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05 DESAFIOS CONTEMPORÂNEOS TUDO

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DESAFIOS 
CONTEMPORÂNEOS 
CAPÍTULO 1 – SOMOS TODOS CIDADÃOS? 
 
Luísa Maria Silva Dantas 
 
 
 
Introdução 
Ao ouvir as palavras cidadão e cidadania, é comum nos remetermos às ideias de cidade e de participação dos indivíduos em sua sociedade. Além disso, cidadania também está associada à concepção de direitos que conformam uma vida digna, ou seja, o cidadão vive em uma coletividade, a sociedade, participa dela e possui direitos e deveres que lhe garantem uma vida digna. Essa poderia ser uma maneira de definir o que é cidadania, ligada à um coletivo de pessoas que atuam na sociedade de forma democrática e igualitária. Contudo, ao olhar ao nosso redor, será mesmo que todos os indivíduos de nossa sociedade participam ativamente das decisões que envolvem suas cidades, estados e a nação brasileira? Ou ainda, todas essas pessoas, que poderiam ser consideradas cidadãos, exercem de fato a cidadania? Em outras palavras, possuem as condições necessárias a uma vida digna? A igualdade, tão clamada e defendida pela sociedade moderna está de fato sendo defendida e praticada em nossa sociedade? 
Neste capítulo, vamos estudar as origens dessas ideias que parecem tão naturalizadas em nosso dia a dia, entender como foram instituídas e quais são os principais desafios para uma sociedade justa e igualitária na contemporaneidade. 
Acompanhe esse capítulo com atenção e bons estudos! 
 
 
 
1.1 Construção da Cidadania 
A palavra cidadania ou o que ela representa, nem sempre existiu ou teve o mesmo significado em diferentes lugares e ao longo do tempo. A concepção de cidadania a qual nos referimos é localizada no mundo ocidental e teve sua consolidação com o surgimento do mundo moderno, pautado nos ideais da razão, da ciência e da ampliação da participação política, que motivaram importantes revoluções, inicialmente, no contexto europeu, nos séculos XVIII, XIX e XX. 
Outra ideia e valor importante, também surgido na modernidade, é o próprio conceito de indivíduo, entendido enquanto um sujeito de direitos e envolto aos ideais de igualdade e liberdade que configuraram os Estados democráticos e capitalistas, com a formação da sociedade civil e a proteção da propriedade privada. O antropólogo francês Louis Dumont (1911-1998) identifica o individualismo como a ideologia da modernidade, ou seja, o conjunto de ideias em que o indivíduo é colocado como um valor central, posto que a ideologia é o modo como diferentes grupos sociais atribuem sentido às suas experiências no mundo. Vamos, a seguir, apresentar uma breve história da cidadania no contexto mundial. 
1.1.1 Breve história da cidadania 
As possíveis origens da cidadania remetem à antiguidade e aos contextos de Roma e Grécia, posto que nas cidades-estados desses países foram identificadas as primeiras formas de participação da população nas decisões da cidade. Apesar de cada integrante ter direito de voz e voto, apenas os considerados como cidadãos tinham este privilégio. Cidadãos eram apenas os homens, livres e com propriedades. Mulheres, escravos, artesãos e comerciantes estavam excluídos dessa classificação. 
Contudo, um conjunto de transformações ocorridas desde o século XV com a Expansão Marítima, Reforma Protestante no século XVI, além da Revolução Científica (século XVII), Independência dos Estados Unidos 
(1776), Revolução Francesa (1789), Revolução Industrial (final do século XVIII) e urbanização do mundo ocidental, provocaram mudanças profundas que promoveram o fim da Idade Média e o advento da Modernidade. 
 
 
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Figura 1 - Revolução Francesa, quando burgueses e camponeses uniram-se para depor o Estado Absolutista. Fonte: Oleg Golovnev, Shutterstock, 2018. 
 
 
O momento que instaura a modernidade pode ser caracterizado pela consolidação da burguesia enquanto grupo central, pois além do poder econômico acumulado com a expansão marítima e a posterior compra de fábricas, este grupo também conquistou o poder político, antes concentrado na aristocracia rural e na igreja católica. A mudança de gestão e organização política trouxe o surgimento do Estado Moderno, que concentrou o aparato administrativo, jurídico e de segurança das novas Nações. E também os ideais de liberdade e igualdade para todos os indivíduos inseridos em cada território. 
 	 
 VOCÊ O CONHECE? 
 
 
 
Os filósofos ingleses Thomas Hobbes (1588-1679) e John Locke (1632-1704), e o franco-suíço Jean-Jacques Rousseau (1712-1778) são conhecidos como contratualistas por defenderem que o surgimento do Estado Moderno é resultado de um contrato social, em que os homens viveriam em um estado de natureza e decidiram abrir mão de sua total liberdade para a constituição da sociedade civil. Contudo, estes filósofos divergiam quanto ao estado de natureza e a função do Estado. Para Hobbes, esta instituição viria para evitar uma guerra de todos contra todos; para Locke, atuaria como um juiz, já para Rousseau foi a instituição da propriedade privada que provocou o surgimento do Estado, posto que o estado de natureza seria o Éden, da felicidade plena. 
 
 
 
Então, desde a noção de cidadania que apenas abarcava homens abastados em Roma e Grécia, passando por quase nenhuma incidência no período feudal, é na modernidade, principalmente com a elaboração da Declaração de Independência dos Estados Unidos da América (1776) e a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789), elaborada na França, que a cidadania, na forma como é pensada e vivenciada por nós atualmente, foi inaugurada. 
Juntamente às transformações políticas, a sociedade e a economia também foram bastante abaladas com a possibilidade de participação nas decisões que envolviam estados, regiões e países e com a industrialização e urbanização que o mundo ocidental experimentava a partir do século XVIII. O modo de produção capitalista, pautado pela formação de um grupo que vendia a sua mão de obra para os donos das máquinas e fábricas em troca de um salário, gerou a classe trabalhadora, primeiro grupo que passou a organizar-se coletivamente para a conquista de direitos visando melhorar suas condições de vida e trabalho. Portanto, praticando uma das dimensões da cidadania, que é a luta por direitos civis, políticos e sociais. 
O sociólogo britânico Thomas Humphrey Marshall (1893-1981), em sua obra “Cidadania, classe social e status”, de 1950, (ARAÚJO, BRIDI e MOTIM, 2013), focada no contexto industrial inglês, defendia que a busca pela efetivação dos direitos era a condição principal para a cidadania, e os classificou em três grupos: 
1. Direitos civis – relacionados à liberdade de expressão, de prática religiosa e direito de propriedade; 
1. Direitos políticos – relacionados à possibilidade de opinar e de ocupar cargos políticos; 
1. Direitos sociais – voltados para a garantia de dignidade de cidadãos à margem da sociedade. 
 
 
VOCÊ SABIA? 
O marxismo contribui bastante para a construção da cidadania, é o que afirma 
Maria de Lourdes Manzini-Covre em seu livro “O que é cidadania?” Numa constante briga com a burguesia no que se refere a forma do uso dos direitos aplicados a sociedade na dominância de grupos sociais, o marxismo é base de uma teoria usada para transformar a sociedade burguesa, expressando a ideia do trabalho como forma de opressão e exploração. Marx (1818-1883) avança na questão da cidadania ao ser sufocado por esta luta. (MANZINI-COVRE, 2013). 
A denúncia de Marx vai de encontro a questão do trabalhador. Por exemplo, o operário é obrigado a vender sua força e habilidades no trabalho, mas não escolhe suas condições trabalhistas, percebendo que na maioria das vezes não tem o retorno esperado nos aspectos de alimentação, educação, mobilidade e saúde, a chamada exploração capitalista. Perceba que a influência do marxismo tem impacto relevante na construção da lei em oferecer um melhor sistema de trabalho, sendo que na ascensão do capitalismo se tem uma ideia de exploração ao operário que trocava suas horas de trabalho por remunerações baixíssimas. 
Agora você consegue perceber o ponto ondeMarx quer chegar, é isso mesmo! O sistema socialista, onde o estado perde forças e a sociedade trabalhadora que dita o planejamento de todos ao trabalho e aos bens necessários a vida. Note que a imagem do socialismo ideal é aparentemente linda, mas no leste Europeu este foi destruído por suas próprias mazelas. Mas não podemos negar que o “poderoso” Estado procura na atualidade se mostrar como um órgão de todos, porém no fundo visa favorecer os que estão no poder. 
Veja que todo esse ideal tem impacto na cidadania, que hoje é usada como arma para combater a exploração do Estado, esse tipo de cidadania sempre é sufocada pela cidadania pautada no consumo, herança capitalista, assim como a cidadania mais plena é uma herança marxista, que de forma aparente é benéfica ao trabalhador e a sociedade oprimida, mas que no fundo não funciona plenamente. 
 
