002, p. 132). Por ser um trabalho interativo o ensino exige um investimento pessoal do(a) professor(a) para garantir o envolvimento do(a) aluno(a) no processo, para despertar seu interesse e participação e para evitar desvios que possam prejudicar o trabalho. É por esse motivo que Tardif (2002) afirma que a personalidade do(a) professor(a) é um componente de seu trabalho, o que ele denomina de trabalho investido, ou seja, no desempenho de seu trabalho o(a) professor(a) empenha e investe o que ele (a) é como pessoa. Aquilo que nos parece ser a característica do trabalho investido ou vivido é a integração ou absorção da personalidade do trabalhador no processo de trabalho quotidiano enquanto elemento central que contribui para a realização desse processo. (...) Nesse tipo de atividade, a personalidade do trabalhador, suas emoções, sua afetividade fazem parte integrante do processo de trabalho: a própria pessoa, com suas qualidades, seus defeitos, sua sensibilidade, em suma, tudo o que ela é, torna-se, de certa maneira, um instrumento de trabalho. Nesse sentido ela é um componente tecnológico das profissões de interação. Essa tecnologia emocional é representada por posturas físicas, por maneiras de estar com com os alunos. (TARDIF, 2002, p. 142). O autor aponta ainda a dimensão ética do trabalho docente que envolve questões como relações de poder, juízos de valor, escolhas, interesses, direitos e privilégios. A primeira questão ética que o autor levanta diz respeito a um aspecto já referido anteriormente, ao fato que trabalhando com grupos o(a) professor(a) não pode deixar de atingir os indivíduos. Segundo Tardif (2002, p. 146), esse problema nunca é resolvido de maneira satisfatória do ponto de vista ético, pois “os professores nunca podem atender às necessidades singulares de todos os alunos assumindo padrões gerais de uma organização de massa”. Cada professor(a) adota no seu dia a dia estratégias próprias de atendimento individualizado, de distribuição da atenção e acompanhamento de seus/suas alunos(as), estando sempre atento(a) a essa tensão entre o individual e o coletivo. Outra questão ética apresentada pelo autor refere-se a forma como o (a) professor torna o conhecimento a ser trabalhado acessível ao(à) aluno 9 (a). O(A) professor(a) tem um domínio de conhecimentos diferente dos(as) alunos(as), a forma como interage com eles(as) ao trabalhar esse conhecimento envolve um problema ético para o qual nem sempre dispensamos a devida atenção. As características apresentadas permitem perceber o grau de complexidade que envolve o desenvolvimento do trabalho docente, e compreender porque não se encaixa em saberes estáveis, sistemáticos e instrumentais, automaticamente aplicados às situações de ensino-aprendizagem. Extraído de Passos (2006b). Quais são os saberes que o professor precisa para desempenhar de forma satisfatória seu labor? Fonte [1] Diversos pesquisadores têm investigado sobre este assunto e enfatizando a sua relevância “[...] para a formação, atuaçãoe desenvolvimento dos professores.” (CUNHA, 2009). Na sua prática profissional (planejamento, implementação e avaliação), o professor mobiliza diferentes saberes visando à melhoria da aprendizagem discente. Uma síntese das categorias dos saberes docentes formuladas por alguns dos estudiosos mais conceituados sobre esse tema é apresentada no Quadro abaixo. CATEGORIZAÇÃO DOS “SABERES DOCENTES OU DOS PROFESSORES” Tardif, Lessard e Lahaye (1991) Pimenta (1999) Gauthier et al (1998) Saviani (1996) das disciplinas e curriculares do conhecimento disciplinares e curriculares específico e didático- curricular da formação profissional pedagógicos das Ciências da Educação, da tradição pedagógica e da ação pedagógica pedagógico, crítico- contextual e atitudinal. da experiência da experiência experienciais Fonte: Adaptado de Cunha (2009). A formulação de Pimenta (1999) congrega em três amplas categorias os saberes docentes: do conhecimento, pedagógicos e da experiência. A primeira contempla o saber disciplinar (conteúdo a ser ensinado) e o saber curricular (seleção e organização do conteúdo). A segunda, que vislumbra os processos de ensinar e de aprender, contempla as Teorias da Educação, as metodologias, o conhecimento de recursos didáticos (analógicos e digitais) e a habilidade para realizar a transposição didática. A terceira contempla as 10 representações queque orientam (princípios, crenças...) a prática docente, as quais estão em permanente transformação, pois que se alimentam da realidade, enquanto inspiração e espaço de validação. Por entender que o saber da experiência refere-se, muitas vezes, aos saberes do conhecimento e pedagógico, e que a dimensão subjetiva do pesquisador é ignorada, Barguil (2016) propõe a substituição do saber da experiência pelo saber existencial, que se refere aos sentimentos, valores, crenças e ideais docentes, os quais o (i)mobilizam na vivência dos demais saberes. Esse autor defende que os saberes docentes são: conteudístico, pedagógico e existencial. A transformação da sociedade na contemporaneidade implica na redefinição da Educação, da escola e do trabalho docente. Libâneo (1998) defende a importância do professor para auxiliar o estudante a aprofundar o seu significado da cultura e da ciência. Considerando este contexto, ele apresenta as seguintes novas atitudes docentes: 1) assumir o ensino como mediação: aprendizagem ativa do aluno com a ajuda pedagógica do professor; 2) modificar a ideia de uma escola e de uma prática pluridisciplinar para uma escola e uma prática interdisciplinar; 3) conhecer estratégias do ensinar a pensar, ensinar a aprender; 4) persistir no empenho de auxiliar os alunos a buscarem uma perspectiva crítica dos conteúdos, a se habituarem a apreender as realidades enfocadas nos conteúdos escolares de forma crítico-reflexiva; 5) assumir o trabalho de sala de aula como um processo comunicacional e desenvolver capacidade comunicativa; 6) reconhecer o impacto das novas tecnologias da comunicação e informação na sala de aula (televisão, vídeo, games, computador, internet, CD-ROM, etc.); 7) atender à diversidade cultural e respeitar as diferenças no contexto da escola e da sala de aula; 8) investir na atualização científica, técnica e cultural, como ingredientes do processo de formação continuada; 9) integrar no exercício da docência a dimensão afetiva; 10) desenvolver comportamento ético e saber orientar os alunos em valores e atitudes em relação à vida, ao ambiente, às relações humanas, a si próprios (LIBÂNEO, 1998, p. 28-48). Zabalza (2003) apresenta as seguintes competências docentes, as quais, no seu entendimento, são imprescindíveis para quem quer atuar na escola do futuro: empática, comunicativa, cognitiva, didático-disciplinar, institucional, criativa e cidadã. É possível alguém atender a tudo isto? 11 Diante de tantas adversidades (salário baixo, excesso de trabalho, indisciplina e violência na sala, pressão dos superiores na hierarquia, desgaste físico e falta de valorização) e exigências, o docente brasileiro está, cada vez mais, doente. Este drama tem recebido a atenção de profissionais da educação e da saúde, pois interfere diretamente na qualidade do trabalho docente e da sua vida pessoal. É importante compreender a natureza deste problema, a qual tem gerado um alto custo social, seja porque, muitas vezes, faltam profissionais habilitados na sala de aula, seja porque o investimento do poder público na formação docente é desperdiçado. As políticas públicas precisam, inspiradas nos diagnósticos emanados das pesquisas sobre essa temática, atuar de forma vigorosa na reversão do cenário acima relatado, sob pena de continuarmos a assistir a diminuição da qualidade de vida (pessoal e profissional) do professor. PARADA OBRIGATÓRIA O Estresse docente (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.). A identidade docente, pelo exposto ao longo desta seção, contempla diversos saberes, os quais se articulam durante a sua vida profissional, objetivando atender as demandas sociais, que se reconfiguram em múltiplos espaços-tempos. É necessária, portanto, uma formação continuada que possibilite ao professor, a partir das suas necessidades, diagnosticadas na práxis, ampliar os seus saberes. MULTIMÍDIA Trabalho docente [2]. OLHANDO DE PERTO Desafios e possibilidades ao trabalho docente e à sua relação com a saúde (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.). Educação, cultura e desporto: concepção e desafios para o século XXI (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.). 12 Experiência e competência no ensino (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.). Formação docente como estratégia de superação do precarizado trabalho docente (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.). Formação de professores na cultura do desempenho (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.). Globalização e Educação: idéias para um debate (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.). Perspectivas atuais na Educação (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.). Representações da identidade docente: uma contribuição para a formulação de políticas (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.). Saberes docentes ou saberes dos professores? (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.) Significado e sentido do trabalho docente (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.). Trabalho docente: características e especificidades (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.). FONTES DAS IMAGENS 1. http://3.bp.blogspot.com/_LSxjzZc- hD0/SwHt3rLJfbI/AAAAAAAAALs/1G6pDHQ5D0A/s320/imagem01_eja.j pg 2. http://www.youtube.com/watch?v=bERxLjM7G0I) 3. http://www.denso-wave.com/en/ Responsável: Professora Carmensita Matos Braga Passos Universidade Federal do Ceará - Instituto UFC Virtual 13 TÓPICO 04: DIDÁTICA: ASPECTOS HISTÓRICOS, PERSPECTIVAS ATUAIS E CONTRIBUIÇÃO PARA O TRABALHO DOCENTE REFLEXÃO • Qual é a origem da Didática? • Qual é a História do desenvolvimento da Didática no Brasil? A Didática, enquanto área de conhecimento dos cursos de formação de professores, caracteriza-se pela mudança dos seus objetos e objetivos. Em 1657, Iohannis Amos Comenius [1] (1592-1670) – João Amos Comênio, em Português – publicou, em latim, Didactica Magna (Didática Magna – Tratado da Arte universal de ensinar tudo a todos), tida como a primeira obra no mundo ocidental voltada aos processos de ensinar e de aprender, motivo pelo qual ele é considerado o pai da Didática Moderna. A proposta educacional de Comênio – ensinar tudo a todos – afrontava a concepção escolástica católica, que era voltada à elite e com currículo restrito, permeado de conteúdos abstratos. Comênio acreditava no poder da Educaçãopara aproximar o Homem de Deus, tornando-o bom cristão: sábio (erudição), crente (religião) e generoso (virtude). No entendimento desse pensador, o cotidiano escolar deveria se inspirar no ritmo da natureza, contemplando todas as áreas do conhecimento e valorizando as situações da vida, além de atender às necessidades e aos interesses de professor e estudantes. Por acreditar que tudo o que se deveria saber necessitaria ser ensinado, Comênio defendia que o professor durante o ensino deveria: i) ser claro e direto; ii) utilizar aplicações práticas para facilitar o processo de aprendizagem; iii) enfatizar as origens desse conteúdo; iv) explicar, inicialmente, os princípios gerais; e v) respeitar o tempo adequado para fazê-lo. A Didática Magna contem as características principais da escola moderna: o entendimento da infância como momento único; a influência da relação família-escola no desenvolvimento do estudante; a necessidade de uma metodologia de ensino (tendo ele proposto a instrução simultânea); e o educador como uma pessoa preparada para tal ofício. INTRODUÇÃO DA DIDÁTICA MAGNA, DE COMÊNIO (CLIQUE AQUI PARA ABRIR) DIDÁTICA GERAL AULA 01: ESCOLA, SOCIEDADE, TRABALHO DOCENTE E DIDÁTICA 14 Tratado da Arte Universal de Ensinar Tudo a Todos ou Processo seguro e excelente de instituir, em todas as comunidades de qualquer Reino cristão, cidades e aldeias, escolas tais que toda a juventude de um e de outro sexo, sem excetuar ninguém em siveiarte alguma, possa ser formada nos estudos, educada nos bons costumes, impregnada de piedade, e, desta maneira, possa ser, nos anos da puberdade, instruída em tudo o que diz respeito à vida presente e à futura, com economia de tempo e de fadiga, com agrado e com solidez. Onde os fundamentos de todas as coisas que se aconselham são tirados da própria natureza das coisas; a sua verdade é demonstrada com exemplos paralelos das artes mecânicas; o curso dos estudos é distribuído por anos, meses, dias e horas; e, enfim, é indicado um caminho fácil e seguro de pôr estas coisas em prática com bom resultado. A proa e a popa da nossa Didática será investigar e descobrir o método segundo o qual os professores ensinem menos e os estudantes aprendam mais; nas escolas, haja menos barulho, menos enfado, menos trabalho inútil, e, ao contrário, haja mais recolhimento, mais atrativo e mais sólido progresso; na Cristandade, haja menos trevas, menos confusão, menos dissídios, e mais luz, mais ordem, mais paz e mais tranqüilidade. Fonte: Comenius (2016). A cronologia a seguir apresentada não é consenso entre os estudiosos, mas permite compreender a trajetória percorrida na estruturação da Didática no Brasil. Destacam-se, na versão escolhida, quatro momentos: PRIMEIRO MOMENTO Começa com a sua implantação em 1939, enquanto curso e disciplina, e termina no começo dos anos 50. Caracteriza-se, inicialmente, pela dificuldade de se definir e delimitar seu objeto e conteúdo e pela influência da Escola Nova, que enfatizou conteúdos técnicos e metodológicos. SEGUNDO MOMENTO Da década de 50 até meados dos anos 70. A Didática aprofunda a dimensão técnica-metodológica, priorizando o caráter normativo, prescritivo, sob o manto da neutralidade científica, e afastando-se da reflexão quanto aos determinantes e objetivos sócio-políticos da Educação. Oliveira e André (1997, p. 8) caracterizam este momento como “(...) o da construção da Didática na perspectiva do liberalismo”. TERCEIRO MOMENTO Situado entre a segunda metade da década 1970 e a primeira metade da década seguinte, que tem como marco fundante o I Seminário “A Didática em Questão” (1982). Surgem críticas e denúncias à Didática Tecnicista – que mascarava o caráter reprodutivista da escola – redundando em movimentos antagônicos: negação e reconstrução da área. No que se refere à última perspectiva, diversos encontros nacionais 15 propiciaram o aporte teórico e prático necessário para redefini-la, ao promover o intercâmbio de pesquisas e experiências pedagógicas de intelectuais e professores. QUARTO MOMENTO Inicia-se na segunda metade da década 1980 e chega ate à atualidade. Expressa o esforço dos especialistas da área para articular o saber didático às questões metodológicas, epistemológicas e ideológicas, compreendendo o ensino como prática social concreta. Neste sentido, o ensino precisa ser analisado nas suas múltiplas dimensões, evitando os reducionismos das fases anteriores, o que significa dizer que a Educação deve ser contextualizada nos seus aspectos sociais, históricos, políticos e culturais, levando à compreensão dos pressupostos que inspiram as práticas pedagógicas e articulam teoria e prática. Este breve relato permite perceber os avanços que ocorreram na área no que se refere às críticas e aos esforços de superá-las, que se expressa na reconfiguração da área, atenta às exigências e aos desafios contemporâneos. A DIDÁTICA NO CONTEXTO ATUAL (CLIQUE AQUI PARA ABRIR) [...] a Didática, como disciplina dos cursos de formação de professores, propõe-se a contribuir com um ensino comprometido com sucesso escolar, não pode se restringir a modelos de ação pedagógica sem interação com a realidade escolar concreta. O conhecimento crítico dessa realidade deve ser parte integrante da disciplina, mantendo um constante diálogo com a fundamentação teórica. Esta, concebida como condição para uma leitura crítica da realidade concreta das escolas, da prática pedagógica efetivamente vivenciada e para a construção de alternativas de transformação da situação pedagógica vigente. Nesse sentido, Caldeira e Azzi (1997) falam de duas dimensões da Didática. A explicativa através da qual se busca a compreensão da realidade pedagógica, e a projetiva através da qual são propostas novas formas de ação didática. Para agir conseqüentemente, o professor precisa compreender a prática pedagógica, suas relações intrínsecas e extrínsecas, contextualizando-a. Mas a compreensão e explicação da prática pedagógica escolar não se esgotam em si mesmas, elas oferecem os elementos capazes de subsidiar a transformação e superar a prática vigente. O processo de compreensão e explicação da ação pedagógica não se dá espontaneamente, tendo como referencial apenas a prática, que revela, mas também oculta, os elementos que levam à superação de uma compreensão superficial. Nesse ponto, é essencial o papel da Didática no sentido de propiciar a reflexão e problematização da prática e de oferecer os elementos conceituais e a fundamentação teórica que permitem a análise da prática - captando seus pressupostos teóricos, sua dinâmica, seus determinantes, suas possibilidades e limites, sua inserção no panorama sócio-político, cultural e econômico mais abrangente. O 16 confronto teoria e prática possibilita também a projeção de uma ação pedagógica diferenciada que supere a existente. As bases da revisão da Didática são sistematizadas pela perspectiva denominada Didática Fundamental, que, na concepção de Candau (1989, p. 21), tem as seguintes implicações: ◾ A perspectiva fundamental da Didática assume a multidimensionalidade do processo de ensino-aprendizagem e coloca a articulação das três dimensões, técnica, humana e política, no centro configurador de sua temática. ◾ Procura partir da análise da pratica pedagógica concreta e de seus determinantes. ◾ Contextualiza a prática pedagógica e procura repensar as dimensões técnica e humana, sempre “situando-as”. ◾ Analisa as diferentes metodologias explicitando seus pressupostos, o contexto em que foram geradas, a visão de homem, de sociedade, de conhecimento e de educação que veiculam. ◾ Elabora a reflexão didática a partir da análise e reflexão sobre experiências concretas, procurando trabalhar continuamente a relação teoria-prática. Esses princípios nortearam o desenvolvimento da revisão crítica da Didática, através de estudos,pesquisas, debates e propostas para o ensino da disciplina, explicitados em encontros da área. Assim entendida, a Didática pretende dar sua contribuição para a formação do professor trabalhando uma visão de ensino contextualizado, perpassado pelas dimensões política, econômica, cultural, técnica, psicológica e ética, como uma prática social, portanto imersa num contexto social mais amplo e em interação com outras práticas. À Didática cabe então, além da compreensão crítica da realidade, contribuir para capacitar o professor com conhecimentos e habilidades para o desempenho consciente de sua prática docente, colaborando para a construção de uma sociedade mais justa e democrática. Extraído de Passos (2006a). A Educação é um fenômeno social que pode ser vivenciado com graus diferentes de formalidade: formal, não-formal e informal (a disciplina Estrutura, Política e Gestão Educacional aborda esse assunto). As pessoas de uma sociedade são formadas em processos educativos. A Pedagogia é a Ciência que busca descrever e compreender a Educação, as teorias e as práticas educativas, com o intuito de melhorá-las. A Didática, por sua vez, é uma disciplina pedagógica voltada ao processo de ensino, o que implica investigar, também, o processo de aprendizagem. A ação educativa contempla aspectos cognitivos, afetivos, éticos, políticos, dentre outros. No próximo tópico, estudaremos sobre os desafios educacionais contemporâneos. LEITURA COMPLEMENTAR Didactica Magna (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.). 17 LEITURA COMPLEMENTAR O habitus professoral: o objeto dos estudos sobre o ato de ensinar na sala de aula. (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.) A Trajetória Histórica da Didática (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.). FONTES DAS IMAGENS 1. http://pt.wikipedia.org/wiki/Comenius 2. http://www.denso-wave.com/en/ Responsável: Professora Carmensita Matos Braga Passos Universidade Federal do Ceará - Instituto UFC Virtual 18 TÓPICO 05: CONTEXTUALIZANDO OS DESAFIOS EDUCACIONAIS CONTEMPORÂNEOS REFLEXÃO É consenso que, na atualidade, as escolas, não somente no Brasil, estão vivenciando grandes desafios, nomeados por alguns de crise. Tal cenário nos remete a algumas indagações: ◾ Como ele pode ser interpretado? ◾ Ele tem alguma relação com o que está acontecendo na sociedade? ◾ Que desequilíbrio é esse, que perpassa a vida em quase todos os lugares do mundo? ◾ As escolas podem fazer algo diante dessa situação? Neste tópico, investigaremos os desafios educacionais contemporâneos, buscando identificar os fatores que contribuem para essa ocorrência, ao mesmo tempo em que vislumbramos alternativas para modificá-lo. DESAFIOS EDUCACIONAIS CONTEMPORÂNEOS Hall (1973, p. 289) nomeia de crise os atuais desafios educacionais e afirma que ela tem três facetas – racial, urbana e educativa – as quais, por estarem intimamente relacionadas, devem ser consideradas conjuntamente. Esse quadro, segundo ele, é causado pelo excessivo desenvolvimento do Homem, que produziu a dimensão cultural, sendo que a maior parte dela lhe permanece oculta. Preocupado, o autor indaga por quanto tempo pode o Homem se permitir ignorar deliberadamente esse aspecto da sua vida. Na mesma perspectiva, é a opinião de Najmanovich (2001, p. 66): A crise atual não se caracteriza só pela emergência de novos paradigmas na ciência ou pela revolução tecnológica permanente. As mudanças em nossa forma de conceber a relação humano-mundo são o “sistema nervoso central” das transformações deste final de modernidade. Alinhando-me a esses pensadores, acredito ser indispensável investigar os intricados vínculos que o Homem estabelece com o meio-ambiente, ou seja, entender como ele produz cultura, bem como as influências dela na sua vida. Creio que essa perspectiva mais ampla é necessária para que se compreenda a dinâmica ocorrente no espaço escolar. Como pode ser entendida a propalada crise na Educação? Uma interessante linha de investigação é se indagar sobre o funcionamento das escolas. Para tanto, exponho duas descrições: DIDÁTICA GERAL AULA 01: ESCOLA, SOCIEDADE, TRABALHO DOCENTE E DIDÁTICA 19 Como são e tem sido as escolas? Que nos diz a memória? A imagem: uma casa, várias salas, crianças separadas em grupos chamadas “turmas”. Nas salas, os professores ensinam saberes. Toca uma campainha. Terminou o tempo da aula. Os professores saem. Outros entram. Começa uma nova aula. Novos saberes são ensinados. O que os professores estão fazendo? Estão cumprindo um “programa”. “Programas” é um cardápio de saberes organizados em seqüência lógica, estabelecido por uma autoridade superior invisível, que nunca está com as crianças. Os saberes do cardápio “programa” não são “respostas” às perguntas que as crianças fazem. Por isso as crianças não entendem por que têm de aprender o que lhes está sendo ensinado. (ALVES, 2003, p. 51-52). No silêncio da sala de aula ecoa a voz do mestre. Alunos calados escutam e copiam suas palavras. Pausadamente, o professor dita a sua versão da matéria com o estatuto de verdade absoluta. Alguns dos alunos permanecem com os olhos fixos no ambiente da sala, mas o pensamento viaja. Estão espacialmente presentes, mas mentalmente ausentes, distantes, embalados pelo som constante e monotônico da preleção. A hora e vez desses alunos nos espaços pedagógicos são restritas e definidas. Reproduzir nos exercícios, trabalhos e provas o pensamento do professor que “ensina”. Para esquecê-los depois. (KENSKI, 2000, p. 136). Inspirados nestes alertas-denúncias, que sintetizam bem o que (não) acontece na escola, os educadores não podemos nos limitar a perpetuar rituais castradores e limitantes das potencialidades humanas e a lamentar as dificuldades que permeiam a nossa atividade laboral. Precisamos avançar no desvelamento dos valores que orientam nosso exercício profissional, com o fito de identificar aquelas que, ao contrário do pensamento anterior, atrapalham a instauração de uma nova dinâmica social, bem como o desenvolvimento da subjetividade dos agentes pedagógicos envolvidos. A Educação, independentemente da forma e do conteúdo, tem consequências para todos os que dela participam, uma vez que habilidades diversas são socializadas, seja numa perspectiva de alienação, negação do sujeito, seja numa perspectiva que possibilite a constituição do indivíduo (ou, ainda, em ambas!), motivo pelo qual ela jamais é neutra, mas tem sempre uma conotação política, num sentido mais amplo. Necessário, portanto, que se alargue a compreensão dos laços entre escola e sociedade, pois esses são por demais estreitos, havendo entre elas intenso e rico vínculo de influências e contribuições de toda ordem. A escola, portanto, não está a salvo das pressões e demandas sociais, de nada valendo, nesse sentido, os seus muros. Da mesma forma, não é ela uma vítima indefesa, que nada pode fazer diante dos acontecimentos, embora seu poder de transformação não seja tão grande quanto muitas vezes alguns enunciam... Os agentes pedagógicos precisam descobrir e potencializar ao máximo o poder que as experiências educacionais na escola podem ter na complexa trama social. 20 Diante dessa falta de sentido, que atinge tanto o corpo discente quanto o docente, o desafio atual é vislumbrar e propor opções para um diálogo entre as diferentes manifestações culturais, principalmente as dos estudantes, que costumam ser ignoradas pela escola. Para tanto, é necessário que o Homem investigue a sua relação com a natureza, a qual é mais do que o seu lar; é o seu útero. Quanto mais o Homem se separa dela, mais ele pode se tornar consciente de si, sabendo-se um ser histórico, temporal (FONTANELLA, 1995, p. 15). Porém, ele precisa voltar, ininterruptamente, seu olhar para sua criadora, sob pena de desperdiçar a chance de aprofundara sua capacidade de compreensão, pois somente quando ele se percebe separado da natureza, ele pode buscar a ligação, a relação, a integração com ela, a qual acontece, coetaneamente, em dois níveis: dentro e fora de si. Até quando o Homem continuará a fracionar a sua existência em categorias estanques? "O homem se divide e divide o mais. Aformação da subjetividade é empurrada para o interior. E esta é a questão que nos preocupa: a visão dualista do homem; mais: a vivência da dualidade" (FONTANELLA, 1995, p. 08). Urge, pois, a busca de novos fundamentos propiciadores de uma Educação que valorize o estudante, os seus conhecimentos, a sua história, os seus sonhos, a sua avaliação sobre o seu desempenho no cotidiano, não mais como realidades desunidas e quase sem relação, mas como elementos de um todo. Para tanto, é indispensável considerar a dimensão curricular, porquanto o cotidiano escolar (onde o prédio é um aspecto material da maior importância) é consideravelmente influenciado por ela. A recuperação da subjetividade e a valorização de uma visão integral do Homem são necessárias para que a aprendizagem possa acontecer: [...] o único aprendizado que influencia significativamente o comportamento é o aprendizado autodescoberto, auto-apropriado. [...] Um conhecimento autodescoberto, essa verdade que foi pessoalmente apropriada e assimilada à experiência de um modo pessoal, não pode se comunicar diretamente a outra pessoa. (ROGERS, 1991, p. 254). Da mesma opinião é Illich (1977, p. 76): Na realidade, a aprendizagem é a atividade humana menos necessitada de manipulação por outros. Sua maior parte não é resultado de instrução. É, antes, resultado de participação aberta em situações significativas. A maioria das pessoas aprende melhor estando «por dentro»; mas a escola faz com que identifiquemos nosso crescimento pessoal e cognoscitivo com o refinado planejamento e manipulação. 21 A partir da certeza de que “O acontecer é global e simultâneo. Ao passo que o verbal é sucessivo e linear...” (GAIARSA, s/d, p. 13), defendo a necessidade de se buscar, com fé e amor, uma Educação que valorize não mais somente a inteligência linguística e/ou lógico-matemática. Compreendendo que o Homem é um organismo extremamente complexo e misterioso, a escola precisa possibilitá-lo desenvolver também (e principalmente, digo, diante do excessivo racionalismo) as demais inteligências – intrapessoal, interpessoal, musical, espacial, corporal- cinestésica, naturalista e existencial (GARDNER, 2005, p. 39-52) – afinal a aprendizagem acontece de modo mais consistente quando contempla as diversas maneiras como a pessoa apreende a realidade. Fonte [1] Uma das relevantes contribuições da Teoria das Inteligências Múltiplas, de Howard Gardner (1943-), não é a descoberta de inteligências com a ampliação das classificações das pessoas, mas a convicção de que o Homem não pode ser reduzido a um rótulo, a uma habilidade, a uma competência. Infelizmente, a substituição de paradigmas, de procedimentos, requer mais do que a mera leitura de novos postulados, uma vez que tais construtos passam por um crivo valorativo, cujas raízes estão incrustadas no íntimo do ser, alimentando-se de emoções e crenças. Há duas concepções distintas do papel do erro na elaboração do conhecimento: na Ciência, é uma etapa do processo do conhecimento, na escola, por sua vez, é uma erva daninha, que precisa sempre ser erradicada, por atrapalhar o sucesso das atividades. Tal antagonismo explica em boa medida a forma diferenciada como o cientista, o educador e o estudante valoram o aprender. Para o primeiro, a tarefa de conhecer é permeada de mistérios, ilusões, esperanças, explicações parciais (BACHELARD, 1985, p. 147); para o segundo, responsabilidade a ser desenvolvida sem espaços para equívocos e/ou dúvidas, sob pena de ser massacrado pelos estudantes ou pelo mito da 22 infalibilidade, da onisciência, numa rotina, por vezes, estressante; para o terceiro, enfim, é uma etapa obrigatória que precisa ser ultrapassada, mesmo que desprovida de significado para si, evitando ser ridiculizado pelo professor e/ou por seus colegas. Considerando o caráter complexo e dinâmico da formação do conhecimento (MACHADO, 1995, p. 296), torna-se imperativa a busca de práticas educacionais – entendidas sempre para além das que acontecem na escola – baseadas no diálogo e na valorização da curiosidade, que recobrem a subjetividade dos autores dos processos de ensino e de aprendizagem, propiciando o crescimento e respeito mútuos, além de favorecer o desenvolvimento da noção de totalidade. A compreensão do caráter histórico do conhecimento permite que o sujeito estabeleça com o primeiro uma relação menos tensa e angustiante, pois ele está cônscio de que a sua missão é interminável: sempre haverá algo a ser descoberto, refeito e ampliado (BARGUIL, 2000), fazendo com que o foco da sua atenção saia do produto, que ele sabe não ter final, e se volte ao processo, permitindo-se desfrutar do privilégio que é aprender. Nesse sentido, a Educação deixa de ter um caráter meramente decorativo (no duplo sentido) e passa a contribuir na investigação e exploração do universo, bem como na constituição da subjetividade da pessoa. A Pedagogia é a reunião de vários campos de conhecimento – Filosofia, Sociologia, História, Psicologia – dentre outros. Cada um deles, de acordo com suas especificidades, contribui para a melhoria constante daquela. A força de cada uma dessas disciplinas é aumentada quando se cria, ininterruptamente, elos, conexões, vínculos entre estas. O distanciamento entre o mundo do estudante e as práticas escolares explica, em grande parte, a apatia, o desânimo e a tristeza de aprender característicos das salas de aula, problemas que não são privilégio do Brasil. O que pode ser feito para que discentes e docentes proclamem, não somente com palavras, a beleza e o prazer de aprender (ALVES, 1994)? Nesse contexto de dramaticidade, a discussão sobre o currículo se revela importante e urgente. É fundamental que as propostas pedagógicas valorizem a participação do estudante, de acordo com as suas possibilidades, em todas as etapas do processo educativo, desde a escolha dos conteúdos a serem estudados – que tenham, sempre que possível, relação com a sua vida – passando pela multiplicidade de recursos, até a forma como a avaliação se efetivará, objetivando responder àquela conhecida, mas sempre pertinente, indagação dos estudantes sobre a importância de determinados conteúdos para a sua vida. A meta educacional da Teoria de Piaget, segundo Kamii (1992), é o desenvolvimento da autonomia (moral e intelectual), em oposição à heteronomia. Defendo a ideia de que a autonomia dos autores pedagógicos seja um princípio da práxis educacional, o que só é possível com a 23 mudança do ensino centrado no educador, o que demanda a transformação das relações pedagógicas, nas quais o ensino desenvolva, cada vez mais, a competência dos educandos, permitindo-lhes assumir a responsabilidade pela sua vida. O presente é filho do passado, sobre o qual, costumeiramente, pouco se conhece. Pior do que isso é o fato de que nós, educadores, costumamos desdenhar da importância que a História tem na clarificação da gênese de determinada realidade. Não basta, porém, apenas constatar essa negligência, sendo imperioso diligenciar-se, com perseverança, no sentido de mapear, embora que de forma insatisfatória e incompleta no início, as relações entre as variáveis que compõem um contexto social. Mais grave, ainda, é o fato de que, conforme alerta Gonçalves (1994, p. 14-15), na escola o futuro costuma ser privilegiado em detrimento do presente: “Todo o ensino caracteriza-se por constituir-se numa preparação para o futuro, esquecendo o momento existencial presente que a criança.”