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Saúde_da_Família_na_atenção_primária (1)

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Circulação Interna 
 
Saúde da Família na Atenção 
Primária 
Biblioteca online – sem valor comercial. Proibida a venda e a reprodução. 
 
1 Textos extraídos do livro: Saúde da Família na Atenção Primária, de Daniela Resende Archanjo, Léa Resende Archanjo e Lincon Luciano da Silva. 
Sumário 
 
 
Introdução............................................................................................................................... 2 
 
Parte I 
Saúde, família e sociedade...................................................................................................... 6 
Capítulo 1: Família e saúde: uma abordagem histórica.......................................................... 7 
Capítulo 2: Saúde e sociedade................................................................................................ 18 
 
Parte II 
Processo de trabalho em saúde da família.............................................................................. 28 
Capítulo 3: Gerência e trabalho em equipe na atenção primária............................................ 29 
Capítulo 4: O uso das ferramentas saúde da família na construção do cuidado em saúde..... 37 
Capítulo 5: Práticas não hegemônicas em saúde e atenção básica: a educação permanente 
como interface de articulação................................................................................................. 
 
46 
Capítulo 6: Uma reflexão sobre educação e saúde na estratégia saúde da família................. 55 
 
Parte III 
Atenção primária nas etapas do ciclo de vida......................................................................... 67 
Capítulo 7: Saúde materna...................................................................................................... 68 
Capítulo 8: A criança.............................................................................................................. 76 
Capítulo 9: Saúde do adolescente na estratégia saúde da família........................................... 84 
Capítulo 10: Saúde do adulto no contexto da atenção primária em saúde.............................. 93 
Capítulo 11: Saúde do idoso................................................................................................... 100 
 
Parte IV 
Gerenciamento de unidade de saúde da família...................................................................... 109 
Capítulo 12: Planejamento estratégico e saúde da família...................................................... 110 
Capítulo 13: Sistemas de informação em saúde...................................................................... 119 
Capítulo 14: Avaliação da qualidade na estratégia saúde da família...................................... 128 
 
Referências............................................................................................................................. 137 
Atividades Avaliativas........................................................................................................ 140 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Biblioteca online – sem valor comercial. Proibida a venda e a reprodução. 
 
2 Textos extraídos do livro: Saúde da Família na Atenção Primária, de Daniela Resende Archanjo, Léa Resende Archanjo e Lincon Luciano da Silva. 
Introdução 
 
Caros alunos, 
 
Em 1994, quando foi proposto pelo Ministério da Saúde, o então Programa Saúde da 
Família tinha por objetivo a consolidação dos princípios do Sistema Único de Saúde (SUS). 
Fugindo ao modelo assistencial até então vigente, orientado para a cura de doenças por meio de 
tratamento individualizado, o Programa Saúde da Família propôs a reorganização desse modelo, 
visando à integralidade da atenção à saúde. 
Pautado no trabalho de equipes multiprofissionais que atuam na construção do cuidado em 
saúde em comunidades definidas, o Programa Saúde da Família vem se confirmando, nos últimos 
anos, como estratégia prioritária de atenção à saúde em diversos municípios do Brasil. 
De acordo com dados do Departamento de Atenção Básica do Ministério da Saúde, em 
maio de 2007 o Brasil contava com 27.319 Equipes de Saúde da Família implantadas em 5.122 
municípios do País. Ou seja, mais de 90% dos municípios brasileiros aderiram a essa estratégia de 
reorientação do modelo assistencial. O aumento no número de Equipes de Saúde da Família 
correspondeu a uma maior demanda por profissionais com novas competências, tornando a 
qualificação dos profissionais da área da saúde um dos desafios para a consolidação do trabalho de 
atenção primária. 
Nesse contexto de transformação do modelo assistencial, o livro Saúde da fomília na 
atenção primária busca auxiliar o profissional enfocando aspectos diversos do processo de trabalho 
da Equipe de Saúde da Família e do gerenciamento da Unidade de Saúde da Família. E, 
diferenciando-se de outras publicações disponíveis no mercado, alguns textos propõem uma 
reflexão crítica sobre a prática e o pensar dos profissionais de saúde. 
A abordagem multiprofissional dos temas reflete a diversidade de formação dos autores e 
imprime ao livro um caráter interdisciplinar que se harmoniza com as bases das ações dos 
profissionais da Estratégia Saúde da Família. 
Este módulo é dividido em quatro partes: 
 
I. Saúde, família e sociedade. 
II. Processo de trabalho em Saúde da Família. 
III. Atenção primária nas etapas do ciclo de vida. 
IV. Gerenciamento de Unidade de Saúde da Família. 
 
Na primeira parte, no capítulo "Família e saúde: uma abordagem histórica", resgatando 
historicamente a atuação do saber médico na promoção de transformações na família, são 
indicados elementos para uma análise crítica sobre a prática profissional das equipes de saúde 
que atuam na Estratégia Saúde da Família. 
Em seguida, no capítulo "Saúde e sociedade", enfoca a história das políticas públicas de 
saúde no Brasil, ressaltando o papel do Movimento da Reforma Sanitária na transformação do 
modelo assistencial que se concretiza na criação do SUS. O autor aponta a Estratégia Saúde da 
Família como uma das formas de garantir os princípios e as diretrizes do SUS. 
O trabalho em equipe, a interdisciplinaridade e a competência gerencial são os temas 
 
Biblioteca online – sem valor comercial. Proibida a venda e a reprodução. 
 
3 Textos extraídos do livro: Saúde da Família na Atenção Primária, de Daniela Resende Archanjo, Léa Resende Archanjo e Lincon Luciano da Silva. 
 
abordados no capítulo "Gerência e trabalho em equipe na atenção primária". Embasados nas 
diretrizes curriculares para os cursos da área de saúde, é apontada a atitude como a competência 
mais importante do profissional no gerenciamento de uma equipe de Saúde da Família. 
No capítulo "O uso das Ferramentas Saúde da Família na construção do cuidado em 
saúde", descreve essas tecnologias leves que auxiliam os profissionais das equipes de saúde a 
realizarem a gestão de caso compreendendo a família de forma integral e sistêmica. 
Diante da proposta do Ministério da Saúde de implantação da homeopatia, da fitoterapia, da 
acupuntura e do termalismo social/crenoterapia nos três níveis de atenção à saúde, são analisadas 
essas "Práticas não hegemônicas em saúde", apontando sua sintonia com a conjuntura sanitária do 
País. Ao abordarem as dificuldades de inserção dessas práticas no atual modelo de assistência, os 
autores ressaltam a necessidade de educação permanente dos profissionais. 
Em "Uma reflexão sobre educação e saúde na Estratégia Saúde da Família", são 
questionadas as práticas educativas comumente adotadas pelas equipes de saúde apontando para 
a necessidade de investir na formação crítica e humanística dos profissionais para trabalhar com 
educação e saúde. 
A terceira parte do livro contempla, sob diferentes enfoques, a atenção primária à saúde nas 
diversas etapas do ciclo de vida. "Saúde materna", de autoria da enfermeira Adriana Cristina 
Franco, focaliza aspectos da atenção primária à saúde da mulher que devemser considerados pela 
Equipe de Saúde da Família para a humanização do pré-natal e do pós-parto. 
Ao abordarem o nascimento, o crescimento e o desenvolvimento da criança no capítulo "A 
criança", são destacadas questões biológicas, psicológicas e sociais que devem ser observadas pelas 
equipes no cuidado à criança. 
No próximo capítulo é ressaltada a necessidade de uma atenção efetiva à saúde do 
adolescente realizada por uma equipe multiprofissional que considere a diversidade dentro do 
próprio grupo etário. No capítulo "Saúde do adolescente na Estratégia Saúde da Família", a 
autora afirma que "atender adolescentes significa, antes de tudo, acolhê-los, ouvi-los e respeitá-los 
como cidadãos com direitos e deveres". 
Relativizando o próprio conceito de saúde, é discutida a "Saúde do adulto no contexto da 
atenção primária em saúde", apontando para a impotência da área da saúde coletiva frente à 
complexidade inerente à questão da saúde do adulto e faz uma análise crítica sobre aspectos 
positivos e negativos que permeiam a intervenção da Estratégia Saúde da Família no processo 
saúde-doença nessa etapa do ciclo de vida. 
É proposto, no capítulo "Saúde do idoso", um "olhar" diferenciado da equipe de saúde. A 
abordagem interdisciplinar, a relação entre equipe e paciente e o reconhecimento da realidade da 
população são citados como fundamentais no processo de atenção à saúde do idoso. 
A última parte do livro propõe uma reflexão sobre a prática da gestão. No capítulo 
"Planejamento estratégico e saúde da família", é discutido os modelos dos sistemas de saúde 
cubano, canadense e inglês, que, no processo de construção do SUS, têm servido de inspiração 
para alguns municípios brasileiros. São apontados, entretanto, que os três modelos citados são 
medicocêntricos, enquanto no Brasil foi adotado o trabalho em equipe. Nesse sentido, afirma que o 
planejamento estratégico é o instrumento mais adequado para promover a organização das práticas 
da Estratégia Saúde da Família. 
Em seguida, são apresentados os "Sistemas de informação em saúde" mais utilizados na 
construção de indicadores para o acompanhamento e a avaliação dos serviços e estratégias 
implantadas, ressaltando a importância desses sistemas para técnicos e gestores. 
 