Com isso, temos uma pequena contextualização da cidadania de modo global, mas e quanto ao Brasil? Acompanhe no próximo tópico. 
1.1.2 Cidadania no Brasil 
A cidadania no Brasil é um assunto bastante delicado, mas como em qualquer outro contexto, é importante saber a história de nosso país e os caminhos que foram e continuam sendo traçados a favor ou contrários à ampliação da cidadania dos brasileiros. Diferentemente do contexto europeu, em que as revoluções burguesas, a valorização da ciência e da razão e os movimentos operários contribuíram para a consolidação da igualdade e participação política de sua população desde o século XVIII, por aqui o percurso se deu posteriormente, influenciado pelos acontecimentos do além-mar, ou seja, pela expansão marítima europeia. 
Se a cidadania diz respeito à participação popular na vida política de um Estado-Nação e o exercício de direitos civis, políticos e sociais, nosso país esteve bastante aquém de alcançá-la. Primeiro, porque africanos e indígenas foram escravizados durante pelo menos três séculos, tendo a escravidão abolida apenas um ano antes da Proclamação da República, em 1888. Além disso, para ficarmos apenas no exemplo de direitos políticos, no Brasil, apenas em 1934 foi permitido às mulheres votar e somente com a Constituição de 1988 os analfabetos conquistaram este direito. 
Desde a primeira Constituição (1891) até a atual (1988), o Estado brasileiro assumiu várias feições, de ser sustentado e ocupado apenas por 
ruralistas, quando o voto era aberto e vigiado (“voto de cabresto”), passando pela Era Vargas (1930-1945), uma iniciante democracia, 20 anos de ditatura militar (1964-1984), até alcançarmos o retorno ao regime democrático de direito (1985). Nesse percurso, os direitos políticos foram conquistados por grande parte da sociedade, mas os direitos civis e sociais ainda se manifestam como um grande desafio para os movimentos sociais e os indivíduos que defendem uma ampla cidadania como condição para um mundo mais justo e igualitário. 
Vamos tomar como exemplo a população negra. Apesar da liberdade de culto religioso ser um direito civil garantido pela Constituição de 1988, é comum as mídias registram casos de assassinatos e violências a líderes e casas de religião de matriz africana. Quanto aos direitos sociais, institutos de pesquisa, como o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgam dados que comprovam o assassinato de grande parte da juventude, o encarceramento da população negra e a violência contra as mulheres, principalmente negras. 
 
 
 
VOCÊ SABIA? 
Educação, saúde, moradia, trabalho, lazer, esporte e segurança são direitos garantidos a todos os cidadãos brasileiros pela Constituição Federal de 1988. Ainda que na teoria isso seja de conhecimento, na prática, esses direitos estão longe de serem garantidos pelo Estado, fazendo com que uma parcela da população recorra aos serviços privados, e a maioria simplesmente viva cotidianamente sem acessá-los, ainda que a existência dos impostos seja justificada para garanti-los. 
Na resistência a favor da vida e da dignidade da população excluída dos meios de subsistência e integração social, o Brasil conta com extenso número de movimentos sociais, sindicatos, associações e organizações não governamentais, que atuam questionando e pressionando projetos e leis aprovados e postos em prática pelos poderes legislativo, executivo e também judiciário, visando a efetivação de políticas públicas e sociais que de fato reconheçam a cidadania da maioria da população brasileira. 
 
 
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Figura 2 - Exemplo de ocupação irregular muito comum no Brasil devido à falta de moradia em melhores condições. Fonte: De Visu, Shutterstock, 2018. 
 
 
Ao longo do tempo, os movimentos sociais também foram mudando sua organização e forma de atuação. Se na metade do século XX se proliferou grande número de sindicatos representativos da classe trabalhadora, com forte estrutura hierárquica e práticas de panfletagem para a organização de passeatas e greves, atualmente, com o desenvolvimento de novas tecnologias, os movimentos encontram-se cada vez mais horizontais e abarcando maiores escalas via mídias digitais que tem capacidade para conectar pessoas nos mais distantes lugares do globo. As manifestações de junho de 2013, bem como outras da contemporaneidade, foram articuladas e disseminadas de tal modo. Vamos continuar nossos estudos com o tema direitos humanos. 
 
 
1.2 Os Direitos Humanos 
Para entender o que são e como surgiu os direitos humanos, precisamos contextualizar historicamente de qual momento e local estamos falando. Vimos que o conceito de cidadão foi se transformando, pois nem sempre abarcou todas as pessoas que compunham determinada sociedade, já que durante muito tempo apenas eram considerados cidadãos os homens, livres e com propriedades. 
A concepção de direitos humanos, que nos referimos com tanta naturalidade, foi desenvolvida na modernidade, quando as revoluções burguesas depuseram os regimes absolutistas e a democracia, caracterizada pela soberania popular, foi estabelecida. O surgimento dos Estados Democráticos, a partir do século XVII no contexto europeu, institucionalizou a sociedade civil e impulsionou o surgimento de direitos e deveres para a manutenção e organização da sociedade. A ideia de cidadania está atrelada a este cenário de ampliação da participação política e da conquista de direitos: “na sua acepção mais ampla, cidadania é a expressão concreta do exercício da democracia” (PINSKY; PINSKY, 2010, p.10). 
Historicamente, os direitos foram associados e restritos aos grupos dominantes e a ampliação para o conjunto maior da sociedade está ligada à modernidade e suas transformações políticas, sociais e econômicas. Os direitos humanos da contemporaneidade se pretendem universais, indivisíveis, interdependentes e inter-relacionados. 
A seguir, vamos apresentar e discutir alguns aspectos históricos e sociológicos dos direitos humanos. 
1.2.1 Aspectos históricos e sociológicos dos Direitos 
Humanos 
A Declaração Universal dos Direitos Humanos, publicada originalmente em 10 de dezembro de 1948, pela Organização das Nações Unidas (ONU, 2009), é considerada o marco regulatório decisivo para a implementação e fiscalização dos direitos humanos no mundo ocidental moderno. A ONU surgiu em 1945, ano em que terminou a Segunda Guerra Mundial, com o intuito de incentivar o diálogo entre as nações e evitar novas catástrofes mundiais. Nesse sentido, a declaração dos direitos humanos foi um documento importante para enfatizar o caráter universal dos direitos, levando em consideração a pluralidade dos povos, bem como a sub- representatividade de determinados grupos nas esferas de poder e prestígio. 
A defesa pela igualdade e liberdade dos indivíduos foi uma das principais bandeiras ainda nas revoluções liberais-burguesas nos séculos XVII e XVIII. Àquela época, o grupo que conseguiu acumular renda, mas que ainda era desprovido de poder e participação política, uniu-se ao povo, os desprovidos de privilégios, mas obrigados a pagar altos impostos para os nobres, para o rei e para a igreja, para ter mais forçase conseguir realizar tais revoluções. Ao garantirem sua vitória, a burguesia aos poucos foi agindo contrariamente à consolidação de direitos para o povo, posto que não mais precisava de seu apoio, mas agora da exploração de suas vidas e trabalho para desenvolver o sistema capitalista. 
Nesse período, começaram a ser disseminadas as correntes do socialismo e do comunismo entre a classe trabalhadora, que passou a organizar-se na forma de partidos e sindicatos e lutar por melhores condições de trabalho A primeira metade do século XX foi marcada então pela divisão do globo entre países capitalistas e socialistas, culminando no surgimento de estados fascistas e totalitários e na Segunda Guerra Mundial. 
 	 
 VOCÊ QUER VER? 
 
 
 
No filme Norma Rae (FRANK JR; RAVETCH, 1979), a protagonista vem de uma família com gerações de trabalhadores da indústria têxtil e a partir do contato com um ativista passa a questionar as condições de trabalho e propor a organização de um sindicato. 
 
 
 
Nas práticas de colonização promovidas pela Europa na América Latina, África e Ásia também podemos identificar a desumanização dos povos dominados, que tiveram sua cultura, língua, economia e religião negligenciados e combatidos em prol da ocidentalização do mundo. Outro exemplo de violência contra a universalidade da humanidade pôde ser observada no regime nazista alemão que, baseado em uma ideia de supremacia racial, também dizimou milhões de pessoas e implementou os campos de concentração. 
 
 
 
VOCÊ SABIA? 
No Brasil foi instituída uma Comissão Nacional da Verdade (CNV), em 2011, durante o governo de Dilma Rousseff, para investigar violações aos direitos humanos cometidos entre 18 de setembro de 1946 e 5 de outubro de 1988, abarcando o primeiro período democrático do país (1946-1964), a ditadura militar (1964-1984), o retorno à democracia (1985) e a instituição da atual Constituição Federal (1988). 
 
 
Outro desafio a partir da Declaração Universal dos Direitos Humanos é de 
que todos os indivíduos “são iguais perante a lei”, além de livres para expressarem suas opiniões e cultuarem a religião que escolherem. Bom, basta olharmos qualquer reportagem e/ou relato do cotidiano para percebermos que a justiça não se aplica de maneira igualitária, independente da cor/etnia, classe social, gênero, nacionalidade, orientação sexual, opção política-ideológica etc. Também temos os casos de “prisioneiros da consciência”, ou seja, pessoas que foram presas por se manifestarem contrariamente a governos totalitários, como durante a ditadura militar no Brasil. E quanto à religião, casos de repressão às suas manifestações, como o uso no véu na França por muçulmanas, que foi repreendido, ou os casos de depredação de casas de religião de matriz africana no Brasil. 
 
 
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Figura 3 - Praticante de religião de matriz africana, que apesar de estar garantida pela constituição brasileira, continuam sofrendo violência. Fonte: Vitoriano Junior, Shutterstock, 2018. 
 
 
Então, é pertinente nos determos na afirmação de John Dewey que o historiador Marco Mondaini (2009, p. 159) nos traz à tona: “Se você quer estabelecer a concepção de uma sociedade, descubra quem está na prisão”. Essa afirmação é importante para que possamos avaliar se os ideais de justiça social, paz, diversidade cultural e respeito aos direitos humanos estão sendo exercidos nos diferentes países. 
No próximo tópico, vamos discutir as assimetrias entre o Brasil de direito, caracterizado pelas leis, e o de fato, fundamentado na prática cotidiana. 
 
 
 
 VOCÊ QUER VER? 
 
Ouvimos e falamos muito em direitos humanos, em diversas lutas, protestos, nas mídias em casa. Sim eles estão por toda parte, inclusive na sua mente. Mas afinal de conta O que são direitos humanos? Como surgiu este conceito e como na prática esses direitos são aplicados na sua vida? Se fizessem a você estas perguntas o que responderia? Pense por alguns instantes e assista o pequeno documentário disponível no site unidos pelos direitos humanos clicando no link <https://www.unidospelosdireitoshumanos.org.br/what-are-humanrights/>, mergulhe nas páginas da história e no mundo do conhecimento deste aspecto tão importante para sua vida, ao final reflita, seus direitos são os direitos dos outros. 
 
