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ANATOMIA E FISIOLOGIA ANIMAL COMPARADA NOTA INTRODUTÓRIA Nos capítulos anteriores (Origem da vida e dos Animais, Taxonomia & sistemática) duas constatações importantes foram feitas: (1) As convergências evolutivas são frequentes e resultam muitas vezes em estruturas morfológicas, anatômicas ou embriológicas aparentemente semelhantes, e que, no entanto, evoluíram de maneira independente. Aliás, muitas homologias são hoje reconsideradas (ou seja, com suspeitas de não serem homologias, mas sim homoplasias), e não das menores. Por exemplo, há muito tempo, há dúvidas sobre a real homologia do celoma nos Protostomados e nos Deuterostomados. (2) A diversidade estrutural dentro dos filos (diversidade intra-filo) é bem mais importante do que se pensava tradicionalmente. Táxons com organização muito diferente do “plano de organização” do filo ao qual pertencem não são raros, o que tornou obsoleta a noção de “plano fundamental de organização corporal”. O fato é que a evolução não para quando um filo é formado (aliás, a evolução não “cria” um filo, é o ser humano que cria essa categoria artificial para designar grupos de Animais com organização que ele julga muito diferente). A chave para entender essas constatações são as restrições funcionais (*) e as pressões seletivas que elas exercem. Todos os Animais têm que desempenhar funções essenciais como respirar, se alimentar e se reproduzir. Porém, a maneira como essas funções são desempenhadas depende das restrições sofridas. Assim, restrições semelhantes podem levar a convergências em táxons não diretamente aparentados, e restrições diferentes podem levar a grandes diferenças em táxons diretamente aparentados. (*) As restrições funcionais são o conjunto de fatores (de cunho físico/químicos, ou fisiológicos, por exemplo) que limitam as diversas formas que podem tomar, por mudanças evolutivas, sistemas que têm que desempenhar determinadas funções anatômica/fisiológicos nos organismos. Por exemplo, a evolução nunca poderia produzir um mamífero com respiração branquial porque leis físico-químicos das trocas de gases e outros fatores como o controle das perdas d’água corporal por evaporação não permitiriam que os processos de seleção natural produzissem brânquias em Animais terrestres. Brânquias em Animais terrestres simplesmente não funcionariam. Por exemplo, em relação à respiração, a vida na água não apresenta os mesmos tipos de problemas que a vida no ambiente terrestre. É, portanto, lógico que Animais não diretamente aparentados (de filos diferentes, por exemplo, e até mesmo muito distantes) que vivem na água tendam a respirar da mesma maneira (=com estruturas que funcionam de maneira semelhante), enquanto táxons de um mesmo filo que vivem, no caso de alguns, na água, e no caso de outros, no ar, tendam a respirar de maneira diferente (= com estruturas que funcionam de maneira diferente). 2 No entanto, não se pode confundir função e estrutura. Animais que têm que enfrentar mesmas restrições evoluem muitas vezes para um funcionamento semelhante, porém isso não significa que as estruturas morfo/anatômicas que asseguram esse funcionamento são idênticas. Pode-se assim observar uma grande diversidade de estruturas diferentes que funcionam mais ou menos no mesmo princípio. Nada a ver, por exemplo, entre o “pulmão” de um Caracol (molusco gastrópode terrestre), de uma Aranha e de um Tetrápode. São estruturas que são muito diferentes (na sua conformação anatômica, na sua origem embriológica/evolutiva), mas que funcionalmente (ou seja, a maneira como funcionam globalmente) evoluíram de modo convergente frente à constrição imposta pela respiração terrestre. A diversidade estrutural (para responder aos problemas ligados à respiração terrestre, por exemplo) vem de dois lados. Primeiramente, da filogenia (história evolutiva). A evolução nunca “trabalha” a partir de uma “página branca”, mas sim, a partir do que foi herdado de ancestrais. A uma herança estrutural diferente corresponderá uma estrutura diferente para desempenhar a mesma função! Em segundo lugar, a seleção natural não favorece uma única solução (aqui, uma solução estrutural para um problema funcional), mas sim tudo que possa funcionar. Mesmo partindo de uma herança ancestral comum, duas espécies podem perfeitamente ver seus órgãos divergir progressivamente desde que esses órgãos modificados sejam eficientes (na resposta ao problema a ser resolvido). Entender a diversidade animal é, em última análise, tanto uma questão de diversidade estrutural como de diversidade funcional. A diversidade estrutural é o fundamento do ensino da biologia desde sempre. Tem que admitir que é complexo, pois as diferenças morfo/anatômicas são tão numerosas entre filos e dentro dos filos que a quantidade de saber a adquirir é colossal. Simplifica- se muitas vezes as coisas com a noção chave de “plano de organização”, que permite, às vezes, de apresentar um só organismo “tipo” por filo (por exemplo, é “tradicional” no ensino de biologia dos Anelídeos, usar a minhoca como organismo “tipo desse filo, ou ainda a Hidra para o ensino de biologia do filo dos Cnidários). Mas, ao fazer isso, e além do fato que esse conceito de “plano fundamental de organização” não é mais pertinente (pelas razões expostas acima), oculta-se a diversidade intra-filo (dentro dos filos). Será que isso significa que é necessário fazer um inventário completo das variações morfo/anatômicas intro-filo, além das variações inter-filos para ensinar a zoologia? Claro que não. Porém, a diversidade estrutural intra-filo é, junto com a diversidade estrutural inter-filos (entre os filos) e, sobretudo, as convergências evolutivas, uma maneira pertinente de apreender a diversidade funcional. É o outro lado da moeda da diversidade, menos ensinado nas disciplinas de zoologia. No entanto, os dois juntos tornam possível entender realmente os Metazoários. Tegumento, esqueletos & movimentos 1 ANATOMIA E FISIOLOGIA ANIMAL I. Revestimento externo, esqueleto, musculatura & MOVIMENTO Tegumento, esqueletos & movimentos 2 Em todos os grupos Animais (com a exceção das Esponjas e de alguns outros pequenos filos de animais com organização corporal muito simples [ex: Placozoa]), o revestimento externo, o esqueleto e a musculatura são interelacionados de diversas maneiras para produzir MOVIMENTO (SL. 4). Globalmente, dois grandes modelos de inter-relações entre revestimento externo, esqueleto e musculatura são encontrados nos Animais (SL. 5 & 6): * Nos “Invertebrados”, pelos menos nos chamados "superiores" (Artrópodes), as funções de proteção (comumente a do revestimento externo) e de sustentação do corpo (a do esqueleto) são combinadas sob a forma de um esqueleto externo rígido e articulado (= formado de peças articuladas) que encerra completamente o corpo do Animal. Os músculos têm uma posição interna em relação a esse exoesqueleto e são atados a sua superfície interna das peças articulados desse exoesqueleto. Os exemplos mais complexos desse sistema são encontrados nos Artrópodes (ver o Crustáceo e o Inseto dos slides 5 & 6). Nesses Animais, o exoesqueleto é composto por várias peças articuladas entre si, com numerosos músculos individuais atados a projeções internas das peças articuladas do exoesqueleto. Os músculos transmitem as forças geradas por sua contração ao exoesqueleto (ou seja, às peças articuladas), o que por sua vez gera o movimento (flexão ou extensão de peças articuladas, por exemplo). Além do mais, os músculos são organizados em pares antagonistas, ou seja, os dois músculos de um par têm ações contrárias (músculo flexor e músculo extensor, por exemplo, ou ainda músculos protratores/retratores [ex: movimento de uma perna para frente ou para trás, respectivamente], oumúsculos adutores/abdutores [músculos que movem uma peça articulada para ou fora de um ponto de referência, com uma mandíbula de insetos, por exemplo]). * Nos Vertebrados, o revestimento externo (ou seja, a pele) é separado do sistema muscular e não possui função esquelética. O esqueleto é interno (e formado por peças articuladas, como no caso dos Artrópodes) e os músculos (também organizados em pares antagonistas) são atados na superfície externa desse esqueleto (SL. 5 & 6). Tegumento, esqueletos & movimentos 3 1. REVESTIMENTO EXTERNO (ou tegumento) O revestimento externo, chamado mais tecnicamente de tegumento, é definido com o envelope que encerra o corpo do animal e que separa o meio interno do animal do meio externo. Portanto, ele funciona como barreira, embora deva também permitir a troca de sinais e matéria com o mundo externo. Esse tegumento é um órgão que pode ter composições, espessuras, aspectos muito diferentes de um grupo animal para outro, como vai ser mostrado a seguir. 