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4 Textos extraídos do livro: Saúde da Família na Atenção Primária, de Daniela Resende Archanjo, Léa Resende Archanjo e Lincon Luciano da Silva. 
No capítulo "Avaliação da qualidade na Estratégia Saúde da Família", ressaltam aspectos 
que diferenciam a avaliação qualitativa daquelas que estão presas a indicadores e exoressões 
numéricas, apontando nara a importância de valorizar as percepções dos atores envolvidos nas 
ações em saúde, em especial dos usuários. 
Repensando o cuidado da saúde a partir de múltiplos olhares, o módulo Saúde dafomília na 
atenção primária pretende estimular a reflexão dos profissionais da área, contribuindo para a 
qualificação destes e, também, para o aperfeiçoamento da Saúde da Família como estratégia para 
consolidar os princípios do SUS. 
As últimas décadas do século XX mostraram-se turbulentas e férteis no âmbito da saúde 
coletiva no Brasil, culminando na transformação de um modelo de saúde que necessitava de 
revitalização. Tal processo partiu da reforma sanitária, deu bases para o SUS de hoje e, já na década 
de 1990, apontou a Estratégia Saúde da Família como um dos caminhos para a reorganização do 
modelo assistencial no País. 
Hoje, essa estratégia mostra-se como a vertente mais sólida da proposta de um modelo 
plural em edificação, que traz meios efetivos de praticar promoção da saúde. De um lado, o setor 
saúde chega aos cidadãos de maneira mais rápida, humana e no território em que estes se 
encontram; de outro, a equipe se vê mais integrada e interagente dentro de uma lógica 
multifacetada, multiprofissional e sustentável. 
Sustentabilidade implica composição de forças entre os atores sociais, 
redimensionamento do poder no território, o que potencializa a sinergia local, e busca de 
componentes transversais entre os vários saberes e práticas. A base territorial permite incorporar 
ingredientes transdimensionais no sentido aglutinador desse processo é a família, pois, a partir dela, 
estabelecem-se relações indivíduo-comunidade, família-família, local-global e saúde-meio. A partir 
da família, constrói-se um tripé de sustentabilidade local: 
 
• Ambiente de inovação: o poder da integração comunitária para criação no ambiente local a 
partir da família traz potencial para transformação do espaço de vida, pois a mudança se 
concretiza com o envolvimento de seus atores sociais. Esse ambiente de criação há de 
considerar as potencialidades locais. 
 
• Potencialidades: estar sempre na busca de... As potencialidades (substrato local) para 
transformação implicam fatores culturais, sociais, educacionais, ambientais e no estado de 
saúde da família, esta sendo agente de sustentabilidade local. O uso de conselhos locais 
define uma organização democrática para gestão do espaço. 
 
• Gestão familiar comunitária: a família no centro da comunidade, pois tem mais autoridade 
para priorizar, decidir e agir, porque usa a vida e as relações sociais como referência. A 
família faz valer táticas que usam as potencialidades locais com vistas à promoção humana. 
 
A busca da sustentabilidade local implica adotar práticas transformadoras que, sejam elas 
exercidas por meio das ações individuais de estilo de vida ou por meio de projetos coletivos, 
certamente afetam a saúde. Vale destacar que essa mobilização traz mudanças, particularmente no 
processo da construção do desenvolvimento local, que é tão importante quanto o resultado 
alcançado, e que fazem parte do exercício da cidadania. 
Transformação em saúde remete às mudanças das práticas nos diferentes níveis. Requer 
 
Biblioteca online – sem valor comercial. Proibida a venda e a reprodução. 
 
5 Textos extraídos do livro: Saúde da Família na Atenção Primária, de Daniela Resende Archanjo, Léa Resende Archanjo e Lincon Luciano da Silva. 
Saúde da família na atenção primária, assim, significa fazer saúde democraticamente com a população local, 
por meio da criação de vínculos e de decisões tomadas a partir das prioridades eleitas pela comunidade. É 
gerar mais acesso, mas é também entender os riscos locais; é construir o perfil epidemiológico, mas é 
também ir para além dos dados em saúde ou doença; é solidificar uma relação humanizada, mas, sobretudo, 
concretizar a sustentabilidade junto à comunidade local. 
novos modelos associados às tradições locais. Implica a reorganização da atenção primária no que 
se refere aos métodos utilizados, às relações interpessoais, ao contexto intra e extra-equipe, com a 
comunidade e com os indivíduos. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Desejamos a todos, bons estudos! 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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6 Textos extraídos do livro: Saúde da Família na Atenção Primária, de Daniela Resende Archanjo, Léa Resende Archanjo e Lincon Luciano da Silva. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Parte I 
 
Saúde da Família e 
Sociedade 
 
 
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7 Textos extraídos do livro: Saúde da Família na Atenção Primária, de Daniela Resende Archanjo, Léa Resende Archanjo e Lincon Luciano da Silva. 
Capítulo 1: 
Família e saúde: 
uma abordagem histórica 
 
 
 
Para melhor compreendermos por que a família vem ganhando destaque enquanto objeto de 
atenção de políticas públicas de saúde, torna-se relevante recuperarmos historicamente a 
importância da atuação do saber médico - aqui entendido como todo o conhecimento baseado no 
cientificismo das ciências médicas, difundido emtodas as categorias profissionais da área da saúde 
- no processo de reprodução ou de transformação dos modelos de organização familiar. Sem 
perdermos de vista que nenhum desses modelos é estanque e que as passagens de um a outro não se 
deram de forma linear, podemos distinguir três grandes períodos na história da família no Brasil. 
Prevaleceu até o final do século XVIII o chamado modelo tradicional de família; desde o século 
XIX e predominando até meados do século XX, destacou-se o modelo de família moderna; por fim, 
desde os anos de 1960 até os dias de hoje, sobressai a chamada família contemporânea ou pós-
moderna, também denominada por arranjos familiares. 
 
Para obter mais informações sobre arranjos familiares, ver BERQUÓ, Elza. Arranjos familiares no Brasil: uma visão 
demográfica. In: NOVAIS, Fernando A. (Coord.); SCHWARCZ, Lilia Moritz (Onr.). História da vida privada no 
Brasil. São Paulo: regulamentação da família e na Companhia das Letras, 1998. v. 4. Contrastes da intimidade 
contemporânea. O emprego da denominação arranjos familiares visa romper com a ideia de predominância de um 
modelo com características destacáveis. Diante da grande diversidade de configurações familiares que marca a contcmporancidadc, o 
uso de tal termo aponta para a inexistência de um padrão de organização e de relações no que ainda insistimos em chamar de 
família. 
 
Para uma pesquisa histórica sobre a constituição do modelo moderno/nuclear de família, ver ARCHANJO, Daniela Resende. O 
adultério no limiar do século XXI: um estudo das suas representações sociais. Curitiba: Aos Qyatro Ventos, 2006. 
 
 
Mais do que demonstrar que não existe um modelo "natural" de família e que o que se 
entende por família é produto cultural - atrelado a um tempo e a um lugar determinados -, o resgate 
histórico das transformações na organização familiar nos fornece elementos para refletirmos sobre a 
 
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8 Textos extraídos do livro: Saúde da Família na Atenção Primária, de Daniela Resende Archanjo, Léa Resende Archanjo e Lincon Luciano da Silva. 
 
influência ainda exercida pelo saber médico sobre a família brasileira, instrumentalizando- nos para 
proceder a uma análise crítica da prática profissional das equipes de saúde que atuam na Estratégia 
Saúde da Família. 
Respondendo à necessidade política de conformação às normas neoliberais de 
desoneração estatal e, também, tendo como objetivo promover a recuperação da família 
enquanto célula mater da sociedade e instituição de normalização social, o Programa Saúde da 
Família, implantado em 1994 pelo Ministério da Saúde, convocou os profissionais da área da 
saúde para, valendo-se de seu conhecimento técnico-científico e de uma visão contemporânea 
sobre essa instituição, atuarem sobre a família. Contudo, conforme salienta Costal, esta não 
é a primeira vez, na história do Brasil, que os agentes educativo-terapêuticos se debruçam sobre a 
família. 
Para ressaltarmos a importância histórica da intervenção dos profissionais da saúde na 
própria configuração das relações familiares, vamos nos fixar na história da família no Brasil e, 
mais do que isso, na história da vivência da elite e da constituição do ideário popular das famílias 
brasileiras, estabelecendo como recorte temporal o período compreendido entre o início do século 
XIX e o início do século XXI. 
A referência ao início do século XIX se deve ao fato de que foi nessa data, a partir da 
chegada da Corte portuguesa ao solo brasileiro, que a família passou a sofrer a intervenção médica, 
adequando-se à necessidade de centralização do poder e ao ideal de organização social importado 
da Europa. Quando a Corte desembarcou no Brasil, encontrou uma sociedade rural e escravocrata, 
baseada no poder de famílias extensas estruturadas sob o regime patriarcal. O poder das famílias da 
elite senhorial, fundado na posse de terras e de escravos, estava concentrado nas mãos do patriarca, 
que era visto como legítimo representante dos interesses familiares. A família era dita extensa, pois, 
além das pessoas ligadas por vínculos de consanguinidade, eram também considerados familiares 
aqueles com os quais se estabeleciam relações de parentesco fundadas em outros elementos, como o 
religioso e o sentimental. Assim, eram tidos como integrantes da família, sob a proteção e as ordens 
do patriarca, não apenas a esposa e os filhos, mas também afilhados, compadres, agregados, entre 
outros. 
 