 
 
 
1.2.2 Brasil Legal x Brasil Real 
O caminho percorrido pelos Estados Unidos, Inglaterra e França, é de conquista de direitos civis – as liberdades individuais (século XVII e XVIII), depois direitos políticos – igualdade política (século XIX), e direitos sociais – igualdade social (século XX). No Brasil, houve inicialmente, alguns ganhos sociais, como a consolidação das leis trabalhistas (CLT), em 1943, durante o governo de Getúlio Vargas, para que posteriormente fossem conquistados direitos civis e políticos, principalmente após a ditadora militar, em 1984, quando foi (re)instituído no Brasil o Estado Democrático de Direito. 
Em termos legais, o Brasil se coloca como um dos países com legislação mais avançada da América Latina, contudo percebemos grande contradição entre o campo “legal” e o “real”, ou seja, apesar de uma constituição e leis que garantem a igualdade, liberdade e dignidade de todos os cidadãos, os direitos fundamentais como saúde, moradia, segurança, transporte, lazer e educação são escassos a ampla parcela da população. 
A dinâmica social contemporânea, ainda que imbuída em um cenário de direitos e normas jurídicas estabelecidas, se passa como se ainda vivêssemos na idade média, quando o poder econômico e político eram determinados pelo nascimento, já que mesmo com a igualdade presente nas leis, não há meios adequados para que pessoas de diferentes estratos sociais alcancem os lugares mais prestigiados da sociedade. Mesmo que a 
justificativa não seja mais os “desígnios de deus”, a estratificação ou desigualdade social é uma das características mais evidentes de nosso país. 
 	 
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“Quarto de Despejo – Diário de uma favelada” (JESUS, 2014) é um livro em que são editados os diários de Carolina Maria de Jesus, uma mulher negra, migrante de Minas Gerais, papeleira e moradora de uma favela em São Paulo, na década de 1950. O livro retrata o cotidiano de miséria, privações e a sociabilidade da escritora, sua família e vizinhos, explicitando as trajetórias de pessoas à margem da cidadania e dos direitos fundamentais no Brasil. 
 
 
 
Pessoas são tratadas de forma distinta conforme os marcadores de diferença, classe, cor e gênero, por exemplo. O aparato público é utilizado com fins privados e o coronelismo ainda se apresenta como uma das principais práticas políticas. Esse clientelismo que deveria ter acabado com a instituição da democracia e ampliação da cidadania ainda não foi exterminado, já que os políticos atuais são os mesmos ou, então, descendentes dos antigos coronéis. Assim, os direitos humanos ainda não conseguiram garantir a emancipação real da maioria da população brasileira. 
 
 
 
 VOCÊ QUER VER? 
 
 
 
No filme Quanto vale ou É por quilo? (BIANCHI; BENAIM; CANITTO, 2005) é retratado os trâmites entre política e filantropia, além de fazer uma analogia entre o comércio de escravos e a atual exploração da miséria por vários agentes sociais. 
 
É inegável que desde a abertura política já tivemos inúmeros avanços, mas infelizmente estes também chegam acompanhados por retrocessos. A reforma agrária que possibilitaria a permanência dos agricultores no campo, a manutenção de identidade e cultura de quilombolas e indígenas ainda não foi realizada. Ao mesmo tempo em que houve a universalização de crianças nas escolas, também enfrentamos uma taxa de mais de 10 milhões de brasileiros desempregados (GOMES, 2018). Vivemos, então, em um Brasil em que uns são mais humanos do que outros? Enfrentar essas disparidades se constitui como um desafio urgente para construirmos um lugar realmente plural e digno para todos, onde a paz, a segurança coletiva, o desenvolvimento e os direitos humanos sejam indissociáveis. 
Agora, vamos apresentara situação de grupos que permanecem à margem de parte ou integralmente dos direitos humanos. 
 
 
1.3 Mulheres e Minorias 
Este tópico diz respeito aos avanços, desafios e entraves para o exercício da cidadania e do respeito aos direitos humanos de grupos subalternizados, também chamados de minorias. O primeiro ponto que precisamos elucidar se relaciona justamente a palavra minorias. Quando a ouvimos, a primeira ideia que nos vem a cabeça tem a ver com um número reduzido, ou seja, com quantidade. No entanto, essa imagem pode gerar equívocos quando a palavra minorias está associada a políticas públicas ou direitos humanos. Isso porque grupos compostos por milhões de pessoas – que, muitas vezes, podem constituir a maioria em termos numéricos da população de determinada sociedade -, mas que, contrariamente à sua presença numérica, estão sub-representados em espaços de poder, prestígio, educação, renda, saúde e lazer. Além disso, são hiper-representados entre o grupo com menor poder aquisitivo, ocupando os empregos menos valorizados e prestigiados, deficitários de saúde, educação, moradia, segurança, lazer e respeito aos direitos humanos. 
Nesse sentido, as mulheres e outros grupos como homossexuais, transexuais e transgêneros, deficientes, idosos, jovens e crianças, são estratos da sociedade considerados minorias justamente por estarem mais vulneráveis a violências e carentes de respeito aos seus direitos humanos mais fundamentais. Em contraponto às minorias, está o grupo hegemônico, provido de privilégios e vantagens historicamente perpetuadas. Esse lugar é ocupado por homens, brancos, heterossexuais, que moram nos lugares mais caros das cidades, ocupam profissões bem remuneradas e respeitadas e estão menos sujeitos às violências criminosas e institucionais, fazendo com que pessoas que não correspondem a este perfil sejam vistas e tratadas como não tão 
“humanas” assim. 
 
 
 VOCÊ QUER VER? 
 
 
Vamos lá, você deve se perguntar as vezes se no meio de tantas leis que promovem a igualdade, por que ainda existe tanta desigualdade? O site believe.earth/pt-br trás de forma simples e objetiva 10 ações diárias para promover a igualdade entre homens e mulheres clique <https://believe.earth/pt-br/10-acoes-do-dia-diaque-promovem-igualdade-de-genero/>; após a leitura e anotações, você é desafiado a pensar em fatos sociais e profissionais que geram desigualdade entre homens e mulheres, ai você percebera que a situação ainda tem muito a ser trabalhada, quer ver? Vou adiantar um dos fatos, o analfabetismo é um deles, dos 750 milhões de pessoas sem habilidades básicas em leitura, mais da metade são meninas. No link a seguir você encontrará a leitura ilustrada desses fatos sobre estas desigualdades listadas pela ONU (Organização das Nações Unidas). <https://nacoesunidas.org/onu-16-fatos-sobre-desigualdades-entre-homens-e-mulheres/>. 
 
 
Será que diferenças são o mesmo que desigualdades? É o que vamos abordar no próximo tópico. 
1.3.1. (Des)naturalização das desigualdades 
Enquanto seres coletivos, vivendo em sociedade, nossa socialização desde a infância se dá por meio de instituições sociais, como família, escola, igreja e Estado, que, frequentemente, disseminam o modelo hegemônico sobre o que é normal ou anormal para a contribuição da ordem social. Entretanto, nesta “ordem”, normalmente alguns grupos são privilegiados, enquanto outros são inferiorizados. Portanto quem detêm o poder político e econômico não pretende perder seus privilégios e, para isso, faze uso do aparato ideológico para manter a estrutura social no modelo que mantém sua posição de dominação sobre outros. 
Isso acontece, por exemplo, em relação ao conceito, características e significados de mulher e homem em nossa sociedade. Somos ensinados que quem nasce com uma vagina é do sexo feminino e devem ser socializados como mulheres, enquanto quem nasce com pênis, devem aprender a ser homem. Essa associação, que durante tanto tempo foi 
vista como natural e disseminada pelas instituições sociais, atualmente começa a ser tensionada por estudiosos que irão defender que a própria biologia é uma construção cultural (MARILYN STRATHERN, 1992 apud CARVALHO, 2012), portanto não é natural ou imutável. 
Mas, seguindo o modelo sexo-gênero (GAYLE RUBIN, 1975 apud CARVALHO, 2012), tão difundido ao longo dos tempos, a genitália determinaria o comportamento social das pessoas e também o papel que estas deveriam desempenhar nos seus contextos sociais. Podemos perceber que essa estrutura binária contribuiu para a dominação masculina e a opressão das mulheres. 
Alguns autores vão justificar que as mulheres estariam ligadas à natureza e à reprodução da família e do lar, enquanto os homens estariam atrelados à cultura, ao espaço público e ao sustento de suas famílias e lares, como se homens e mulheres estivessem limitados a apenas um destino estabelecido pela natureza. 
Várias pesquisas em diferentes sociedades (MARGARETH MEAD, 2000 apud CARVALHO, 2012) contrapuseram este quadro, demonstrando que existem vários modelos sobre o que é ser homem ou mulher e nem sempre ligados à constituição biológica dos seres. Além disso, hoje se sabe que a maneira dicotômica de classificar o mundo em macho/fêmea, alto/baixo, mente/corpo, é apenas uma das possibilidades de entendimento, dentre várias outras, cada vez mais múltiplas. 
Em relação especificamente às mulheres, que se constitui como uma minoria por não gozar de plena cidadania e respeito aos direitos humanos, foi justamente durante as revoluções liberais, que elas passaram a questionar sua ausência no grupo dos cidadãos. A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, por exemplo, não incluía as mulheres. Desde o início da modernidade, as mulheres passaram a lutar por sua efetiva inserção na sociedade civil, reclamando seu direito de voto e também de poderem assumir cargos políticos. 
 