. Agindo assim, a escola contribuipara que a alienação se aprofunde cada vez mais, tanto pela negação do presente como pelo fato de que o futuro é uma abstração, que nunca se realiza! Assim, as dimensões temporais – passado, presente e futuro – são merecedoras de uma teoria e de uma prática pedagógica que as contemplem de modo saudável, percebendo e valorizando as ligações entre elas, o que só acontece quando os agentes pedagógicos problematizam a sua vida. Só assim, creio, terá sentido se falar e pensar em amanhã... O objetivo da interpretação, portanto, é a compreensão e não a explicação, uma vez que aquela, ao contrário dessa, admite a multiplicidade de visões. A narração de histórias é uma forma de permitir que cada pessoa elabore o significado do que ouve, de acordo com as suas experiências, valores, sonhos... Para que isso aconteça, a polissemia é tempero necessário nessa prática (BRUNER, 2001, p. 92). Da mesma opinião é Doll Jr. (1997, p. 185): O modo narrativo requer interpretação. Uma boa estória, uma grande estória, encoraja, desafia o leitor a interpretar, a iniciar um diálogo com o texto. Numa boa estória existe exatamente a quantidade suficiente de indeterminância para incitar o leitor ao diálogo. PARA QUE ISSO ACONTEÇA, O ESTUDANTE PRECISARÁ: • analisar e comparar informação; • produzir conhecimento e expressá-lo de modo variado; • integrar conhecimento de fontes e disciplinas variadas em narrações; • elaborar perguntas para fomentar uma pesquisa produtiva; • expor as suas ideias de maneira rigorosa, criativa e convincente. PARA QUE ISSO ACONTEÇA, O PROFESSOR PRECISARÁ: 24 • instigar o corpo discente a desenvolver as suas habilidades; • entender a avaliação como um processo e não como um veredicto final; • aceitar, nos momentos avaliativos, uma diversidade de respostas adequadas. (BRUNER, 2001, p. 92). Essa diversidade cultural, porém, não é aceita pela estrutura social que privilegia a padronização, a uniformidade de valores, crenças e sonhos de consumo. Para mascarar os graves conflitos sociais, que nos alertariam para a urgência da necessidade de se lutar pela transformação das relações de produção de bens, aqui entendidas no sentido amplo, somos seduzidos por várias promessas fantasiosas... Para Reimer (1983, p. 61-69), as sociedades modernas possuem quatro mitos – igualdade de oportunidades, liberdade, progresso e eficiência – os quais tentam impedir que se veja, respectivamente, a desigualdade imposta, uma vez que as “chances maiores são as de permanecer na base da escada do que chegar ao topo”; a crescente repressão e dominação, que, na maioria das vezes, silenciosamente permeia as relações entre o Estado e o cidadão; a falácia da melhora da qualidade de vida, uma vez que: [...] estamos nos aproximando dos limites de absorção do calor pela atmosfera e de absorção de poluição pelos oceanos, os limites da capacidade do planeta de sustentar a população, os limites da paciência dos pobres em sobrevir às custas das dádivas dos ricos, os limites dos próprios ricos em suportar as peias impostas por si mesmos ou de agüentar os próprios luxos que inventaram; e a falência dos modos de produção capitalista, que gera exclusão social e alienação do trabalhador, cuja solução residiria na organização mais eficiente da produção. A escola, com seus ritos, é utilizada para esconder tais abismos, uma vez que, enquanto as crianças estiverem ocupadas com diversas atividades, elas não pensarão neles. O sistema escolar, para Illich (1977, p. 37-38), repousa, também, sobre a grande ilusão: [...] de que a maioria do que aprende é resultado de ensino. O ensino, é verdade, pode contribuir para determinadas espécies de aprendizagem sob certas circunstâncias. Mas a maioria das pessoas adquire a maior parte de seus conhecimentos fora da escola; na escola, apenas enquanto esta se tornou, em alguns países ricos, um lugar de confinamento durante um período sempre maior de sua vida. REFLEXÃO ◾ Qual é o preço que as novas gerações pagam por esse confinamento? ◾ Será que as vantagens superam as desvantagens? ◾ É possível a escola desempenhar um papel diverso dessa concepção de escola-prisão, tendo em vista as influências sociais? 25 ◾ Se sim, o que ela precisa modificar, nos mais variados aspectos (físico, simbólico...)? MULTIMÍDIA Sociedade sem escolas – Ivan Illich. [2] Embora concorde com o pensador austríaco, no que concerne ao papel desempenhado pela escola na maioria das vezes, acredito, ao contrário dele, ser possível que ela possa contribuir na elucidação dos engodos culturais, motivo pelo qual não aceito a sua postulação de que, em virtude das inúmeras práticas desprovidas de significado para os seus agentes, ela é mais maléfica do que benéfica, devendo, por isso, ser fechada. Snyders (1988, p. 23) também admitia que: Há formas de cultura que são adquiridas fora da escola, fora de toda autoformação metódica e teorizada, que não são o fruto do trabalho do esforço, nem de nenhum plano: nascem da experiência direta da vida, nós a absorvemos sem perceber; vamos em direção a elas seguindo a inclinação da curiosidade e dos desejos; eis o que chamarei de cultura primeira. Conforme o mesmo autor, a cultura elaborada, que circula (ou que deveria circular) na escola, permite que os valores da cultura primeira sejam vividos com plenitude, fomentando, ainda, a reflexão sobre a relação entre elas, permeada de continuidade e ruptura (SNYDERS, 1988, p. 24). LETRA DA MÚSICA OUTRO TIJOLO NO MURO (ANOTHER BRICK IN THE WALL – PART 2) CLIQUE AQUI. Outro tijolo no muro Rogers Waters Nós não precisamos de nenhuma educação Nós não precisamos de nenhum controle de pensamento De sarcasmo sombrio na sala de aula Professores deixem as crianças em paz Ei, professores, deixem as crianças em paz! De qualquer maneira, é apenas mais um tijolo no muro De qualquer maneira, você é apenas mais um tijolo no muro “Errado, faça de novo!” “Se você não comer carne, não terá pudim. Como você espera ter pudim se você ainda não comeu a carne?” “Você. Sim, você atrás do bicicletário, fique parado garoto!” Traduzido do original Another Brick in the Wall – Part 2 por mim. [3] Afinal, qual é o papel que a escola desempenha, e ainda pode desempenhar, em virtude das circunstâncias? Se é verdade que a escola 26 costuma ser utilizada para reproduzir uma cultura, formatando corpos para a produção, também é verossímil que ela pode desempenhar um papel revolucionário, preparando os estudantes para lidar com um mundo em transformação, embora seja necessário se indagar como decidiremos conteúdos e práticas, em virtude da transitoriedade das demandas (BRUNER, 2001, p. vii). Essa abertura da escola para a vida não deve ocorrer de modo que ela perca a sua especificidade, o quinhão que lhe pertence, mas, exatamente o contrário: permitir que ela seja enriquecida pelo cotidiano. A escola, na opinião de Snyders (1988, p. 274), corre dois riscos: continuar fechada ou assimilar acriticamente o mundo. O desafio é conseguir se transformar, remontando às origens da vida e da especificidade, elaborando uma síntese particular, fonte de uma alegria genuína. Não bastassem todas essas questões filosóficas, a escola tem, tal como a sociedade, cada vez mais, diversos aparatos tecnológicos, os quais, por proporcionarem diversas maravilhas, nos fazem, na maioria das vezes, esquecer de indagar sobre esse acontecimento. Os agentes pedagógicos precisam evitar dois riscos nesse processo: i) acontecer apenas uma mudança (superficial) das práticas e do ambiente escolares, perpetuando sua antiga crença de que a aprendizagem é um ato mecânico, prescindindo, assim, de motivação, interesse e curiosidade; e ii) acreditar que a interação estudante-máquina dispensa a ação docente. Para Benito (2000, p. 43), a tecnologia modifica o universo da Educação, contemplando não apenas o cenário material onde estase realiza, mas, também, a ecologia da aula, as interações entre as pessoas envolvidas no processo pedagógico, o papel desempenhado por professores e estudantes, os modelos de comunicação e os mecanismos de avaliação e controle. Essas transformações, ocorrentes em espaços e tempos convencionais, proporcionam mudanças das teorias e das práticas didáticas, levando, provavelmente, a escola a se conectar a um espaço e um tempo em movimento. A Educação, atualmente, é marcada por três grandes temas, conforme Najmanovich (2001, p. 97-98): TEMA 01 A compreensão de que ela não se encerra com um diploma, devendo, portanto, ser permanente. Assim, ela precisa ser entendida juntamente com formação e capacitação, numa rede de elaboração e socialização cognitiva. TEMA 02 Uma nova concepção epistemológica propicia e fomenta uma revolução na produção, divulgação e avaliação do saber. TEMA 03 As novas tecnologias de informação e comunicação contribuem para que as formas utilizadas pela Humanidade para interagir sejam profundamente modificadas. 27 LEITURA COMPLEMENTAR A Teoria das Inteligências múltiplas e suas implicações para a Educação [4]. DICAS Sugestões de filmes que abordam assuntos dessa aula. A Língua das mariposas [5] A Missão [6] Além do quadro negro Coach Carter – treino para a vida [7] Ser e ter [8] ATIVIDADE DE PORTFÓLIO 1. Leia as orientações insertas neste Roteiro. (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.) Coloque no seu portfólio a sua produção (AULA_1_PORTFOLIO_1_ESTUDANTE.DOC). 2. Leia as orientações insertas neste Roteiro. (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.) Coloque no seu portfólio a sua produção (AULA_1_PORTFOLIO_2_ESTUDANTE.DOC). FÓRUM Freire (2009, p. 22) afirma que “(...) ensinar não é transferir conhecimentos, mas criar as possibilidades para a sua produção ou a sua construção.”. Inspirado(a) nesse pensamento: i) posicione-se, com argumentos e exemplos do cotidiano, em relação ao mesmo; ii) por que muitos professores no Brasil ainda ensinam de modo tradicional, apesar de essa Didática se revelar pouco eficiente?; e iii) o que os professores precisam aprender (a fazer e a ser) para modificar a sua prática e diminuir a crise educacional? Comente, com argumentos e/ou exemplos, a participação de dois(duas) colegas. REFERÊNCIAS ALVES, Rubem. A Escola da Ponte (3). In: ______. A Escola com que sempre sonhei sem imaginar que pudesse existir. 5. ed. Campinas: Papirus, 2003. p. 51-55. BACHELARD, Gaston. O Novo espírito científico. Tradução Juvenal Hahne Júnior. 2. ed. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1985. BARGUIL, Paulo Meireles. Há sempre algo novo! –Algumas considerações filosóficas e psicológicas sobre a avaliação educacional. Fortaleza: ABC Fortaleza, 2000. 28 ______. Aprendizes em múltiplos espaços-tempos. In: BARGUIL, Paulo Meireles (Org.). Aprendiz, docência e escola: novas perspectivas. Disponível em: < http://www.ledum.ufc.br/Aprendiz_Docencia_Escola_Novas_Perspectivas.pdf > [9] (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.). Acesso em: 15 jul. 2016. BENITO, Agustín Escolano. Tiempos y espacios para la escuela – Ensayos históricos. Madrid: Biblioteca Nueva, 2000. BRUNER, Jerome. A Cultura da Educação. Tradução Marcos A. G. Domingues. Porto Alegre: ArtMed, 2001. CALDEIRA, Anna Maria S.; AZZI, Sandra. Didática e Construção da Práxis Docente: Dimensões explicativa e projetiva. In: ANDRÉ, Marli Eliza Dalmazo André; OLIVEIRA, Maria Rita Neto Sales. Alternativas do Ensino de Didática. Campinas: Papirus, 1997. p. 97-127. CANDAU, Vera Maria. A Didática em Questão. Petrópolis: Vozes, 1989. COMENIUS. DIDACTICA MAGNA. Disponível em: http://www2.unifap.br/edfisica/files/2014/12/A_didactica_magna_COMENIUS.pdf [10] (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.). Acesso em 30 de jun. 2010. CUNHA, Emmanuel Ribeiro. Os Saberes docentes ou saberes dos professores? Disponível em: http://www.nead.unama.br/prof/admprofessor/file_producao.asp? codigo=17 [11]. Acesso em: 22 mar. 2009. DOLL Jr., William E. Currículo: uma perspectiva pós-moderna. Tradução Maria Adriana Veríssimo Veronese. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997. FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário da Língua Portuguesa. 2. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1993. FONTANELLA, Francisco Cock. O Corpo no limiar da subjetividade. Piracicaba: Editora Unimep, 1995. FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. 39. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2009. GARDNER, Howard. MENTES QUE MUDAM: a arte e a ciência de mudar as nossas ideias e as dos outros. Tradução Maria Adriana Veríssimo Veronese. Porto Alegre: Artmed/Bookman, 2005. 29 GAIARSA, José Ângelo. O Espelho mágico: um fenômeno social chamado corpo e alma. 12. ed. São Paulo: Summus, s/d. GONÇALVES, Maria Augusta Salin. Sentir, pensar, agir – corporeidade e educação. Campinas: Papirus, 1994. HALL, Edward T. La Dimension oculta – enfoque antropológico del uso del espacio. Traducción Joaquin Hernandez Orozco. Madrid: Instituto de Estudios de Administración Local, 1973. ILLICH, Ivan. Sociedade sem escolas. Tradução Lúcia Mathilde Endlich Orth. 4. ed. Petrópolis: Vozes, 1977. KAMII, Constance. Autonomia: a meta da Educação Piagetiana. In: KAMII, Constance; JOSEPH, Linda Leslie. Aritmética: novas perspectivas – implicações da teoria de Piaget. Tradução Marcelo Cestari Terra Lellis, Marta Rabioglio e Jorge José de Oliveira. Campinas: Papirus, 1992. p. 71-80. KENSKI, Vani Moreira. Múltiplas linguagens na escola. In: CANDAU, Vera Maria (Org.). Linguagens, espaços e tempos no ensinar e aprender. Rio de Janeiro: DP&A, 2000. p. 123-140. LIBÂNEO, José Carlos. Adeus Professor, Adeus Professora? – novas exigências educacionais e profissão docente. São Paulo: Cortez, 1998. ______. Democratização da escola pública: pedagogia crítico- social dos conteúdos. 14. ed. São Paulo: Loyola, 1996. MACHADO, Nilson José. Epistemologia e didática. São Paulo: Cortez, 1995. NAJMANOVICH, Denise. O Sujeito encarnado – questões para pesquisa no/do cotidiano. Rio de Janeiro: DP&A, 2001. PASSOS, Carmensita Matos Braga. Didática: breve incursão histórica em busca da identidade. Fortaleza. 2006a. Notas de aula. ______. Trabalho docente: características e especificidades. Fortaleza. 2006b. Notas de aula. PIMENTA, Selma Garrido. Formação de professores: identidade e saberes da docência. In: ______. (Org.). Saberes pedagógicos e atividade docente. São Paulo: Cortez, 1999. REIMER, Everett. A Escola está morta: alternativas em Educação. Tradução Tonie Thompson. 3. ed. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1983. SNYDERS, Georges. A Alegria na escola. Tradução Bertha Halpren 30 Gozovitz e Maria Cristina Caponero. São Paulo: Manole, 1988. TARDIF, Maurice. Saberes Docentes e Formação Docente. Petrópolis: Vozes, 2002. ZABALZA, Miguel A. O Ensino universitário: seu cenário e seus protagonistas. Porto Alegre: ArtMed, 2004. FONTES DAS IMAGENS 1. http://www.psiconlinews.com/wp-content/uploads/2015/05/19.jpg 2. http://www.youtube.com/watch?v=Stmz8aY682U 3. http://www.pink-floyd-lyrics.com/html/another-brick-2-wall.html 4. http://www.homemdemello.com.br/psicologia/intelmult.html 5. http://www.planetaeducacao.com.br/portal/artigo.asp?artigo=211 6. http://www.planetaeducacao.com.br/portal/artigo.asp?artigo=70 7. http://www.planetaeducacao.com.br/portal/artigo.asp?artigo=462 8. http://educacao.aaldeia.net/filme-ser-ter/ 9. http://www.ledum.ufc.br/Aprendiz_Docencia_Escola_Novas_Perspecti vas.pdf 10. http://www2.unifap.br/edfisica/files/2014/12/A_didactica_magna_C OMENIUS.pdf 11. http://www.nead.unama.br/prof/admprofessor/file_producao.asp? codigo=17 12. http://www.denso-wave.com/en/ Responsável: Professora Carmensita Matos Braga Passos Universidade Federal do Ceará - Instituto UFC Virtual 31 TÓPICO 01: MUDANÇA DE PARADIGMASREFLEXÃO • A Ciência é infalível? • A Ciência é neutra, imparcial? • Quais são as características do conhecimento científico? • Qual é a relação entre o conhecimento científico e o cotidiano escolar, acadêmico? Para mudar algo é necessário conhecê-lo. No caso dos desafios educacionais contemporâneos, é importante que os docentes compreendam que ela tem um componente epistemológico, uma vez que a Ciência não possui mais o poder de outrora. Acredito que o conhecimento da História da Ciência permite que o corpo docente estabeleça com o corpo discente relações inspiradas na curiosidade, na pesquisa e no desejo de aprender. A HUMANIDADE É CAFÉ COM LEITE, PAULO MEIRELES BARGUIL Fonte [1] Que sina a do Homem: vive num mundo que lhe foge à compreensão! Nem o átomo — do grego átomos: que não pode ser cortado, indivisível — que se acreditou durante milênios ser a menor parte da matéria ele consegue decifrar, pois está há mais de um século envolvido nessa aventura. A cada resposta formulada, surgem outras perguntas... A natureza é mais feroz do que a Hidra de Lerna, que substituía cada cabeça cortada por duas! Se nem o micro — cujo tamanho lhe é desprezível — a Humanidade consegue desvendar, o que dirá do macro — cuja extensão ela sequer logra imaginar? E a si mesmo? Quem ousaria dizer conhecer? Solucionar as infinitas charadas é divertido. DIDÁTICA GERAL AULA 02: EDUCAÇÃO: NOVOS PARADIGMAS 32 Melhor mesmo é contemplar e deliciar-se com as inebriantes belezas — internas e externas, pequenas e grandes. Estou desconfiando de que a Humanidade é café com leite nessa brincadeira com a natureza... Fonte [2] Nesta aula, objetivando entender e vislumbrar soluções para os desafios educacionais contemporâneos, refletiremos sobre a elaboração do conhecimento científico, as teorias de aprendizagem que orientam as práticas pedagógicas; a relação professor-conhecimento-estudante; e os (des)encontros no ambiente escolar, que revelam o quanto a realidade social o influencia, mas não o determina. Vários estudiosos propagam a ideia de que vivemos nova fase na explicação da realidade. Essa mudança, provocada pela formulação de concepções inéditas nas diversas searas da Ciência, em especial na Física, pauta-se em conceitos díspares dos apresentados na Modernidade, superando-os, e, até, os contradizendo, criando um clima de incerteza e probabilidade, bastante diverso do anterior, pautado na determinação e na ausência de dúvida. Para a Educação, essa mudança de paradigma, [3] que não se limita aos fenômenos da natureza, bem como nas demais Ciências Sociais, entrevejo como oportunidade ímpar de libertar-se do jugo de uma concepção linear e hierarquizada, que dominou por tantos séculos a compreensão dos fenômenos humanos, e de propor uma explicação que valorize a não- linearidade e o conhecimento em rede, sem um fundamento indispensável, onde todas as partes têm sua importância, motivo pelo qual não podem ser comparadas nem entendidas isoladamente. MULTIMÍDIA Novos Paradigmas na Educação [4]. Para compreender a revolução que a Física não newtoniana provocou, e vislumbrar o potencial ainda adormecido, apresentarei, sucintamente, a revolução originada pelo pensamento newtoniano, defensor do argumento de que a Humanidade poderia (e deveria) estabelecer com o meio ambiente uma relação pautada em novos fundamentos: não mais baseada na súplica mediante rituais ou preces, tampouco em práticas harmoniosas, mas na extração de todas as riquezas disponíveis, controlando-o, dominando-o, subjugando-o (DOLL JR., 1997, p. 37). A CIÊNCIA MODERNA DE GALILEU E DESCARTES Desde a pré-História, a Humanidade elabora explicações de matizes diferentes sobre o mundo, as quais permitiram a “complexificação” das suas funções emocionais, cognitivas e sociais, redundando numa estruturação crescente da vida coletiva e do domínio do espaço circundante. Assim, a Arte, a Ciência, a Filosofia e a Religião são frutos de esforços milenares do Homem para desbravar o desconhecido. 33 A Arte Grega [5] se expressou, principalmente, na Arquitetura (-- com a construção de palácios, fortalezas, templos e teatros) , na Escultura (-- privilegiando as formas humanas) e na cerâmica (-- com vasos de formas diversas e imagens, retratando tanto cenas do cotidiano como temas da mitologia) . Também devem ser destacadas as seguintes manifestações artísticas: estatuetas em argila, trabalhos em metal, joias e moedas, e a pintura em paineis. Os primeiros cientistas foram os filósofos gregos, uma vez que pro- curavam explicar a realidade com os parcos conhecimentos disponíveis à época, sem recorrer aos mitos e à religião. Sócrates (469 a.C. - 399 a.C.) [6] e Platão (427 a.C. - 347 a.C.) [7] privilegiaram o entendimento do com- portamento humano e suas causas em detrimento dos fenômenos naturais, fomentando, dessa forma, o desenvolvimento da Medicina, que teve em Hipócrates de Crós (460 a.C. - 380 a.C) seu maior representante nesse período. Fonte [8] Aristóteles (384 a.C. - 322 a.C) [9], fundador do Liceu, um observador atento e minucioso da realidade, e Teofrasto (371 a.C. - 287 a.C) podem ser considerados os mais remotos precursores da Ciência moderna. Relevantes, também, foram as experiências de Arquimedes (287 a.C. - 212 a.C), que deram grande impulso à Ciência grega, principalmente à Matemática, Astronomia e Engenharia, as quais receberam importantes contribuições de Aristarco de Samos (310 a.C. - 230 a.C), Euclides (c. 310 a.C) e Cláudio Ptolomeu (120 d.C. - 180 d.C.), dentre outros. A Filosofia (dos vocábulos gregos philos, amigo, e sophia, sabedoria) grega, que se desenvolveu principalmente em Atenas, teve como seu primeiro expoente Sócrates. Até então, ela se dedicava a compreender a natureza e a desenvolver técnicas de argumentação. Sócrates afirmava que o conhecimento do que era correto estava dentro de cada pessoa, motivo pelo qual tanto valorizava o autoconhecimento, expresso na máxima “Conhece-te a ti mesmo!”, inscrita no Templo de Apolo em Delfos, cuja autoria é desconhecida, embora atribuída a várias pessoas. Há registros desse aforismo no Templo de Luxor, no Antigo Egito. Enquanto Platão privilegiava na Academia o debate entre mestres e discípulos sobre todos os temas, Aristóteles valorizava no Liceu, além da querela, o estudo, o ensino e a pesquisa de todo conhecimento disponível. A contribuição de ambos impulsionou definitivamente a Filosofia, colocando-a numa posição de destaque no mundo ocidental. 34 Fonte [10] Para que a Religião grega seja compreendida, é necessário considerar a importância da Mitologia [11] no cotidiano dessa civilização. Os deuses e as deusas tinham todos os sentimentos e comportamentos humanos, sendo, porém, imortais e extremamente sensíveis, pois se irritavam com muita facilidade... Os heróis, por sua vez, eram filhos de uma entidade divina com um humano, e, embora fossem mortais, eram capazes de grandes feitos. Em virtude de a explicação dos fenômenos e acontecimentos mais simples se vincularem à ação dos seres divinos, a Religião grega caracterizava-se pelo culto aos deuses (às deusas) e aos heróis (às heroínas), objetivando aplacar a sua (frequente) ira. O povo grego era, ainda, muito ligado ao passado e ao futuro, que se expressava, de forma privada, no culto aos mortos, bem como na arte de adivinhar, mediante sonhos, entranhas de animais e oráculos. MULTIMÍDIA Deuses gregos . [12] A Idade Média foi marcada por uma filosofia aristotélica e uma teologia cristã. A noção do universo orgânico, vivo e espiritual, foi substituída nos séculos XVI e XVII, graças à Revolução Científica [13], que simboliza o período de grandes descobertas na Física, Astronomia e Matemática, pela noção de um mundo como uma máquina, que se tornou a metáfora da Era moderna instaurada por Copérnico, Galileu, Descartes, Bacon e Newton (CAPRA,2001, p. 34). Na civilização ocidental, durante séculos, a Teoria Geocêntrica – a Terra é o centro do universo – era a única explicação aceita para o movimento dos planetas e do Sol, em trajetórias circulares, de acordo com as fórmulas apresentadas no início da era Cristã por Cláudio Ptolomeu. Tal verdade era defendida ardorosamente pela Igreja Católica e, posteriormente, por Martinho Lutero (1483-1546). Intrigado com o fato de que Mercúrio e Vênus não serem vistos por volta de meio-dia, mas somente pela manhã ou à tarde, bem como com a movimentação de Marte, Júpiter e Saturno, que pareciam andar para trás, numa perspectiva retrógrada, Nicolau Copérnico (1473-1543) [14] postulou, por volta de 1530, a ideia de que o Sol e não a Terra é o centro do Universo, defendendo, portanto, a Teoria Heliocêntrica. Suas ideias foram confirmadas, em 1610, por Galileu Galilei (1564-1642) [15], que, com seu telescópio, fez várias descobertas astronômicas. Embora tenha ido a Roma apresentar sua posição, a Igreja Católica declarou, em 1616, que o sistema copernicano era herético. Galileu permaneceu anos em silêncio, conforme lhe fora determinado, mas não sem continuar suas pesquisas. Em 1632, publicou uma obra na qual defendia, de forma mais categórica ainda, sua posição inicial. No ano seguinte, foi obrigado, sob a ameaça de morte, a jurar que a Terra era imóvel (BARGUIL, 2000, p. 130- 132). 35 LEITURA COMPLEMENTAR Galileu Galilei [16]. Os cientistas forjados nesse momento histórico tiveram a [...] coragem de questionar verdades tidas como imutáveis, numa época em que as coisas eram simplesmente porque sempre haviam sido”, bem como enfrentaram a “[...] resistência e a oposição que a sociedade, nas suas diversas instituições, ofereceu ao modo ‘insensato’ e ousado de confrontar a realidade com questionamentos e dúvidas. (BARGUIL, 2000, p. 134-135). Grande lição desse breve relato é a “[...] fé que eles tiveram em suas convicções”, pois, embora muitas vezes não dispusessem das condições materiais e técnicas para provar as suas teorias, como no caso de Copérnico, ou das condições emocionais para manter suas crenças, como no caso de Galileu, eles as defenderam. Finalmente, ele revela o “[...] caráter transitório do conhecimento”, pois ambos estavam errados ao postular o Sol como o centro do universo, porque esse é apenas uma das 200 bilhões de estrelas da Via-Láctea (a nossa galáxia no meio de outras 100 bilhões), conforme nos permitiram aprender as imagens transmitidas pelo telescópio espacial Hubble [17], que foi ao espaço em 1990. (BARGUIL, 2000, p. 135). A contribuição de René Descartes (1596-1650) [18] foi criar “[...] o método do pensamento analítico, que consiste em quebrar fenômenos complexos em pedaços a fim de compreender o comportamento do todo a partir das propriedades das suas partes.". (CAPRA, 2001, p. 34). Numa perspectiva cartesiana, a natureza se divide em dois domínios independentes: a mente e a matéria. O universo material seria uma máquina, que poderia ser completamente entendida se fosse analisada em suas menores partes (CAPRA, 2001, p. 34-35). Para encontrar as certezas absolutas, ele propõe as meditações cartesianas. A dúvida projeta o cientista na busca metódica de um fundamento sólido para o conhecimento, que objetiva expurgar qualquer sombra de dúvida e de incerteza. Aqui, a fé não é o ponto de partida, como para os religiosos, mas o ponto de chegada, a meta a ser alcançada, o que ocorre somente após uma longa jornada. Em certo sentido, portanto, a fé fundamentalista iguala religiosos e “racionalistas” (NAJMANOVICH, 2001, p. 21). A concepção do mundo como uma máquina governada por leis matemáticas exatas recebeu a contribuição do físico inglês Isaac Newton (1643-1727) [19], que elaborou três leis (inércia, força e ação e reação), explicando o movimento dos corpos e, ainda, a forma como as forças atuam neles. Na Biologia, o médico inglês William Harvey (1578-1657) [20], aplicando o modelo mecanicista de Descartes, propôs nova explicação para a 36 circulação sanguínea, o que serviu de inspiração para que os fisiologistas aplicassem esse modelo na descrição de outras funções somáticas: digestão e metabolismo. No século seguinte, as descobertas de Antoine-Laurent Lavoisier (1743-1794) [21] revelaram que a respiração é permeada de processos químicos, não sendo possível descrevê-la em termos mecânicos (CAPRA, 2001, p. 35). Desde o seu surgimento no século XVII, com Galileu e Descartes, a Ciência moderna influencia de modo crescente a vida social, com a divulgação de valores e normas que impregnam as mais diferentes atividades, desde a construção de cidades e a instituição de leis, até a edificação de escolas e a seleção do por quê (justificativa), para quê (objetivos), o quê (conteúdos), como (metodologia), quando e como (tempo e atividades) e com o quê (recursos didáticos) se ensina, bem como das estratégias avaliativas. Fonte [22] A Ciência moderna delimitou as coordenadas do estudo, fixando a noção de que, somente por intermédio da quantificação, seria possível se conhecer algo, devendo o pesquisador, para tanto, seguir os instrumentos de medida, especialmente construídos para isso, os quais deveriam ser utilizados segundo os procedimentos determinados. Essa concepção de conhecimento, obtido no isolamento da realidade e na fiel obediência da estabilidade das condições, criou a crença de que esse mundo domesticado e artificial era mais importante e válido do que aquele que tem cheiro e barulho, e que o conhecimento naquele produzido era universal, porquanto objetivo (NAJMANOVICH, 2001, p. 41-42). Desde então, assiste-se a uma valorização crescente da Ciência (e de seus produtos) no cotidiano, sendo-lhe, muitas vezes, outorgado o encargo de classificar e dar status às outras formas de explicação e interpretação da realidade. A supremacia da Ciência favoreceu o incremento da compreensão do Homem sobre o mundo, mediante teorias mais complexas, além de encorajar o Homem na instigante tarefa de desbravar o Universo. Promoveu, entretanto, verdadeira caça às bruxas, quando valores e aspectos intrínsecos do existir social foram, muitas vezes, extirpados, por não estarem de acordo com os seus princípios: neutralidade do conhecimento e no fracionamento da realidade, fundamentos que foram apresentados, respectivamente, por Galileu e Descartes. MULTIMÍDIA Rosa de Hiroshima [23]. LETRA DA MÚSICA ROSA DE HIROSHIMA 37 Infelizmente, durante muito tempo, particularmente no mundo ocidental, assistimos a um excesso de valorização do conhecimento dito científico, caracterizada pelo domínio da razão, em detrimento das outras dimensões da pessoa. É um paradoxo terrível que a Ciência nas diversas áreas, como expressão do esforço da Humanidade de melhorar a sua vida, seja para a maioria dos estudantes apartada do cotidiano deles, ensejando a lamentável e nefasta cisão entre teoria e prática, escola e vida. Há de se clarificar os motivos dessa ocorrência, porquanto tal paradoxo atingir níveis cada vez mais absurdos, expressos, no universo pedagógico, em atividades escolares desprovidas de qualquer significado para os seus agentes (professor e estudantes), fazendo com que a convivência entre eles seja, na maior parte das vezes, meramente burocrática, desprovida de motivação, entusiasmo e dedicação. Gonçalves (1994, p. 20) entende que o Homem, ao privilegiar a explicação do universo por meio de leis matemáticas e mecânicas, acredita ter encontrado na razão a solução para todas as suas dúvidas e angústias, permitindo-o transformar o mundo conforme os seus interesses, merecendo, por isso, o status de único instrumento válido de conhecimento, levando, assim, a um distanciamento de seu corpo, que passou a ser visto apenas como um objeto que deve ser disciplinado e controlado (assim como todo orestante da natureza). É necessário lembrar que, para Descartes, somente com o fracionamento da realidade em partes menores, nomeados de objetos de estudo, seria possível entendê-la. A especialização, pois, é uma consequência “natural”, sendo, nessa perspectiva, necessária e merecedora de créditos. O equívoco dessa formulação é que o todo, ao qual a parte pertencia, é esquecido, desprezado, fazendo com que esse objeto seja, de certa forma, mutilado (GALLO, 2000, p. 166). O modo de se fazer Ciência e de se divulgar os seus achados – que nunca são definitivos, embora poucas vezes se ouça isso – avança sobre o conjunto da sociedade, não se limitando a ocupar os espaços escolares, acadêmicos. Essa invasão ocorre silenciosamente, daí residindo o seu perigo e a sua eficácia, pois o Homem dificilmente percebe o quanto a sua rotina, o seu cotidiano, é influenciado por um ideário científico, seja ele qual for. Conforme explica Doll Jr. (1997, p. 37-38), 38 A metodologia de Descartes da “razão correta” era tão certa e dogmática quanto a metodologia escolástica que ela substituiu, e a Ciência mecanicista de Newton baseava-se numa ordem cosmológica, estável, uniforme. A parte mais importante desta visão, o determinismo causa- efeito matematicamente mensurado, dependia de um universo fechado, não-transformativo, linearmente desenvolvido. Isso é bastante significativo e emblemático, pois esse referencial, que era para ser um instrumento de consecução de um mundo menos didatorial e mais justo, contribuiu para perpetuar o que desejava abolir. Que isso sirva de alerta, principalmente quando formos seduzidos pela promessa de instauração de relações mais justas e menos opressoras, graças ao complexo suporte tecnológico, o que parece estar ocorrendo atualmente, com o questionamento das antigas crenças e a valorização de valores esquecidos. A modernidade concebeu o humano dividido em compartimentos estanques. A partir do olhar newtoniano, conhecimento/emoção/ação são esferas que não se comunicam, porque absolutamente autônomas. Impôs- se socialmente uma confiança ilimitada nos poderes da razão na qual a ciência impulsionaria o progresso permanente se os seres humanos se mostrassem capazes de dominar seus sentimentos e disciplinar seu agir atrás dos ditados da razão. Por sua vez, o homem se considerava radicalmente separada da natureza, observador e observado eram termos rigorosamente separados. (NAJMANOVICH, 2001, p. 83). (Itálico no original). A MUDANÇA DE PARADIGMAS A partir das reflexões teóricas de Galileu, Descartes e Newton, a natureza deixou de ser vista como ente espiritual e passou a ser compreendida como máquina perfeita que funciona de acordo com leis matemáticas. Infelizmente, o Homem desconhecia (e ainda desconhece!) o fato de que essa concepção o atingira em cheio, uma vez que ele pertence à natureza... Fonte [24] A clássica Mecânica só foi abalada no início do século passado, quando Albert Einstein (1879-1955) [25] brindou-nos com a Teoria da Relatividade Especial e reformulou as definições de massa (que varia de acordo com a velocidade do objeto) e de espaço e tempo (precisa considerar a posição e o movimento do observador e do observado). Enquanto na clássica Mecânica, o ser é somente matéria, na Quântica, ele se manifesta como matéria e movimento, como corpúsculo e irradiação, motivo pelo qual a equação de Einstein é mais “[...] do que uma equação de transformação, é uma equação ontológica”. (BACHELARD, 1985, p. 66). Quanto às implicações filosóficas da Física não newtoniana, há dois aspectos que ora saliento. Enquanto a Mecânica (de teor clássico) percebe a realidade como algo permanente, rígido, determinístico, a Quântica a enxerga com a marca da transitoriedade, da fluidez, da probabilidade. O outro aspecto diz respeito à importância da ideia de relação restaurada pela 39 nova Física, uma vez que os fenômenos, para serem devidamente compreendidos, precisam considerar a dinâmica entre energia e matéria, contrapondo-se à posição anterior, que isolava o objeto para compreendê-lo, ou, quando muito, o enquadrava numa lógica de causa-efeito. Com a exploração do mundo do átomo, os físicos se viram diante de uma realidade desconhecida, pois [...] suas concepções básicas, sua linguagem e todo o seu modo de pensar eram inadequados para descrever os fenômenos atômicos. Seus problemas não eram meramente intelectuais, mas alcançavam as proporções de uma intensa crise emocional e, poder-se-ia dizer, até mesmo existencial. Eles precisaram de um longo tempo para superar essa crise, mas, no fim, foram recompensados por profundas introvisões sobre a natureza da matéria e de sua relação com a mente humana. (CAPRA, 2001, p. 24). Essas radicais transformações são analisadas pelos filósofos da Ciência, dentre os quais Thomas Kühn (1922-1996) [26], que as percebeu em contexto de mudanças de paradigmas, entendidos como um conjunto de realizações (concepções, valores e técnicas) aceitas por uma comunidade científica, as quais ocorrem “[...] sob a forma de rupturas descontínuas e revolucionárias”, propiciando, também, ampla modificação cultural (CAPRA, 2001, p. 24). Reputo como a mais importante de todas