 
O marco teórico que orienta este texto foram os estudos de Jurandir Freire Costa, psicanalista brasileiro, que trata, sob uma 
perspectiva histórica, a questão da intervenção médica sobre a família. Referimo-nos, aqui, sobretudo, ao livro Ordem médica e 
norma familiar (1983), devendo também ser citada a obra Sem fraude nem fovor (1998). 
 
 
 
A extensão garantia a dominação política por parte das famílias proprietárias, que 
monopolizavam os meios formais e informais de controle político. Os representantes políticos, 
eleitos para ocupar os assentos nas Câmaras e nas Juntas Gerais, tinham sempre relações 
estreitas com os patriarcas, representando os seus interesses no espaço formal de poder. Além 
disso, através do estabelecimento de vínculos de solidariedade com a comunidade circundante, as 
famílias senhoriais reforçavam e legitimavam a sua dominação. Por meio desses mecanismos de 
controle político, elas exerciam, na prática, o poder do Estado, posto que "a cidade funcionava[...] 
como extensão da propriedade e das famílias rurais. Não apenas em sua ordenação econômica, 
arquitetônica e demográfica, mas também na regulação jurídica, política e administrativa". 
No entanto, se até o final do século XVIII a falta de controle de Portugal sobre a colônia era 
 
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9 Textos extraídos do livro: Saúde da Família na Atenção Primária, de Daniela Resende Archanjo, Léa Resende Archanjo e Lincon Luciano da Silva. 
um inconveniente suportado pela metrópole, a partir do século XIX, quando território e governo se 
encontraram sobre o mesmo solo, foi necessário adotar medidas que enfraquecessem o poder das 
famílias e fortalecessem o poder centralizado do Estado. Em síntese: a família real precisava 
efetivamente governar o Brasil. 
A implantação das novas regras se efetivou à medida que a elite brasileira absorvia os ideais 
europeus de vida. A chegada da Corte ao Rio de Janeiro, em 1808, além de aumentar em quase 
um terço a população da cidade, produziu importantes transformações sociais, com a criação de 
novas necessidades nos planos político, material e social. No âmbito político, conforme já 
anunciado, era necessário promover a centralização do poder, reduzindo a influência das 
famílias; no âmbito material, foi introduzido o desejo pelos produtos europeus (como vidraças, 
cortinas, tapetes e louças); por fim, no âmbito social, a legitimação do poder passou a exigir um 
certo tipo de refinamento. 
Para participar dos favores da Corte, "já não bastavam dinheiro, escravos, terras, 
brancura de pele, catolicismo da alma ou outra qualquer tradição de importância ligada aos 
costumes locais. A condição para introduzir-se junto à aristocracia-, era aristocratizar-se". O 
processo de aristocratização passava pela higienização das práticas e dos comportamentos, 
resultando em uma maior disciplina sobre os corpos e as mentes. Aristocratizar-se significava, 
pois, enquadrar-se nos ideais burgueses- urbanos e higiênicos-, que foram sendo apropriados e 
ressignificados pelo saber médico. 
Vale ressaltar que a parceria medicina- Estado obteve êxito pois era benéfica para os dois. 
Enquanto interessava ao Estado encontrar um discurso "científico" que legitimasse as transfor- 
mações sociais por ele clesejadas - visandoà centralização do poder em suas mãos -, à medicina 
interessava firmar-se como um conhecimento superior e irrefutável, sendo o respaldo estatal um 
aliado importante. 
As regras higienistas abrangiam diversos aspectos, prescrevendo ensinamentos que iam 
desde aqueles da competência de um engenheiro civil ou de um arquiteto (indicando materiais a 
serem usados na construção das casas, recomendando a posição e o tamanho dos cômodos, 
especificando quantidade e posição ideais de portas e janelas), até as normas de etiqueta social 
(como as referentes à apresentação pessoal, ao oferecimento de festas, ao uso de louças e talheres). 
A introjeção dos padrões desejados de práticas e comportamentos tinha por objetivo constituir 
um modelo de organização familiar mais adequado ao ideal liberal-burguês, tendo como 
consequência (ou causa) a desestruturação da família patriarcal e a promoção da centralização do 
poder do Estado. 
Diante da família tradicional, em que o pai monopolizava o poder, mantendo-se todos os 
demais membros em uma condição de submissão e invisibilidade em relação a ele, o 
enfraquecimento desse patriarca era fundamental para romper com o poder familiar. Um meio 
importante utilizado pelo saber médico para alcançar esse objetivo foi a valorização da distinção 
entre os integrantes da família, obtida com o distanciamento dos parentes sem vínculos de 
consanguinidade em relação aos consanguíneos e, ainda, com o enaltecimento das diferenças 
existentes entre homens, mulheres e crianças. 
A separação entre consanguíneos e não consanguíneos, com a retirada destes últimos do 
lugar reservado aos então considerados parentes, somada à difusão da ideia de que homens, 
mulheres e crianças tinham funções distintas e interdependentes que deveriam ser desempenhadas 
para o bem da família, produziu nos inte,grantes do núcleo familiar a sensação de que tinham muito 
mais em comum entre si do que com as demais pessoas, levando-os a constituir uma "preciosa 
 
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10 Textos extraídos do livro: Saúde da Família na Atenção Primária, de Daniela Resende Archanjo, Léa Resende Archanjo e Lincon Luciano da Silva. 
fortaleza emocional", a "nova" família. Dentro dessa ideologia, prevaleceu a noção de que "o 'lar' 
vestia-se de todas as virtudes, em oposição ao mundo exterior, que encarnava as desordens humanas 
e sociais". 
Além da restrição do número de pessoas consideradas membros da família, o processo 
de individualização, com a valorização de lugares específicos para mulheres e crianças nessa 
instituição, foi fundamental para ofuscar o poder do patriarca. Dentro do "lar doce lar", cada um 
passou a ter valorizada uma função que lhe cabia enquanto membro da família, havendo rigorosa 
divisão dos papéis sexuais. O novo modelo pressupunha a instalação do núcleo reservado 
constituído de pai, mãe e filhos numa habitação aconchegante; o marido saía para trabalhar, a fim 
de obter os meios de subsistência da família, enquanto a esposa ficava responsável pela organização 
da vida doméstica, cuidando da limpeza da casa, do preparo dos alimentos, da educação dos filhos. 
Resumindo, na família moderna o papel do homem (marido e pai) era o de provedor, enquanto a 
mulher (esposa e mãe) figurava como a "rainha do lar", a "dona-de-casa- mãe-de-família". 
 
Haveria uma complementaridade entre as funções masculinas e femininas. A mulher era 
responsável pela vida doméstica, poupando o homem dos problemas presentes no cotidiano 
familiar. E o homem, com vida voltada para os negócios e para a realização profissional, 
deveria proteger a mulher dos complicados problemas do mundofora de casa para que ela 
pudesse ter melhor desempenho em seu trabalho no lar. 
 
É preciso perceber que essa visibilidade da mulher se sustenta na construção de um 
estereótipo feminino tributário da ideologia patriarcal. O poder do patriarca não foi simplesmente 
negado, mas, sim, ressignificado. Dessa forma, ao mesmo tempo em que decretou a existência e a 
importância da mulher na família e na sociedade, a divisão sexual de tarefas foi acompanhada pela 
desvalorização das funções femininas em relação às masculinas. A identificação simbólica da 
mulher "baseada na excessiva importância que se dá à função puramente fisiológica de procriação" 
a coloca "numa categoria com afinidade mais direta com a natureza, o que serve como argumento 
"científico" para justificar a manutenção de sua inferioridade em relação ao homem. 
"As ciências biológicas, encabeçadas pela anatomia e a fisiologia, lançaram-se na busca das 
diferenças sexuais que deviam fundamentar e justificar as desigualdades de gênero na vida pública 
e privada". Para tanto, o saber médico dissecou os corpos e os sentimentos de homens e mulheres a 
fim de, pautando-se nos legitimados métodos científicos, nomeá-los e classificá-los como próprios 
(naturais) de cada sexo. Como resultado desse esforço, houve a conversão das diferenças sexuais 
em profundas diferenças de personalidade. ''A masculinidade é definida como a capacidade para 
sublimar, para ser agressivo, racional e ativo; a feminilidade é definida como a capacidade para 
expressar emoções, para ser fraca, irracional e passiva". 
Ao mesmo tempo em que era valorizada a singularidade da mulher, exaltando-se a 
necessidade de que ela se enquadrasse no padrão burguês de feminilidade (consumindo produtos de 
uso pessoal e doméstico, aprendendo a receber pessoas em casa e com a casa e os filhos etc.), 
também havia a preocupação em controlar a porosidade dessa nova sociabilidade. 
Podemos ressaltar como uma das formas de exercer tal controle a valorização atribuída 
pelo saber médico à maternidade. Entendida como função natural da mulher, importantíssima para a 
perpetuação da espécie humana, o ideal de maternidade serviu também como instrumento de 
disciplinarização da mulher. 
 