VOCÊ SABIA? 
A Arábia Saudita é um país em que as diferenças entre os direitos e papéis de homens e mulheres é bastante desigual, visto sob o contexto dos direitos humanos. As mulheres precisam da autorização de um parente masculino para viajarem, trabalharem ou casarem. Foi o último país no mundo a negar as mulheres o direito de voto, conquistado apenas em 2015, e ainda assim, a representatividade das mulheres é irrisória, apenas 1 em cada 10 eleitores. 
 
 
A luta pelo direito do voto, quando da consolidação dos Estados democráticos no ocidente, se constituiu como a “primeira onda” na história oficial do feminismo – movimento acadêmico e ativista que atua em prol das mulheres. Posteriormente, com a industrialização e urbanização, as mulheres também passaram a se organizar para exercerem direitos iguais aos dos homens como o de ocupar o emprego que lhes desse vontade e ter a mesma remuneração que seus pares masculinos. Além disso, também passaram a questionar seus papéis sexuais enquanto apenas esposas, mães e responsáveis pelos afazeres domésticos, e a reivindicar por liberdade sexual, o que foi facilitado com a invenção da pílula anticoncepcional na década de 1950, a prática sexual não mais estaria atrelada somente à reprodução. 
 
 
 
 
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Figura 4 - Dilma Rousseff foi, até o momento, a primeira e única mulher presidente do Brasil (2011 a 2016). Fonte: Shutterstock, 2018. 
 
 
Enquanto ferramenta de produção de conhecimento científico, após o conceito de papéis sexuais, na década de 1980, a feminista estadunidense Joan Scott (1985) introduziu o conceito de gênero para estudar o caráter cultural dos papéis de homens e mulheres. Partindo dessa ferramenta analítica, muitas pesquisas foram desenvolvidas, mas inicialmente apenas chamando atenção para as trajetórias sociais e dificuldades que as mulheres enfrentavam/enfrentam em seus cotidianos. Depois, houve o entendimento de que a categoria gênero seria relacional, se trataria das relações sociais constituídas por homens e mulheres e suas peculiaridades. Nesse momento, surgem trabalhos que também interpelam e manifestam a existência de masculinidadese feminilidades no plural. 
Isso significa que de categorias que antes foram determinadas biologicamente, homens e mulheres passaram a ser constructos sociais e,portanto, passíveis de mudanças, já que a cultura está em contínua transformação. 
 
 
 
 VOCÊ QUER LER? 
 
 
 
O livro “O conto da aia” (ATWOOD, 2017), em inglês The Handmaid’s Tale, é um romance da canadense Margaret Atwood lançado originalmente em 1985. A partir de uma cidade fictícia dos Estados Unidos, a história retrata um golpe em que um grupo conservador toma o poder, destruindo o país e impondo papéis sexuais para diferentes grupos de mulheres, que remetem às ideias de natureza e submissão. 
 
 
 
Além das recentes discussões sobre o caráter cultural da natureza, as perspectivas de feministas afro-estadunidenses, desenvolvidas pelos menos desde os anos 1960, juntamente com as abordagens de mulheres do “terceiro mundo”, passaram a ter maior visibilidade a partir dos anos 1990. Autoras como Angela Davis, Bel Hooks, Kimberlé Crenshaw, Chandra Mohanty e Lélia Gonzalez chamaram atenção para a 
heterogeneidade da categoria mulher, defendendo que as experiências e opressões variam de acordo com o lugar que determinada mulher ocupa e da sociedade em que está inserida. Desse modo, salientam que classe social, cor, orientação sexual e religião não podem ser entendidas de forma separada ou hierarquizada, pois, muitas vezes, atuam de forma simultânea nas trajetórias de diferentes mulheres. Então, levantaram críticas a respeito de apenas um discurso feminista, pautado nas experiências de mulheres, brancas, heterossexuais, norte-americanas e europeias. 
 
 
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Figura 5 - Mulher protestando em ato público pela garantia de direitos civis, políticos e 
sociais. Fonte: arindambanerjee, Shutterstock, 2018. 
 
 
Para enfrentar as desigualdades e violências que diferentes mulheres ainda enfrentam, os movimentos sociais, organizações não governamentais e partidos sensibilizam a opinião pública por meio de campanhas e protestos, visando o estabelecimento de leis de proteção e políticas afirmativas para que as mulheres possam ser respeitadas em seus direitos humanos e ocupem diferentes espaços sociais. 
No Brasil, em 7 de agosto de 2006, foi sancionada a Lei Maria da Penha - Lei 11.340 (BRASIL, 2006) que visa criminalizar e punir a violência contra as mulheres. Há também a Lei do Feminicídio – Lei 13.104 (BRASIL, 2015) – que classifica como crime os assassinatos cometidos em razão de serem mulheres. 
Qual seria o outro seguimento social que também permanece em desigualdade em nossa sociedade? Veja a resposta no tópico a seguir. 
 
 
1.4 A questão étnica racial 
Para justificar a colonização, exploração e dominação de povos e países, os europeus ancoraram-se em teorias pseudocientíficas que abalizavam diferenças étnico-raciais enquanto desigualdades intelectuais e morais. Isto é, utilizaram a teoria da evolução das espécies desenvolvida por Charles Darwin (1809-1882) para explicar a manutenção e proliferação de certos tipos de animais e vegetais, e construíram a teoria da evolução social, pautando-se pelo argumento de que povos também deveriam passar por estágios evolutivos para progredirem. Iriam da selvageria, passando pela barbárie, até chegar na civilização, que seria a cultura ocidental europeia. 
Assim, o argumento moralmente defendido para a colonização era de que os europeus iriam “civilizar” o novo mundo, enquanto uma “missão de ajuda humanitária”. Não é preciso adivinhar que para tal intento, no caso brasileiro, trataram como selvagens e bárbaros indígenas, africanos e seus descendentes. Era preciso tornar inferior estes grupos, juntamente às suas culturas e religiões, para que o projeto “civilizatório” desse certo. Com isso, foram aplicadas na sociedade brasileira teorias raciais que surgiram na Europa desde o século XIX, e pregavam a ideia de supremacia e pureza raciais. Então, além do genocídio da população indígena e a escravização de africanos, também foram postos em práticas políticas públicas para o embranquecimento da população, sob o argumento que o desenvolvimento da nação estaria diretamente relacionado com o fim da população negra e indígena. 
 
 
 
 VOCÊ O CONHECE? 
 
 
 
O psiquiatra e filósofo martinicano, de ascendência francesa e africana, Franz Fanon (1925- 1961), escreveu sobre os efeitos do racismo na subjetividade de homens racializados e lutou pela independência da Argélia. Suas obras “Pele negra, máscaras brancas” (1952) e “Os condenados da terra” (1961) são referências dos estudos culturais e pós-coloniais. 
 
 
 
Como você pode subentender, durante muitos séculos o conceito de cidadão brasileiro não incluía a população negra ou indígena. Por serem considerados “menos humanos” que os brancos, não eram reconhecidos como sujeitos dos direitos humanos, logo, o país vem perpetuando uma dívida com esses grupos, que podem ser considerados minorias, e que, infelizmente, apesar de alguns direitos já reconhecidos, continuam tendo que resistir aos efeitos da discriminação racial que estrutura a sociedade brasileira. 
Surge, então, a pergunta: como consolidar a cidadania e a democracia plena em um país fundado na desigualdade social e no preconceito racial? A resposta passa por uma grande revolução em todas as esferas da vida social, com a prioridade dos direitos humanos universais. Com isso, poderemos pensar em nos desenvolvermos e constituirmos em um povo harmônico e miscigenado de fato, enquanto isso, ainda temos muita estrada pela frente. 
 
 
 
 
 
 VOCÊ QUER VER? 
 
Racismo é um assunto delicado, é necessário sair um pouco da teoria e ver como acontece na realidade cotidiana das pessoas, acompanhe agora um pequeno vídeo produzido pela GNT onde três mulheres negras, incluindo a filósofa Djamila Ribeiro, discutem o que é o racismo. Um dos contextos é a educação, o acesso as escolas e universidades. Vamos lá? <https://youtu.be/dU-hqu7aqj4> talvez você passe por estas situações citadas ou conheça alguém que vive estes dramas raciais. 
 
 
Já no próximo tópico, vamos estudar a sociedade brasileira, posto que a partir da identificação, é possível buscar soluções para os problemas. 
1.4.1 Enxergando a sociedade brasileira 
A década de 1930 ficou conhecida como o período em que surge a sociologia no Brasil. O início foi marcado por perguntas que buscavam entender a sociedade e a cultura brasileira, “afinal, o que faz o Brasil, Brasil?”. Nesse momento, surgiram obras importantes com o intuito de responder tal questionamento como “Casa Grande e Senzala” (FREYRE, 1992 [1933]), do pernambucano Gilberto Freyre (1900-1987), em que podemos perceber uma crítica à supremacia racial das teorias raciais do século XIX. O autor aborda a miscigenação entre europeus, africanos e indígenas como o traço central da sociedade brasileira, mas defende o que ficou conhecido como o “mito da democracia racial”, como se no Brasil não existisse conflitos raciais e todos os povos vivessem com respeito, igualdade e harmonia. Desse modo, o mito da democracia racial corresponde à ideia de que no Brasil não existem conflitos raciais e todos os segmentos sociais tem a mesma oportunidade de acesso a direitos, bens e serviços, ou seja, uma falácia. 
 
 
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Figura 6 - A capoeira é uma arte marcial brasileira, desenvolvida por africanos e brasileiros 
escravizados e durante muito tempo sua prática foi proibida. Fonte: Val Thoermer, Shutterstock, 2018. 
 
 
Por décadas e mesmo nos dias atuais, o mito de que no Brasil não existem conflitos raciais ainda é disseminado quando se deseja discorrer sobre a sociedade brasileira. O problema é que ele mascara e invisibiliza a realidade de grupos brasileiros (negros e indígenas), contribuindo assim para a perpetuação de violências, desigualdades e segregações. 
 