as mudanças o entendimento de que a lógica mecânica da vida, que permite o controle dos acontecimentos em diversas áreas do cotidiano, não está de acordo com o funcionamento da natureza, a qual tem uma dinâmica muito distinta daquela imaginada pelos famosos pensadores da Ciência moderna. A compreensão da realidade, portanto, não é alcançada com o seu fracionamento em partes menores (para facilitar o entendimento) e com o seu isolamento (para garantir que variáveis externas não influenciarão o estudo), como defendia Descartes, mas com a consideração dos vínculos, das relações que as partes estabelecem entre si e entre o todo. Tal ênfase inaugura uma perspectiva holística, global, e se expressa num pensamento sistêmico [27], orgânico. Sobre isso, bastante elucidativa é a seguinte explicação de Capra (2001, p. 46-47): Na mudança do pensamento mecanicista para o pensamento sistêmico, a relação entre as partes e o todo foi invertida. A ciência cartesiana acreditava que em qualquer sistema complexo o comportamento do todo podia ser analisado em termos das propriedades de suas partes. A ciência sistêmica mostra que os sistemas vivos não podem ser compreendidos por meio da análise. As propriedades das partes não são propriedades intrínsecas, mas só podem ser entendidas dentro do contexto do todo maior. Desse modo, o pensamento sistêmico é pensamento “contextual”; e, uma vez que explicar coisas considerando o 40 seu contexto significa explicá-las considerando o seu meio ambiente, também podemos dizer que todo pensamento sistêmico é pensamento ambientalista. Outra consequência, segundo França (1994, p. 76), é que Em toda a ciência hoje há uma movimentação em direção a uma nova forma de abordagem dos problemas. Essa tentativa de inovação reside principalmente na necessidade de superação do binômio newtoniano causa-efeito, que vinha conferindo um caráter dualista inaceitável em se tratando de nossa realidade, nosso mundo não pode ser visto estaticamente. A urgência e a necessidade da divulgação desse novo entendimento sobre o funcionamento da vida residem no fato de que o paradigma antigo continua infiltrado em diversos valores e ideias amplamente aceitos, conforme as nossas práticas sociais. [...] a visão do universo como um sistema mecânico composto de blocos de construção elementares, a visão do corpo humano como uma máquina, a visão da vida em sociedade como uma luta competitiva pela existência, a crença no progresso material ilimitado, a ser obtido por intermédio de crescimento econômico e tecnológico, e – por fim, mas não menos importante – a crença em que uma sociedade na qual a mulher é, por todaa parte, classificada em posição inferior à do homem é uma sociedade que segue uma lei básica da natureza. (CAPRA, 2001, p. 25). O novo paradigma, com uma visão holística do mundo, que o percebe como um todo integrado e não como a junção de partes diversas, tem uma perspectiva ecológica profunda, pois “[...] reconhece a interdependência fundamental de todos os fenômenos, e o fato de que, enquanto indivíduos e sociedades, estamos todos encaixados nos processos cíclicos da natureza (e, em última análise, somos dependentes desses processos)”. (CAPRA, 2001, p. 25). Você não pode nem mesmo observar qualquer coisa sem modificar o objeto observado e até mesmo a si próprio. (TOBEN; WOLF, 1998, p. 36). A citação a seguir apresenta uma síntese do que entendo ser a mudança de paradigmas: A civilização que acreditou nas certezas definitivas, no conhecimento absoluto e no progresso permanente começou a ser derrubada e está se abrindo passagem para novos modos de pensar e viver no mundo. Da concepção do universo como um cosmo mecânico, estamos passando à concepção de ilhas de estabilidade em um mar de caos. Da afirmação da possibilidade de um conhecimento absoluto, verdadeiro, objetivo e universal, passamos a afirmar o perspectivismo, a inseparabilidade absoluta do observador e do observado, a íntima ligação entre a teoria, a 41 ação, a emoção e os valores. De um mundo em que as ciências e as humanidades estavam separadas em duas culturas radicalmente distintas, estamos começando a percorrer um caminho em direção a uma ciência que se considere a si mesma como um “olhar poético da natureza” (PRIGOGINE e STENGERS) e artes que não hesitam de se propor como formas de conhecimento. (NAJMANOVICH, 2001, p. 65-66). Quais são as implicações disso para a Educação? Inicialmente, percebe- se que ela é marcada por um "[...] sistema de ordenamento linear, sequencial, facilmente quantificável [...]", centrado em "[...] indícios claros e fins definidos.". (DOLL JR., 1997, p. 19). A partir da aceitação do fato de que a aprendizagem é uma parte da vida, a qual nunca se encerra, mas está em constante processo, em transição, o sistema educacional pode (e deve) ser substituído por uma rede complexa, pluralista, contemplando, dessa forma, a dimensão criativa dos seus membros. A noção de ordem, portanto, se transmuta: não busca mais o linear, a sequência, o controle, mas privilegia o não linear, a harmonia, a fluidez. É necessário, acredito, diligenciar-se na compreensão do que se esconde atrás do véu da neutralidade científica. Para Najmanovich (2001, p. 18), ela é utilizada para justificar a validade de um conhecimento do mundo, elaborado objetivamente por um “observador neutro”, que seguiu, cuidadosamente, os passos do método experimental. O problema, segundo ela, é que esse mundo é muito afastado da experiência humana. Tal crença, a despeito de ser cada vez mais denunciada, continua influenciando a nossa forma de produzir e difundir conhecimento, pois afirma que a realidade está posta, à espera de ser observada, captada de forma imparcial, por meio de métodos que privilegiam a quantificação e a medição, condições indispensáveis para que os resultados possam ser universalizados. Segundo essa compreensão, o pesquisador deve se despir de toda a sua carga emocional, de seus valores e sonhos, esquecer-se, enfim, de que é um ser social. Essa exigência, porém, não se sustenta dada a força da dimensão subjetiva do pesquisador, da sua ligação com a sociedade, principalmente nos tempos atuais de inúmeros conflitos sociais, políticos, econômicos, culturais, sexuais, religiosos... Postulo a ideia de que o cientista, ao desenvolver uma pesquisa, deve se indagar sobre a função social desta, seja para a transformação ou a manutenção do status quo, seja para maior equilíbrio ou azedamento das relações entre as nações, pessoas. Sua contribuição intelectual, portanto, tem um aspecto moral, ético. Isso não significa que ele deve renunciar ao seu ímpeto desbravador, ou deturpá-lo, mas que precisa estar ciente de que o 42 conhecimento, desde os primórdios, é fonte de poder, seja para oprimir, seja para libertar. Quando produz saberes, diz Rocha (2000, p. 138), a Humanidade o faz por intermédio de várias práticas que a condiciona, disciplina, de modo que institui, sem que ela perceba, um padrão de comportamento, baseado naqueles, utilizado conosco e com os outros. Dessa forma, eles são fonte de poder, de sujeição e de imposição (de vontade e de verdade), sufocando, assim, as possibilidades de se instaurar ritos pautados na criatividade e espontaneidade. MULTIMÍDIA Esquadros. [28] ESQUADROS – ADRIANA CALCANHOTO Eu ando pelo mundo prestando atenção Em cores que eu não sei o nome Cores de Almodóvar Cores de Frida Kahlo, cores Passeio pelo escuro Eu presto muita atenção no que meu irmão ouve E como uma segunda pele, um calo, uma casca Uma cápsula protetora Ah, eu quero chegar antes Pra sinalizar o estar de cada coisa Filtrar seus graus Eu ando pelo mundo divertindo gente Chorando ao telefone E vendo doer a fome nos meninos que têm fome Pela janela do quarto Pela janela do carro Pela tela, pela janela Quem é ela? Quem é ela? Eu vejo tudo enquadrado Remoto controle Eu ando pelo mundo E os automóveis correm para quê? As crianças correm para onde? Transito entre dois lados, de um lado Eu gosto de opostos Exponho meu modo, me mostro Eu canto para quem? Pela janela do quarto Pela… O olhar não é, portanto, um fenômeno natural, mas, antes, social, embora que dotado de um aspecto biológico. É na convivência com seus pares, que o Homem aprende a perceber e valorar o mundo. Assumir a influência de tais condicionamentos na sua prática não é uma tarefa simples 43 Fonte [29] para o professor, embora indispensável, se ele deseja instaurar uma dinâmica no seu ambiente de trabalho em que os estudantes são convidados a reelaborar movimentos, sentimentos, crenças e valores. O que observamos não é a natureza em si, mas a natureza exposta ao nosso método de questionamento. (HEISENBERG, Werner). O fato de se olhar numa direção, conforme ensina Fazenda (2000, p. 143), revela que ele é condicionado, seja para buscar interação, seja para dela fugir. O professor pode olhar para o estudante demonstrando atenção e interesse de aprender ou revelando a sua vontade de inquirir ou criticar. O estudante, assim, poderá se sentir acolhido ou rejeitado. Da mesma forma, o olhar do corpo discente pode provocar no professor curiosidade ou desinteresse. Diante dos infinitos aspectos a serem considerados na análise da vida humana, não é um exagero a afirmação de Vygotsky (1991, p. 74) de que A procura de um método torna-se um dos problemas mais importantes de todo empreendimento para a compreensão das formas caracteristicamente humanas de atividade psicológica. Nesse caso, o método é, ao mesmo tempo, pré-requisito e produto, o instrumento e o resultado do estudo. (Itálico no original). O desafio expresso, portanto, está em formular procedimentos de pesquisa compatíveis com os acontecimentos que serão estudados, considerando suas especificidades e peculiaridades. Deve-se evitar, assim, as posições extremadas, seja a que adota, acriticamente, instrumentos de outras ciências, seja a que, diante da necessidade de descobrir o novo, sucumbe e desiste de entender o desconhecido. Alinho-me à reflexão de Severino (1994, p. 32), quando defende a ideia de que o referencial teórico deve constituir apoio para a desafiante tarefa de aproximação e afastamento do que se almeja compreender, rechaçando uma utilização escolástica deste recurso de pesquisa, equívoco tantas vezes cometido por inúmeros investigadores ao longo da História, e pugnando por um entendimento da dimensão pedagógica do referencial adotado. Assim como a Ciência, a Filosofia da Ciência demanda uma atitudeque, em vez de se distanciar da realidade para melhor compreendê-la, dela se aproxima, por compreender o caráter vivencial. Nesse sentido, é a reflexão de Bachelard (1985, p. 12-13): [...] pelo próprio fato de que a filosofia da Ciência é uma filosofia que se aplica, ela não pode guardar a pureza e a unidade de uma filosofia especulativa. Qualquer que seja o ponto de partida da atividade científica, esta atividade não pode convencer plenamente senão deixando o domínio de base: se ela experimenta, é preciso raciocinar; se ela raciocina, é preciso experimentar. Toda aplicação é transcendência. (Itálico no original). 44 Para Weil (1993, p. 13), assistimos a um movimento que possibilita uma nova visão do mundo, que abandonando os paradigmas da Ciência moderna, que está levando ao suicídio da espécie humana, propõe soluções para sair da fragmentação. Mais adiante, o autor assevera que A crise de fragmentação começa por uma ilusão, por uma miragem, que é a separação entre sujeito e objeto. Antes dessa ilusão, há uma não- separatividade ou mesmo uma identidade entre o conhecedor, o conhecimento e o conhecido, ou seja, entre sujeito, conhecimento e objeto. (WEIL, 1993, p. 15). Doll Jr. (1997, p. 114), por sua vez, entende que a Teoria do Caos indica que a forma de se relacionar com o mundo, com a natureza e conosco, chegou a um estádio crítico, forjando a elaboração de um paradigma baseado num novo senso de ordem. MULTIMÍDIA O olho do furacão. [30] O OLHO DO FURACÃO – ENGENHEIROS DO HAWAII Tudo muda ao teu redor, o que era certo, sólido Dissolve, desaba, dilui, desmancha no ar No moinho, giram as pás, e o tempo vira pó De grão em grão, por entre os dedos, tudo parece escapar Estamos no centro, por dentro de tudo, no olho do furacão Estamos no centro de tudo que gira, na mira do canhão Se for parar pra pensar, não vai sair do lugar Não tem parada errada, não! No olho do furacão Tudo gira ao teu redor o que era certo, sólido Evapora, vai-se embora, o que era líquido e certo Estamos no centro, por dentro de tudo, no olho do furacão Estamos no centro de tudo que gira, na mira do canhão Se for parar pra pensar, não vai sair do lugar !Não tem parada errada, não! No olho do furacão No olho do furacão... Na visão clássica, proporcionada pela Física, a ordem é associada a equilíbrio, como se encontra nas estruturas estáticas, e a desordem a não- equilíbrio, como a turbulência. Na perspectiva da ciência da complexidade, inspirada na “teia da vida”, o não-equilíbrio é uma fonte de ordem, uma vez que os fluxos turbulentos de água e ar, aparentemente caóticos, seguem padrões de vórtices, que se dividem, sucessivamente, em escalas menores. Nos sistemas vivos, é ainda mais fácil perceber a ordem oriunda do não- equilíbrio, a qual se manifesta na riqueza, na diversidade e na beleza da vida 45 que nos rodeia. “Ao longo de todo mundo vivo, o caos é transformado em ordem”. (CAPRA, 2001, p. 155-156). A objetividade postulada e praticada pela Ciência moderna influenciou a forma como o corpo do sujeito foi percebido, porque as emoções, a forma de perceber, sentir e agir, e os vínculos do pesquisador com o mundo, devem ser extirpados para que ele produza um conhecimento válido. Assim, o corpo é reduzido àquilo que pode ser medido, representado (NAJMANOVICH, 2001, p. 19). Para Gonçalves (1994, p. 102), o corpo não é um objeto como outro qualquer, isento de subjetividade, que reage mecanicamente a estímulos, motivo pelo qual ela assinala estar o Homem impregnado pela subjetividade que o anima. A fisiologia mecanicista, ao separar o afeto da motricidade, pariu um corpo desprovido de interioridade. Essas reflexões, que serão retomadas na aula 3, apontam para a necessidade de se elaborar uma Educação que esteja de acordo com essa nova compreensão de mundo. A interação dos agentes é privilegiada para fomentar o crescimento mútuo, em detrimento de rituais meramente burocráticos, que se prestam, na maioria das vezes, apenas a cumprir uma obrigação. Para tanto, é indispensável que o professor modifique o seu papel, não para diminuir a sua importância e dos saberes que já domina, mas para dar uma nova dinâmica à sua bagagem cultural e emocional, bem como à dos estudantes, mediante um processo reflexivo (DOLL JR., 1997, p. 119). Para entender melhor o que postulo, apresento, no próximo tópico, algumas teorias da aprendizagem, as quais são o núcleo de qualquer projeto educacional, e suas implicações para os processos de ensino e de aprendizagem. PARADA OBRIGATÓRIA Um Novo paradigma em Educação (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.). OLHANDO DE PERTO Notas sobre Educação na transição para um novo paradigma [31]. Os Novos paradigmas em Educação: os caminhos viáveis para uma análise (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.). FONTES DAS IMAGENS 1. http://www.origemedestino.org.br/blog/johannesjanzen/735- universo.jpg 2. http://www.cronicadodia.com.br/2015/02/a-humanidade-e-cafe-com- leite-paulo.html 3. http://pt.wikipedia.org/wiki/Paradigma 4. http://www.youtube.com/watch?v=GQPXp7KOYAM 5. http://pt.wikipedia.org/wiki/Arte_grega 6. http://pt.wikipedia.org/wiki/S%C3%B3crates 7. http://pt.wikipedia.org/wiki/Plat%C3%A3o 46 8. http://abobrinhaecia.files.wordpress.com/2012/06/1804.jpg 9. http://pt.wikipedia.org/wiki/Arist%C3%B3teles 10. http://media.giphy.com/media/123VBUlCD9sLXG/giphy.gif 11. http://pt.wikipedia.org/wiki/Mitologia_grega 12. http://www.youtube.com/watch?v=c57pM7eyRy0 13. http://pt.wikipedia.org/wiki/Revolu%C3%A7%C3%A3o_cient%C3% ADfica 14. http://pt.wikipedia.org/wiki/Cop%C3%A9rnico 15. http://pt.wikipedia.org/wiki/Galileu 16. http://www.histedbr.fe.unicamp.br/navegando/glossario/verb_b_galil eu_galilei.htm 17. http://pt.wikipedia.org/wiki/Telesc%C3%B3pio_espacial_Hubble 18. http://pt.wikipedia.org/wiki/Ren%C3%A9_Descartes 19. http://pt.wikipedia.org/wiki/Isaac_Newton 20. http://pt.wikipedia.org/wiki/William_Harvey 21. http://pt.wikipedia.org/wiki/Antoine_Lavoisier 22. http://media.giphy.com/media/o37e1VlwzOvFS/giphy.gif 23. http://www.youtube.com/watch?v=j11OYO0abGo 24. http://media.giphy.com/media/f1HSBidKJIOWY/giphy.gif 25. http://pt.wikipedia.org/wiki/Einstein 26. http://pt.wikipedia.org/wiki/Thomas_Kuhn 27. http://pt.wikipedia.org/wiki/Pensamento_sist%C3%AAmico 28. http://www.youtube.com/watch?v=EeNUsrw8qA8 29. http://3.bp.blogspot.com/_SHMlvWpCZb8/SwhoUK5kBKI/AAAAAA AAAAc/QTXHONgVKgM/s1600/ilusao3.jpg 30. http://www.youtube.com/watch?v=ueNBo2I_tBw 31. http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1414- 32831997000200004&script=sci_arttext&tlng=pt 32. http://www.denso-wave.com/en/ Responsável: Professora Carmensita Matos Braga Passos Universidade Federal do Ceará - Instituto UFC Virtual 47 TÓPICO 02: TEORIAS DE APRENDIZAGEM E SUAS IMPLICAÇÕES PARA O ENSINO REFLEXÃO • O que é aprender? • Como se aprende? • Quais são as características do conhecimento O que é ensinar? Para ser um bom professor é essencial compreender o processo de aprender, de modo a desempenhar de modo mais eficaz o ato de ensinar. Neste tópico, aprofundaremos o entendimento da relação entre as teorias de aprendizagem e as práticas educacionais. Durante séculos, o processo de aprendizagem foi entendido como consequência “natural” do processo de ensino, daí a expressão processo ensino-aprendizagem, a qual insinua que o ensino antecede a aprendizagem e que professor e estudante são responsáveis exclusivos de cada metade: o professor pelo ensino, o estudante pela aprendizagem. Para afastar tal equívoco, defendo a adoção da expressão processos de ensino e de aprendizagem, explicitando que professor e estudante vivenciam ambos os processos. O ENSINO, KHALIL GIBRAN (CLIQUE AQUI PARA ABRIR) Fonte [1] Depois um professor disse, Fala-nos do Ensino. E ele [o Profeta] respondeu: Ninguém vos poderá revelar nada que já não esteja meio adormecido na aurora do vossoconhecimento. O professor que caminha na sombra do templo, entre os seus discípulos, não dá a sua sabedoria, mas antes a sua fé e amor. Se for realmente sábio, não vos convida a entrar na casa da sua sabedoria, mas antes vos conduz ao limiar do vosso próprio espírito. O astrônomo pode falar-vos do seu entendimento do espaço, mas não vos pode dar o seu entendimento. O músico pode cantar-vos o ritmo do espaço, mas não vos pode dar o ouvido que faz parar o ritmo, ou a voz que dele faz eco. DIDÁTICA GERAL AULA 02: EDUCAÇÃO: NOVOS PARADIGMAS 48 E aquele que é versado na ciência dos números, pode falar-vos de pesos e medidas, mas não pode levar-vos até lá. Pois a visão de um homem não empresta as suas asas a outro homem. E, mesmo que cada um de vós esteja sozinho no conhecimento de Deus, também cada um de vós deve estar sozinho no seu conhecimento de Deus e na sua compreensão da Terra. Fonte: (GIBRAN, 1970, p. 53-54) Nas disciplinas de Psicologia da Educação, vocês estudaram sobre as teorias de aprendizagem, motivo pelo qual faremos, apenas, uma breve síntese sobre as ideias de Piaget e Vygotsky. VERSÃO TEXTUAL A Educação no século XX foi palco de grandes debates, notadamente a partir das pesquisas de Piaget e Vygotsky, as quais propiciaram o questionamento de práticas educacionais seculares. É interessante perceber que ambos não eram educadores, motivo pelo qual suas descobertas devem ser estudadas com muito cuidado, de modo a evitar que as novas práticas supostamente nelas inspiradas não as contradigam. Fonte [2] Jean Piaget (1896-1980) [3], após concluir o doutorado em Ciências Naturais, trabalhou com Èdouard Claparède no então recém-inaugurado Instituto de Ciências Educativas Jean Jacques-Rousseau, aplicando testes de inteligência para crianças. Embora contar as respostas certas e erradas fosse tarefa repetitiva, ele buscou compreender os motivos que levavam os interrogados a escolher determinados itens e não outros. Portanto, a pesquisa psicogenética iniciada por Piaget objetivava deslindar a elaboração do conhecimento pelo sujeito, o qual, no seu entendimento, é um organismo ativo em constante interação com o meio, que tenciona estabelecer com esse uma relação de equilíbrio, utilizando-se, para tanto, de operações mentais: assimilação e acomodação. Piaget (1991) definiu assim tais operações: A ASSIMILAÇÃO Integração, incorporação de elementos da realidade (objetos, acontecimentos...) às estruturas cognitivas, aos esquemas do sujeito, fruto do seu propósito de entender o mundo. A ACOMODAÇÃO Modificação nas estruturas cognitivas, esquemas de assimilação do sujeito, em virtude da complexidade da realidade, com o surgimento de novos esquemas. Considerando que o sujeito está sempre incrementando a sua adaptação ao ambiente, os esquemas – as estruturas mentais, cognitivas – são transitórios, o Epistemólogo suíço nomeou esse processo de equilibração 49 sucessiva: equilíbrio-desequilíbrio-reequilibração. Ele postulou a ideia de que toda pessoa desenvolve suas estruturas cognitivas de acordo com uma sequência linear, mediante sucessivos estágios: sensório-motor, pré- operatório, operatório concreto e operatório formal. As idades indicadas não são marcos fixos, mas referências para compreender o desenvolvimento dos indivíduos. O estágio sensório-motor – do nascimento aos dois anos de vida – é marcado pelas ações sensoriais e motoras, as quais possibilitam intensas transformações quantitativas e qualitativas na mente. No início, os reflexos automáticos – sugar, chorar, agarrar ... – compõem a grande maioria das ações do bebê, as quais lhe permitem, em seguida, desenvolver os primeiros esquemas sensório-motores, ampliando exponencialmente as suas possibilidades de exploração e entendimento do espaço circundante. Fonte [4] No estágio pré-operatório – dos dois aos sete anos – a criança amplia e torna mais complexa a sua capacidade de simbolizar, de interpretar. Por meio de imitações e situações criadas a partir do faz-de-conta, a criança torna-se capaz de manipular símbolos. Para Piaget, a maior limitação dela nessa fase é o egocentrismo, uma vez que ela é incapaz de imaginar, de entender a realidade a partir de outro ponto de vista que não seja o seu. Estudos posteriores sobre o egocentrismo autorizaram os cientistas a afirmar que a capacidade de se colocar no lugar do outro não é mera questão cognitiva, mas possui forte carga emocional. A dificuldade de descentrar, de reconhecer outras leituras, explicações do mundo, elaboradas por outros olhos e mentes, não é exclusividade das crianças, uma vez que o grande desafio é utilizar a flexibilidade das estruturas cognitivas e não simplesmente possuí-las. Rogers (1991, p. 255) já alertara para o fato de que o diferente, o não-eu, não é uma ameaça à existência das pessoas, mas uma fonte de crescimento, por isso anota: Julgo que uma das melhores maneiras, mas das mais difíceis, para mim de aprender é abandonar minhas defesas, pelo menos temporariamente, e tentar compreender como é que a outra pessoa encara e sente a sua própria experiência. [...] outra forma de aprender é confessar as minhas próprias dúvidas, procurar esclarecer os meus enigmas, a fim de compreender melhor o significado real da minha experiência. O estágio operatório concreto – dos sete aos catorze anos – caracteriza-se pela reversibilidade, que permite o sujeito visualizar uma ação mental nos dois sentidos: indo e voltando. 50 Essa flexibilidade também se manifesta na capacidade da criança de prestar atenção, quando diante de um problema, em mais de uma característica (um aspecto, uma dimensão) de um objeto, conforme atestam os testes de conservação de quantidade, massa e líquido, elaborados por Piaget, superando o comportamento da fase anterior em que se fixava em apenas um deles. Há outras importantes conquistas: A SERIAÇÃO Capacidade de classificar objetos, resultado da constituição do conceito de transitividade, quando objetos são comparados de acordo com alguma qualidade (tamanho, peso, ...). A INCLUSÃO DE CLASSES Capacidade de relacionar a parte com o todo, quando a criança compreende que há uma hierarquia entre diferentes categorias, as quais podem ser agrupadas de inúmeras maneiras. Quando alcança o estádio operatório formal – dos 14 anos em diante – o indivíduo é capaz de pensar de forma muito mais versátil e flexível do que no estádio anterior, como atesta o desenvolvimento da capacidade de pensar em problemas hipotéticos e ideias, ampliando a manipulação mental para além do mundo concreto. Ele, também, começa a empreender uma busca sistemática de soluções, mediante a consideração de inúmeras possibilidades. MULTIMÍDIA Jean Piaget: biografia e pesquisas [5]. Vygotsky (1896-1934) Fonte [6] O caráter processual do conhecimento é fortemente defendido pela Teoria Sócio-interacionista, de Lev Semenovich Vygotsky (1896-1934), [7] conhecida também como histórico-cultural ou sócio-histórica, que enfatiza a importância do meio social no desenvolvimento das estruturas psicológicas superiores, uma vez [...] que “[...] o aprendizado humano pressupõe uma natureza social específica e um processo através do qual as crianças penetram na vida intelectual daquelas que as cercam”. (VYGOTSKY, 1991, p. 99). (Itálico no original). Nos princípios do século passado, os psicólogos comportamentalistas (Pavlov e Watson) afirmavam que o comportamento do Homem assemelhava-se ao do animal, que funciona num esquema de estímulo- resposta. Levantando-se contra esses, os gestaltistas (Wertheimer, Kohler, Koffka e Lewin) defendiam a ideia de que as funções psicológicas superiores – pensamento, linguagem e comportamento volitivo – não se estruturavam da mesma forma que as funções psicológicas simples, resultado da maturação da base instintiva. 51 Vygotsky (1991, p. 33), influenciado pelomaterialismo dialético de Marx e Engels, advogava que o contexto social, que é histórico, exerce grande influência no desenvolvimento das funções superiores humanas: Desde os primeiros dias do desenvolvimento da criança, suas atividades adquirem um significado próprio num sistema de comportamento social e, sendo dirigidas a objetos definidos, são refratadas através do prisma do ambiente da criança. O caminho do objeto até a criança e desta até o objeto passa através de outra pessoa. Essa estrutura humana complexa é o produto de um processo de desenvolvimento profundamente enraizado nas ligações entre história individual e história social. Para Vygotsky (1991, p. 95/97), cada pessoa tem dois níveis de desenvolvimento mental: O Real - Revela as funções cognitivas que já amadureceram, caracterizando-o retrospectivamente. O Potencial - Revela as funções que ainda estão amadurecendo, caracterizando-o prospectivamente. Metaforicamente, enquanto o primeiro é o fruto, o segundo é a flor do desenvolvimento mental. A distância entre o nível de desenvolvimento real e o nível de desenvolvimento potencial é chamada por Vygotsky de zona de desenvolvimento proximal. É interessante destacar o fato de que ela está sempre em expansão. No entendimento desse pesquisador bielo-russo, o desenvolvimento da fala e da inteligência prática ocorre simultaneamente. Para Vygotsky, a linguagem, durante a vida humana, tem duas funções: A segunda função (planejar) só ocorre no desenvolvimento humano após alguns anos do nascimento – e permite duas formas de comunicação para cada pessoa: interpessoal (com o outro) e intrapessoal (consigo). A linguagem, portanto, permite que a noção de espaço seja (continuamente) refeita, revelando novas dimensões, pois a pessoa “[...] começa a perceber o mundo não somente através dos olhos, mas também através da fala” (VYGOTSKY, 1991, p. 36). 52 O mundo é visto (e compreendido) pelo Homem não somente pelas cores e formas, mas também pelos sentidos e significados (VYGOTSKY, 1991, p. 37), os quais são sempre reelaborados, influenciando na maneira que ele se relaciona com o mundo. MULTIMÍDIA Lev Vygotsky: biografia e pesquisas [8]. A cultura, que reúne as produções individuais e coletivas, é um conjunto de signos, os quais permitem o incremento da capacidade do Homem de se relacionar com o mundo nas suas diversas formas. Muitas vezes, os profissionais da Educação desconhecemos o fato de que a cultura é um signo, que para ter sentido para o sujeito precisa ser manipulado, afetiva e cognitivamente, permitindo, assim, que ele desfrute da beleza e da suavidade do seu cotidiano. Nessa perspectiva, a natureza não é inerte à ação do ser humano, mas transforma-se e demanda transformações na forma como o Homem se relaciona consigo mesmo, com o seu semelhante e com o meio ambiente. A linguagem utilizada por ela para expressar sua mensagem é silenciosa, mas nem por isso pouco compreensível, conforme atestam os crescentes desastres naturais em todo o Planeta. Penso que a não-consideração dessa peculiaridade do conhecimento contribui para que as relações professor-estudante se tornem cada vez mais frias e distantes, sem que o saber exerça o papel de ponte, de elo entre as pessoas, mas seja exatamente o oposto, aquilo que afasta, oprime. Os problemas de aprendizagem revelam, na grande maioria das vezes, problemas de ensino (de didática), em virtude de o professor acreditar que o domínio de conteúdos e de certas técnicas é suficiente para garantir a aprendizagem dos estudantes. Nesta concepção, crê-se que o conhecimento pode ser transmitido. É cada vez mais necessário, portanto, que os educadores entendam que um signo é composto de dois aspectos: significante e significado. Fonte [9] • enquanto o primeiro é de domínio social (por exemplo, a escrita dos algarismos) e pode ser socializado, • o segundo é construído pelos sujeitos, num processo de mediação social, onde a atividade do sujeito é fundamental. Ainda hoje, infelizmente, as teorias de Piaget e Vygotsky pouco impactaram nos cotidianos educacionais formais, seja pelas queixas dos agentes pedagógicos – professor e estudantes – seja pelo uso de expressões que explicitam sua compreensão equivocada sobre os processos de ensinar – "passar, transmitir o conteúdo"... – e de aprender – “absorver, captar o conteúdo“... – perpetuando e aprofundando um cenário desolador. SÍNTESE DE ALGUMAS TEORIAS DE APRENDIZAGEM (CLIQUE AQUI PARA ABRIR) 53 BEHAVIORISMO – centrada apenas nos “comportamentos objetivamente observáveis”, negligenciando as atividades mentais. A aprendizagem é simplesmente definida como a aquisição de um novo comportamento. Princípios: habituação, isto é, a diminuição da tendência para responder aos estímulos que, após uma exposição repetida, se tornaram familiares; o “condicionamento” é um processo universal de aprendizagem: condicionamento clássico, condicionamento instrumental (operante). Críticas: a) não considera algumas capacidades intelectuais; b) não explica alguns tipos de aprendizagem; c) não explica alguns dados conhecidos de adaptação. CONSTRUTIVISMO – parte do pressuposto de que todos nós construímos nossa concepção do mundo em que vivemos a partir da reflexão sobre as próprias experiências. Cada um de nós utiliza “regras” e “modelos mentais” próprios (que geramos no processo de reflexão sobre a nossa experiência pessoal), consistindo a aprendizagem no ajustamento desses “modelos”, “acomodando”, “adaptando” as novas experiências... Princípios: 1) a aprendizagem é busca do significado das coisas, por isso deve começar pelos acontecimentos em que os alunos estão envolvidos e cujo significado procuram construir...; 2) a construção do significado requer não só a compreensão da “globalidade” / totalidade, como das “partes” que a constituem e a integram num “contexto”; 3) para se poder ensinar bem é necessário conhecer os modelos mentais que os alunos utilizam e os pressupostos que suportam esses modelos; 4) aprender é construir seu próprio significado e não encontrar as “respostas certas” dadas por alguém. A PERSPECTIVA DESENVOLVIMENTISTA DE PIAGET – o ser humano, no seu desenvolvimento, constrói estruturas cognitivas sofisticadas – que vão dos reflexos do recém-nascido até às complexas atividades mentais do. A estrutura cognitiva é um “mapa” mental interno, um “esquema” ou uma “rede” de conceitos construídos pelo indivíduo para compreender e responder às experiências dentro do seu meio envolvente. Princípios: quatro estágios de desenvolvimento e um conjunto de processos através dos quais o ser humano progride: * Sensório-motor – conceito de permanência do objeto; esquemas sensório-motores coordenados; imitações até chegar a representações mentais complexas; * Pré-Operatório - pensamento representativo, mas carente de operações mentais (ordenação e organização); * Operações Concretas - conceptualização e criação de “estruturas lógicas” para a explicação de experiências, sem abstração; * Operações Formais - raciocínio abstrato, com hipóteses possíveis e capacidade de pensar cientificamente. 54 O SÓCIO-INTERACIONISMO DE VYGOSTKY – o desenvolvimento do indivíduo é resultado de um processo sócio-histórico, enfatizando o papel da linguagem e da aprendizagem nesse desenvolvimento. A aquisição de conhecimentos se dá pela interação do sujeito com o meio – questão central da teoria. Destaque para a formação de conceitos, que remetem às relações entre pensamento e linguagem no processo de construção de significados pelos indivíduos, ao processo de internalização e ao papel da escola na transmissão de conhecimento, que é de natureza diferente daqueles aprendidos na vida cotidiana. A formação das funções psíquicas superiores é resultado de internalização mediada pela cultura. Assim, a interação social e o instrumento linguísticosão decisivos para o desenvolvimento, que tem, pelo menos, dois níveis: real, já adquirido ou formado, que determina o que o ser humano é capaz de fazer por si próprio, e potencial, ou seja, a capacidade de aprender com outra pessoa. A aprendizagem interage com o desenvolvimento, produzindo abertura nas zonas de desenvolvimento proximal (distância entre aquilo que o ser humano faz sozinho e o que é capaz de fazer com a intervenção/interação de outro; o desenvolvimento cognitivo é produzido pelo processo de internalização da interação social com materiais fornecidos pela cultura, num processo que se constrói de fora para dentro, a partir de uma mediação). Extraído de Dias (2008). Dezenas de teóricos têm contribuído para aclarar a compreensão quanto ao processo de aprendizagem, com consequências intensas no processo de ensino. Neste sentido, necessário se conhecer algumas ideias da Teoria da Aprendizagem Significativa, formulada por David Ausubel (1918-2008). No início da década de 1990, o neurocientista Paul MacLean (1913- 2007) postulou que o cérebro humano é dividido em 3 unidades distintas – reptiliano, límbico e neocórtex – sendo que cada uma delas representa um momento da evolução dos vertebrados. A primeira camada, a reptiliana, está associada à sobrevivência (lutar ou fugir), auto-preservação. É a porção instintiva do cérebro, responsável por reflexos primários, pelo agir mais primitivo: comer, dormir, proteger-se, sexo. A segunda camada, a límbica, está ligada às emoções (ira, pavor, paixão, amor, ódio, alegria e tristeza). É a parcela emocional do cérebro, responsável pelo sentir. A terceira camada, o neocórtex, está relacionada à abstração, à linguagem simbólica, à invenção. É o pedaço racional do cérebro, responsável pelo pensar. Essa teoria de MacLean é conhecida como cérebro trino. 