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Quando se pensa em músculos, é possível visualizá-los como um todo, ou seja, como uma unidade isolada. Isso é natural porque, aparentemente, um músculo esquelético atua como uma entidade isolada. Contudo, os músculos esqueléticos são muito mais complexos do que essa pers- pectiva deixa entrever. Se um indivíduo tiver que dissecar um músculo, ele deverá cortar primeiramente o revestimento de tecido conjuntivo externo. O epimísio que circunda o músculo inteiro, mantendo-o unido. Tão logo ele tenha sido seccionado, poderão ser observados pequenos feixes de fibras envoltas em uma bainha de tecido conjuntivo. Esses feixes são denominados fascículos. A bainha de tecido conjuntivo que envolve cada fascículo é o perimísio. Por fim, quando o perimísio é seccionado, será possível visualizar, com a utilização de um microscópio, as fibras musculares, que são células musculares individuais. Diferente de muitas células do corpo, as quais possuem um único núcleo, as células musculares são multinucleadas. Uma bainha de tecido conjuntivo, denominada endomísio, também reveste cada fibra muscular. Geralmente, pensa-se que as fibras musculares se estendem de uma extremidade à outra do músculo, mas, pela observação ao microscópio, os ventres musculares (a parte medial espessa dos músculos) geralmente se dividem em compartimentos ou bandas fibrosas mais transversas (inscrições). Por causa dessa divisão em secções, as fibras musculares humanas mais longas medem cerca de 12 cm, o que corresponde a cerca de 500 mil sarcômeros, a unidade funcional básica da miofibrila. O número de fibras nos diferentes músculos varia entre algumas centenas (p. ex., músculo tensor do tímpano) até mais de 1 milhão (p. ex., músculo gastrocnêmio medial). FIBRAS MUSCULARES Quanto ao diâmetro, as fibras musculares variam entre 10 e 120 μm e, portanto, são praticamente invisíveis a olho nu. As seções seguintes irão descrever a estrutura da fibra muscular individual. Plasmalema Quando se observa cuidadosamente uma fibra muscular isolada, pode-se verificar que ela é circundada por uma membrana plasmática denominada plasmalema. O plasmalema faz parte de uma unidade maior, conhecida como sarcolema. O sarcolema é composto de plasmalema e membrana basal. Na extremidade de cada fibra muscular, seu plasmalema se funde com o tendão, que se insere no osso. Os tendões são constituídos de cordões fibrosos de tecido conjuntivo que transmitem para os ossos a força gerada pelas fibras musculares, criando assim o movimento. Desse modo, em geral, cada fibra muscular está, em última análise, presa ao osso por meio do tendão. O plasmalema apresenta diversas características singulares que são importantes para o funcionamento das fibras musculares. Quando a fibra está contraída ou em estado de repouso, essa estrutura tem o aspecto de uma série de pregas rasas ao longo da superfície da fibra, mas, quando o músculo está alongado, essas pregas desaparecem. Esse dobramento permite o alongamento da fibra muscular sem que ocorra ruptura do plasmalema. O plasmalema exibe também pregas juncionais na zona de inervação da junção neuromuscular, que auxiliam na transmissão do potencial de ação do moto- neurônio para a fibra muscular, conforme será discutido mais adiante neste capítulo. Finalmente, o plasmalema ajuda a manter o equilíbrio acidobásico e a transportar metabólitos desde os vasos capilares até a fibra muscular. As células-satélite estão localizadas entre o plasmalema e a membrana basal. Essas células estão envolvidas no crescimento e no desenvolvimento dos músculos esqueléticos e na adaptação do músculo à lesão, à imobilização e ao treinamento. Esses tópicos serão discutidos em mais detalhes nos capítulos subsequentes. Sarcoplasma No interior do plasmalema, uma fibra muscular contém subunidades sucessivamente menores. As maiores dessas subunidades são as miofibrilas, o elemento contrátil do músculo, que serão discutidas posteriormente. Uma substância gelatinosa preenche os espaços no interior e entre as miofibrilas. Essa substância é o sarcoplasma, que é a parte líquida das fibras musculares – seu citoplasma. O sarcoplasma contém principalmente proteínas dissolvidas, minerais, glicogênio, gorduras e as organelas necessárias, diferindo do citoplasma da maioria das células por conter uma grande quantidade de glicogênio armazenado, bem como mioglobina, um composto ligante de oxigênio bastante semelhante em estrutura e em função à hemoglobina encontrada nos eritrócitos. Túbulos transversos O sarcoplasma também abriga uma extensa rede de túbulos transversos (túbulos