 
 
 VOCÊ QUER LER? 
 
 
 
O livro “Um defeito de cor” (GONÇALVES, 2006), escrito por Ana Maria Gonçalves, é a história de uma africana trazida à força para ser escravizadano Brasil, seus antepassados e os eventos que vivencia no “novo mundo”. É uma obra prima que reflete o horror da escravidão e do racismo na sociedade brasileira, mas também um documento histórico sobre resistência, solidariedade e espiritualidade. 
 
 
 
No Brasil, metade da população é negra ou não branca (SARAIVA, 2017), mas estes estão sub-representados nos locais de prestígio e poder da sociedade e hiper-representados nas profissões de menor valorização e remuneração, como o trabalho doméstico, de portaria e segurança. Ocupam os bairros menos valorizados, distantes do centro das cidades, muitas vezes, com falta de saneamento básico e serviços. Assim como as mulheres, a população negra ou não branca, sobretudo, mulheres negras, ganham menos que os homens brancos ao realizarem o mesmo serviço. 
CASO 
No Brasil, existem aproximadamente 6 milhões de trabalhadores domésticos. Destes, mais de 95% são mulheres, e em torno de 70% mulheres negras. Apenas 30% destas trabalhadoras possuem a carteira de trabalho registrada e contribuem para a previdência social. Isso quer dizer que durante décadas essas mulheres trabalharam sem a garantia de um salário mínimo, uma jornada de trabalho estabelecida e a garantia de aposentadoria. Somente em 2015, foi 
regulamentada a “lei das domésticas”, LCP 150 (BRASIL, 2015), que visa equiparar os direitos das trabalhadoras domésticas aos demais trabalhadores. A lei abarca somente trabalhadoras mensalistas, enquanto cresce o número de diaristas, que trabalham várias vezes por semana. Algumas trabalhadoras preferem o trabalho na forma de diaristas, pois podem flexibilizar seus horários, porém com isso apenas recebem quando estão trabalhando, além de que os danos para a saúde a longo prazo podem ser bem maiores. 
Atualmente, o Ministério do Trabalho busca fiscalizar e punir os empregadores que não estão obedecendo a lei 150/15. Os movimentos sociais continuam se organizando para conseguirem mais direitos para as diaristas, que já representam aproximadamente 30% do grupo. 
 
 
 
Os indígenas são os povos originários de nossas terras e bastantes heterogêneos, organizados em diferentes etnias, com língua e cultura próprias. De acordo com o censo de 2010 (BRASIL, 2012) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), existem aproximadamente 817.963 indígenas, falando 274 línguas distintas e divididos em torno de 305 povos. 
É comum achar que eles fazem parte do passado, de uma cultura selvagem e que vivem apenas na Floresta Amazônica. Essas ideias etnocêntricas foram disseminadas durante a colonização justamente para colaborar com a exploração e dizimação dos povos indígenas e, atualmente, são usadas por empresários que visam o uso ilimitado das terras para fins privados e comerciais. 
Como o número do censo em relação à diversidade nos mostra, os índios persistem e estão cada vez mais ocupando diferentes lugares na sociedade sem perderem suas identidades. 
As culturas indígenas são parte constitutiva da sociedade brasileira, seja no vocabulário, nas práticas alimentares ou medicinais, e suas influências estão presentes no cotidiano de qualquer cidadão, bem como a influência das culturas africanas, europeias e, em menor medida, asiáticas. 
 
 
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Figura 7 - Exemplo do sincretismo que forma a sociedade brasileira, mulher negra performatiza uma dança com influências indígenas. Fonte: ostill, Shutterstock, 2018. 
 
 
Como mecanismo para promover a igualdade de segmentos sociais historicamente discriminados, políticas públicas diferenciadas começaram a ser desenvolvidas, de ações afirmativas, com intuito de implantar mecanismo de cotas para que os grupos minoritários possam alcançar de maneira mais rápida igualdade de oportunidades nas sociedades. 
De acordo com a antropóloga Ana Paula Comin de Carvalho (2012), citando o etnólogo Carlos Moore Wedderburn (2005), diferentemente da ideia de que as políticas de ação afirmativa surgiram nos Estados Unidos, na década de 1960, no contexto da luta pelos direitos civis de afro- americanos, as ações afirmativas teriam sido originadas na Índia, já no pós-PrimeiraGuerra Mundial, quando as castas inferiores começaram a clamar por mais representatividade nas esferas de poder. Esse movimento teria se intensificado após a Segunda Guerra Mundial, com as lutas de independência dos países da África e Ásia, para então servirem como forte instrumento em busca de igualdade pelas mulheres norte- americanas e europeias, pelas populações negras diaspóricas (populações oriundas da África que se estabeleceram em outros lugares do globo), e também na América Latina. 
Em especial no Brasil, as políticas de ação afirmativas, que visam resgatar a equidade de segmentos sociais de maneira rápida e eficaz, passaram a ter maior incidência a partir dos anos 2000, quando não apenas a representação feminina foi estimulada na esfera governamental, mas outras minorias organizaram-se na luta pela igualdade de direitos. Desse modo, atualmente existem cotas para diferentes grupos nas esferas da política, do trabalho e da educação. Porém, estão em risco quando grupos conservadores põem em cheque sua importância, como acontece em relação à política de cotas para negros e indígenas nas universidades brasileiras. 
 
 
Síntese 
Concluímos a unidade introdutória aprendendo que o conceito de cidadão nem sempre abarcou todos os indivíduos de uma determinada sociedade, assim como a consolidação dos direitos humanos continua sendo um desafio diário, sobretudo, para minorias sociais. 
Neste capítulo, você teve a oportunidade de: 
1. aprender que a Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948) se constitui como o documento de referência para a implementação dos direitos humanos nas constituições dos mais diversos países; 
1. estudar os percursos históricos para o surgimento da cidadania e a garantia dos direitos humanos no contexto brasileiro, chamando atenção para os desafios que persistem na consolidação da igualdade e justiça social em nosso país. 
 
 
 
DESAFIOS 
CONTEMPORÂNEOS 
CAPÍTULO 2 - É POSSÍVEL VIVER NA MODERNIDADE DE FORMA SUSTENTÁVEL? 
Luísa Maria Silva Dantas 
 
 
 
 
 
 
 
 
Introdução 
A modernidade pode ser caracterizada pela ampliação do estilo de vida urbano, marcado pela industrialização que possibilitou a produção em larga escala, e o desenvolvimento de tecnologias que facilitou o cotidiano e nos deu a ideia de que como seres humanos tínhamos dominado completamente a natureza e nos apartado dela. Contudo, quanto mais o tempo passa, percebemos que o caminho não é bem esse e que os recursos naturais não são inesgotáveis. Você sabia que a queima de combustíveis fósseis, como a gasolina, necessária para o funcionamento de veículos é um dos principais produtores de gases do efeito estufa que promovem o aquecimento global? 
É cada vez mais comum vermos noticiadas enchentes e inundações. E você sabia que esses fenômenos não são decorrentes apenas de processos naturais, mas bastante influenciados pela ação humana? 
Esses e outros eventos, como a proliferação de doenças e a migração de populações ocasionada por catástrofes naturais, pareciam distantes de nossos quartos climatizados com ar-condicionado e nossas geladeiras repletas de mantimentos industrializados. Porém, chegou o momento de implicar ambientalmente e perceber que não apenas políticas públicas, mas também nosso estilo de vida precisa ser modificado para garantir a permanência da vida humana no planeta. 
O que se propõe é o desenvolvimento pautado pela sustentabilidade, ou seja, que qualquer política de crescimento econômico não deixe de passar pelas demandas sociais e ambientais. E isso se faz ao garantir saúde, alimentação e moradia digna, além de legislações ambientais que protejam o futuro do planeta. O que podemos fazer para contribuir com isso? Este capítulo pretende levantar questões e propor alternativas para um mundo mais sustentável. 
Acompanhe a leitura e bons estudos! 
 
 
2.1 As cidades modernas 
Quando falamosem cidades modernas, lembramos logo de grandes prédios, construções com design cada vez mais artístico, muita tecnologia, sistemas de transportes, propagandas de consumo e muitos serviços. Imaginamos grandes cidades como Nova Iorque e São Paulo, com milhões de pessoas andando pelas ruas, plugadas em seus celulares. Mas será que o mundo sempre foi assim? O que faz uma cidade ser considerada moderna e outra não? É o seu tamanho territorial, a quantidade populacional ou o número de empresas multinacionais que congrega? 
Neste tópico, vamos estudar como as cidades modernas surgiram, isto é, qual o contexto histórico, político, econômico e social que favoreceu o surgimento das cidades. Também vamos identificar seus principais problemas e possíveis soluções para tornar esses lugares mais justos. 
 
 
 
 VOCÊ QUER VER? 
 
 
Problemas administrativos, ruas esburacadas e falta de saneamento são alguns aspectos observados por muitas pessoas em relação a sua cidade, o transporte público, a construção civil e o comércio bem como outros diversos setores que compõe as cidades atuais. Agora, já imaginou como serão as cidades do futuro? Como a evolução da tecnologia pode tornar prática a vida de gerações futuras? O abastecimento de energia e água, o acesso aos alimentos e a arquitetura? Caio Esteves em seu texto nos faz embarcar nesta viagem pela inovação. Acesse < https://ofuturodascoisas.com/inteligencia-e-ofuturo-das-cidades/>. 
 