55 Fonte No próximo tópico, será analisada a relação professor-estudante. O PROFESSOR LOCUTOR E O ESTUDANTE ESPONJA, PAULO MEIRELES BARGUIL (CLIQUE AQUI PARA ABRIR) Depois de várias semanas anunciando para mim mesmo, finalmente escreverei sobre algo que vem me incomodando há muito tempo. É assaz frequente, infelizmente, a afirmação de que o professor transmite o conhecimento, o conteúdo e o estudante o absorve, o capta. A tragédia não é escutar esse discurso, mas identificar as seculares tentativas de dar vida a essa crença, mediante práticas mortíferas. Quando éramos um pouco mais ignorantes do que somos agora, se o resultado não era alcançado tal como planejado, educávamos, com autoridade, torturando as crianças com pisa de cinto ou palmatória, ajoelhando-as em cima de caroços de feijão ou de milho e ainda tendo que segurar, de costas para o quadro e olhando para a parede, uma cadeira na cabeça, levando-as ao desespero com a arguição da tabuada, obrigando-as a copiar dezenas de vezes palavras e números sem qualquer sentido, como se elas fossem pedras duras, que necessitariam de muita água mole para serem furadas... E o que dizer dos milhares e milhares recreios roubados das crianças por adultos zelosos? Não, o conhecimento não pode ser transmitido! Eu não sou locutor! Não, o conhecimento não pode ser absorvido! O estudante não é uma esponja! O mundo não tem significado per si. É cada pessoa que o elabora ou não... Numa Educação sem sentidos, é fácil entender o fracasso do modelo atual. O significante, sim, pode ser transmitido, mostrado, mas o significado é uma tarefa individual, vivenciada com maior ou menor vigor a depender de inúmeros fatores, num ritmo próprio, a despeito da insanidade que deseja tudo controlar . É tão simples: sem sentido, a informação desaparece em meio à multidão, cada vez mais agitada. Somos, todos, seres luminosos, capazes de constituir sentido à vida. Ninguém pode fazer isso por mim. Da mesma forma, não posso fazê-lo por ninguém. Trocar o discurso do professor, o exercício do livro por uma brincadeira, um jogo, um software, um filme ou algo do gênero é insuficiente se o estudante continuar sentado e sem o direito de compartilhar o que sabe, bem como se o profissional permanecer insensível à vida que pulsa à sua frente e dentro dele... 56 Que nos lembremos, contudo, o fato de que o Homem não se reduz à dimensão cognitiva. Uma Educação integral, na escola ou fora dela, precisa contemplar, também, as dimensões corporal, afetiva e espiritual. Chegará o tempo em que aprenderemos que não temos o direito de invadir o outro, em qualquer dimensão e sob qualquer pretexto. O nascimento é sempre um processo lento, com muitos detalhes. Somente um olhar transmutado consegue ver o amanhã, mesmo que distante. Essa visão é motivo de alegria, paz e energia. Dedico-me, todos os dias, a me livrar de armaduras que me impedem de brincar de ser eu. Que a minha jornada inspire outros, mesmo quando eu não estiver mais expirando... Fonte [10] PARADA OBRIGATÓRIA Evolução dos conceitos sobre o cérebro e o processo de aprendizagem (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.). Teoria da aprendizagem significativa segundo Ausubel (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.). LEITURA COMPLEMENTAR Carrossel dos Sentidos (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.). OLHANDO DE PERTO Inserção da Neurobiologia na Educação (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.). Linguagem e aprendizagem significativa (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.). FONTES DAS IMAGENS 1. http://bemviverapometria.files.wordpress.com/2010/04/maos-de- luz.jpg 2. http://userscontent2.emaze.com/images/b008c09f-3bcb-4f3e-9f93- 2703728af868/68767dfd-59d8-4697-9e56-4c2e2f1831a4.gif 3. http://pt.wikipedia.org/wiki/Jean_Piaget 4. http://media.giphy.com/media/9K6pvMdAhhshG/giphy.gif 5. http://www.youtube.com/watch?v=EnRlAQDN2go 6. http://www.marxists.org/archive/vygotsky/images/portrait.jpg 7. http://pt.wikipedia.org/wiki/Vygotsky 8. http://www.youtube.com/watch?v=_BZtQf5NcvE) 9. http://3.bp.blogspot.com/_0vVKT_iqTC8/SLS8tHhwJFI/AAAAAAAAD O0/hUu7cOQdHcI/s400/paulofreire4.gif 10. http://www.cronicadodia.com.br/2014/09/o-professor-locutor-e-o- estudante.html 11. http://www.denso-wave.com/en/ 57 TÓPICO 03: RELAÇÃO PROFESSOR-ESTUDANTE: REPRODUÇÃO OU PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO? REFLEXÃO • Como a relação professor-estudante influencia na divulgação e constituição do conhecimento? • Que comportamentos de professor e estudantes favorecem a aprendizagem? Continuando nossa navegação para elaborar novos paradigmas, é necessário investigar as relações entre as pessoas, notadamente a relação professor-estudante. O Homem é um ser complexo, com várias dimensões – física, emocional, cognitiva e espiritual – as quais precisam ser consideradas no cotidiano escolar. Neste tópico, enfatizaremos a dimensão cognitiva, que é a mais facilmente percebida na Educação. No próximo, contemplaremos os aspectos emocionais e físicos, os quais, infelizmente, na grande maioria das vezes, não recebem a devida atenção. ESCOLA E SOFRIMENTO, RUBEM ALVES (CLIQUE AQUI PARA ABRIR) Fonte [1] Estou com medo de que as crianças me chamem de mentiroso... Pois eu disse que o negócio dos professores é ensinar a felicidade. Acontece que eu não conheço nenhuma criança que concorde com isto. Se elas já tivessem aprendido as lições da política, me acusariam de porta voz da classe dominante. Pois, como todos sabem, mas ninguém tem coragem de dizer, toda escola tem uma classe dominante e uma classe dominada: a primeira, formada por professores e administradores, e que detém o monopólio do saber, e a segunda, formada pelos alunos, que detém o monopólio da ignorância, e que deve submeter o seu comportamento e o seu pensamento aos seus superiores, se desejam passar de ano. DIDÁTICA GERAL AULA 02: EDUCAÇÃO: NOVOS PARADIGMAS 58 Basta contemplar os olhos amedrontados das crianças e os seus rostos cheios de ansiedade paracompreender que a escola lhes traz sofrimento. O meu palpite é que, se fizer uma pesquisa entre as crianças e os adolescentes sobre as suas experiências de alegria na escola, eles terão muito que falar sobre a amizade e o companheirismo entre eles, mas pouquíssimas serão as referências à alegria de estudar, compreender e aprender. A classe dominante argumentará que o testemunho dos alunos não deve ser levado em consideração. Eles não sabem, ainda… Quem sabe são os professores e os administradores. Acontece que as crianças não estão sozinhas neste julgamento. Eu mesmo só me lembro com alegria de dois professores dos meus tempos de grupo, ginásio e científico. A primeira, uma gorda e maternal senhora, professora do curso de admissão, tratava-nos a todos como filhos. Com ela era como se todos fôssemos uma grande família. O outro, professor de Literatura, foi a primeira pessoa a me introduzir nas delícias da leitura. Ele falava sobre os grandes clássicos com tal amor que deles nunca pude me esquecer. Quanto aos outros, a minha impressão era a de que nos consideravam como inimigos a serem confundidos e torturados por um saber cujas finalidade e utilidade nunca se deram ao trabalho de nos explicar. Compreende-se, portanto, que entre as nossas maiores alegrias estava a notícia de que o professor estava doente e não poderia dar a aula. E até mesmo uma dor de barriga ou um resfriado era motivo de alegria, quando a doença nos dava uma desculpa aceitável para não ir à escola. Não me espanto, portanto, que tenha aprendido tão pouco na escola. O que aprendi foi fora dela e contra ela. Jorge Luís Borges passou por experiência semelhante. Declarou que estudou a vida inteira, menos nos anos em que esteve na escola. Era, de fato, difícil amar as disciplinas representadas por rostos e vozes que não queriam ser amados. Esta situação, ao que parece, tem sido a norma, tanto que é assim que aparece frequentemente relatada na literatura. Romain Rolland conta a experiência de um aluno: “… afinal de contas, não entender nada já é um hábito. Três quartas partes do que se diz e do que me fazem escrever na escola: a gramática, ciências, a moral e mais um terço das palavras que leio, que me ditam, que eu mesmo emprego – eu não sei o que elas querem dizer. Já observei que em minhas redações as que eu menos compreendo são as que levam mais chances de ser classificadas em primeiro lugar”. Mas nem precisaríamos ler Romain Rolland: bastaria ler os textos que os nossos filhos têm de ler e aprender. Concordo com Paul Goodmann na sua afirmação de que a maioria dos estudantes nos colégios e universidades não desejam estar lá. Estão lá porque são obrigados. Os métodos clássicos de tortura escolar como a palmatória e a vara já foram abolidos. Mas poderá haver sofrimento maior para uma criança ou um adolescente que ser forçado a mover-se numa floresta de informações que ele não consegue compreender, e que nenhuma relação parecem ter com sua vida? Compreende-se que, com o passar do tempo a inteligência se encolha por medo e horror diante dos desafios intelectuais., e que o aluno passe a 59 se considerar como um burro. Quando a verdade é outra: a sua inteligência foi intimidada pelos professores e, por isto, ficou paralisada. Os técnicos em educação desenvolveram métodos de avaliar a aprendizagem e, a partir dos seus resultados, classificam os alunos. Mas ninguém jamais pensou em avaliar a alegria dos estudantes – mesmo porque não há métodos objetivos para tal. Porque a alegria é uma condição interior, uma experiência de riqueza e de liberdade de pensamentos e sentimentos. A educação, fascinada pelo conhecimento do mundo, esqueceu-se de que sua vocação é despertar o potencial único que jaz adormecido em cada estudante. Daí o paradoxo com que sempre nos defrontamos: quanto maior o conhecimento, menor a sabedoria. T. S. Eliot fazia esta terrível pergunta, que deveria ser motivo de meditação para todos os professores: “Onde está a sabedoria que perdemos no conhecimento?” Vai aqui este pedido aos professores, pedido de alguém que sofre ao ver o rosto aflito das crianças, dos adolescentes: lembrem-se de que vocês são pastores da alegria, e que a sua responsabilidade primeira é definida por um rosto que lhes faz um pedido: “Por favor, me ajude a ser feliz…”. Fonte: (ALVES, 1994, p. 13-18) Conforme estudamos no tópico anterior, diversas concepções de aprendizagem têm desfilado nos palcos escolares nos últimos séculos. Nesta seção, é reafirmado o fato de que elas expressam uma compreensão de como o Homem produz e socializa o conhecimento, ou seja, uma epistemologia. Essas teorias têm percepções distintas quanto ao papel que o sujeito e o objeto desempenham na produção de conhecimento, entendendo aquele como o que conhece e esse como o que se quer conhecer. Acredito que o saber pode ser significativo para cada pessoa e não uma peca decorativa (no duplo sentido), descartável, que pode ser rapidamente substituída por outra mais atraente. Conforme Bruner (2001, p. 15/19), são duas as concepções sobre o funcionamento da mente: O “COMPUTACIONALISMO” A primeira defende o argumento de que o Homem processa informações, como se fosse um computador, uma vez que elas estão dispostas num código linguístico compreensível para aquele. A missão do professor é fornecer aos estudantes dados para que esses executem os comandos cerebrais pertinentes e possam aprender. O CULTURALISMO A segunda explicação evidencia a capacidade que o Homem tem de simbolizar e interpretar, uma vez que ele pertence a uma comunidade que produz cultura. Dessa forma, a aprendizagem e o pensamento não são processos mecânicos, idênticos para todas as pessoas, mas são atividades peculiares, diretamente vinculadas ao desenvolvimento de cada uma delas num contexto particular, motivo pelo qual os significados de um mesmo 60 objeto, acontecimento podem (e costumam) ser diversos para vários indivíduos. DICA Enquanto o “computacionalismo” se baseia no processamento de informações, privilegiando a explicação, o culturalismo defende a produção de significado, destacando a interpretação. A visão da mente humana como uma máquina não é nova na História da Humanidade. Capra (2001, p. 66/68) relata que a ciência cognitiva, no seu início, defendeu a noção de que a inteligência humana poderia ser entendida como um processador de informações. Tal atitude, envolta num amplo entusiasmo de membros da academia e do público em geral, pode ser comparada com a ideia, lançada no século XVII por Descartes, de que o funcionamento do corpo humano se assemelhava ao do relógio. A utilização de termos tipicamente humanos (memória, linguagem...) reforçou a concepção cartesiana de que o Homem é uma máquina, embora tal crença tenha se revelado recentemente uma falácia, pois a inteligência da máquina (a “artificial”) é totalmente diversa da humana, uma vez que o: [...] sistema nervoso humano não processa nenhuma informação (no sentido de elementos separados que existem já prontos no mundo exterior, a serem apreendidos pelo sistema cognitivo), mas interage com o meio ambiente modulando continuamente sua estrutura. Além disso, os neurocientistas descobriram fortes evidências de que a inteligência humana, a memória humana e as decisões humanas nunca são completamente racionais, mas sempre se manifestam coloridas por emoções, como todos sabemos a partir da experiência. Nosso pensamento é sempre acompanhando por sensações e por processos somáticos. Mesmo que, com freqüência, tendamos a suprimir estes últimos, sempre pensamos também como o nosso corpo; e uma vez que os computadores não têm um tal corpo, problemas verdadeiramente humanos sempre serão estrangeiros à inteligência deles. (CAPRA, 2001, p. 68). Rememorando as salas de aula que frequentei, como estudante ou professor, revejo as cenas de práticas pedagógicas nelas vivenciadas e percebo o quanto essa distinção nas crenças dos agentes envolvidosquanto ao funcionamento da mente (processamento de informações e produção de significado) implica em momentos – movi-, senti- e pensa- mentos – díspares. 61 Os produtos oriundos da relação professor-estudante não se limitam à dimensão cognitiva, mas alcançam, também, o desenvolvimento moral da criança, conforme Piaget pesquisou. Na sua opinião, o julgamento moral expressa a compreensão que a criança tem do mundo social. Dessa forma, as experiências por ela vivenciadas permitem avançar nos estádios descritos por ele: i) Pré-moral (desconhecimento de regras); ii) Moralidade heterônoma (os deveres e os valores são seguidos fielmente); iii) Semi-autonomia (início da relativização de ordens e de regras); e iv) Moralidade autônoma (baseada na reciprocidade). Fonte [2] A importância dessa concepção de moralidade infantil é a recusa de entendê-la como um processo maturacional, pois enaltece as interações que o sujeito estabelece com o meio ambiente. A excessiva valorização das consequências das ações é, progressivamente, substituída pelas intenções dos sujeitos, as quais passam a ser entendidas dentro de um sistema valorativo, possibilitando que as regras e as exigências sociais sejam relativizadas, hajam vistas as especificidades individuais, num interminável diálogo. A partir dessas contribuições piagetianas, os papéis do estudante e do professor transformam-se radicalmente: para elaborar o conhecimento, aquele deve confrontar os seus saberes com a realidade, considerar as informações dos colegas, de modo a formular explicações mais consistentes. Agindo assim, ele abandonará a enfadonha tarefa de guardar (por pouco tempo) conteúdos amorfos e assumirá, cada vez mais, a responsabilidade pela sua vida, que congrega bem mais do que a área cognitiva, num processo interminável de equilibração. Nessa perspectiva, o professor tem grande influência na dinâmica da sala, nas interações que nela ocorrem, motivo pelo qual é indispensável que ele abandone a atitude de conferencista, de divulgador de um conhecimento que só ele possui, e assumir a responsabilidade pela proposição de atividades que desafiem os seus pupilos a se expandirem em todas as dimensões. Para que isso ocorra, o docente precisa considerar o contexto social em que o corpo discente vive, permitindo que esse atinja níveis mais complexos de entendimento da dinâmica social, permeada que é, no caso do Brasil, por inúmeras contradições e injustiças, as quais não são acontecimentos naturais, mas acontecimentos históricos, sendo passíveis de transformação. Os estudos de Piaget permitiram melhor compreensão do universo infantil, das suas capacidades, limitações e necessidades. Pesquisas posteriores revelam que as suas ideias quanto à capacidade de realização das crianças pré-escolares e ao egocentrismo não são totalmente verdadeiras. 62 Isso não tira o mérito do esforço empreendido por ele, mas mostram a transitoriedade do conhecimento, que se torna cada vez mais depurado, com a formulação de novas teorias, que caracterizam o processo de acomodação na perspectiva Piagetiana. PARA DOLL JR. (1997, P. 80), OS ESTUDOS DE JEAN PIAGET SÃO: (CLIQUE AQUI PARA SABER MAIS) A alternativa de explicação para o desenvolvimento humano em substituição à Física newtoniana, uma vez que o modelo aberto, por ele apresentado, privilegia as relações que os seres humanos estabelecem com o seu meio, enaltecendo a noção de que o valor que as partes têm só pode ser entendido no sistema como um todo, e não mediante o isolamento entre aquelas. Suas investigações, forjadas numa perspectiva da Biologia, objetivavam desvendar a interação das pressões que o meio ambiente situa sobre o organismo e a reação por este apresentada a essas pressões. Piaget rejeitou a explicação lamarckiana (as respostas formuladas pelos indivíduos às pressões do meio ambiente são herdadas) e a darwiniana (que entendia as pressões ambientais como suscitando respostas aleatórias, com a sobrevivência do mais adaptado), pois, para ele, a primeira era mecanicista e a segunda não tinha objetivo. Segundo Doll Jr. (1997, p. 96-97), a epistemologia proposta por Piaget é o "terceiro caminho", que privilegia a "[...] interação entre o organismo e seu meio ambiente" ressaltando "[...] a maneira pela qual o organismo busca ativamente responder ao meio ambiente e ao mesmo tempo resiste a qualquer pressão para mudar seus próprios padrões”. O equilíbrio nunca é plenamente alcançado, haja vista que os estímulos do meio levam o organismo a reformular as suas estruturas. Porém, “o meio ambiente não molda o organismo; os organismos moldam a si mesmos”, não sendo, dessa forma, passivos, como se costumava pensar, mas dotados de uma capacidade de reagir positivamente às pressões ambientais. Antes de finalizar essa reflexão sobre as contribuições do construtivismo para a Educação, saliento a discussão que ele fomentou sobre o erro, notadamente no ambiente escolar, o qual só se revela como tal quando o sujeito é capaz de confrontar o seu conhecimento com o de outras pessoas, seja via movimento, oralidade ou registro. Assim, ele é uma etapa natural na elaboração do conhecimento, não devendo ser motivo de culpa, vergonha ou complexo de inferioridade. Conforme o referencial piagetiano, o erro pode ser compreendidocomo construtivo – indica progresso na atividade cognitiva da criança – e como não construtivo – não revela avanço na atividade cognitiva da criança. Essa diferença na natureza do erro demanda atitudes distintas do professor, motivo pelo qual devem ser demovidas condutas tolerantes em relação aos erros cometidos pelos estudantes, notadamente quando esses forem do tipo não construtivo, os quais indicam a necessidade de que o professor oportunize ao estudante ampliar seu universo conceitual. 63 Creio que as novas gerações têm o direito de desfrutar momentos de aprendizagem inspirados numa nova lógica de saber, dando-lhes a oportunidade de experimentar, descobrir, melhorar e aprender com os próprios equívocos, incrementando a autoimagem e a autoestima. A degustação de todas as formas de conhecimento permitirá que elas compreendam que o saber é histórico, pois que resulta da jornada da Humanidade na Terra, sendo, portanto, passível de modificação. Os postulados sócio-interacionistas ratificam o fato de que, para que a realidade educacional seja transformada, as práticas pedagógicas precisam considerar os processos intra e interpessoal que caracterizam a significação do saber, a qual nunca se encerra, haja vista que: “É na inconclusão do ser, que se sabe como tal, que se funda a educação como processo permanente. Mulheres e homens se tornaram educáveis na medida em que se reconheceram inacabados”. (FREIRE, 1997, p. 64). Os atos de aprender e ensinar, portanto, são atividades que caracterizam o existir humano, não sendo exclusividade do ambiente escolar, uma vez que ele é apenas um dos locais onde isso é possível de acontecer. A peculiaridade desse espaço é a possibilidade de os sujeitos nele estabelecerem vínculos muito mais intensos, pois frutos de um processo deliberado, permitindo-os participar do mundo com todas as suas habilidades, e não simplesmente para estarem nele, tal como objetos. A escola precisa, portanto, considerar o cotidiano, as experiências dos seus sujeitos, professor e estudantes, de modo que o saber os ajude a decifrar as complexas ligações entre os acontecimentos. Esse desafio, embora seja coletivo, precisa ser vivenciado por cada pessoa, pois ela necessita interpretar o mundo e constituir significado para a sua vida. A experiência implica a capacidade de aprender a partir da própria vivência. Experienciar é aprender; significa atuar sobre o dado e criar a partir dele. O dado não pode ser conhecido em sua essência. O que pode ser conhecido é uma realidade que é constructo da experiência, uma criação de sentimento e pensamento. (TUAN, 1983, p. 10). Diante do exposto, é necessárioque as relações entre os agentes pedagógicos sejam pautadas no respeito mútuo, condição indispensável para se estabelecer um diálogo, que substitua o monólogo que, acredito, impera na grande maioria das salas de aula. Nessa perspectiva, a oitiva é tão importante quanto a fala, devendo aquela preceder essa, sob pena de se produzir um monólogo estéril, inócuo. 64 O ato de ensinar anda de mãos dadas com o de aprender, aquele não está na frente desse, não o precede, mas se alimentam mutuamente. Essa também é a opinião de Freire (2009, p. 113): “Somente quem escuta paciente e criticamente o outro, fala com ele, mesmo que, em certas condições, precise de falar a ele. O que jamais faz quem aprende a escutar para poder falar com é falar impositivamente”. (Itálico no original). Reconheço que a ausência do diálogo não é privilégio da escola, mas nela os resultados são ainda mais catastróficos, considerando que a mensagem subliminarmente difundida é a de que o conhecimento é algo inútil e chato, que não tem nenhuma relação com a vida, com a realidade, seja a dos estudantes, seja a dos professores. Será que é possível sonhar com algo distinto? Vislumbro um cenário em que professor e estudantes assumam os papeis de flor e abelha, onde o conhecimento é o mel, tal como imaginado por Gibran (1970, p. 69): “[...] o prazer da flor é entregar o mel à abelha. Pois, para a abelha, uma flor é uma fonte de vida. E para a flor, uma abelha é mensageira de amor. E para ambas, a abelha e a flor, dar e receber o prazer é uma necessidade e um êxtase”. Kenski (2000, p. 137) ressalta o fato de que, numa prática apoiada nos ideais de Vygotsky, “[...] o poder da fala do professor é substituído pela interação, pela troca de conhecimentos e pela colaboração grupal a fim de se garantir a aprendizagem”, fortalecendo, dessa forma, o diálogo e as trocas de informações. Assim, na perspectiva do sócio-interacionismo, “As aprendizagens, o desenvolvimento do pensamento lógico e científico, realizam-se através da interação comunicativa, o que possibilita a construção social do conhecimento”. VERSÃO TEXTUAL Para se compreender a natureza das críticas ordinariamente enunciadas sobre o construtivismo, é necessário esclarecer que ele não é uma teoria educacional, como muitos estão habituados a pensar e propagar, mas uma teoria do conhecimento. Acredito que a grande dificuldade de se entender o potencial transformador do ideário construtivista reside no fato de que ele propõe uma forma radicalmente diferente de se explicar como o Homem aprende. As pessoas que buscam receitas para ensinar, que podem ser seguidas por qualquer indivíduo e em qualquer contexto social, acreditam que a mente é um processador de informações, motivo pelo qual o conhecimento pode e deve ser transmitido, de forma clara e precisa, pelo professor aos estudantes. Ora, não bastasse o fato de que o construtivismo não é uma pedagogia, pois afigura-se como uma epistemologia, ele fomenta o desenvolvimento de uma teoria da aprendizagem (e do ensino) que valoriza a interpretação, a produção de significados, o que só se efetiva quando o sujeito confronta a sua 65 realidade (social, emocional, cognitiva, ...) com a produção cultural a que tem acesso das mais variadas formas. O construtivismo, portanto, é um golpe no “computacionalismo”, que acredita no poder do professor de transferir conhecimento, e uma aposta no culturalismo, que crê na capacidade do estudante de produzir sentido. Não somente no Brasil, mas também no mundo, de um modo geral, a teoria do conhecimento que predomina nas salas de aula e dos professores, bem como nos gabinetes dos diretores e dos gestores, é o “computacionalismo”, expresso no intento de massificar, de produzir em série, de apresentar a solução para a maior quantidade de pessoas possível. É por isso que a crença de que o construtivismo seria a solução da Educação no contexto nacional se revelou um grande fiasco. O motivo do malogro, todavia, não está na explicação apresentada pela teoria construtivista, mas no nefasto uso e na distorção que dela fizeram, objetivando atingir objetivos distintos, e até mesmo contraditórios, dos que ela expõe. Da mesma forma, o responsável por esse fracasso não é o professor, que seria incapaz de compreender e pôr em prática os seus fundamentos, mas de uma proposta educacional que acredita que ele tem o poder de sozinho resolver todos os problemas, de naturezas diversas, que afligem os seus estudantes. O culturalismo demanda uma organização do trabalho escolar bastante diversa da que costuma caracterizar o cotidiano no Brasil. A autonomia do professor e estudante não pode ser entendida como um isolamento do sujeito da sua realidade, mas exatamente o contrário. Somente um indivíduo que experimenta o prazer de descobrir(-se) pode contribuir e facilitar para que outras pessoas também tenham o privilégio de o desfrutarem. Individualidade não é sinônimo de individualismo, uma vez que a vocação ontológica do Homem é se encontrar (e se perder) no e com o outro, numa perspectiva de união e não de isolamento. A relação do professor com o estudante é apenas uma das possibilidades de encontro que toda pessoa tem com seu ambiente (social/cultural e natural), o qual foi poeticamente descrita por Freire (2009, p. 134) assim: Estar disponível é estar sensível aos chamamentos que nos chegam, aos sinais mais diversos que nos apelam, ao canto do pássaro, à chuva que cai ou que se anuncia na nuvem escura, ao riso manso da inocência, à cara carrancuda da desaprovação, aos braços que se abrem para acolher ou ao corpo que se fecha na recusa. É na minha disponibilidade permanente à vida a que me entrego de corpo inteiro, pensar crítico, emoção, curiosidade, desejo, que vou aprendendo a ser eu mesmo em minha relação com o contrário de mim. E quanto mais me dou à experiência de lidar sem medo, sem preconceito, com as diferenças, tanto melhor me conheço e construo meu perfil. 66 O professor, desse modo, precisa viver a sua autonomia (entendida por mim como sempre inconclusa, merecedora, assim, de cuidado e dedicação ininterruptos) para que ele proponha atividades que contribuam e favoreçam o desenvolvimento da autonomia pelo corpo discente. Para tanto, é necessário que o ambiente e o material pedagógicos sejam ricos e diversos, possibilitando a exploração, pelos sujeitos, de opções, com incremento da respectiva flexibilidade, respeitando a diversidade que caracteriza o mundo, com a formulação de explicações que contemplem a complexidade da dinâmica da vida, e rejeitando aquelas que, deliberadamente ou não, a negam. O construtivismo, como teoria do conhecimento, favorece o desabrochar de uma ética nas relações humanas pautada na igualdade – pertencemos à mesma espécie – e na diversidade – a peculiaridade do que cada um viveu, vive e viverá – as quais não podem ser entendidas como antagônicas, mas como propiciadoras de crescimento. Professor e estudantes não são, portanto, oponentes, mas companheiros de uma mesma aventura, cada um procurando desempenhar seu papel da melhor forma possível, confiando e acreditando na lealdade de quem está ao seu lado (ou na sua frente... ou, ainda, atrás!). O fato de a autoria da aprendizagem ser individual, em virtude de a constituição de significados ser feita por cada pessoa, não significa, de forma alguma, que ela é desligada das relações sociais. Fonte [3] Considerando a reflexão desenvolvida sobre o construtivismo, é incorreto afirmar que o professor não pode ensinar, em virtude da singularidade da forma com que o Homem aprende, posto que ele continua a ocupar um papel de destaque na sala de aula. Sua importância é ainda mais enaltecida: ele é convidado a assumir a individualidade, a expor sua sensibilidade, a estabelecer vínculos afetivos com os seus estudantes, sendo a cultura e o conhecimento pretextos para que isso ocorra. O erro discente, nesse cenário, não é visto como catástrofe,uma vez que ele nos lembra haver sempre algo a ser aprendido, requerendo que o professor, com a sua gama de conhecimento e sensibilidade, o interprete e formule oportunidades e desafios para o estudante, continuamente, reelaborar a sua resposta. Acredito que essa atitude é sempre necessária, não apenas quando acontece um erro. Tendo em vista a crescente quantidade de saberes e a impossibilidade de dominá-la, mesmo que precariamente, como devem ser a Educação, o ensino, a aprendizagem e a relação professor-estudante? Diante de tantas informações, não há como se absorver, intuir um conhecimento geral, um saber daquilo que o ser humano supostamente deveria estar ciente. Não me iludo mais com isso. A única forma de se criar um conhecimento geral, um conhecimento inteiro, é dentro de cada pessoa, e só essa pessoa sabe quais são as informações necessárias para que ela mesma seja inteira. Isso não significa isolamento. Continuaremos nos influenciando uns aos outros, permanecemos inspirando uns aos outros, porém não devemos querer o controle sobre o outro, mas apenas 67 deixar disponíveis para o outro as informações que temos, e que o outro siga o próprio caminho. (LOUREIRO JR, 1996, p. 44). À luz das reflexões apresentadas, destaca-se o fato de que o Homem é um ser que necessita do encontro para se realizar como tal, não significando isso que os desentendimentos, as contradições sejam uma negação do processo. Enquanto há vida, ele está aprendendo, ampliando a sua capacidade de interpretar, de criar significados do mundo. O ponto de chegada nunca é definitivo, constitui-se apenas numa temporária escala para outras viagens, descobertas e aventuras. O desconhecido está sempre à sua frente, instigando-o a prosseguir, a avançar, demandando que cada pessoa seja movida pela fé, pela esperança e não pela certeza, a qual se revela inócua e incompatível com a dinâmica da natureza. A excessiva valorização da razão faz com que o Homem acredite que o conhecimento científico permite o controle do mundo. Essa crença origina muito sofrimento para o Homem, pois grandes são as suas frustrações – quando ele percebe, na maioria das vezes, que algo não saiu como ele desejava e queria que acontecesse – e pequenas e efêmeras são as suas alegrias – porque ele não está apto a dançar ao ritmo da melodia do universo e de se deliciar com os seus mistérios. Fonte [4] A não-permanência não é a exceção, mas é a regra da vida. Essa verdade requer que o Homem assuma o seu caráter finito e incompleto, o que não é nenhum demérito, nem motivo de sofrimento, mas a condição necessária para sempre crescer, aprender e usufruir das maravilhas que irrompem, a todo momento, ao seu redor e no seu interior. Para desenvolver o seu Eu, cada indivíduo precisa do outro, do não-eu, para formar um par e deslizar nos palcos do Planeta azul. Postulo a ideia de que a escola possibilite às pessoas aprenderem a valorizar o outro, a se alegrarem com o encontro, que sempre permite aprender algo. Afinal, descobrir a cultura ou o outro é, de certa forma, desvendar a si mesmo. A relação pessoal de homem para homem – no diálogo, no respeito e consideração, na confiança e no amor – não é mais, em sentido próprio, uma relação de sujeito e objeto, mas uma relação de sujeito para sujeito, de eu e tu. Daí que resultam estruturas e categorias completamente diferentes das que se encontram num esquema rígido de sujeito e objeto, dado que não se antepõe a mim uma coisa objetivamente apreensível e disponível, mas uma essência pessoal da mesma qualidade e mesmo valor que eu, que se abre ou se fecha livremente e que só posso ‘compreender’ na aceitação cheia de fé e confiança de sua livre auto-abertura. (CORETH, 1973, p. 99). Acredito que as ideias de Jacob Levy Moreno (1889-1974) e a concepção de conhecimento na Teoria de Santiago (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.) enriquecem e aprofundam os estudos sobre a construção do conhecimento, motivo pelo qual os professores devem conhecê-las. 68 DISCURSO OU PERCURSO: QUAL É A SUA PEDAGOGIA?, PAULO MEIRELES BARGUIL (CLIQUE AQUI PARA ABRIR) Fonte [5] Afinal, como o Homem aprende? Nos primórdios, quando éramos poucos e vivíamos em bandos, aprendíamos o necessário na convivência: vendo, sentindo, ouvindo, falando, fazendo e registrando. O desenvolvimento de habilidades acontecia com todo o corpo, num processo dinâmico e interativo. Diante de um mundo repleto de mistérios, incertezas, belezas e ameaças, a Humanidade desenvolveu várias formas de interpretá-lo — Arte, Ciência, Filosofia e Religião — e expressar o elaborado. Nessa jornada, ampliamos exponencialmente os nossos saberes, com algumas pessoas ocupando, em variados espaços-tempos, diferentes papeis na divulgação do sabido: ancião, pajé, professor, sacerdote... O saber instituído nos possibilita poupar tempo e vida, mas, também, é capaz de nos privar de espaço e descobertas. O conhecimento pode ser usado para tentar nos controlar ou nos convidar à entrega. A realidade, contudo, não pode ser apreendida diretamente pelos nossos sentidos, motivo pelo qual utilizamos instrumentos. Um signo é composto de SIGNIFICANTE — é de domínio público (por exemplo, o nome das letras, dos algarismos, das formas geométricas, das notas musicais...) e pode ser ensinado, em virtude da sua natureza arbitrária — e SIGNIFICADO — é constituído por cada pessoa (a compreensão e a degustação da sonoridade e do registro da Língua Materna, da Matemática, da Música...), num processo de mediação social, onde a atividade do sujeito é fundamental. As revoluções epistemológicas ocorrem em virtude do questionamento do estabelecido e da alteração da capacidade de divulgar, mediante variadas tecnologias, convicções. 