1.1. Quais são as funções do tegumento? Elas são muitas vezes múltiplas e em todos os grupos animais, ele possui pelo menos uma das seguintes funções (SL. 7 & 8): * Uma barreira protetora contra ferimentos, abrasão, agentes infecciosos, raios que podem destruir as células (raios UV, por exemplo) * Uma superfície de comunicação com o meio externo: em quase que todos os grupos animais, o tegumento possui muitos receptores capazes de perceber estímulos mecânicos (mecanorreceptores), térmicos (termorreceptores), químicos (quiomiorreceptores), dores (nociceptores), etc. * Em certos grupos animais, sobretudo aquáticos ou dependendo de um meio úmido, o tegumento permite a troca de gazes. É o caso dos "Peixes" (as brânquias são uma parte especializada do tegumento), dos Anfíbios (a pele toda efetua uma parte significativa das trocas de gases), de muitos “Invertebrados” aquáticos e até mesmo de pequenos “Invertebrados” terrestres (em muitos minúsculos Insetos, por exemplo, a troca de gases ocorre por difusão através da cutícula; nas minhocas, o tegumento representa uma superfície de troca de gases). * Em muitos grupos aquáticos, o tegumento participa dos mecanismos que permitem manter relativamente constante a concentração de certos íons nas células e no líquido intersticial. Significa que o tegumento efetua a osmorregulação. * O tegumento pode ter um papel na comunicação química entre os seres vivos. Em muitos grupos animais, o tegumento possui glândulas que sintetizam e liberam, para o exterior, substâncias que servem como "mensagens químicas". Quando essas mensagens servem para a comunicação entre indivíduos da mesma espécie, fala-se de feromônios; quando eles servem para a comunicação entre indivíduos de espécies diferentes, chamam-se aleloquímicos (uma substância produzida por um animal e que serve a afastar outro animal de outra espécie, por exemplo, é um aleloquímico; os aleloquìmicos são ainda divididos em alomônios quando o benefício da emissão da mensagem é para o emissor [ex: emissão de repelentes], e em kairomônios quando o beneficiário da mensagem é quem o recepciona [ex: substâncias liberadas por árvores doentes e que atraem insetos cavando galerias nessas árvores]). * O tegumento pode conter células com pigmentos (= cromatóforos), as quais permitem a formação de padrões de cores ou até mudanças de padrões de cores. Esses padrões de cores pedem servir para a camuflagem, para o mimetismo, para dar avisos (= aposematismo) (cores muito vivas de certas espécies de rá que avisam do caráter venenoso do animal, por exemplo), ou para a comunicação visual (entre parceiros de sexos diferentes, por exemplo). Tegumento, esqueletos & movimentos 4 * O tegumento produz também estruturas muito diversas em muitos grupos animais, como, por exemplo: cutícula, penas, chifres, cascos, unhas, cabelos, pelos etc. (penas, chifres, cascos, unhas, cabelos, pelos são produções tegumentares oriundas da ectoderme e caracterizadas por um alto grau de queratinização; são chamadas genericamente de fâneros) 1.2. Tipos de tegumento Os tegumentos variam muito em espessura, composição, complexidade e nas funções que assumem, segundo os grupos animais. A seguir, vão ser examinados os principais tipos de tegumento nos “Invertebrados” e Vertebrados. 1.2.1. “Invertebrados” Protozoários (SL. 9) Numerosos grupos de Protozoários possuem, diretamente sob a membrana plasmática, uma rede ordenada de microfilamentos(*)1, microtúbulos(*)1, alvéolos, ou ainda uma combinação dos três. O conjunto formado pela membrana celular e essas redes é chamada película; e forma um tipo de parede corporal, flexível ou rígida, mais ou menos complexa segundo os grupos de Protozoários. O papel principal dessa película é a manutenção da forma celular e em certos casos, a formação de pseudópodes. (*)1 Os microfilamentos e microtúbulos são formados por polimerização de proteínas globulares (actina no caso dos microfilamentos, tubulina no caso dos microtúbulos), e são presentes em quase todas as células animais onde formam o citoesqueleto da célula. Participam de numerosos processos vitais da célula como a divisão celular, a formação do fuso acromático, a fixação das organelas etc. Os microtúbulos são também o elemento fundamental dos cílios e flagelos. Animais (multicelulares) Em muitos grupos de “Invertebrados”, o tegumento é constituído pela epiderme recoberta por uma complexa CUTÍCULA. Uma característica dos “Invertebrados” é que a epiderme (= epitélio que recobre a superfície externa do corpo) é formada de apenas 1 camada de células (= epiderme monoestratificada) (SL. 10). Quanto à cutícula, ela é definida como uma camada/matriz de material extracelular não vivo que é secretado pela epiderme e que a recobre (SL. 10). Segundo os grupos de “Invertebrados”, essa cutícula varia em espessura e composição; em certos grupos como os Artrópodes, ela forma um EXOESQUELETO. * Nos Anelídeos (minhocas, por exemplo), a cutícula é fina, flexível e de composição relativamente simples. Ela é constituída principalmente por fibras de colágeno organizadas em Tegumento, esqueletos & movimentos 5 camadas sucessivas de fibras espiralizadas ao redor do corpo, a direção da espiral sendo sucessivamente alternadamente à esquerda e à direita de uma camada para outra. Essa disposição fortalece a parede corporal, além de prevenir nós e aneurisma (SL. 11). * Nos Nematódeos, o componente principal da cutícula é também o colágeno. Entretanto, a cutícula é bem mais espessa e complexa (várias camadas com organização diferente) (SL. 12). * O maior grau de complexidade da cutícula é encontrado nos Artrópodes (Insetos, Aranhas, Escorpiões, Crustáceos etc.). Nesses Animais, a cutícula é geralmente espessa, rígida e organizada em placas articuladas entre si, e forma um exoesqueleto articulado. A composição química dessa cutícula é bastante complexa. Muito resumidamente, a cutícula tipo de um artrópode é constituída de 3 camadas principais. A mais espessa e interna é a endocutícula. A mais fina e externa é a epicutícula. Entre os dois, fica a exocutícula, menos espessa que a endocutícula, todavia mais rígida (SL. 13). Exocutícula e endocutícula formam a procutícula (SL. 13). O principal componente da procutícula (= endo + exocutícula) é a quitina (a quitina forma de 20 a 50% do peso seco da cutícula dos Insetos). A quitina é um polissacarídeo um pouco especial na medida em que as unidades que constituem a cadeia são moléculas de glicose modificadas, ou seja, moléculas de glicose nas quais o grupo hidroxilo (OH) ligado a um dos carbonos (o carbono 2') é trocado por um grupo nitrogenado (o grupo N-acetil: -NH-CO-CH3) (SL. 13). Essas moléculas nitrogenadas de glicose são chamadas N-acetil-D-glicosamina (uma molécula de quitina é, portanto, um polímero de N-acetil-D- glicosamina)(SL. 13). Na procutícula, as moléculas de quitina são encontradas sob a forma de microfibrilas: cada microfibrila (que tem 3 nm de diâmetro e 0,3 µm de comprimento) é formada por cerca de 20 moléculas de quitina paralelas e juntadas por pontes de hidrogênio. Na procutícula, essas microfibrilas são organizadas em inúmeras camadas superpostas, sendo que em cada camada, as microfibrilas são paralelas entre si, e que a orientação geral dessas microfibrilas muda de camada para outra, no sentido anti-horário (SL. 13). As microfibrilas de quitina ficam dentro de uma matriz quimicamente complexa e composta principalmente por vários tipos de proteínas (até mais de 100 tipos diferentes de proteínas) que formam ligações covalentes com as microfibrilas de quitina. A diferença entre endo e exocutícula é que nessa última, há moléculas especiais (polifenoís) que estabelecem, via enzimas chamadas polifenol oxidases, ligações (ligações orto-quinonas) entre as proteínas da matriz, o que torna a exocutícula muito mais rígida que a endocutícula. O processo se chama esclerotização. As áreas de articulação entre as peças articuladas do exoesqueleto dos artrópodes são formadas por procutícula cuja parte superior não sofreu processo de esclerotização (ou seja, há apenas endocutícula (+ epicutícula), nessas áreas). Essas áreas (chamadas membrana articular) são, portanto, bem mais flexíveis que ás áreas da cutícula que sofreram esclerotização. Quanto à epicutícula, muito fina, ela é completamente desprovida de quitina. Ela formada por três camadas que, da mais externa para a mais interna, são: uma camada de lipoproteínas, uma camada de ceras (longas moléculas de hidrocarbonetos, e ésteres de ácidos graxos e álcoois) e uma camada de cuticulina (proteína). A epicutícula serve como proteção contra a abrasão e infecções bacterianas. Também permite, via a camada de ceras, a impermeabilização da cutícula, uma propriedade muito importante para animais terrestres de pequeno tamanho que, sem essa camada de impermeabilização, correriam o risco de perder muito rapidamente sua água corporal por evaporação através do tegumento. Tegumento, esqueletos & movimentos 6 Nos Crustáceos, o exoesqueleto é mineralizado, carbonato de cálcio sendo depositado na parte superior da procutícula. * Nos Moluscos, o manto (tegumento da superfície dorsal do corpo dos Moluscos) produz uma concha muito rígida formada essencialmente por carbonato de cálcio (SL. 14). Em resumo, a cutícula é uma secreção da epiderme encontrada na maioria dos grupos de “Invertebrados”. Sua composição, espessura, rigidez e complexidade variam de grupo para outro de “Invertebrados”. O colágeno e a quitina são os dois tipos principais de componente encontrados na cutícula. 