A "nova mãe" passa a desempenhar um papel fundamental no nascimento da família 
nuclear moderna. Vigilante, atenta, soberana no seu espaço de atuação, ela se torna a 
 
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11 Textos extraídos do livro: Saúde da Família na Atenção Primária, de Daniela Resende Archanjo, Léa Resende Archanjo e Lincon Luciano da Silva. 
responsável pela saúde das crianças e do marido, pela felicidade da família e pela higiene 
do lar, num momento em que cresce a obsessão contra os micróbios, a poeira, o lixo e tudo 
o que facilita a propagação das doenças contagiosas. A casa é considerada como o lugar 
privilegiado onde se forma o caráter das crianças, onde se adquirem traços que definirão 
a conduta da nova força de trabalho do país. Daí, a enorme responsabilidade moral 
atribuída à mulher para o engrandecimento da nação. 
 
A importância atribuída à mãe - que ganhou o status de mediadora entre seus filhos e o 
Estado - estava diretamente relacionada com a valorização das crianças. Enquanto no modelo 
tradicional de família as crianças eram consideradas um "mal necessário", restando aos pais esperar 
que crescessem para que daí sim pudessem auxiliar no progresso econômico e na consequente 
manutenção do status social da família, no modelo moderno, o poder médico redefiniu o estatuto 
social da criança, elevando-a à condição de figura central da família nuclear. 
O discurso médico-científico afirmava que 
 
a maneira como o indivíduo tinha sido tratado na sua infância era determinante de suas 
qualidades corporais e morais quando adulto. Uma criança submetida a uma má 
amamentação; a uma alimentação insuficiente; à falta de exercício; a um regime 
anti-higiênico do vestuário; ou, ainda, a castigos brutais, à falta de amor paterno e materno; 
ao medo provocado por histórias de "fantasmas, duendes, lobisomens", etc... seria um 
adulto fraco de caráter, pusilânime, possuidor de uma saúde física e moral extremamente 
precária. Uma criança bemcuidada, pelo contrário, tornar-se-ia o perfeito adulto higiênico. 
 
Como os pais, a princípio, não estariam ainda devidamente qualificados para exercer o 
relevante papel social de educadores, posto que ainda estariam presos às práticas tradicionais, a 
solução médica foi a valorização da escola. A partir do argumento de que pais e mães, por 
ignorância, eram involuntariamente nocivos à criança, os filhos eram mandados para o espaço 
higienizado da escola e, assim, afastados dos vícios familiares. 
Além da valorização das individualidades, com a visibilidade social de mulheres e 
crianças, outra importante interferência do saber médico foi a difusão de uma nova forma de 
pensar a sexualidade, na qual se congregavam sexo, amor, matrimônio e procriação. 
 
 
Para informar-se mais sobre a ressignificação da infância, recomendamos a leitura de ARLES, Philippe. História social da criança 
e dafomília. Tradução de Dora Flaksman. 2. ed. Rio de Janeiro: Zahar, 1981. 
 
Na vigência da família patriarcal, o casamento era, na maior parte das vezes, tratado como 
um negócio, sendo as uniões matrimoniais decididas pelo patriarca, segundo seus interesses 
enquanto representante do grupo familiar. Numa sociedade estratificada e com poucas camadas 
sociais, a necessidade de preservação do patrimônio e do status social fazia com que fosse 
considerado ideal o casamento realizado entre "iguais", ou seja, entre pessoas que compartilhassem 
dos mesmos valores, interesses e gostos. Como salienta Trigo, "o casamento não deixava espaço 
para interesses pessoais. Bem ao contrário, a finalidade primeira da aliança matrimonial era de 
ordem social, ou seja, de fortalecimento de grupos de parentesco e de status, preservação da herança 
e do poder econômico". Assim, o casamento era, no mais das vezes, objeto de estratégias política e 
econômicas, arranjado de modo a fortificar os interesses das famílias, não se cogitando, portanto, da 
necessidade de amor em tre os cônjuges e tornando-se desnecessária até mesmo qualquer simpatia 
entre eles. Inclusive, como o interesse pessoal inerente a uma paixão amorosa poderia colocar em 
risco os interesses do grupo familiar, muitas vezes os cônjuges eram apresentados um ao outro 
 
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12 Textos extraídos do livro: Saúde da Família na Atenção Primária, de Daniela Resende Archanjo, Léa Resende Archanjo e Lincon Luciano da Silva. 
É preciso lembrar aqui que a vinda da Corte para o Brasil ocasionou um aumento considerável do número de 
membros da elite e, consequentemente, dos considerados "aptos" para o casamento. 
Como podemos notar, pouco se sabe sobre os sentimentos dos casais “rítimas" desses casamentos arranjados. Isso não 
significa que os cônjuges não sentiam nada um pelo outro nem que esses sentimentos eram "negativos" ou "ruins"; 
significa apenas que seus sentimentos não eram levados em conta, sendo considerados sem importância quando o 
assunto era casamento. 
somente no dia do casamento. 
 
 
 
 
 
 
Contrapondo-se ao modelo tradicional, na família moderna os elementos vistos como 
fundantes da união matrimonial tornaram-se outros: os sentimentos compartilhados pelos cônjuges 
passaram a ter grande importância, e a constituição da família deixou de ser apenas um negócio 
para o patriarca, sendo entendida como a realização de um desejo dos cônjuges. 
A construção higienista das individualidades, com a atribuição de práticas e 
comportamentos distintos para cada um dos sexos, somada ao aumento quantitativo de 
candidatos aptos ao casamento, produziu a necessidade de que os jovens casadoiros investissem 
na apresentação de qualidades pessoais que despertassem o interesse do sexo oposto e 
contribuíssem para a obtenção de um "bom" casamento. Nesse processo de exposição de 
qualidades, rapazes e moças se conheciam, passando a empatia a interferir nas escolhas 
matrimoniais. A introdução desse novo elemento, que foi denominado pela historiografia de amor 
romântico, mudou a visão a respeito do casamento não apenas em relação à sua origem, mas 
também ao seu modus operandi, aumentando o grau de intimidade compartilhado pelos 
membros do núcleo familiar. 
Conforme salienta Shorter, "As pessoas começaram a colocar o afeto e a compatibilidade 
pessoal ao alto da lista de critérios de escolha de parceiros conjugais". Além disso, "mesmo os que 
continuaram a empregar os critérios tradicionais de prudência e riqueza na seleção de parceiros 
começaram a ter um comportamento romântico dentro destes limites". 
 
 
 
 
 
Quais as mudanças você acredita que a vinda da corte para o Brasil trouxe para as relações 
familiares? 
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Os casamentos passaram a ser precedidos por um período em que os noivos se preocupavam 
em se conhecer melhor, em compartilhar momentos e sentimentos, enfim, um período em que os 
nubentes se preparavam para o casamento. As famílias dos jovens começaram a respeitar e até a 
incentivar a observância desse período e desse processo pré-casamento. A partir da visão de que o 
casamento implicava viver junto e de que as pessoas tinham o direito de ser felizes, rapazes e moças 
passaram a ter maior liberdade para escolher o seu par, a sua "outra metade", e, nessa empreitada, 
começaram a sentir-se guiados única e exclusivamente pelo coração. Na família moderna, "a 
escolha matrimonial deixa de ser, fundamentalmente, assunto familiar para se tornar 'teoricamente' 
livre e, mais do que isso, com expectativa de ter o amor como base". 
 
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13 Textos extraídos do livro: Saúde da Família na Atenção Primária, de Daniela Resende Archanjo, Léa Resende Archanjo e Lincon Luciano da Silva. 
Como a elite brasileira dependia dos escravos para o bom funcionamento do sistema doméstico, não sendo possível, 
em um primeiro momento, simplesmente desfazer-se deles, a estratégia higienista foi, inicialmente, transformar o 
significado atribuído ao escravo sem alterar a sua posição social. De 'animal' útil ao patrimônio e à propriedade 
tornou-se 'animal' nocivo à saúde. (COSTA, Jurandir Freire. Ordem médica e norma familiar. 3. ed. Rio de Janeiro: 
Graal, 1999. p. 121). Assim, a higiene exigia o afastamento dos escravos do núcleo familiar e, com isso, reforçava os 
laços estabelecidos entre os membros da família nuclear e contribuía para a construção e o fortalecimento da 
intimidade entre eles, despertando cada vez mais o rosto pela privacidade, pela domesticidade, pelo "lar doce lar”. 
A ideia de que o casamento se fundava no amor que unia os cônjuges teve como 
consequência a transformação dos filhos em símbolos enquanto frutos desse amor, reafirmando os 
ideais higienistas de valorização da criança e de responsabilização dos pais em garantir aos filhos o 
que houvesse de melhor (amor, cuidados, escolarização etc.). 
Por fim, outra medida propalada pelo saber médico e que serviu à constituição da família 
moderna foi a colocação, em um primeiro momento, de escravos, loucos, mendigos, prostitutas e 
demais "sem-família" na categoria de antinorma, ou seja, como exemplo daquilo que não deveria 
ser seguido. A princípio, todos aqueles que não tinham condições de realizar o modelo burguês de 
organização familiar (que era a maioria da população brasileira) foram excluídos, sendo tal 
modelo prescrito apenas para a elite brasileira. 
 