69 A crença de que vivemos numa sociedade do conhecimento é inadequada, seja porque informação é diferente de conhecimento, seja porque toda a História da Humanidade é caracterizada pela dilatação da compreensão do Cosmos. Há bem pouco tempo, tínhamos a certeza de que a Terra estava no centro do Universo! Acreditávamos, também, que ele era bem menor do que é. Esse exemplo, para mim, ilustra bem o quanto ignoramos! Admito: não são poucas as pessoas que ainda acham que o mundo gira ao seu redor... O excesso de informação não é suficiente para transformar a qualidade da vida do Homem, pois ele tanto precisa acessar boas fontes, bem como dispor de tempo para empreender as mudanças, internas e externas, necessárias. Acredito, até, que a enxurrada de estímulos tem efeito contrário ao desejado, pois, sem o devido cuidado, ela nos distancia da nossa conexão com o Cosmos. Bruner acredita que existem duas formas de se entender a aprendizagem: o “computacionalismo” — o Homem, tal como um computador, processa informações, as quais se apresentam a ele num código linguístico compreensível — e culturalismo — o Homem, como um ser simbólico, interpreta os fenômenos do mundo a partir de sua singular constituição, fruto do que vivenciou. Essas concepções geram práticas educacionais, na escola e fora dela, antagônicas. No “computacionalismo”, o DISCURSO de quem sabe e o silêncio e a inércia de quem ignora são as características dessa pedagogia, que se baseia na crença de que os aprendizes são tábulas rasas, vazias, ou seja, desprovidas de movimentos, sonoridades, sentimentos e pensamentos — saberes. Dessa forma, o que eles são é inútil e deve ser jogado fora... Na escola, é responsabilidade do professor fornecer aos estudantes dados — significantes — para que esses executem os comandos cerebrais pertinentes e aprendam. No culturalismo, o sujeito e a sua realidade são o ponto de partida, o que coloca todas as pessoas em relativa igualdade, considerando a singularidade de ambos — indivíduo e contexto. É no PERCURSO, portanto, que a ação educativa, seja escolar ou não, acontece, com a transformação, em ritmos ímpares, de todos os envolvidos, que se percebem aprendizese, também, ensinantes. No contexto acadêmico, é atribuição do professor instigar e acompanhar, mediante atividades diversificadas, o desenvolvimento 70 integral de cada estudante, pois a compreensão — significado — de um mesmo acontecimento é única, considerando a especificidade pessoal. Nas últimas décadas, a distância entre as formas de se aprender, fora e dentro da escola, aumentou consideravelmente, pois as Novas Tecnologias da Informação e Comunicação ampliaram, em qualidade e quantidade, o conhecimento elaborado pelo Homem e a sua difusão. A permanência de ritos seculares na escola tem contribuído para que ela seja, cada vez mais, para muitos de seus agentes, um ambiente desagradável, inútil e, por vezes, hostil. Paulo Freire denunciou a Educação bancária — na qual o conhecimento é “guardado” em gavetas pelo estudante, após a transmissão acrítica dos conteúdos pelo professor — e defendeu uma Educação libertadora, problematizadora — o conhecimento é entendido pelo estudante na sua dimensão histórica, contemplando a sua construção e a sua importância, e elaborando sentido sobre o saber instituído. Nos multiplicamos, conforme orientação divina, e ocupamos quase toda a Terra, embora, por vezes, sem a atenção necessária! Movidos pela compreensão de que a nossa morada aqui é finita e pela ousadia que nos caracteriza, já vislumbramos a colonização de outros planetas. Em síntese: a Humanidade aprende porque, diante de um Mundo apinhado de segredos, tem a coragem de perguntar e buscar respostas. O conhecimento, portanto, é fruto da interação desencadeada por um problema, um desafio, a vida. Esse processo dura o tempo necessário para se encontrar uma solução considerada satisfatória e pode ser retomado a qualquer momento, quando os seus limites são descobertos. Que esse meu discurso inspire o nosso percurso... [Vestígios atávicos depois da chuva - 1934. Salvador Dali - 1904-1989] Fonte [6] A escola, conforme as considerações aqui delineadas, constitui-se num espaço de encontros entre pessoas com valores, crenças, sonhos e experiências diferentes. É importante que professores e estudantes aprendam a conviver com a diversidade, uma vez que a sociedade é ainda mais plural. É sobre isto que estudaremos nos próximos dois tópicos. PARADA OBRIGATÓRIA O processo ensino-aprendizagem e o papel do professor como gestor do pensar (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.). OLHANDO DE PERTO 71 “Ser” aluno: o segredo do “ser” professor (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.). FONTES DAS IMAGENS 1. http://3.bp.blogspot.com/_cRuDmNlXtmk/R2azZhC4UYI/AAAAAAAA AmQ/dyH8lOxCktU/s400/escola+tradicional.jpg 2. http://canilho.files.wordpress.com/2009/07/arte-escultura-benson- garden-sculpture-park-criancas-equilibrio.jpg 3. http://www.brasilescola.com/upload/e/relac%20prof-aluno%20-% 20C.E(1).jpg 4. http://www.oba.org.br/extranet/fotos/2009/8998_02_06_2009_10_0 6_04.jpg 5. http://www.luispellegrini.com.br/blog/wp- content/uploads/2011/11/Vest%C3%ADgios-at%C3%A1vicos-depois-da- chuva-de-Salvador-Dali2.jpg 6. http://www.cronicadodia.com.br/2015/04/discurso-ou-percurso-qual- e-sua.html 7. http://www.denso-wave.com/en/ Responsável: Professora Carmensita Matos Braga Passos Universidade Federal do Ceará - Instituto UFC Virtual 72 TÓPICO 04: (DES)ENCONTROS NA ESCOLA E NA SALA DE AULA: ÉTICA, DIÁLOGO E VIOLÊNCIA - I REFLEXÃO Os desafios educacionais contemporâneos possuem um componente afetivo, que se explicita nos crescentes conflitos entre os agentes pedagógicos, que têm como característica comum a falta de respeito. Nesse tópico e no seguinte, procuraremos responder às seguintes perguntas: • Por que será que as pessoas se agridem cada vez mais? • O que é necessário para se estabelecer o diálogo? • A escola pode fazer algo para diminuir a violência? NA ESCOLA, CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE (CLIQUE AQUI PARA ABRIR) Fonte [1] Democrata é Dona Amarílis, professora na escola pública de uma rua que não vou contar, e mesmo nome de Dona Amarílis é inventado, mas o caso aconteceu. Ela se virou para os alunos, no começo da aula, e falou assim: ― Hoje eu preciso que vocês resolvam uma coisa muito importante. Pode ser? ― Pode – a garotada respondeu em coro. ― Muito bem. Será uma espécie de plebiscito. A palavra é complicada, mas a coisa é simples. Cada um dá sua opinião, a gente soma as opiniões e a maioria é que decide. Na hora de dar opinião, não falem todos de uma vez só, porque senão vai ser muito difícil eu saber o que é que cada um pensa. Está bem? ― Está – respondeu o coro, interessadíssimo. ― Ótimo. Então, vamos ao assunto. Surgiu um movimento para as professoras poderem usar calça DIDÁTICA GERAL AULA 02: EDUCAÇÃO: NOVOS PARADIGMAS 73 comprida nas escolas. O governo disse que deixa, a diretora também, mas no meu caso eu não quero decidir por mim. O que se faz na sala deve ser de acordo com os alunos. Para todos ficarem satisfeitos e um não dizer que não gostou. Assim, não tem problema. Bem, vou começar pelo Renato Carlos. Renato Carlos, você acha que sua professora deve ou não usar calça comprida na escola? ― Acho que não deve – respondeu, baixando os olhos. ― Por quê? ― Porque é melhor não usar. ― E por que é melhor não usar? ― Porque minissaia é muito mais bacana. ― Perfeito. Um voto contra. Marilena, me faz um favor, anote aí no seu caderno os votos contra. E você, Leonardo, por obséquio, anote os votos a favor, se houver. Agora quem vai responder é Inesita. ― Claro que deve, professora. Lá fora a senhora usa, por que vai deixar de usar aqui dentro? ― Mas aqui dentro é outro lugar. ― É a mesma coisa. A senhora tem uma roxo- cardeal que eu vi outro dia na rua, aquela é barbara. ― Um a favor. E você, Aparecida? ― Posso ser sincera, professora. ― Pode não, deve. ― Eu, se fosse a senhora, não usava. ― Por quê? ― O quadril, sabe? Fica meio saliente... ― Obrigada, Aparecida. Você anotou, Marilena? Agora você, Edmundo. ― Eu acho que Aparecida não tem razão, professora. A senhora fica muito bacana de calça comprida. O seu quadril é certinho. ― Meu quadril não está em votação, Edmundo. A calça, sim. Você é contra ou a favor da calça? ― A favor 100%. ― Você, Peter? 74 ― Para mim, tanto faz. ― Não tem preferência? ― Sei lá. Negócio de mulher eu não me meto, professora. ― Uma abstenção. Mônica, você fica encarregada de tomar nota dos votos iguais ao do Peter: nem contra, nem a favor, antes pelo contrário. Assim, iam todos votando, como se escolhessem o Presidente da República, tarefa que talvez – quem sabe? – no futuro sejam chamados a desempenhar. Com a maior circunspeção. A vez de Rinalda. ― Ah, cada uma na sua. ― Na sua, como? ― Eu na minha, a senhora na sua, cada um na dele, entende? ― Explique melhor. ― Negócio seguinte. Se a senhora quer vir de pantalona, venha. Eu quero vir de midi, de máxi, de short, venho. Uniforme é papo furado. ― Você foi além da pergunta, Rinalda. Então é a favor? ― Evidente. Cada um curtindo à vontade. ― Legal! – exclamou Jorgito – Uniforme está superado, professora. A senhora vem de calça comprida, e a gente aparecemos de qualquer jeito. ― Não pode – refutou Gilberto – vira bagunça. Lá em casa, ninguém, anda de pijama ou de camisa aberta na sala. A gente tem de respeitar o uniforme. Respeita, não respeita, a discussão esquentou, Dona Amarílis pedia ordem, ordem, assim não é possível, mas os grupos haviam se extremado, falavam todos ao mesmo tempo, ninguém se fazia ouvir, pelo que, com quatro votos a favor da calça comprida, dois contra, e um tanto-faz, e antes que fosse decretada por maioria absoluta a abolição do uniforme escolar, a professora achou prudente declarar encerrado o plebiscito, e passou à lição de História do Brasil. Fonte: (SABINO, 2002, p. 54-57) REFLEXÃO Diariamente, ouvimos (e falamos) sobre a falta de ética. 75 • O que é ética, afinal? • Como se aprende a ser ético? • É possívelensiná-la (na escola)? Se sim, como? Ética, conforme o Dicionário Aurélio, é: (clique aqui para abrir) “[Fem. substantivado do adj. ético.] S. f. 1. Estudo dos juízos de apreciação referentes à conduta humana suscetível de qualificação do ponto de vista do bem e do mal, seja relativamente a determinada sociedade, seja de modo absoluto.” (FERREIRA, 1993, p. 733). De acordo com a definição supra, a Ética contempla o julgamento do comportamento do Homem, à luz de determinados valores, dentre os quais se destaca o respeito (e o cuidado) pela vida. • O que revela este descaso por ela? • Por que é difícil (e necessário) dialogar, principalmente na seara educacional? Socializo a seguinte reflexão de Barguil (2006, p. 166-167): [...] a forma como me relaciono com o outro está em sintonia com a forma como me relaciono comigo. Todo educador precisa aprender a olhar para dentro de si, perceber o que se passa no seu interior, acolhendo, também, o não-eu, tanto aquilo que já vive como o que ainda não veio à tona. Essa abertura se exerce também quando ele abraça o aluno, com os seus saberes, peculiaridades e limitações. Cônscio das incompletudes que permeiam o seu viver, o educador desenvolverá atividades entremeadas de um sentimento de humildade diante do universo, que se apresenta como eterno desconhecido. Ele, portanto, precisa ter uma relação com o saber compatível com aquela que deseja que seus alunos tenham consigo mesmos e com os outros: “Como professor não me é possível ajudar o educando a superar sua ignorância se não supero permanentemente a minha. Não posso ensinar o que não sei”. (FREIRE, 1997, p. 107). Viva o diálogo! (Itálico no original) A despeito de objetivar a compreensão da realidade escolar, postulo o argumento de que essas considerações possam (e precisem) ser ampliadas para um contexto mais amplo, que congregue a sociedade como um todo, pois em ambos é sintomática a negação do direito de individuação. Pensar sobre o Homem é difícil também, porque sendo o Homem, ao mesmo tempo, sujeito e objeto da reflexão, essa tarefa significa um desvelar do nosso próprio ser, uma compreensão das nossas crenças e uma busca de desmistificação de ideologias que, ao longo de nossa vida, sedimentaram-se em 76 nossa forma de ver e pensar o mundo. (GONÇALVES, 1994, p. 74). O Homem se caracteriza por um movimento ambíguo, do qual dificilmente ele se apercebe. Por um lado, ele intenta descobrir, ser diferente, inovar, aventurando-se no desconhecimento; de outra parte, ele quer sentir- se seguro, ter certezas, protegido das ameaças do inesperado. A convivência de cada pessoa com seus semelhantes possibilita tanto a identificação como a diferenciação, ou, pelo menos, deveria ser assim, uma vez que aquela não é mero reflexo da realidade, pois, constantemente, interpreta-a, valora-a e cria significados, ou seja, (re)elabora a sua subjetividade. REFLEXÃO Há, entretanto, uma tentativa incessante de festejar e privilegiar o ideal de homem-modelo. • A quem interessa a padronização? • O que leva as pessoas a não se diferenciarem umas das outras e passarem a pensar, a almejar as mesmas coisas? • Qual é o preço que elas pagam por essa negação de si mesmas? Atualmente, é fácil perceber que a padronização é um dos pilares do capitalismo, que instituiu a produção em série, tomando o lugar da manufatura, do artesanato, que se caracteriza pela peculiaridade de cada peça. Fonte [2] A escola, na maior parte das vezes, organiza as suas práticas baseadas num estudante-modelo, tanto como ponto de partida como de chegada, as quais requerem, também, um professor-padrão. Agindo assim, ela elimina qualquer possibilidade de os agentes pedagógicos (estudantes e professores) se perceberem como sujeitos singulares, particulares, distintos de todos os outros, de conceberem, continuamente, a autopercepção, a autoestima e o autoconceito. Acredito que toda pessoa tem o direito inalienável de desenvolver a sua subjetividade, entendida não como algo estático, mas como um universo em movimento e expansão. Para tanto, ela precisará desenvolver uma intensa relação com o meio ambiente, a qual permitirá que ela descubra o que aprecia e o que rejeita, vislumbrando novos horizontes e despertando porções interiores adormecidas. Para que isso ocorra, o indivíduo deve estar em sintonia com os seus afetos, as suas emoções, sob pena de viver como um autômato, que executa, mas não sente, que faz, mas não avalia, sendo incapaz de identificar as 77 situações que lhe são prazerosas ou não e, posteriormente, de escolher o que gostaria de viver. Para reaver a subjetividade e favorecer o processo de individuação, é indispensável que a Educação propicie situações em que o sujeito, superando a sua visão quantificadora, fragmentadora, valorize as suas emoções, o seu corpo, superando a oposição destes em relação à mente e à razão (FONTANELLA, 1995, p. 10), e desenvolva uma compreensão holística, que percebe as sutis relações entre as partes e o todo e se renda à impossibilidade de medir as belezas da vida, não capturáveis por uma lógica linear, exata. Para Gonçalves (1994), a corporalidade, que contempla tudo aquilo que diz respeito ao indivíduo, costuma ser ignorada e reprimida na escola, o que enseja sua recuperação, de forma a contemplar tanto o educando como o educador. Michel Foucault (1926-1984) [3] Foucault (2002) analisou, com detalhes, como o corpo foi tratado na História. O controle dos corpos, até o século XVII, era exercido através de práticas de suplício contra o corpo. A partir do século XVIII, devido à Revolução Industrial, ao aumento da produção e à explosão demográfica, surge uma nova modalidade de poder, denominada por Michel Foucault (1926-1984) disciplina, a qual tem como alvo o corpo humano, mas não mais para supliciá-lo ou mutilá-lo: seu objetivo é aprimorá-lo, adestrá-lo para que possa melhor servir. A disciplina, portanto, visa à produção de corpos submissos, dóceis. Para alcançar esses objetivos, o espaço escolar foi projetado para possibilitar que o professor pudesse controlar os seus estudantes, verificando se eles estavam se comportando conforme o esperado. No entendimento de Foucault, ensinar é uma forma de disciplinar, motivo pelo qual afirma que a escola passou a ser uma máquina de “[...] vigiar, hierarquizar, de recompensar”. (FOUCAULT, 2002, p. 126). Desde os primórdios, o Homem, para conhecer o seu ambiente, movimenta-se com o seu corpo no espaço, fazendo indagações, vislumbrando possibilidades, avaliando resultados, buscando opções, alargando, continuamente, seus horizontes, numa graciosa dança existencial, ao som de uma música cuja melodia expressa a convicção de que há sempre algo novo (BARGUIL, 2000). Privá-lo disso é, sem dúvida, negar-lhe o direito de aprender, de transcender. A imposição de um espaço e de um tempo tem como finalidade a submissão do sujeito. Ao longo da História, a Humanidade tem utilizado as suas habilidades físicas, emocionais e cognitivas de modo diverso. Nas sociedades pré- industriais, o corpo tinha grande importância na identidade pessoal bem como para o funcionamento da sociedade, uma vez que a força, destreza e agilidade eram importantes em torneios, em competições, na guerra e na política (GONÇALVES, 1994, p. 18). Com a produção capitalista, o Homem inaugurou relações diferentes com a natureza, modificando o seu corpo, bem como distanciando-se do produto – externo e interno – do seu trabalho, uma vez que foram dissociadas as suas forças corporal e espiritual (GONÇALVES, 1994, p. 22). 78 Embora o cerceamento dos corpos, dos movimentos, das emoções, seja ainda a realidade da grande maioria das nossas escolas, muito me anima saber que os rituais escolares são processos históricos, como tais, passíveis de mudança, de transformação. Para McLaren (1992, p. 354), embora os ritos sejam estabelecidos pela instituição escolar e adotados pelos professores, eles são intensamentequestionados pelos estudantes, que utilizam os seus corpos e as suas falas para expressar a sua insatisfação. Esse desagrado em relação ao instituído, com a disciplina, com o controle dos corpos, das mentes e dos corações não é mais aceito como o era até recentemente. A globalização, ao tentar impor a uniformização de costumes, povos e línguas, possibilitou ao Homem valorizar as suas diferenças e lutar pelo direito de permanecer com a sua singularidade, originando mais conflito do que se esperava (ROCHA, 2000, p. 142). No entendimento de Illich (1977, p. 77), a escola, ao instituir a aprendizagem em matérias, fragmentando o conhecimento, forma “[...] dentro do estudante um currículo feito desses blocos pré-fabricados”. Essa cisão do estudante é acompanhada pela negação da subjetividade, pois o ato de avaliar é quase sempre assumido pelo professor, retirando a possibilidade de olhar para si, de assumir a responsabilidade pela sua vida e reforçando um padrão de subserviência à opinião, ao controle de outrem, não contribuindo para o desenvolvimento da individualidade e aprofundando a alienação. Conforme Linhares (2003, p. 240), ao tentar por sobre alguém sentidos já prontos, retira-se desse a possibilidade de, durante a obra, experimentar e criar. Essa doação de sentidos tem uma mecânica que simula o utilitarismo fabril dominante. A Arte na Educação, por vezes, sucumbe ao medo de produzir e experienciar sentidos. Bruner (2001, p. 44) assinala que a humanidade organiza e administra o conhecimento do mundo de duas formas: • O pensamento lógico-científico (que a permite tratar de coisas) e • O pensamento narrativo (que a habilita lidar com pessoas e condições). Para ele, é inaceitável o fato de que a maioria das escolas não valorize as artes da narrativa – canto, drama, ficção, teatro etc. – compreendendo-as apenas como uma decoração, uma vez que o Homem sempre utiliza o discurso narrativo para contar histórias. Isso se torna ainda mais grave, diante da afirmação de psicanalistas de que a neurose “[...] é um reflexo de uma história insuficiente, incompleta ou imprópria que um indivíduo tem de si mesmo”. (BRUNER, 2001, p. 44). A Arte na escola, portanto, não é apenas um enfeite, mas uma necessidade vital que é, há muito tempo, negada aos sujeitos pedagógicos. O espaço da estética não pode ser de responsabilidade apenas de uma pessoa, 79 em um momento e em um lugar determinados, mas deve inspirar o projeto político-pedagógico da escola, sob pena de falsear a transformação que pretende promover. Isso não quer dizer que a presença de um profissional habilitado seja dispensável, muito pelo contrário. Considerando a aridez da formação de quase todos os nossos professores, ele é necessário para que esse projeto se efetive e avance com a colaboração da comunidade escolar. Na opinião de Matos (2002, p. 18), ensinar é pensar com o outro, é ter esperanças coletivas. Diante da constatação de que o mundo moderno privilegia o isolamento, promove o distanciamento (físico, afetivo e cognitivo) entre as pessoas, esse autor defende a ideia de que a arte, por expressar o inenarrável, contribui na importante aprendizagem de se colocar no lugar do outro. Também no domínio estético, o estudante tem progressos a realizar: que as obras das quais ele é o autor tornem-se cada vez mais suas, respondam às preocupações de ordem e que a visão do belo esteja cada vez mais aí presente; que sua própria iniciativa se separe, que saia do banal, de seu banal e a seu modo, para se estabelecer em um nível mais alto da emoção estética. E paralelamente para as obras admiradas por ele. (SNYDERS, 1988, p. 253). Somente dialogando, é possível ao sujeito compreender o outro e a si mesmo, o que ocorre de forma simultânea. Esse aprendizado é inesgotável, uma vez que ambos estão em constante mudança. A identificação de novos elementos está ligada à criatividade, capacidade de interpretar de forma distinta a situação renovada, agindo de maneira que leve em conta as transformações ocorridas, não se limitando, portanto, à repetição do que foi feito, o que demanda contínua flexibilidade. A urgência do estudo da corporalidade reside no fato de que, com exceção da Psicomotricidade e disciplinas correlatas voltadas à Educação Infantil, não há na Educação um cuidado com o corpo, o que, acredito, diminui sobremaneira as possibilidades de transformação da escola e de suas práticas. Conceber a corporalidade integrada na unidade do homem significa resgatar o sentido do sensível e do corpóreo na vida humana. A práxis humana se efetiva porque o homem é um ser corpóreo, que possui necessidades materiais e espirituais. Sua relação com o mundo não é simplesmente a relação de uma consciência que pensa o mundo, sem deixar-se tocar, mas é a relação de um ser engajado no mundo – que tem emoções, que ama, que odeia, que tem fome, que tem dor, que vive a solidão, a amizade, o desprezo etc. –, enfim, de um ser que sente, solo sobre o qual o pensamento se edifica. Da práxis humana e dos modos dela decorrentes de coexistência entre os homens criam-se formações ideológicas, que impregnam sua maneira de ser. Assim, podemos compreender as formas alienadas de o homem sentir e pensar, no mundo 80 contemporâneo, são como que penetradas pelo tecido econômico que se tornou, no sistema capitalista, o prisma do qual as coisas mundanas fundam seu sentido. Essas formas estão in“corpo”radas em seu ser e encerram todas as distorções e os tipos de alienação que o homem contemporâneo, que se manifestam tanto nas relações inter-humanas, nas relações com a natureza e com a cultura, como nas formas de o homem lidar com sua corporalidade. (GONÇALVES, 1994, p. 176-177). Outro indício da negação da subjetividade é a crescente violência escolar. Embora esse fenômeno seja muito complexo, e contemple acontecimentos que são sociais e invadem o espaço acadêmico, como é o caso das drogas e das gangues, é inegável que a violência simbólica, verbal e institucional, a que são submetidos professores e estudantes, está cada vez mais intensa. Continuaremos esta temática no tópico seguinte. NEXOS, PAULO MEIRELES BARGUIL (CLIQUE AQUI PARA ABRIR) Fonte [4] Solto altas gargalhadas internas quando ouço as pessoas dizerem que nunca estivemos tão conectados! Penso exatamente o contrário: nunca estivemos tão desconectados, conosco e com os outros. Mais adequado seria dizer que nunca, na História da Humanidade, estivemos tão plugados... Nexum, em latim, de onde se origina nexo, significa, conforme o Houaiss, atar, ligar, travar, entrelaçar, unir e prender. A Humanidade, há milênios, busca entender o Universo, bem como a natureza desse safári ontológico, em que cada pessoa é, ao mesmo tempo, caça e caçador, como já cantara Milton Nascimento, em Caçador de mim. Há quem defenda que a existência, o sentido do mundo está nele mesmo, não sendo necessária a participação, a intervenção do Homem. Outros, contudo, argumentam que, sem o Homem, o mundo não existe, pois é aquele que ratifica a existência desse. Piaget, no século passado, diferenciara duas formas de o Homem conhecer o mundo: a abstração empírica – somente mediante a observação – e a abstração reflexiva – relação, conexão entre objetos, acontecimentos. 81 Embora ambas estejam relacionadas, elas se diferenciam pelo tempo dedicado e o produto alcançado. Se na abstração empírica é possível se pensar em percepções semelhantes, o mesmo não se pode imaginar na abstração reflexiva. Ao que consta, Buda ensinou que o caminho do meio, aquele que fica entre os extremos, nos leva ao equilíbrio. A aceitação disso, contudo, não é suficiente porque permanece o desafio de encontrar os limites, que raramente são apenas dois, e balancear aspectos não quantificáveis... Postulo que o sentido do mundo não está nele, mas é elaborado por cada pessoa, os quais se modificam infinitamente. A enxurrada de estímulos proporcionada por variadas parafernáliastecnológicas, que estão cada vez mais disponíveis, não tem o poder de nos integrar, mas talvez para o contrário... Devoradores de pixels, o Homem se vicia nesse tipo de alimento, que o nutre cada vez menos, fazendo com que ele o busque em doses crescentes, ao mesmo tempo em que contribui para o desenvolvimento de percepção fragmentada da realidade. Transferimos, sem que percebamos, parte significativa da nossa identidade para tais aparatos e nos tornamos objetos deles, quando deveria ser o contrário... Permanece, contudo, e se amplia, a necessidade de ser visto e valorizado, tal como facilmente se constata nos selfies e respectivas postagens. — Veja o que eu estou fazendo! Veja como eu sou feliz! Veja como eu sou demais! — gritamos no fundo da caverna, na esperança de que alguém estabeleça, pelo menos, um meteórico contato: curti!. Que sorte quando alguém comenta! Que maravilha quando uma conversa se estabelece. Fomos infectados, e não sabemos, por um vírus parasita, que se alimenta das nossas riquezas mais profundas, exaurindo-as. O Homem é resultado do que se alimenta e da forma como digere os respectivos nutrientes. O tempo outrora dedicado à preparação da refeição e à degustação, momentos fundamentais no equilíbrio pessoal, pois frutos do autocuidado, é canalizado à deglutição voraz. — Eu não tenho tempo! — dizemos, visivelmente alterados, a todo momento — enquanto corremos de um lado para outro, na horizontal ou na vertical. 82 A qualidade das nossas conexões, nos nossos vínculos, internos e externos, é influenciada pelo que ingerimos e como o fazemos, e não pela quantidade do que engolimos... Essa crônica tem nexo? Fonte [5] MULTIMÍDIA Violência na escola [6]. LEITURA COMPLEMENTAR Ensinar a alegria (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.). FONTES DAS IMAGENS 1. http://petragaleria.files.wordpress.com/2007/11/2007_aula_classe_sch ool_classroom_2.jpg 2. http://liamaral26.files.wordpress.com/2009/09/auto-estima-ii.jpg 3. http://upload.wikimedia.org/wikipedia/en/5/52/Foucault5.jpg 4. http://3.bp.blogspot.com/_4wz- Qm4WlRI/TJEgiKGbYbI/AAAAAAAAAEo/QxigVK8Nfcs/s1600/confusao_c om_orquideas_by_acida.jpg 5. http://www.cronicadodia.com.br/2014/11/nexos-paulo-meireles- barguil.html 6. http://www.youtube.com/watch?v=ljvX64CYJrc) 7. http://www.denso-wave.com/en/ Responsável: Professora Carmensita Matos Braga Passos Universidade Federal do Ceará - Instituto UFC Virtual 83 TÓPICO 05: (DES)ENCONTROS NA ESCOLA E NA SALA DE AULA: ÉTICA, DIÁLOGO E VIOLÊNCIA - II Fonte [1] No Brasil, é assustadora a quantidade de matérias nos diversos meios de comunicação que relatam fatos de violência que acontecem na escola: “Ameaças e agressões dos alunos contra professores, violência sexual entre alunos e alunas, uso de armas, consumo de drogas, roubos, furtos e assaltos, violência contra o patrimônio” (ABRAMOVAY; RUA, 2004, p. 22). Ressalto que esses acontecimentos não são privilégio do contexto nacional, mas estão globalizados. A escola pública tem se surpreendido como o fato de ser subitamente assaltada por uma população crescente de gangue de subúrbio. Os educadores não parecem distinguir simples agrupamentos da rapaziada de grupos já com funcionamento mais ostensivo, que utilizam violência. (LINHARES, 2003, p. 147). A UNESCO, no Brasil, promove, desde 1997, inúmeras pesquisas sobre temas diversos – juventude, violência e cidadania – com o objetivo de contribuir para o desenvolvimento de políticas públicas que possam, efetivamente, resolver os diversos problemas que atingem essa parcela da nossa população: exclusão social, mercado de trabalho, família, educação, participação social... (ABRAMOVAY; RUA, 2004, p. 32). Na opinião de Debarbieux (apud ABRAMOVAY, 2003, p. 18-19), a violência no cotidiano das escolas está associada a três dimensões: degradação do ambiente escolar; violência que entra na escola, pela ação das gangues, das drogas; componente interno da escola. A partir de uma pesquisa realizada, em 2001, em quatorze capitais brasileiras, Abramovay (2003, p. 73-74) propõe que a violência seja entendida de duas formas: TIPO 01 • "Intervenção física de um indivíduo ou grupo contra a integridade de outro(s) ou de grupo(s) e também contra si mesmo” TIPO 02 • "Violência simbólica (abuso do poder, baseado no consentimento que se estabelece e se impõe mediante o uso de símbolos de autoridade); verbal e institucional (marginalização, discriminação e práticas de assujeitamento utilizadas por instituições diversas que instrumentalizam estratégias de poder)”. DIDÁTICA GERAL AULA 02: EDUCAÇÃO: NOVOS PARADIGMAS 84 Fonte [2] Para uma análise mais apropriada da violência no ambiente escolar, é necessário, portanto, perceber-se que essas formas têm origens diversas, motivo pelo qual ela precisa ser entendida a partir de várias perspectivas. Inicialmente, é de fácil constatação o fato de que a violência está em toda a nossa sociedade, não sendo um privilégio da escola. A insatisfação é sentida tanto pelos jovens como pelos membros do corpo técnico-pedagógico. Há mútuas críticas e acusações e a escola aparece, ao mesmo tempo, como causa, consequência e espelho dos problemas aos quais, muitas vezes, não consegue responder e cuja solução não se encontra ao seu alcance. (ABRAMOVAY; RUA, 2004, p. 93-94). Isso, porém, não significa que ela nada pode fazer a respeito, como se estivesse à mercê dos acontecimentos. É necessário identificar as práticas escolares que, por meio de amplo e profundo processo de segregação, fomentam, silenciosamente, a violência nos (e dos) agentes pedagógicos. Acredito que a tristeza, a apatia e a indiferença que muitos daqueles sentem nas nossas escolas revelam uma insatisfação com o que nelas vivem. Conforme Abramovay (2003, p. 78), a relação professor-estudante, o centro do processo educacional, está bastante deteriorada, desgastada, não somente na escola pública! Os jovens da pesquisa reclamaram que: i) os professores estão afastados da sua cultura; ii) os seus códigos culturais não são compreendidos; iii) eles não são escutados; e iv) eles são etiquetados. Eles declararam sentir haver um “[...] enorme buraco que os separa dos adultos”. Por sua vez, os professores e os membros do corpo-técnico se ressentem com a falta de respeito, ameaças e humilhações proferidas pelo corpo discente. Dessa forma, é fácil entender a razão pela qual as relações de confiança são quase inexistentes e por que é tão difícil haver diálogo. [...] [O] conhecimento do outro não quer dizer apenas que é o outro que o possui mas que meu conhecimento comporta dentro dele esse olhar do outro e, também, que o outro possui saber e essa relação que eu estabeleço sempre envolve a dimensão desiderativa, além da cognitiva. Na Escola, onde o sujeito epistêmico se relaciona com seus pares e com o 85 educador, a socialidade vai sendo esculpida nos corpos. É nessa instituição o lugar onde se passa o saber sistematizado e, nela, um sujeito se constrói com a mediação do outro que é o grupo (no sentido lato). Nesse lugar de passagem do conhecimento (porque o conhecimento é algo que migra) também vai-se esculpindo nos sujeitos a vestidura da socialidade com seus silêncios, conflitos, lacunas, palavras, ritos. Na escola, ao operarmos com os aspectos lógicos e linguísticos, da linguagem e do número, costumamos excluir da cena todo um campo de expressão que não envolve apenas esse modo de estruturação do pensamento. (LINHARES, 2003, p. 205). OBSERVAÇÃO Embora a escola seja, presumidamente, o local privilegiado do conhecimento na sociedade, parece que ele não é usufruído pelas pessoas que a frequentam. Esta constatação revela um profundo desconhecimento do outro, da sua realidade, da sua necessidade, dos seus sentimentos, expresso na falta de cuidado, de atenção. Na escola, nos últimos anos, a violência física ou psicológica –empurrões, gestos, rejeição ou divulgação de apelidos ofensivos – entre colegas, repetitiva e sem razão aparente tem sido chamada de bullying [3]. (do inglês bully, que significa tiranizar, oprimir, ameaçar ou amendrontar) Fonte [4] Diversos estudos constatam o fato de que a cultura dos educandos não é devidamente considerada na escola pelos educadores, que a rejeitam sistematicamente, seja ignorando-a, seja desqualificando-a. A consequência dessa atitude pedagógica é, como relatei há pouco, a impossibilidade dos estudantes constituírem a sua subjetividade, com a reinterpretação da sua cultura. Até quando a escola, mediante suas práticas pedagógicas, permanecerá surda, estática e insensível a tais denúncias? Existe nas escolas uma multiplicidade de vozes, de corpos e movimentos. Movimentos e corpos que se apresentam de forma diferenciada nas posturas de professores e alunos. Sem precisar dizer, é possível saber que pela “fala” do corpo a identidade de seu dono e a sua posição no contexto educativo: os que “ensinam” e os que “aprendem”. Estes últimos, crianças e jovens em geral, possuem hábitos, atitudes e comportamentos que revelam um nova cultura, em muitos casos ignorada (em alguns casos, rejeitada) pela escola. (KENSKI, 2000, p. 126). 