1.2.2. Vertebrados O tegumento dos Vertebrados apresenta grandes diferenças com o dos “Invertebrados” (SL. 15): - nos Vertebrados, a epiderme (de origem ectodérmica) é pluriestratificada (= formada por várias camadas de células) (monoestratificada na maioria dos “Invertebrados”) - o tegumento dos Vertebrados é também composto da derme, tecido conjuntivo de origem mesodérmica. Ela contém numerosas fibras de colágeno, vasos sanguíneos, nervos e células com pigmentos (os cromatóforos, com grânulos de melanina). A derme nutre a epiderme. A parte mais externa do tegumento, a exposta a todo tipo de agressões, sofre um desgaste constante. Essa parte é constantemente renovada graças à camada basal da epiderme (o "stratum germinatum") (SL. 15), cujas células sofrem divisões mitóticas intensas. * No grupo dos "Peixes" (grupo parafilético que agrupa as mixinas [os “peixes-bruxas”], as lampreias, os peixes cartilaginosos [tubarões, raias], e os peixes ósseos), a epiderme é sempre fina (não mais do que 5 a 9 camadas de células) e permite trocas osmóticas e iónicas entre o meio exterior e interior. Ela é também ricamente provida de células produzindo muco (SL. 16). - Nos Peixes ósseos (classe Actinopterygii principalmente), a epiderme recobre escamas ósseas produzidas pela derme (SL. 16). - Nos Peixes cartilaginosos (Classe Chondrichthyes – tubarões, arraias etc.), as escamas (também uma produção da derme) possuem a forma de pequenos dentes. Aliás, elas têm a mesma composição que os dentes (SL. 16): dentina (substância que se assemelha ao osso, contudo sem células e composto por fosfato de cálcio misturado com material fibroso) recoberta por esmalte (cristal de fosfato de cálcio). * Nos Vertebrados terrestres (grupo Tetrapoda: Anfíbios, “Répteis”, Aves, Mamíferos), uma característica da epiderme é que com o passar do tempo, as células superficiais se enchem cada vez mais de queratina (proteína fibrosa). Em consequência disso, essas células morrem e formam uma camada córnea que fornece uma barreira eficiente contra as perdas d'água por evaporação, o problema número 1 dos Animais terrestres. Tegumento, esqueletos & movimentos 7 - Nos Anfíbios, a camada córnea é muito fina (1 só camada) (SL. 17). Consequentemente, a epiderme permanece permeável o que permite que a pele possa servir como superfície de troca de gases. O tegumento dos Anfíbios é ricamente provido de glândulas que produzem muco, o qual permite certo grau permanente de umidade da pele (condição essencial para a troca de gases – ver capítulo sobre troca de gases). - Nos "Répteis", a camada córnea é fortemente desenvolvida e forma escamas e placas, que não são nada mais do que epiderme queratinizada e muito espessa (SL. 17). - Nas Aves e nos Mamíferos, a camada córnea é também desenvolvida e as penas e os pelos não são nada mais que produtos fortemente queratinizados (e altamente especializados claro) da epiderme (SL. 18). Eles servem como proteção contra a abrasão, para o voo e para a conservação do calor (termorregulação). Outros derivados queratinizados da epiderme encontrados nas Aves e nos Mamíferos são: chifres, cascos, unhas, bico, garras etc. Vários tipos de glândulas encontram-se no tegumento dos Vertebrados terrestres: * Nos Mamíferos, a epiderme contém glândulas típicas da classe: as glândulas sebáceas e sudoríparas. As primeiras secretam uma substância oleosa que permite a lubrificação dos pelos e da pele, enquanto as segundas secretam um líquido que refresca o corpo por evaporação (termorregulação). Os Mamíferos são também caracterizados pelas glândulas mamárias, encontradas somente neles. * Nos Anfíbios, a epiderme é ricamente provida de glândulas que produzem muco e também de glândulas de veneno que produzem substâncias com papel importante enquanto agentes antimicrobianos. * Os “Répteis” possuem glândulas cloacais ou anais que produzem odores muito fortes que servem para a aproximação dos sexos * Nas Aves, as glândulas da epiderme são relativamente raras. Existe apenas um par de glândulas uropígeas, perto da cloaca, que secretam uma substância oleósa servindo para impermeabilizar as penas. Tegumento, esqueletos & movimentos 8 2. ESQUELETOS O que é um esqueleto ? Basicamente, é uma estrutura física que permite uma das seguintes 3 coisas, e mais frequentemente, as 3 ao mesmo tempo (SL. 19): - Proteger o corpo - Sustentar o corpo - Transmitir as forças geradas pela contração de músculos 2.1. Quais são os diferentes tipos de esqueleto? Uma primeira distinção pode ser feita entre (1) os esqueletos "duros" e (2) os esqueletos hidráulicos. (1) Entre os esqueletos duros, pode-se ainda distinguir os exoesqueletos (nesse caso, o esqueleto é externo, ele recobre o corpo ex: Artrópodes) e os endoesqueletos (que ficam dentro do corpo ex: Vertebrados) (SL. 21). Os esqueletos "duros" podem também ser flexíveis ou rígidos (SL. 21). Os flexíveis são os que podem ser deformados por forças musculares e que voltam a sua forma normal quando as forças musculares cessam. Os esqueletos de cartilagem, como nos Tubarões e afins(grupo Chondrichthyes), são um bom exemplo disso (*)2. Os esqueletos rígidos não podem ser deformados, eles resistem a mudanças de formas. Os ossos de Tetrápodes são um exemplo desse tipo de esqueleto; outro exemplo é a concha dos Moluscos. (*)2 Nos Chondrichthyes, todos os elementos de esqueleto cartilaginoso são recobertos por uma camada de cartilagem calcificada prismática. (2) Um esqueleto hidráulico (ou hidroesqueleto) é composto por um líquido mantido sob pressão num compartimento fechado do organismo (SL. 22). Ele serve para manter a forma do corpo (função de sustentação) e também para gerar movimentos quando músculos atuam sobre esse compartimento (função de transmissão de forças geradas pela contração de músculos). Já que a água é incompressível, o volume de líquido num compartimento fechado é constante. Portanto, qualquer aumento local de pressão (por contração de músculos que ficam ao redor do compartimento, por exemplo) será transmitido através do corpo e a força gerada pelo deslocamento do fluido numa região do corpo pode ser usada para efetuar trabalho em outra região (para cavar, por exemplo). Esse tipo de esqueleto é encontrado em grupos Animais como os Cnidários, Platelmintos, Nematódeos e Anelídeos. Esses Animais se deslocam usando seus músculos para modificar a forma de compartimentos cheios de líquido. Tegumento, esqueletos & movimentos 9 Os hidroesqueletos não fornecem nenhuma proteção. Além do mais, não poderiam oferecer nenhuma sustentação a um Animal terrestre de grande tamanho, razão pela qual hidroesqueletos não são encontrados em grandes Animais. 2.2. Principais tipos de esqueleto duros encontrados nos “Invertebrados” * Nos Protozoários, certos grupos secretam esqueletos externos ou internos (esféricos ou com outras formas) calcários, silicosos ou orgânicos, ou ainda o constroem a partir de elementos externos (partículas minerais. por exemplo) (SL. 23). Esses tipos de esqueleto têm uma função de proteção e de sustentação do “corpo” da célula. * Nas Esponjas (Filo Porifera), existe um esqueleto interno relativamente frouxo, composto de uma rede de minúsculas espículas calcárias ou silicosas, ou ainda, de proteína fibrosa (a espongina) (SL. 24). Suas funções são a proteção e a sustentação do corpo. * Em certos Cnidários, como os Corais (corais pétreos ou corais moles), existe um esqueleto externo de carbonato de cálcio (corais pétreos) ou interno de proteínas fibrosas (a gorgonina) (corais moles) (SL. 25) que fornecem um suporte para o crescimento das colônias. * Nos Moluscos, a concha é um exoesqueleto composto por carbonato de cálcio (SL. 26). Sua principal função é protetora. * Os Artrópodes são caracterizados por possuírem um exoesqueleto (SL. 27) composto basicamente por quitina (30 a 50 % da cutícula) e proteínas, e formado por peças articuladas entre si por cutícula flexível. Suas funções são múltiplas: proteção, sustentação, e transmissão das forças geradas pela contração muscular para permitir o movimento. Durante a fase de crescimento (da fase larvar até a fase adulta), os Artrópodes sofrem mudas regulares (ecdises), cada muda sendo um processo complexo que consiste em sintetizar um novo e maior exoesqueleto, e a se livrar do antigo. * Nos Equinodermos, o esqueleto é, apesar das aparências, um endoesqueleto: ele fica logo debaixo da epiderme e é produzido pela derme. Ele é formado por pequenas placas calcárias (SL. 28) que, segundo os grupos, são soldadas (ouriços do mar), articuladas entre si (ofiuras, crinóides), ou espalhadas na derme (estrelas do mar). 2.3. O esqueleto dos Vertebrados Nos Vertebrados, o esqueleto é interno e possui várias funções (SL. 29). Como no caso do exoesqueleto dos Artrópodes, ele sustenta o corpo e fornece sítios de fixação de músculos Tegumento, esqueletos & movimentos 10 organizados em pares antagonistas (permitindo assim a transmissão de forças geradas por contração muscular). Além disso, nos Vertebrados, ele protege os centros nervosos: cérebro e medula espinhal. O esqueleto dos Vertebrados pode ser composto de dois tipos de tecidos: cartilagem ou osso (SL. 30). A cartilagem é uma massa elástica, contudo firme, constituída por proteínas (colágeno), glicoproteínas e condroitina (*)3, produzidas por células (os condrócitos) espalhadas nessa matriz e contidas em pequenas câmaras (SL. 30). (*)3 a condroitina, uma substância característica da cartilagem, é um comprido polissacarídeo formado por unidades de dissacarídeos nos quais um dos açúcares é sempre um açúcar aminado. Na cartilagem, os condrócitos são aprisionados em pequenas câmaras e, portanto, não podem efetuar trocas de material, a não ser por difusão, processo lento e limitado pela distância. Isso explica a capacidade limitada de crescimento e de remanejamento da cartilagem em relação ao tecido ósseo. O tecido ósseo é uma estrutura rígida, altamente estruturada, composta de uma densa matriz de colágeno com depósitos de cristais de fosfato de cálcio e de carbonato de cálcio (SL. 30). Um osso é composto por numerosas unidades estruturais, cada uma delas sendo mais ou menos cilíndrica e composta por lamelas concêntricas de substância mineral. Cada uma dessas unidades possui um canal central por onde passam nervos e vasos sanguíneos. As células ósseas encontram- se dentro de pequenas câmaras que ficam na interface entre as lamelas concêntricas. Todas essas câmaras são interconectadas por muito finos canalículos que permitem trocas de material entre os capilares e as células ósseas, o que por sua vez possibilita o rápido crescimento do osso e seu remanejamento contínuo. Nos embriões de todos os Vertebrados, o primeiro esqueleto a ser formado é constituído inteiramente por cartilagem. Em alguns grupos de Vertebrados, como os Chondrichthyes (Tubarões e Arraias), o esqueleto cartilaginoso persiste durante toda a vida (embora os