 
 
 
 
 
 
 
Conforme visto anteriormente, a realização do modelo burguês de família implicava ter, 
necessariamente,uma moradia que comportasse de forma adequada os membros da família e 
possibilitasse a cada um o acesso aos meios necessários para exercer seus respectivos papéis. 
Todavia, explicando a situação de forma bastante sintética, ocorria que a "desproporção entre 
os preços das moradias e os vencimentos" inviabilizava o atendimento a esse requisito por parte 
das classes populares. A ideia de cada grupamento de pai, mãe e filhos ter a sua própria casa não 
condizia com a realidade econômica da classe operária. Outrossim, "os salários fabris eram tão 
baixos que, tipicamente, toda a família tinha que trabalhar para garantir a subsistência", 
desmontando a possibilidade de o pai prover as necessidades de sua família e a mãe se limitar a 
cuidar da casa e dos filhos. 
Sob a perspectiva do Estado e dos industriais, as contradições inerentes à expansão do 
modelo burguês de família para a classe operária inviabilizavam a expansão da industrialização – o 
progresso - no Brasil de meados do século XX e tornavam-se "objeto de profunda preocupação de 
médicos-higienistas, de autoridades públicas, de setores da burguesia industrial, de filantropos e 
reformadores sociais". Visando suplantar esse problema, diferentes agentes, embasados pelo saber 
médico, engendraram diversos e simultâneos meios de introjeção do modelo moderno como ideal 
de organização familiar. 
Entre os mecanismos utilizados para "fabricar a classe trabalhadora desejada", Rago 
destaca a implantação dos regulamentos internos de fábrica e a construção das "vilas operárias". A 
primeira medida, com a qual se estabeleciam na fábrica horários (de trabalho, descanso e refeições), 
uniformes, códigos (de penalidade, punições e prêmios), entre outras regras, higienizava o 
operário por meio da disciplinarização de suas condutas dentro do espaço fabril. A construção das 
"vilas operárias", que objetivava a desodorização do espaço urbano, estendia a vigilância sobre os 
corpos e as mentes dos trabalhadores e de seus familiares até o espaço reservado das "habitações 
higiênicas e baratas" destinadas aos operários. Aos industriais interessava ter um operário ordeiro, 
ciente de suas responsabilidades e empenhado em garantir o seu posto de trabalho, distanciando-se 
de qualquer reivindicação de caráter trabalhista. Ao Estado era fundamental garantir a ordem, 
 
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14 Textos extraídos do livro: Saúde da Família na Atenção Primária, de Daniela Resende Archanjo, Léa Resende Archanjo e Lincon Luciano da Silva. 
O uso da palavra ideal visa ressaltar ao leitor que, mesmo não sendo possível ao operariado realizar o modelo burguês, 
o que interessava, sobretudo ao Estado e aos industriais, era despertar o gosto do trabalhador por esse modelo. Ou 
seja, o objetivo era implantar no operário o espírito burguês-liberal; ainda que esse regime significasse a sua própria 
exclusão, o trabalhador deveria desejá-lo e trabalhar muito para nele integrar-se e "progredir". Outra questão 
importante quando tratamos da expansão da ideologia burguesa às classes populares é a falta de opção que cercava o 
trabalhador. Não é possível romancear esse processo pensando que o trabalhador foi facilmente enfeitiçado pelas 
promessas burguesas do trabalho e da ordem como garantidores da paz e da felicidade. A não-conformação do 
trabalhador implicava sofrer medidas repressivas como a perda do emprego e restrições civis e políticas. 
exercendo controle sobre a sociedade. E, por fim, como vimos anteriormente, o status de distinção 
do saber médico era almejado pelas categorias profissionais que dominavam esses conhecimentos. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Assim, com o objetivo de redefinir a "maneira de pensar, de sentir, de agir e erradicar 
práticas e hábitos considerados perniciosos e tradicionais" por meio de diferentes estratégias, "os 
valores do amor monogâmico, privacidade, individualismo, domesticidade, assistência 
materna aos filhos e conforto emocional" foram apresentados à classe operária como o modelo 
ideal de comportamento e de vida. 
Os estudiosos da história da família ocidental defendem diferentes teses para explicar o 
porquê de a organização familiar ter sofrido essas transformações. Aries credita à escolarização das 
crianças o mote das mudanças; Burguiere aponta os novos comportamentos religiosos como 
fator preponderante; já Shorter defende que "o capitalismo de mercado esteve provavelmente na 
raiz da revolução no sentimento". Certamente todos os três têm razão, uma vez que, como vimos, a 
transformação da família foi o resultado da introjeção de uma nova ideologia, uma nova forma de 
ver e de viver o mundo, forma esta que se apropriou dos corpos e das mentes dos indivíduos, 
arrombando todas as portas e as janelas por onde podia entrar. 
 
 
Para aprofundar os conhecimentos sobre o processo de higienização da classe operária e os mecanismos de controle e vigilância 
criados pelo poder público e pelos industriais sobre os trabalhadores, ver RAGO, Luzia Margareth. Do cabaré ao lar: a utopia da 
cidade disciplinar (Brasil1890-1930). Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1985. 
 
Entretanto, entendemos que a tese de Shorter é a que melhor responde às transformações 
familiares ocorridas no Brasil, não apenas em relação à passagem do modelo tradicional ao 
moderno, mas também no que concerne à ruptura desse modelo e à constituição da família 
contemporânea. Senão, vejamos. 
De acordo com a hipótese que vê no processo de industrialização e na consolidação do 
capitalismo o fio condutor das transformações na família, a substituição da economia tradicional 
pela economia moderna mudou a lógica que regia o mercado, o que, consequentemente, 
ocasionou uma profunda mudança nos valores e nos comportamentos das pessoas, 
transformando as relações familiares e os sentimentos estabelecidos no seio da família. A ideologia 
capitalista de mercado, calcada em valores individualistas, favoreceu as transformações dessa 
instituição, que também resultaram na priorização cada vez maior do indivíduo, ressaltando as 
individualidades e exaltando o desenvolvimento de qualidades pessoais (restritas aos padrões 
aceitos socialmente). 
Enquanto na sociedade tradicional não era nítida a distinção entre o que estava na esfera 
pública (sujeito ao escrutínio público) e o que estava na esfera privada (resguardado do escrutínio 
público), havendo uma mistura entre essas duas ordens e uma certa publicização de tudo, já que não 
 
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15 Textos extraídos do livro: Saúde da Família na Atenção Primária, de Daniela Resende Archanjo, Léa Resende Archanjo e Lincon Luciano da Silva. 
Como exemplo da presença do individualismo na esfera pública, podemos resgatar a questão da concorrência no 
mercado (as indústrias buscando produzir mais e melhor para dominar o mercado consumidor e, se possível, superar 
as indústrias concorrentes) e a questão da divisão do trabalho dentro das fábricas cada trabalhador tem uma atividade 
determinada e deve exercê-la da melhor forma possível para garantir seu espaço de trabalho, sendo que, estando 
limitado ao exercício daquela tarefa, desconhece as demais atividades que fazem parte da produção. 
se valorizavam a individualização e a distinção entre homens, mulheres, crianças, parentes 
próximos, escravos etc., na sociedade moderna houve a higienização desses espaços- público e 
privado-, os quais foram rigidamente separados. Na sociedade moderna a esfera privada é 
privilegiada na defesa da consecução dos desejos e dos prazeres pessoais. 
Tendo redefinido esses domínios da vida, a privatização característica da modernidade se fez 
presente tanto no espaço público quanto no espaço privado: de um lado, marcou sua presença na 
esfera pública, influenciando o comportamento dos indivíduos enquanto trabalhadores, 
consumidores, produtores;de outro, marcou sua presença na esfera privada, no âmbito das relações 
pessoais e, em especial, da família. 
Seguindo essa mesma tese, que credita ao incremento da ideologia capitalista as 
transformações da família, percebemos que, durante a segunda metade do século XX, quando o 
sistema capitalista de produção avançou no Brasil, foram sentidas novas transformacões nas 
relações familiares, marcadas, sobretudo, pelo acentuado distanciamento entre as pessoas, inclusive 
entre as que compunham o núcleo familiar. 
 
 
Vale ressaltar que, quando afirmamos que o espaço público e o espaço privado foram rigidamente separados, buscamos 
salientar que passaram a ser acentuadas as diferenças características de cada um deles, não significando dizer que sejam campos 
isolados, pois, pelo contrário, eles se relacionam profundamente, "como as faces de uma mesma moeda" (DAMATTA, Roberto. 
A casa e a rua: espaço, cidadania, mulher e morte no Brasil. 5. ed. Rio de Janeiro: Rocco, 1997. p. 90). 
 
 
Na contemporaneidade, "no interior da vida privada da família surge[...] uma vida 
privada individual". Não basta somente estar inserido no grupo de mãe, pai e filhos, longe do 
restante da comunidade circundante; cada um busca o seu próprio espaço dentro desse pequeno 
grupo. Apesar de não servir como referência para todos os grupos sociais, restringindo-se à classe 
burguesa, as mudanças arquitetônicas ocorridas nas casas e apontadas por Trevelyan (citado 
por Habermas) representam bem esse novo nível de privatização que vem perpetuando-se até os 
dias de hoje. 
 