 
2.1.1 A formação das cidades na sociedade moderna 
A partir da cronologia histórica desenvolvida pelo Ocidente, podemos afirmar que a modernidade inicia com as revoluções liberais-burguesas ocorridas primeiramente na Inglaterra, Estados Unidos e França, nos séculos XVII e XVIII, para depois espalharem-se pelo globo. Essas revoluções propiciaram o fim da Idade Média, caracterizada pelo feudalismo, em que a terra era o bem maior, e a igreja e os nobres, os grupos privilegiados, além do primeiro modelo de estado moderno, o absolutismo, que concentrava todos os poderes nas mãos de um rei (ARAÚJO; BRIDI; MOTIM, 2013). 
As primeiras cidades e/ou fortificações eram denominadas burgos, por isso seus primeiros habitantes foram chamados de burgueses. Este grupo concentrou-se na atividade de comércio e acumulou bastante capital econômico proveniente do mercado ultramarino. Pois bem, cheios de dinheiro, os burgueses também buscavam maior participação e intervenção política nas cidades que residiam, ou seja, ansiavam por ampliação de sua cidadania. Então, percebendo que os camponeses, comerciantes e artesãos trabalhavam para os nobres e para igreja, pagavam altos impostos e também não tinham direitos nem participação da vida política dos territórios, os burgueses propuseram se unir ao povo para transformar a sociedade. 
Assim deu-se o início da modernidade, com a consolidação de Estados liberais, liderados pela burguesia, que a partir desse momento passou a ter poder econômico e político e fundamentados pelos ideais de liberdade, igualdade e fraternidade. 
Nesse mesmo contexto, ocorria a Revolução Industrial na Inglaterra, que com o advento da máquina a vapor provocou transformações impactantes na economia e na sociedade. Com a produção em massa, a produção artesanal do meio rural não conseguiu concorrer, fazendo com que houvesse enorme êxodo rural, isto é, a migração de pessoas do campo para a cidade em busca de sustento. Isso fez com que surgisse uma classe de trabalhadores, que passou a vender sua força de trabalho em troca de um salário, e um grupo de proprietários, donos das máquinas e fábricas, os burgueses. 
 
 
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Figura 1 - Concentração de milhares de trabalhadores na Inglaterra pós-Revolução 
Industrial, que também passava por intensa urbanização. Fonte: Everett Historical, Shutterstock, 2018. 
 
 
O processo de urbanização deu-se conjuntamente à industrialização da Europa e posteriormente em todo o mundo. Com isso, surgiram mudanças não só na forma de produção como também na estrutura familiar e, consequentemente, na sociedade. No item a seguir, você irá conhecer essas mudanças. 
2.1.2 Transformação da sociedade 
Na nova configuração, a produção, que antes era artesanal, em pequena escala e familiar, sofreu fortes mudanças e as famílias foram para a cidade trabalhar em fábricas, e às mulheres coube o trabalho reprodutivo e de cuidados do lar e da família. 
Assim, além da nova economia doméstica, que teve que se moldar à nova realidade da produção industrial e do trabalho assalariado, as cidades também não foram planejadas para receber tantas pessoas. Então começaram a surgir vários problemas sociais, como a ocupação desordenada do espaço, que sem saneamento básico, ocasionou a proliferação de inúmeras doenças, além do grande número de pessoas sem trabalho, que marginalizadas da nova ordem social, começaram a cometer crimes para se manterem. 
É com esse cenário que surge a sociologia, ciência que busca estudar, explicar, compreender e transformar a sociedade, dependendo da teoria e autor em questão. O primeiro professor de sociologia, considerado o “pai” dessa disciplina, foi o francês Émile Durkheim (1858-1917). Ele estava inserido no contexto das transformações que ocorriam na França e 
buscou explicar a sociedade, ou seja, identificar os mecanismos que promovem a ordem, mas também a mudança social. Para ele, a sociedade se sobrepunha ao indivíduo, que a partir da observância às normas e regras, se mantinha integrado ao coletivo em redes de solidariedade. 
Outro autor clássico, também considerado um dos fundadores da sociologia, foi Karl Marx (1818-1883), mas diferente de Durkheim, este alemão estava preocupado em transformar a sociedade com o intuito de beneficiar a classe trabalhadora. De acordo com ele, a divisão social do trabalho, decorrente do sistema capitalista, dividiu a sociedade em duas classes sociais predominantes: os burgueses, que seriam os donos das máquinas, proprietários dos meios de produção; e os proletários, trabalhadores, que vendiam sua força de trabalho em troca de um salário. O sistema capitalista se manteria pela mais-valia, a parte do trabalho que não é pago e se transforma em lucro para os burgueses. Devido a essa desigualdade, Marx argumenta que a transformação social apenas seria possível a partir da luta entre essas duas classes, quando os trabalhadores poderiam se apropriar das fábricas e do Estado. 
O terceiro autor clássico também é alemão e se chama Max Weber (1864- 1920), cuja proposta era compreender a sociedade a partir do sentido que os indivíduos davam para as suas ações. Weber defendia que a sociedade era formada pelo conjunto de ações individuais e recíprocas e classificou essas ações em tipos ideais, salientando que toda ação corresponde a uma das quatro motivações predominantemente: a ação pode ser afetiva, tradicional, baseada em valores ou com uma finalidade racional. O autor buscou compreender a consolidação do sistema capitalista, permeado por relações de dominação e o desenvolvimento da burocracia, que visou racionalizar a administração pública (QUINTANEIRO; BARBOSA; OLIVEIRA, 1995). 
Os três autores são fundamentais para que possamos estudar a sociologia, ciência que surge no contexto da modernidade ocidental. Eles propõem diferentes conceitos e categorias que colocam a sociedade como objeto de estudo e continuam tendo bastante influência nas pesquisas sociológicas atuais. 
Para continuar nosso estudo, vamos agora abordar a configuração e os problemas das cidades brasileiras. 
2.1.3 Entraves da contemporaneidade 
Os primeiros problemas sociais gerados pela concentração de pessoas nas cidades modernas da Europa foram intensificados ao longo do tempo e se tornaram presentes nas mais distintas cidades do mundo. E no Brasil não foi diferente. Ainda que tenha deixado de ser majoritariamente rural apenas nos anos 2000, o processo de urbanização do país foi marcado por forte ocupação desordenada, além de seguir a estrutura segregacionista das cidades coloniais. Isso quer dizer, a estrutura casagrande e senzala, em que na casa grande moravam os portugueses e seus descendentes, os proprietários de terras, e nas senzalas, os trabalhadores escravizados. 
Quando falamos em urbanização, estamos nos referindo à construção de fortificações e cidades, compostas pela intensificação da construção de casas, prédios, sistemas de transportes e serviços. Diferente da zona rural, caracterizada por intensa produção agrícola, com predominância da fauna e da flora e reduzido número de fortificações. 
Ao nos referirmos à estrutura casa grande e senzala, estamos nos remetendo ao Brasil colônia, que inicia com a ocupação do território, em 1500, até a constituição do Império, em 1822. O autor pernambucano Gilberto Freyre (1900-1987) buscou construir a história social do Brasil, argumentando que a sociedade brasileira foi construída em três pilares: a escravidão, o latifúndio e a miscigenação. A escravidão foi o sistema que fez com que milhares de homens e mulheres, trazidos à força do continente africano, fossem obrigados a trabalhar ilimitadamente, sem terem suas culturas e dignidades respeitadas. O latifúndio é a enorme concentração de terras nas mãos de poucos europeus e/ou seus descendentes, voltado para a monocultura e a exportação. E a miscigenação é o cruzamento entre europeus, negros e indígenas. 
A dinâmica social foi materializada na casa grande, onde moravam os donos da terra, grupo detento de privilégios. Como o próprio nome diz, geralmente eram casas enormes, com vários quartos, salas e empregados responsáveis pela sua manutenção. O contrário da senzala, grandes barracões sem estrutura ou conforto, que abrigavam de forma apertada e sobre-humana os africanos escravizados. 
Como podemos inferir, neste período, o Brasil era predominantemente rural, mas é preciso chamar a atenção que essa oposição também foi transposta para a zona urbana. Neste caso, materializada nos bairros residenciais planejados que dispõem de infraestrutura e serviços, ocupados majoritariamente pela população branca, e as favelas, caracterizadas pela ocupação desordenada, carência de saneamento básico, serviços públicos e habitada predominantemente pela população negra. 
 
 
VOCÊ SABIA? 
Apenas ao final da primeira década do século XXI, pela primeira vez na História da Humanidade, a população urbana se tornou maior do que a população rural (OLIVEIRA; COSTA, 2016). Esse dado nos mostra que o campo ainda se configura como um espaço fundamental para a dinâmica da sociedade, seja abastecendo as cidades de alimentos, seja porque existe um grande contingente populacional que se dedica às atividades agrícolas e suas necessidades devem ser observadas, ou ainda porque é na zona rural que a diversidade de fauna e flora estão melhor representadas e conservadas, o que implica em saúde de toda a humanidade, dentro e fora da zona urbana. 
 
 
Explicando melhor, ocorre atualmente nas cidades brasileiras, bem como em muitas outras do mundo, um fenômeno conhecido como segregação socioespacial, cuja origem pode ter sido na divisão social do trabalho da sociedade industrial, que estabeleceu a formação de classes sociais, uma de trabalhadores e outra de proprietários dos meios de produção/empregadores. Essa realidade é percebida pelos “muros visíveis”, como os condomínios luxuosos rodeados por ocupações menos providas de bens e serviços, os “muros invisíveis”, em bairros nobres onde coexistem favelas, e também ao percorrer as cidades e perceber bairros residenciais de classe média mais próximos ao centro, e a mudança de configuração ao longo da periferia. 
Essas modalidades de segregação socioespacial são caracterizadas pelo fornecimento de água, esgoto, coleta de lixo, oferecimento de escolas, bancos e supermercados em algumas áreas, enquanto que em outras não há pavimentação nas ruas, há grandes “lixões” – terrenos abandonados onde o lixo é jogado devido a falta de coleta -, reduzido número de transportes públicos e escasso acesso a serviços e lazer. 
Especialistas alegam que problemas como as enchentes e outras 
catástrofes “naturais” são decorrentes da falta de planejamento urbano. Contudo, é possível perceber que quem é comumente submetido a esses problemas é a população mais pobre, no caso brasileiro, congregado ao fator étnico-racial, isto é, pobres e negros. Aqui vale chamar atenção para os fatores socio-raciais-econômicos porque mesmo quando os grupos subalternizados da população ocupam espaços com boa infraestrutura urbana, com o passar do tempo são “expulsos” para locais distantes de seus trabalhos e sociabilidade devido à especulação imobiliária, pois a presença de moradias humildes em determinadas áreas pode desvalorizar seu valor de compra. 
 