elementos de esqueleto cartilaginoso sejam recobertos por uma camada de cartilagem calcificada). Em todos os outros Vertebrados, o tecido ósseo substitui progressivamente a cartilagem durante o desenvolvimento. Entretanto, cartilagem permanece em alguns lugares como a extremidade das costelas, a superfície das áreas de articulações, as orelhas, a nariz, os anéis da traqueia etc. Tegumento, esqueletos & movimentos 11 O esqueleto de todos os Vertebrados possui o mesmo plano básico (SL. 31) (*)4: (*)4 O esqueleto mostrado no slide 31 é o de uma espécie de uma ordem extinta (Therapsida) de animais que tinham uma aparência de répteis (embora não fossem répteis) e que eram predadores do tamanho de um cachorro. Os mamíferos são oriundos desse grupo. * Um esqueleto cefálico (crânio) * Um esqueleto axial (a coluna vertebral) constituída por uma sucessão de peças articuladas entre si (as vértebras). Na maioria dos casos, o esqueleto axial é associado a uma caixa torácica composta de varetas esqueléticas (as costelas). * Um esqueleto apendicular que representa o esqueleto dos membros locomotores (nadadeiras ou patas), e que é muitas vezes associado a um esqueleto zonal constituído pelas chamadas cinturas: a cintura escapular (ou pectoral) e a cintura pélvica, que ligam os membros ao esqueleto axial. Em todos os Cordados (Filo Chordata que é formado por 3 subfilos: Urochordata, Cephalochordata e Vertebrata) (ver árvore filogenética do slide 32), o primeiro elemento do esqueleto que surge no embrião é um fino bastonete rígido e elástico chamado notocorda que se estende dorsalmente desde a cabeça até a parte traseira, entre o tubo digestivo e a corda nervosa (SL. 33). Forma o esqueleto axial primário de todos os embriões de Vertebrados (SL. 33). Essa notocorda é formada por células fortemente vacuolizadas e cercadas por duas bainhas (uma externa, fina e elástica; a outra interna, mais espessa e fibrosa) (SL. 33). A notocordapersiste no estágio adulto somente em alguns grupos de Cordatos: * no subfilo Cephalochordata (ex: Branchiostoma lancelolatum – o anfioxo) * em alguns subgrupos do grupo Vertebrata: nos Myxinoidea (as mixinas ou “peixes-bruxa”) e nos Petromizontoidea (as lampreias) (ver SL. 34). Nos Vertebrata, a notocorda é progressivamente cercada e finalmente substituída pela coluna vertebral, constituída por peças ósseas articuladas entre si (as vértebras) (nas lampreias, existem vértebras rudimentares associadas à notocorda – ver SL. 34). Cada vértebra possui um arco neural que rodea (e protege) a medula espinhal (SL. 34). A notocorda só se encontra sob a forma de elementos vestigiais entre as vértebras (na maioria dos Tetrápodes, a notocorda desaparece completamente no estágio adulto). * no subfilo Urochordata (os Tunicados), apenas a larva (de vida livre e com aspecto de girínio – ver SL. 33) possui uma notocorda; o adulto (fixado ao substrato - ver SL. 33) não possui mais notocorda. Tegumento, esqueletos & movimentos 12 3. MOVIMENTO O movimento é uma característica própria dos Animais. A maioria dos Animais são móveis (pelo menos numa fase da sua vida ex: larvas de Esponjas) e dedicam uma parte importante de tempo e de energia para procurar o alimento, escapar dos predadores ou achar um parceiro para o acasalamento por exemplo. Existem diversos tipos de locomoção, em diversos tipos de ambientes (terrestre ou aquático; em contato com o substrato; em plena água, no ar) o nado, o “rastejar”, o “andar”, o “saltar”, e o voo etc.. Cada um desses tipos de locomoção apresenta exigências energéticas e problemas específicos para vencer dois tipos de resistência: a fricção e a gravidade. Basicamente, três tipos de movimento são encontrados no mundo animal e dos protozoários: ameboide, ciliar/flagelar, muscular (SL. 35). 3.1. Movimento ameboide Numerosos Protozoários do grupo das Amebas se deslocam (e também se alimentam) por formação de pseudópodes. Nos Animais, esse tipo de locomoção é também encontrado em alguns tipos de células como os macrófagos e fibroblastos de Vertebrados. Nas Amebas, a progressão em direção a um estímulo (de natureza química, por exemplo), começa com a formação de um largo pseudópode que se estende em direção ao estímulo, fixa-se ao substrato, e puxa para ele o resto da célula (SL. 36). Segundo o modelo proposto para explicar esse tipo de locomoção, a progressão por pseudópodes depende de fluxos citoplasmáticos controlados por mudanças do estado “gel” ao estado “sol” (*)5 do citoplasma periférico (o ectoplasma). (*)5 Nas Amebas e outros Protozoários, existe na periferia da célula, logo debaixo da membrana, um chamado ectoplasma (ou córtex), de aspecto gelatinoso e filamentoso (estado "gel" – plasma-gel), enquanto o citoplasma interior, chamado endoplasma, é mais fluido (estado "sol" – plasma-sol). O estado "gel" deve-se a polimerização de subunidades de actina, o que resulta na formação de filamentos ligados a ângulo reto, criando assim uma rede de filamentos que torna o citoplasma geliforme. Segundo o modelo (ver (SL. 36), o ectoplasma na região do estímulo torna-se fluido (= torna-se endoplasma por despolimerização dos microfilamentos de actina). Por causa da pressão interna, o endoplasma interno é forcado a se deslocar para esse ponto, o que resulta na formação de um pseudópode. Ao mesmo tempo, o endoplasma da periferia do pseudópode se torna ectoplasma, o que permite a consolidação do pseudópode. Na parte da célula oposta à zona de formação do pseudópode, o ectoplasma é convertido a endoplasma por despolimerização dos filamentos da actina, o que alimenta o fluxo de endoplasma para o pseudópode. Tegumento, esqueletos & movimentos 13 No que diz respeito à força responsável pelo fluxo de endoplasma, ainda tem controvérsias. Uma hipótese propõe que o fluxo de citoplasma é criado por contração na parte traseira da célula, de modo que o citoplasma é pressionado para frente (a zona de formação do pseudópode). Esse contração seria devida a interações actina-miosina no córtex, embora a presença de miosina no córtex ainda seja duvidosa. Caso essa hipótese for confirmada, teríamos um mecanismo de contração muito semelhante à contração de células musculares. 3.2. Movimento vibrátil (cílios e flagelos) (SL. 37 & 38) Os cílios e os flagelos permitem um deslocamento ativo num meio líquido para organismos de muito pequeno tamanho como os Protozoários, os Turbelários (platelmintos de vida livre), os Ctenóforos (os Ctenóforos representam os maiores dos Animais usando apenas movimento ciliar para se locomover; nesses animais, o movimento se dá por movimentação de placas (ou paletas) natatórias, cada uma sendo formada por centenas de compridos cílios parcialmente fundidos) (SL. 38), os estágios larvares de grupos animais como as Esponjas, os Cnidários, Anelídeos e Moluscos. Os espermatozoides na maior de grupos animais se deslocam por movimento flagelar. Os cílios e os flagelos possuem exatamente a mesma ultraestrutura e o mesmo diâmetro (0,2 µm). Eles diferem por seu comprimento e seu número. Os cílios são geralmente mais curtos (5 a 15 µm) que os flagelos (50 a 500 µm); os flagelos estão sempre presentes em pequeno número (1 ou 2 geralmente), enquanto os cílios formam geralmente "campos" que podem recobrir toda a superfície de uma célula (paramécio, por exemplo). Também diferem pelo tipo de movimento que eles efetuam: em “remo” nos cílios, ondulatórios nos flagelos (SL. 37). Em certos grupos animais, os cílios ou flagelos também servem para criar forças de deslocamento de fluidos ou material viscoso em parte do corpo (na cavidade gastrovascular dos Cnidários, por exemplo, onde as células ciliadas da gastroderme movimentam o conteúdo dessa cavidade), ou no corpo inteiro (nas Esponjas, por exemplo, as células flageladas [coanócitos] são responsáveis das correntes d’água que percorrem permanentemente [em canais] o corpo das Esponjas). 3.3. Movimento muscular Praticamente todas as células Animais, bem como os Protozoários, possuem dentro do citoplasma microfilamentos que junto com os microtúbulos formam o citoesqueleto das células. Esses microfilamentos podem através de mecanismos de deslizamento uns sobre os outros provocar a contração das células. Isso explica que todas as células possuem uma capacidade de contração, mais ou menos desenvolvida segundo os tipos de células. Tegumento, esqueletos & movimentos 14 A medida que os Animais se tornavam maiores e mais complexos, e que a especialização celular aumentava, células se especializaram completamente para um só e único papel: a contração (ver disciplinas de histologia e fisiologia para a análise dos fenômenos de contração muscular na escala celular e molecular). São as chamadas células musculares (também chamadas fibras musculares devido a sua forma alongada, ou ainda miócitos) que por sua vez formam tecidos musculares, ou seja, os músculos. Os músculos nunca poderiam permitir a execução de movimentos sem sua associação com um sistema esquelético. Eles precisam de suportes mecânicos, de transmissores de forças, para ter seu papel de órgãos do movimento. Três tipos principais de sistema músculos-esqueleto existem nos Animais: (A) Sistema esqueleto hidráulico/músculos; (B) Sistema esqueleto duro externo/músculos; (C) Sistema esqueleto duro interno/músculos (SL. 39). Os dois primeiros sistemas se encontram apenas nos “Invertebrados”, enquanto o terceiro se encontra principalmente nos Vertebrados. (A) Sistema esqueleto hidráulico/músculos Esse tipo de sistema encontra-se principalmente nos Cnidários, nos Platelmintos, nos Nematódeos e nos Anelídeos (SL. 40 & 41). * Cnidários (Filo Cnidaria) A parede corporal dos Cnidários (formada por epiderme, gastroderme, e, entre os dois mesogleia) possui células contráteis quenão