 
 
 
 
 
Nas modernas mansões privadas das grandes cidades, todas as peças que servem "para toda 
a família" estão reduzidas às mais miseráveis dimensões: os espaçosos vestíbulos reduziram-se a 
uma entradinha pobre e estreita; ao invés da família e dos deuses do lar, somente criadas e 
cozinheiras movimentam-se pela cozinha profanada; mas especialmente os pátios [...] 
transformaram-se em recantos estreitos, úmidos, mal-cheirosos [...] Caso olhemos para o 
interior de nossas moradias, então se descobre que o "espaço familiar", o local de permanência em 
comum para o homem, a mulher, as crianças e a criadagem tornou-se cada vez menor ou 
desapareceu por completo. Em compensação, os quartos privados de cada um dos membros da 
família tornaram-se cada vez mais numerosos, sendo decorados de modo característico. O 
isolamento do membro da família, mesmo no interior da casa, passa a ser considerado como algo 
positivo. 
 
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16 Textos extraídos do livro: Saúde da Família na Atenção Primária, de Daniela Resende Archanjo, Léa Resende Archanjo e Lincon Luciano da Silva. 
O desejo de cada um, dentro do seu quarto, do seu espaço, fica protegido não só da 
sociedade como um todo, mas também da própria sociedade familiar; no espaço privado do quarto, 
os bens, a arrumação, os detalhes são característicos de cada pessoa. Cada um dos membros da 
família deseja sua autonomia e independência, longe dos demais membros, sob a égide de um 
individualismo absoluto. Aqueles que não dispõem de condições econômicas para promover 
essa divisão no espaço físico da casa realizam-na por outros meios. Os espaços dos grupos - dos 
jovens, das mães, das crianças, dos trabalhadores - reúnem os pares, fortalecem as 
identidades de grupos que não são familiares, mas constituem-se por outras razões, por 
razões que marcam suas individualidades. Existe, pois, uma divisão espacial (feita na casa ou 
na rua) que preserva a individualidade, protegendo e mantendo todas as peculiaridades que 
distinguem uma pessoa da outra, desmembrando, espacial e sentimentalmente, a comunidade 
familiar. 
 
Reflita sobre como é sua vida familiar, ela se enquadra nas características descritas acerca da 
família contemporânea. 
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O enfraquecimento dos laços que unem os membros do núcleo familiar tem produzido 
transformações no que se refere ao tipo de sentimento estabelecido entre esses membros e 
também à forma como eles se organizam. Marcada pela diversidade de configurações e 
relações (nuclear, ampliada, monoparental, homossexual) e pela flexibilização dos papéis 
sexuais, a família vive um novo processo de transformação. Com frequência, vemos famílias de 
pais separados, em que pai, mãe e filhos não vivem sob o mesmo teto; famílias constituídas por 
casais homossexuais com filhos (adotados ou gerados em laboratório); famílias formadas por 
irmãos e sobrinhos, avós e netos, entre outros parentescos, coexistindo atualmente diversas 
composições familiares. 
A diversidade dos arranjos e a impossibilidade de adequá-los aos modelos familiares 
historicamente conhecidos têm levado os estudiosos a se debruçarem sobre a existência de uma 
crise da instituição e "os analistas indagam se a família está se desintegrando ou meramente 
evoluindo para uma nova forma". 
Discutindo essa crise da família, Costa chama a atenção para a responsabilidade do saber 
médico nesse processo de mudança, alertando para o fato de que "muitos dos fenômenos 
apontados, hoje em dia, como causas da desagregação familiar, nada mais são que consequências 
históricas da educação higiênica. Em outros termos, as famílias se desestruturaram por terem 
seguido à risca as normas de saúde e equilíbrio que lhes foram impostas". A exacerbação do 
individualismo, tributária da higienização e da distinção dos papéis, somada ao desenvolvimento 
do capitalismo de mercado calcado na concorrência, no consumismo e no hedonismo, deixou pouco 
tempo e espaço para a vivência do "compartilhar" inerente ao que nos acostumamos a chamar de 
família (núcleo familiar). Isso nos obrigou (e ainda nos obriga) a ressignificar esse símbolo. 
A atual preocupação com a família demonstra claramente que o referencial burguês de 
relações familiares ainda é muito forte no imaginário social. A ideia de que se deve casar por amor, 
a busca pelo "príncipe encantado", a sensação de dívida constante em relação aos filhos, os 
estereótipos de masculinidade e feminilidade, constantemente reforçados pela mídia e por outros 
meios, são alguns exemplos de quão presente ainda é o ideal de família moderna na 
 
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17 Textos extraídos do livro: Saúde da Família na Atenção Primária, de Daniela Resende Archanjo, Léa Resende Archanjo e Lincon Luciano da Silva. 
 
contemporaneidade. 
Além disso, os esforços governamentais no sentido de formular políticas públicas 
voltadas para a organização familiar evidenciam a persistência da crença de que a família é a célula 
mater da sociedade. Entendendo a família "como lugar de busca de condições materiais de vida, de 
pertencimento na sociedade e de construção da identidade", o Estado aposta suas fichas nessa 
instituição, adotando estratégias para fazer dela uma aliada importantíssima na luta por melhores 
níveis de vida, incluindo-se aí melhores níveis de saúde. 
Apesar de não definir a que modelo de família se destina nem propor diretamente uma 
padronização das organizações familiares, a Estratégia Saúde da Família, enquanto política de 
intervenção estatal na esfera privada/doméstica, configura-se, sem dúvida, como um 
mecanismo de controle da sociedade, comandado, novamente, pelo saber médico. Todavia, o 
que se propõe hoje (e o estudo da história das intervenções higienistas sobre a família nos auxilia a 
refletir sobre isso) não é apenas conceber a existência, ou não, de novos modelos de grupos 
familiares originados das transformaçõestecnológicas, científicas, culturais e humanas nem discutir 
a viabilidade, ou não, de tais formas de organização. Entendendo que a família "é, acima de 
tudo, a instituição a que é atribuída a responsabilidade por tentar superar os problemas da 
passagem do tempo tanto para o indivíduo como para a população", o que se requer dos 
profissionais das Equipes de Saúde da Família é a constante reflexão crítica sobre os seus saberes e 
as suas práticas, facilitada pela interdisciplinaridade e pelo multiprfissionalismo exigidos pela 
Estratégia Saúde da Família. 
 
 
1- Quando a família passou a sofrer a intervenção médica no Brasil? Como ocorria essa 
intervenção? 
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2- A partir da visão de que o casamento implicava viver junto e de que as pessoas tinham o direito 
de ser felizes, rapazes e moças passaram a ter maior liberdade para escolher o seu par, a sua "outra 
metade", e, nessa empreitada, começaram a sentir-se guiados única e exclusivamente pelo coração. 
Quais as implicâncias da casamento se funda no amor que une os cônjuges para a organização 
familiar? 
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3- De que forma a da ideologia capitalista influencia nas transformações da família? 
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18 Textos extraídos do livro: Saúde da Família na Atenção Primária, de Daniela Resende Archanjo, Léa Resende Archanjo e Lincon Luciano da Silva. 
Capítulo 2: 
Saúde e sociedade 
 
 
Começamos este capítulo conferindo especial enfoque a Marc Lalonde, ministro da Saúde 
do Canadá (1972-1977), que analisou, em 1974, os determinantes do nível de saúde naquele país. 
A importância para nós do Informe Lalonde é que suas conclusões influenciaram, nas décadas 
seguintes, os sistemas de saúde dos países em que as doenças crônico-degenerativas representavam 
importante causa de morbi-mortalidade. O Brasil se insere nesse contexto pois as transições 
demográfica e epidemiológica trouxeram um perfil de morbi-mortalidade em que coexistem 
doenças infecto-contagiosas (chamadas de doenças da pobreza) e doenças crônico-degenerativas 
(chamadas de doenças da civilização). Segundo Lalonde, os determinantes do nível de saúde das 
populações são: a biologia humana, os serviços de saúde, os estilos de vida e o meio ambiente, o 
que pode ser visto na Figura 1.A linha tracejada que delimita os domínios do meio ambiente e dos 
estilos de vida mostra que é difícil separar esses dois determinantes. Acrescentemos que, 
conforme constatamos na figura, de acordo com os dados desse informe, a partir da análise 
epidemiológica atribui-se um maior valor a esses dois componehentes. Porém, quando se estudou o 
nível de investimentos maiores se concentram nos serviços de saúde, como mostra a Figura 2. 
 
Figura 1- Efeito relativo do meio ambiente, do estilo de vida, dos serviços de saúde e da biologia humana sobre a saúde 
pública. 
 
Efeito relativo do meio ambiente, do estilo de vida, dos serviços de 
saúde e da biologia humana sobre a saúde pública 
Biologia humana
Serviços de Saúde
Meio Ambiente
Estilos de Vida
 
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19 Textos extraídos do livro: Saúde da Família na Atenção Primária, de Daniela Resende Archanjo, Léa Resende Archanjo e Lincon Luciano da Silva. 
 
Fonte: Lalonde, 1974. 
Figura 2 Proporções relativas do dinheiro público destinadas ao meio ambiente, ao estilo de vida, 
aos serviços de saude e à biologia humana: 
 
Fonte: Lalonde, 1974. 
 