 
 
 VOCÊ QUER VER? 
 
 
 
O documentário etnográfico Mestre Borel e a ancestralidade negra em Porto Alegre (ROCHA, 2010) retrata, a partir da trajetória do artista e seu passeio pela cidade, a existência de casas de religião de matriz africana no centro da cidade e a remoção das populações negras para a periferia. Acesse (http://<https://www.ufrgs.br/biev/?xylus-portfolio=mestre-borel-a- ancestralidade-negra-em-porto-alegre>)< (https://www.ufrgs.br/biev/?xylus- portfolio=mestre-borel-a-ancestralidade-negra-em-porto-alegre) https://www.ufrgs.br/biev/?xylus-portfolio=mestre-borel-a-ancestralidade-negra-em-porto- alegre (https://www.ufrgs.br/biev/?xylus-portfolio=mestre-borel-a-ancestralidade-negra- em-porto-alegre)>. 
 
A ocorrência e disputa por megaeventos, como a Copa do Mundo de 2014 no Brasil, significa a captação de vários recursos para serem investidos nas cidades, porém, o que podemos perceber com a experiência do país é 
a existência de “cidades de exceção” (VAINER, 2011 apud OLIVEIRA; COSTA, 2016, p. 257), em que se procura remover parte da população das áreas centrais da cidade e promover espaços com diferentes regulamentações, que promovam bons retornos para o turismo, mas escondam as mazelas sociais. 
Nesse sentido, durante a ocorrência ou não de megaeventos, as favelas se constituem como espaços em que os recursos públicos são escassos e que, frequentemente, são lideradas por facções criminosas que organizam o tráfico de drogas, fazendo uso de forte armamento bélico e provocando medo na população. As favelas surgem devido à grande parte da população não ter condições financeiras para comprar moradias bem estruturadas e as políticas públicas também não lhes garantirem esse direito fundamental. Em 2006, 36,6% (51,7 milhões) da população brasileira vivia em favelas (OLIVEIRA; COSTA, 2016). 
Uma das soluções para que as cidades modernas se tornem lugares menos violentos e mais apropriados para o meio ambiente e a saúde humana é a redução das desigualdades sociais, pois se todos tivessem acesso a um emprego, com salário mínimo capaz de suprir suas necessidades básicas, o número de ocupações irregulares reduziria, assim como o crime. 
Além disso, que os governos invistam em um planejamento urbano responsável para que enchentes, catástrofes e o problema do lixo sejam canalizados, previstos e tratados de maneira mais sustentável. Para isso, as necessidades da população devem ser priorizadas em relação aos interesses do mercado e da especulação imobiliária. Habitação, mobilidade e democratização das cidades e dos espaços públicos precisam ser respeitadas e praticadas cotidianamente. 
Apenas dessa forma poderemos construir uma “cidade sustentável” (SOUZA; AWARD, 2012), onde as preocupações e necessidades sociais também estejam integradas às ambientais e culturais. A seguir, você irá entender a relação entre meio ambiente, sustentabilidade e o espaço urbano. 
 
2.2 Meio ambiente e sustentabilidade 
Desde o contexto europeu, a modernidade, fortemente influenciada pela Revolução Industrial e Revolução Francesa, no século XVIII, deu início a um período histórico com predominância da razão, da ciência e da técnica, da consolidação do sistema capitalista e sua ênfase no lucro, e na constituição de Estados liberais democráticos, com o objetivo de garantir a igualdadee a participação popular. 
Nesse sentido, houve um distanciamento do meio rural e de todos os aspectos relacionados à natureza, como se estes remetessem a um passado primitivo, atrasado e limitado. Desde então, vimos um acelerado processo de transformação da natureza por meio do trabalho visando suprir necessidades e aspirações sociais. Os séculos XIX e XX foram marcados pela intensificação na exploração de recursos e minérios naturais, pela industrialização e urbanização desenfreadas, como se a natureza fosse uma fonte inesgotável, existente para satisfazer ou ser submetida à ação antropomórfica. 
Chegado o século XXI, percebemos que essa fonte não é tão inesgotável assim e vários problemas e catástrofes ambientais que estão ocorrendo são resultados das intervenções no meio ambiente, visando o desenvolvimento econômico, que ao invés de emancipar os indivíduos, tem intensificado as desigualdades sociais e posto em risco a vida no planeta. Para reverter essa situação é, antes de tudo, preciso entender a noção que aprendemos sobre a relação entre ser humano e natureza, ponto que vamos abordar a seguir. 
 
 
VOCÊ SABIA? 
A partir do século XX com o aumento da população mundial e como consequência o maior consumo de energia, com esses avanços vieram as consequências infligindo uma série de eventos que se propagaram a medida em que a população corre em direção ao avanço, em com ele os problemas ambientais, sendo necessário assim uma formação da consciência ambiental. Abaixo você acompanha uma linha do tempo dos principais eventos marcantes para o debate a respeito da sustentabilidade a partir do início do século XX (SILVA, 2012). 
2.2.1 Diferentes olhares sobre a natureza 
O conhecimento produzido pelo Ocidente classificou o mundo em partições binárias, isto é, para explicar os fenômenos e acontecimentos, os cientistas, sobretudo europeus, elaboraram pares opostos como: alto - baixo, mente - corpo, cru - cozido etc. Natureza e cultura também podem ser um exemplo de entidades coladas em contraposição ao longo do tempo, como se tudo que pertencesse ao mundo da cultura não tivesse qualquer relação com a natureza e vice-versa. Também se argumentou que as culturas seriam múltiplas e diversas, enquanto a natureza apenas uma e imutável. 
Essa versão de entendimento sobre o mundo e as coisas pode ser considerada hegemônica, posto que é o que aprendemos ao longo de nossa formação escolar, e que é divulgada nas mais diversas fontes de informação. No entanto, ela não é a única, junto com esta versão existem muitas outras cosmologias, ou seja, formas de conhecimento e linguagem que explicam o mundo a partir de outras abordagens. 
O antropólogo brasileiro Eduardo Viveiros de Castro, após longa interlocução com grupos indígenas, nos apresenta uma forma distinta daquela que naturalizamos através dos tempos, o perspectivismo ameríndio. De acordo com o autor, para os indígenas não há uma dicotomia entre natureza e cultura, e ao contrário do que pensávamos, eles defendem que existem apenas uma cultura e várias naturezas. Isso porque para eles, cada grupo/espécie que constitui um dado meio ambiente, entre semelhantes, são considerados pessoas e seus diferentes, animais. Entre os cachorros, por exemplo, eles consideram-se pessoas e os humanos, animais. Portanto, a humanidade é uma questão de ponto de vista e de natureza, já a cultura é existente nas mais diferentes espécies (CASTRO, 2011). 
 
 
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Figura 2 - As populações indígenas originárias do território onde hoje é o Brasil, historicamente, mantêm uma relação de equilíbrio com o meio ambiente, a partir de culturas e epistemologias próprias de entendimento do mundo. Fonte: Nina B, Shutterstock, 2018. 
Achou complicado? Isso acontece quando aprendemos novas abordagens que tencionam a ordem que nos foi estabelecida. Apesar do estranhamento causado, estudar e compreender essas diferentes visões de mundo pode nos ajudar a realmente buscar novos caminhos para um mundo que emancipe de fato os indivíduos, para que tenham condições de estabelecer um estilo de vida sustentável. 
O exemplo do pensamento indígena é pertinente primeiro porque nos propõe uma nova forma de olhar para a natureza, e depois porque é uma alternativa de relação entre humanos, animais e recursos naturais que pode oferecer caminhos para um mundo melhor. Além disso, desconstrói o preconceito de que eles seriam selvagens e menos inteligentes, base de ideologia colonizatória, com sua “missão humanitária”, ou seja, de que os humanos civilizados, os europeus, estavam colonizando outros povos para os ajudarem a saírem da selvageria, um estado considerado inferior, por serem diferentes da cultura europeia. 
Ainda sem adentrar profundamente na lógica ameríndia, mas de acordo com a “nossa”, a que nos foi imposta pelo modelo hegemônico, aprendemos que natureza é tudo aquilo ligado à biologia, à fauna e flora, mas dificilmente identificamos os seres humanos em condição simétrica, isto é, como sendo também um elemento da natureza constituindo diferentes meio ambientes. Ao termos essa visão, do homem como parte da natureza, podemos entender a forma como ocorre a interferência humana na natureza e, assim, buscar por soluções para reduzir esse impacto. Essa será nossa abordagem do próximo item. 
2.2.2 Interferência humana na natureza 
Tudo se passa como se os seres humanos, dotados de inteligência e tendo dominado a natureza, tivessem um estatuto superior aos demais animais, vegetais e capacidade para sobreviverem sem estes. De fato, a racionalização do mundo, o desenvolvimento de técnicas e tecnologias, provocou muitas transformações no meio ambiente, constituindo um estilo de vida urbano e funcional. Os impactos dessas ações na natureza não foram previstos e atualmente contata-se que as fontes se esgotam e os fenômenos naturais decorrentes da nossa própria ação precisam ser respeitados e levados a sério, sob o risco da vida ser extinta. Então, é importante dar conta de que constituímos também o meio ambiente que nos ronda. “Essa concepção abrangente da natureza do ser humano, como ser cultural e também natural, está na base das teorias por um desenvolvimento sustentável pós-consumista, ou seja, não desperdiçador” (ARAÚJO; BRIDI; MOTIM, 2013, p. 291). 
Para adaptarem-se ao meio físico/natural, os seres humanos historicamente desenvolveram técnicas e tecnologias. A agricultura pode ser considerada a primeira forma de sedentarização dos grupos humanos, pois com a domesticação das espécies foi possível produzir grande parte da subsistência sem precisar se mudar constantemente. O descobrimento do fogo para o aquecimento também foi bastante importante. Com o passar do tempo, o desenvolvimento das trocas, a mercantilização e o surgimento do sistema capitalista, a busca por minérios, metais e novas culturas produtivas aumentaram e motivaram a expansão marítima. 
 