são verdadeiras células musculares, já que são ao mesmo tempo células que formam os epitélios externo (epiderme) e interno (gastroderme) (SL. 40). Essas células possuem formato colunar, com a base alargada que fica em contato com a mesogleia (SL. 40). As fibrilas contráteis se encontram nessa base alargada, enquanto que as organelas e outros componentes do citoplasma se encontram na parte dita "citoplasmática", apical, e não contrátil, a qual forma a superfície externa dos epitélios (epiderme e gastroderme) (SL. 40). Existem dois tipos de células contráteis: as células epitélio-musculares (que formam boa parte do epitélio externo [epiderme]) e as células musculares nutritivas (que formam boa parte do epitélio interno [gastroderme], além de participar da digestão intracelular). Tegumento, esqueletos & movimentos 15 Nas células epitélio-musculares, as fibrilas contráteis são orientadas paralelamente do eixo corporal (eixo oral/aboral [boca-pé]) (SL. 40) e formam uma camada muscular cilíndrica longitudinal. Nas células musculares nutritivas, as fibrilas contráteis são orientadas perpendicularmente em relação ao eixo corporal (SL. 40), formando uma camada muscular circular. Quando o Cnidário fecha a boca, a cavidade digestiva cheia d'água se torna de fato um compartimento fechado (esqueleto hidráulico) sobre o qual músculos podem atuar. As duas camadas musculares têm efeitos antagonistas: quando os músculos circulares são contraídos, o diâmetro do corpo diminui e em consequência, ele se alonga. A contração dos músculos longitudinais provoca o efeito contrário: encolhimento do corpo e aumento do diâmetro. * Platelmintos (Filo Platyhelminthes) Nos Platelmintos, existem verdadeiras células musculares que são organizadas numa camada circular e uma longitudinal, a circular sendo a mais externa das duas. Existem também músculos dorso-ventrais e diagonais entre os músculos circulares e longitudinais (SL. 40). Os músculos circulares e longitudinais formam duas bainhas musculares ao redor da massa de tecido conjuntivo que preenche a cavidade corporal desses animais. Nesse caso, o tecido conjuntivo que fica entre a parede corporal e a cavidade digestiva, de natureza frouxa e provida de muitas pequenas fendas preenchidas por líquido intersticial, sofre deformações quando as bainhas musculares que ficam ao redor se contraem cria movimento. * Nematódeos (Filo Nematoda) Nesses Animais, as células musculares se assemelham um pouco às dos Cnidários (não são completamente especializadas para a contração) e suas fibrilas contráteis são dispostas na base das células, paralelamente ao eixo anterio-posterior desses animais, formando assim uma camada muscular longitudinal, dividida em quatro campos musculares (dois dorsais e dois ventrais - SL. 41) ao redor do pseudoceloma, que atual como hidroesqueleto (SL. 41). Não há músculos circulares nos Nematódeos. Isso explica que os Nematódeos podem se deslocar somente através de vigorosas ondulações resultando de contrações alternadas de campos musculares opostos. A cutícula, espessa e formada por muitas fibras de colágeno, atua como sistema antagônico dos músculos. Tegumento, esqueletos & movimentos 16 * Anelídeos (Filo Annelida) Nos Anelídeos, a parede corporal comporta duas camadas de músculos formados por verdadeiras células musculares: uma circular (a mais externa) e uma longitudinal (a longitudinal é dividida em quatro blocos: dois dorsais, dois ventrais). Essas camadas formam um duplo "tubo" muscular ao redor de um verdadeiro celoma, ou seja, uma cavidade cheia de líquido e delimitada por um epitélio (o peritônio) (SL. 41). Nesse caso, a progressão do Animal é em linha reta (e não por ondulações), provocada por movimentos peristálticos (contrações alternadas dos músculos circulares e longitudinais ao longo do corpo) (SL. 41 & 42). Os Anelídeos mostram um exemplo da exploração mais completa possível das capacidades que oferece um esqueleto hidráulico em associação com um sistema muscular disposto ao redor. Isso se deve a dois fatores todos ligados à organização metamérica (segmentação) do corpo desses animais. O primeiro fator é a segmentação do celoma: esse celoma é formado por uma série linear de sacos celômicos, um por segmento, cada saco celômico sendo separado do anterior e do posterior por um septo. O segundo fator é a segmentação do sistema nervoso. Na face ventral dos anelídeos, há uma dupla cadeia nervosa ventral que é provida. em cada segmento, de um par de gânglios que possuem nervos laterais, os quais inervam especificamente a porção do tubo muscular circular ou longitudinal que passa no segmento. Essa segmentação do celoma e do sistema nervoso permite que num segmento ou grupo de segmentos tenha contração do tubo muscular circular (ou seja, da porção do tubo muscular circular que corresponde a esse(s) segmento(s)), enquanto que em outro segmento ou grupo de segmentos tenha simultaneamente contração do tubo muscular longitudinal (ou seja, da porção do tubo muscular longitudinal que corresponde a esse(s) segmento(s)). Significa concretamente que com esse sistema, um anelídeo pode alongar regiões do corpo, enquanto encolhe (e aumenta o diâmetro) de outras regiões do corpo. Isso providencia um excelente sistema para cavar e rastejar (SL. 42). (B) Sistema esqueleto duro externo-músculos Esse sistema é encontrado principalmente nos Artrópodes (Filo Arthropoda). Os Artrópodes são os únicos “Invertebrados” que se afastam do padrão de organização dos músculos em camadas-tubos (como nos Anelídeos, por exemplo). Tegumento, esqueletos & movimentos 17 Esses animais possuem numerosos músculos individuais e organizados em pares antagonistas, atados à superfície interna das peças articuladas do exoesqueleto, nas regiões de articulação dessa peças esqueléticas (SL. 43). Como nos Vertebrados, os movimentos sempre ocorrem segundo o princípio da alavanca, pela ação de pares de músculos antagonistas (SL. 43), proporcionando capacidades de movimento (variedade de movimento, precisão, força etc.) bem superiores às encontradas nos Animais com hidroesqueleto. (C) Sistema esqueleto duro interno-músculos dos Vertebrados Nos Vertebrados, os músculos são geralmente volumosos e determinam a forma do Animal. Como no caso dos Artrópodes, é um esqueleto articulado que permite a transmissão mecânica da força gerada por pares de músculos antagonistas dispostas nas zonas de articulação do esqueleto. Entretanto, nos Vertebrados, os músculos agem sobre um esqueleto interno, e não externo. Uma característica da musculatura dos Vertebrados é que ela é fundamentalmente metamerisada, ou seja, composta de uma série de "blocos" musculares repetidos, chamados miómeros (SL. 45, 46 & 48). Essa disposição segmentar é particularmente visível na musculatura do tronco (axial) dos grupos Cordados primitivos, com os Cephalocordatos ou as lampreias (Vertebrata do grupo Petromizontoidea) (SL. 45, 46 & 48). Nos outros grupos, em particular os Vertebrados do grupo Tetrapoda (B no SL. 48), a metameria original da musculatura é mascarada pelo desenvolvimento dos músculos, não segmentares, associados ao pescoço e aos membros (SL. 48 & 49). (A) Em Branchiostoma lancelatum (anfioxo) (Cephalochordata), os músculos, segmentares (são chamados miómeros), são dispostos em peças sucessivas encaixadas (<<<<<<) ao longo da corda dorsal (a notocorda), único elemento esquelético desses animais, à qual eles são fixados, de cada lado dessa notocorda (SL. 45 &46). A contração sucessiva dos miómeros de um lado do corpo e em seguida do outro lado permite criar ondas de ondulações do corpo e, portanto, possibilita o nado (SL. 47). Esse movimento por ondulação (SL. 47) é considerado como o movimento primitivo, basal, dos Cordados. Nas lampreias ("peixes" sem mandíbulas – grupo Petromizontoidea– ver slide 34), a musculatura axial representa, como no anfioxo, a quase totalidade da musculatura do Animal, e ela conserva Tegumento, esqueletos & movimentos 18 uma disposição metamérica próxima da encontrada nos Cefalocordados (ex: Branchiostoma lanceolatum – o anfioxo) (SL. 48). A mesma disposição básica dos músculos, em associação com o esqueleto axial, encontra-se nos “peixes” (Mixinas, Lampreias, Chondrichthyes, Osteichthyes) (SL. 48), com, no entanto, desenvolvimento de músculos não segmentares associados aos membros (nadadeiras), em muitos grupos de “peixes” (SL. 48). (B) Na maioria dos Tetrápodes, dos Anfíbios aos Mamíferos, a musculatura axial segmentar se tornou bem menos importante. Ela sofreu uma importante redução (salvo nos Tetrápodes secundariamente ápodes como os Répteis sem patas [cobras], certos Anfíbios sem patas [“cobra- cega” - ordem Gymnophiona], e os Cetáceos, por exemplo) e adquiriu novas funções (sustentação das vísceras, por exemplo). Nos Tetrápodes, a maior parte do sistema muscular é formada pelos músculos do pescoço e dos membros (SL. 49), não segmentares. Nutrição & sistemas digestivos 1 ANATOMIA E FISIOLOGIA ANIMAL II. NUTRIÇÃO & SISTEMAS DIGESTIVOS Nutrição & sistemas digestivos 2 1. Algumas definições básicas Os organismos vivos podem ser divididos em dois grandes grupos segundo sua maneira de conseguir os nutrientes (= fontes de carbono [esqueletos carbonados] e nitrogênio necessárias para a realização de funções vitais (ex: produção e armazenamento de energia, síntese de proteínas, e hormônios, controle dos equilíbrios iônios, formação das membranas celulares etc.) + os nutrientes ditos essenciais [= os que o organismo não pode sintetizar]): (1) os AUTOTRÓFICOS (FOTOautotróficos ou QUIMIOautotrófics) (SL. 3); (2) os HETEROTRÓFICOS (QUIMIOheterotróficos ou AUTOheterotróficos) (SL. 3) (1) Os autotróficos (SL. 4) são os organismos que podem viver num ambiente quase que completamente