É de especial interesse colocar uma pergunta a respeito desse documento: os estilos de vida 
que levam ao adoecimento são de natureza individual ou coletiva? Nesse sentido, estamos frente a 
mais uma dicotomia, entre tantas antinomias que constroem a nossa visão de mundo. Como 
profissionais da saúde, estamos acostumados, desde a nossa formação, a conviver com polarizações 
como individual-coletivo, curativo-preventivo, corpo-mente, biológico-social, público-privado. É 
assim que a primeira grande questão que se coloca quando se discute a relação entre saúde e 
sociedade é se a saúde é um bem individual ou coletivo. 
Não é possível pensar em saúde sem pensar na sociedade. Lalonde expressa isso quando 
admite a relação entre estilos de vida e ambiente, relação que está clara na Lei n° 8.080, de 19 de 
setembro de 1990, a Lei Orgânica da Saúde, no seu art. 3°: 
 
A saúde tem como determinantes e condicionantes, entre outros, a alimentação, a moradia, 
o saneamento básico, o meio ambiente, o trabalho, a renda, a educação, o transporte, o 
lazer e o acesso aos bens e serviços essenciais; os níveis de saúde da população expressam 
a organização social e econômica do país. 
 
Também é preciso destacar aqui o que afirma a Constituição da República Federativa do 
Brasil de 1988 em seu art. 196: 
 
A saúde é um direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e 
econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso 
universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação. 
 
Gostaríamos de ressaltar três aspectos mencionados no art. 196 da Constituição brasileira: 
 
1- O papel do Estado - Reconhecer saúde como um direito da condição humana e como 
Proporções relativas do dinheiro público destinadas ao meio 
ambiente, ao estilo de vida, aos serviços de saude e à biologia 
humana: 
Biologia Humana
Estilos de Vida
Meio Ambiente
Serviços de Saúde
 
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20 Textos extraídos do livro: Saúde da Família na Atenção Primária, de Daniela Resende Archanjo, Léa Resende Archanjo e Lincon Luciano da Silva. 
dever do Estado nos remete ao papel que o Estado brasileiro desempenhou na organização 
dos ser- viços de saúde, principalmente após o advento da República. O Estado sempre 
esteve presente na ordenação dos serviços de saúde, como veremos adiante, porém nunca, 
até a criação do Sistema Único de Saúde, tratou-se de acesso igualitário. 
 
2- Saúde como resultante das políticas sociais e econômicas- O reconhecimento de que não 
bastam os serviços de saúde para que se tenha saúde leva à necessidade de atuar sobre o am- 
biente, incluindo a sua dimensão social. Já citamos o trabalho de Marc Lalonde e aqui vale 
lembrar a importância que este autor deu aos estilos de vida e ao meio ambiente. Ao longo 
deste capítulo, poderemos também resgatar a relação entre esse tema e a determinação social 
do processo saúde-doença, evidenciando autores como Asa Cristina Laurell e Jaime Breilh. 
 
3- O acesso aos serviços de saúde - Pela primeira vez na história das políticas públicas de 
saúde no Brasil se propõe acesso universal aos serviços de saúde, organizados de forma a 
garantir a integralidade de ações como promoção, proteção e recuperação da saúde. Estava 
plantadaa semente do que seria o Sistema Único de Saúde (SUS). Único, pois realizaria o 
sonho dos militantes do Movimento da Reforma Sanitária Brasileira em ver, num só 
sistema, ligado a um só ministério, as ações preventivas e curativas. 
 
Breve revisão das políticas públicas de saúde no Brasil 
 
Para compreendermos o SUS, é necessário recuar no tempo e entender que ele é fruto da luta 
de setores da sociedade brasileira que, em plena ditadura militar, constituíram-se em críticos dos 
serviços públicos de saúde da época e propositores de uma nova organização do sistema de saúde. 
Esses setores da sociedade militaram no que chamamos de Movimento da Reforma Sanitária 
Brasileira. 
O ideário da Reforma Sanitária apontava para a necessidade de se repensar o sistema de 
saúde no Brasil, revertendo a tendência histórica baseada em três características: a flagrante 
dicotomia entre as ações preventivas e curativas, o atendimento a certos setores da sociedade, 
negligenciando a ideia de universalidade do sistema, e a crescente centralização do sistema de 
saúde. 
Veremos, de forma breve, essa trajetória, para entendermos as proposições da Reforma 
Sanitária. 
 
1- Dicotomia entre as ações preventivas e curativas - O sistema de saúde brasileiro, até a 
década de 1990, caracterizou-se pela separação entre as ações de promoção e proteção da 
saúde e as ações de recuperação da saúde. Duas vertentes estiveram presentes: a vertente do 
sanitarismo campanhista e a da medicina previdenciária. Na vertente do sanitarismo 
campanhista, foi criada, em 1897, a Diretoria Geral da Saúde Pública, que estava ligada ao 
Ministério da Justiça e Negócios Interiores. Oswaldo Cruz foi importante figura nessa 
diretoria, tendo sido protagonista de campanhas de erradicação da febre amarela, de peste 
bubônica e da varíola no Rio de Janeiro, no início do século XX. É muito conhecido o 
episódio da Revolta da Vacina, em 1904, no Rio de Janeiro, por ocasião da tentativa de 
regulamentação da lei que tornava obrigatória a vacina contra a varíola. Mais tarde, em 
1920, a Diretoria Geral de Saúde Pública se transformou no Departamento Nacional de 
 
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21 Textos extraídos do livro: Saúde da Família na Atenção Primária, de Daniela Resende Archanjo, Léa Resende Archanjo e Lincon Luciano da Silva. 
Saúde Pública, tendo Carlos Chagas à sua frente (Oswaldo Cruz falecera em 1917). Em 
1930, foi criado o Ministério da Educação e Saúde. O Ministério da Saúde só passa a existir 
a partir de 1953, quando são separadas as áreas de educação e saúde. O novo ministério, 
dedicado à saúde, fica com um terço das verbas do antigo ministério. A vertente da medicina 
previdenciária tem sua origem com a Lei Elói Chaves, de 1923, a partir da qual se criaram 
as Caixas de Aposentadoria e Pensões (CAPs), que, além de aposentadorias e pensões, 
ofereciam assistência médica aos seus beneficiários. Em 1933, iniciam-se sucessivas 
criações de Institutos de Aposentadoria e Pensões (IAPs) e, em 1966, foi criado o Instituto 
Nacional da Previdência Social (INPS), órgão que passou a ter um braço assistencial a partir 
de 1978, o Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (Inamps). Essa 
estrutura ficou ligada ao Ministério da Previdência e Assistência Social (MPAS), criado em 
1974, que se ocupava da medicina curativa, enquanto o Ministério da Saúde se ocupava da 
prevenção das doenças e da promoção da saúde. Tais estruturas, ligadas à Previdência 
Social, ficam com a concentração dos recursos disponíveis para investimento em saúde. 
 
2- A universalidade negligenciada - O mesmo período analisado no item anterior pode ser 
visto como uma sucessão de escolhas do poder público, que, em detrimento da univer- 
salização, opta por setores da sociedade a serem atendidos pelas políticas públicas de saúde. 
Esses setores representavam os interesses econômicos do País. Quando da criação das 
CAPs, eram atendidos somente os trabalhadores das empresas e seus dependentes. A própria 
Lei Elói Chaves surgiu como resposta do Estado às reivindicações dos trabalhadores 
urbanos durante as greves do final da década de 1910, principalmente em São Paulo, e não 
como uma política de Estado, para garantir o direito à saúde ao conjunto da população. 
Quando criados os IAPs, manteve-se a cobertura apenas para trabalhadores formais, mas, 
agora, organizados por categoria profissional e não por empresas. Isso atendeu ao interesse 
de industrialização do País. Mesmo com a criação do INPS e do Inamps, o conjunto da 
sociedade brasileira não foi contemplado. Esses institutos mantiveram a setorialização do 
atendimento, garantindo o direito à saúde somente aos trabalhadores com carteira assinada e 
excluindo grande parte da população brasileira. 
 
3- Crescente centralização dos serviços de saúde - Das CAPs ao Inamps, assistimos a uma 
crescente centralização dos serviços de saúde no Brasil. As CAPs eram organizadas por 
empresas e tinham uma participação ativa dos trabalhadores de Getúlio Vargas (1930-1945), 
a centralização administrativa e política ocorreu com a unificação das CAPs em IAPs, agora 
organizados por categoria profissional. Os trabalhadores perderam, com isso, a possibilidade 
de interferir na gestão dos recursos financeiros dos institutos, inclusive, sendo os 
presidentes dos IAPs indicados diretamente pelo presidente da República. Durante a 
ditadura militar, instaurada no País a partir de 1964, houve mais um passo na centralização, 
quando os IAPs, em 1966, foram unificados no INPS. 
 
O Movimento da Reforma Sanitária Brasileira passa, então, a propor, a partir do final da década de 1970, um sistema 
de saúde que unifique as ações presentes no Ministério da Saúde e no Ministério da Previdência e Assistência Social, 
garantindo, dessa forma, a integralidade das ações. A Reforma Sanitária reivindica também a universalidade do atendimento, 
garantindo a todos os residentes no País o direito à saúde, e a descentralização do sistema de saúde com aumento do papel dos 
municípios, bem como a garantia da participação popular na formulação e na fiscalização das estratégias e das políticas de 
saúde. 
 
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22 Textos extraídos do livro: Saúde da Família na Atenção Primária, de Daniela Resende Archanjo, Léa Resende Archanjo e Lincon Luciano da Silva. 
 