 
 
 
 VOCÊ QUER VER? 
 
 
Prepare-se, vamos assistir um videodocumentário produzido em 2009 que nos traz os transtornos sofridos pelos cursos dos rios da cidade de São Paulo no processo de urbanização, o que veremos é uma jornada por fatos históricos que possibilitam conhecer mais sobre a cidade de São Paulo, vale a pena refletir o fato de que a cidade de São Paulo por muitos anos foi pautada em sua existência pela presença de dois rios, que hoje praticamente não são notados, já sabe quais são? Você certamente deve se perguntar, será possível urbanizar e crescer sem danificar o meio ambiente? Vamos descobrir juntos? Basta clicar no link < https://youtu.be/Fwh-cZfWNIc>. 
 
 
 
Com a industrialização, a urbanização e o aumento da população, a produção em massa para a sociedade do consumo necessitou do estabelecimento de muitas fábricas, fontes de energia, mas também locais para depositar seus resíduos. Os meios de transporte aumentaram e passaram a produzir gases nocivos ao meio ambiente, como o dióxido de carbono, o metano e o clorofluorcarboneto. 
A produção alimentícia, tanto para consumo como para exportação, tambémintensificou a pecuária, além da monocultura de solos que são responsáveis por desequilíbrios nos ecossistemas e extinção de espécies vegetais. Nos rios, que muitas vezes são contaminados por resíduos provenientes de indústrias, além das intervenções de seus cursos promovidas por barragens, são identificados cada vez mais danos para a flora e a fauna, que afetam diretamente populações indígenas e ribeirinhas, bem como o meio ambiente no geral. 
Infelizmente, diariamente os noticiários mostram acidentes e catástrofes ambientais resultantes do mau uso do solo, dos mares e das alterações climáticas decorrentes do efeito estufa e do buraco na camada de ozônio, por exemplo. 
 
 
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Figura 3 - A desertificação é um sintoma de degradação ambiental que desequilibra o meio 
ambiente e provoca danos incalculáveis. Fonte: Smit, Shutterstock, 2018. 
 
 
Visando reduzir os impactos dos usos excessivos e inapropriados dos recursos naturais, surgiram vários movimentos ecológicos ao redor do mundo que atuam em prol de uma conscientização ambiental para a sociedade civil, mas também demandando das instâncias governamentais e jurídicas forte intervenção. No plano regulatório, temos as seguintes determinações e eventos (SILVA et al, 2016): 
1. 1972 – Realização da 1ª Conferência das Nações Unidas para o Desenvolvimento Humano – Conferência de Estocolmo – primeira investida para a construção de uma agenda de políticas ambientais; 
1. 1987 – Relatório da ONU – (“Nosso Futuro Comum”) – Relatório Brundtland – quando se formou uma comissão mundial sobre o meio ambiente, devido à constatação da necessidade de um desenvolvimento sustentável; 
1. 1992 – Realização da Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e Desenvolvimento (Cnumad) – Eco 92. Realizada no Rio de Janeiro com o objeto de discutir propostas de desenvolvimento econômico em conciliação com a preservação ambiental; 
1. 2002 – Realização, na África do Sul, da Rio+10, com a criação da Agenda 21, visando efetivar ações internacionais de apoio e metas socioambientais para garantir o desenvolvimento sustentável; 
1. 2012 – Realização da Rio +20 para a avaliação das metas da conferência anterior, sofreu fortes críticas dos movimentos sociais por não ter convidado a sociedade civil e tradicional para participarem. Estas realizaram um evento paralelo, a Cúpula dos Povos. 
 
As regulamentações nacionais e transnacionais, com o meio ambiente como objeto central, visam estabelecer metas e propor modelos que tem a sustentabilidade como principal força motriz. Por isso, é importante destacar que sustentabilidade é um conceito que foi disseminado nos anos 2000 e defende a simultaneidade e o equilíbrio entre os capitais sociais, econômicos e ambientais, visando satisfazer “as necessidades do presente, sem comprometer as necessidades das gerações futuras” (LAASCH, 2015, p. 60). 
 
 
 
 VOCÊ O CONHECE? 
 
 
 
Francisco Alves Mendes Filho, o Chico Mendes (1944-1988), foi um seringueiro, sindicalista e ambientalista, que lutou contra a exploração da floresta amazônica e em favor dos povos da floresta – ribeirinhos, indígenas e seringueiros. Nascido em Xapuri, na fronteira do Acre com a Bolívia, o líder sindical foi assassinado com 44 anos. Para mais informações, consulte o site 
Memorial 	Chico Mendes 	(MCM, 2018), disponível 	em 
<http://memorialchicomendes.org/chico-mendes/ 	(http://memorialchicomendes.org/chico- mendes/)>. 
 
 
 
Por meio de políticas públicas, em que o ser humano é visto em igualdade aos demais seres vivos e como parte do ecossistema, a sustentabilidade defende uma revolução radical na forma como os projetos de desenvolvimento econômico e a sociedade do consumo vêm atuando, propondo a renovação e o fortalecimento de todos os recursos que mantêm a vida. 
É imprescindível uma mudança de mentalidade em todos os segmentos que formam a sociedade para um mundo sustentável. Primeiramente, como já foi dito, precisamos deixar de lado a arrogância e a soberba e nos colocarmos apenas como mais um elemento da natureza, de igual importância a todos os outros. Em segundo lugar, aprender e respeitar as sociedades tradicionais que historicamente mantêm uma relação harmoniosa e saudável com os ecossistemas. Não apenas aprender e respeitá-las, como também lutar para a sua sobrevivência e proteção contra a violência de atores sociais que visam apenas os interesses privados. 
Os governos devem levar em consideração o equilíbrio entre os capitais sociais, econômicos e ambientais e promover políticas públicas de fiscalização e regulamentação de gases poluentes para empresas que atuam no Brasil, bem como contribuir para a melhor gestão ambiental de outros países. 
Sem consciência ecológica, mudança do estilo de vida e limites para a intervenção desenfreada na natureza, estaremos fadados ao fim, por isso é importante a discussão sobre meio ambiente e desenvolvimento sustentável, nosso próximo item de estudo. 
2.3 Meio ambiente e desenvolvimento sustentável 
Existe mais de uma maneira de definir e abordar o que é meio ambiente e desenvolvimento, até mesmo o sustentável. Em relação ao meio ambiente, podemos classificar duas posturas, uma em que a natureza deve ser completamente apartada da ação humana, pois o homem sempre lhe causará danos, o preservacionismo; e outra, em que o ser humano é visto como um integrante do meio ambiente, portanto, deve interagir com os recursos naturais de forma equilibrada, visando garanti- los para as gerações futuras, o conservacionismo. 
Já a palavra desenvolvimento está relacionada com avanço e progresso. No entanto, ele pode ser empreendido a qualquer custo, com objetivos somente para o mercado e para a produção de lucros ou elaborado de maneira em que as justiças social e ambiental sejam respeitadas, neste caso, de forma sustentável. A seguir, vamos abordar a questão dos efeitos da interferência do ser humano na natureza e o que se tem feito para reduzir os danos gerados dessas ações. 
 
 
VOCÊ SABIA? 
Ao longo das décadas as causas de emissão de gás carbônico no Brasil sofreram diversas mudanças, com é o caso da diminuição de emissão pela mudança de uso da terra que em 1990 somava 68% e em 2013 passou a somar 35% de toda emissão. Uma outra variação consiste na produção de energia, em 1990 eram 12% aumentando em 2013 para 29%, outros setores sofreram variação como mostra o gráfico. 
 
Fonte: Documento de análise [recurso eletrônico] p. 7 
No brasil atualmente a maior causa de emissão é o petróleo, o aumento de veículos no setor do transporte contribui significativamente, vale ressaltar que esse aumento contribui para o crescimento econômico, porém a sustentabilidade perde força. Observe no gráfico a baixo como o Brasil contribui para emissão de gás carbônico pelo aumento do setor de transporte, somando 45% em 2013. 
 
2.3.1 A falácia da superioridade do ser humano sobre a natureza 
O grande impacto na transformação da relação dos seres humanos com a natureza iniciou-se com a Revolução Industrial (final do século XVIII) e a consolidação de uma sociedade urbana, industrial e capitalista. Com o avanço tecnológico, a produção em massa e o aumento do consumo, pensou-se que haveria uma emancipação social, caracterizada pela superação de todos os entraves técnicos e naturais, para o bem-estar humano. No Brasil, por exemplo, desde a Era Vargas (1930-1945), passando pela democratização do país, houve intenso investimento na industrialização sem levar em consideração qualquer impacto ambiental. 
Acontece que com o decorrer do tempo, os efeitos nocivos da industrialização e das ações econômicas priorizando os mercados começaram a ser identificados. Já no final dos anos 1970, acidentes nucleares de grande impacto internacional começaram a ocorrer em usinas construídas para a produção de energia alternativa ao carvão e ao petróleo. Foram os casos de Three Mile Island, em 1979, nos Estados Unidos; Chernobyl, em 1986, na antiga União Soviética; e Fukushima, em 2011, no Japão. 
 
 
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