inorgânico já que podem sintetizar seus próprios compostos orgânicos (monoses, por exemplo) a partir de moléculas inorgânicas (CO2, para a fonte de carbono; NH3 ou NO3-[nitratos] para as fontes de nitrogênio). Essas moléculas inorgânicas são suficientemente pequenas e solúveis para que possam passar através da membrana celular. Portanto, não há necessidade de pré-tratar (ou seja, digerir) essas moléculas antes de pegá-las dentro da célula. A maioria dos autotróficos é fotossintetizante, ou seja, usa a energia luminosa, convertida em energia química (moléculas de ATP), para sintetizar compostos orgânicos (a partir de moléculas inorgânicas), os quais servem de fonte de energia (após oxidação dessas moléculas e armazenamento da energia recuperada em moléculas de ATP). Por isso, são chamados fotoautotróficos (SL. 3 & 4). Todas as Plantas, as Algas pluricelulares, alguns grupos de “protistas”, e certas Bactérias como as Cianobactérias são fotoautotróficos. Existem também alguns grupos que em vez da energia solar, usam energia resultando da oxidação de substâncias inorgânicas como H2S (sulfeto de hidrogênio), NH3 (amônia), FeO (óxido de ferro), Fe++ etc, para fixar o CO2 (e assim formar moléculas orgânicas). É o caso de alguns grupos de Bactérias. Tais organismos são chamados quimioautotróficos (SL. 3 &4). (2) Os heterotróficos (SL. 5) são os organismos incapazes de sintetizar seus próprios compostos orgânicos a partir nutrientes inorgânicos. Portanto, têm que obter sua fonte de carbono por meio de moléculas orgânicas presentes no seu alimento, ou seja, comendo outros organismos. Entretanto, a maioria das moléculas orgânicas encontradas no alimento dos heterotróficos são macromoléculas, ou seja, moléculas grandes demais para que possam ser absorvidas por membranas (*)1. Além do mais, as macromoléculas de um organismo que serve como alimento para outro organismo são diferentes das que compõem esse outro organismo. Portanto, antes de poder ser usadas, essas macromoléculas devem ser quebradas em unidades menores (os Nutrição & sistemas digestivos 3 monômeros), ou seja, elas devem sofrer um processo de digestão. Certos desses monômeros são usados para obter energia (= são oxidados), armazenada sob a forma de ATP, que por sua vez serve para alterar e juntar outros monômeros, para sintetizar macromoléculas (proteínas, ácidos nucléicos, polissacarídeos etc.). (*)1 Macromoléculas como proteínas, polissacarídeos, ácidos nucléicos etc. não podem ser absorvidas por membranas, seja pela membrana que delimita os vacúolos digestivos, no caso da digestão intracelular, seja pela membrana plasmática que delimita as células dos epitélios digestivos no caso da digestão extracelular). As macromoléculas têm primeiro que ser cortadas em seus elementos constitutivos menores (monômeros) por enzimas (ou seja, têm que sofrer processo de digestão). Essas moléculas menores (aminoácidos, monoses, nucleotídeos, glicerol, ácidos graxos, monoglicerídeos etc.) podem ser absorvidas pelas membranas, um processo que pode ocorrer por transporte passivo (difusão simples ou facilitada [i.e. mediada por carreador proteico ou canais protéicos]), no sentido do gradiente de concentração, ou, mais comumente, por transporte ativo (contra gradientes de concentração), com a ajuda de bombas (e, consequentemente, gasto de energia [ATP]). A maioria dos heterotróficos é quimioheterotrófico (SL. 3). Significa que obtêm sua energia por meio da oxidação (via a respiração ou fermentação) de moléculas orgânicas. Porém, existem alguns grupos de bactérias heterotróficas que usam energia luminosa. São fotoheterotróficos (SL. 3). Todos os Animais, todos os Fungos e a maioria das espécies de Bactéria são heterotróficos. Muitos grupos de “protistas” (os chamados “protozoários”) são também heterotróficos. 2. Tipos principais de organismos heterotróficos Existem 4 grupos principais de organismos heterotróficos (SL. 6) (1) Bactérias não fotossintetizantes (ou seja, a maioria das espécies de Bactérias) (2) Fungos (3) “Protistas” não fotossintetizantes (os chamados "protozoários") (4) Animais (1) e (2) não possuem sistema digestivo interno. Dependem completamente da absorção de moléculas resultando de uma digestão extracorporal (*)2. Fazem parte da categoria dos saprófagos, ou seja, os organismos que se alimentam, por absorção, dos produtos resultando da degradação (geralmente enzimática) realizada extracorporalmente de organismos mortos (esse tipo de nutrição chama-se saprofagia). As bactérias e os fungos são os principais saprófagos do mundo vivo, sendo responsáveis pela decomposição dos animais ou plantas mortos, mas as larvas de moscas e os aracnídeos são também saprófagos, pelo menos na primeira fase da sua nutrição. (*)2 Tanto as Bactérias como os Fungos não podem efetuar a fagocitose de partículas alimentares devido à presença de uma parede celular (de peptidoglicanos nas Bactérias, de quitina no caso dos Fungos). Devem, portanto, liberar enzimas digestivas para o exterior, a fim de realizar uma digestão externa. Nutrição & sistemas digestivos 4 (3) e (4) praticam a ingestão, ou seja, pegam partículas alimentares, pedaços de alimento, ou organismos inteiros (mortos ou vivos) dentro do corpo, para, em seguida, digeri-los. O termo técnico desse tipo de nutrição é holotrofia ou nutricão holozóica (do grego holos [inteiro]). A maioria dos Animais são holotróficos, salvo alguns grupos parasitos como as Ténias que absorvem moléculas orgânicas (resultando da digestão de alimento pelo hospedeiro) diretamente através do tegumento. A nutrição holozóica sempre comporta várias etapas, que ocorrem muitas vezes em compartimentos distintos do organismo (ex: estômago, intestino) (SL. 7): 1. Ingestão: nos animais, significa pegar o alimento na boca;nos protozoários, ocorre principalmente por endocitose (fagocitose ou pinocitose), com formação de vacúolo nutritivo; 2. Digestão: fragmentação mecânica (por dentes, por exemplo) do alimento (nos Animais) e degradação enzimática de complexos compostos orgânicos (macromoléculas) em moléculas mais simples (monômeros); 3. Absorção: transporte passivo e/ou ativo dos produtos da digestão, do compartimento onde ocorreu a digestão (vacúolo digestivo ou estômago/intestino) para o corpo (via sangue/hemolinfa) e, in fine, para o citoplasma (das diversas células do corpo no caso de um animal; para o citoplasma da célula no caso de um protozoário); 4. Assimilação: uso das moléculas absorvidas para vários processos metabólicos; 5. Ejeção: expulsão do material no digerido, ou seja, defecação. Os Animais usam uma grande variedade de recursos nutricionais orgânicas, com, geralmente especializações mais ou menos pronunciadas: os herbívoros ingerem principalmente (mas não unicamente) organismos de origem vegetal; os carnívoros ingerem principalmente (mas não unicamente) outros animais; os onívoros ingerem tanto vegetais como animais; os necrófagos ingerem restos de animais em fase de decomposição (usa-se o termo tanatófago para os Animias que ingerem restos de vegetais em fase de decomposição) (SL. 8). Às vezes, os regimes alimentares são muito especializados. Certos animais comem apenas ou quase que exclusivamente, insetos (insetívoros), ou madeira como os cupins (xilófagos), peixes (piscívoros), ou até excrementos (coprófagos) etc. (SL. 9 & 10). Em certos casos, a especialização pode ser extrema, como, por exemplo, o marsupial australiano Coala (Phascolarctos cinereus) (SL. 10) que se alimenta exclusivamente de folha de eucalipto, mais precisamente de folhas provindo de cerca de 30 espécies de eucalipto entre as 600 espécies existentes. Outro exemplo é o caso dos Insetos fitófagos (que comem plantas). Frequentemente, os Insetos fitófagos são extremamente específicos, alimentando-se de apenas uma ou algumas espécies de planta. https://en.wikipedia.org/wiki/Ingestion https://en.wikipedia.org/wiki/Digestion https://en.wikipedia.org/wiki/Digestion#Overview_of_vertebrate_digestion https://en.wikipedia.org/wiki/Assimilation_(biology) https://en.wikipedia.org/wiki/Egestion Nutrição & sistemas digestivos 5 3. Mecanismos para obter o alimento nos Animais. • Muitos Invertebrados aquáticos alimentam-se de partículas alimentares (ou seja, alimentos muito menores que eles) em suspensão na água. Possuem estruturas especiais (cílios, cerdas, tentáculos etc.) situadas em partes variadas do corpo, que permitem uma filtração da água. Esse mecanismo é chamado filtração (SL. 10). É o caso das Esponjas, dos Bivalvos (grupo de Moluscos), de certos Anelídeos, das larvas de mosquito, por exemplo (SL. 11 & 12) etc. Geralmente, as partículas filtradas são muito pequenas, razão pela qual esses animais são chamados micrófagos (= que se alimentam de pequenas coisas). Entretanto, os filtradores não são sempre micrófagos já que os maiores animais do planeta, as baleias, alimentam-se por filtração. Elas nadam com a boca amplamente aberta para ingerir milhões de pequenos crustáceos (o krill, pequenos crustáceos com aspecto de camarão e que se deslocam em grupos enormes e densos no mar – SL. 14) que elas filtram a partir da enorme quantidade d'água que elas forçam a passar entre as barbatanas. As barbatanas são longas placas córneas fixadas à mandíbula superior, dispostas em fileiras, e cuja borda interna é franjada com longos pelos córneos. São essas fileiras de barbatanas que atuam com filtro (Sl. 14). O método de ingestão por filtração é considerado como sendo o mais antigo/primitivo nos Animais. • Certos grupos de Animais alimentam-se por ingestão do substrato (SL. 15). Eles vivem sobre ou dentro da sua fonte de alimento. À medida que abrem caminho no substrato, o comem. As minhocas representam um exemplo típico desse tipo de ingestão. Cavam