86 Observei, então, em um movimento de construção teórica que foi se urdindo aos poucos, que a expulsão da cultura do educando, em suas formas expressivas, poéticas e o trabalho com esta forma de conhecer que é a arte, se fazia às expensas da mutilação de dimensões vitais. O modo como as classes populares se situavam socialmente no mundo do trabalho e a forma de a escola pública funcionar como agenciadora de mão-de-obra, fazia com que a cultura escolar fosse uma cultura do sacrifício. Já que para as classes populares trabalho é sacrifício, a escola funcionaria como um treinamento para a sujeição. (LINHARES, 2003, p. 27). REFLEXÃO O desafio da comunidade escolar é responder a seguinte indagação: “De que forma desenvolver uma experiência educativa que estabeleça a relação direta com o mundo real, com o trabalho, seus fins e consequências para o homem, a sociedade humana e a natureza?”. (SOARES, 2000, p. 53). Para confrontar essa alienação, dentre outras coisas, é necessária uma nova compreensão da relação entre as partes e o todo, que, superando a visão mecanicista, reducionista, atomística, que enfatiza as partes, privilegie o todo, o organismo, a ecologia, instaurando, dessa forma, uma perspectiva holística, sistêmica, expressa no “pensamento sistêmico” (CAPRA, 2001, p. 33). Outro aspecto que pode contribuir para essa transformação é que a ideia de ordem estabelecida pela Física não newtoniana chegue à escola, permitindo que as relações entre professores e estudantes mudem drasticamente, as quais “[...] exemplificarão menos o professor instruído que informa os alunos não-instruídos, e mais um grupo de indivíduos interagindo juntos na mútua exploração de questões relevantes” (DOLL JR, 1997, p. 37). Profícuas também são as investigações sobre a satisfação que os estudantes têm com o (ou no) prédio escolar. Loureiro (1999, p. 69-70) relata que as crianças das escolas pública e privada “[...] têm diferentes formas de estruturar sua satisfação com o prédio escolar – o foco central para os dois grupos é a experiência direta com a sala de aula”. Para as primeiras, porém, a disponibilidade de biblioteca e quadra de esporte é valorizada, enquanto que, para as outras, a satisfação depende da qualidade do ensino ministrado. As imagens falam por si mesmas. A “escola-jaula” está aí a nos lembrar a necessidade de superar a escola que priva da liberdade, que adestra por meios de castigo e, mais ainda, que produz o “tédio e a revolta” própria aos animais enjaulados: por um lado, a “escola-açougue”, este lugar que destrincha, que divide, que esquartela, que tortura física e mentalmente, precisa ser superado por uma escola que tenha como função social a produção da unidade e da homogeneidade. Nesse ambiente, a 87 diferenciação, base da hierarquia educativa, é fruto da ação dos próprios sujeitos – as crianças –, observados e conduzidos pelo professor, que, é bom observar, também incorporou outras funções e qualificações na nova ordem escolar: a de psicólogo e a de analista. (FARIA FILHO, 2000, p. 79). Fonte [5] A violência simbólica na (e da) escola, portanto, se manifesta no seu distanciamento em relação à realidade, permeada de contradições. Para romper esse isolamento, essa atitude de dar as costas aos conflitos e às demandas crescentes (atingíveis?), é preciso desenvolver uma Educação transformadora, crítica, que não tem medo de enfrentar os desafios de quem luta por uma sociedade mais justa, verdadeira e livre (GONÇALVES, 1994, p. 124). Essa também é a opinião de França (1994, p. 67), pois, diante do divórcio entre a vida e a universidade, denunciada pelos estudantes, advoga a noção de que os valores educacionais devem ser repensados. Por isso, ela postula a noção de que a escola seja utilizada como “[...] um território da contradição, onde pode surgir uma contra-corrente, uma contra-ideologia, ou qualquer outra variação semântica”, permitindo-nos formular, assim, uma perspectiva de mudança (FRANÇA, 1994, p. 99). Ao longo da sua existência, a escola desenvolve, em virtudes de motivações diversas (políticas, religiosas, epistemológicas), as quais devem ser entendidas de forma contextualizada e numa perspectiva relacional, práticas que objetiva(va)m o disciplinamento, o controle do corpo. Rocha (2000) elaborou cuidadosa e detalhada pesquisa sobre as formas de como o exercício do controle, da vigilância na escola se transformou. Embora as estratégias, os meios, tenham se atualizado, a intenção permaneceu a mesma: “[...] disciplinar, manter, aprisionar, anestesiar, acalentar, educar” (ROCHA, 2000, p. 144). Essa mudança dos meios, que se tornaram, pelo menos no discurso, mais doces, justos, científicos, humanos e fraternos, vislumbravam, na verdade, ser “[...] mais econômicos, mais produtivos, mais abrangentes, menos violentos (entendendo-se sempre violência como força, coação física)”. Para tanto, o aparato tecnológico é indispensável (ROCHA, 2000, p. 144-145). A pesquisadora gaúcha propõe que a escola exerce três tipos de vigilância: “[...] repressora, disciplinadora e tecnológica” (ROCHA, 2000, p. 145) (Itálico no original). Embora, para formular tais conceitos, ela tenha se inspirado nas escolas que pesquisou, a autora declara que essa reflexão precisa ser ampliada para o cenário social mais amplo, cconsiderando que “[...] outros locais públicos e privados de convivência social” têm sido contemplados com medidas que visam ao controle (ROCHA, 2000, p. 145- 146). No início da escolarização de massa, dadas as peculiaridades das primeiras escolas – ligadas ao clero, com rígidas regras e hierarquias a 88 serem seguidas –, mas também o perfil do aluno a que se destinavam – poucos e nobres homens que deveriam aprender como melhor governar outros homens e que, portanto, deveriam saber exercer o controle de si e dos outros para obter de todos o máximo proveito possível (sem discórdias nem insatisfações) – tínhamos um tipo de vigilância repressora: coativa, coercitiva, que usava a força física para impedir, impor limites, regrar, regular, normalizar. (ROCHA, 2000, p. 145) (Itálico no original). O crescimento e a diversidade da clientela, a ampliação das instâncias responsáveis pela Educação e as novas organizações socioeconômicas e culturais contribuíram para a mudança no padrão de vigilância exercido, que passou a ser menos direta: “[...] disciplinadora (que disciplina por ‘convencimento’, explicando, argumentando, assujeitando o outro através do saber socialmente aceito, pois ir à escola dizem ser um bem universal a que todos têm direito)”. (ROCHA, 2000, p. 145)(Itálico no original). Recentemente temos “[...] a vigilância tecnológica (que disciplina por ‘impedimento’, que impede sem violentar, através de meios invisíveis, de alta tecnologia, ampla cobertura, grande velocidade e acumulação de informações)”. (ROCHA, 2000, p. 145) (Itálico no original). A vigilância, seja ela qual for, transforma a perspectiva que o Homem tem do espaço, pois seu acesso e uso são limitados, controlados, com a criação de quadrículos físicos ou imaginários. A escola, também, tem seu espaço transformado porque VERSÃO TEXTUAL [...] quanto mais organizado, distribuído, delimitado, previsto, quanto melhor determinadas suas ocupações e funções, menor será o exercício do controle externo, arbitrário, totalitário, único e unilateral. (ROCHA, 2000, p. 146). Por isso, ela assevera que a tipologia do espaço escolar reflete uma forma de exercício de vigilância: As escolas que necessitam de controles mais ostensivos constroem determinados espaços físicos (fechados, fortemente hierárquicos, complexos, delimitados). As escolas que ensinam seus alunos a ocuparem os espaços que lhes são permitidos, que lhes ensinam a tomar as melhores decisões, a viver com sabedoria, justiça, paz, fraternidade, igualdade, democracia (e todos os demais valores universais tão constantemente inculcados nesta e por esta sociedade) geralmente constroem espaços físicos onde os próprios alunos sabem o quê e quando fazer. As escolas que exercem o controle de forma anônima (identificável ou não), constroem seus espaços prevendo este tipo de vigilância, dispondo instrumentos tecnológicos em locais estratégicos, dispondo móveis, utensílios, paredes, muros e cercas de outras maneiras. (ROCHA, 2000, p. 146). 89 PROTEÇÃO E CRESCIMENTO, PAULO MEIRELES BARGUIL (CLIQUE AQUI PARA ABRIR) Bruce Lipton, em Biologia da Crença, explica que a célula tem dois movimentos principais: proteção e crescimento. No primeiro, ela foge de tudo que acredita ameaçar sua existência. No segundo, ela vai ao encontro do que julga propiciar a continuidade da sua vida. Conforme esse biólogo, esses mecanismos não podem funcionar ao mesmo tempo. Em determinado momento, portanto, a energia da célula só pode ser direcionada ou para se defender ou para crescer. Por ser o Homem composto de trilhões de células, Lipton defende que esse princípio também acontece em nós. Diante de um mundo repleto de mistérios, é natural que o Homem tenha medo, o qual, em doses moderadas, contribui para que ele reflita sobre os diversos aspectos da realidade e objetive tornar a sua existência mais segura e satisfatória. De modo simplificado, as crenças são frutos de experiências — nossas e/ou de outras pessoas — as quais geram sentimentos e pensamentos. O centro da nossa existência são os sentimentos. É a partir deles que escolhemos as atividades que irão, quase sempre, confirmá-los. As nossas emoções desagradáveis são, basicamente, medo, vergonha, raiva e tristeza. Enquanto as agradáveis são, respectivamente, coragem, segurança, amor e alegria. O controle é a atitude de alguém que tem sua vida guiada pelas emoções desagradáveis. A entrega é o comportamento de quem se orienta pelas emoções positivas, a qual não pode ser confundida com submissão e rendição, mas como aceitação e gratidão de tudo que a vida lhe oferece, potencializando a sua ação no mundo com foco no outro e não na sua satisfação pessoal. 90 Quando alguém sente — leia-se, acredita — que um ambiente, um acontecimento, um indivíduo é hostil, sua energia é prioritariamente alocada para a sua segurança. Penso que, de modo geral, uma pessoa ansiosa é medrosa, insegura. Ela não acredita que é capaz de resolver, da forma possível, as situações que poderão aparecer — ou seja, não confia em si e, consequentemente, nas outras pessoas, bem como no poder do Amor — por isso tenta, inutilmente e compulsivamente, controlar o mundo, que, na sua fantasia, existe para atender os seus caprichos. Qualquer sombra, cheiro ou som diferente que, de alguma forma, lembre algo que tenha gerado frutos desagradáveis no passado, pode acionar o seu instinto de lutar ou fugir, propiciando-lhe, se optar pela segunda, se afastar rapidamente do suposto perigo. Após cada ocorrência, seu temor aumenta e confirma a sua crença de que ela precisa realmente estar sempre alerta. Suas sensibilidade e resposta — corporal e verbal — tornam-se cada vez mais rápidas! Não é difícil imaginar o resultado disso após alguns anos... Outra possibilidade de uma pessoa ansiosa é alguém que deseja muito vivenciar algo e que, por vários motivos, ainda não aprendeu a esperar, o que não significa que ela nada pode fazer, mas que precisa compreender que o mundo não funciona no ritmo do nosso desejo. A nossa interpretação do mundo, que se expressa em ações e discursos, tende a confirmar as nossas emoções, as quais não podem ser extirpadas, apenas transmutadas, se forem identificadas, num processo lento e fascinante. Creio, contudo, que os nossos sentimentos podem ser sufocados ou negados, mas continuam dirigindo a nossa vida... As consequências dessa repressão são nefastas, pois só ampliam a ebulição desse caldeirão! O aumento exponencial, em todo o mundo, das doenças de natureza psicológica confirmam o equívoco e o perigo dessa atitude. O medo, portanto, impulsiona a pessoa a, de um lado, querer controlar, vigiar tudo que lhe cerca, e, do outro, a se isolar. Essa afirmação, caso proceda, não é suficiente para mudar quem deseja, pois a dinâmica entre ação, sentimento e pensamento é muito poderosa e sutil, conforme atestam as descobertas das últimas décadas quanto à composição química do Homem, que revelam, aos poucos, o intrincado funcionamento das glândulas e o impacto de seus respectivos hormônios na qualidade da vida dele. É importante compreender e aceitar que os aspectos motores, afetivos, cognitivos e espirituais são intimamente relacionados. 91 O desafio, portanto, de cada um de nós é, a cada segundo, migrar da hostilidade à hospitalidade! Fonte [6] Conforme vimos durante esta aula, os desafios educacionais contemporâneos são complexos e requerem que o professor esteja atento a inúmeros aspectos. Refletir coletivamente sobre a realidade é uma contribuição importante que os profissionais da Educação devem empreender com afinco, possibilitando que as novas gerações tenham um olhar mais crítico sobre a sociedade. LETRA DA MÚSICA ESTUDO ERRADO Estudo errado Gabriel O Pensador 1 Eu tô aqui Pra quê? Será que é pra aprender? Ou será que é pra aceitar, me acomodar e obedecer? Tô tentando passar de ano pro meu pai não me bater Sem recreio de saco cheio porque eu não fiz o dever A professora já tá de marcação porque sempre me pega Disfarçando espiando colando toda prova dos colegas,/ E ela esfrega na minha cara um zero bem redondo E quando chega o boletim lá em casa eu me escondo Eu quero jogar botão, vídeo-game, bola de gude Mas meus pais só querem que eu "vá pra aula!" e "estude!" Então dessa vez eu vou estudar até decorar cumpádi Pra me dar bem e minha mãe deixar ficar acordado até mais tarde Ou quem sabe aumentar minha mesada Pra eu comprar mais revistinha (do Cascão?) Não. De mulher pelada A diversão é limitada e o meu pai não tem tempo pra nada E a entrada no cinema é censurada (vai pra casa pirralhada!) A rua é perigosa então eu vejo televisão (Tá lá mais um corpo estendido no chão) 92 Na hora do jornal eu desligo porque eu nem sei nem o que é inflação - Ué não te ensinaram? - Não. A maioria das matérias que eles dão eu acho inútil Em vão, pouco interessantes, eu fico pu.. (Vai pro colégio!!) Então eu fui relendo tudo até a prova começar Voltei louco pra contar: Manhê! Tirei um dez na prova Me dei bem tirei um cem e eu quero ver quem me reprova Decorei toda lição Não errei nenhuma questão Não aprendi nada de bom Mas tirei dez (boa filhão!)Quase tudo que aprendi, amanhã eu já esqueci Decorei, copiei, memorizei, mas não entendi Quase tudo que aprendi, amanhã eu já esqueci Decorei, copiei, memorizei, mas não entendi Decoreba: esse é o método de ensino Eles me tratam como ameba e assim eu num raciocino Não aprendo as causas e consequências só decoro os fatos Desse jeito até história fica chato Mas os velhos me disseram que o "porque" é o segredo Então quando eu num entendo nada, eu levanto o dedo Porque eu quero usar a mente pra ficar inteligente Eu sei que ainda num sou gente grande, mas eu já sou gente E sei que o estudo é uma coisa boa O problema é que sem motivação a gente enjoa O sistema bota um monte de abobrinha no programa Mas pra aprender a ser um ingonorante (...) Ah, um ignorante, por mim eu nem saía da minha cama (Ah, deixa eu dormir) Eu gosto dos professores e eu preciso de um mestre 93 Mas eu prefiro que eles me ensinem alguma coisa que preste - O que é corrupção? Pra que serve um deputado? Não me diga que o Brasil foi descoberto por acaso! Ou que a minhoca é hermafrodita Ou sobre a tênia solitária. Não me faça decorar as capitanias hereditárias!! (...) Vamos fugir dessa jaula! "Hoje eu tô feliz" (matou o presidente?) Não. A aula Matei a aula porque num dava Eu não aguentava mais E fui escutar o Pensador escondido dos meus pais Mas se eles fossem da minha idade eles entenderiam (Esse num é o valor que um aluno merecia!) Íííh... Sujô (Hein?) O inspetor! (Acabou a farra, já pra sala do coordenador!) Achei que ia ser suspenso mas era só pra conversar E me disseram que a escola era meu segundo lar E é verdade, eu aprendo muita coisa realmente Faço amigos, conheço gente, mas não quero estudar pra sempre! Então eu vou passar de ano Não tenho outra saída Mas o ideal é que a escola me prepare pra vida Discutindo e ensinando os problemas atuais E não me dando as mesmas aulas que eles deram pros meus pais Com matérias das quais eles não lembram mais nada E quando eu tiro dez é sempre a mesma palhaçada Refrão Encarem as crianças com mais seriedade Pois na escola é onde formamos nossa personalidade 94 Vocês tratam a educação como um negócio onde a ganância a exploração e a indiferença são sócios Quem devia lucrar só é prejudicado Assim cês vão criar uma geração de revoltados Tá tudo errado e eu já tou de saco cheio Agora me dá minha bola e deixa eu ir embora pro recreio... 1 GABRIEL O PENSADOR. Estudo errado. Intérprete: Gabriel O Pensador. AINDA É SÓ O COMEÇO. Chaos/Sony Music. 1995. Faixa 06. MULTIMÍDIA Estudo errado [7]. LEITURA COMPLEMENTAR Mediação de conflitos no espaço escolar [8]. OLHANDO DE PERTO Violência nas escolas [9] (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.). DICA Sugestões de filmes que abordam assuntos dessa aula. Billy Elliot [10] Elefante [11] Como estrelas na terra [12] O preço do desafio [13] Tiros em Columbine [14] ATIVIDADE DE PORTFÓLIO 1. Considerando o conteúdo desta aula, redija um documento, conforme as orientações contidas neste Roteiro. (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.) Coloque no seu portfólio a sua produção (AULA_2_PORTFOLIO_1_ESTUDANTE.DOC). 2. Considerando o conteúdo desta aula, redija um documento, conforme as orientações contidas neste Roteiro (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.). Coloque no seu portfólio a sua produção (AULA_2_PORTFOLIO_2_ESTUDANTE.DOC). FÓRUM Leia um texto da seção Olhando de Perto desta aula e poste um comentário com as seguintes informações: i) O título e o(a) autor(a); ii) As 95 principais ideias do documento; e iii) Sua opinião (concorda ou discorda ...), com argumentos, sobre as ideias citadas no item anterior e o que você aprendeu (e/ou as dúvidas que surgiram) com este artigo. Comente, com argumentos e/ou exemplos, a participação de dois(duas) colegas. REFERÊNCIAS ABRAMOVAY, Miriam (Org.). ESCOLA E VIOLÊNCIA. 2. ed. Brasília: UNESCO, UCB, 2003. ABRAMOVAY, Miriam; RUA, Maria das Graças (Orgs.). 4. ed. VIOLÊNCIAS NAS ESCOLAS. Brasília: UNESCO, 2004. ALVES, Rubem. A ALEGRIA DE ENSINAR. 5. ed. São Paulo: Ars Poética, 1994. BACHELARD, Gaston. O NOVO ESPÍRITO CIENTÍFICO. Tradução Juvenal Hahne Júnior. 2. ed. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1985. BARGUIL, Paulo Meireles. Avaliação – momento de angústia ou oportunidade de crescimento pessoal? In: PASCUAL, Jesus Garcia; DIAS, Ana Maria Iorio (Orgs.). CONSTRUTIVISMO E EDUCAÇÃO CONTEMPORÂNEA. Fortaleza: Brasil Tropical, 2006. p. 145-173. ______. HÁ SEMPRE ALGO NOVO! –Algumas considerações filosóficas e psicológicas sobre a avaliação educacional. Fortaleza: ABC Fortaleza, 2000. BRUNER, Jerome. A CULTURA DA EDUCAÇÃO. Tradução Marcos A. G. Domingues. Porto Alegre: ArtMed, 2001. CAPRA, Fritjof. A TEIA DA VIDA: uma nova compreensão científica dos sistemas vivos. Tradução Newton Roberval Eichemberg. 5. ed. São Paulo: Cultrix, 2001. CONRAD, Gerson; MORAES, Vinícius de. Rosa de Hiroshima. Intérprete: Secos e Molhados. In: SECOS E MOLHADOS. Continental, 1973. Faixa 09. CORETH, Emerich. QUESTÕES FUNDAMENTAIS DE HERMENÊUTICA. Tradução Carlos Lopes de Matos. São Paulo: EPU, 1973. DIAS, Ana Maria Iorio. CONCEPÇÕES DE ENSINO E APRENDIZAGEM. Fortaleza. 2008. Notas de aula. DOLL JR., William E. CURRÍCULO: uma perspectiva pós-moderna. Tradução Maria Adriana Veríssimo Veronese. Porto Alegre: Artes 96 Médicas, 1997. FARIA FILHO, Luciano Mendes de. DOS PARDIEIROS AOS PALÁCIOS: cultura escolar e urbana em Belo Horizonte na Primeira República. Passo Fundo: Universidade de Passo Fundo, 2000. FAZENDA, Ivani Catarina Arantes. Integração como proposta de uma nova ordem na educação. In: CANDAU, Vera Maria (Org.). LINGUAGENS, ESPAÇOS E TEMPOS NO ENSINAR E APRENDER. Rio de Janeiro: DP&A, 2000. p. 141-146. FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. NOVO DICIONÁRIO DA LÍNGUA PORTUGUESA. 2. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1993. FONTANELLA, Francisco Cock. O CORPO NO LIMIAR DA SUBJETIVIDADE. Piracicaba: Editora Unimep, 1995. FOUCAULT, Michel. VIGIAR E PUNIR: o nascimento das prisões. Tradução: Raquel Ramalhete. 25. ed. Petrópolis: Vozes, 2002. FRANÇA, Lilian Cristina Monteiro. CAOS – ESPAÇO – EDUCAÇÃO. São Paulo: Annablume, 1994. FREIRE, Paulo. PEDAGOGIA DA AUTONOMIA: saberes necessários à prática educativa. 39. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2009. GALLO, Sílvio. Disciplinaridade e transversalidade. In: CANDAU, Vera Maria (org.). LINGUAGENS, ESPAÇOS E TEMPOS NO ENSINAR E APRENDER. Rio de Janeiro: DP&A, 2000. p. 165-179. GIBRAN, Gibran Khalil. O PROFETA. Tradução: Mansour Challita. 8. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1970. GONÇALVES, Maria Augusta Salin. SENTIR, PENSAR, AGIR – corporeidade e educação. Campinas: Papirus, 1994. ILLICH, Ivan. SOCIEDADE SEM ESCOLAS. Tradução Lúcia Mathilde Endlich Orth. 4. ed. Petrópolis: Vozes, 1977. KENSKI, Vani Moreira. Múltiplas linguagens na escola. In: CANDAU, Vera Maria (Org.). LINGUAGENS, ESPAÇOS E TEMPOS NO ENSINAR E APRENDER. Rio de Janeiro: DP&A, 2000. p. 123-140. LINHARES, Ângela Maria Bessa. O TORTUOSO E DOCE CAMINHO DA SENSIBILIDADE: um estudo sobre Arte e Educação. 2. ed. Ijuí: Editora Unijuí, 2003. LOUREIRO, Claudia. CLASSE, CONTROLE, ENCONTRO: o espaço escolar. 1999. Tese (Doutorado em Arquitetura). USP, São Paulo. 97 LOUREIRO JR., Eduardo. UMA COISA LEVA A OUTRA. 1996. Dissertação (Mestrado em Educação). UFC, Fortaleza. MATOS, Elvis de Azevedo. O ARTISTA, O EDUCADOR, A ARTE E A EDUCAÇÃO: um mergulho nas águas da pedagogia Waldorf em busca de um sentido poético para a formação docente, ou artifício às artimanhas. 2002. Dissertação (Mestrado em Educação). Universidade Federal do Ceará, Fortaleza. MATURANA, Humberto R.; VARELA, Francisco J. A ÁRVORE DO CONHECIMENTO: as bases biológicas da compreensão humana. Tradução Humberto Mariotti e Lia Diskin. São Paulo: Palas Athena, 2001. McLAREN, Peter. RITUAIS NA ESCOLA: emdireção a uma economia política de símbolos e gestos na Educação. Tradução: Juracy C. Marques e Ângela M. B. Biaggio. Petrópolis: Vozes, 1992. MESTERS, Carlos. POR TRÁS DAS PALAVRAS. Petrópolis: Vozes, 1974. NAJMANOVICH, Denise. O SUJEITO ENCARNADO – questões para pesquisa no/do cotidiano. Rio de Janeiro: DP&A, 2001. PIAGET, Jean. SEIS ESTUDOS DE PSICOLOGIA. Tradução Maria Alice Magalhães D’Amorim e Paulo Sérgio Lima Silva. 18. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1991. ROCHA, Cristianne Maria Famer. DESCONSTRUÇÕES EDIFICANTES: uma análise da ordenação do espaço como elemento do currículo. 2000. Dissertação (Mestrado em Educação). UFRGS, Porto Alegre. ROGERS, Carl. TORNAR-SE PESSOA. Tradução Manuel José do Carmo Ferreira. 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1991. SABINO, Fernando et alli. CRÔNICAS 2. 19. ed. São Paulo: Ática, 2002. (Para gostar de ler, 2). SEVERINO, Antônio Joaquim. Problemas e dificuldades na condução da pesquisa no curso de pós-graduação. In: FAZENDA, Ivani (Org.). NOVOS ENFOQUES DA PESQUISA EDUCACIONAL. 2. ed. São Paulo: Cortez, 1994. p. 27-34. SNYDERS, Georges. A ALEGRIA NA ESCOLA. Tradução Bertha Halpren Gozovitz e Maria Cristina Caponero. São Paulo: Manole, 1988. SOARES, Suely Galli. ARQUITETURA DA IDENTIDADE: sobre educação, ensino e aprendizagem. São Paulo: Cortez, 2000. 98 TOBEN, Bob; WOLF, Fred Alan. ESPAÇO-TEMPO E ALÉM. Tradução Hernani Guimarães Andrade e Newton Roberval Eichemberg. 5. ed. São Paulo: Cultrix, 1998. TUAN, Yi-Fun. ESPAÇO E LUGAR: a perspectiva da experiência. Tradução Lívia de Oliveira. São Paulo: DIFEL, 1983. VYGOTSKY, Lev Semenovich. A FORMAÇÃO SOCIAL DA MENTE. Tradução: José Cipolla Neto, Luis Silveira M. Barreto e Solange Castro Afeche. 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1991. WEIL, Pierre. Axiomática transdisciplinar para um novo paradigma holístico. In: WEIL, Pierre; D´AMBROSIO, Ubiratan; CREMA, Roberto. RUMO À NOVA TRANSDISCIPLINARIDADE:sistemas abertos de conhecimento. 3. ed. São Paulo: Summus, 1993. p. 09-73. FONTES DAS IMAGENS 1. http://media.giphy.com/media/d1E2GyfleudkorxS/giphy.gif 2. http://www.alexandracaracol.com/ficheiros/escola02%5B1%5D.jpg 3. http://pt.wikipedia.org/wiki/Bullying 4. http://4.bp.blogspot.com/_66QziqjelJw/S8ZcV6cAgqI/AAAAAAAAAJ4 /YPxLP2ZRNJI/s1600/bullying-1271254325907_615x300.jpg 5. http://media.giphy.com/media/l4EpgiWUIpJeelvX2/giphy.gif 6. http://www.cronicadodia.com.br/2015/03/protecao-e-crescimento-do- controle.html 7. http://www.youtube.com/watch? v=m08sChqOgYk&feature=player_embedded 8. http://diariodonordeste.globo.com/materia.asp?codigo=742971 9. http://www.uff.br/obsjovem/mambo/images/stories/Documentos/Carr ano_Violencia_escolas%5B1%5D.pdf 10. http://www.planetaeducacao.com.br/portal/artigo.asp?artigo=24 11. http://www.planetaeducacao.com.br/portal/artigo.asp?artigo=323 12. http://www.psicosmica.com/2013/10/como-estrelas-na-terra-e- as.html 13. http://www.planetaeducacao.com.br/portal/artigo.asp?artigo=342 14. http://www.planetaeducacao.com.br/portal/artigo.asp?artigo=245 15. http://www.denso-wave.com/en/ Responsável: Professora Carmensita Matos Braga Passos Universidade Federal do Ceará - Instituto UFC Virtual 99 TÓPICO 01: TRANSDISCIPLINARIDADE E TRANSPOSIÇÃO DIDÁTICA REFLEXÃO A missão da escola é ensinar, preparando as novas gerações para a vida social. Essa tarefa, todavia, não é uma receita que possa ser aplicada igualmente em quaisquer tempo e espaço. Para que ela alcance o seu intento, é necessário que os profissionais que nela laboram se indaguem: - Por que ensinar? (Justificativa) - Para que ensinar? (Objetivos) - O que ensinar? (Conteúdo) - Como ensinar? (Metodologia) - Quando ensinar? (Tempo e ordem) - Com o que ensinar? (Recursos didáticos) - Como avaliar? (Avaliação?) Nesta aula, refletiremos sobre a organização do trabalho docente, contemplando os seguintes aspectos: transdisciplinaridade, transposição didática, inovações pedagógicas e planejamento. As perguntas acima expressam a busca para constituir sentido à prática docente. Neste tópico, estudaremos sobre currículo ( -- Conjunto de saberes e valores que são socializados, mediante várias atividades, ao corpo discente.) . Currículo origina-se do vocábulo latino curriculum, que significa “ato de correr, pista de corrida e atalho”. Conforme veremos nesse tópico, na 2ª metade do século passado, o currículo foi objeto de estudo de muitos pensadores, que dele retiraram a neutralidade, revelando, portanto, o caráter formativo e intencional, ou seja, político. A crítica dos conteúdos lecionados revela-se cada vez mais premente, haja vista que eles não são naturais, mas contemplam uma visão de Homem, de sociedade, de natureza, de cultura, ensejando (ou não!) o desenvolvimento da individuação dos agentes pedagógicos em prejuízo da sua alienação. É como afirma Costa (1999, p. 38): “O currículo escolar é um dos mecanismos que compõem o caminho que nos torna o que somos”. O surgimento das primeiras instituições de ensino atende a uma necessidade de socializar conhecimentos (currículo) que não eram disponíveis na convivência. Esses saberes eram escolhidos pela autoridade que detinha o poder. A atual formatação do currículo foi forjada no final do século XVI e início do século XVII, motivo pelo qual, para entendê-lo, é preciso “[...] DIDÁTICA GERAL AULA 03: ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO DOCENTE 100 resgatar práticas esquecidas, documentos obscuros, discursos já silenciados”, com o fito de compreender os seus pressupostos ao longo do tempo (VEIGA- NETO, 1999, p. 101). No tópico 1, da aula 2, apresentei, de forma detalhada, os paradigmas epistemológicos com o objetivo de entender os desafios educacionais contemporâneos. Dissertarei, a partir de uma síntese dessas ideias, sobre as práticas curriculares, permitindo, assim, compreender que a modificação do atual cenário educacional requer outro vínculo entre realidade e escola, expresso na seleção e vivência de conteúdos que possam ser significativos aos agentes pedagógicos. No Ocidente, durante séculos, a Igreja Católica teve a primazia na divulgação da explicação e finalidade da vida, influenciando presente e futuro, bem como livrando uma parcela significativa da Humanidade da angústia da incerteza. Esse poder eclesial foi tremendamente abalado com as descobertas e explicações de Galileu, as quais possibilitaram uma mudança na concepção de mundo, transferindo para a Ciência porção vultosa da autoridade antes usufruída somente pela Igreja. Não se pode, todavia, concluir que houve uma libertação do Homem, porquanto o que efetivamente ocorreu, em grande medida, foi uma mera mudança de seara – da eclesial para a científica – pois ele continuou à mercê das verdades divulgadas por outrem. Para Galileu, o mundo é um livro aberto... escrito em linguagem geométrica, ou seja, somente aquilo que pode ser reduzido à formula, à expressão aritmética, à quantificação, é conhecimento. O que não se enquadra nessas determinações não é digno de adentrar no prestigioso império da razão: O programa de Galileu oferece-nos um mundo morto: extinguem-se a visão, o som, o sabor, o tato e o olfato, e junto com eles vão-se também as sensibilidades estética e ética, os valores, a qualidade, a alma, a consciência, o espírito. A experiência como tal é expulsa do domínio do discurso científico. É improvável que algo tenha mudado mais o mundo nos últimos quatrocentos anos do que o audacioso programa de Galileu. Tivemos de destruir o mundo em teoria antes que pudéssemos destruí-lo na prática. (R. D. LAING apud CAPRA, 2001, p. 34). A falta dos sentidos na interpretação e degustação do mundo pelo Homem explica a falta de sentido que o atormenta, a despeito dos inúmeros avanços que o cercam, mas que não acalentam as suas ânsias. Talvez, até, as tornem mais profundas! Ainda sob essa manta galileana, desenvolveu-se a crença de que o conhecimento– produção e socialização – e o cientista são neutros, pois o que distingue uma pessoa das demais é exatamente aquilo que é desprezado: * os valores, * as crenças, 101 * os sentimentos, * o compromisso social. Isso não é tudo! Para conhecer o mundo, Descartes criou o método do pensamento analítico, que defende a quebra dos fenômenos complexos em pedaços pequenos, de modo que as propriedades das partes expliquem o comportamento do todo. Para ele, a natureza tinha dois domínios independentes: E mais, o universo material é uma máquina, que para ser compreendida precisa ser analisada em suas diminutas partes (CAPRA, 2001, p. 34-35). Desde a década de 1980, têm acontecido intensos debates sobre a disciplinaridade do currículo, uma vez que ela não permitia a compreensão total de um fenômeno, mas apenas de uma parte do todo. Ora, isso não é um acidente, um desvio, mas o fruto mais legítimo da Ciência Moderna, que fraciona a realidade, sob a promessa de melhor entendê-la. [...] as disciplinas científicas são constituídas por discursos especializados e delimitam um determinado território diretamente associado aos mecanismos institucionais da comunidade científica em seu processo de produção do conhecimento. Nesse sentido, as disciplinas têm seu próprio campo intelectual de textos, práticas, regras de ingresso, exames, títulos para o exercício profissional, bem como de distribuição de prêmios e sanções (BERNSTEIN, 1998). É por intermédio de um mecanismo disciplinar que as ciências se organizam coletivamente, definem espaços de poder, de alocação de recursos e de reprodução dos métodos e princípios de construção do conhecimento. (LOPES, 2000, p. 156). A adoção, por parte da escola, dessa visão mecanicista e mensurada da realidade foi levada às últimas consequências, com a adoção de currículos que reservavam ao professor a missão de conduzir o estudante a alcançar a aprendizagem esperada, de acordo com um roteiro, planejamento elaborado por aquele, privilegiando a linearidade: uma tarefa depois da outra, sem lacunas e vazios. No currículo disciplinar tudo pode ser controlado: o que o estudante aprende, como aprende, com que velocidade o processo acontece e assim por diante. Tudo pode ser avaliado: o desempenho do estudante, a ‘produtividade’ do professor, a eficácia dos materiais didáticos etc. Da mesma forma, todo o processo pode ser metrificado e o desempenho do estudante traduzido numa nota, às vezes com requintes de fragmentação, incorporados no número de casas decimais. (GALLO, 2000, p. 169). Conhecer, nessa perspectiva, é simplesmente descobrir um mundo preexistente, determinado, expresso num sistema fechado, mediante o uso 102 da razão, e não criar uma interpretação pessoal, com os sentimentos e as experiências, de uma realidade em constante mudança, indeterminado, representado por um sistema aberto (DOLL JR., 1997, p. 48). Essa lógica é maximizada com os princípios formulados por Tyler: I) Que propósitos educacionais as escolas devem tentar atingir? II) Que experiências educacionais podem ser proporcionadas para tornar mais provável que esses propósitos sejam atingidos? III) Como essas experiências educacionais podem ser efetivamente organizadas? IV) Como podemos determinar se esses propósitos estão sendo atingidos? (DOLL JR. 1997, p. 68) Para atingir os objetivos almejados, as experiências devem ser cuidadosamente selecionadas e organizadas, assim como a avaliação que verifica se aqueles foram contemplados. Dessa forma, os objetivos estão em todo o processo e não somente no início (DOLL JR., 1997, p. 69). O método analítico, sobre o qual se desenvolve a disciplinaridade, teve os primeiros abalos quando algumas verdades científicas começaram a ser desmontadas. Na Física, a estabilidade do universo é substituída por noções como indeterminação, incerteza e relatividade, as quais caracterizam a vida. Sobre a disciplinaridade, Crema (1993, p. 132) declara que: [...] o reducionismo e a insuficiência desse enfoque suscitaram inteligentes alternativas reparadoras, como as abordagens multi, pluri e interdisciplinar. Como os termos indicam, entretanto, sempre ainda na órbita disciplinar: uma produtiva e ampliada dialogicidade entre os muitos discursos e enfoques do mesmo racionalismo científico. Nos anos 60, os movimentos estudantis na França e Itália lutavam por um ensino que contemplasse as questões sociais, políticas e econômicas, o que implicava no envolvimento de cientistas de várias áreas, considerando a complexidade desses fenômenos. Surge, então, a interdisciplinaridade. MULTIMÍDIA Disciplinaridade. [1] A interdisciplinaridade, do ponto de vista epistemológico, “[...] aponta para a possibilidade de produção de saberes em grupos formados por especialistas de diferentes áreas”, enquanto que, na seara pedagógica, ela “[...] indica um trabalho de equipe, no qual docentes de diferentes áreas planejam ações conjuntas sobre um determinado assunto”. (GALLO, 2000, p. 173). 