T), extensões do plasmalema que atravessam lateralmente a fibra muscular. Esses túbulos estão interconectados ao passarem entre as miofibrilas, permitindo que os impulsos nervosos recebidos pelo plasmalema sejam rapidamente transmitidos a cada miofibrila. Os túbulos também proporcionam caminhos desde a parte externa da fibra até seu interior, permitindo que substâncias penetrem na célula e que resíduos saiam. Retículo sarcoplasmático Há, no interior da fibra muscular, uma rede longitudinal de túbulos, conhecida como retículo sarcoplasmático (RS). Esses canais membranosos avançam paralelamente às miofibrilas, enrolando-se em torno dessas estruturas. O RS funciona como um local de armazenamento para o cálcio, que é essencial para a contração muscular. Miofibrilas Cada fibra muscular contém de várias centenas a milhares de miofibrilas. Estas pequenas fibras são compostas por elementos contráteis básicos do músculo esquelético – os sarcômeros. Vistas em microscópio, as miofibrilas aparecem como longas tiras de sarcômeros. Sarcômeros Ao microscópio ótico, as fibras do músculo esquelético exibem um aspecto nitidamente listrado. Por causa dessas marcas, ou estriações, o músculo esquelético é também denominado músculo estriado. Essas estriações também são observadas no músculo cardíaco, que, portanto, também pode ser considerado como um músculo estriado. O sarcômero é a unidade funcional básica da miofibrila e também a unidade contrátil básica do músculo. Cada miofibrila é composta de numerosos sarcômeros unidos pelas extremidades nos discos Z. Filamentos grossos Cerca de dois terços de toda a proteína existente no músculo esquelético consistem em miosina, a principal proteína do filamento grosso. Geralmente, cada filamento grosso (de miosina) é formado por cerca de 200 moléculas de miosina. Filamentos finos Cada filamento fino, embora com frequência identificado simplesmente como filamento de actina, é na verdade composto de três moléculas de proteínas diferentes – actina, tropomiosina e troponina. Cada filamento fino possui uma extremidade inserida em um disco Z e a outra se estendendo em direção ao centro do sarcômero, situando-se no espaço entre os filamentos grossos. Contração da fibra muscular O motoneurônio alfa é uma célula nervosa que pode se conectar a muitas fibras musculares (inervando-as). Um único motoneurônio e todas as fibras musculares por ele inervadas são coletivamente denominados unidade motora. A sinapse ou lacuna entre um motoneurônio alfa e uma fibra muscular é denominada junção neuromuscular. Nesse local ocorre a comunicação entre os sistemas nervoso e muscular. Acoplamento excitação-contração A sequência complexa de eventos que iniciam a contração de uma fibra muscular é chamada acoplamento excitação-contração, pois tem início com a excitação do nervo motor e resulta na contração das fibras musculares. O processo, é iniciado por um sinal elétrico, ou potencial de ação, proveniente do cérebro ou da medula espinal até um motoneurônio alfa. O potencial de ação chega aos dendritos do motoneurônio alfa, que são receptores especializados presentesno corpo celular do neurônio. Em seguida, o potencial de ação passa pelo axônio até os terminais axônicos, localizados muito próxi-mos ao plasmalema. Quando o potencial de ação chega aos terminais axônicos, essas extremidades nervosas secretam uma substância neurotransmissora denominada acetilcolina (ACh), que cruza a fenda sináptica e se liga aos receptores no plasmalema. Se uma quantidade suficiente de ACh se ligar aos receptores, o potencial de ação será transmitido por toda a extensão da fibra muscular, ao se abrirem os canais iônicos na membrana da célula muscular, permitindo a entrada do sódio. Esse processo denomina-se despolarização. Papel do cálcio na fibra muscular Além de despolarizar a membrana da fibra muscular, o potencial de ação se desloca através da rede de túbulos da fibra (túbulos T) até o interior da célula. A chegada de uma carga elétrica faz com que o RS adjacente libere para o interior do sarcoplasma uma grande quantidade de íons cálcio (Ca2+ ) armazenados. No estado de repouso, as moléculas de tropomiosina cobrem os sítios de ligação de miosina nas moléculas de actina, impedindo a ligação das cabeças de miosina. Tão logo os íons cálcio são liberados do RS, eles se ligam à troponina existente nas moléculas de actina. Acredita-se que a troponina, com sua forte afinidade com os íons cálcio, dê início ao processo de contração por meio do deslocamento das moléculas de tropomiosina para fora dos sítios ativos nas moléculas de actina. Tendo em vista que a tropomiosina