galerias na terra e à medida que cavam, ingerem o substrato (ou seja, a terra) cujos elementos orgânicos (restos de vegetais, de insetos, ovos de insetos etc.) são digeridos no tubo digestivo da minhoca. O resto é rejeitado sob a forma de excremento. Lagartas de numerosas espécies de lepidópteros (borboletas, mariposas) vivem dentro do tecido vegetal (nas folhas, por exemplo - ver SL. 16), cavando galerias e comendo ao mesmo tempo o tecido vegetal (SL. 16). • Outros grupos de Animais usam o método chamado aspiração (SL. 16). Eles sugam líquidos ricos em nutrientes, presente no corpo de outros organismos (ex: sangue, hemolinfa, seiva) ou produzido em órgãos especiais de organismos (ex: néctar produzido por nectários). É o caso de alguns grupos de Insetos como os pulgões, as cochonilhas, e certos hemípteros fitófagos (cigarras, por exemplo) que sugam a seiva das plantas graças a um tipo de tromba/seringa. Outros Insetos sugam o sangue de outros Animais, como os mosquitos, os barbeiros (hemípteros), as sanguessugas; beija-flor e abelhas que aspiram o néctar de flores são outros exemplos (SL. 18 a 20). Nutrição & sistemas digestivos 6 • Entretanto, fora esses grupos de Animais com métodos relativamente antigos ou especializados para conseguir capturar/ingerir o alimento, a maioria dos Animais ingerem grandes pedaços de alimento, e até a presa inteira. São chamados macrófagos (somos macrófagos) (SL. 21 & 22). Usam estruturas corporais variadas para arrancar, cortar ou moer plantas, para capturar presas e/ou reduzi-las a pedaços menores: mandíbulas, dentes, pinças, garras, bico, moela,..etc, e até ação enzimática (enzimas derramadas na presa por exemplo). 4. Necessidades nutricionais dos Animais e digestão Qualquer que seja o mecanismo usado para obter o alimento e seu regime alimentar, todos os Animais vivos precisam de certo número de moléculas orgânicas de base (também chamados macronutrientes) com o objetivo fornecer dois recursos fundamentais (SL. 23): * Energia (= síntese de ATP por oxidação dessas moléculas) * Fonte de carbono e nitrogênio para a síntese das macromoléculas constitutivas. Essas moléculas de base são aminoácidos, glicose (e outros monoses), nucleotídeos, bases nitrogenadas, glicerol, ácidos graxos, monoglicerídeos etc., obtidas por digestão de macromoléculas (proteínas, polissacarídeos, ácidos nucléiocos, lipídios). Os Animais também precisam de certo número de minerais, ou seja, nutrientes inorgânicos geralmente necessários em pequenas quantidades, porém essenciais (também chamados micronutrientes). Os Vertebrados, por exemplo, precisam de grandes quantidades de cálcio e fósforo para a formação dos ossos. O cálcio é também essencial para o funcionamento dos nervos e dos músculos, enquanto o fosforo entra na composição do ATP e dos ácidos nucléicos. O ferro é um componente dos citocromos, importantes enzimas das cadeias respiratórias de transporte de elétrons, e também da hemoglobina, a proteína que serve para transportar o oxigênio. O sódio e o potássio são essenciais para o equilíbrio osmótico do organismo. Outros minerais como o enxofre, o cloro, o magnésio, o zinco, o cobre, o iodo, o manganês, o flúor têm importantes funções. As vitaminas são moléculas orgânicas necessárias em quantidades muito pequenas e que o Animal não pode sintetizar. A maioria delas são coenzimas (= componente não proteico de uma enzima e essencial para o funcionamento dessa enzima) ou partes de coenzimas. É o caso da vitamina B1, B2, B6, B12, no ser humano, por exemplo. Nutrição & sistemas digestivos 7 Minerais e vitaminas fazem parte dos nutrientes essenciais (= os que as células não podem sintetizar e têm que obter pré-formados no seu alimento), junto com certos aminoácidos e ácidos graxos (*)3 (*)3 Alguns nutrientes são essenciais para todos os animais, outros são essenciais somente paraalgumas espécies. A vitamina C, por exemplo, é um nutriente essencial para os humanos e outros primatas, algumas aves e as cobras, mas não é nutriente essencial para a maioria dos outros animais. Os minerais e as vitaminas podem ser absorvidos tais quais. São pequenas moléculas que não precisam ser remanejados estruturalmente (SL. 24). No caso das moléculas orgânicas de base (as que servem de fonte de energia e de matéria prima para a síntese de macromoléculas), o problema é que elas não se encontram tais quais no alimento. Quando se come um pedaço de carne, por exemplo, não são encontrados tais quais os aminoácidos dos quais precisamos para sintetizar nossas proteínas: elas se encontram sob a forma de proteínas que são próprias do Animal que comemos. Em outra palavra, as moléculas de base dos quais os Animais precisam se encontram sob a forma de macromoléculas (proteínas, ácidos nucléicos, polissacarídeos, lipídios) no alimento. Portanto, os Animais têm que digerir essas macromoléculas para obter seus elementos constitutivos (aminoácidos das proteínas, nucleotídeos dos ácidos nucléicos, monoses dos polissacarídeos, ácidos graxos, glicerol, e monoglicerídeos dos lipídios etc.) (SL. 24). A digestão é o processo inverso do processo que permite ligar (por ação enzimática) monômeros, para obter macromoléculas (condensação): digestão significa hidrólise das macromoléculas do alimento graças a enzimas hidrolíticas (também chamadas hidrolases). Segundo o tipo de macromoléculas que elas hidrolisam (digerem), as enzimas digestivas são chamadas proteases (hidrólise das proteínas), nucleases (hidrólise dos ácidos nucléicos), carboidrases (hidrólise dos polissacarídeos), lipases (hidrólise dos lipídios). Porque essa necessidade de digerir (hidrolisar) as macromoléculas? Duas razões para isso: (1) Somente pequenas moléculas podem passar através de (ou seja, ser absorvidas por) membrana (de um vacúolo digestivo ou de uma célula); (2) As macromoléculas que um Animal encontra no seu alimento não são idênticas às que compõem esse Animal. Na maioria dos Animais, a hidrólise é geralmente precedida por uma fragmentação mecânica do alimento (pela ação de dentes, garras, bico, por exemplo). Essa fragmentação do alimento em pedaços menores é importante, pois ele aumenta a superfície total exposta à ação das enzimas digestivas e, portanto, acelera a degradação enzimática. Nutrição & sistemas digestivos 8 5. Tipo de digestão e de estruturas digestivas Um primeiro tipo, relativamente marginal, de digestão encontrado nos Animais é a digestão extracorporal. Digestão extracorporal significa que enzimas digestivas são derramadas, fora do corpo, sobre o (ou dentro do) alimento ainda não ingerido. Esse tipo de digestão, que é típica das Bactérias e dos Fungos, é, no entanto, também encontrado em alguns grupos de Animais. Um caso bem conhecido é o das Aranhas e dos Aracnídeos em geral. Nesses Animais, quando a presa é capturada (com as quelíceras) e morta (ou paralisada) (pelo veneno injetado), enzimas provindas do intestino médio são derramadas sobre a presa que sofre um início de digestão (extracorporal). Isso liquefaz os tecidos da presa, o que permite à aranha aspirar o alimento cuja digestão é terminada dentro do tubo digestivo. As larvas de moscas, que se alimentam de cadáveres, praticam também a digestão extracorporal. Entretanto, nos “protozoários” e na grande maioria dos Animais, o alimento é ingerido num compartimento corporal digestivo onde ocorre a ação das enzimas digestivas sem, todavia, danificar o citoplasma do “protozoário” ou as células do Animal. Mesmo no caso dos Aracnídeos citados acima, os produtos oriundos da digestão parcial extracorporal são ingeridos e sua digestão é finalizada num compartimento corporal digestivo (tubo digestivo nesse caso). O tipo mais simples (e evolutivamente mais antigo) de compartimento corporal digestivo é o vacúolo digestivo (também chamada lisossomo secundário) (SL. 25) que é a organela (compartimento celular delimitado por uma membrana) da célula onde alimentos podem ser digeridos graças a enzimas digestivas, sem perigo para o citoplasma (já que as potentes enzimas digestivas ficam presas dentro do vacúolo) (SL. 26). Nesse tipo de digestão, a célula incorpora o alimento por endocitose (fagocitose ou pinocitose), e a vesícula consequentemente formada (vacúolo nutritivo) se funde em seguida com um lisossomo (organela especializada para armazenar as enzimas digestivas) para formar o vacúolo digestivo (ou lisossomo secundário) onde ocorre a digestão (SL. 26). Os produtos da digestão são absorvidos (*)4 pela membrana do vacúolo digestivo e passam para o citoplasma, enquanto os resíduos da digestão são evacuados fora da célula por exocitose. (*)4 A absorção, o fato de moléculas passarem (= serem transportadas) através de membranas, pode acontecer de duas maneiras: (1) por simples difusão ao longo de um gradiente de concentração; (2) por transporte ativo, contra o gradiente de concentração e com a ajuda de bombas (= gasto de energia). Esse tipo de digestão é chamado digestão intracelular A digestão intracelular é o único tipo de digestão existente nos “protozoários” (SL. 27). Nutrição & sistemas digestivos 9 Entre os Metazoários, apenas as Esponjas se baseiam completamente e unicamente na digestão intracelular para digerir o alimento (SL. 28). Em todos os outros Animais, pelo menos uma parte da digestão é extracelular. Significa que ela ocorre dentro de um compartimento do corpo com função digestiva (cavidade gastrovascular ou tubo digestivo "completo") onde as macromoléculas vão ser completamente ou parcialmente digeridas por enzimas digestivas secretadas nessa cavidade. Os produtos da digestão (ou seja, os nutrientes) são em seguida absorvidos pelas células do epitélio da cavidade, onde podem eventualmente sofrer etapa suplementar e final de digestão intracelular (como nos Cnidários e nos Platelmintos do grupo Turbellaria, por exemplo). 