103 A multidisciplinaridade se caracteriza por uma ação simultânea de várias disciplinas sobre uma temática comum. Não há relação e cooperação entre as disciplinas nessa intervenção pedagógica. Na pluridisciplinaridade, ocorre uma frágil interação (cooperação) entre as áreas de conhecimento, as quais permanecem no mesmo nível hierárquico. Na interdisciplinaridade, as atividades são organizadas para atender um eixo integrador (tema gerador), possibilitando uma intensa interação entre as áreas de conhecimento. A transdisciplinaridade promove a integração de vários sistemas interdisciplinares, possibilitando uma interpretação holística. No âmbito educacional, essas opções oferecem a esperança de que os autores pedagógicos (professores e estudantes) consigam, enfim, estabelecer as relações entre as diversas áreas do conhecimento, dificuldade essa que não é peculiar do corpo discente, uma vez que o próprio corpo docente padece da mesma incapacidade. Na tentativa de superar a disciplinaridade, além da interdisciplinaridade, pode-se falar em multidisciplinaridade, plurisdisciplinaridade e transdisciplinaridade. Na opinião de Crema (1993, p. 132), a transdisciplinaridade possibilita que sentem, lado a lado, na mesa do conhecimento, cientistas e poetas, técnicos e filósofos, racionalistas e místicos, permitindo o nascimento não somente de uma nova concepção de conhecimento, mas também de conhecedor. Apesar das ótimas intenções, em sua grande maioria, as propostas "pós" disciplinares – de modo especial, as interdisciplinares, que são as mais frequentes – pouco modificaram o cotidiano escolar, acadêmico. Penso que o elemento principal para esse fracasso é que elas requerem dos profissionais uma abertura ao desconhecido, num esforço que vai além da questão teórica, mas que contempla afetos e atitudes, bem como a diversidade das linguagens empreendidas. Para tanto, eles precisam de uma formação radicalmente distinta da que lhes foi oferecida. Outro fator é que, frequentemente, elas não convidam para essa festa epistemológica a Arte, a Filosofia e a Religião, mas somente os rebentos da Ciência – Matemática, Física, Química, Biologia, História, Geografia... – perpetuando, dessa forma, o distanciamento entre razão e emoção, mente e corpo. A disciplinaridade, portanto, só pode ser superada por uma concepção de conhecimento que congregue todas as modalidades de saber e promova animada roda e não institua uma fila indiana. A concepção clássica tomava a separação radical sujeito-objeto como uma verdade inquestionável e não como uma perspectiva particular, entre muitas outras possíveis. O conhecimento humano poderia chegar a abarcar tudo, podiam chegar a ser estabelecidas teorias completas sobre o mundo. Contudo, hoje nos damos conta de que ao expulsar o qualitativo e 104 privilegiar exclusivamente o quantificável; ao mecanizar o cosmoe separar o corpo e a alma do homem; ficaram de fora do mundo da ciência a emoção e a beleza, a ética e a estética, a cor e a dor, o espírito e a fé, a arte e a filosofia, o corpo emocional e o mundo subjetivo. O sujeito da objetividade não podia dar conta de si mesmo, porque não se via, era um homem desencarnado. Essa dicotomia radical entre arte e ciência, razão e emoção, corpo e alma, atingiu fortemente o desenvolvimento das ciências humanas: como fazer ciência dos sujeitos sem considerar a subjetividade? Como descrever o qualitativo a partir do quantitativo? O homem que acreditava ter domesticado o universo, se havia perdido a si mesmo. (NAJMANOVICH, 2001, p. 83-84).(Itálico no original). A recuperação da corporalidade do sujeito demanda novas teorias e práticas pedagógicas, as quais devem valorizar aspectos que foram historicamente desprezados, ignorados – emoção, intuição, solidariedade... – bem como diminuir a importância de outros que até aqui receberam todas as honras (razão, competição...). Engajo-me ao entendimento de Doll Jr. (1997, p. 22): “Um currículo criativo e transformativo precisa combinar o cientifico com com o estético.”. Para que um currículo seja transformador, o conhecimento deve ser visto não como um prédio, uma acumulação, mas como uma rede, que modifica continuamente as suas estruturas, bem como as relações entre elas, num processo auto-organizativo (DOLL JR., 1997, p. 83-84). Assim, a linearidade é substituída pela não-linearidade, a qual se revela bem mais próxima da dinâmica da vida do que aquela. Um currículo nessa nova perspectiva deve, conforme Doll Jr. (1997, p. 193-199), privilegiar: A RIQUEZA A riqueza consiste no fato de que cada saber tem seu contexto, conceitos e vocabulários próprios. A multiplicidade de linguagens desenvolve essa riqueza ao se dedicar à interpretação de metáforas, mitos e narrativas. A RECURSÃO A recursão revela que um final não é absoluto, pois pode ser, sempre, um ponto de partida para descobertas. Cada atividade – trabalho, teste, diário de campo – não pode ser desvinculada, desligada de um processo maior de conhecimento. AS RELAÇÕES As relações devem ser entendidas numa perspectiva pedagógica e cultural, que são complementares. Na primeira, por instituírem práticas que possibilitam a troca, a parceria entre os agentes envolvidos. Na segunda, por se referirem àquelas manifestações cosmológicas, não contempladas pelo currículo. O RIGOR 105 O rigor evita que o currículo “caia ou num ‘relativismo extravagante’ ou num solipsismo sentimental”. Indica a busca intencional de diferentes alternativas, relações e conexões. Dewey defendia o argumento de que a escola deveria ser uma comunidade crítica e apoiadora. Para que ela se transforme nesse ideal, é necessário que os objetivos educacionais sejam desenvolvidos num processo que valorize as experiências, as criações e as inovações e se afaste da concepção de Tyler, que se baseia na execução de um planejamento construído por uma pessoa, sem levar em conta as peculiaridades dos estudantes, e numa avaliação que contempla a quantificação (DOLL JR., 1997, p. 69). As teorias críticas do currículo defendem que as experiências, os valores e os conhecimentos dos autores pedagógicos sejam contemplados, não como verdades que devem ser veneradas, mas como matéria-prima do trabalho a ser desenvolvido no ambiente escolar. No Brasil, isso é ainda mais necessário, haja vista a diversidade sociocultural do nosso País, revelando-se um absurdo todas as propostas de unificação cultural. Como devem ser entendidos os Parâmetros Curriculares Nacionais - PCN? Embora os seus autores declarem que eles não devem ser lidos como uma prescrição, mas como um guia, que fornece várias informações, transferindo ao leitor o direito de escolher o que lhe aprouver, Lopes (1999) entende que os PCN revelam o desejo de homogeneizar a cultura nacional, esconder os seus contrastes, que revelam uma sociedade profundamente injusta. Essa diversidade social é contemplada pela emergência dos Estudos Culturais, que ressaltando as diferenças culturais, de gênero, etnia etc., postulam currículos que as valorizem e não as ignorem e tentem sufocá-las (BERTICELLI, 1999, p. 173). Os Estudos Culturais têm muito a contribuir na formulação de um currículo que respeita as diferenças dos sujeitos, contribuindo para o seu desenvolvimento e não para a sua submissão (intelectual, social e cultural): Desde a última década, começamos a desenvolver uma consciência cósmica e inter-relacional. O desafio deste reconhecimento é duplo: por um lado, respeitar o caráter local das nossas percepções e, por outro, perceber que as nossas perspectivas locais estão integradas numa matriz cultural, ecológica e cósmica muito mais ampla. O nosso progresso e a nossa existência – como indivíduos, como comunidades, como uma raça, como uma espécie, como uma forma de vida – dependem da nossa capacidade de criar uma harmonia complementar entre essas duas perspectivas. (DOLL JR., 1997, p. 199). OBSERVAÇÃO Diversos pesquisadores (MACLAREN, 1992; ROCHA, 2000) entendem que atrás do currículo anunciado, divulgado, há outro, implícito, “oculto”. Enquanto o primeiro contempla as disciplinas e os 106 programas explicitados, o segundo refere-se ao que, embora não propagado, está presente no ambiente escolar – valores, crenças, espaços, tempos... – influenciando e participando significativamente dos processos de ensino e de aprendizagem. Há, ainda, o currículo real, que se refere ao que foi implementado na sala de aula pelo professor. Entendo que currículo é mais do que prescrições e intenções, sejam elas explicitadas ou não, sendo ele o que se vive. Acredito, ainda, que alguns aspectos da nossa vida, da nossa prática profissional são desconhecidos até para nós mesmos! O desenvolvimento pessoal ocorre em duas dimensões – individual e social – as quais, embora sejam singulares, só podem ser compreendidas na intensa dinâmica que as vincula: por um lado, o indivíduo precisa percorrer uma singular estrada para manifestar suas aptidões tipicamente humanas e, por outro, é somente na convivência com seus semelhantes e com a natureza que aquela jornada se realiza (VYGOTSKY, 1991). O meio-ambiente, porém, não é somente a base física da existência humana, uma vez que cada pessoa está constantemente elaborando significados daquele, num intenso processo de organização, classificação e descrição, que ocorre dentro e fora dos tempos e espaços escolares: O controle físico e corporal exercido através do currículo e seus dispositivos espaço-temporais nos ensinam gestos, movimentos, posições possíveis, formas de nos dirigirmos e nos relacionarmos aos/com os outros, lugares de pertencimento, regras de sociabilidade. (ROCHA, 2000, p. 23). O prédio escolar, portanto, é um aspecto curricular da maior importância, pois tanto pode: i) promover o isolamento intelectual e afetivo dos estudantes, o que contribui para que eles não se percebam como sujeitos, mas como objetos de (e para o) consumo, desprovidos de subjetividade e escravos do desejo de ter mercadorias; ii) como favorecer o desenvolvimento integral dos agentes pedagógicos. Silva (2005) apresenta uma interessante análise das teorias curriculares (tradicionais, críticas e pós-críticas), concluindo que “O currículo tem significados que vão muito além daqueles aos quais as teorias tradicionais nos confinaram. O currículo é lugar, espaço, território. O currículo é relação de poder. O currículo é trajetória, viagem, percurso. O currículo é autobiografia, nossa vida, curriculum vitae: no currículo se forja nossa identidade. O currículo é texto, discurso, documento. O currículo é documento de identidade”. (SILVA, 2005, p. 150). O quadro abaixo dispõe os conceitos que caracterizam cada uma dessas teorias de currículo. 107 Fonte: Adaptadade Silva (2005, p. 17). MULTIMÍDIA Escola, currículo, ideologia e poder [2]. Essa Ecologia antropocêntrica, porém, precisa, urgentemente, ser substituída por uma ecocêntrica, pois o Homem tem profundo vínculo com o meio ambiente, o qual influencia, de forma significativa, o seu bem- estar corporal, emocional e racional. Acredito que a seleção e a socialização dos conteúdos no ambiente escolar não têm favorecido a integração com a natureza, muito pelo contrário. É constante a queixa de estudantes quanto à inaplicabilidade de muitos conteúdos ensinados na escola, o que revela a urgência dos educadores refletirem sobre a atualidade e relevância do currículo. Outro aspecto que também precisa ser considerando é o fato de que o saber científico para ser ensinado aos estudantes precisa ser transformado num objeto do saber escolar. Esta adaptação foi chamada por Chevallard de transposição didática, que contempla três diferentes tipos de saber: o saber sábio, produzido pelos cientistas e intelectuais, o saber a ensinar, conteúdo científico nos livros e materiais didáticos, o saber ensinado, apresentado na sala de aula. Percebe-se, portanto, que na transposição didática há uma intensa preocupação com a articulação entre epistemologia e pedagogia. O professor, inicialmente, seleciona um conteúdo, que contempla vários conceitos, os quais têm importância variada, merecendo, por isso, graus de atenção diferenciada. O tempo é organizado para permitir a socialização, com recursos múltiplos, dos temas escolhidos. A disciplina escolar, desta forma, não é a cópia do conhecimento científico, tanto em virtude das modificações necessárias para a sua 108 Conteudístico Domínio do conteúdo, seleção e organização dos seus principais conceitos, relação dele com outras áreas e a contextualização; Pedagógico Escolha de estratégias (metodologias) e recursos didáticos, de acordo com o referencial educacional adotado, que permitem aos estudantes, a partir de seus conhecimentos prévios, construírem significado (aprenderem) do conteúdo ensinado; Existencial A subjetividade do professor – sentimentos, crenças, percepções e valores sobre a vida, o conhecimento, o estudante e a Educação – que se expressa no seu agir, sentir e pensar no cotidiano escolar. compreensão pelos estudantes, como por considerar os recursos didáticos utilizados para propiciar a aprendizagem. A transposição didática será tanto mais eficaz quanto melhor o professor conseguir articular os seus saberes, conforme estudamos na aula 01. Para alcançar tal intento, o professor precisará ter uma atitude permanente de humildade e avaliação, ao admitir a sua incompletude, que se expressa, inexoravelmente, na sua práxis. OLHANDO DE PERTO Aprendizagem de conteúdos por meio da transposição didática (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.). Transposição Didática, Interdisciplinaridade e Contextualização (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.). Um novo tipo de conhecimento - transdisciplinaridade (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.). Usos e abusos do conceito de transposição didática (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.). FONTES DAS IMAGENS 1. http://www.youtube.com/watch?v=4qDz_j6n7ZM 2. http://www.youtube.com/watch?v=4xXGG5G1ZKI 3. http://www.denso-wave.com/en/ Responsável: Professora Carmensita Matos Braga Passos Universidade Federal do Ceará - Instituto UFC Virtual 109 TÓPICO 02: INOVAÇÕES PEDAGÓGICAS VERSÃO TEXTUAL À luz do que já estudamos nas duas aulas, o processo de ensino precisa ser modificado para alcançar melhores resultados, que se evidenciam na aprendizagem discente. Convém, pois, indagar: ◾ Qual é a importância das inovações pedagógicas? ◾ Que critérios o professor deve observar para adotá-las? Na nossa vida, a rotina, repetição tem um caráter estruturador, pois permite ao Homem viver com um nível mínimo de incerteza, que é fonte de insegurança. Por outro lado, ele também tem a necessidade de desenvolver sua capacidade criativa, que é indispensável para superar limitações e desafios do cotidiano, ou seja, ser um profissional cidadão, capaz de agir de forma interativa e responsável na sociedade. Os processos de ensino e de aprendizagem de um conteúdo, por envolverem pessoas, são diferentes, peculiares. Desta forma, o professor sempre pode ter algo para melhorar na sua prática – seja no material escolhido, que está relacionado à metodologia, seja nos objetivos, que se vinculam aos seus valores e crenças, seja nos procedimentos avaliativos – de modo a incrementar a aprendizagem dos estudantes. Conforme o Dicionário Aurélio, inovar é: “[Do lat. innovare.] V. t. d. 1. Tornar novo; renovar. 2. Introduzir novidade em.” (FERREIRA, 1993, p. 948). Novo, inovar, renovar e novidade: como relacioná-los com o conhecimento? O estudante aprende quando compreende a nova informação a partir da sua estrutura cognitiva – assimilação – a qual poderá ser ou não modificada – acomodação. É atribuição do professor escolher estratégias e recursos que possibilitem ao corpo discente, caracterizado pela diversidade, estabelecer as conexões do conteúdo com as suas experiências, condição necessária para que aconteça aprendizagem. Em toda aula, o professor precisa verificar em que intensidade as suas escolhas – metodologia, atividades, recursos didáticos – foram adequadas e, se for o caso, pensar sobre o que pode ser inovado para torná-las mais eficientes. Tendo em vista que a definição de inovar remete a renovar, continuemos nossa pesquisa na obra supra: Renovar é: “[Do lat. renovare.]V. t. d. 1. Tornar novo; dar aspecto ou feição de novo a; mudar ou modificar para melhor: “se não tens força, nem DIDÁTICA GERAL AULA 03: ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO DOCENTE 110 originalidade para renovar um assunto gasto, melhor é que te cales e te retires” (Machado de Assis, História sem Data, pp. 4-5). 2. Substituir por novo, por coisa nova. 3. Recomeçar, reinicar, restaurar: Os agressores renovaram a luta. 4. Dizer ou fazer de novo; repetir: O suplicante renovou os apelos. 5. Consertar, reformar, corrigir, melhorar em todos os aspectos ou praticamente em todos: Os sábios renascentistas renovaram a ciência medieval. 6. Fazer novamente; refazer: renovar um contrato; uma promissória. 7. Excitar de novo; tornar a excitar. 8. Consertar, reparar; reformar: Mandou renovar o motor do carro. 9. Pôr novamente em vigor; restaurar, restabelecer: renovar um regulamento esquecido. 10. Dar novo brilho a. 11. Dar novas forças a: O sol renova a vegetação. 12. Trazer de novo a lembrança; relembrar: Renovava com saudade os seus tempos de criança. T. d. e. i. 13. Fazer de novo; repetir; reiterar: Renovarei o pedido às autoridades. Int. 14. Deitar novos rebentos ou renovos; brotar: As plantas renovam na primavera. 15. Surgir de novo; vir novamente; reaparecer, restabelecer-se, renovar-se: Com a falta de providências sanitárias, a epidemia renovou. 16. Sobrevir; suceder-se; renovar-se: Os ataques inimigos renovam a cada dia. P. 17. Rejuvenescer, juvenescer, revigorar-se: Renovou-se com a medicação geriátrica. 18. Aparecer de novo; repetir-se: Observações astronômicas prevêem que a aparição do cometa renovar-se-á em 80 anos.” (FERREIRA, 1993, p. 1485). Do extrato acima, renova-se algo quando este é transformado, modificado, restaurado, repetido... O professor, para propor e implementar inovações pedagógicas, precisa: • refletir sobre os processos de ensino e de aprendizagem; • experimentar/experienciar/propor práticas múltiplas; • avaliar a sua práxis, contemplando o seu planejamento, a sua implementação e os resultados. Para inovar com intencionalidade e não por modismo, o professor necessita saber o que quer atingir com tal mudança, ou seja, os objetivos, a intenção. • Baseado em que informaçõeso professor implementa uma novidade no seu trabalho? • Após inovar na sala de aula, como o professor avalia a eficácia da mudança considerando as metas pretendidas? 111 A OBRIGAÇÃO DA LUDICIDADE, PAULO MEIRELES BARGUIL (CLIQUE AQUI PARA ABRIR) De quando em vez, os ambientes educacionais são invadidos por expressões, as quais são repetidas como palavras de ordem. Quem não as verbaliza queima numa fogueira psicológica. Não importa muito se o que é falado com a boca é confirmado com o corpo. O fundamental, para sobreviver, é ecoar o discurso. Desde o final do século passado, a moda pedagógica, no Brasil, é se declarar construtivista e/ou sociointeracionista. Ninguém quer saber se você leu Piaget e/ou Vygotsky. Basta colocar um rótulo ou mudar algumas coisas para atestar a sua transformação. Há, também, aqueles que, ao perceberem o engodo cometido por muitos, se negam a aceitá-lo e denunciam tais equívocos, mas não se dão ao trabalho de conhecer as contribuições daqueles autores e de tantos outros que ampliaram as suas pesquisas sobre aprendizagem. Os nossos espaços acadêmicos são, de modo geral, compostos de cores e sons tristes, não sendo de estranhar o motivo de muitas das nossas melhores lembranças do tempo estudantil serem no recreio. Sim, precisamos e podemos modificar essa realidade, assim como muitas outras. O caminho sempre começa dentro de nós. Diante dos inúmeros problemas vivenciados em escolas e universidades, de modo especial a falta de interesse discente no currículo, materializado nas práticas docentes, a panaceia atual é promover atividades lúdicas. E lá vamos nós atrás dessa poção mágica que vai dissolver os conflitos! Parece existir uma crença de que sem alegria e prazer não acontece aprendizagem. Será? Antes de mais nada, é necessário esclarecer que uma atividade pode ser lúdica, divertida para uma pessoa e não o ser para outra. Ou seja, não é a atividade que é lúdica. A qualidade da interação que alguém estabelece é que lhe proporciona satisfação. O que faz algo ser lúdico para uma pessoa? Quando ela está inteira — corpo, afeto, razão e espírito — numa atividade. Você se sente alegre, pleno quando faz algo que deseja e, por isso, mobiliza todo o seu ser. O mundo, contudo, não existe para satisfazer os caprichos apenas de um indivíduo. As pessoas são cada vez mais diferentes. Isso nos conduz à necessidade de aprender a estabelecer relações caracterizadas pela flexibilidade, sinceridade e empatia, de modo a construir situações mais harmônicas e menos conflituosas. 112 Reconhecer-se Narciso é quebrar o espelho que nos aprisiona na nossa solidão, é permitir olhar para o outro e criar vínculos, entender que o outro não existe apenas para me satisfazer, afinal, eu não sou o centro do mundo... É aceitar que o outro, também, não precisa ser meu escravo, nem meu algoz. É romper com a crença do tudo ou nada. Aprender é mudar. Há algo que eu não sei — fazer, sentir ou pensar — sendo necessário eu aprender — estabelecer novas conexões — para conseguir. Nessa perspectiva, só é possível alguém aprender quando ela aceita, por motivos variados, que sua configuração atual não lhe é satisfatória e decide modificá-la. No centro da aprendizagem, portanto, há descontentamento, inconformismo. Afinal, quem gosta de limites, independentemente de que lado eles estejam? Existe, também, humildade para admiti-los e determinação para transmutá-los. Para que eu decida sair de onde estou, é necessário eu acreditar em duas coisas: i) a nova situação será mais agradável do que a atual; e ii) eu sou capaz de chegar lá. Ah, eu também preciso dizer: eu quero mudar! O foco, portanto, não é exterior, mas interior. É imprescindível aceitar que o ponto de partida da transformação está dentro de nós. Quando isso acontece, por incrível que pareça, o mundo do lado de fora, tal qual um espelho, também se altera... Nessa aventura interna, que se parece com a escalada de uma montanha, temos vários tipos de sentimentos e pensamentos: alguns agradáveis e outros desagradáveis. Todos são naturais e precisam ser acolhidos. O importante é não deixar nenhum deles se apossar de você. A beleza da vida é fruto do que ocorre dentro da pessoa e não do lado de fora. Sem descartar medos, raivas, feridas e inseguranças, como é que a vida pode jorrar? Existirão momentos, também, em que seu corpo pedirá trégua e outros em que ele estará repleto de energia. Ouça-o e atenda as suas demandas, pois ele é seu companheiro indispensável nessa jornada na Terra. Acredito, portanto, que podemos aprender rindo ou chorando. Cada um deles tem sua riqueza. Um não substitui o outro. Precisamos de ambos. Nos momentos de desânimo, lembre-se sempre: tudo passa! Um detalhe importante: chegar no topo — ou no centro — é um fenômeno raro, por isso a riqueza dessa viagem é desfrutar de cada instante. Caminhe no seu ritmo, olhe a natureza, prove os sabores, respire fundo, ouça os sons, sinta as texturas, descanse... e siga em frente! 113 Na vida — e na escola — é fundamental que cada um assuma a responsabilidade pela sua epopeia, partilhe os seus aprendizados, avalie as consequências das suas escolhas e se perceba único numa multidão de peregrinos. Um aprendizado maravilhoso é respeitar o direito de quem não quer olhar para dentro e, por isso, escolhe continuar a sua vida no mesmo lugar íntimo e tentando mudar apenas os cenários exteriores... Ingrediente necessário nesse percurso é sempre celebrar, louvar, agradecer a vida. Reconheço: eu investi muito tempo da minha vida nessa faxina, mas agora está na hora de brincar mais! Obrigado meus amados mestres compositores e cantores: Almir Sater, Ego Trip, Engenheiros do Hawaii, Fernando Brandt e Milton Nascimento, Legião Urbana, Milton Nascimento, Raul Seixas... Obrigado meus amados mestres espirituais: Buda, Jesus Cristo... Obrigado meus amados mestres escritores: Antoine de Saint-Exupéry, Leo Buscaglia, Paulo Freire, Richard Bach, Rubem Alves... (a lista é grande!) Obrigado meus amados mestres amigos... Obrigado meus amados mestres terapeutas... PS: Acredito que estou cada vez mais motivado a ser construtivista, sociointeracionista e lúdico. ;-) Fonte [1] Inúmeras experiências têm acontecido no mundo mostrando que é possível, efetivamente, transformar a Educação, proporcionando aos agentes educativos alegria no espaço escolar. Destaco, aqui, a Escola da Ponte, em Portugal. PARADA OBRIGATÓRIA A Escola da Ponte (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.). MULTIMÍDIA EMEF Des. Amorim Lima [2]. O trabalho docente, portanto, possibilita e requer do professor uma constante reflexão sobre a sua práxis, que contempla o planejamento, a implementação e a avaliação. Isto será analisado mais detalhadamente na próxima seção. MULTIMÍDIA Novos horizontes [3]. 114 LETRA DA MÚSICA NOVOS HORIZONTES Fonte [4] Novos horizontes Humberto Gessinger Corpos em movimento, universo em expansão O apartamento que era tão pequeno não acaba mais Vamos dar um tempo, não sei quem deu a sugestão Aquele sentimento que era passageiro não acaba mais Quero explodir as grades e voar Não tenho pra onde ir, mas não quero ficar Novos horizontes, se não for isto, o que será? Quem constrói a ponte não conhece o lado de lá Suspender a queda livre, libertar O que não tem fim sempre acaba assim... OLHANDO DE PERTO Basta implementar inovações nos sistemas educativos? (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.) FONTES DAS IMAGENS 1. http://www.cronicadodia.com.br/2015/03/a-obrigacao-da-ludicidade- paulo.html 2. http://www.youtube.com/watch?v=QNkx0gpKYKo 3. http://www.youtube.com/watch?v=75wrC55F_0A 4. http://tbn2.google.com/images? q=tbn:ieRGU0pWI4anZM:http://br.geocities.com/euosou/liberdade02.jpg 5. http://www.denso-wave.com/en/ Responsável: Professora Carmensita Matos Braga Passos Universidade Federaldo Ceará - Instituto UFC Virtual 115 TÓPICO 03: PLANEJAMENTO EDUCACIONAL REFLEXÃO Neste tópico, refletiremos sobre o papel do planejamento na docência. • Por que é essencial um profissional planejar a sua prática? • Qual é a importância do planejamento para atividade docente? Conforme o Dicionário Aurélio: PLANEJAMENTO: S. m. 1. Ato ou efeito de planejar. 2. Trabalho de preparação para qualquer empreendimento, segundo roteiro e métodos determinados; planificação: o planejamento de um livro, de uma comemoração. 3. Bras. Elaboração, por etapas, com bases técnicas (especialmente no campo sócio-econômico), de planos e programas com objetivos definidos; planificação. (FERREIRA, 1993, p. 1342). Afinal, o que é planejar? Planejar, conforme o Dicionário Aurélio, é: “V. t. d. 1. Fazer o plano ou planta de; projetar, traçar: Um bom arquiteto planejará o edifício. 2. Fazer o planejamento de; elaborar um plano ou roteiro de; programar, planificar: planejar um roubo. 3. Fazer tenção ou resolução de; tencionar, projetar: ‘Mesmo antes do dia nascer, levantara-se, planejando uma vistoria aos serviços’ (Nélson de Faria, Cabeça-Torta, p. 135).” (FERREIRA, 1993, p. 1342). DIDÁTICA GERAL AULA 03: ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO DOCENTE 116 Fonte [1] O PLANEJAMENTO (CLIQUE AQUI PARA ABRIR) O planejamento, na maioria das vezes, é visto como mais uma exigência burocrática, um documento a ser arquivado, que só é elaborado para se desobrigar dessa cobrança, e não porque se perceba necessidade ou algum sentido em realizar. As reflexões a seguir buscam superar essa compreensão de planejamento, percebê-lo como uma atividade inerente à ação docente e ir além de uma perspectiva meramente formal e burocrática que o limita ao preenchimento de formulários e ao atendimento de exigências administrativas. O planejamento é a previsão, a projeção de uma prática. Contribui para guiar, orientar uma ação em busca de resultados. No caso do ensino, planejar envolve decidir sobre o quê e o como ensinar, com base nas concepções do por quê e do para quê ensinar. Não são, portanto, decisões meramente técnicas, uma vez que envolvem escolhas, interesses e fundamentam-se em valores. Para além do desobrigar-se de uma exigência burocrática, planejar é refletir sobre a prática pedagógica, para adequá-la a seu contexto, solucionar problemas que se apresentam, superar dificuldades, enfim para aperfeiçoar a ação docente. Ao planejar o professor torna-se protagonista de sua ação, negando-se a ser simples executor de esquemas elaborados por outrem. Mesmo partindo de propostas pensadas longe do espaço de sua sala de aula, o professor pode tomá-las como objeto de reflexão, avaliando-as, ressignificando-as, redirecionando-as, apropriando-se crítica e criativamente delas, imprimindo-lhes o significado desejado. Planejar é dar sentido à ação, é questionar sobre a importância das práticas pedagógicas, do conteúdo ensinado, das exigências feitas ao aluno, do tipo de avaliação empregado, das atividades propostas. É perguntar-se: qual o significado de cada um desses elementos na formação do meu aluno? Somente a partir dessa concepção de planejamento é possível evitar uma ação docente fundada na reprodução de rotinas descontextualizadas e 117 desmotivantes. A reflexão, a problematização e o questionamento do significado da ação desenvolvida permitem sua dinamização e renovação de acordo com a realidade para qual se destina. É através do planejamento que é possível encontrar caminhos para a efetivação dos princípios pedagógicos assumidos. O planejamento é a mediação entre aquilo que pensamos teoricamente ser a educação e o ensino, e a realidade concreta, como nos lembra Luckesi (1992, p. 168): “Para planejar torna-se necessário ter presentes todos os princípios pedagógicos a serem operacionalizados, de tal forma que sejam dimensionados para que se efetivem na realidade educativa”. O planejamento deve ser flexível, contínuo e participativo. A flexibilidade deve ser uma característica inerente ao planejamento do ensino, pois trata-se de prática social, interativa, imprevisível. Traçar princípios norteadores para a ação não significa que seja possível prevê-la em todos os seus detalhes. Não se trata, portanto, de uma camisa de força, um esquema rígido de ação, mas um roteiro flexível de orientação para a ação. É como um mapa que orienta a viagem, mas não representa a totalidade da viagem. Como prática social, o ensino apresenta sempre situações que não se repetem, portanto previsões rígidas não se encaixam nessa realidade. Estamos sempre lidando com a contingência, com o inesperado. Isso exige uma constante revisão, adaptação, contextualização do que foi previsto inicialmente. Planejar é, pois, uma atividade contínua que percorre todo o processo, e não apenas realizada no início para não ser mais retomada. Dar ao planejamento uma perspectiva participativa garante que a ação a ser vivenciada não esteja centrada na concepção de uma única pessoa ou de um grupo específico, valorizando apenas sua percepção da realidade, discriminando e excluindo outras leituras possíveis. Os alunos dão constantes evidências de sua percepção sobre o desenvolvimento do ensino aprendizagem, assim como outros sujeitos como: pais, outros professores, comunidade, demais profissionais da escola, pedagogos podem oferecer importantes elementos a serem considerados durante o planejamento. Do exposto, concluímos que, o planejamento numa perspectiva crítica, mais do que uma previsão técnica de objetivos, conteúdo, metodologia e avaliação, implica numa tomada de posição sobre a educação e o ensino, para, a partir de então, organizar a ação no sentido pretendido. Planejar é refletir sobre a ação docente, compreendê-la em seus determinantes, limites e possibilidades, e propor, com base nessa compreensão as possibilidades de construção de uma prática em constante superação. Extraído de Passos (2006). O planejamento de ensino, portanto, pressupõe que o docente tenha uma disposição permanente para refletir sobre a prática, no sentido de avaliar em que medida os elementos constantes do plano foram satisfatórios e o que pode ser modificado, objetivando à melhoria. Convém, portanto, que 118 ele seja um professor reflexivo, conforme defendem inúmeros estudiosos: Donald Schön, António Nóvoa, dentre outros. PARADA OBRIGATÓRIA Planejamento de ensino: peculiaridades significativas (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.). MULTIMÍDIA Didática e planejamento [2]. No próximo tópico, estudaremos sobre os diferentes tipos de plano de ensino, bem como os seus elementos constituintes. LEITURA COMPLEMENTAR Planejar é antecipar ações para atingir certos objetivos [3]. O Planejamento deve ser flexível [4]. Vamos estudar juntos? [5] OLHANDO DE PERTO O professor pesquisador e reflexivo (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.). Professor reflexivo: da alienação da técnica à autonomia da crítica (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.). FONTES DAS IMAGENS 1. http://www.tecnologiadeprojetos.com.br/banco_objetos/% 7BB34C96F9-468E-4516-9AEA-4D58027311DA%7D_gangorra.jpg 2. http://www.youtube.com/watch?v=7XKWgidh4B0 3. http://novaescola.org.br/conteudo/296/planejar-objetivos 4. http://novaescola.org.br/conteudo/345/o-planejamento-deve-ser- flexivel 5. http://novaescola.org.br/conteudo/1963/vamos-estudar-juntos 6. http://www.denso-wave.com/en/ Responsável: Professora Carmensita Matos Braga Passos Universidade Federal do Ceará - Instituto UFC Virtual 119 TÓPICO 04: PLANO DE ENSINO (TIPOS E ELEMENTOS) Conforme vimos no tópico anterior, o planejamento é uma atividade indispensável para o trabalho docente, o qual visa à aprendizagem do estudante. A avaliação da aprendizagem do estudante revela, portanto, não somente o que este aprendeu, mas permite saberem que medida as metas estabelecidas (no plano) pelo professor foram alcançadas. Planejar-implementar-avaliar: este é o cotidiano do professor comprometido com a qualidade do seu trabalho, que acredita que a Educação pode, de alguma forma, como preconizava Paulo Freire, em citação apresentada no tópico 2, da Aula 1, contribuir para a transformação da realidade. Na Educação, temos vários tipos de planejamento, de acordo com o tempo abrangido: disciplina (semestre e/ou ano), unidade e aula. O docente, no planejamento de ensino, deve considerar os meios (recursos) e os fins (objetivos), os quais estão intimamente vinculados, bem como as etapas e os caminhos, que precisam se adequar ao tempo disponível. Embora seja impossível a qualquer pessoa prever todas as possibilidades de uma situação, a improvisação na ação docente deve ser evitada a priori, ou seja, o professor precisa estar ciente de que o seu plano é uma orientação, um guia, mas que nem tudo sairá como planejado, sendo necessário, por vezes, criar uma alternativa para contornar uma situação inusitada. Nesta disciplina, refletiremos sobre plano de ensino, que é um documento necessário no cotidiano docente, pois registra vários componentes sobre o ensinar – o que (conteúdo), por que (justificativa), para