O Movimento da Reforma Sanitária 
 
Uma reviravolta na saúde era necessária para promover a reversão do modelo assistencial 
dicotomizado entre o Ministério da Saúde e o Ministério da Previdência e Assistência Social, 
centralizado no governo federal e muito longe de ser justo e equitativo, principalmente por atender 
somente aos setores da sociedade formalmente empregados. Esse sistema era o Inamps. No 
entanto, não se ficava apenas nas críticas a esse instituto; propunha-se um sistema de saúde 
universal, descentralizado e integral. Sarah Escorei resgata essa história no livro Reviravolta na 
saúde: origem e articulação do movimento sanitário. Desempenharam papel central na articulação 
do movimento diversos atores sociais, os quais Escore divide em três vertentes. 
A primeira vertente é representada pelo movimento estudantil e pelo Centro Brasileiro de 
Estudos de Saúde (Cebes), os quais difundiram análises críticas da medicina e apresentaram 
propostas transformadoras. A segunda vertente é representada pelo Movimento dos Médicos 
Residentes e pelo Movimento de Renovação Médica (Reme). Esses dois movimentos discutiram a 
realidade das condições de trabalho do médico atuando na regulamentação da residência médica, 
tentando garantir os direitos trabalhistas para os médicos residentes e atuando nos sindicatos 
médicos. A terceira vertente estava nas universidades, fazendo uma revisão crítica do modelo 
preventivista. Como representante desta última vertente citamos o trabalho de Sérgio Arouca, 
recentementepublicado: Odilema preventivista: contribuição para a compreensão e crítica da 
medicina preventiva (2003). Arouca e outros autores estão, a partir da década de 1970, fazendo 
uma crítica ao discurso preventivista. Asa Cristina Laurell, no México, e Jaime Breilh, no 
Equador, elaboram nesse período o que chamamos de modelo da determinação social do processo 
saúde-doença. Em 1991, é publicada a edição brasileira de Epidemiologia, economia, medicina y 
política, de autoria de Jaime Breilh. O livro traz no prólogo da primeira edição (maio de 1979), 
assinado por Asa Cristina Laurell, a seguinte afirmação: 
 
De uma ou de outra forma tem surgido a proposição de que a doença não pode ser 
entendida à margem da sociedade na qual ocorre. [...] Hoje, há um reconhecimento quase 
universal da importância do social no processo de geração da doença. No entanto, esse 
reconhecimento não teve maiores repercussões práticas. A medicina continua sendo 
exercida nos hospitais com um enfoque puramente clínico-biologicista. 
 
Estavam plantadas as ideias para uma reviravolta na saúde. O Movimento da Reforma 
Sanitária Brasileira havia cumprido um papel de resistência política à ditadura militar no setor saúde 
e, quando da redemocratização do País, esses atores sociais puderam influenciar de forma decisiva 
a Reforma Sanitária. O ano de 1986 tornou-se um marco para que a reviravolta na saúde 
acontecesse, data em que ocorre a mais importante conferência de saúde do Brasil. 
 
A VIII Conferência Nacional de Saúde 
 
O relatório final da VIII Conferência N acional de Saúde ocorrida em Brasília, em 
1986, com a participação de aproximadamente cinco mil representantes dos diversos setores 
interessados na questão de saúde, traz um modelo de determinação do processo saúde-doença 
muito próximo do que estaria, mais tarde, em 1990, contemplado na já citada Lei Orgânica da 
 
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23 Textos extraídos do livro: Saúde da Família na Atenção Primária, de Daniela Resende Archanjo, Léa Resende Archanjo e Lincon Luciano da Silva. 
Saúde, a Lei n° 8.080/90: 
 
Em seu sentido mais abrangente, saúde é a resultante das condições de alimentação, 
habitação, educação, renda, meio ambiente, trabalho, transporte, emprego, lazer, liberdade, 
acesso e posse da terra e acesso aos serviços de saúde. 
 
É assim, antes de tudo, o resultado das forças de organização social da produção, as 
quais podem gerar grandes desigualdades nos níveis de vida. 
 
Saúde não é um conceito abstrato, define-se no contexto histórico em determinada 
sociedade, em um dado momento de seu desenvolvimento, devendo ser conquistada pela 
população em suas lutas cotidianas. 
 
Nessa conferência, prevaleceram as ideias do movimento sanitário. Além do reconhecimento 
da determinação social do processo saúde-doença, o relatório final sinalizou para a construção de 
um sistema de saúde único, de acesso universal, descentralizado e com ações integrais, rompendo 
com quase cem a, nos de centralização e exclusão social. 
Nos anos que se seguiram, iríamos assistir à criação do arcabouço legal do SUS. A 
Constituição de 1988 e, mais tarde, em 1990, a Lei Orgânica da Saúde estabeleceram os princípios 
e as diretrizes do novo sistema de saúde, que viria a substituir o então Inamps. Antes, porém, do 
SUS, tivemos experiências bem-sucedidas precursoras da descentralização. Sem a intenção de 
discuti-las, neste momento, gostaríamos apenas de citar as Ações Integradas de Saúde (AIS), 
implantadas em 1983, e os Sistemas Unificados e Descentralizados de Saúde (Suds), 
implantados em 1987. 
 
Princípios e diretrizes do SUS 
 
Iremos abordar aqui sete princípios e diretrizes do SUS, a saber: universalidade, equidade, 
integralidade, hierarquização, descentralização, regionalização, participação popular. A escolha 
é parcial, pois outros princípios e diretrizes podem ser encontrados na legislação do SUS. Para 
simplificar a apresentação, não faremos diferenciação entre princípios e diretrizes, cabendo 
alerta de que não podemos tomar quaisquer destes de forma isolada. A consolidação do SUS só 
se dará se reconhecermos a indissociabilidade entre princípios e diretrizes. 
O primeiro aspecto que deve ser considerado é que o SUS deve atender a todos. Trata-se do 
princípio da universalidade. As políticas públicas de saúde, a partir da Constituição de 1988, de- 
vem ser pensadas e planejadas para o conjunto da população, ou seja, saúde passa a ser um direito 
fundamental da pessoa, independente da forma como ela se coloca no mercado de trabalho. "A 
saúde é um direito de todos e dever do Estado" - é essa expressão que abre a Seção II -Da Saúde, do 
Capítulo II -Da Seguridade Social, da Constituição Federal. O novo sistema de saúde, 
regulamentado em 1990, terá um grande desafio pela frente: ''A saúde é um direito fundamental do 
ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício. 
O SUS, desse modo, passa a cuidar da saúde de todos, promovendo a justiça, na medida em 
que, ao planejar suas ações, deve levar em conta as necessidades das pessoas. Mais do que a 
igualdade, o que significaria atender a todos da mesma forma, o SUS passa a ter por princípio a 
promoção da justiça. Equidade é mais que igualdade. Esta pode ser apenas formal, enquanto aquela 
é o reconhecimento das diferenças e das necessidades especiais dos grupos sociais mais vulneráveis 
socialmente. 
 
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24 Textos extraídos do livro: Saúde da Família na Atenção Primária, de Daniela Resende Archanjo, Léa Resende Archanjo e Lincon Luciano da Silva. 
Além disso, não basta atender a todos se a natureza do atendimento não incorporar o 
princípio da integralidade. Atender de forma integral é garantir a promoção, a proteção 
(prevenção) e a recuperação da saúde. Antes os serviços de saúde ligados ao Ministério da Saúde 
priorizavam a promoção da saúde e a prevenção das doenças, enquanto o Inamps, ligado ao 
Ministério da Previdência e Assistência Social focava seu objetivo na recuperação da saúde, 
assistindo à doença. Agora, essas ações devem ser garantidas no SUS. 
Também não basta garantir a universalidade e a integralidade apenas na atenção básica à 
saúde (ou atenção primária à saúde). É preciso que a promoção da saúde, a prevenção das doenças e 
a recuperação da saúde estejam presentes em níveis de hierarquização do sistema de saúde, que 
deve ser organizado de forma a oferecer uma ampla rede de atenção básica (atenção primária à 
saúde), porta de entrada do sistema, com nível de resolutividade em torno de 80%. Os serviços 
ambulatoriais mais especializados e o atendimento hospitalar estão organizados nos níveis de 
atenção secundária e terciária à saúde. Porém, nem sempre isso acontece. Em estudo anterior, 
tivemos oportunidade de demonstrar o sofrimento de mulheres gestantes, ao peregrinarem pelo 
SUS, em busca de garantia de internação em maternidades da cidade de Curitiba, Paraná. 
Contrariando a tradição da crescente centralização do sistema de saúde, o SUS apresentou-se 
num momento de tentativas de descentralização (AIS e Suds, entre outras). Talvez a maior marca 
do sistema de saúde brasileiro a partir da década de 1980 seja a descentralização. Isso aconteceu, 
por um lado, pelos anseios do Movimento da Reforma Sanitária e, por outro, como uma saída para a 
crise da previdência anunciada no início daquela década. A descentralização fortaleceu o papel dos 
municípios na gestão do sistema e permitiu que se levasse em conta a epidemiologia local no 
planejamento dos serviços. Além disso, a descentralização acompanhou o processo de 
redemocratização do País. 
Como consequência da descentralização e da hierarquização do sistema, estabeleceu-se a 
regionalização. Os serviços

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