6. Aparelhos digestivos 6.1. Digestão intracelular em vacúolos digestivos “Protozoários” Os organismos unicelulares possuem um plano "corporal" completamente diferente dos Metazoários. Portanto, pode-se esperar que suas adaptações para obter e digerir o alimento sejam completamente diferentes. De fato, existem importantes diferenças. Entretanto, apesar dessas diferenças, existem semelhanças surpreendentes entre o aparelho digestivo unicelular e pluricelular. • No caso das Amebas e afins, “protistas” sem estrutura permanente para capturar e digerir o alimento, pseudópodes são formados na região da membrana plasmática estimulada pela presença de alimento (outros “protistas”, por exemplo, ou Bactérias) (SL. 27). Progressivamente, os pseudópodes cercam completamente o alimento e uma vesícula nutritiva é finalmente formada. Mais tarde, essa vesícula funde-se com lisossomos e a digestão começa na vesícula digestiva (também chamada lisossomo secundário). As vesículas nutritivas podem ser vistas como análogos funcionais das cavidades digestivas dos Animais (SL. 27). • Nos Ciliados, importante grupo de “protistas” caracterizados por complexos sistemas de cílios na superfície do "corpo", as semelhanças são ainda mais pronunciadas (SL. 27). Nutrição & sistemas digestivos 10 Os Paramécios, por exemplo, que são entre os mais complexos Ciliados, mostram uma organização interna e diferenciações citoplasmáticas (sistema de organelas especializadas) análogas ao sistema de órgãos dos Metazoários. Esses “protistas” possuem uma estrutura especializada e permanente para ingerir o alimento: o perístoma (ou cavidade bucal). Trata-se de um tipo funil provido de complexas estruturas ciliadas. No fundo desse perístoma, há outra estrutura permanente: a "boca" da célula, ou citostoma. O movimento dos cílios no perístoma cria uma corrented'água que leva o alimento (Bactérias ou outros “protistas”) para o citostoma, de onde passa para um curto canal (tipo de cilindro formado por microtúbulos) chamado citofaringe. No final da citofaringe, as partículas alimentares se acumulam dentro de um vacúolo nutritivo que, uma vez preenchido, se desprende da citofaringe. Logo em seguida, o vacúolo digestivo começa a deslocar-se dentro do citoplasma segundo um caminho elíptico chamado ciclose. Durante esse caminho, o vacúolo se funde primeiro com lisossomos (os lisossomos são organelas que contêm enzimas digestivas; as enzimas são sintetizadas no retículo endoplasmático rugoso e são em seguida “empacotadas” no aparelho de Golgi) e se torna um vacúolo digestivo (ou lisossomo secundário), uma cavidade digestiva miniatura que inicia, dentro do vacúolo, a digestão. Os produtos da digestão são absorvidos pela membrana do vacúolo e passam para o citoplasma da célula. O movimento da ciclose permite distribuir para toda a célula os produtos da digestão trata-se de um sistema circulatório rudimentar. No fim do caminho da ciclose, o vacúolo com os resíduos da digestão chega a uma região determinada e fixa do Paramécio chamada poro "anal" (ou citoprocto), onde os resíduos são evacuados para o exterior por um fenômeno de exocitose. Esponjas (SL. 28) As Esponjas (filo Porifera) são Metazoários marinhos (alguns grupos são de água doce) muito simples caracterizados por uma organização corporal construída ao redor de um sistema de canais aquíferos (= canais por onde circula a água), com numerosos minúsculos orifícios situados na superfície externa e por onde a água entra no corpo (poros inalantes) e um número reduzido de outros poros, maiores, por onde a água sai do corpo (poros exalantes) (SL. 28). Células flageladas especializadas (os coanócitos), encontradas em pequenas câmaras (as câmaras vibráteis - SL. 28), asseguram uma corrente contínua d'água através desse sistema de canais. São também essas células que filtram parte das partículas alimentares entrando com a corrente d'água (outras partículas são fagocitadas por células que revestem os canais aquíferos – ver apostila sobre as Esponjas para mais detalhes). Os coanócitos possuem ao redor do flagelo um colar de Nutrição & sistemas digestivos 11 microvilosidades que permite a filtração da água (esse colar atua como peneira) (SL. 28). As partículas retidas do lado de fora de colar são encaminhadas para a base do colar onde elas são fagocitadas. Os vacúolos nutritivos assim formados se deslocam até a base dos coanócitos onde as particulas alimentares são colocadas para fora (por exocitose) e de novo fagocitadas por outras células (os arqueócitos) onde ocorre de fato a digestão intracelular. A digestão é, portanto, completamente intracelular nas Esponjas. 6.2. Digestão em cavidades gastrovasculares Cnidários (SL. 29) Os Cnidários são animais marinhos com simetria radial e organização corporal relativamente simples (SL. 29). O corpo tem basicamente a forma de um saco (pelo menos nas formas sedentárias, como as hidras ou as anêmonas) cuja parede é formada de apenas duas camadas de células (são diploblásticos), com, entre os dois epitélios uma camada de material gelatinoso/fibroso (a mesogleia): * uma camada externa de células (a epiderme) que funciona como epitélio protetor e sensorial. Possui também células especiais (o cnidócitos) que servem para a captura e imobilização das presas através de injeção de veneno; * uma camada interna de células (a gastroderme) com células que secretam enzima e outras que fagocitam particulas alimentares. A cavidade central é uma cavidade digestiva com apenas uma abertura que serve ao mesmo tempo para a ingestão do alimento (boca) e a liberação para o exterior dos resíduos da digestão (ânus) (SL. 29). Tal cavidade digestiva com apenas uma abertura chama-se cavidade gastrovascular. Os Cnidários são Animais carnívoros que capturam suas presas (geralmente pequenos crustáceos) graças a células especiais (os cnidócitos) que podem injetar veneno nas presas. Em seguida, os tentáculos (que ficam ao redor da boca) levam a presa para a boca que pode distender-se fortemente para ingeri-la. Uma vez na cavidade gastrovascular, a presa sofre a ação de enzimas digestivas secretadas pelas células glandulares da gastroderme. Essas enzimas fragmentam os tecidos moles da presa em partículas alimentares (digestão extracelular) que são movimentados por toda a cavidade graças aos cílios da gastroderme (daí o nome gastrovascular, pois além da sua função digestiva Nutrição & sistemas digestivos 12 [gastro], a cavidade assegura a distribuição, a circulação [vascular], das substâncias nutritivas para todas as partes da cavidade gastrovascular). Em seguida, as partículas alimentares resultando da digestão extracelular são fagocitadas por células especializadas da gastroderme nas quais a digestão é terminada de maneira intracelular, dentro de vacúolos digestivos. Porque a presença de um processo adicional de digestão extracelular numa cavidade digestiva já que, afinal das contas, há também digestão intracelular? O problema com a digestão intracelular com endocitose (fagocitose ou pinocitose) é que ela limita fortemente o tamanho do alimento que pode ser ingerido. O fato de possuir uma cavidade digestiva constitui uma adaptação que permite aos Animais ingerir presas de grande tamanho e em seguida, de reduzi-las a partículas a fim de alimentar as células. Platelmintos (SL. 30) Os Platelmintos são animais com simetria bilateral, triploblásticos e com corpo geralmente muito achatado. Muitas espécies são parasitas, porém muitas outras são de vida livre, marinhas ou de água doce. A maioria dos Platelmintos possui uma cavidade gastrovascular (com apenas uma abertura) que, nesses Animais, é fortemente ramificada. A Planária, por exemplo (SL. 30), possui uma faringe, tipo de tubo musculoso, que ela pode evaginar pela boca que fica no meio da face ventral. Essa faringe é usada para penetrar (com a ajuda de enzimas) os tecidos da presa, além de liberar enzimas digestivas que vão digerir parcialmente a presa que em seguida, é sugada para dentro da cavidade gastrovascular. Essa cavidade possui três ramos que par sua vez são extremamente ramificados, o que aumenta bastante a superfície da gastroderme. Como no caso dos Cnidários, a Planária começa a digestão da presa de maneira extracelular e a termina de maneira intracelular. 6.3. Digestão num tubo digestivo Todos os Animais com um nível de organização corporal mais complexo que o dos Cnidários e dos Platelmintos possuem um sistema digestivo dito completo, ou seja, um tubo digestivo que comporta duas aberturas: uma anterior por onde a alimento é ingerido – a boca -; uma posterior por onde são evacuados os resíduos da digestão – o ânus (SL. 31) Nutrição & sistemas digestivos 13 O tubo digesto possui vantagens óbvias em relação à cavidade gastrovascular: • O alimento e os resíduos da digestão não têm mais que usar a mesma abertura • O alimento pode deslocar-se numa só direção (boca ânus) num sistema tubular: isso permite a divisão desse tubo em série de compartimentos/porções distintos, cada um podendo especializar-se para uma (ou várias) função(ões) diferente(s) efetuadas por etapas (SL 31): ingestão dos alimentos & quebra mecânica dos alimentos armazenamento temporário do alimento digestão enzimática do alimento absorção dos produtos da digestão armazenamento dos resíduos da digestão evacuação dos resíduos. O resultado é um sistema digestivo muito mais eficiente. Além do mais, existe um potencial para modificações evolutivas de partes do tubo digestivo (especializações), que tornam os Animais adaptados a uma grande variedade de regimes alimentares. Certas partes do tubo digestivo desempenham funções
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