que (objetivos – geral e específicos), como (metodologia), quando (as atividades e o tempo) e com que (recursos) – além das estratégias de análise da aprendizagem (avaliação) e das fontes utilizadas (bibliografia). Existem vários modelos de plano, cujas principais diferenças residem na nomenclatura dos elementos e na disposição dos mesmos. Escolhemos, conforme orientações insertas no Roteiro da Atividade de Portfólio 1, um modelo que contém os seguintes elementos: assunto, justificativa, objetivos, conteúdo, metodologia, atividades-tempo, recursos didáticos, avaliação e bibliografia. Eles serão explicados, a seguir, um por um. Alerto, todavia, que esta opção didática não nos permite concluir que os elementos podem ser entendidos separadamente, uma vez que, conforme estudamos na aula 2, é exatamente o contrário: O entendimento deles só emerge quando interligados, posto que eles compõem um todo. DIDÁTICA GERAL AULA 03: ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO DOCENTE 120 ASSUNTO (EMENTA) Apresenta o conteúdo, em formas de tópicos e em frases nominais (sem verbos), que será trabalhado no período indicado no plano, que, conforme vimos, pode ser de disciplina, de unidade e de aula. O assunto deve ser detalhado no elemento Conteúdo. JUSTIFICATIVA (INTRODUÇÃO/APRESENTAÇÃO) Exposição sobre o conteúdo da disciplina e a sua importância para a vida do estudante. É uma resposta àquela famosa pergunta dos estudantes: “Para que eu estou estudando isso, professor(a)”?. OBJETIVOS – GERAL E ESPECÍFICOS Os objetivos devem expressar as habilidades dos estudantes – motora, afetiva, cognitiva, relação interpessoal, inserção social... – que se pretende desenvolver durante o processo de ensino. Há somente um objetivo geral, que se desmembra em vários objetivos específicos. Eles são escritos com o verbo no infinitivo para indicar a competência aser alcançada – por exemplo: refletir, analisar, aprofundar, compreender, diagnosticar, identificar, elaborar, redigir, desenvolver, construir, valorizar, diferenciar, conhecer, estabelecer... – podendo serem complementados com outro verbo no gerúndio. Os objetivos, conforme já disse, estão relacionados aos conteúdos. O QUE SÃO OS OBJETIVOS? (CLIQUE AQUI PARA ABRIR) Os objetivos indicam as aprendizagens que se pretende desenvolver como conseqüência do processo de ensino. Constituem-se numa direção norteadora para a ação (não devem ser entendidos como previsão de um produto acabado). São os resultados buscados pela ação educativa. É a partir da definição dos objetivos que se pode acionar os meios adequados para atingi-los. Na definição dos objetivos devem ser considerados: as características dos alunos para os quais se dirige o ensino (nível de desenvolvimento, necessidades, interesses), a realidade social e institucional e as características da disciplina. Numa perspectiva crítica os objetivos devem propiciar o desenvolvimento: das capacidades mentais, do espírito crítico e da criatividade, de processos participativos, da relação teoria-prática, da solidariedade, do conhecimento cultural e científico. Neste enfoque a meta é superar níveis de aprendizagem que se limitem à reprodução de conhecimentos, à memorização de informações. É preciso ter consciência que as aprendizagens não se esgotam na dimensão cognitiva. O desenvolvimento do cidadão e do profissional (de qualquer área) envolve também as dimensões afetiva, ética, atitudinal, e em muitos casos envolve também aprendizagens motoras. A formação de um cidadão e de um profissional não se limita aos conhecimentos técnicos e científicos é, portanto, fundamental que os objetivos expressem isso. Cabe ainda esclarecer que, quanto à abrangência, os objetivos podem ser: Geral: que se constitui em diretrizes gerais para o trabalho pedagógico; expressa um posicionamento político sobre a relação da 121 instituição formadora com a sociedade. Alguns autores denominam de finalidades. É definido pelo sistema escolar (sistema federal de ensino - LDB, diretrizes curriculares - estadual ou municipal); pela instituição que define princípios e diretrizes através de uma proposta pedagógica; e pelos professores da disciplina. Nesse nível de abrangência são definidos: o papel da educação, do ensino ou da disciplina na formação dos sujeitos. Específicos: são os pequenos passos em direção ao alcance das finalidades. Referem-se a resultados de aprendizagens alcançáveis num espaço de tempo menor. Os objetivos mais amplos (formação de consciência crítica, desenvolvimento da criatividade, da capacidade de expressão, de atitudes de preservação e respeito ao ambiente; compreensão da organização do espaço; desenvolvimento do raciocínio lógico, dentre outros) são construídos a partir da combinação de aprendizagens alcançáveis num tempo menor, mas que são fundamentais para que se atinjam as grandes metas. Extraído de Passos (2006). CONTEÚDO Tradicionalmente, os conteúdos se restringiam à capacidade cognitiva. Zabala (1998, p. 30) defende a ideia de que eles devem contemplar, também, as dimensões motora, afetiva, de relação interpessoal e inserção ssocial. Col (1986 apud ZABALA, 1998, p. 31) divide os conteúdos em três categorias: conceituais (saber), procedimentais (saber fazer) e atitudinais (ser). Sugiro a substituição do ser por saber viver. Os componentes de cada conteúdo, conforme Zabala (1998, p. 32), são: Conceituais - Fatos, conceitos e princípios. Procedimentais - Procedimentos, técnicas e métodos. Atitudinais - Valores, atitudes e normas. COMO ESCOLHER CONTEÚDOS? (CLIQUE AQUI PARA ABRIR) A escolha dos conteúdos que devem compor o plano não é uma questão meramente técnica, já que no processo de seleção alguns conhecimentos são incluídos e outros são excluídos. Essa decisão se dá, com base em certas compreensões que se tem desses saberes e do seu papel na formação dos alunos. Não se pode, nesse sentido, esquecer o caráter de construção social próprio da seleção dos conteúdos programáticos de um plano de ensino. É necessária uma constante reflexão sobre os conteúdos a serem trabalhados, se quisermos realmente superar uma concepção de ensino baseada apenas na transmissão/reprodução de conhecimentos. Para isso torna-se imprescindível criar e ocupar espaços para que os conteúdos: • sejam instrumentos de compreensão e intervenção crítica na realidade, para isso precisam estar articulados com essa realidade; • superem a fragmentação e permitam uma visão de totalidade, através de uma perspectiva interdisciplinar; 122 • sejam dinâmicos, atualizados e oportunizem o desenvolvimento das capacidades cognitivas, éticas,afetivas, atitudinais e psicomotoras do educando; • oportunizem a manifestação e o respeito à diversidade. Extraído de Passos (2006). Conclui-se, portanto, que a seleção dos conteúdos, por estar fortemente vinculada aos objetivos, expressa uma concepção política, a partir do momento que pode (ou não) contribuir para a formação profissional de indivíduos, entendendo-os como sujeitos sociais. LEITURA COMPLEMENTAR Conteúdos procedimentais [1] Os tipos de conteúdo e os eixos temáticos dos PCN [2] METODOLOGIA Selecionados os conteúdos e os objetivos, o professor precisa escolher as ações de ensino, ou seja, o “como” fazer. São várias as metodologias: aula expositiva-dialogada, estudo de texto, tempestade cerebral, mapa conceitual, estudo dirigido, solução de problemas, dramatização, seminário, estudo de caso, fórum, oficina... Na seleção das estratégias, é fundamental que o professor as conheça, bem como considere, dentre outras coisas: i) o universo discente – idade, conhecimento, interesses...; ii) o conteúdo a ser socializado; e iii) os recursos didáticos disponíveis. A seguir, duas reflexões de pesquisadoras cearenses sobre a metodologia. CONTRIBUIÇÃO DAS METODOLOGIAS PARA A APRENDIZAGEM. (CLIQUE AQUI PARA ABRIR) A metodologia refere-se ao como desenvolver a ação pedagógica e só pode ser entendida articuladamente ao por quê e ao para quê dessa ação. Há uma grande expectativa de que a partir de mudanças na metodologia se possa conseguir resultados positivos na aprendizagem. Entretanto, uma mudança significativa demanda uma reflexão da prática pedagógica em sua totalidade, seus princípios e fundamentos. Uma mudança significativa não resultará de um acréscimo superficial e fragmentado de novas tecnologias e procedimentos de ensino. A metodologia é um recurso encaminhador de uma proposta pedagógica, neste sentido deve ser considerada em sua relação com os demais elementos que compõem a ação pedagógica, e não de forma auto- suficiente. É nesse contexto que se inserem novas metodologias, procedimentos e tecnologias. A escolha dos encaminhamentos metodológicos não deve ser aleatória, desvinculada dos objetivos e dos conhecimentos que se pretenda trabalhar. Também não é uma escolha neutra, pois o modo como se conduz a ação 123 pedagógica compromete-se com uma concepção de realidade e de educação; contribui com a formação de um determinado tipo de cidadão. Se a intenção do plano é superar uma concepção reprodutora/conservadora de ensino a metodologia deve respeitar os seguintes princípios: • compreensão da metodologia como parte de uma proposta pedagógica mais abrangente • relação professor-aluno dialógica • criação de espaço para a pergunta, a dúvida e a problematização • o aluno percebido como sujeito ativo de sua aprendizagem, alguém que constrói conhecimento (observa, relata, lê, resolve problemas, investiga, produz, cria, analisa, interpreta, tira conclusões, posiciona- se, experimenta, questiona, busca informações – ou seja, sai da posição de mero ouvinte) • relação teoria-prática • contextualização do objeto ou assunto em estudo • visão de totalidade • variação das situações de aprendizagem Extraído de Passos (2006). Metodologia é o estudo dos métodos. Metodologia de ensino significa o conjunto de métodos aplicados à situação didáticopedagógica. Método de ensino é o caminho escolhido pelo professor para organizar as situações ensinoaprendizagem. A técnica é a operacionalização do método. No planejamento, ao elaborar o projeto de ensino, o professor antevê quais os métodos e as técnicas que poderá desenvolver com seu aluno em sala de aula na perspectiva de promover a aprendizagem. E, juntamente com os alunos, irão avaliando quais são os mais adequados aos diferentes saberes, ao perfil do grupo, aos objetivos e aos alunos como sujeitos individuais. Nesse processo participativo o professor deixa claro suas possibilidades didáticas e o que ele pensa e o que espera do aluno como sujeito aprendente, suas possibilidades, sua capacidade para aprender, sua individualidade. Quando o professor exacerba um método ou uma técnica, poderá estar privilegiando alguns alunos e excluindo outros, e, mais ainda, deixando de realizar singulares experiências didáticas que o ajudariam aperfeiçoar sua prática docente e possibilitar ao aluno variadas formas de aprender. Ainda arriscar a trabalhar o saber de diferentes formas, percorrendo criativos trajetos em sala de aula. O medo de mudar, às vezes, impede o professor de arriscar novos caminhos pedagógicos. Daí o significado didático-pedagógico na formação 124 do professor. Os paradigmas das experiências anteriores podem ser as referências de muitos professores. Assim posto, é válido para o docente buscar novas técnicas, desbravar novos caminhos, numa investida esperançosa de quem deseja fazer o melhor, do ponto de vista metodológico e didático. Tal atitude implica em estudar sobre a natureza didática de sua prática educativa. Donald Schon tem sido uma referência teórico- metodológica dos profissionais que atuam na área de formação de professores por afirmar que os bons profissionais utilizam um conjunto de processos que não dependem da lógica, da racionalidade técnica, mas sim, são manifestações de sagacidade, intuição e sensibilidade artística. Schon orienta para que se observe estes professores para averiguarmos como desenvolvem suas práticas, como fazem e o que fazem, para colhermos lições para nossos programas de formação. O professor deve refletir didaticamente sobre sua prática, pensar no cotidiano sobre o saberfazer em sala de aula, para não escorregar na mesmice metodológica de utilização dos mesmos recursos e das invariáveis técnicas de ensino. É importante que o professor estude sobre essa temática, uma vez que há uma diversidade metodológica que pode ser trabalhada em sala de aula e/ou numa situação didático-pedagógica. Exemplo: exposição com ilustração, trabalhos em grupos, estudos dirigidos, tarefas individuais, pesquisas, experiências de campo, sociodramas, painéis de discussão, debates, tribuna livre, exposição com demonstração, júri simulado, aulas expositivas, seminários, ensino individualizado. Extraído de Silveira (2005). ATIVIDADES E TEMPO Fonte [3] O próximo passo é descrever as atividades e alocar o tempo disponível para elas. Esta etapa é indispensável para evitar que, no caso de: i) uma aula, o professor ultrapasse o tempo previsto, bem como fique sem saber o que propor aos estudantes; 125 ii) uma disciplina, o docente ensine alguns conteúdos com mais profundidade e outros, igualmente importantes na sua compreensão, de forma superficial. Com o passar dos anos, o(a) docente vai aperfeiçoando a distribuição do tempo para as atividades, recorrendo aos seus planos anteriores e às respectivas avaliações quanto à eficácia dos mesmos. Muito importante, também, é a troca de ideias com os colegas, que possibilitam uma reflexão do que se faz, bem como o conhecimento de outras estratégias. Para estimar o tempo de cada atividade, o professor deve considerar que os estudantes precisam de tempo para entender a atividade, organizarem-se e realizarem-na de acordo com as orientações. É recomendável não planejar muitas atividades para pouco tempo, uma vez que é interessante que os estudantes socializem as suas concepções e apresentem os caminhos e os resultados para serem avaliados pelo docente e pelos colegas. RECURSOS DIDÁTICOS Há de se esclarecer, inicialmente, a necessidade de diferenciar o recurso didático utilizado pelo professor para o ensino daquele destinado ao estudante para a aprendizagem. Embora eles possam ser o mesmo, é fundamental que se compreenda a importância do estudante, principalmente aquele no início Educação Básica, de explorar com todo o seu corpo a realidade que deseja compreender. Fundamental, portanto,que o professor escolha os recursos didáticos que permitam aos estudantes investigarem, individualmente ou não, formularem hipóteses, verificarem e socializarem as suas respostas, de modo a ampliar os conhecimento iniciais. Na escolha do recurso didático, o professor precisa considerar os seguintes aspectos: 1. Características do público a quem se destina; 2. Características do recurso a ser utilizado: considerar, principalmente, a adequação, a pertinência e a linguagem; 3. Características da situação em que o recurso será utilizado. Os recursos didáticos podem ser obtidos, basicamente, através de três formas: SELEÇÃO – o recurso já existe e o professor o utiliza sem qualquer alteração – ADAPTAÇÃO – o professor efetua alguma modificação num recurso – e CONFECÇÃO – o professor cria um recurso. Quanto ao uso, eles podem ser: • fartos (atendem vários estudantes), • variados (estimulam diferentes áreas do cérebro e ampliam as experiências), • significativos (contemplam aspectos do conteúdo). 126 É importante que toda sala de aula disponha de material básico – cartolina, papel A4, papel madeira, revista, caneta hidrocor, cola, tesoura, duréx, fita gomada... – para facilitar a realização de atividades rápidas. Na escolha do recurso didático, é importante que o professor considere os seguintes critérios: Tamanho: os materiais devem ser confeccionados ou selecionados em tamanho adequado à faixa etária dos alunos. Materiais excessivamente pequenos não ressaltam detalhes de suas partes componentes ou perdem-se com facilidade. O exagero no tamanho pode prejudicar a epreensão da totalidade (visão global). Significado Tátil: o material precisa possuir um relevo perceptível e, tanto quanto possível, constituir-se de diferentes texturas para melhor destacar as partes componentes. Contrastes do tipo liso/áspero, fino/espesso, permitem distinções adequadas. Segurança: o material não deve provocar reações alérgicas ou irritação da pele e não deve oferecer perigo para os estudantes. Estimulação Visual: o material deve ter cores fortes e contrastantes. Facilidade de Manuseio: os materiais precisam ser simples e de manuseio fácil, proporcionando ao estudante uma prática utilização. Durabilidade: os recursos didáticos devem ser confeccionados com materiais que não se estraguem com facilidade, considerando o frequente manuseio pelos estudantes. Desde o final do século passado, as novas tecnologias de informação e comunicação – NTIC têm sido, cada vez mais, utilizadas para facilitar os processos de ensino e de aprendizagem. Com a internet, as possibilidades se multiplicaram, com a criação dos Ambientes Virtuais de Aprendizagem – AVA, como é o caso do SOLAR, desenvolvido pela UFC Virtual. 0 desafio atual é identificar em que aspectos os recursos tecnológicos digitais contribuem e, eventualmente, atrapalham a Educação. A tecnologia, seja ela analógica ou digital, pode redimensionar os papéis de docente e de estudantes ou, apenas, modificar aspectos superficiais, mantendo, contudo, práticas baseadas na transmissão e na absorção. Fonte [4] Não é, porém, somente o aparato tecnológico que redesenha as relações em sala de aula. Outros recursos didáticos, a depender dos objetivos 127 pretendidos pelo docente, têm a capacidade de permitir que os estudantes, superando a passividade típica do ensino tradicional, assumam uma atitude de protagonismo. Em relação a isso, convém conhecer o Cone da Experiência, formulado, em 1946, pelo psicólogo Edgar Dale. Desta forma, os recursos didáticos – quadro, cartaz, painel, retroprojetor, tv, dvd, computador, datashow, internet e suas possibilidades (sites, e-mail, hipertextos, teleconferências, ... ) – devem estar a serviço da proposta pedagógica do professor, que se expressa nos vários elementos do plano de ensino. AVALIAÇÃO Fonte [5] Embora venha formalmente no final do plano, a avaliação está presente em toda a sua elaboração. Neste momento, o docente deve indicar quais serão as opções adotadas – por exemplo: participação, análise de caso, atividades práticas, situações-problemas, provas, experimentos – para acompanhar o processo/grau/nível de aprendizagem dos estudantes. 128 Ressalte-se que a aprendizagem não pode ser medida e que um instrumento pode ser adequado a alguns indivíduos e revelar-se inconveniente para outros. É importante, portanto, que, sempre que possível e a depender de diversas variáveis (idade dos estudantes, conteúdo, ....), o professor realize mais de uma verificação de aprendizagem, a qual permitirá que ele (re) planeje sua atuação. A avaliação pode ser realizada de diferentes formas: escrita, oral, observação, análise de produção. No que se refere à responsabilidade pela avaliação, são três os tipos: heteroavaliação, autoavaliação e coavaliação: na primeira, o responsável pela avaliação não é quem está sendo avaliado; na segunda, o próprio sujeito avalia seu desempenho; na terceira, há uma combinação das outras duas modalidades. A avaliação pode ter três funções: diagnóstica – são identificados, no início da ação de ensino, as habilidades dos estudantes, de modo a orientar a atuação do(a) professor(a) – formativa – acompanhamento, em vários momentos, da ampliação dos conhecimentos discentes – e certificativa ou somativa – cumprimento, no final da ação de ensino, dos objetivos traçados. Entendo que, no sentido mais amplo, toda avaliação é diagnóstica, pois ela permite interpretar a realidade. A partir dessa leitura, dois tipos de ação são possíveis: certificar ou continuar a formação. Abaixo, as pesquisadoras cearenses apresentam suas considerações sobre a avaliação. AVALIAÇÃO: O QUE SE QUER SABER, AFINAL? (CLIQUE AQUI PARA ABRIR) A avaliação tem sido usada como instrumento de poder, mecanismo ameaçador, disciplinador, punidor, gerando medo, tensão e inibição. Apesar do título avaliação, o processo esgota-se no ritual de aplicação, correção, entrega de testes e provas; reduz-se a função de atribuir notas tornando-se fator de seleção e exclusão; limita-se a ser classificatória e burocrática; rotula os alunos (os que sabem e os que não sabem, os que acertam e os que erram). A avaliação tem polarizado o processo de escolarização tornando-se um fim em si mesma, ou seja, tudo na instituição de ensino acaba girando em torno da avaliação, da nota e da preparação para processos seletivos: o que é importante, é importante porque cai na prova ou no vestibular; o que mais interessa ao aluno é saber como o professor vai avaliar, como será a prova; o importa é passar. A aprendizagem, o desenvolvimento do aluno, seu progresso em relação a níveis mais complexos de compreensão da realidade ficam em segundo plano. Com essas características a avaliação reduz-se a procedimentos que constatam problemas de aprendizagem, mas pouco ou nada fazem para solucionar tais problemas. Depois de realizadas as provas e entregues as notas, passa-se ao conteúdo seguinte sem que nenhuma providência seja tomada em relação às dificuldades que foram evidenciadas no instrumento de avaliação aplicado. 129 Para que a avaliação deixe de ser um mecanismo de exclusão e de produção do fracasso escolar e possa contribuir para a inclusão, e a superação das dificuldades de aprendizagem diagnosticadas, é preciso ressignificá-la como parte de uma prática pedagógica. Mudanças significativas só ocorrem quando se repensa a postura pedagógica como um todo, mudar a avaliação isoladamente não leva a uma mudança consistente. Por exemplo: incluir outros instrumentos de avaliação como seminários, relatório sem repensar o seu papel dentro do processo de ensino aprendizagem tende a ser uma mudança superficial. É fundamental resgatar a essência da avaliação, isso significa torná-la um meio para o crescimento do aluno, identificando suas dificuldades, como primeiro passo para sua superação; torná-la contínua e diagnóstica,o que leva a uma tomada de decisões, ao redirecionamento da prática, à reflexão do fazer pedagógico, para a busca de resultados satisfatórios. Nesta perspectiva, o erro que o aluno comete deve servir para construir a superação e não para desqualificá-lo ou ridicularizá-lo. Os resultados da avaliação oferecem evidências sobre o encaminhamento do processo de ensino aprendizagem, são subsídios que devem implicar num redirecionamento da ação, num replanejamento da ação pedagógica. O que revelam esses resultados? Houve aprendizagens? Quais os erros mais incidentes? O que significam esses erros? Que decisão se deve tomar? Retomar os conhecimentos que não repercutiram em aprendizagens? Prosseguir independente do que informam os resultados da avaliação? São decisões que implicam em reflexão sobre a ação pedagógica, que envolvem planejamento. Resgatar o papel da avaliação como subsídio para a superação das dificuldades de aprendizagem implica ir além do papel que tem cumprido de limitar-se a uma função de classificação e seleção. Para tanto há que se considerar alguns aspectos como: • Estabelecimento de critérios para a avaliação e correção dos instrumentos de avaliação, evitando decisões arbitrárias, ou avaliação de aspectos irrelevantes. Neste sentido os objetivos são elementos norteadores (se quero desenvolver o raciocínio a capacidade de análise crítica, qual o sentido de perguntar aspectos irrelevantes só para “pegar” o aluno?); • Utilização de vários instrumentos e vários momentos de avaliação, coletando evidências da aprendizagem (ou das dificuldades de aprendizagem) em várias situações; • Oportunizar situações variadas para a recuperação da aprendizagem e superação das dificuldades identificadas; • Evitar utilizar a prova como recurso de punição e coerção do aluno. A avaliação, considerando os aspectos levantados, pode contribuir para o crescimento do aluno, deixando de se constituir num ato definitivo, estático e seletivo para se converter num processo de investigação para a construção de resultados positivos de aprendizagem. (Luckesi, 1995; Esteban, 1999). 130 As reflexões acima pretenderam oferecer elementos para o professor repensar o planejamento passando a percebê-lo para além da formalidade do cumprimento de uma exigência burocrática, com potencialidade para se constituir num instrumento de aperfeiçoamento do ensino, para a superação de uma prática pedagógica engessada, repetitiva, descontextualizada, incapaz de responder aos desafios da contemporaneidade à educação, à formação dos cidadãos. Tomando por base os elementos sugeridos, o planejamento (e seu resultado, o plano) pode ser um fator dinamizador da ação docente e contribuir para melhoria da qualidade de ensino, ao lado de outros fatores indispensáveis na busca dessa qualidade: valorização do trabalho docente e melhores condições de realização desse trabalho. Extraído de Passos (2006). A avaliação é uma etapa presente quotidianamente em sala de aula, exerce uma função fundamental, que é a função diagnóstica. O professor deverá acolher as dificuldades do aluno no sentido de tentar ajudá-lo a superá-las, a vencê-las. Evitar a função classificatória, comparando sujeitos entre sujeitos. A avaliação deverá considerar o avanço que aquele aluno obteve durante o curso. Há muito que estudar sobre avaliação. Uma das dicas é a de realizar as articulações necessárias para que se possa promover testes, provas, relatórios, e outros instrumentos a partir de uma concepção de avaliação que diz respeito ao aluno como sujeito de sua aprendizagem, uma vez que planejar é uma ação dinâmica, interativa, e acontece antes de se iniciar o processo de ensino, durante e depois do processo. É uma ação reflexiva, que exige do professor permanente investigação e atualização didático- pedagógica. Extraído de Silveira (2005). PARADA OBRIGATÓRIA Avaliação – momento de angústia ou oportunidade de crescimento pessoal? (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.) BIBLIOGRAFIA Para elaborar e implementar um bom plano, é fundamental que o professor consulte livros universitários e didáticos, bem como sites e outros recursos – revistas, vídeos, filmes, músicas, poesias, mapas... – para ampliar seus saberes docentes: do conhecimento e pedagógico. Antes de finalizar esta aula e a disciplina Didática Geral, enfatizo o fato de que o trabalho docente não deve ser entendido como individual, uma vez que ele pertence a uma comunidade acadêmica, motivo pelo qual é fundamental que o docente, sempre que possível, busque articular-se com os colegas que lecionam na mesma turma, bem como com aqueles que 131 lecionam a mesma matéria nas turmas dos anos anterior e posterior à sua turma. O planejamento educacional, durante muito tempo, foi vivenciado como um ato burocrático, esvaziado de sentido, nos quais os professores pouco refletiam sobre os seus saberes e as suas práticas, limitando-se a indicar o conteúdo a ser lecionado durante certo período tempo. Cada vez mais, contudo, os agentes pedagógicos estão aproveitando essas reuniões para ampliar suas competências e, assim, transformar o cenário educacional. Neste sentido, o projeto pedagógico representa a oportunidade que a comunidade tem de discutir sobre as escolhas e as estratégias, bem como de avaliá-las a longo prazo, implementando as mudanças que se fizerem necessárias e lutando para melhorar as condições de trabalho, notadamente se for em uma escola pública. EX-PROFESSOR, PAULO MEIRELES BARGUIL (CLIQUE AQUI PARA ABRIR) Fonte [6] "A palavra é de prata. O silêncio é de ouro." Provérbio Chinês "Para tudo há um tempo, para cada coisa há um momento debaixo dos céus: [...] tempo para calar, e tempo para falar." Eclesiastes 3, 1.7b "São precisos dois anos para aprender a falar e sessenta para aprender a calar." Ernest Hemingway Professar ou não professar? Há alguns meses, ele vinha sendo palco de uma feroz batalha interna. Etimologicamente, professor é aquele que divulga verdades, crenças, certezas, na intenção de influir na vida dos ouvintes. 132 A sua trajetória pessoal, incluindo a acadêmica, lhe indicava, cada vez mais, a impossibilidade de cumprir esse mister, ainda mais utilizando palavras... Na maioria das vezes, o máximo que conseguia fazer, quando percebia alguma acolhida, era partilhar o que tinha aprendido, pois avaliava ser insano distribuir as suas dúvidas. Professor ou ex-professor? Vivia como um agente duplo, que brinca de se esconder, sem ter o prazer de se sentir em casa. Talvez por isso, escolhesse, com frequência, o silêncio. DICA Plano de Ensino (e de Aprendizagem) de Disciplina [7] (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.) Planos de Aula [8] LEITURA COMPLEMENTAR Planejamento docente (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.) Planejamento e conteúdos (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.) OLHANDO DE PERTO A Didática nos cursos de licenciatura: o futuro educador e a avaliação contínua (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.). Instrumentos de avaliação (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.). DICA Sugestões de filmes que abordam assuntos dessa aula. Escritores da liberdade [9] O céu de outubro [10] O sorriso de Mona Lisa [11] Sociedade dos poetas mortos [12] O Triunfo [13] MULTIMÍDIA Aspectos do planejamento escolar [14]. 133 Planejamento [15]. ATIVIDADE DE PORTFÓLIO Leia as orientações contidas neste Roteiro. (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.) Coloque nos portfólios individual e do grupo a sua produção (AULA_3_PORTFOLIO_1_ESTUDANTE.DOC). FÓRUM 1 - Leia as orientações contidas neste roteiro (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.) e poste a sua produção no Fórum. Comente, com argumentos e/ou exemplos do cotidiano, a respostade dois (duas) colegas. 2 - Leia um texto da seção Olhando de Perto da aula 3, excetuando-se os sobre Avaliação, e poste um comentário com as seguintes informações: i) O título e o(a) autor(a); ii) As principais ideias do documento; e iii) Sua opinião (concorda ou discorda ...), com argumentos, sobre as ideias citadas no item anterior e o que você aprendeu (e/ou as dúvidas que surgiram) com este artigo. Comente, com argumentos e/ou exemplos, a participação de dois(duas) colegas. REFERÊNCIAS BARGUIL, Paulo Meireles. O Homem e a conquista dos espaços – o que os alunos e os professores fazem, sentem e aprendem na escola. Fortaleza: Gráfica e Editora LCR, 2006. BERTICELLI, Ireno Antonio. Currículo: tendências e filosofia. In: COSTA, Maria Vorraber (Org.). O Currículo nos limiares do contemporâneo. 2. ed. Rio de Janeiro: DP&A, 1999. p. 159-176. CAPRA, Fritjof. A TEIA DA VIDA: uma nova compreensão científica dos sistemas vivos. Tradução Newton Roberval Eichemberg. 5. ed. São Paulo: Cultrix, 2001. COSTA, Maria Vorraber. Currículo e política cultural. In: COSTA, Maria Vorraber (org.). O Currículo nos limiares do contemporâneo. 2. ed. Rio de Janeiro: DP&A, 1999. p. 37-68. DALE, Edgar. AUDIO-VISUAL METHODS IN TEACHING. New York: Dryden Press, 1946. CREMA, Roberto. Além das disciplinas: reflexões sobre transdisciplinaridade geral. In: WEIL, Pierre; D´AMBROSIO, Ubiratan; CREMA, Roberto. Rumo à nova transdisciplinaridade: sistemas abertos de conhecimento. 3. ed. São Paulo: Summus, 1993. p. 125-172. 134 DOLL Jr., William E. Currículo: uma perspectiva pós-moderna. Tradução Maria Adriana Veríssimo Veronese. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997. FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário da Língua Portuguesa. 2. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1993. GALLO, Sílvio. Disciplinaridade e transversalidade. In: CANDAU, Vera Maria (org.). Linguagens, espaços e tempos no ensinar e aprender. Rio de Janeiro: DP&A, 2000. p. 165-179. GESSINGER, Humberto. Novos Horizontes. Intérprete: Engenheiros do Hawaii. In: 10.000 destinos. Universal, 2000. Faixa 18. LOPES, Alice Ribeiro Casimiro. Pluralismo cultural em políticas de currículo nacional. In: MOREIRA, Antonio Flávio Barbosa (org.). Currículo: políticas e práticas. Campinas: Papirus, 1999. p. 59-79. ______. Organização do conhecimento escolar: analisando a disciplinaridade e a integração. In: CANDAU, Vera Maria (Org.). Linguagens, espaços e tempos no ensinar e aprender. Rio de Janeiro: DP&A, 2000. p. 147-163. LUCKESI, Cipriano C. Filosofia da Educação. São Paulo: Cortez, 1992. NAJMANOVICH, Denise. O Sujeito encarnado – questões para pesquisa no/do cotidiano. Rio de Janeiro: DP&A, 2001. PASSOS, Carmensita Matos Braga. Planejamento: para além do burocratismo. Fortaleza. 2006. Notas de aula. ROCHA, Cristianne Maria Famer. Desconstruções edificantes: uma análise da ordenação do espaço como elemento do currículo. 2000. Dissertação (Mestrado em Educação). UFRGS, Porto Alegre. SILVA, Tomaz Tadeu. Documentos de identidade: uma introdução às teorias do currículo. 2. ed. 8ª reimp. Belo Horizonte: Autêntica, 2005. SILVEIRA, Regina Lúcia Barros Leal. Planejamento de ensino: peculiaridades significativas. In: Revista Iberoamericana de Educación, 2005. VEIGA-NETO, Alfredo. Currículo e história: uma conexão radical. In: COSTA, Maria Vorraber (org.). O Currículo nos limiares do contemporâneo. 2. ed. Rio de Janeiro: DP&A, 1999. p. 93-104. 135 VYGOTSKY, Lev Semenovich. A Formação social da mente. Tradução: José Cipolla Neto, Luis Silveira M. Barreto e Solange Castro Afeche. 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1991. ZABALA, Antoni. A Prática educativa: como ensinar. Tradução Ernani F. da F. Rosa. Porto Alegre: ArtMed, 1998. FONTES DAS IMAGENS 1. http://www.slideshare.net/louisacarla/apresentao-contedos- procedimentais 2. http://www.webartigos.com/artigos/os-conteudos-conceituais- procedimentais-e-atitudinais-em-correlacao-com-os-eixos-tematicos-dos- pcns/35902/ 3. http://3.bp.blogspot.com/-b9l-_tRSmQA/T_jpW6JfaiI/AAAAAAAAKA Y/g7VGiLby01M/s1600/tirinha+turma+da+monica48.gif 4. http://www.moodle.ufba.br/file.php/8925/imagens/humor1.jpg 5. http://4.bp.blogspot.com/-APchyIQPP04/UZ- Z4G5Ef0I/AAAAAAAAYag/EFkXTCoP8TA/s1600/jimmy+provas+c%C3% B3pia.jpg 6. http://imagens.mensagemespirita.com.br/images/uploads/posts_file_f oto/ftw-940x-am_121737_2989491_805004.jpg 7. http://www.ledum.ufc.br/arquivos/atividades/disciplinas/Plano_Ensin o_Educacao_Matematica_Educacao_Infantil_2015_1.pdf 8. http://educacao.uol.com.br/planos-aula/ 9. http://www.planetaeducacao.com.br/portal/artigo.asp?artigo=991 10. http://www.planetaeducacao.com.br/portal/artigo.asp?artigo=30 11. http://www.planetaeducacao.com.br/portal/artigo.asp?artigo=266 12. http://www.planetaeducacao.com.br/portal/artigo.asp?artigo=91 13. http://arquivoxdecinema.blogspot.com/2008/10/o-triunfo-ron-clark- story-200690-mins.html 14. http://www.youtube.com/watch?v=uCQCtHOnwkM) 15. http://www.youtube.com/watch?v=PnRUXfyHHNY&NR=1) 16. http://www.denso-wave.com/en/ Responsável: Professora Carmensita Matos Braga Passos Universidade Federal do Ceará - Instituto UFC Virtual 136 LPED_Capa_Creditos_Sumario.pdf impresso_parcial.pdf 01.pdf 02.pdf 03.pdf 04.pdf 05.pdf 01.pdf 02.pdf 03.pdf 04.pdf 05.pdf 01.pdf 02.pdf 03.pdf 04.pdf LPED_Contracapa.pdf