geralmente oculta os sítios ativos, essa proteína bloqueia a atração entre as pontes cruzadas de miosina e as moléculas de actina. Contudo, tão logo a tropomiosina tenha sido retirada dos sítios ativos pela troponina e pelo cálcio, as cabeças de miosina poderão se acoplar a esses sítios ativos nas moléculas de actina. Figura: Sequência de eventos que conduz à ação muscular, conhecida como acoplamento excitação- contração. (a) Em resposta a um potencial de ação, um motoneurônio libera acetilcolina (ACh), que cruza a fenda sináptica e se liga a receptores no plasmalema. Se uma quantidade suficiente de ACh se ligar, um potencial de ação é gerado na fibra muscular. (b) O potencial de ação inicia a liberação dos íons cálcio (Ca2+ (c) O Ca2+ das cisternas terminais do retículo sarcoplasmático para o interior do sarcoplasma. se liga à troponina no filamento de actina, e a troponina traciona a tropomiosina para fora dos sítios ativos, permitindo que as cabeças de miosina se fixem ao filamento de actina. Teoria dos filamentos deslizantes: como o músculo cria movimento Quando o músculo contrai, ocorre o encurtamento das fibras musculares. Para compreender como ocorre esse fenômeno, é necessário recorrer à chamada teoria dos filamentos deslizantes. Quando as pontes cruzadas de miosina estão ativas, elas ligam-se com a actina, resultando em uma mudança na conformação espacial das pontes cruzadas, o que faz com que a cabeça de miosina se incline e arraste o filamento fino na direção do centro do sarcômero. Essa inclinação da cabeça é conhecida como movimentação das pontes cruzadas. A tração do filamento fino para além do filamento grosso encurta o sarcômero e gera força. Quando as fibras não estão contraindo, a cabeça de miosina permanece em contato com a molécula de actina, mas a ligação molecular no local fica enfraquecida ou bloqueada pela tropomiosina. Imediatamente após a inclinação da cabeça de miosina, essa estrutura se separa do sítio ativo, gira de volta à sua posição original e se fixa ao novo sítio ativo, um pouco mais além no filamento de actina. A repetição dos acoplamentos e da movimentação das cabeças de miosina faz com que os Banda I Z Músculo relaxado Miosina Actina Banda A Z filamentos deslizem entre si – e essa é a causa do nome teoria dos filamentos deslizantes. Esse processo tem continuidade até que as extremidades dos filamentos de miosina atinjam os discos Z ou até que o Ca2+ seja bombeado de volta para o interior do retículo sarcoplasmático. Durante esse deslizamento (contração), os filamentos finos se movimentam em direção ao centro do sarcômero, protraindo na zona H e terminando pela superposição. Quando isso ocorre, a zona H passa a não mais ser visível. Lembre-se de que os sarcômeros são unidos em suas extremidades nas miofibrilas. Por causa desse arranjo anatômico, quando os sarcômeros encurtam, as miofibrilas encurtam, e as fibras musculares dentro do fascículo também encurtam. O resultado final do encurtamento de muitas fibras é uma contração muscular organizada. Energia para contração muscular A contração muscular é um processo ativo que requer energia. Além do sítio de ligação para a actina, a cabeça de miosina contém um sítio de ligação para o trifosfato de adenosina (ATP). A molécula de miosina deve se ligar ao ATP para que ocorra a contração muscular, pois o ATP fornece a energia necessária. A enzima adenosina trifosfatase (ATPase), que está localizada na cabeça de miosina, decompõe o ATP resultando na produção de difosfato de adenosina (ADP), fosfato inorgânico (Pi ) e energia. A energia liberada pela decomposição do ATP é utilizada para impulsionar a inclinação da cabeça de miosina. Assim, o ATP é a fonte química de energia para a contração muscular. Relaxamento muscular A contração muscular terá continuidade enquanto houver disponibilidade de cálcio no sarcoplasma. No final da contração muscular, o cálcio é bombeado de volta para o interior do RS, onde fica armazenado até que um novo potencial de ação chegue à membrana da fibra muscular. O cálcio retorna ao RS por meio de um sistema de bombeamento ativo. Este é outro processo que requer a energia proveniente do ATP. Portanto, a energia é necessária tanto na fase de contração quanto na de relaxamento. Quando o cálcio é bombeado de volta ao RS, tanto a troponina como a tropomiosina retornam à conformação de repouso. Isso bloqueia a ligação das pontes cruzadas de miosina com as moléculas de actina, interrompendo o uso do ATP. Como resultado, os filamentos grossos e finos retornam a seu estado original de relaxamento.
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